// LIVRO

Onde o CEO Encontrou o Amor.250Z

Onde o CEO Encontrou o Amor

Emily precisou deixar Toronto para proteger o filho da família opressora de seu ex-noivo. Saindo de um relacionamento abusivo, após sofrer violências domésticas, estava reunindo forças para seguir em frente e recomeçar, com seu bebê de apenas um mês nos braços. Retornar para Chicago e ficar perto da família parecia a melhor maneira de criar Samuel, sem apoio do pai biológico. Liam sobreviveu a um atentado na zona de guerra e além das cicatrizes por todo corpo e rosto, tinha marcas na alma. Solitário, era um homem que vivia para o trabalho e próximo apenas da avó, irmão e melhores amigos. Conhecido como a Fera pelo humor taciturno e aparência, não imaginava que sua nova assistente fosse tão bonita e se interessasse por ele. Manhãs de cafés e conversas nos corredores aproximou o casal improvável. Eles eram diferentes no humor e nos gostos, mas encontraram um ponto de equilíbrio. O que ambos não sabiam é que além da família do ex-noivo, o passado de Emily tinha grandes segredos e eles precisariam de força para enfrentar o desconhecido, ou a relação poderia chegar a um ponto de ruptura.

CAPÍTULO UM
Emily
“Era uma vez Dylan Mitchell e Adelle Evans e agora é a parte em
que começa o nosso “felizes para sempre”. Venha comemorar
conosco…”
Larguei o convite em cima da mesa velha do meu escritório e
respirei fundo, esfregando o peito para deixar a sensação esquisita
de lado. Meu ex-noivo mandou o convite de seu casamento, apenas
alguns meses depois que o nosso foi cancelado. Pelo menos, ele
não teve a cara de pau de marcar no mesmo lugar e no mesmo
horário para não perder o cheque de pagamento.
Dessa vez, seria em um clube pomposo da cidade, um local
que eu não escolheria, mas a mãe dele, sim. Talvez a futura esposa
tenha escolhido apenas para agradar a sogra.
Digitei o nome da noiva no google e vi que ela era filha de um
político local, o que só comprovava que a pressão que Dylan sofria
de sua família era verdadeira. A família Mitchell queria alguém
dentro dos seus padrões, da classe que pertenciam. Nunca fui o
suficiente para ele, um homem de família rica e tradicional.
Guardei o cartão de confirmação junto ao convite. Não iria
aparecer. Nosso término foi um pesadelo não consensual. Ele me
bateu uma vez, um empurrão, e eu deixei de lado por acreditar que
havia sido minha culpa. Quando aconteceu novamente, pedi
desculpas por irritá-lo, até que me tornei a mulher que pouco falava
e reprimia a personalidade para não provocar nenhuma reação
brusca que pudesse me machucar.
Descobri a gravidez e fiquei feliz. Eu o amava e acreditava que
poderíamos ser felizes, ou não teria insistido tanto. Foi diferente no
restaurante.[1] Não só porque foi em público e por ter me levado para
o hospital. Quando abri os olhos, pensei na vida que meu filho teria
ao crescer assistindo a mãe apanhar do pai, que sempre bêbado,
nunca parecia estar feliz.
Com o escândalo, Dylan saiu do país, mas estava certo que eu
o perdoaria e criaríamos nosso filho juntos. Ele retornou, pronto para
casarmos escondidos e fingir que a gravidez havia acontecido
depois, para não prejudicar a imagem conservadora de sua família.
Apesar da dor dilacerante no meu peito e do amor que já sentia pelo
meu filho, terminei tudo.
Foi doloroso ligar para meus amigos e familiares informando o
cancelamento do casamento, mas eu segui firme.
Aguentei as notas nos jornais, meus colegas de trabalho me
olhando estranho e as perguntas indiscretas dos mais ousados.
Por que ela deixaria um homem como Dylan Mitchell?
Por que ela não queria ser a nova sra. Mitchell?
Não nasci em família rica, fui criada em um orfanato até meus
sete anos, quando uma mulher quase me atropelou com sua
bicicleta. Ela disse que foi amor à primeira vista e uma resposta
divina. Naquele mesmo dia, recebeu a notícia de que não poderia
ter filhos naturalmente. Depois de me adotar, levou mais três
crianças para casa e assim eu tive irmãos, pais amorosos e uma
vida feliz.
No hospital, pensando nos meus pais e no casamento sólido
deles, tive certeza que por mais que amasse Dylan e ele fosse
“perfeito” comigo, não havia amor do lado dele. Eu era a fuga de
seu estilo de vida, da casa estoicamente decorada em preto, branco
e cinza. Um escape do controle de sua mãe, do poder abusivo do
pai e do escárnio do irmão problemático.
Toda vez que estava em sua casa, com sua família, me sentia
oprimida, infeliz, deslocada e menos humana. Eu amava a minha
vida despreocupada, minha casa cheia de flores e meu cantinho
colorido. Não possuía uma grande renda e prezava mais ser feliz do
que ser a esposa perfeita nos braços de um homem de sucesso. Foi
por isso que tirei o ostentoso anel de noivado que não combinava
comigo e devolvi.
Foi um erro amar Dylan porque, no fundo, ele só pensava em si
mesmo.
Tanto que não fiquei surpresa quando ele abriu mão da guarda
do bebê que estava carregando por pressão da mãe. Eu estava
apenas de algumas semanas quando terminamos. Carina Mitchell
sabia que o marido nos obrigaria ao casamento ou faria de tudo
para que o bebê fosse apenas deles. Eu concordei, porque não
queria casar por obrigação e muito menos perder meu filho.
Nós arquitetamos um plano. Ninguém saberia da minha
gestação. Deixei meu trabalho e me mudei de bairro. Tive uma
gestação até bem tranquila, considerando que a minha vida poderia
estar muito pior.
Quando meu pequeno homem nasceu, Dylan me ligou
chorando, querendo ver o filho. Eu não sabia exatamente o que ele
estava pensando, nem qual conflito seu coração enfrentava. Deixeio vir e foi uma das visitas mais difíceis. Meu bebê mal sabia o que
estava acontecendo com os pais. Nunca seriamos uma família feliz,
como sempre havia sonhado.
— Vai ser melhor para ele crescer sem ser um Mitchell, Emm
— Dylan disse, esfregando a mão na cabecinha cabeluda do meu
bebê. Ele estava sóbrio, a voz doce e emocionada. — Vai ser feliz e
crescer sem nenhuma pressão para ser perfeito. — Fungou e beijou
a testinha dele. — Vai poder continuar livre de mim.
Dylan tentou me tocar e recuei. Ele deixou cair a mão, tenso,
com um olhar irado. Peguei meu filho e abri a porta, encerrando sua
visita bruscamente. Meu coração estava acelerado e meus dedos
tremiam, mas por amor ao meu menino, me mantive forte.
Samuel não teria seu sobrenome, apenas o meu. Dylan
assinou o documento que abria mão da paternidade. A linha da
assinatura estava permanentemente manchada com minhas
lágrimas, porque eu queria que a nossa história tivesse um final
feliz.
E agora, o casamento dele. Será que a amava? Será que
amaria a vida com ela? Os filhos seriam amados e acolhidos?
Desejava que ele fosse feliz, mas ainda existia uma parte do meu
coração que queria que ele fosse feliz comigo, com nosso bebê e
pudéssemos viver uma vida completa. Parte do meu coração me
dizia que Dylan não deixou de ser egoísta por abrir mão de nós.
Isso me levava até onde estava, sentada em minha casa vazia,
com caixas por todo lado e um bebê de um mês de vida dormindo
em um carrinho. Parte do acordo era que eu saísse da cidade.
Ainda estava em licença maternidade e em breve iria assumir a
posição de assistente pessoal em uma empresa em Chicago. Mudar
seria bom, não só emocionalmente, como profissionalmente.
Fechei meus olhos e disse para mim mesma que ficaria tudo
bem. Eu e o meu bebê iríamos vencer o mundo juntos.
Seu chorinho no canto me fez levantar da velha cadeira. Só
havia o convite ali em cima, nada mais. Toda casa estava limpa,
vazia, sem as minhas caixas. O proprietário logo encontraria alguém
para preencher o local. Meu caminhão de mudança estava
agendado para o dia seguinte bem cedo e iria dirigindo até a nova
cidade. Meu pai queria que o esperasse sair de férias para me
ajudar, mas eu não queria demorar mais tempo.
Não queria que ninguém me reconhecesse com o bebê e
fizesse as conexões.
Samuel estava com os olhos abertos, se esticando e
encolhendo, soltando estalinhos com os lábios e logo encontrou o
caminho do punho para a boca. Chupou forte. Aquele menino vivia
faminto. Sentei no chão, com a almofada de amamentação no colo e
o tirei do carrinho, liberando meu seio esquerdo, o que estava mais
cheio e mais duro.
Meu telefone tocou e tirei do bolso. Silenciei a chamada de
vídeo e atendi, para não perturbar meu menino faminto. Ele era tão
quieto, só não dormia muito à noite, mas ainda não me afetava. Não
fazia a mínima ideia como seria quando começasse a trabalhar o dia
inteiro e ficar com ele à noite.
— Meu meninão está mamando? — Jenna, minha melhor
amiga, perguntou empolgada. — Estou tão ansiosa para amanhã
que mal consigo dormir! — ela disse com um sorriso de ocupar a
tela inteira. — Já fui ao seu novo prédio e fiz uma boa limpeza.
Comprei uns artigos de decoração, fotografias e fui ao brechó
comprar novos casacos, fiz umas comprinhas para você também.
— Jenna…
— Nós finalmente vamos morar juntas depois de anos… estou
tão feliz! — Soltou um gritinho e ouvi a voz baixa de seu marido,
pedindo que se acalmasse ou iria acordar as crianças. Justin[2]
,
marido de uma nova amiga, Olívia[3]
, foi quem me ajudou com o
emprego. O marido de Jenna, coincidentemente, era um
paramédico em posição disponível nessa empresa. Acabou
ajudando nas referências.
Fiz a entrevista duas semanas antes e meu cargo era para
substituir uma mulher que estava se aposentando. Não conheci meu
novo chefe, apenas a assistente, uma senhora que foi muito legal. A
própria chefe do RH me deu várias dicas antes de entrar para
responder as perguntas e me apresentar.
Era uma empresa relativamente jovem, mas potente e que
oferecia serviços de segurança na internet, softwares, cuidava de
crimes cibernéticos e tudo que um dia pensei nunca ser possível
trabalhar. Me formei em jornalismo, era o tipo de pessoa
comunicativa e alegre. Me candidatei à vaga porque eles queriam
uma mulher que pudesse auxiliar e orientar o CEO e os demais
funcionários da presidência nas questões de organização. Além de
trabalhar na comunicação com o mundo externo.
O que mais me atraiu foram as palavras “facilidades de
flexibilidade de trabalho”. Eu podia trabalhar remotamente se fosse
necessário, todas as reuniões eram agendadas, existia um sistema
a ser trabalhado e seguido rigorosamente na empresa. Entre dezoito
candidatas, fui contratada. Fiquei feliz e aliviada, porque apesar de
Dylan ter acordado dar pagamentos mensais para Samuel, eu não
queria o dinheiro dele.
— Terra para Emily Williams! — Jenna me chamou atenção
quando viajei sem respondê-la. — Está tudo bem, querida?
— Estou bem, também estou ansiosa. Vou chegar aí na hora
do almoço.
— Tudo certo com sua documentação?
— Sim. O caminhão irá passar pela fronteira sem problemas.
Obrigada por se dedicar tanto, não sei o que faria sem você. — Sorri
para a tela e olhei para meu menino mamando, sugando forte. Ainda
doía muito amamentar, mas já estava me acostumando, nos
primeiros dias foi bem mais doloroso.
— Eu meio que fiz uma promessa de dedinho quando você foi
adotada, que nós nunca iríamos nos separar. — Fez um beicinho
com um encolher de ombros e eu ri.
Jenna nunca foi adotada, ela sempre teve esperanças mas
viveu em lares temporários até os dezoito. Era difícil compreender
como conseguia manter o sorriso no rosto e a esperança de um
futuro melhor com tudo que viveu. Principalmente depois que se
tornou adolescente, com um corpo bonito e seios fartos.
— Tente dormir, nós teremos um longo dia amanhã, durma
bem, amo você!
— Eu sei, te amo, contando as horas. Dê um beijo nesse
bebezão, a titia aqui irá enchê-lo de beijos.
Encerrei a chamada e me concentrei na alimentação do meu
bebê. Samuel não foi planejado, jamais imaginei ter um filho com
Dylan antes do casamento e sempre fui cuidadosa em relação a
isso. Aconteceu e não me perguntem qual dia meu anticoncepcional
falhou, se tomei mais tarde, se perdeu efeito com alguma
medicação ou se era para acontecer.
Simplesmente aconteceu.
Sammy se tornou o amor da minha vida no segundo que ouvi
seu coração bater. Era meu bebê, minha paixão, tão pequeno e já
com uma batida tão forte. Tudo que um dia pensei amar na vida era
nada, comparado a ele. Dylan teve coragem de me pedir para tirá-lo
e só de lembrar, meu sangue fervia.
O meu amor da vida inteira estava nos meus braços. Escolhi
tê-lo e iria cuidar de sua vida como toda mãe apaixonada e
dedicada. O pai era um caso à parte, entrou na minha vida para me
fazer amadurecer e mostrar o quanto eu podia ser forte. Ele me
ajudou a conceber meu menino. O propósito de sua existência só
Deus sabia e eu não me importava com os motivos. Eu o amava e o
adorava por completo.
Dormi meio sentada, amamentando diversas vezes durante a
noite, trocando a fralda umas outras mil vezes e de manhã, dei-lhe o
último banho antes de sair, fraldas limpas, bolsas completas. Os
carregadores da mudança chegaram e fizeram um bom trabalho,
rápido e eficiente. Arrumei Samuel na cadeirinha no banco de trás
junto a algumas malas de roupas, bolsas pessoais de um lado e
bolsas de emergência do outro.
Era uma viagem de sete horas e meia até Chicago, planejei
paradas em lugares seguros para amamentar, me alimentar e
chegar em minha nova casa com segurança. Samuel dormiu as
primeiras duas horas, acordou quando estacionei o carro em uma
lanchonete. Troquei sua fralda, amamentei dentro do carro e
comprei um lanche.
Ele ficou meio aborrecido em dado momento. Seu cabelo preto
era arrepiado para todas as direções, o rostinho amassado de
nervoso e os olhos cinza arregalados, brilhando com as lágrimas
que ainda não haviam sido derramadas.
— Nós só temos a metade do caminho, você pode parar de
chorar — disse e ele ficou em silêncio, com os olhos arregalados. —
Você quer ouvir a voz da mamãe? Deixe-me pensar em um assunto,
garotinho. Uma mulher sempre tem o que discursar.
Falei sem parar por quase uma hora. Ele ficou quieto, me
ouvindo, depois comecei a cantar e então, voltou a dormir. Esperava
que aguentasse chegar à próxima parada para chorar e querer
peito. Felizmente, consegui fazer tudo conforme o programado e
quando cruzei a fronteira, de volta ao país que nasci e morei até
meus dezoito anos, senti a esperança que tanto alimentei nas
últimas semanas aflorar com força.
Tive vontade de ir direto para casa dos meus pais, mas, o
caminhão estaria me esperando para descarregar tudo. Queria que
Samuel descansasse um pouco antes de sofrer o estresse de ter mil
pessoas em cima dele. Ele precisaria se acostumar com o barulho e
principalmente com a minha mãe, que iria tomar conta dele para que
eu pudesse trabalhar.
O centro de Chicago estava cheio, peguei um pouco de
engarrafamento e recebi a ligação informando que Zayn estava
recebendo minhas coisas com meu irmão mais novo, Cole. Jenna
estava no trabalho e imaginava que pudesse estar quase fingindo
um desmaio para que seu chefe a liberasse.
Virei a rua do meu novo prédio e reconheci o caminhão, então
estacionei na frente. Meu irmão me reconheceu e veio correndo, ele
era só um menino de vinte e dois anos muito doce. A pele morena
era a mais bonita do mundo. Engravidou a namorada aos dezoito,
casaram por insistência da família dela e pareciam ser felizes juntos,
mesmo com a vida precoce.
— Alguém já te disse que é a mulher mais teimosa do mundo
inteiro? Vir dirigindo com um bebê recém-nascido? — Cole abriu a
porta do meu carro e me ajudou a sair do cinto de segurança.
— Eu pude pari-lo sozinha, podia muito bem vir dirigindo —
respondi rindo e abraçando-o apertado. — Está tudo bem por aqui?
— Faltam só cinco caixas. Já está tudo lá em cima. Todos nós
viremos à noite para um mutirão de arrumação, nem adianta discutir.
Que tal deixar sua família te ajudar?
— Quem te mandou ensaiar esse discurso?
— A mamãe. — Sorriu e ri mais ainda.
— Tudo bem, eu aceito a ajuda e agradeço. Obrigada por vir
mais cedo, agora vamos entrar.
Algumas horas mais tarde, meu novo apartamento estava
cheio. Samuel passava de colo em colo, mal podia respirar sem ter
dez mãos em cima dele. Cole, Zayn, Joseph, meu outro irmão, e
meu pai estavam arrumando as coisas pesadas. Joseph me deu um
abraço apertado assim que chegou com a esposa, Tullia. Senti
muita falta dos dois, quase não os via durante o ano, somente nas
festas.
Minha mãe me abraçou por um total de cinco minutos, sem me
soltar e em seguida agarrou o neto. Ela ficou comigo por uma
semana quando Sammy nasceu. Minhas cunhadas, Tullia e Jasmim
assumiram a arrumação do meu quarto. Jenna e eu cuidamos do
restante.
O apartamento já era mobiliado, a maioria dos móveis
planejados. A proprietária era conhecida de Jenna do trabalho e
alugou para mim, o antigo morador saiu sem aviso e ela precisava
que alguém ocupasse. Era espaçoso, com três quartos, uma
varanda que encheria de plantas, cozinha com layout aberto e uma
sala de jantar integrada à sala de estar. Dois banheiros, um na suíte
que seria meu quarto e outro no corredor.
Não estava fantasiando uma vida fácil com um bebê. A
realidade era que estava sozinha, em um emprego novo e prestes a
enfrentar um monte de batalhas desconhecidas em uma base diária.
Estava assustada, com medo de falhar, de colocar a vida de
uma criança inocente em risco e medo de fracassar com tudo que
havia conquistado. Eu tinha uma posição de comentarista em uma
revista feminina, respondia as leitoras e elas amavam. Precisava
esconder meu nome como assistente pessoal de um CEO, porque o
salário era o dobro do que ganhava antes e porque tinha que
sustentar um bebê, não me aventurar por aí.
O barulho na minha casa era meu único conforto: tinha uma
rede de apoio, uma família que me amava e estava pronta para me
ajudar caso precisasse — até se não. Podia fazer tudo isso dar
certo. Iria fazer.
No entanto, ainda sonhava com um amor, com um
companheiro para novas aventuras e construir uma família.
Mas por que parecia ser tão impossível?
CAPÍTULO DOIS
Emily
Alguns dias depois.
— Tenho certeza que vai ficar tudo bem. — Mamãe segurou
meus ombros. Eu estava travada no lugar, com medo de sair e com
a represa de lágrimas prestes a explodir. — Vai chegar atrasada no
seu primeiro dia de trabalho, Emily.
— Troque o bico da mamadeira se ele rejeitar e me liga que
qualquer coisa fujo para vir dar de mamar.
— Nós nos veremos na hora do seu almoço, okay? Eu sei
cuidar de um bebê e vou te ligar se precisar. — Ela me tranquilizou.
Meus lábios tremeram. — Não, meu amor. Não chore.
— Ele é tão pequeno! Como posso deixá-lo? Sou um monstro!
— Chorei no ombro da minha mãe, que me deu tapinhas
confortadores nas costas. Ela era uma mulher pequena, um metro e
sessenta, quinze centímetros mais baixa que eu, porém, com uma
força que toda mãe leoa tem.
— Não é um monstro. Você é mãe e precisa de um trabalho.
Vai ficar tudo bem. Vá ao banheiro, retoque essa maquiagem e saia
por essa porta agora mesmo — disse em um tom autoritário e
obedeci, limpando meu rímel borrado e retocando onde era
necessário. Dei mais um beijinho no meu bebê dormindo e me
arrastei para o lado de fora.
Depois de duas semanas me ambientando no apartamento,
guardando tudo e me acostumando com uma nova rotina, era hora
de começar a trabalhar. Meu bebê completou quarenta e cinco dias
de nascido. Meu resguardo havia terminando há cinco dias, fui
liberada para ter relações sexuais e praticar exercícios, exceto
pegar peso em excesso.
Tirei leite o suficiente para alimentar meu bebê durante o dia e
minha mãe o levaria até meu trabalho para amamentá-lo
pessoalmente na hora do almoço, pelo menos nesses primeiros
dias, para que ele não sentisse tanto a minha ausência. Ele era tão
pequeno, enquanto tinha medo da viagem de quinze minutos da
casa dos meus pais até meu trabalho, a ideia de não vê-lo durante
um dia inteiro me deixava apavorada.
Minhas mãos estavam suadas conforme dirigia até o grande
prédio comercial, no qual os últimos cinco andares pertenciam ao
meu novo trabalho. Estive ali para buscar meu crachá, o informativo
de vestimenta, alguns papéis necessários para meu primeiro dia e
conversar com Barbara, a assistente que estava se aposentando.
Ela era tão legal, podia nos ver sendo amigas, era uma pena que
estava saindo.
E se ela não estivesse saindo, não haveria uma vaga para
mim.
Olhei-me no espelho do carro, minha maquiagem ainda estava
boa. Passei apenas rímel, base, corretivo e blush. Nada de
iluminador ou pó, apenas o básico e um batom rosa, cor de boca
com um pouco de brilho. Brincos pequenos, cabelos soltos e
escovados. Havia cortado há dois dias, era longo, na marca do
sutiã, mas estava muito complicado gerenciar um cabelo longo e um
bebê ao mesmo tempo.
Peguei minha bolsa e saí do carro, estacionando do outro lado
da rua, no estacionamento privativo para funcionários da empresa.
Ganhei um cartão de acesso ao local, entendendo que era apenas
para acompanhar meu chefe, não para deixar meu carro ali. Achei
que seria muito abuso.
Vestia uma calça jeans escura, justa, com botas de cano médio
e uma camisa social larga, que cobria a minha bunda com o
terninho cinza escuro. Era alta, mas não fazia o estilo modelo devido
às minhas curvas. Minhas pernas eram longas, meus ombros
eretos, seios bem fartos devido a minha produção de leite. Escolhi
usar uma pasta de couro preta, para guardar o material que fosse
necessário para o dia.
Passei pela recepção e um dos chefes que Barbara me
apresentou estava entrando quase ao mesmo tempo que eu.
— Seja bem-vinda, Emily. Como está? — Seu sorriso animado
realmente me fez sentir bem-vinda. — Ansiosa com o primeiro dia?
— Estou bem, obrigada. Um pouco ansiosa sim, não vou
negar.
A empresa, além de segurança online, também fornecia
segurança pessoal, serviço de guarda-costas e alguns detetives.
Quando Barbara me apresentou a Owen, meus olhos quase
saltaram da cabeça e fiquei vermelha pela reação que tive à sua
beleza.
O homem era alto, forte, musculoso, um rosto marcado por
cicatrizes que o deixavam ainda mais bonito. Com um jeitinho
selvagem. Mas seu sorriso com covinhas lhe dava o ar de ursinho
assustador meio fofo. Foi muito simpático e brincalhão, ele era chefe
da segurança do prédio e do CEO, fundador da empresa, que ainda
não conhecia.
Liam Logan Jones.
Eu não sabia quem era, não havia fotos dele na página
corporativa. Somente de algumas áreas comuns e fotos
profissionais, não dos funcionários. Era bom o quanto a empresa
prezava pela privacidade de quem trabalhava com eles.
Junto a Owen, entrei no elevador que levava à presidência.
Apenas cinco funcionários eram permitidos entrar ali, qualquer outro
precisava ser convidado através de liberação ou código. Não tinha
uma recepcionista no meu andar, justamente porque somente
pessoas convidadas estariam autorizadas a subir e era melhor estar
na minha mesa quando elas chegassem.
— Aqui está a sua sala. — Owen abriu uma porta de uma sala
espaçosa, com vista para a cidade e todos os prédios altos ao redor.
— Barbara já te deu um tour?
— Já sim, obrigada.
Owen me desejou boa sorte antes de sair para sua própria
sala. Na minha lista de tarefas, havia algumas coisas que
precisavam ser feitas antes da copeira ser autorizada subir. Ela
trazia café fresco, água quente, chás e tudo ficava organizado na
copa, que mais parecia uma sala de jantar de uma casa pomposa.
Meu trabalho era assegurar que ela não fizesse nenhum trajeto
além do elevador para a copa.
Dei uma espiada, tudo parecia limpo. Bárbara me disse que
Owen sempre ficava até mais tarde para a limpeza dos escritórios,
haviam informações confidenciais que não podiam ser roubadas.
Assinei um contrato que responsabilizava até a minha próxima
vida por todas as informações, tive meus antecedentes verificados e
como não era idiota, tinha noção que Owen sabia que eu tinha um
filho e quem era o pai dele, bastava fazer as contas.
Uma jovem senhora saiu do elevador com o uniforme da
empresa que vi em outros funcionários, mas o dela era todo azul ao
invés de todo preto.
— Bom dia, srta. Williams. Sou Marisa. — Ela tinha um sotaque
diferente, mas a sua aparência não lhe dizia nada sobre qualquer
origem.
— Muito prazer, Marisa.
Sem delongas, empurrou o carrinho até a sala da copa,
arrumando a jarra bonita de café, colocou várias embalagens para
as cápsulas das máquinas, como cappuccino e outros sabores.
Senti minha boca salivar, mas ainda não estava liberada para
cafeína. Era o que mais sentia falta enquanto estava grávida e então
amamentando. Usando uma cinta pós-parto, uma calcinha de
cintura alta, sutiã de amamentação e absorventes no seio, talvez
merecesse um café.
Ao invés disso, me concentrei no chá. Era o que podia tomar.
Marisa arrumou cookies que pareciam frescos, outros biscoitos
amanteigados e vários palitinhos de queijo. Pacotes de manteiga,
geleia, creme de avelã e besteiras que gente normal só come em
hotel quando se tem dinheiro para consumir o frigobar.
— Obrigada, Marisa. — Acompanhei-a de volta ao elevador.
Tomei café em casa e parecia uma criança, querendo comer
aquilo tudo. Aproveitei o tempinho e liguei o computador. Havia uma
letra de forma em um post-it. Estava um login e uma senha,
assinado por Owen. Ele trabalhava aos domingos também? Ou
deixou na sexta-feira? Digitei a senha e o computador ligou, não era
uma interface normal de um computador do Windows ou da Apple.
Era diferente, bem autoexplicativo, mas sabia que iria precisar de
prática.
Li os arquivos em cima, havia notas em todos eles, em uma
letra diferente que parecia masculina demais para ser de Barbara.
Talvez fosse do meu chefe e como ainda faltava uma hora para que
chegasse, segundo a rotina que fui informada, decidi seguir a lista e
cuidar das mensagens escritas nos documentos.
Enviei uma mensagem para minha mãe, para saber como meu
bebê estava e ela enviou uma foto dele de volta, só de fralda, no
trocador portátil que deixei com suas coisas. Voltei a me concentrar
no trabalho, sempre gostei de ouvir música enquanto digitava, mas
não sabia se era permitido. Precisava comprar fones de ouvido.
Um sinal suave, como uma campainha, soou e olhei para a tela
que ficava na mesa ao lado da minha, ela mostrava quem estava no
elevador. Dois homens de terno e gravata, altos, não dava para ver
o rosto. Qual dos dois seria meu novo chefe? Levantei, com as
mãos suadas e limpei na calça jeans. Fiquei de pé e parei em frente
a minha porta, esperando-os.
Por que está tremendo, Emily? São só pessoas!
As portas deslizaram abertas e olhei para o mais alto. Ele
usava o cabelo raspado, estilo militar, olhos verdes impressionantes
e um rosto duro, forte, em uma cabeça gigante, bem equilibrada no
corpo também muito grande. Uma cicatriz no olho me lembrou o
Scar, de O Rei Leão. Seu tamanho indicava que malhava, era forte,
era possível ver o contorno dos músculos no terno, que
provavelmente foi feito sob medida.
Eu sabia que ele era Liam Logan Jones.
Ele não falou nada por uns segundos, até que esticou a mão.
— Seja bem-vinda, srta. Williams. — Sua mão era grande
comparada à minha e eu não era uma mulher pequena. — Sou Liam
Jones.
— É um prazer conhecê-lo, sr. Jones. Espero que possamos
fazer um bom trabalho juntos. — Minha voz até saiu firme,
considerando que estava nervosa e meus seios vazando leite.
Estava muito molhada. Minha blusa estava molhada? Fiquei lutando
para não olhar, com vontade de conferir.
— Também espero.
E foi isso. Sem apresentar o outro homem, saiu em passos
firmes para seu escritório e fechou a porta. Eu deveria perguntar se
ele tinha expectativas? Pedidos? Algo a dizer? Respirei fundo,
conferi minha roupa no banheiro e troquei os absorventes, secando
onde molhou com leite. Ainda não precisava trocar de blusa antes
que cheirasse como uma vaca ambulante.
Voltando para minha mesa, verifiquei as mensagens da minha
mãe, garantindo que meu bebê estava bem. Meu chefe ficou dentro
de sua sala por horas e eu trabalhei nos arquivos, arrumando-os em
ordem. Achei um aplicativo no sistema onde podia dar baixa em
uma lista de tarefas colocadas para serem executadas no mesmo
dia.
O outro homem alto saiu da sala e me deu um sorriso.
— Olá, srta. Williams. Meu não tão educado irmão não me
apresentou. Sou Frank Jones, não trabalho aqui, mas estou quase
sempre aqui. Meu escritório é do outro lado da rua. — Esticou a
mão e apertei, sorrindo. Ele tinha um fortíssimo sotaque britânico. —
Espero que ele não te faça sair correndo.
— Srta. Williams? — A voz potente do meu chefe me fez
pular. Não tive tempo de responder o irmão, indo até a porta de seu
escritório e parei. — Vou almoçar no meu escritório hoje, Barbara
deve ter uma lista de comidas que gosto e os restaurantes. Pode
pedir qualquer coisa que seja de um desses restaurantes, dentro da
lista dos pratos que como.
— É claro, só um minuto.
Encontrei o que Barbara descreveu como agenda da comida e
havia uma série de restaurantes, pratos e o que ele costumava
comer em cada refeição. Imaginei que um simples sanduíche não
alimentaria um homem daquele tamanho, então, pedi uma refeição
completa com bife, batatas, salada de feijão e pães. Estava listado
que ele não bebia refrigerantes, somente cerveja preta, comum,
suco de fruta natural sem açúcar e chá. Então, o suco de laranja foi
a bebida escolhida.
O restaurante me garantiu que entregaria em trinta minutos.
Minha mãe informou que chegaria em quinze, bem, ela poderia
esperar. Ele listou o pedido do almoço como uma tarefa depois que
falou comigo. Achei desnecessário, mas não reclamei. Talvez fosse
para não esquecer, já que ele tinha um compromisso logo depois.
Quando o almoço chegou, arrumei tudo no prato ao invés das
embalagens, não coloquei gelo diretamente no copo e sim em um
pequeno balde que encontrei nos itens da cozinha.
— Não precisa me servir ou levar até a sala — ele disse e pulei
assustada, sem tê-lo ouvido se aproximar. Como um homem
enorme podia ser tão silencioso? — A copa foi criada para isso.
Pode almoçar também. Trouxe sua comida ou vai pedir?
— Trouxe um sanduíche, mas vou precisar descer um pouco.
— Fique à vontade, é seu horário de almoço.
Dispensada.
Sorri e sai da sala, pegando apenas meu telefone e o crachá
que me daria acesso de volta. Desci e encontrei minha mãe dentro
do carro, do outro lado da rua, em um estacionamento. Entrei no
banco de trás, pegando meu menino no colo e o enchi de beijos.
Seu cheirinho estava tão bom! Minha mãe o vestiu com um
macacão jeans, pequenos tênis all-star e uma blusinha branca de
gola.
— Esperei o suficiente para que você pudesse amamentar
bastante. Ele é um doce, se comportou como um rapaz.
Meus seios estavam doloridos demais, enquanto ele mamava
em um peito, usei a bomba em outro e ao mesmo tempo, comi o
sanduíche de carne que minha mãe preparou. Samuel mamou tanto
que acabou dormindo e já estava na hora de voltar para o trabalho.
A pediatra pediu para mantermos essa rotina pelo menos até os três
meses, para que ele ficasse exclusivamente com meu leite, depois
poderíamos inserir o suplemento.
— Muito obrigada, mãe. Até às seis horas estarei em casa.
— Não corra, estaremos bem.
Voltei para minha sala, escovei os dentes e passei fio dental
para não ter nenhum indício do meu almoço nos dentes. Lavei as
mãos e hidratei. Conferi a copa e estava tudo limpo, louça lavada e
no relatório de entrada e saída, ninguém entrou pelo elevador ou
escada. Meu chefe era um homem educado e lavou a própria louça,
graças a Deus.
Seu compromisso das treze horas chegou cinco minutos mais
cedo. Ofereci café, água ou chá, mas o homem estava mais
interessado em elogiar o fato de que havia uma carne nova no
pedaço.
— Posso imaginar que a outra senhora fosse muito eficiente,
mas faz bem aos clientes ver algo mais jovem — ele disse e o olhei
impassível por um bom tempo, continuei encarando-o até que
desviou o olhar, percebendo que não havia gostado.
— O sr. Jones irá atendê-lo em breve. — Minha voz saiu fria e
não adocei com um sorriso, apenas o encarei e voltei para minha
mesa.
Meu chefe chamou seu convidado, me dando um olhar
estranho antes de fechar a porta. Ele não me pediu para entrar e
tomar notas, ainda bem, mais uma piadinha do cliente assanhado e
eu iria enfiar a caneta em seus olhos. Voltei a me concentrar nas
tarefas, eliminando todas elas com toda certeza até às quatro horas.
Quatro e quinze, meu chefe abriu a porta e o cliente saiu sem
nem olhar na minha direção, encarando o chão. Liam me deu mais
um olhar e voltou para dentro. Ele era sempre sem palavras? Não
sabia se isso era bom ou ruim. Ainda estava considerando. Quando
meu horário encerrou, o próprio sistema me avisou e apareceu uma
mensagem vinda dele, dizendo que estava liberada para ir.
Ele sequer sairia da sala para fazer algum comentário sobre
meu primeiro dia?
Agradeci, reuni minhas coisas e fiz o procedimento para fechar
os aplicativos e desligar o computador. Owen apareceu para me
dizer tchau e perguntar como foi, disse que tudo era uma novidade
ainda, mas estava gostando muito. Com um sorriso, entrei no
elevador e saí no lobby lotado de funcionários não só da mesma
empresa que a minha, como de outras do prédio, saindo em
grandes massas.
Ao entrar no carro, fechei a porta e chorei.
Teria que aguentar aquilo todos os dias.

 

CAPÍTULO TRÊS
Liam
— Ninguém pode substituir Bárbara — reclamei pela milésima
vez no caminho para o trabalho. O idiota do meu irmão riu. — Como
a sua mãe pode ter feito isso comigo?
— Da última vez que verifiquei, ela é sua mãe também. —
Frank estava sorrindo e eu bufei, me concentrando no trânsito.
— Eu deveria demiti-la por ajudar Bárbara e agir pelas minhas
costas.
— Demita Owen também — Frank retrucou e bufei. Não podia
demitir meu melhor amigo, porra. E ele sabia, era por isso que fazia
essas coisas irritantes. — Qual o problema de ter uma nova
assistente? Teve duas semanas para se acostumar com a ideia de
que vai ter uma bela assistente no lugar da Barbara brigando com
você.
Bela poderia mesmo definir Emily Williams. Eu não fiz a
verificação de antecedentes, apenas li o relatório que Owen me
encaminhou, o que basicamente dava no mesmo. Ele era tão
meticuloso quanto eu em relação aos nossos funcionários. Emily era
formada em jornalismo, escrevia colunas sobre relacionamentos e
respondia comentários dos leitores online. Também era pósgraduada em comunicação online, marketing digital e tinha as
melhores notas em comunicação verbal.
Era exatamente o que necessitava como assistente. Nem
sempre era bom com as palavras, precisava de alguém criativo e
gentil para atender novos clientes comigo. Fiquei curioso pelo
motivo que deixou Toronto para voltar a Chicago, mas, Owen listou
que sua família morava na cidade.
Estacionei o carro no subsolo do prédio, nas vagas privativas
dos últimos andares. Nós também alugamos o estacionamento do
outro lado da rua para os funcionários dos outros andares. Somente
convidados e quem trabalhava na presidência tinha acesso ao
estacionamento, por questões de segurança.
Costumava não ter um horário fixo para chegar à empresa e
tinha certeza que Bárbara não passou essa informação. Ela sabia
que não era uma boa dizer que eu não mantinha uma rotina, além
do mais, antes de sair de casa, passei um bom tempo assistindo
minha nova assistente seguir os protocolos deixados por minha
antiga assistente.
Ela era realmente bonita, seu cabelo estava diferente da foto
do relatório. Era alta, corpo bem definido, curvas generosas nos
lugares certos e uma postura ereta. Não parecia ser o tipo de
mulher que aceitaria qualquer besteira nos ombros, não sem lutar
antes. Sempre que estava prestes a encontrar uma mulher bonita,
me sentia nervoso.
Não me considerava um homem bonito, não com todas as
marcas no meu rosto, lembrete constante de tudo que vivi na
guerra. Elas eram profundas e se um dia já não me achava o mais
atraente devido ao meu tamanho e personalidade, realmente não
havia mais nada. Não que ela estivesse ali para me admirar, as
mulheres que me relacionava eram pagas para não reclamar e não
fazer uma expressão de horror.
Todas elas saíam fodidamente satisfeitas depois que deixavam
a merda do preconceito de lado.
Emily me recebeu de pé, parecia nervosa, o olhar observador
correndo por todo lado e positivamente, não fez nenhuma
expressão. Ela me olhou curiosa, atenta, querendo ser profissional e
me agradar ao mesmo tempo. Pessoalmente, sua beleza me deixou
tímido e eu não tinha esse tipo de reação com nenhuma mulher. Até
a voz era excitante, o perfume era gostoso e definitivamente, uma
visão mais agradável que Barbara andando atrás de mim.
Sem saber como reagir, nem lembrei de apresentar meu irmão
idiota, que sabia que eu estava afetado por ela. Passei direto para
minha sala e me escondi a manhã inteira, apenas observando-a
trabalhar, falar sozinha, estalar os dedos e fazer dancinhas
animadas quando finalizava uma tarefa listada no sistema.
Sua escrita era perfeita, não havia meio erro de ortografia e eu
nem era bom naquilo. Na hora do almoço, meu irmão foi embora
para seu caro escritório do outro lado da rua, onde trabalhava como
advogado. Se formou depois de muita luta e reabilitações no
caminho. Era muito bom no que fazia, só teimoso feito uma mula.
Emily pediu meu almoço favorito, nada de sanduíche com pão
integral, que Barbara me fazia comer. Carne e batatas era a melhor
refeição. E foi melhor ainda vê-la inclinada sobre a mesa, decorando
uma bandeja como se eu tivesse em um maldito hotel. Me recriminei
por olhar para sua bunda, era totalmente errado, assediador e
antiprofissional, mas eu era um homem de sangue muito quente e
uma boa bunda me chamava a atenção.
Emily saiu para almoçar e assim seguiram-se todos os dias,
por duas semanas. Ela nunca ficava no escritório. Era março, o
tempo estava melhor lá fora, começando a ficar ameno, era até um
bom momento para comer no parque. Não sabia se conhecia
alguém no prédio ou ia encontrar com algum namorado, amigo ou
familiar. Não havia nenhum relacionamento listado no relatório,
então, era provável que não tivesse um.
Eu estava tão curioso, que quase pedi para que um dos meus
caras a seguisse, mas seria inaceitável, considerando que não havia
motivos para desconfiar das suas atitudes.
Emily bateu na minha porta em uma tarde de sexta-feira.
— Está tudo pronto para a reunião da equipe na sala de
conferências — anunciou, enfiando as mãos no bolso da calça. —
Só estou esperando os bolinhos que encomendei para o lanche.
— Não tem problema. Eles precisam chegar até o final da
reunião. — Levantei e vesti meu terno, sem perder seu olhar
hipnotizado nos meus movimentos. Fechei o botão, pegando celular,
chaves do carro e carteira. Dei a ela. — Segure para mim, sairemos
para a reunião do centro logo após, estaremos de volta antes das
quatro e meia da tarde. Ou posso deixá-la em sua casa.
— Meu carro fica no estacionamento, só me deixar na entrada.
— Pegou suas pastas e me seguiu para o elevador. Era uma tortura
ficar com ela em um ambiente fechado. Seu cheiro era floral,
feminino e gostoso. Tinha vontade de enfiar o rosto em seu pescoço
e ali ficar.
Emily não era o tipo de mulher tagarela. Comigo, falava apenas
o necessário. Com Owen e meu irmão Frank, costumava conversar
bastante, sempre rindo e brincando. Meu irmão dizia que ela tinha
um humor meio pateta.
Uns dias atrás, não resisti e ativei o som das câmeras de sua
sala. Ela estava cantando Happy do Pharrel Williams e ao mesmo
tempo se incentivava a não errar meu discurso em um evento que
eu atenderia no final de semana. Ela repetia em voz alta quando
soava bom e cantava uns trechos da música, fazendo movimentos
divertidos na cadeira.
Se alguém me perguntasse se eu conhecia uma pessoa oposta
a mim, eu apontaria diretamente na direção de Emily.
A sala de conferências estava lotada com a maior parte dos
nossos funcionários, todos ruidosos, aguardando a reunião mensal
de balanço e participação de lucros. Às vezes até sorteava alguns
eletrônicos entre eles, para manter o espírito esportivo. Me disseram
que era bom manter funcionários felizes, reduzia a margem de
erros. Não era bom com pessoas e os evitava ao máximo, mas
Owen odiava falar em público e como eu era o dono, me via sendo o
único obrigado a estar ali.
Minha avó brincava que era meu jeito irlandês que espantava
os funcionários, mas eu não podia fugir das minhas raízes.
Emily estava andando atrás de mim e devido à quantidade de
cabeças girando esperando-a passar, parei e fiz sinal para ir à
minha frente. Sem entender, passou por mim e subiu no palco. Meu
corpo protegeu a visão de sua bunda inclinada na escada íngreme.
Ofereci minha mão, algo que nunca fazia, somente com a minha
avó, e ela aceitou, agradeceu, terminou de subir e sentou no canto,
me deixando livre para começar o show.
Tirei a lista de assuntos que ela escreveu do bolso e comecei a
falar, ler e observar as reações. No final, quando os lanches foram
servidos e a maioria comia e bebia no local, Owen me puxou para
uma conversa chata com um dos nossos gerentes da qual ele
provavelmente não queria sofrer sozinho. De longe, a observei ser
abordada por diversos funcionários enquanto verificava se os copos
precisavam de reposição.
— Você quer um babador? — Owen me provocou.
— Vai se foder.
O idiota riu e sai de perto, sinalizando para ela que era hora de
irmos. Emily verificou o celular cinco vezes somente no elevador,
parecia esperar uma mensagem e bateu o pé impaciente, sem nem
se dar conta. Mordeu o lábio, até que sorriu, respirou aliviada e
enfiou o telefone no bolso. Eu era um cara observador, mas ela
aguçava a minha curiosidade várias vezes. Ao mesmo tempo, era
estranho que eu também não tinha vontade de mandar alguém me
dar as informações de sua vida por completo.
Sentia vontade de desvendá-la pedaço por pedaço.
Saímos no estacionamento e destravei o alarme do meu carro
algumas vagas à frente. Seus saltos ecoaram no piso liso.
— Uau, seu carro é enorme! — Soltou e cobriu a boca. Quase
ri de sua reação. — Me desculpa. Isso foi inapropriado!
— Ele é grande, sim. Em um carro comum os meus joelhos
batem na frente e incomodam. — Abri sua porta. Ela ficou parada,
olhando, tentando entender como subir. — Pé no estribo, mão no
suporte e pronto. — Orientei e me vi morrendo por segurá-la pela
cintura, mas seria um toque errado.
Dei a volta e entrei, dando vida ao motor.
— Realmente legal. Nunca vi um desses.
— É um Land Rover meio personalizado — retruquei e reparei
que não havia outro carro no estacionamento, considerando que
Owen estava de carona comigo. — Onde está seu carro? —
questionei, querendo saber se ela mentiu ou se não queria uma
carona para casa.
Emily me olhou confusa por um instante e mordeu o lábio.
— Está no outro estacionamento.
— Você pode colocar o carro aqui, não tem problema. Uma das
vagas é para minha assistente — expliquei e ela assentiu,
respondendo que não sabia, por isso colocava no outro.
Em silêncio, seguimos para um restaurante onde um cliente
estava fazendo uma pequena confraternização. Nós fornecíamos a
segurança online e física da empresa, ele era um dos mais antigos e
apenas por esse motivo eu estava comparecendo ao evento. Claro,
tentaria captar novos clientes, já que ele sempre me dava boas
indicações. A única coisa que me estressava profundamente era a
sua esposa, vinte e cinco anos mais jovem, o tipo que chamo de
mulher produto.
— Você pode anotar possíveis clientes e telefones por mim?
Não consigo digitar tão rápido quanto gostaria nesses telefones —
pedi a Emily e lhe entreguei meu telefone.
— É claro. Tem bastante gente, não é? — Ela soou um pouco
nervosa com a multidão.
— Sempre tem — resmunguei, um pouco irritado ao ver tantas
pessoas em um espaço pequeno. O corpo de bombeiro distribuiria
multas com felicidade ao ver o local. Acenei para alguns dos meus
seguranças, que estavam prestando serviço para a empresa e fui
cumprimentado por conhecidos. Apresentei Emily a quem parou
para falar. — Droga.
— Liam Jones! — Tiffany Thompson agarrou meu braço com
suas unhas, arrastando, achando que aquela atitude era tão sexy
quanto seu decote, que ia até o umbigo, em um vestido vermelho
justo e curto. Nada contra, ela poderia usar o que quisesse, mas
poderia também me deixar em paz.
— Sra. Thompson — cumprimentei-a de forma seca e tentei
puxar meu braço. Para uma mulher pequena, ela tinha força.
Lambendo os lábios, me olhou de cima a baixo, esfregando os seios
duros no meu bíceps. — Como vai?
Meu desconforto aumentou e dei um passo para trás.
— Que lugar lindo! — Emily se pendurou no meu braço e me
deu um olhar engraçado, visivelmente estava tentando me salvar de
Tiffany. — Quem é você? — questionou, brava, olhando diretamente
para a mulher do meu lado e depois para a mão dela no meu braço.
— Sua amiga?
— Não. Ela é a esposa do Sr. Thompson — respondi, preso
entre as duas. Tiffany tirou a mão, dando um sorriso para Emily.
— Não sabia que estava acompanhado, Liam. Nos vemos por
aí — Tiffany disse. Ela era do tipo que não desistia fácil, então
apenas continuei olhando, sem esboçar nenhuma reação e encarei
Emily, que parecia reunir todas as forças para não rir.
— Nem uma palavra sobre isso — grunhi. Owen faria a festa
com essa informação.
O evento em si foi bem chato e ao mesmo tempo, bom o
suficiente para ter algumas reuniões com clientes de alto escalão.
Na volta, Emily comentou sobre minha agenda e reforçou onde
estava o discurso do evento em que iria sozinho. Apesar de querer
sua companhia, ela não precisava ir e eu não pediria tão em cima
da hora.
— Bom final de semana, sr. Jones. — Emily desceu do meu
carro. — Estarei com meu telefone se desejar de algo, até segunda.
Ela parecia super ansiosa para ir embora. Segurando a bolsa,
chamou o elevador e saiu com um último aceno. Enviei uma
mensagem para Owen e o aguardei no carro. Meu amigo desceu
com suas coisas, assobiando. Ele estava no modo irritante desde
cedo, quando me fez atravessar a cidade para buscá-lo em sua
casa só porque o carro havia quebrado.
Ele sabia que eu odiava bancar o motorista.
— E aí, sobreviveu, bolas azuis? — Jogou sua mochila no
banco de trás.
— Não sei do que está falando.
— Tudo bem, vou parar de te encher sobre a Williams hoje. —
Sorriu torto, o que significava que ele voltaria nesse assunto na
segunda-feira. — E como está a sra. Thompson?
— Ainda mais inconveniente. — Decidi mudar de assunto ao
voltar a dirigir. — Temos algumas novas reuniões importantes,
inclusive, com o secretário da marinha. Acho que deveria estar
presente.
— Tudo bem. Frank está querendo fazer um churrasco
domingo.
— Estarei lá, basta dizer o horário.
Depois de deixá-lo na casa que dividia com meu irmão, em um
bairro residencial agradável, voltei para o centro. Entrei em casa e o
silêncio me saudou, como era comum todos os dias. Não havia
ninguém me esperando, apenas a minha avó aparecia para encher
a geladeira com comida e a funcionária para fazer a limpeza. Peguei
uma cerveja no refrigerador, tirei o terno e me joguei no sofá,
bebendo e olhando para o nada. A solidão era triste, mas
necessária.
Um homem como eu, nasceu para ser só.
Com mais de trinta anos, cheio de cicatrizes no rosto,
pesadelos que nunca passavam e obcecado pelo meu trabalho por
não ter alguém para preencher meus dias, mal conseguia manter
um relacionamento.
Nunca existiu uma mulher na minha vida, nenhuma namorada
a longo prazo antes da Marinha e muito menos depois. Minha mãe
nos deixou para cair no mundo e voltou anos depois, com o rabinho
entre as pernas, pedindo ajuda, então, dei-lhe um emprego. Fui
criado pela minha avó na Inglaterra e quando ela veio para Chicago
cuidar do irmão, Frank veio atrás e em seguida, eu também decidi
estabelecer minha vida aqui. Vovó foi a mulher que não desistiu de
nós, nem nos momentos mais difíceis.
Quando eu era jovem, pensei sobre ser feliz, ter uma família.
E aí, eu cresci e a realidade do homem que me tornei mostrava
que seria algo impossível.
CAPÍTULO QUATRO
Liam
Sábado era um dia que normalmente me ocupava trabalhando.
Meu irmão e meu amigo estariam fazendo um churrasco na casa
deles, por isso, apenas malhei por quase toda manhã na academia
do meu prédio e próximo à hora do almoço, me arrumei para sair.
Comprei um fardo de cerveja e dirigi para o lado da cidade que eles
moravam. No caminho, acabei preso em um breve engarrafamento
na frente do bairro que lembrava o que cresci na Inglaterra.
Não estruturalmente. O estilo e a energia. Era um bairro
simples, antigamente, segundo os antigos, era um local tranquilo.
Ao se tornar perigoso, passou a ter muitos conflitos com a
organização criminosa predominante e só de estar ali, doeu meu
estômago.
Quando mais jovem, viver naquele meio era tudo que pensava
que um dia faria. Me envolver com os encrenqueiros, assumir a
ordem de uma rua, vender drogas pelos becos e ter meu próprio
grupo de prostitutas para gerenciar. Foi assim com meu pai, foi
assim que as pessoas da escola queriam que nós fôssemos e era
assim que um homem aparentemente sem futuro como eu aceitaria
viver.
Até que um dia, meu irmão teve uma overdose na minha frente.
Tudo que vivia ali caiu em mim como um peso. Eu não usava
drogas, mal bebia muito, mas andava com os garotos, gostava de
ordem e segurança. Para mim, não havia outra vida fora dali, até
que no meu último dia na escola, um grupo de marinheiros levou
uns panfletos sobre como se alistar e assim, eu realmente pensei
que fosse a minha oportunidade.
Meu irmão estava internado pela primeira vez na clínica de
reabilitação. E eu fui para a Marinha, deixando a minha avó sozinha
pela primeira vez em anos. Com o passar do tempo, conheci Owen
e ele se tornou meu parceiro. Em uma missão secreta, conheci
Justin e Simon[4]
. Owen ficou trabalhando na inteligência, enquanto
eu me aventurava pelo mundo. Antes da minha última missão, voltei
para o mesmo agrupamento.
Fui chamado para proteger dois príncipes com Justin e Simon.
Era para ser um trabalho simples, levar, proteger, participar das
filmagens, voltar e entregar os dois herdeiros de coroas inteiros.
Não foi bem assim. Tudo explodiu. Foi um banho de sangue e eu
ganhei as cicatrizes no meu rosto.
Owen sempre foi nerd, ele queria trabalhar com computadores,
mas o pai não deixou, querendo que seguisse a carreira militar
como todos os homens da família. Nós andamos juntos por anos e
nesse meio tempo, consegui ajudar meu irmão e minha avó
financeiramente. O garoto entrou para a faculdade, teve um monte
de recaídas, mas venceu e estava sóbrio há dois anos.
Com o dinheiro que ganhei, criei minha empresa, investindo
em uma equipe de segurança e depois em Owen, que criou todos
os nossos algoritmos de segurança online. Ele não quis a
sociedade, porque não queria nada além de uma participação e
poder fazer o que bem entendesse. Nós crescemos muito ao longo
dos anos, treinamos nossos homens, investimos em melhorias e
estávamos acompanhando o avanço da tecnologia.
Se um dia alguém me dissesse que sairia daquele bairro,
me tornaria um homem muito rico e conseguiria ajudar outras
crianças a ter um futuro diferente, eu não acreditaria. Era grato
pelas mudanças da vida. Consegui dar uma ótima casa a minha
avó, com um jardim que sempre sonhou. Ela fazia atividades ao ar
livre com amigas, viajava em grupo e jogava bingo na igreja toda
quarta-feira.
Minha mãe vivia em um apartamento no centro. Não falava
muito com ela, não éramos próximos, porém, não neguei ajuda
quando precisou. Dei-lhe um emprego com muitos benefícios, mais
que qualquer um dos funcionários. Ela nos abandonou e sumiu no
mundo, recentemente, soube que estávamos em Chicago e se
aproximou. Ela era apenas a mulher que me deu à luz.
Estacionei o carro na frente da casa e já podia ouvir a música
alta que estava tocando nos fundos. Desci com a cerveja, acenei
para alguns vizinhos no caminho e atravessei pela sala, falando com
os funcionários da empresa que foram convidados. Owen era muito
mais sociável que eu.
— Olá, meu menino! — Vovó andou na minha direção e me
abraçou. Tinha metade do meu tamanho e uma força gigantesca. —
Como você está, minha criança? — Acariciou meu rosto.
— Estou bem, vovó. E a senhora?
— Perfeita. Fiz aquela salada de batata que tanto ama e sua
mãe trouxe o molho que adorava quando criança.
— Estranho que ela lembre algo que goste — murmurei e
minha avó ficou quieta. Ela tentava me fazer ser amigo da filha,
mesmo sabendo que não era tão simples assim. — Vou falar com o
pessoal, se cuida, minha coroa.
Owen e Frank estavam na churrasqueira, com cerveja e
acompanhados de outros grandes caras que trabalhavam conosco,
também ex-militares. Guardei as cervejas no refrigerador, peguei
uma gelada e bebi. Eles estavam falando sobre o jogo da noite
anterior, que assisti sozinho e xinguei feito um louco.
— Oi, chefe! — Laila, uma das assistentes da gerência,
passou e me deu um sorriso. — Como está?
— Muito bem e você?
— Também. — Ela continuou sorrindo. Hum, deveria dizer
mais alguma coisa? Felizmente, ela saiu alegre e foi falar com outra
pessoa.
Owen parou do meu lado, olhando para o gramado cheio.
Ele era um filho da puta cheio da grana, porque a família tinha muito
dinheiro. Mas escolheu viver em outro país, começando do zero,
para ajudar Frank em sua empreitada de ajudar os meninos no
bairro.
— Convidei Emily e ela infelizmente tinha um compromisso —
comentou do nada e ignorei por fora, por dentro, me perguntei
porque estava decepcionado que ela não estava ali. — Ela tem sido
uma boa adição para nossa equipe.
— Faz um bom trabalho. — Encolhi os ombros, sem cair em
seu assunto. Ele me pegou olhando-a várias vezes e sabia que
ficava vigiando-a trabalhar pelo meu controle de câmera. — Vocês
convidaram muitos funcionários, parece uma festa de
confraternização.
— Você é o único a não ter amigos.
— Ah, sinto muito. Pensei que tivesse amigos o suficiente. —
Dei um gole na minha cerveja.
— Não custa nada ser amigável. E eu convidei só os que
gosto, não tem nem dez funcionários aqui.
— Não gosto de misturar as coisas.
— Tá certo. Então, se você não gosta de misturar as coisas e
eu sim, posso chamar Emily para sair?
Resolvi que estava bom de churrasco pra mim. Deixei Owen
sozinho. Tinha certeza que estava rindo atrás de mim. Me despedi
da minha avó e voltei para o meu carro, dirigindo pela cidade. Parei
em um shopping para comprar uns livros novos, não havia nada de
novo para ler em casa. Frank me deu um kindle e não me acostumei
à leitura digital. Gostava de ler antes de dormir.
Minha avó sempre lia pra mim quando criança e era uma das
poucas lembranças boas que tinha da minha infância.
Selecionei cinco títulos de suspense e fui para a fila,
carregando-os nos braços e mexendo no celular, me estressando
por acabar apertando as teclas erradas. Não importava o quão
grande colocasse as letras. De repente, fui abatido nos joelhos.
Uma garotinha estava agarrada às minhas pernas, rindo.
— Sophie! — Um rapaz correu atrás dela. — Ele não é o
papai, garota. — E a pegou no colo. — Me desculpe, senhor. Ela
achou que era o papai. Ele usa calças camufladas também.
— Está tudo bem, tomem cuidado.
Eram duas crianças, ele não devia passar dos doze anos de
idade e já estava com a irmã pequena em um shopping cheio.
A garotinha me soprou um beijo pelo ombro do irmão e sorri.
Normalmente crianças não chegavam muito perto de mim, a cicatriz
que cortava minha sobrancelha até abaixo do olho assustava um
pouco. Tinha outra no queixo e algumas pequenas nas bochechas.
Ao voltar para casa, guardei os livros, comi o que deveria ter
comido no churrasco e limpei a cozinha.
Poderia ir a um clube que estava acostumado para
conseguir sexo e diversão, mas, eu tinha um compromisso cedo. Iria
discursar em uma universidade privada sobre segurança online e
Emily passou a semana inteira trabalhando na minha apresentação,
criando slides, separando em tópicos e bolando algo criativo.
Deitei na cama, sozinho, olhando para a televisão sem
realmente prestar atenção. Meu telefone vibrou com algumas
mensagens do trabalho e foi a distração perfeita, me ocupar com
atualizações do sistema e alguns problemas a serem resolvidos,
mas não urgentes. Foi o suficiente para a hora passar e pegar no
sono.
Domingo amanheceu ensolarado, meu despertador tocou e
as persianas subiram sozinhas para deixar a luz entrar. Me estiquei
na cama, com sono e no meu celular havia uma mensagem de
Emily, desejando boa sorte e que se precisasse dela em alguma
coisa no discurso, poderia ligar. Era o primeiro material criado por
ela que usaria, talvez estivesse nervosa.
Me arrumei e tomei café na rua, chegando à universidade
com tempo para conversar com o reitor e alguns professores. A sala
de conferências da universidade estava lotada de rostos jovens,
novas mentes procurando seus caminhos no mundo.
O discurso era leve. Emily colocou piadas sutis e conselhos
sobre cyber bullying, compartilhamento ilegal de conteúdos de
direito autoral privado, fotos nuas e outras coisas bem comuns entre
jovens. Alguns riram, outros fizeram anotações o tempo inteiro e no
final, havia mais mãos que pudesse computar querendo fazer
perguntas.
Bárbara seguia meu jeito direto e simples de fazer um
discurso, Emily me deu a chance de ver que podia fazer ainda mais.
No final do evento, fui abordado por vários alunos desejando saber
mais como funcionava a segurança online e foi gratificante ser
referência.
Aceitei o convite da reitoria para almoçar e fomos a uma
churrascaria. Normalmente não aceitaria, mas estava animado e me
dei o direito de socializar um pouco. A conversa girou sobre o
mesmo tema da conferência, como a universidade era privada, não
custava nada causar uma boa impressão para ganhar um grande
cliente.
Ao final do dia, carregava a sensação de ter feito um bom
trabalho e meu dedo pairou sobre o nome de Emily na minha
agenda. Queria enviar uma mensagem. Dizer-lhe qualquer coisa
que a fizesse rir e brincar comigo como brincava com os demais,
para deixá-la menos nervosa ao meu redor. Ao invés de lhe dizer
algo espirituoso, agradeci o discurso.
Ela me respondeu quase ao mesmo tempo, provavelmente
estava com o telefone na mão.
“Imagino que foi tudo bem. Lembro quando era universitária e
passava por essas palestras”.
Eu continuei o assunto.
“Havia muitos deles e fizeram perguntas interessantes no final.
Ganhará um café especial”.
Logo os três pontinhos que indicava que ela estava digitando
uma resposta apareceram, parei no sinal, ansioso para ler o que
viria a seguir.
“Isso é ótimo. Estou feliz e satisfeita. Aceito agradecimento em
forma de chocolate quente. Estou dando um tempo da
cafeína”.
Sorri para seu atrevimento inocente. Ela estava flertando ou
somente criando uma amizade? Seja como fosse, não reprimiria
aquilo. Não pude responder imediatamente, porque precisava seguir
com meu carro até o meu apartamento. Entrei em casa e me joguei
no sofá, pegando meu telefone, ansioso para respondê-la:
“Chocolate quente será”.
O domingo pareceu se arrastar após a troca de mensagens.
Talvez porque estivesse ansioso para estar no escritório e ver a
reação dela com o chocolate quente e várias coisas gostosas junto,
em forma de agradecimento. Decidi mergulhar no trabalho,
analisando relatórios e verificando o funcionamento do sistema da
empresa.
De manhã cedo, malhei por duas horas e me preparei para o
trabalho. Parei em uma lanchonete no caminho, pedi um chocolate
quente, cookies, bolinhos e um pedaço de torta. A menina do balcão
parecia jovem demais para ser atendente, ela sorriu e embalou tudo
em uma caixa rosa com a logomarca em cima. Deixei o lugar me
sentindo um idiota, considerei deixar de lado e ignorar, mas ao
mesmo tempo, queria ver o rosto de Emily ao receber a caixa.
Ainda bem que não precisava dividir meu elevador com
ninguém.
Assim que as portas abriram, Emily estava em sua mesa e
ergueu o olhar para me ver entrar. De sua sala, não era
necessariamente obrigada a levantar para minha chegada, mas ela
fazia mesmo assim. Sorridente, esticou as mãos.
— Sinto cheiro de chocolate!
— E se não for para você? — brinquei e ela fez um beicinho
que quase me deixou de joelhos. — Tudo bem. É para você.
— Eu amo chocolates. Quase não posso comer mais. —
Abriu a caixa em cima da mesa e quase pedi que fizesse aquilo na
copa. Não gostava de comida perto dos equipamentos. — Eu vou
comer um bolinho com chocolate quente e a sua bebida?
— Só bebo café. — Ela foi animada para a copa, enchendo
um copo térmico de café preto, puro e sem açúcar. Ao me entregar,
me olhou com expectativa. Emily queria que comesse um bolinho
também. Peguei um e ela pegou outro, mordendo.
— Como foi seu final de semana? — perguntou, fazendo
assunto, com as longas pernas balançando de seu lugar na mesa.
— Apenas trabalho e você?
— Fiz tarefas de casa, sabe? Limpeza, lavagem de roupa,
almoço e tudo mais. Nada muito divertido. — Deu outra mordida e
soltou um gemidinho de satisfação que meu pau reagiu
imediatamente. — Isso é muito bom, que gostoso. Onde é esse
lugar? Perdi muito dos lugares aqui no tempo que estive fora.
— É aqui na rua, virando a esquina. Por que Toronto?
Emily me deu um olhar cauteloso, como se eu soubesse
daquela resposta. Eu fazia verificações de antecedentes e histórico,
não exatamente os motivos pessoais.
— Fui para faculdade lá, falar francês, inglês, espanhol e
estudar. Acabei conseguindo um emprego depois que me formei, fui
ficando, até que senti que era necessário voltar e ficar perto da
minha família. Estão todos aqui e apesar de Toronto não ser tão
longe, os via muito pouco — explicou e bebeu o chocolate,
lambendo os lábios. Meu olhar acompanhou o movimento de sua
língua, limpando as gotas.
— Eu entendo perfeitamente.
— Obrigada pelo café da manhã. — Ela desceu da mesa. —
Vou ter bolinhos para comer o dia inteiro. E ah, coloquei um monte
de pastas em cima da sua mesa. Tem muitos recados no sistema
que são para você. Inclusive, um gerente solicitou uma reunião. —
disse, já no modo de trabalho, enquanto meu olhar lutava para não
descer para sua bunda.
Comecei a trabalhar, bastante satisfeito com os
acontecimentos da manhã e ao contrário dos últimos dias, deixei a
porta aberta. Do meu lugar, podia ouvi-la cantar baixinho e bater o
pé no ritmo da música, brigar com a impressora e digitar tão rápido
que parecia impossível. Na hora do almoço, ela saiu ansiosa, mal
olhando para trás e me senti intrigado, doido para saber o que
realmente a fazia correr feito louca para o estacionamento e ficar lá.
Pensei em convidá-la para almoçar, usaria a desculpa
verdadeira que Barbara almoçava comigo — apenas porque ela
trazia seu almoço e usava a copa ao mesmo tempo. Queria
conhecê-la. Olívia, esposa do meu amigo, só tinha boas coisas a
dizer sobre Emily. Minha nova assistente me intrigava, chamava
atenção e o jeito que me olhava, me fazia pensar que podia
enxergar além da minha aparência.
Quando voltou, parecia feliz e cheirava a talco de bebê.
— Seu almoço não chegou ainda?
— Sim e já comi. Sou um rapaz grandinho e sei limpar minhas
coisas. — Pisquei e ela riu.
Nem pude acreditar que pisquei para uma garota. Que coisa
adolescente de fazer…
— Bom saber disso. — Sorriu de seu jeito brilhante e foi
para a mesa.
Owen se aproximou, assobiando pelo corredor, com as
mãos enfiadas nos bolsos e por alguns segundos senti certo medo
dele realmente convidar Emily para sair. Brincando com ela, a fez rir
diversas vezes, mas não a fez sorrir como ela sorria para mim, isso
queria dizer algo, certo? Odiava me sentir um idiota inseguro.
— O que é isso piscando nas telas? — Emily soltou um
gritinho meio alarmada e me vi distraído, sem ver que havia um
alerta no sistema informando que um dos nossos clientes estava
sofrendo uma tentativa de invasão. — O que devo fazer?
— Está tudo bem, é comigo. — Owen voltou para sua sala e
me deu um olhar engraçado, sabendo que não fiz alarde porque
estava prestando atenção neles.
— Como sabe que tem alguém invadindo o sistema do
nosso cliente? — Emily apareceu na porta da minha sala, com as
mãos na cintura. — Isso é tão tecnológico!
— Vem aqui, posso te explicar.
Ela parou ao meu lado e inclinou-se um pouco para ver a tela.
Seu cheiro me deixou em alerta pela milésima vez no dia. O que
realmente podia fazer para ter um pouco de resistência contra ela?
Ignorando todos os meus pensamentos maliciosos, comecei a
explicar o passo a passo dos alertas importantes do sistema,
mesmo que não fosse trabalho dela cuidar daquilo.
Eu só queria ficar perto dela.

CAPÍTULO CINCO
Emily
— Eu realmente não sei como um bebê tão pequeno pode
sujar tanta roupa! — reclamei ao dobrar uma infinidade de roupinhas
de Samuel. Com dois meses e duas semanas, estava um pouco
mais diferente de um recém-nascido, mas ainda era pequeno e
frágil, ao mesmo tempo, estava crescendo e perdendo roupas na
velocidade da luz.
Deitado no meio da cama, meu menino gorgolejou em
resposta, sacudindo as pernas e me olhando. Aproveitei o momento
que não estava exigente para simplesmente adiantar as roupas que
trouxe da lavanderia. Era um sábado de sol, com vento frio, por isso
não saí com ele para passear. Limpei a casa, fiz comida e fui lavar
roupa. Era uma rotina meio corrida, por isso tirava os domingos para
dormir e descansar.
Ainda sentia muita culpa em deixá-lo com minha mãe todos
os dias, mas ele já não chorava tanto. Jenna disse que era normal,
meus hormônios ainda estavam confusos, passei por um bocado
emocionalmente no último ano e enfrentando sozinha o que muita
gente não dava conta acompanhada. Se não fosse por minha
família e minha melhor amiga com seu marido, não sabia o que
seria de mim.
Estava amando meu trabalho e gostando de me sentir útil. Ser
assistente do CEO era uma posição importante, considerando que a
minha palavra e atitudes refletiam muito nos outros andares. Liam
estava mais sociável, mais calmo comigo e às vezes chegava a
pensar que estava flertando, sendo brincalhão. Depois do episódio
do chocolate e da aula muito importante sobre o sistema, onde até
descobri que fazia coisas erradas e ele corrigia, parecia que
encontramos um acordo.
Ainda o olhava mais do que deveria, mas um homem gostoso
daquele não podia andar por aí assim. Quer dizer, eu o toquei uma
única vez, quando o salvei da esposa predadora de seu cliente.
Aquele braço musculoso podia erguer um carro. Eu tive imagens
mentais pervertidas e nada profissionais. Olívia riu e disse para
culpar os hormônios.
Minha brincadeirinha de pedir um chocolate quente como
agradecimento parece ter quebrado o gelo. Não consegui entendêlo ao todo, parecia difícil e temperamental em alguns momentos do
dia. Tinha um ar de homem perigoso, que observava demais e jeito
de durão, ao mesmo tempo, sentia que me olhava com um jeito
mais terno.
— Mamãe terminou por aqui. Vamos assistir um pouco de
televisão e ficar com os pés para o alto? Amanhã nós iremos
almoçar com a vovó e teremos um dia cheio — conversei com meu
menino cheiroso. Beijei sua barriguinha gostosa e dei umas
mordidinhas em suas dobrinhas. Ah, como o amava!
Tirei umas fotografias com o celular, registrando o momento
e enviei para meus amigos e família. Senti vontade de enviar à
Dylan e desisti, não seria bom para nós manter contato. Ele estava
casado e precisava se dedicar à família. Samuel era só meu.
— Eu estou chegando com um pouco de vinho. — Jenna me
ligou uma hora mais tarde. — Sei que você não pode beber, mas eu
sim. Também estou levando um suco de uva integral, só para não se
sentir de fora.
— E as crianças?
— O pai está levando para jogar bola no parque e depois para
lanchar. É a noite dos meninos e a mamãe vai ter a noite das
meninas com a Tia Emily! — cantarolou e sorri, senti muita falta dela
quando estava longe.
— Estou te esperando. Vou deixar a sua entrada autorizada.
Basta subir — respondi e encerrei a chamada, olhando para Samuel
quieto, mamando. Ele era um bezerro, quantas vezes oferecesse o
peito, ele aceitava. Não podia sentir meu cheiro, que choramingava
querendo mamar. Minha mãe dizia que ele dava uma segurada
maior quando eu estava longe.
Não reclamava, porque passávamos o dia inteiro longe e à
noite fazia comida e cuidava um pouco dele, da casa e de mim. Um
pouco maior, dormia mais horas, na verdade, só acordava por volta
das três da manhã e depois ia direto até a hora de sairmos.
Jenna chegou e eu estava no mesmo lugar, olhando para o
rostinho perfeito de Samuel, acordado. Ela abriu o vinho, serviu em
uma taça e em outra serviu o suco. Trouxe para minha mesa de
centro vários frios, amendoins e besteiras que eu não podia comer
ou daria cólicas ao meu filho. Fiquei com os palitos de cenoura
mesmo.
Nós conversamos por horas, ela até trocou a fralda de Samuel
pra mim e arrulhou com ele, fazendo-o rir. Depois que foi embora,
era tarde, estava cansada e Samuel mamou mais um pouco, quase
nada, só fazendo meu peito de chupeta para dormir.
Nunca tive coragem de deixá-lo no outro quarto, todo
arrumadinho e decorado com dinossauros, ele dormia no berço
portátil, ao lado da minha cama. Não estava acostumado a dormir
comigo, sempre tive medo de rolar no colchão ou sufocá-lo. Liguei o
ar para deixar o quarto fresco.
Entrei no chuveiro e tomei banho, vigiando Samuel no
bercinho. Ele dormia pesado, então, podia relaxar e me lavar direito
para dormir limpinha, sem cheiro de leite no corpo. Coloquei um
pijama limpo, com sutiã, sem calcinha, deitei na cama e meu
telefone tocou. O nome de Dylan na tela me surpreendeu. Ponderei
em atender mas no fim, deslizei a tela.
— Oi, Dylan — falei bem baixinho. — Aconteceu alguma
coisa?
— Preciso ver você. Ver vocês. — Sua voz era um sussurro
rouco, como se estivesse chorando. Provavelmente estava no meio
de uma crise existencial. — Sinto saudades, sinto tanto sua falta.
— Sente minha falta? Você casou com outra mulher dez
meses depois.
— Eu precisava de uma esposa. Não é amor, só amo você,
quero segurá-lo de novo.
— Nós não somos um brinquedo. Não sou um brinquedo e um
segredinho sujo. Minha resposta é não, Dylan. Não estrague as
coisas agora, já foi muito difícil pra mim…
— É meu direito vê-lo, ele é meu filho!
— Você abriu mão dele!
— Você não me quis! Não queria mudar por mim e me
perdoar! É sua culpa!
— Eu não tenho que mudar por você! Você me bateu, Dylan!
Não podemos nos ver.
— Vou cortar todos os pagamentos até que me deixe ver
meu filho! — berrou. Estava completamente louco se achava que
eu iria ceder sua chantagem por causa de dinheiro.
— Adeus, Dylan — sussurrei e encerrei a chamada,
bloqueando o número logo em seguida. Meu coração estava
acelerado no peito. A dor do nosso término e toda decisão que veio
a seguir, de ser mãe solo e desaparecer da vida dos Mitchell bateu
como uma onda forte, me arrastando a um mar de lágrimas que
precisavam ser silenciosas ou meu filho teria o sono interrompido.
Meu travesseiro estava molhado e na mamada do meio da
noite, minha cabeça explodindo. Samuel mamando, de olhos
fechados, sugando meu seio e segurando meu dedo foi o melhor
calmante e o melhor jeito de curar um coração partido. Quando ele
voltou a dormir, também me entreguei ao sono.
De manhã cedo, ele acordou aos berros, até me assustei.
Levantei correndo para olhá-lo e se contorcia, chorando. Disse pra
mim mesma que não havia motivo para pânico… ainda. Consegui
acalmá-lo meia hora depois, massageando sua barriguinha, que
estava bem dura. Como havia parado de chorar, deixei-o no meio da
minha cama e fui arrumando a bolsa para passarmos o dia com
minha mãe.
Soltando um gritinho, de repente, apenas senti o cheiro antes
de ver a cagada. Havia bosta por todo lado. Samuel simplesmente
evacuou o equivalente a dez crianças. Sujou as cobertas, toda a
roupa, a barriga e o cheiro não era maravilhoso. Gemendo,
esfreguei meu rosto e o olhei rir, provavelmente aliviado de colocar
aquilo tudo para fora.
Levei duas horas para conseguir limpar tudo e precisei deixar
as janelas abertas. Também precisei parar para amamentá-lo e com
isso, foi impossível chegar a tempo de tomar café da manhã com
meus irmãos. Pelo menos chegaria a tempo do almoço, meu pai
certamente faria um churrasco.
Rindo da minha desastrosa manhã cheia de cocô, dirigi até a
casa dos meus pais. Lembrei da primeira vez que a assistente social
me trouxe para casa. Era só um lar temporário enquanto meus pais
brigavam pela minha guarda na justiça. Eu não sabia disso. Era uma
criança que estava feliz de sair do orfanato e finalmente ter um lar.
Tinha lembranças maravilhosas, principalmente quando
meus irmãos chegaram. Minha mãe não podia ter filhos
naturalmente e então, adotou quatro crianças que precisavam de
pais amorosos e que se dedicaram a vida toda para nos dar o
melhor.
— Oi bebê! — Joseph pegou o bebê conforto e segurou
meu filho. — Lindão do tio!
— Oi, irmão. Estou bem, também. Incrível, quando o bebê
nasce, a mãe é ignorada. — impliquei com ninguém em particular, já
que meu irmão e a esposa Tullia estavam paparicando meu filho.
Cole me abraçou e em seguida sua esposa. Mamãe me deu seu
sorriso alegre, com os olhos castanhos brilhando de alegria.
Ela era uma mulher linda, de pele clara, cabelos crespos
que usava soltos, sempre cheios. Samuel adorava tentar agarrá-los
e às vezes conseguia. Meus sobrinhos estavam correndo no quintal
dos fundos, na piscina que foi construída apenas alguns anos atrás.
Quando éramos crianças, meu pai nos molhava com a mangueira e
colocava plásticos com sabão para escorregarmos.
Eu não podia ter uma família melhor.
— Eu cheguei! — Regina gritou da entrada e veio toda alegre.
— Essa pessoa aqui te convida para uma ida rápida ao shopping
quando Samuel dormir. — Ela me puxou para um abraço e lambeu
minha bochecha. Gritei de nojo. Minha irmã caçula era a criatura
mais irritante que eu conhecia.
— Somente se a mamãe puder olhar e não posso demorar,
ainda quero descansar hoje.
— Você é tão chata. Não vamos demorar, tenho um encontro
quente.
— Um encontro em pleno domingo? — Cole perguntou,
admirado.
— Qualquer dia é dia, amor. E se ele valer a pena, chegarei
com sono no trabalho — Regina disse e gememos. Joseph bufou,
irritado, ele tinha muito ciúme de todos nós. — Cadê meu velho?
— Ainda não o vi e nem tive tempo para perguntar, você
chegou gritando feito louca. Não tem modos! — brinquei e peguei
meu filho, limpando sua boca e beijando a cabecinha. Mamãe disse
que papai estava na rua, para comprar bananas e cerveja para os
meninos. — Vocês não sabem o que esse garoto aprontou comigo
hoje, enquanto fiquei aliviada que finalmente fez cocô, demorou
duas horas para ter tudo limpo. O apartamento ainda está fedendo!
— Isso aí, cara. Homens cagam com respeito! — Joseph
segurou o punho pequeno do meu filho e deu uma batida.
— Não enquanto a mamãe limpa a sua bunda.
Depois do almoço e com Samuel dormindo na cama dos meus
pais, entrei no carro da minha irmã, com sua direção maluca.
Pegamos Jenna no caminho e antes de chegarmos no
estacionamento, meus olhos estavam lacrimejando de lágrimas não
derramadas e minha barriga doendo de tanto rir da minha
desastrosa irmã contando o seu encontro com um amigo. Eles
estavam tentando fazer posições de ioga e sexo.
— É sério, algumas posições são complicadas, o pau
precisa ser bem grande para caber tudo e ainda manter o ritmo —
ela disse e estacionou de qualquer jeito em uma vaga. — Tenho que
comprar roupas íntimas novas, já usei todas as boas em primeiros
encontros.
— Você faz sexo em todos os seus primeiros encontros? —
Jenna perguntou ao sair do carro.
— Não me julgue, faço sexo quando estou a fim — Regina
respondeu com um sorriso insolente.
— Não estou julgando, apenas pensando que casei cedo
demais — Jenna murmurou e dessa vez, eu ri. — Não me entendam
mal, meu homem é um ótimo marido e pelo que ouço de outras
amigas casadas, ele é um cara incrível, não é egoísta na cama,
nunca foi. Só perdi essa coisa de me aventurar por aí.
— Sua vida já teve aventuras demais. — Acalmei sua
frustração, ligando meu braço ao dela.
Regina era doida, mas certa do que queria e logo estava com
suas compras. Eu acabei me empolgando, comprando novas
calcinhas e me olhando no espelho. Não tive estrias na barriga,
todas se concentraram na lateral e na bunda, não reclamava, foi
meu bebê quem me deu. Mesmo assim, estava com um corpo
bonito. Devido aos meus problemas emocionais, não engordei
muito, fiquei meio deprimida a maior parte da gravidez.
Meu humor voltou um pouco depois que ele nasceu, mas ainda
chorava à toa. Estava com mais bunda, mais peito e a pele mole da
barriga desapareceu. Não voltaria a ter o corpo que tinha antes de
Samuel e ao me ver com roupas íntimas sexy, percebi que não fazia
muita diferença. Comprei sutiãs de amamentação que eram tão
lindos que nem pareciam feitos para mães. Fiz um estoque deles, já
que havia longos meses pela frente com meus seios servindo de
refeição.
— Temos que fazer isso mais vezes. — Regina dançou na
minha frente.
— Com certeza iremos, eu amo vocês. — Abracei as duas.
Voltamos para casa dos nossos pais e peguei meu menino
gorgolejando no colo do meu pai. Me despedi da minha família, indo
para minha casa e iniciando nossa rotina noturna. Fiquei com
Samuel na sala, assistindo série, amamentando-o e comendo um
pouco de sopa de macarrão com legumes.
Na segunda bem cedinho, deixei meu bebê com minha mãe e
fui trabalhar. O lobby estava vazio e encontrei Owen, também
chegando cedo. Jogamos conversa fora no elevador e seu telefone
tocou, ele atendeu e acenou, indo direto para sua sala. Coloquei
minha bolsa na mesa, ligando meu computador e os outros
monitores.
Ainda faltava algum tempo para Marisa subir e reparei que a
porta da sala de Liam estava aberta. Iria verificar se estava tudo
limpo para sua chegada e parei surpresa ao vê-lo em sua mesa,
absorto na tela à sua frente, com uma caneta na mão.
— Oi, está tudo bem?
— Está sim. Apenas mergulhado em um projeto. Não consegui
dormir pensando nele e vim adiantar o que pude.
— Ao menos tomou café da manhã? Quer ajuda? Aprendo
rápido!
Liam me olhou de cima a baixo e senti um friozinho na
barriga, uma ansiedade diferente me bateu e mordi meu lábio,
esperando sua resposta. Com um suspiro, esfregou o rosto.
— Posso esperar Marisa chegar… e sim, aceito a sua ajuda.
Puxei a cadeira à sua frente. Ele me entregou dois arquivos.
— Preciso que grife os boletins de ocorrência que a empresa
registrou e quais falhas de segurança o relatório da polícia apontou
como causas. Em seguida, iremos elaborar um plano de segurança
que permita flexibilidade à empresa com os funcionários e ao
mesmo tempo manter os cofres seguros.
— Isso parece interessante. Como pensa em fazer isso?
— Planta baixa, alarmes, sensores, novos cofres e novos
esquemas de segurança física — respondeu e voltei a me
concentrar no documento, grifando. Quando olhei para ele, o flagrei
me olhando também. Nós desviamos o olhar ao mesmo tempo. —
Assim que terminar, tenho mais aqui — ofereceu como uma
desculpa por me olhar.
— Agora estou ansiosa para fazer parte disso. Parece simples
e não é. Emocionante — murmurei, fazendo conversa. Liam abriu
um sorriso, foi um pequeno, mal deu pra ver seus dentes e só esse
simples gesto me deixou encantada. Ele ficava lindo quando sorria.
Desviamos nossos olhares novamente e mordi a caneta, me
sentindo tão adolescente quanto nunca me senti antes. Era gostoso,
uma sensação privilegiada de ser secretamente admirada por um
cara, sem cantadas grotescas ou insinuações abertamente sexuais.
Os caras queriam nudes antes do primeiro beijo e depois de tudo
que passei com Dylan, precisava me sentir bem antes de qualquer
coisa.
Não queria dizer que seria com Liam, apenas era o meu novo
posicionamento sobre relacionamentos a partir do momento que
tinha um filho para servir de exemplo.
CAPÍTULO SEIS
Emily
Abril foi o mês que passou mais rápido em toda minha vida.
Desde que Liam aceitou minha ajuda com a criação de projetos,
passei a participar mais e ainda tinha a minha função como
assistente. Organizei a agenda para o mês seguinte, respondi
convites, participei de mais reuniões do que pude contabilizar e me
senti útil profissionalmente como nunca havia sentido antes.
Podia me considerar satisfeita e feliz pela primeira vez em
anos. Meu filho estava crescendo, saudável, começando a dormir
quase a noite inteira, ficando mais tempo acordado, interagindo com
o mundo e sorridente, como um bebê feliz e muito amado.
Infelizmente, nem tudo eram flores. Dylan realmente cortou o
pagamento que se comprometeu a dar e eu fiquei um pouco
apertada financeiramente.
Para piorar, meu carro quebrou e como era antigo, o conserto
ficou mais caro do que imaginava. Não havia nenhuma maneira que
pudesse dispor de dois mil dólares para mandar consertar.
Busquei conselho com meu pai. Ele analisou as contas e sua
expressão não parecia das melhores. Meu pai era um inventor, ele
ganhava bem o suficiente, mas não era e nunca foi rico. Seu sonho
era que uma de suas patentes finalmente valessem mais que
pagamentos mensais das empresas. Ele era muito bom.
— Não quero seu dinheiro, pai. Apenas seu conselho.
— Não entendo porquê você não quer aceitar ajuda.
— Mamãe sonha com esse cruzeiro há anos, não quero que
use o dinheiro da poupança comigo e nem que pegue um
empréstimo, sei que ainda estão pagando a faculdade da Regina. —
Empurrei o envelope com um cheque na sua direção.
— Isso é mais importante.
Ele tentou empurrar de volta e segurei sua mão.
— Pai, te amo, só preciso me virar sozinha. Tenho um filho,
não posso correr pra cá sempre que precisar. Não quero falhar, mas
se falhar, pode ter certeza que vou bater na sua porta pedindo
abrigo — disse e olhei no telefone. — Se vender o carro, poderei dar
entrada em outro, pagar algumas parcelas com meu salário, talvez
procure um apartamento menor. Samuel e eu podemos viver em um
de um quarto só. Existem muitas maneiras de economizar…
— Entendo. Se vender, como vai fazer para trazê-lo e ir
trabalhar?
— Pegar um táxi todos os dias de manhã pra cá, ir de ônibus
para o trabalho, voltar de ônibus e aceitar a generosa carona que
meu pai vai me oferecer até meu apartamento.
— Assim eu posso te ajudar, minha filha. Não coloque muita
pressão nos seus ombros, nem seja orgulhosa. Aceitar ajuda não é
uma fraqueza. — Ele segurou minhas mãos e sorri. — Vamos tentar
do seu jeito primeiro. Talvez você possa ficar com o carro da sua
mãe quando ela não precisar levar Samuel ao centro todos os dias.
— Tudo bem, obrigada.
Mesmo que houvesse uma solução a longo prazo, claramente
iria conseguir sair do enrolo financeiro, nem que isso significasse me
mudar. Seria um transtorno, sem sombra de dúvidas. Jenna estava
olhando um apartamento perto do trabalho dela, não era o bairro
mais seguro, mas seria uma economia de trezentos dólares. Poderia
facilmente me comprometer com a parcela de um carro através do
banco.
Fui trabalhar pensativa e um tanto desanimada.
— Procurando um novo apartamento? — Owen me assustou
enquanto olhava as fotos do local que planejava alugar, pensando
em como tornar as paredes manchadas de infiltração em algo mais
bonito.
— Estou precisando economizar — respondi, minimizando a
tela.
— Não estamos te pagando o suficiente? — ele brincou e
enfiou a mão no meu pote de balas de gomas, comendo quase
todas de uma vez.
— Claro que estão. Vendi meu carro, preciso comprar um
novo, mais confortável e mais seguro. — Divaguei e não entrei mais
no assunto. — Posso te ajudar em alguma coisa?
— Apenas perturbando, vou almoçar — respondeu e saiu.
Esfreguei meu rosto, estressada e preocupada, querendo
uma solução para aplacar minha crescente ansiedade. Massageei
minhas têmporas, dizendo para mim mesma que se colocasse boas
trancas, talvez um sistema de alarme e fizesse amizades, não
haveria perigo de morar em um prédio sem porteiros. Não podia
voltar para a casa dos meus pais. Precisava conseguir um aluguel
que me desse folga para pagar as contas, comprar um carro e fazer
uma poupança.
Porra, ser mãe solo era o cacete de um pesadelo!
— Está tudo bem, Emily? — Liam perguntou e levantei a
cabeça, amolecendo um pouco ao vê-lo tão bonito, na porta de seu
escritório, sem terno, só com a camisa e a gravata meio frouxa. Ele
ficava tão sexy de cinza.
— Apenas me distraí um pouco.
— Não está ouvindo suas musiquinhas hoje — comentou,
aproximando-se e parou na minha porta, encostando o ombro e
cruzando os tornozelos. — Nem estalando os dedos.
— Acho que não estou me sentindo muito bem. Nada demais.
Ele me deu um olhar avaliador.
— Precisa de alguma coisa? Algo que possa ajudar?
— Não é nada, apenas bobeira. Obrigada por se importar.
Liam me deu uma prévia de sorriso e voltou para sua sala.
Nas últimas semanas, ficamos cada vez mais próximos, tomávamos
café juntos todos os dias de manhã, conversando sobre besteira,
comida e até assei um bolo de banana com canela só porque ele
nunca havia provado. Ele implicava com meus chocolates quentes,
sem saber que eu babava pelo café preto dele todos os dias.
Ainda não havia contado da existência de Samuel, não menti
na minha entrevista, apenas ocultei a verdade porque não queria ser
tirada da seleção por ser mãe e solteira. O assunto nunca surgiu e
não queria que ele deixasse de estar próximo apenas porque eu
tinha um bebê. Por algum motivo, queria proteger Samuel e a mim
mesma de ser magoada por ser mãe solo.
Felizmente, passei o dia inteiro conseguindo disfarçar minha
preocupação e no fim do dia, me despedi dele e caminhei até o
ponto de ônibus mais próximo. Desci na esquina da minha mãe,
cansada, com os pés doendo e antes de entrar já pude ouvir o choro
de Samuel. Abri a porta correndo, jogando minha bolsa no sofá.
Meu pai e minha mãe tentavam acalmar o grito do meu filho.
— O que está acontecendo?
— Ele só está irritado e um pouco febril, nada demais.
— Mamãe chegou, meu amor. — Suspirei e peguei meu filho,
não chegava a estar com febre, apenas chorando. Algo estava
doendo, não sabia o que era. E com cuidado, dei-lhe peito,
acalmando-o. Jantei com meus pais, pensei até em dormir na casa
deles, mas quando Samuel ficou horas sem chorar, decidi ir para
casa.
Tudo parecia bem por um tempo, ele dormiu depois de mamar
por um tempão e quando deu duas da manhã, o choro começou
intenso novamente. Liguei para a clínica pediatra e me orientaram a
aferir a temperatura e depois seu ouvido. Parecia estar com dor no
ouvido. Mesmo com a medicação, a febre persistiu, seis horas da
manhã perdi a batalha contra o desespero e chamei um táxi, indo
para a emergência.
Nunca me senti tão desamparada e sozinha, em uma
emergência lotada com outras mães e crianças chorando. Vestia
uma calça jeans e minha blusa do pijama. A bolsa do bebê em um
ombro, com meus documentos todos misturados com as coisas
dele. Sentei para esperar, depois de retirar a senha e dar apenas o
nome no balcão de atendimento.
— Eu sei que está doendo, mamãe vai resolver, juro —
sussurrei para a cabecinha cabeluda do meu filho. Samuel estava
vermelho de tanto chorar, com o rostinho molhado, meu coração
doía. Por que não era o meu ouvido ao invés do dele?
Quarenta minutos depois, ele finalmente dormiu, mas eu sabia
que não estava sentindo-se bem, era exaustão. Fiquei vigiando sua
respiração, apenas com medo. Medo de tudo.
— Emily? — Virei e encarei Liam me olhando, com as mãos
enfiadas nos bolsos. — O que aconteceu?
— Meu bebê não está bem. — Minha voz saiu em um sussurro
embargado. Percebendo que faltava pouco para explodir em
lágrimas, respirei fundo.
— Seu bebê? — Ele parecia confuso e realmente, pudera, não
sabia da existência do meu filho. Não da minha boca, pelo menos.
Pensei que se soubesse por minha ficha, teria me falado.
— Esse é meu filho, Samuel. Como me encontrou? O que está
fazendo aqui?
— Você não apareceu, não atendia as ligações, então, rastreei
seu telefone. Fiquei preocupado.
— Me perdoa, não passou pela minha cabeça avisar, fiquei tão
nervosa e aqui está tão cheio! — Gesticulei e Samuel abriu os
olhos, chorando novamente. — Está tudo bem, amor da mamãe.
Logo seremos atendidos, faltam três pessoas na nossa frente.
— Está sozinha? E o seu marido? O pai do bebê? — Sua
confusão estava longe de terminar. Nós flertamos nas últimas
semanas e não falei absolutamente nada.
— Sou mãe solo, Liam. Não tem um papai e nem um marido
— respondi e olhei para o painel da senha, parado e as enfermeiras
agitadas na triagem.
Ele ficou me olhando e então, puxou minha bolsa para ajudar a
apoiar meu braço e empurrou o outro banco, elevando minhas
pernas, me acomodando com cuidado. Tirei uma toalha da bolsa,
abaixei minha blusa e abri o sutiã. Samuel não estava mamando,
mas aceitou o bico para ficar calmo.
Liam foi até o balcão, falou alguma coisa com a mulher que
lixava as unhas, ela logo deu um jeito de apertar as senhas e falou
ao telefone. Quem estava na minha frente entrou para a triagem.
Liam voltou, ofereceu a mão e me ajudou a levantar, pegando a
bolsa e me conduzindo para uma sala depois da área de triagem.
— Basta preencher esse documento e marcar no final a forma
de pagamento, me procura na recepção, uma enfermeira deve vir
aqui assim que possível — a recepcionista me disse.
— Eu o seguro para preencher. — Liam ofereceu e soltei
Samuel do peito, fechando minha roupa e passando-o para ele com
cuidado. Samuel resmungou um pouco, reclamando da troca e Liam
parecia que segurava uma boneca de porcelana, olhando fixamente
para meu filho. — Ele é lindo, Emily.
Meu coração encheu-se de orgulho.
— É sim, obrigada. Exceto quando solta umas bombas fedidas
e gritos de estremecer a parede — brinquei, toda boba e fui
preenchendo a ficha.
Fui à recepção entregar a prancheta, quando voltei, a
enfermeira estava lá. Ela deitou Samuel na cama, começou a
examiná-lo, falando suave. Cinco minutos depois, uma médica
sorridente chegou para nos atender e pegou meu bebê com maior
cuidado. Senti que estava pronta para arrancá-lo das mãos dela
caso chorasse ou fosse ruim. Liam colocou a mão no meu ombro,
com apoio e conforto.
— Vai ficar tudo bem, deixe a médica examinar — ele disse
baixinho e concordei, me afastando um pouco. Samuel soltou um
grito estridente e quase pulei fora, correndo com ele. Liam me
segurou, mantendo-me no lugar.
A simpática médica pediu para tomar cuidado com os banhos
por enquanto, era uma infecção no ouvido. Apenas externa, por isso
da febre baixa e que de fato ele não estava mamando com tanta
intensidade nas últimas horas. Com prescrição médica e uma
medicação tomada na hora, ele ficou calmo quase que
imediatamente e nós fomos liberados para casa.
— Ele parece tão pacífico agora. — Meditei ao vê-lo gorgolejar
e rir para mim. — Meu menininho, nada de aventuras no banho com
a vovó.
— Tem bons pulmões, achei que a janela ia quebrar com os
gritos dele — Liam brincou e pegou a bolsa do meu ombro. — Onde
está seu carro?
— Estou sem carro. Vou chamar um táxi. — Troquei Samuel
de braço. — Obrigada por ficar. Não precisava. — Tentei pegar a
bolsa de volta.
— Eu te levo em casa — disse educadamente e fiquei parada.
— Eu posso te pegar no colo, mesmo segurando o bebê e te colocar
no carro. Basta continuar aí. — Continuou e me movi, porque
acreditei em cada palavra. Liam não parecia do tipo que brincava e
lembrei do conselho do meu pai, em ser menos teimosa e aceitar
ajuda.
— Viu só, nós vamos para casa! — cantarolei para o meu filho
e segui Liam até seu carro no estacionamento. Ele abriu a porta de
trás e ao entrar, segurei-o com bastante cuidado, pois estava sem a
cadeirinha. Lembrei de avisar minha mãe, que já devia estar super
preocupada.
Ao pegar meu telefone, reparei que havia várias mensagens,
até Regina, que nunca se preocupava com nada, parecia
estressada. Contei no grupo da família que fui ao hospital, foi um
pandemônio, meu pai quase ficou irritado que não chamei ninguém
e levei o caminho inteiro para convencê-lo que estávamos bem e em
casa.
— Esqueci de avisar a minha família. — Estalei a língua. —
Agora estão todos agitados. Minha mãe toma conta dele quando
estou no trabalho, então, já estava ligando para a polícia — disse,
guardando meu telefone na bolsa. — Acho que não vou conseguir
trabalhar hoje…
— É claro que não. Está quase caindo e com os olhos
fundos. Não deve ter dormido muito, não é? — ele falou do banco
da frente.
— Samuel começou a chorar sem parar às duas da manhã.
Ainda ouço o choro ecoando no fundo da minha mente. — Suspirei
e me dei conta de que não precisei dizer meu endereço. Liam parou
certinho em frente ao meu prédio. — Obrigada mais uma vez.
— Vou subir — avisou e seu tom era definitivo. Ele nem
precisava argumentar, meu cérebro sequer reclamou. Culpava o
cansaço.
Carregando a bolsa e me ajudando a passar pelas portas, me
recriminei mentalmente que o apartamento estava meio zoneado,
pelo menos não havia lixo. Nem louça suja na pia.
— Vou deixar suas bolsas aqui e me dê ele para que possa
ajeitar as coisas e dormir um pouco.
Abri minha boca para argumentar e saiu um bocejo, cobri na
hora. Liam riu e esticou os grandes braços. Samuel soltou um
gritinho e abocanhou o nó da gravata dele, chupando sem nenhuma
vergonha e agarrou as golas, sacudindo as pernas. Liam riu,
acariciando-o e sua mão era tão grande que a cabeça do meu filho
desaparecia.
Senti uma coisa no meu coração em ver Samuel tão
confortável no colo de Liam. E o que mais mexia comigo era o olhar
dele, encantado, curioso e ao mesmo tempo, havia algo a mais que
não sabia identificar. Sorri pela primeira vez em horas.
Aproveitei para tomar banho, arrumar a cama, o berço e na
volta para a sala, encontrei Liam no sofá e meu filho rindo, tentando
agarrar seu nariz.
— Vou dormir um pouco com ele.
— Pode ir lá. Fica tranquila — Liam respondeu e meus olhos
estavam fechando. Peguei Samuel e deitei na minha cama, dando
de mamar e fazendo-o dormir ao mesmo tempo. Quando ele dormiu,
coloquei-o no berço e fechei meus olhos, apagando de vez.
A exaustão me dominou por horas, até que acordei assustada,
pensando que sequer havia levado Liam até a porta. Ofeguei e
quase enfartei ao ver que Samuel não estava no berço. Levantei
correndo, desesperada e cheguei na sala. Parei abruptamente com
a cena na que encontrei: Liam estava com seu computador ligado
em cima da minha mesinha, alguns papéis espalhados e meu filho
esticado em seu colo, com o punho na boca e parecendo divertido.
— Eu quase morri do coração agora. — Coloquei a mão no
peito.
— Ele chorou e você não acordou. Como continuou chorando
e eu fiquei meio sem saber o que fazer, achei melhor pegá-lo.
Me joguei no sofá do lado deles.
— Não foi embora?
— Acho que fiz bem em não ir embora. — Arqueou a
sobrancelha. Sim, ele tinha razão. — Comprei almoço. Aqueles
sanduíches integrais que você gosta, com carne e queijo.
Meu estômago roncou na hora, corei e ri. Samuel estava
estalando a boca com força, o que significava uma coisa: fome
daquelas. Me acomodei na poltrona com ele no colo, com sede,
esqueci de pegar água. Pedi a Liam, que voltou da cozinha com
sanduíche, suco, água e sobremesa.
— Isso tudo? Que maravilhoso, obrigada! — Sorri e peguei um
pedaço da carne, enfiando na boca. — Me desculpa por não ter
contado sobre o Samuel. Eu ainda me sinto muito insegura com
muitas coisas que o envolvem. Podemos conversar agora, o que
acha?
— Acho que é uma ótima ideia, sou todo ouvidos. Não precisa
se desculpar, eu entendo.
CAPÍTULO SETE
Liam
O bebê no colo da mãe mais bonita que já vi soltou um
resmungo e logo voltou a soltar sons de sucção.
Emily tem um filho.
Um bebezinho lindo, com olhos grandes e muitos cabelos na
cabeça. Eu nem sei como descrever a minha surpresa quando a vi
sentada na emergência do hospital, segurando uma criança
chorando e quase chorando junto. Minha mente ficou em branco,
porque não sabia e normalmente eu era o cara que sabia das
coisas.
Senti desconforto ao pensar que estive flertando com uma
mulher casada. Emily jamais pareceu ser esse tipo de mulher e
depois a minha raiva mudou ao entender que não havia um homem.
Como alguém podia deixar mulher e filho sozinhos? Mesmo que o
relacionamento acabasse, filho não é um bem a ser dividido no meio
ou deixado para trás.
Emily estava fora de sua zona, sem soar confiante, alegre ou
brincalhona. Seu olhar estava sem foco, cheio de lágrimas e
desespero. A emergência estava lotada, várias outras crianças
chorando e mães preocupadas, querendo ser atendidas. Fui até a
recepcionista entediada e apenas apontei o meu nome na parede e
mostrei minha identidade.
Minha empresa financiou a reforma da emergência e o diretor
colocou meu nome na parede, bastou minha identidade para que ela
diminuísse a fila.
Depois do passeio na emergência, Emily ficou tão aliviada
que estava dando longas piscadas, com a cabeça tombando no
banco e o bebê não parecia querer dormir. Trabalhando com Emily,
já sabia que era teimosa e não aceitava ajuda em praticamente
nada. Ela até carregava as caixas de folhas para não ter que me
pedir ou a Owen, o que é um completo absurdo.
Quando ela dormiu, encomendei um almoço que gostava, fui
até meu carro, peguei minhas coisas e voltei para sua sala. Ela
estava dormindo, o menino também, liguei o notebook e reli o
arquivo dela. Não havia nenhuma menção a um bebê ou um
relacionamento. Liguei para Owen, ele riu e disse que não queria
que a garota fosse demitida por ter um bebê e nenhum pai no jogo.
O idiota sabia que ela era mãe solteira e ocultou do relatório.
Era com o filho que Emily passava o horário do almoço,
alimentando-o no carro enquanto almoçava.
— Parece distraído… estou quase acabando — Emily disse,
apoiando o bebê nos ombros, parecendo querer fazer arrotar.
— Estou bem, tome seu tempo. Quantos meses ele tem?
— Três meses e meio. Agora é um menino grande, teve um
salto de crescimento há algumas semanas — disse orgulhosa e me
deu um sorriso. — Uma grande surpresa para você, não é? Não
escondi de maldade, só não estava preparada para ser mãe, de
repente, precisei sair do meu emprego, mudar de cidade, ter um
novo emprego e me virar sozinha com um bebê. Quando pensei em
contar, o progenitor cortou os pagamentos acordados e fiquei com
medo de ser demitida, não sei. Gostava dos nossos momentos, não
queria perder nada e por isso fui egoísta.
— Ele não pode simplesmente cortar os pagamentos…
— Sim, pode. Samuel não é registrado como filho dele, ele
abriu mão da paternidade, o bebê é apenas meu e de ninguém
mais, o acordo foi de boca, uma ajuda… — Suspirou e se ajeitou,
dando seu dedo pro garoto morder.
— Por que ele não quis ficar com o filho? — questionei,
tentando não julgar e pensar que ela era a outra mulher na vida de
um homem ou poderia ter sido enganada.
— Nós estávamos noivos. Namoramos por dois anos e
ficamos noivos, mas não estava tudo bem e a família dele era um
pesadelo. Apesar de o amar, não queria fazer parte daquilo, deixar
de ser eu mesma para me tornar um fantasma de braços dados com
ele — disse com um olhar distante. — O anel trouxe a realidade das
nossas diferenças. Eu vi que não podia literalmente me subjugar
para agradá-lo e posar do lado dele. Ele bebia muito, tomava
remédios controlados e aos poucos, foi ficando violento até que me
deixou inconsciente em um restaurante quando contei sobre o bebê.
Terminamos e eu já estava grávida, então, fechamos esse acordo. O
bebê seria meu, somente meu e precisaria me mudar para que não
descobrissem a existência dele. Os pagamentos eram uma ajuda
muito boa, por sinal.
— E por que ele cortou?
— Porque é um idiota. Casou com outra mulher dez meses
depois que terminamos, mas ficava chorando e dizendo que era
melhor para Samuel e apesar de concordar, o meu filho não é um
pacote que você olha e deixa de lado — retrucou e seu pescoço
ficou vermelho. — Eu concordo? Sim. Samuel merece ser amado e
cuidado, apoiado em suas escolhas. Coisa que a família dele não
faz. Enfim, me ligou algumas semanas atrás e decidi que não ia
ceder, ele ficou puto, gritando umas coisas e desliguei.
Um completo imbecil.
— Precisei vender meu carro, como era um modelo antigo,
algumas pessoas compram para restaurar e eu não tinha como
consertar mesmo. Também estou planejando me mudar, então, vou
economizar para um carro mais novo, melhor e mais seguro —
explicou e botou o bebê deitado no sofá, ele imediatamente gritou.
— Ele gosta de ficar no colo, minha mãe o segura o dia inteiro.
— Talvez não precise se mudar. No próximo mês ganhará a
participação dos lucros da empresa, é um valor de novos clientes
que divido com todos os funcionários, alguns mais do que os outros
e como você é o cargo abaixo de Owen, vai ser um bom dinheiro —
concluí e ela me olhou chocada.
— Você divide o valor com os funcionários?
— Uma parte, sim. A empresa só consegue fazer um bom
trabalho porque todos trabalham para isso, então, todos merecem
ganhar um pouco, não acha?
— Estamos falando de quanto?
— Depende das entradas. Por que você acha que o setor de
captação fica caçando clientes como cães? Eles ganham muito
bem.
Emily me deu um sorriso lindo.
— Isso é generoso.
— Como está indo ao trabalho agora? — Virei um pouco no
lugar e segurei o pezinho de Samuel, que batia na minha coxa
repetidamente. Ele riu e soltou um guincho, empurrando o pé de um
jeito desengonçado. — Você é um bagunceiro, garoto.
— Vou de ônibus. Levo ele de táxi até a casa dos meus pais
e depois pego o ônibus. — Ela me respondeu e levantou, foi até o
quarto e voltou carregando umas mudas de roupas e fraldas. — A
noite o meu pai nos traz de volta.
Emily começou a trocar o bebê com maestria, mesmo com
ele se mexendo para todo lado e rindo, empolgado com os beijos
que soprava na barriguinha. Ele agarrou o cabelo dela na mesma
força mortal que agarrou meu nariz enquanto ela dormia, como uma
pessoa em hibernação.
— Passo por aqui todos os dias de manhã. — Soltei. Eu
estava mentindo, porque meu apartamento era para o outro lado. —
Posso te pegar, não custa nada.
— Não precisa se preocupar. E eu preciso estar no trabalho
antes do meu chefe. — Emily me deu uma piscadinha e ri, ela sorriu
mais ainda. Sempre tinha aquela reação quando ria.
— Tenho certeza que seu chefe não está se importando. Ele
tem outro funcionário, que merece o castigo de estar lá bem cedo
todo dia a partir de amanhã — retruquei, pensando no quão puto
Owen iria ficar, mas não tinha problema, ele merecia. Ninguém
mandou mentir pra mim. — Te pego aqui, levamos o bebê para sua
mãe e depois vamos para o trabalho.
Seus olhos brilharam.
— Isso significa que estou perdoada?
— Não — respondi bem sério e o rosto dela ficou branco. —
Vai precisar fazer aquele bolo de banana de novo.
— Liam Jones pode ser brincalhão, quem diria. — Pegou o
bebê limpo e foi até o banheiro, jogando a fralda suja fora. Ela fazia
tudo tão rápido, tão simples e o neném chupando a pele de seu
ombro não parecia incomodar. Reuni minhas coisas, ela parecia
melhor e eu ainda precisava trabalhar um pouco de casa. —
Obrigada por tudo mais uma vez. Nos vemos amanhã.
— Tchau, Emily. Tchau, Samuel.
— Tchau, Liam. — Ela ergueu a mãozinha dele, acenando da
porta e fez uma voz de bebê. Ele riu e sacudiu as pernas,
empolgado com a brincadeira simples.
Dirigindo para casa, liguei para Owen e informei que ele
precisaria chegar mais cedo, para cobrir Emily. Ele ficou meio
irritado, mas sabia que era minha vingança por ter escondido
informações importantes de mim. Não disse a ele que iria buscá-la
todos os dias até conseguir comprar um carro.
Entrei em casa, desativando o alarme e jogando as chaves em
cima do balcão. Larguei minha pasta no sofá, surpreso com o dia
que tive. Quando iria imaginar? Quando cheguei no trabalho e ela
não estava lá, fiquei preocupado. Sabia que podia ser um simples
atraso. Não era comum, mas imprevistos aconteciam. Depois de um
tempo, decidi que olharia se o sinal de seu telefone estava em seu
apartamento.
Quando vi que estava no hospital, na área da emergência,
minha preocupação ganhou forma e tamanho. Nem pensei direito,
apenas peguei minhas coisas, voltei para o carro e fui atrás dela. Foi
impensado, impulsivo, ela poderia estar lá com um namorado, os
pais, qualquer pessoa. Disse pra mim mesmo que iria só olhar de
longe, saber o que estava acontecendo e ir embora.
Eu a reconheci toda bagunçada, balançando um bebê de
forma suave e sozinha. Fui até ela o mais rápido possível. Foi a
melhor coisa que fiz, o dia se desenvolveu da forma mais
surpreendente. Conheci outro lado, que me deixou encantado, com
um desejo repentino de cuidar dela.
E por que não poderia fazer isso?
Fiquei pensando sobre o ex-namorado. O quão idiota um
homem pode ser para abrir mão de um filho? Até entendia terminar
o relacionamento por diferenças. Mas um bebê? Se ele soubesse
que existiam homens que não podiam ter seus próprios bebês,
talvez não fizesse isso. Quando sofri o acidente, o médico disse que
não poderia ter filhos, devido à gravidade dos meus ferimentos.
Nunca pensei que um dia me afeiçoaria a uma mulher com um
bebê.
Quando fechava os olhos, pensava nela, rindo, brincando e
dançando pelo escritório quando achava que não estava vendo. Ela
me fazia rir. Ninguém me fazia rir. Com esse pensamento, sorrindo
feito um idiota pra mim mesmo, no escuro da minha casa, senti falta
do cheiro floral dela misturado ao cheirinho de bebê, os gritinhos
suaves e as perninhas me cutucando no sofá.
Liguei para meu irmão, ele atendeu no segundo toque.
— Seu idiota.
— Seu babaca.
Era o nosso olá usual.
— Você viu a vovó hoje? — questionei, esticando minhas
pernas à frente.
— A velha tem mais compromissos que nós dois juntos, fui lá
duas vezes, só falei pelo telefone. Margareth está te procurando —
comentou, sabendo que não gostava que ela me ligasse. — Contou
que não foi trabalhar hoje e nem a sua assistente, imaginei que
tiveram um dia de compromisso fora do escritório.
— Sim, reuniões com clientes e eram distantes do trabalho —
menti descaradamente.
Meu irmão não precisava saber que passei o dia inteiro no
apartamento da minha assistente com seu bebê pequeno.
— Quando você vai perdoá-la?
— Acho que nunca. Temos que falar sobre isso? Te liguei
para saber se está bem e se a vovó estava bem, nada mais. Vejo
você depois.
Recostei no sofá, fechando os olhos e me vi ansioso para o
dia seguinte.

CAPÍTULO OITO
Liam
Quatro da manhã, entrei na academia do meu prédio e
malhei até às seis horas. Perdi o sono, mas conseguia ficar com
cinco horas dormidas ou menos. Acordava com qualquer mínimo
sinal de barulho, herança do meu tempo na Marinha. Estava
ansioso, não só pelos novos contratos que seriam assinados no dia,
como também com o novo treinamento dos meus seguranças que
elaborei junto a Owen e finalmente estava pronto para execução.
Também estava muito ansioso para buscar Emily,
reencontrar seu pequeno bebê cheiroso e sorridente. Quem
imaginaria que gostaria tanto de uma criança apenas com um dia de
convivência? Estava curioso e encantado.
Depois de malhar, fui tomar banho e fiquei debaixo do
chuveiro, colocando minhas ideias em ordem.
Me esfreguei com xampu e sabonete, fazendo a barba,
escolhendo um terno escuro e camisa azul marinho, com a gravata
preta. Verifiquei minha pasta três vezes, todos os contratos
revisados e as notas coloridas que Emily espalhava pelos arquivos
respondidas. Chaves, carteira, celular e um carregador extra,
porque Owen sempre pegava o meu e desaparecia.
A manhã estava escura, era um dia nublado, o trânsito
estava tranquilo e não demorei mais de quinze minutos para
estacionar em frente ao prédio de Emily. Desci e a vi no saguão,
com o bebê em uma cadeirinha, uma bolsa marrom com vários
dinossauros desenhados e a sua bolsa de trabalho. Ela estava linda,
nem parecia a mesma mulher do dia anterior. Usava uma saia
apertada até os joelhos, saltos altos, uma blusa vermelha e um
terninho do mesmo tom escuro da saia.
Uma perfeita mulher de negócios.
— Bom dia, Liam. — Emily saiu do prédio e peguei as
bolsas. — Muito obrigada. — Ela sorriu e ergueu a cadeirinha.
Samuel estava acordado e franzindo os olhos, concentrado em seus
dedos. — A mão dele é uma descoberta todo dia.
— Bom dia, Emily. Ele passou a noite bem?
— Só ficou enjoadinho de madrugada. Dei a medicação e
dormiu novamente, indo direto até dez minutos atrás. E você? Ficou
bem? Perdi muita coisa do trabalho ontem? Avisei a minha mãe, vou
ficar até mais tarde e colocar tudo em ordem. — Ansiosa, me seguiu
para o carro. Coloquei as bolsas na frente e a ajudei a subir com o
bebê no banco de trás.
— Foi um dia atípico. Está tudo em ordem. Só tem
solicitações no sistema, nada que precise chegar tão tarde em casa.
O endereço da sua mãe?
— Não rastreou isso? — me provocou e senti meu rosto
quente. Droga. — Estou brincando e muito grata que me localizou
ontem. — Ela apertou meu ombro e ditou o endereço da sua mãe,
não era tão longe. Samuel soltou um grito. — Oi bebê.
— Ele parece animado — comentei, olhando o menino, que
segurava o pé e olhava pra mim e para a mãe conforme ouvia
nossas vozes.
— De manhã cedo tem energia de sobra. — Emily acariciou
o cabelinho arrepiado dele, que tentou agarrar o cordão dela. —
Meus pais brincam com ele o dia inteiro. Tenho vídeos lindos. Me
desculpe, sou o tipo de mãe que, às vezes, não consegue parar de
falar do filho.
— O tipo de mãe boa, acredite em mim, existem mães que não
pensam nos filhos — adicionei em tom ácido, com os olhos no
trânsito.
— Não o planejei e agora não posso viver sem.
Ao entrar no bairro que a mãe dela morava, me perguntei
como era crescer em um lugar pacífico, com boas escolas e boas
chances de um futuro saudável e profissionalmente bem sucedido.
Não era um bairro rico, mas havia casas que podiam ser
consideradas mansões no meu antigo bairro. Inclusive, a casa dos
pais dela era imensa, bonita, reformada, com um balanço de pneu
em uma árvore e brinquedos espalhados.
Emily abriu a porta sem me esperar fazer isso. Tirei as bolsas,
ajudei-a a levar para casa, mas não entrei. Voltei para o carro e
esperei, não era educado entrar na casa de uma família sem ser
convidado, ainda mais de manhã cedo, o momento em que as
pessoas ainda estão de pijama e tomando café da manhã.
Observei-a voltar para o carro e abri sua porta, ajudando-a a
entrar porque era alto e usava saltos. Emily agradeceu com seu
sorrisinho lindo e dei a volta, sabendo que a pequena mulher
espiando na janela era sua mãe.
Voltamos para o trânsito da cidade e eu estava perfeitamente
consciente dela do meu lado, com seu cheiro gostoso, as pernas
meio cruzadas, o braço apoiado no banco e tirando o iPad da bolsa.
Abriu alguma espécie de arquivo, com fotografias de alguns clientes
que receberíamos para uma reunião, para fechar contratos. Não
eram todos os clientes que precisavam estar presentes, tinha um
setor capacitado para isso. Quando eram contas com mais de
alguns zeros costumava tratar diretamente.
— Esse homem parece o sr. Cabeça de Batata. — Emily riu,
olhando para a foto do nosso primeiro cliente do dia. Espiei a foto do
sr. Turner. Olhei-a, sem entender. — Não sabe quem é o sr. Cabeça
de Batata? Toy Story? — questionou, como se eu fosse louco.
— Não faço ideia.
— Em que mundo você vive? — ela quase gritou, chocada e ri.
Se ela soubesse… — Quando chegarmos ao escritório, vou te
mostrar quem é. É um ótimo filme, bem divertido e eu chorei em
todos eles. Espero que Samuel adore tanto quanto eu. Espero
conseguir levá-lo à Disney ano que vem.
— Ano que vem ele ainda não terá um ano. — Continuei
confuso e ela riu mais ainda.
— Não sabe nada sobre inserir crianças ao mundo da Disney,
não é? Eu nunca fui, sempre quis ir, é mágico. Jenna, minha melhor
amiga, foi duas vezes com os filhos. Quero ir com Samuel! — Ela
continuava animada.
De onde essa mulher tirava energia?
— Não fui uma criança inserida ao mundo da Disney, gosto
de filmes de ação e suspense — retruquei e ela começou a listar
filmes do gênero que gostava e por questão, assisti todos, então,
tivemos um longo assunto sobre atores de ação.
Estacionei o carro na minha vaga usual, olhando para o de
Owen, todo torto. Ele chegou atrasado e sorri só de imaginar a
correria. Desde que Emily se familiarizou com a rotina e horário, ele
passou a dormir até tarde. Ninguém mandou me enrolar. Confiava a
minha vida nas mãos dele, esteve nos bons e nos maus momentos,
mas, como uma boa amizade, volta e meia a gente trocava
vinganças.
Emily ainda estava falando sobre filmes. Ela era uma coisinha
tagarela, gostava de ouvir a sua voz. Ao chegarmos no último andar,
deixou a bolsa no aparador e foi ligando os computadores. Entrei
em minha sala e deixei a pasta no canto.
Owen estava no refeitório, com um copo grande de café. Emily
estava quieta, montando seu prato com frutas, a máquina fazendo
chocolate quente e me perguntei se ele havia falado algo que ela
não gostou ou ao contrário. Enchi minha caneca com café preto sem
açúcar e sentei na frente dele, olhando-o.
— Falha minha, me desculpe — Owen resmungou e sorri. Ele
continuou. — Mas eu não estava errado.
— Mesmo assim… — disse olhando-o e revirou os olhos.
— O que os rapazes estão falando? — Emily sentou na outra
cadeira com sua comida. — Não comem nada? Sabia que faz muito
mal só beber café?
— Preciso de café — Owen resmungou, ainda de mal humor.
— Seu bebê está melhor?
— Está sim, obrigada. Você deve comer mesmo assim, precisa
colocar algo ou seu estômago vai ficar doendo.
— Sim, mamãe. — Owen pegou um prato e colocou um monte
de coisas aleatórias. — Satisfeita, querida?
— Só quando Liam começar também — ela disse, segurando
o garfo e me olhando intensamente, como se eu fosse levantar e
fazer o que estava pedindo, mas ela tinha o olhar, aquele que mães
costumam dar e causam uma coceira para fazer o que estão
mandando silenciosamente. Eu era um cara cínico por natureza e
minha mãe não estava por perto quando cresci, minha avó
costumava arremessar coisas. — Posso fazer isso o dia inteiro. —
Deu de ombros, debruçou e apoiou o queixo nas mãos.
— Tudo bem. — Suspirei e enchi um prato com ovos, bacon,
torrada e era melhor que não exigisse frutas também ou teríamos
sérios problemas.
— Não gosta de manga? — Furou a fatia de uma em um garfo e
me ofereceu. — Frutas fazem bem à saúde. Prove só um pedacinho
— insistiu e mordi a fruta, olhei para Owen e ele estava explodindo
em risos. — Cale-se, Owen. É a sua vez… que tal, mamão?
— Estou indo embora agora mesmo. — Owen saiu com prato
e café em mãos, diretamente para o seu escritório e se fechou lá
dentro.
— Qual o problema de um café da manhã saudável? — Ela
soou meio ofendida e continuei comendo, sem falar nada.
Quando terminamos de comer, limpamos a bagunça e cada
um foi para sua mesa. Dez minutos depois, ela me enviou um link
do youtube. Abri, meio sem entender e de repente, a cena de um
desenho infantil explodiu algo nos altos falantes e um boneco em
forma de batata surgiu, falando de forma rabugenta, brigando. Sua
esposa arrancava um dos olhos e tinha visões.
Que drogas essas pessoas usam?
Emily estava rindo de sua mesa. Ela era uma boba.
Quando o sr. Turner chegou, falando todo explosivo e
irritado com sua assistente por ela ter confundido o endereço, Emily
me deu um olhar que estava brilhando de diversão, porque
realmente, o cara parecia o personagem do desenho. Não gostei da
forma que falou com sua assistente e pedi que deixassem a questão
para depois, caminhando para a sala de reuniões.
— Eu disse que ele era o sr. Cabeça de Batata — sussurrou
no fim. — Irei levá-lo até o elevador. — Emily saiu com eles e meu
olhar caiu para sua bunda.
— Você está verificando a bunda da sua assistente? —
Owen perguntou e dei um soco em sua barriga, brincando. — Filho
da puta — gemeu e bateu no meu braço. Continuamos lutando um
com o outro.
— As crianças podem parar? Nosso próximo compromisso
está subindo. — Emily passou por nós com novas pastas para a
reunião. — Acho que precisamos de mais café. Vou ligar para a
copa. — Saiu mais uma vez e tentei não olhar em sua direção
enquanto Owen me analisava.
— Você gosta dela. — Não era uma pergunta. Ele continuou
me olhando. — Chame-a para um encontro, aproveite o momento
em que ela também parece gostar de você.
— Eu não sei do que está falando…
— Sabe sim.
Ela voltou com nosso compromisso seguinte e comecei a
reunião, deixando o assunto para depois.
— Estou indo almoçar, tudo bem? — Emily estava olhando
seu telefone, provavelmente ansiosa para ver seu bebê. Passei a
entender porque ela ficava pulando quando chegava a hora do
almoço.
— Pegue-o e suba, chame a sua mãe. Coma aqui com
calma, amamente ali na poltrona, não tem problema. — Ofereci e
seu olhar ampliou. — Não estou brincando. Pode ir lá pegar ele, não
precisa correr.
— Não. Está tudo bem, estou acostumada a gerenciar isso
lá no carro.
— Você é tão teimosa. Só estou falando para almoçar aqui,
por favor? Também quero vê-lo. Quando uma pessoa te oferece
algo, para ajudar, você sorri e agradece. É bem simples.
— Tudo bem, obrigada. — Sorriu e saiu para buscar
Samuel, voltando dez minutos depois, com ele nos braços e uma
bolsa. — Minha mãe aproveitou para ir ao banco. Acho que sou
muito egoísta, estou ocupando meus pais por completo. Talvez seja
melhor contratar uma babá.
— Olha só esse pequeno homem. — Owen esticou a mão
para pegar. — Posso?
Emily passou Samuel e foi inevitável sentir ciúme. Gostei de
segurá-lo. Samuel riu para as bobeiras e caretas de Owen e resolvi
me ocupar, esquentando nossos almoços e distribuindo nos pratos.
A comida de Emily era cheia de coisa verde, algo que deveria comer
e não comia. Era mais adepto a suplementos e vitaminas, do que a
comida saudável diretamente na refeição.
Servi no meu prato um monte de besteiras de comida chinesa.
Emily tentou comer, mas Samuel tinha outras ideias e começou a
ficar irritado, soltando gritos enfezados e agarrando a roupa dela.
— O que ele tem? — Owen perguntou, meio de boca cheia.
— Está querendo almoçar tanto quanto eu — ela respondeu,
olhando para o filho. — Tudo bem, mamãe vai te dar o que quer.
Levantei e ela ergueu o olhar, me acompanhando.
— Vem comigo? — Ofereci e peguei a bolsa dele, levando
para meu escritório. — Aqui vai ficar confortável no sofá. Fique à
vontade e tome seu tempo. Quer água?
— Eu aceito, obrigada. — Sorriu e sentou com ele, tirando
um tecido da bolsa e virei quando começou a abrir os botões,
fazendo malabarismo para segurá-lo querendo mamar a todo custo.
Entreguei sua água e lhe dei privacidade para ficar com o menino.
Felizmente, Owen não me provocou sobre minha rara
atitude em ser cuidadoso com uma mulher. Ele só me deu um
sorriso cheio de merda e voltou a comer. Emily voltou para onde
estávamos, com Samuel com a boca cheia de leite e rindo sozinho.
Ela voltou a tentar comer com uma mão só, lidando com a agitação
dele cheia de maestria.
— Deixe-me segurá-lo para comer com calma.
Emily me entregou o bebê, que riu pra mim e sorri de verdade
de volta. Ele soltou umas coisas com a boca, sons engraçados e
agarrou minhas orelhas. Tinha um aperto forte. Incrível. Owen pediu
licença e saiu, dizendo que iria comprar um doce decente e
perguntou se queríamos algo. Pedi balas de menta e Emily queria
balas de goma, em forma de ursinhos. Até os doces dela eram
excêntricos.
Ponderei sobre o conselho de Owen em chamá-la para um
encontro. Por que ela aceitaria sair comigo? Podia estar
confundindo tudo. Por que se interessaria por um homem cujo rosto
era marcado pela guerra e mal tinha uma noite de sono sem acordar
suando ou gritando, pensando que ainda estava no fodido combate?
Samuel guinchou com a minha cosquinha e reparei que Emily
estava me olhando tão intensamente que mal comia. Por que não
tentar? O que eu perderia em chamá-la para sair?
1 — A nossa crescente amizade;
2 — Seu companheirismo matinal;
3 — Seus lindos sorrisos.
Ordenei a mim mesmo deixar de ser covarde.
— Sábado terá um evento beneficente no State Park And
Harbor — comentei, olhando para Samuel e em seguida para Emily,
que mantinha um sorriso doce nos lábios e os olhos brilhando. —
Gostaria de ir comigo? Um dos clientes está organizando e
forneceremos a segurança.
— Eu adoraria — ela respondeu com um sorriso enorme e
senti um alívio no peito. — Tenho uma pergunta antes…
Meu alívio durou muito pouco.
— Faça, pode fazer.
— Será um evento de trabalho ou um encontro? — Apoiou o
cotovelo na mesa e o queixo nas mãos, me encarando com
expectativa.
— Um encontro — assumi e meu coração batia tão forte no
peito que me perguntei se, de repente, deixei de ter trinta e três
anos para ter treze. Considerando que nunca convidei uma mulher
para um encontro antes, apenas acontecia de sair com elas, era
realmente a minha primeira vez. — A não ser que não queira.
— Eu quero sim. Estou ansiosa para isso.
Éramos duas pessoas muito ansiosas para um encontro.
CAPÍTULO NOVE
Emily
O tão esperado sábado do meu encontro com Liam chegou na
velocidade da luz. Nós trabalhamos a semana inteira em um clima
bastante divertido e ameno, ele era uma pessoa bem adorável
comigo, nem sempre na companhia de outras pessoas. Apenas com
Owen e Frank que mostrava a mesma face. Eu também aprendi a
separar os momentos de brincadeira, de flerte e que ele estava
falando muito sério sobre o trabalho.
Depois que o repreendi na quinta-feira a tarde sobre bagunçar
minhas notas no sistema, ele também entendeu que eu não
brincava com meu trabalho. Owen me deu a oportunidade de
aprender a criar projetos no sistema, para execução dos outros
setores e eu amei vê-los crescer. Criei o correio amigo, um
compartilhamento secreto de boas mensagens e também uma ótima
maneira de Liam espiar seus funcionários.
O servidor da empresa também emitia alerta de e-mails
suspeitos, tentativas de invasão, trocas de senhas e era preciso ter
um cuidado extremamente excessivo com as informações, afinal,
prometíamos segurança aos clientes. As mensagens eram
criptografadas, nem Owen podia decifrar, uma vez que o cliente
decidia o que era altamente secreto.
Recebemos a visita do FBI querendo umas informações, eles
tinham um mandato, mas era impossível de decodificar. Liam ajudou
até onde podia, sem ferir as regras da empresa.
No final do mesmo dia que recebi o convite inesperado de
um encontro, Liam me disse que era para levar Samuel, porque
iríamos nos divertir os três. Enquanto queria muito ter um encontro
sozinha com ele, fiquei realmente encantada por incluir meu filho,
sabendo que eu só tinha os finais de semana para curtir meu bebê o
dia inteiro.
Decidi ditar o ritmo entre nós, desejava conhecê-lo em um
aspecto pessoal, que nem sempre dava no trabalho. Nós
conversávamos na hora do almoço, conhecemos nossos gostos
musicais e ele me exasperava por realmente não conhecer nenhum
filme divertido, nem os desenhos animados. Missão de vida era
mostrar o lado bom da vida.
Mesmo depois de uma semana muito boa, estava nervosa
como uma adolescente no primeiro baile.
— Você poderia parar? — Regina estava deitada no sofá
com meu filho no colo e eu andando pela casa de calcinha e sutiã,
catando tudo que poderia precisar em um dia no parque. Por que
sair com uma criança demandava tanta coisa?
— Estou nervosa. O que acha? — Apontei para dois
vestidos esticados na porta do banheiro da sala. — Acho que vou
com o floral, posso amamentar com facilidade e ficar bonita ao
mesmo tempo — concluí e minha irmã concordou.
— Ele é o mais bonito — ela disse e sorriu para o meu bebê.
— Não precisa ficar nervosa, o cara sabe que tem bagagem e
mandou levar junto. O que pode dar errado?
— Meus seios explodirem de leite e Samuel vomitar em
mim? Ou nele? Ficar fedendo a leite? Ou Samuel soltar aquela
super bomba de cocô? Existem muitas coisas que podem dar
errado, porra. Já era foda conseguir um encontro solteira, sem
barriga pós-parto e peitos explodindo, depois é quase impossível e
eu meio que gosto dele, quero que dê certo! — gritei para minha
irmã, que ao invés de me responder, apenas pegou o telefone e
apertou.
— Você precisa vir, não vou dar conta dela sozinha. Está
pirando, falando de cocô e leite, sei lá — falou com o telefone e
sabia que era para Jenna. — Traga sua chapinha e maquiagem,
tenho certeza que essa doida não tem nada além do básico.
— Fodam-se vocês! Eu tenho uma gaveta inteira de
maquiagem! — Continuei gritando e Samuel deitou a cabeça entre
os seios da minha irmã, rindo pra mim.
— Vai lavando o cabelo ou vamos nos atrasar. — Regina
mandou e corri para o chuveiro, não querendo que Liam chegasse e
tivesse que me esperar com a minha irmã louca no mesmo
ambiente. Regina iria assustá-lo.
Lavei meu cabelo e tomei um banho caprichado, depilando
tudo, não que ele fosse ver algo, mas estava calor e usaria um
vestido que mostraria minhas pernas e axilas, não precisava mostrar
que estava com pelos crescendo. Jenna chegou e fez escova no
meu cabelo, passando chapinha em seguida, enquanto isso, Regina
cuidou de Samuel. Ela deu banho nele por mim, fazendo uma
bagunça do caramba no banheiro.
— Vai limpar minha casa, sua bagunceira — reclamei e
Jenna bateu em mim, para ficar quieta ou borraria meu delineado.
— Esqueci que essa louca não cata as calcinhas.
— É por isso que parei de usar — Regina respondeu e
rimos. — Não liga para sua mãe, ela está nervosa porque vai ver um
pau.
— Não fale essas coisas para o meu filho!
— Por que não? Ele tem um pau!
— Um pintinho, um pênis. Ele é um bebê, Regina! Sai de
perto do meu filho, sua doente! — reclamei e as duas estavam rindo
mais ainda. — Imbecis, eu devia ter feito isso sozinha.
— Você está insuportável. Não é seu primeiro encontro. —
Jenna me olhou e deu um sorriso. — Prontinha! Agora é só colocar
o vestido e o esperar chegar. Regina e eu iremos embora.
— O quê? Eu quero abrir a porta quando ele chegar! — Regina
reclamou e ri de sua ansiedade.
— Não, ele sabe que ela mora sozinha e já veio aqui sem
você, pode ficar meio acanhado. — Jenna recolheu suas coisas, me
deu um beijo, colocou Samuel no berço do meu quarto e
literalmente arrastou minha irmã para fora de casa.
Coloquei o vestido e prendi um cinto do mesmo tom das flores
na cintura, cuidando para que meu cabelo não ganhasse frizz. Vesti
Samuel com um macacão azul claro, blusinha branca e um par de
tênis da Adidas que meu irmão havia dado semana passada. Ele
estava lindo, combinei com um bonezinho, ficou perfeito para um
comercial.
Verifiquei minhas coisas mais uma vez e o prendi no
carrinho que virava uma cadeirinha boa para o carro. Liam chegou
exatamente às dez da manhã. Abri minha porta ansiosa, sorridente
e ele estava tão bonito de jeans, com uma camisa polo que
mostrava abertamente seus músculos bem trabalhados cobertos por
tatuagens incríveis.
— Você está linda, Emily. — Ele me entregou um buquê de
flores mistas, que nem reparei que estava segurando. — Achei que
fosse gostar.
— Obrigada, elas são perfeitas, vou colocar em um vaso.
Entre, Samuel já está no carrinho, estamos prontos para ir. —
Peguei as flores e arrumei uma garrafa de vidro, colocando algumas
e depois coloquei o restante nos vasos. Liam abaixou na direção do
carrinho, brincando com meu filho e toda vez que ele fazia isso, meu
coração parecia que ia explodir no peito.
Como sempre, me ajudou carregando as bolsas, nada
parecia pesado para ele. Seu carro era diferente dessa vez, escuro,
da mesma marca, porém outro modelo. Acomodei Samuel no meio
do banco, exatamente entre nós e coloquei as bolsas atrás, junto
com ele. Liam abriu a porta pra mim e me ajudou a entrar, um
arrepio me percorreu ao sentir suas duas grandes mãos na minha
cintura.
— Quer ouvir alguma música? — ofereceu quando caímos no
trânsito tranquilo da cidade.
— Tem certeza? — perguntei, conectando meu celular ao seu
aparelho de som e logo Ed Sheeran começou a tocar, com Shape
Of You. Samuel gostava da música, ele sempre sorria. Batendo as
pernas no seu lugar, riu quando olhei para ele e sorri.
— Ele é sempre tão alegre.
— Porque a mamãe ri o tempo todo pra ele, não é meu
amor? — brinquei com seus pés e ele fez o som mais adorável do
mundo, como se me respondesse.
Liam entrou na área privativa do evento, logo sendo
reconhecido por um segurança e fomos para uma das vagas
reservadas. O dia estava lindo e o parque lotado de barracas,
famílias, crianças correndo, música alta e vendedores com balões e
doces. Saímos do carro com minha bolsa pequena e a bolsa de
Samuel, abri seu carrinho e fui empurrando, admirada. Liam parou
para falar com um dos seguranças, que apontou uma direção.
— Reservei uma mesa para nós, podemos deixar as bolsas
lá e passear. É em uma barraca fechada para os convidados. — Ele
colocou a mão nas minhas costas e fomos andando juntos.
— Bem-vinda, família! Não deixem de vir participar do nosso
leilão beneficente! — Uma mulher de boné e com a camisa do
evento nos recebeu na barraca. — Sr. Jones? Seja bem-vindo —
disse meio confusa, olhando para mim e depois para ele, mas sorriu
simpática, nos entregando folhetos. — Divirtam-se!
Entramos na área da barraca e fomos para a mesa com o
nome de Liam, de frente para a baía. Era uma visão linda.
Estacionei o carrinho e tirei Samuel dele, para acalmá-lo da agitação
que estava por estar em um ambiente diferente. Liam pegou água,
bebemos e então, decidimos explorar enquanto havia tempo.
— Eu era muito boa no jogo de arco. Vamos jogar algumas
coisas? — Analisei as barracas das brincadeiras.
— Vou comprar algumas fichas, fique aqui na fila. Quero ver
se é muito boa mesmo — ele disse e eu ri, chocada e aceitando o
desafio. — Me dê a criança e ganhe um urso.
— Liam Jones! Você está me desafiando?
— Claro, por que não? Você tem cara que não gosta de
perder! — Sorriu e ri, porque quando ele sorria, as borboletas do
meu estômago sobrevoavam sem controle. Eu realmente era
péssima perdedora. Entreguei Samuel chupando a mão para ele,
tirei a mão da boca do meu filho e limpei a baba.
Entreguei a ficha ao moço da barraca e agarrei cinco arcos,
para jogar em cinco pinos, se acertasse, ganharia um urso. Joguei
os cinco, acertei três. Liam estava atrás de mim dizendo ao meu
filho que a mamãe ganhava pontos por tentar. Rindo, bati nele.
— Faça melhor. — Arqueei a sobrancelha.
Bem… Samuel ganhou o primeiro urso do dia e eu um gigante
beicinho.
Encontramos uma barraca de tiro ao alvo, quis tentar pegar o
Nemo gigante e o atendente explicou que era para acertar todas as
garrafas em movimento. Aprumei meus ombros, confiante, porque
eu não sabia atirar, mas queria tentar.
— Você vai perder se manter essa postura. — Liam estava
atrás de mim e afastou minhas pernas com seu joelho. Mordi meu
lábio ao senti-lo tão próximo. Com uma mão, porque a outra
segurava meu bebê, puxou minha cintura e empurrou meus ombros
para frente. — Mire com cuidado.
— Se você continuar assim, eu vou errar tudo — sussurrei
meio ofegante e ele riu, continuando perto. — Está tentando me
fazer perder? A propósito, você é bem cheiroso.
Liam parecia não esperar pelo elogio repentino, porque riu e
senti seu nariz próximo ao meu pescoço e a mão do meu filho
enfiada no meu cabelo.
— Você também.
E eu errei todos os tiros.
Liam tentou, acertou praticamente tudo, ganhando um urso
imenso. Não o Nemo. Deixei pra lá, porque ele estava ganhando
tudo e eu queria procurar uma barraca onde pudesse acertar
alguma coisa. Encontrei uma de dardos em bolas com água. Cada
um tinha um prêmio. Com concentração, estourei um balão que
ganhava mais fichas.
— Quer almoçar agora? Acho que ele está com fome —
Liam ofereceu enquanto Samuel chupava a pele do meu pescoço.
— Ainda não estou com fome. Podemos voltar à mesa para
que possa amamentar?
— É claro, vou comprar bebidas, vamos lá.
Mais uma vez, ele segurou minha cintura e andamos juntos,
bem próximos. Segurando Samuel, atravessei meu braço na cintura
dele, mostrando que estava bem com o contato físico. Era um
encontro, não uma saída de amigos. Na mesa, peguei uma toalha e
ajeitei meu vestido para que Samuel amamentasse, ele estava
coçando os olhos também, acabaria dormindo um pouco.
Liam não pareceu incomodado com o tempo que Samuel
levou para mamar e dormir, na verdade, nós usamos esse tempo
para conversar. Ele era tão inteligente e eu via que seus olhos
nunca paravam, sempre observando as pessoas, meio alerta. Era o
caos que vinha com a profissão que teve antes de abrir a empresa.
Sabia que seus ferimentos foram em combate e não entrei em
detalhes.
Falamos sobre sua criação na Inglaterra, país que era louca
para conhecer e esperava poder visitar vários lugares com meu
pequeno homem.
Coloquei Samuel dormindo no carrinho, ele estava com calor.
Tirei sua roupa, procurando amenizar um pouco e decidimos
almoçar cachorros-quentes, suco e sorvete de sobremesa.
— Com tanta coisa para comer, acabamos no simples
cachorro-quente.
— Ainda temos o dia inteiro. Você pode comer de novo — ele
brincou e dei a língua. Estava tão brincalhão que me senti menos
pateta do lado dele.
Empurrando o carrinho pelo parque, Liam e eu voltamos ao
estande de tiro e dessa vez, ficou totalmente atrás de mim, me
ensinando a atirar. Não ganhei nada de novo, valeu a experiência de
senti-lo tão pertinho de mim. Era todo duro, trabalhado e grande.
Uma sensação diferente. Sempre fui do mesmo tamanho ou maior
que meus encontros, ele me fazia sentir acolhida.
Foi anunciado um show de uma banda local e seguimos
para o palco, segurando seu braço e ele empurrando o carrinho com
o bebê adormecido. Paramos em uma das pontas, com várias
famílias com filhos pequenos correndo ao redor. Liam parou atrás de
mim, inicialmente com as mãos no bolso, depois segurou meu
ombro e por fim, eu estava recostada em seu peito, cantando quase
todas as músicas famosas que a banda escolheu tocar.
Samuel estava morto para o mundo por quase duas horas,
acordou chorando e saímos de perto do barulho para acalmá-lo.
— Preciso trocá-lo — avisei ao sentir a fralda cheia.
Rapidamente peguei as coisas e improvisei um espaço com duas
cadeiras.
— Como consegue fazer isso sem sujar tudo? Ele não para.
— Liam estava olhando Samuel empurrar as pernas por todo lado.
— Isso é muita maestria.
— Eu sujo tudo, às vezes dá certo e às vezes não. Tudo
depende da prática e do bom humor dele em cooperar.
Com Samuel no carrinho, terminamos nosso passeio pelas
barracas e convenci Liam a comer maçãs caramelizadas. Mordi um
pedaço, ficando com a boca grudada de doce, lambi e ele ficou
olhando fixamente a minha língua passear pelos meus lábios. Olhei
em seus olhos e vi desejo neles, um olhar intenso, escurecido. Sorri,
sem nenhuma vergonha e ele só grunhiu.
Queria beijá-lo. Seria cedo demais? Ousado demais?
A queima de fogos do fim do dia decidiu que não era a nossa
hora. Principalmente porque Samuel ficou muito assustado com o
barulho e chorou copiosamente contra meu peito, nos fazendo sair o
mais rápido possível de perto do barulho. Liam parecia irritado que
havia uma queima de fogos, achando um absurdo que não foi
avisado e Samuel chorando. Ele queria reclamar com a organização
do evento.
Achei tão fofo e engraçado, mas o impedi de reclamar. No
caminho de volta, Samuel dormiu e eu sabia que era só um cochilo
porque chorou, mamou e estava no balanço do carro. Em dado
momento, segurei a mão de Liam, que estava descansando em seu
apoio quando o sinal estava fechado. Ele me deu um olhar tranquilo,
carinhoso e fechou os dedos nos meus, sem soltar pelo resto do
caminho.
Entramos com minhas coisas e fechei a porta. Deixei Samuel
dormindo no berço.
— Eu amei o dia. — Parei na frente de Liam na sala. Sentei
ao lado dele, no sofá. — Obrigada por ser tão paciente com as
necessidades do meu filho. Foi muito divertido. Ele vai ficar olhando
para o balão o tempo todo.
— Não precisa me agradecer por isso. — Ele chegou mais
perto. — Estou feliz que tenha gostado. Esse era o objetivo. Eu
também gostei muito.
Mordi meu lábio, meio incerta.
— Eu quero beijar você — confessei e ele me olhou, depois
riu. — O que foi?
— Você sempre me surpreende.
— Isso é bom ou ruim?
Bateu insegurança que meu jeito fosse assustador para ele.
— É muito bom, significa que a vida nunca será tediosa com
você — ele respondeu e segurou meu rosto, com todo carinho e
cuidado, me senti preciosa e delicada. Sempre fui tão alta, tão
“grande” e ele me dava o prazer de me sentir feminina. — Eu
também quero beijar você.
— Então me beije.
Sem falar mais nada e nem pensar duas vezes, me beijou
delicadamente, apenas um simples roçar de lábios e então,
pressionou firme. Sua boca estava quente, convidativa, segurei sua
nuca, chegando para frente e separei meus lábios. Liam me pegou
firme, puxando-me para si, quase ao ponto de estar em seu colo e
sua boca me devorou em um beijo avassalador, que me deixou
excitada imediatamente.
Eu nunca havia sido beijada daquele jeito e agora, não queria
parar mais.
CAPÍTULO DEZ
Emily
— Tem certeza? — questionei Owen pela milésima vez.
— Você é insuportável — ele reclamou, debaixo da minha
mesa. — Alguém te disse isso?
— Minha irmã Regina me diz toda vez que me vê — respondi
sem me abalar com seu humor ruim. — Eu te pedi para mudar um
monitor de lugar. Você é o único querendo mudar tudo.
— O nome disso é logística.
— Então, quem é o insuportável agora? — retruquei e ele riu,
jogando uma ferramenta no meu pé e pulei para trás, batendo em
uma parede sólida de músculos com um cheiro muito familiar. Virei
rapidamente. — Oi. Não te ouvi chegar.
— Usei as escadas. — Ele olhou para minha boca e senti tudo
dentro de mim apertar.
Desde que nos beijamos e demos um amasso no meu sofá
sábado passado, a sensação se tornou familiar. Nos beijamos
outras vezes, não tão intensamente como naquele dia, porque não
tivemos privacidade ou tempo para ficarmos juntos.
Liam insistia em me buscar todos os dias para me levar até
a casa dos meus pais e por todo caminho brincava com Samuel.
Chegávamos juntos no trabalho, tomávamos café, às vezes
sozinhos e outras vezes com Owen. Tudo era filmado na empresa,
então eu não me sentia confortável em sermos abertamente íntimos.
Sempre que ele chegava de algum compromisso, nos falávamos
formalmente. Eu queria mais. Fazia tanto tempo que um homem não
me deixava tão acesa, feliz e empolgada.
Não era só a parte física. Tudo que saía da minha boca era
interessante para ele. Nem mesmo Dylan, que amei com todo meu
coração, me deu tanta atenção e valor. Liam parava tudo para me
ouvir falar, ele mandava mensagens atenciosas, querendo saber
como estava e sempre perguntava pelo meu filho. Sempre.
Decidi convidá-lo para nosso segundo encontro e dessa vez,
sem Samuel. Minha mãe aceitou olhar meu bebê para me dar uma
noite fora.
— Vocês podem se beijar, eu não ligo. — Owen soltou debaixo
da mesa e corei, me afastando de Liam, mas ele me segurou e
puxou-me para perto novamente.
— Tenho algumas coisas para te repassar — falei nervosa e
peguei umas pastas em cima da mesa, levando para a sala dele.
Liam veio atrás de mim e fechou a porta. Seu olhar determinado me
fez recuar até a parede, onde não havia mais para onde fugir. — Se
você me beijar aqui, eu vou te atacar e isso não é exatamente uma
boa ideia. Que tal aceitar meu convite para jantar sexta-feira?
— Que convite?
— O que vou fazer agora. Quer jantar comigo sexta-feira?
— Sim, eu quero e eu vou te beijar agora. Prometo me
comportar depois — avisou, vindo na minha direção, segurou minha
cintura e me beijou tão intensamente que os dedos dos meus pés
enrolaram dentro dos sapatos. Minha mente ficou dispersa. —
Sexta-feira? Uma mulher nunca me convidou para um encontro
antes.
— Por que não? Nunca convidei e foi por falta de
oportunidade, mas, não vejo problema. — Passei a mão por seu
cabelo, com meus braços apoiados em seu ombro. Desci minhas
mãos para seus bíceps, apertando um pouco. Uau! O tempo que ele
gastava malhando tinha um bom resultado! — Samuel vai ficar com
minha mãe. Ele ainda não vai conseguir passar a noite toda devido
à mamada noturna. Podemos jantar, passear e depois irei buscá-lo.
— Está perfeito. Não se cobre tanto, isso é muito novo para
mim também. — Ele falou com sinceridade e me senti tranquila. —
Estou lisonjeado com o convite.
— Sou sempre uma surpresa, querido. Nunca se esqueça. —
Alisei minha roupa. — Agora sério, esses documentos precisam da
sua revisão final e assinaturas para serem colocados de vez no
arquivo. — Peguei uma das pastas.
— Tenho que resolver isso agora? Está quase na hora de
sairmos…
Faltou o beicinho projetar nos lábios.
— Quero deixar no arquivo no caminho para o
estacionamento, na verdade, preciso ou vou me embolar com esse
monte de pastas lá. Pode me ajudar com isso agora? Caso
contrário, posso deixar tudo isso criando poeira. — Coloquei as
mãos na cintura, olhando-o.
— Está certo — ele resmungou e sentou, pegando uma
caneta e começando a analisar, assinando no final. — Li o e-mail
que me encaminhou sobre o convite para fazermos a segurança do
baile do museu. Falei com Owen, vai dar para cobrir, parece que
temos outro evento. Fale com Margareth para fazer a separação dos
funcionários e para o RH abrir vagas se for necessário, ainda temos
tempo para verificação de antecedentes e treinamento.
— Sim, senhor. Continue assinando, por favor. Eu vou arrumar
minha bolsa e quando voltar, estarei pronta para sairmos.
— Como vai fazer com Samuel hoje?
— Não irei vê-lo — respondi e saí, sem deixar que ele visse
que estava triste por não poder ficar com meu filho por um tempinho
na hora do almoço.
Deixei mais leite com minha mãe e tirei um pouco para não
ficar com os seios vazando na rua. Apesar de ser normal, era
desconfortável e em alguns momentos, constrangedor.
Owen ainda estava debaixo da minha mesa, mudando meus
monitores de lugar e apenas recolhi minhas chaves e carteira,
enfiando na bolsa junto com o celular. Liam me entregou as pastas
assinadas e também me deu o requerimento assinado para novas
contratações. Entramos no elevador juntos, ele respondendo
alguma mensagem e se irritando com o touchscreen enquanto eu
organizava os arquivos em ordem alfabética para não perder tempo.
— Não vou demorar — avisei a Liam na porta da sala do
arquivo, olhando os armários, procurando exatamente onde aquelas
informações precisavam ficar guardadas. Minha senha era uma das
poucas que podia entrar ali, era a parte mais exaustiva do meu
trabalho, ter que arquivar sessenta mil folhas. Evitava deixar
acumular ou entraria ali e nunca mais sairia.
Logo ao lado era a sala dos servidores, uma sala onde só
Owen, o funcionário que trabalhava lá dentro e Liam, possuíam
acesso. As áreas restritas eram muito respeitadas ou haveria
alarmes e um monte de luzes vermelhas piscando pelos corredores.
— Eu te ajudo. — Liam pegou metade das pastas. — Não
pense que isso é educado da minha parte, a verdade é que estou
com fome e iremos perder a reserva do nosso almoço e por
consequência, essa reunião estúpida.
Soltei uma risada por seu mau-humor e fui para o outro lado,
guardando o que estava nas minhas mãos. De repente, fui puxada
contra um armário e Liam me colocou sentada em uma mesinha no
canto, mal me dando tempo para reagir e me beijou. Agarrei-o para
me equilibrar e em seguida segurei sua nuca, retribuindo o beijo
com a mesma fome em que ele me agarrava.
— Estamos fazendo isso no trabalho — sussurrei contra sua
boca. — Temos que ir, não estava irritado com um possível atraso?
— Não resisti. Não pode culpar um homem por não resistir a
uma linda mulher, não é?
— Eu posso culpar meu chefe se ele brigar comigo por
chegarmos atrasados na reunião estúpida.
— Você venceu, srta. Williams. — Ele me ajudou a descer da
mesa e saímos da sala do arquivo.
— Só mais uma parada. Pode me esperar no carro. —
Apertei o botão do andar do RH.
— Você vai demorar, porque dá assunto a todo mundo que fala
com você, está com alerta de trânsito e nós temos grandes chances
de nos atrasar.
Quase murmurei que ele foi o único que me agarrou no
arquivo, mas não estávamos sozinhos no elevador. Liam deu um
aceno para uma mulher que trabalhava na recepção de um dos
andares, não lembrava qual e ficou falando comigo como se ela não
existisse. Eu era mais sociável e provavelmente criaria uma
conversa para incluí-la também.
Liam raramente conversa com as pessoas, nunca o reparei
falando mais que o essencial. Ele brincava comigo por insistência,
eu acho. Era boba e acabava arrastando as pessoas para minha
bobeira. Owen adorava minhas besteiras e Frank, irmão de Liam,
também. Via que ele ficava mais à vontade com pessoas de seu
círculo.
Saímos no andar do RH, passei pelo corredor e acenei para
meus colegas de trabalho. Havia uma galerinha meio implicante que
tinha certo receio da minha presença, porque era assistente do
CEO. Outros eram bem legais. Ainda não havia aceitado nenhum
convite para beber depois do trabalho, por conta de Samuel, mas
esperava poder ir em algum momento e fazer amizades.
— Não demore — Liam disse emburrado e achei estranho
que não entrou comigo no RH.
Bárbara me avisou que Liam ficava de mal humor quando
horários não eram respeitados e era por isso que estava correndo
feito louca a manhã inteira para não deixar nada faltando.
Estávamos saindo uma hora mais cedo da nossa reserva porque o
cliente marcou a reunião em um restaurante bem longe do
escritório.
— Emily! — Margareth, a chefe do RH, sorriu e havia algo
nela que era familiar, mas nunca soube definir o que era. — Quase
não nos vemos! Como está indo?
— Acredito que estou indo bem. Alguém reclamou de mim
aqui?
— Só elogios e resolvemos várias pendências com a sua
ideia do correio amigo. Nada mais de fofocas nos setores. Que tal
um cafezinho comigo?
— Não posso, Liam, quer dizer, sr. Jones está me
aguardando para irmos a uma reunião. Só vim entregar essa
solicitação assinada para novos contratos, mas já deve ter algo no
sistema.
— Sim, eu vi. Tenho alguns currículos e indicações, assim
que preencher as vagas te aviso para encaminhar aos treinamentos.
É Owen que lida com isso — ela respondeu, analisando a folha que
lhe entreguei. — Tudo certinho, Emily. Agora vá, sei que meu filho
odeia atrasos, ele é assim desde bebê.
— Seu filho? — Parei, confusa.
— Liam e Frank são meus filhos, não sabia? — Algo no
sorriso dela caiu um pouco.
— Não, sinto muito. Também não era da minha conta. — Sorri,
sem graça. — Agora sei de onde te achava familiar, é dos seus
filhos. Isso é legal, uma família que trabalha junto. — tagarelei sem
noção e meu telefone começou a tocar. Era Liam. Por que ele não
entrou para falar com a mãe? — Tenho que ir! Marcamos nosso
cafezinho depois?
Encontrei Liam no corredor e ele só apontou para o relógio,
resmungando sobre me atrasar à toa por ficar conversando. Ainda
estava tão chocada que Margareth fosse mãe dele que nem
respondi. O segui no piloto automático, com a mente trabalhando
em mil possibilidades para entender porque ele nunca mencionou
nada. Já havíamos conversado sobre família, ele sabia que eu era
adotada e que tinha outros irmãos que também eram adotados.
Lembrava dele dizendo que foi criado pela avó. O pai faleceu
quando era criança, então, por que nesse mundo não me falou
sobre a sua mãe? Fiquei sem saber se deveria reclamar sobre isso
ou deixá-lo me contar por conta própria. Ou podia mencionar que
sua mãe acidentalmente me contou quem ela era.
Entramos no carro e logo saímos, com o gps indicando um
caminho que nos faria chegar lá mais rápido. Esperava que não
houvesse muito trânsito, afinal, Liam não era o tipo de CEO que
gostava de ser conduzido e ele não precisava de segurança, porque
era o próprio segurança.
— Está tudo bem? — Ele parecia preocupado. — Sei que
sou chato, sinto muito. Não quero atrasar o dia todo, também sei
que tem hora para buscar Samuel na sua mãe.
— Não é isso, está tudo bem. — garanti e olhei meu
telefone, minha mãe enviou uma foto de Sammy no colo do meu pai,
mamando e rindo ao mesmo tempo. Ele era tão lindo. — Olha isso!
— Mostrei a fotografia para Liam, que desviou o olhar do trânsito e
sorriu.
— Ele é perfeito.
— Margareth é a sua mãe? — Soltei e me arrependi na
mesma hora. — Não é da minha conta, sinto muito.
— Acho que é da sua conta sim, só não gosto de falar sobre
ela. — Sua voz estava calma e reparei que ele não a chamou de
mãe.
— Não precisamos falar sobre isso, se te incomoda. — Toquei
sua coxa e depois acariciei.
— Não é realmente um incômodo. Ela nos abandonou quando
éramos crianças e voltou alguns anos atrás. Nunca apareceu, ligava
de vez em quando, mandava cartões postais e teve uma vez que
precisei pagar sua fiança, porque foi presa por jogar tinta em uma
famosa que usava um casaco de pele. — Ele contou e engoli seco.
A doce Margareth abandonou os filhos? Deveria ser doloroso. — Ela
nos deixou um ano depois que meu pai morreu, assassinado, por
causa de uma briga que ela arrumou com a esposa de uma espécie
de traficante do nosso antigo bairro. O cara foi morto no dia
seguinte, pela gangue da nossa rua. Não foi só por ter matado meu
pai, mas por tudo que eles estavam aprontando pelo bairro. Minha
mãe disse que precisava de um tempo e foi, nos deixando com
vovó, que fez de tudo para nos criar com a ajuda do meu avô.
— Isso é tenso. Não sabia que seu bairro era tão violento.
— Hoje não muito mais. Era pior quando criança, coisa do
crime organizado, mas nós saímos de lá e fomos viver em Londres,
quando meu avô foi promovido no trabalho. Enfim, minha mãe viveu
viajando, morando de favor ou em carros. Alegava que precisava
realizar seus sonhos enquanto ainda era jovem, que filhos prendiam
muito, impediam de crescer na vida. — Continuou falando e meu
coração apertou.
— Sinto muito, não sabia. Ela só mencionou algo sobre você
não gostar de atrasos desde que era bebê.
— Ela voltou meio fracassada. Não realizou nada, porque
não sabia o que queria realizar. Era ativista de um monte de coisa
louca, tão perdida na vida que paguei para ela um curso
profissionalizante e dei um emprego. Ela é boa nos recursos
humanos, sabe que não pode cruzar a linha e muito menos entrar
no meu caminho. — Finalizou e entendi a resistência. Segurei sua
mão e me inclinei sobre o console do carro, beijando sua bochecha.
A aparência dura não mostrava o seu grande coração.
— Você é um homem bom — disse e voltei para o meu lugar.
Liam não sorriu e entendi que o assunto da mãe doía, mesmo
que ele dissesse que não incomodava. O silêncio do carro me
deixou tensa e então, comecei a cantar a música tema de Moana. O
primeiro refrão comecei baixinho, depois estava mais alto e quase
balançando as mãos. Ele me olhou duas vezes, cético e preocupado
que fosse louca. Continuei cantando sem parar.
De repente, para minha completa surpresa, explodiu em uma
gargalhada alta. Continuei cantando até que perdi a batalha e ri
junto. Paramos no sinal, com uns cinco carros à nossa frente e ele
me puxou pela nuca, me beijando.
— Você é louca.
— É apenas Moana.
— Você sabe que não sei quem é Moana, mas imagino que
seja da Disney — falou contra minha boca e o beijei mais uma vez
antes de ouvirmos a buzina, porque deixamos de prestar atenção no
trânsito.
Ao chegarmos no restaurante, o manobrista levou o carro e,
segurando minha bolsa, entramos juntos e fomos informados que a
mesa ainda não estava pronta, éramos os primeiros da reserva a
chegar. Arqueei minha sobrancelha, sabendo que ele correu feito
louco à toa e deixando meu ponto bem claro.
Ele ignorou, claro que ignoraria, já estava satisfeito por chegar
ali antes.
Fomos encaminhados ao bar e pedi chá gelado, morrendo por
uma marguerita, mas a minha vida alcoólica estava em pausa até
segunda ordem. Liam pediu água, simples e sem palhaçada. Ele
não ingeria nada alcoólico durante seu horário de trabalho e
costumava beber somente cerveja nas folgas.
— Comporte-se. — Alertei ao sentir a mão em meu joelho.
— Estou comportado. — Sorriu e me fez rir, porque subiu a
mão um pouquinho mais. Bati em seus dedos. — Ele chegou.
Virei e dei de cara com um homem que pensei que nunca mais
veria. Travei no lugar, agarrando a mão de Liam. Eu nunca o
seguraria em horário de trabalho.
— Emily? É você, querida?
— Vocês se conhecem? — Liam perguntou e eu ainda
estava em choque.
Eu estava pronta para dizer que não, sair pela porta e fingir
que nada estava acontecendo. Liam percebeu meu estado de
choque, entrelaçando nossos dedos.
— Querida?
Meus olhos ainda estavam grudados no homem que, na última
vez que vi, estava cheirando uma carreira inteira de cocaína, com a
esposa caída ao lado. A polícia entrou, invadiu a casa e me pegou.
Fui colocada para adoção tão rápido quanto um piscar de olhos ou
pelo menos foi a minha percepção infantil, ao ser tirada da minha
família e levada para outra.
Antes que pudesse responder Liam, uma jovem mulher se
aproximou com pressa.
— Desculpe o atraso, papai — ela disse e percebi que era
mais jovem que eu e muito parecida comigo.
— Emily, querida. — Meu pai insistiu e engoli seco.
Olhei para os dois, sentindo meu mundo rodar. A garota me
olhava com curiosidade e de repente, entendeu quem eu era.
Simplesmente dei as costas e saí do restaurante, com Liam em meu
encalço. Parei na calçada, respirando fundo, puxando todo ar dos
meus pulmões e tentando me acalmar. Meu coração parecia
explodir no peito.
— Ele é seu pai biológico, não é? — Esfregou minhas
costas suavemente.
— Você sabia? — acusei, furiosa. Tinha a minha ficha antes
mesmo de me ver, por que não saberia disso?
— Não. Seus registros de adoção estão arquivados como
secretos, não achamos nenhum motivo para verificar. Por que iria
querer saber quem são seus pais biológicos? — retrucou, sem se
abalar com a minha raiva. Ele tinha razão. Balancei a cabeça de
acordo. — Então, ele é seu pai?
— Ele era. Parece que teve outros filhos — comentei com
amargura.
— Sinto muito.
— Pensei que tivesse morrido ou preso, fiquei para adoção,
não havia parentes para ficar comigo, morei um ano em um lar
temporário antes de ser adotada definitivamente pela minha família.
— Olhei para o restaurante. — Sinto muito, Liam. Não posso fazer
isso, não posso falar com ele.
— Não tem problema. Vamos embora, sei o que vai te fazer
melhor agora. — Ele fez sinal para o manobrista.
Fiquei em silêncio no carro, sem prestar atenção no
caminho e quando dei por mim, Liam estacionou na garagem da
casa da minha mãe. Olhei para ele e sorri, verdadeiramente feliz,
porque tudo que precisava era segurar meu filho e ter o colo dos
meus pais.
Meu pai estava na sala, com Samuel arrulhando. Peguei
meu filho no colo e o abracei, cheirando-o e então, comecei a
chorar. Senti Liam me abraçar, deitando minha cabeça em seu peito
e só fechei os olhos, ignorando meu pai perguntando o que houve e
a agitação da minha mãe. Em algum momento iria contar a eles,
mas naquele instante, só queria chorar.
CAPÍTULO ONZE
Liam
Uma caneca de café foi colocada à minha frente. Olhei para o
homem que sentou na cadeira do outro lado da mesa de madeira
bem feita, com um ar preocupado. O pai de Emily, seu pai de
criação e, o assunto era o encontro inusitado com o pai biológico
dela. Aquele homem de olhos verdes com rugas de expressão ao
redor deles era apaixonado pela filhinha e estava preocupado com a
segurança dela.
— Minha filha está em risco?
— Ele não é um perigo. Não deve estar envolvido em negócios
peculiares na superfície. A reunião era para ouvir sua proposta, ele
pediu indicação de um cliente muito antigo e de confiança, por isso
fui pessoalmente. Não saio da empresa e muito menos levo Emily
se houver qualquer chance de ser perigoso. — Ele tinha o direito de
saber, mesmo que me ofendesse um pouco pensar na possibilidade.
— Meu segurança estava olhando as câmeras e eu raramente entro
em um lugar para trabalho desarmado e sem a planta baixa do local.
Sei onde são as saídas e para onde correr.
— Entendo que seja seu trabalho. Existe alguma possibilidade
de ele ter armado esse encontro para ver Emily?
— Pequenas. Parecia surpreso ao vê-la. — Dei um gole do
café.
— Nós nunca nos preocupamos com a família biológica da
Emily e ao longo de seu crescimento, oferecemos a informação de
que sabíamos e o restante, ela nunca quis saber. Sei que lembra do
dia que foi levada e nada mais, para ela, a vida com os pais
biológicos é um borrão — ele me contou e assenti, fazendo
anotações mentais de sua fala. — Quando minha esposa encontrou
Emily sem querer, na frente da casa em que ela estava, soubemos
que havia uma superlotação. As crianças dividiam até a mesma
cama. Entramos com a solicitação de lar temporário, foi aprovado e
em seguida nosso advogado correu atrás.
— E como ficaram sabendo do pai? — questionei e olhei
rapidamente para meu relógio.
Emily estava no andar de cima com a mãe e Samuel, dando
um banho e arrumando as coisas dele para levar embora.
— O nosso advogado disse que Emily vivia em um lar fora
de ordem, eram pessoas muito ricas, o pai era um herdeiro mimado,
muito jovem e a esposa uma socialite. Eu não sei como
conseguiram tirar uma criança de uma família rica, mas aconteceu.
Eles nem recorreram à decisão da justiça de entregar a criança para
adoção. — Ele franziu o cenho, reflexo do meu movimento. Era
muito estranho. — Se você tiver a possibilidade, poderia investigar
melhor e me informar?
— Sim, eu o farei — concordei, por estar curioso com boa
parte da história. Ouvimos barulho na escada. Emily retornou com a
mãe e o bebê sorridente. — Obrigado pelo café.
Emily agradeceu e se despediu dos pais, colocando o menino
bagunceiro na cadeirinha. Nós saímos juntos e me perguntei o que
seus pais pensavam em nos ver com um pouco mais de intimidade
que uma relação chefe e funcionária. Suas mentes estavam focadas
no problema do pai biológico de Emily.
— Tenho que buscar minhas coisas no trabalho — ela refletiu
com um choramingo dentro do carro. Eu também precisava buscar
minhas pastas.
— Eu te deixo em casa com ele e pego tudo, levo de volta
para seu apartamento. — Olhei pelo retrovisor para o bebê fazendo
barulhinhos com a boca. — Ele parece maior.
— Não para de crescer. Estamos perdendo muitas roupas. —
Sorriu para o menino.
— As perninhas dele não param. — Ri dos chutes no meu
banco.
Emily pegou minha mão e levou para seu colo, dando um beijo
suave no meu braço.
— Eu acordo com ele chutando o berço o tempo inteiro. Você
pode ficar para jantar? Não comemos o dia inteiro e ainda quero
ficar um pouco com você hoje…
— Não estava pensando em ir embora. — Apertei sua coxa,
subindo um pouquinho e ela beijou minha bochecha quando
paramos em frente ao prédio. Ajudei-a a descer com as bolsas, levei
até seu apartamento, colocando no sofá e ela me deu um sorriso
dizendo que me aguardava de volta em breve.
Inclinei-me e dei-lhe um beijo.
Jamais imaginei que um dia gostaria tanto de me despedir
com um beijo. Beijá-la se tornou minha nova atividade favorita,
enquanto pensava repetidamente o quanto queria mais que um
beijo. Não me sentia pronto para esse passo, porque Emily era mais
que sexo, ela era tudo que me consumia e estava apavorado de
estragar tudo com meu humor de merda.
Dirigindo de volta para a empresa, pensei em Gideon Russo.
Ele era amigo de um antigo cliente, que gostou muito do nosso
pacote total de segurança e queria implementar em casa, na
empresa, na casa dos filhos e nos carros. Como era um amigo de
um ótimo cliente, Owen não encontrou nada arriscado em seus
negócios, apenas um homem rico, que herdou a empresa da família
e vivia com a esposa e filhos na área nobre da cidade.
Entrei no escritório de Owen.
— É a segunda vez, cara — explodi irritado e ele apenas me
olhou. — Não me olhe assim, como nessa merda você não viu que
Emily era filha desse idiota?
— Não tinha como saber. Ela foi deletada da vida deles. —
Encolheu os ombros e sinalizou para mostrar a tela. — Odeio invadir
sites federais, Emily foi listada como adoção privada e depois, tudo
deletado. — Mostrou os arquivos riscados. — Como eu sou muito
bom eu os recuperei, o problema é que também estou cheirando
merda.
— Como assim? O que esse cara realmente faz?
— Os negócios da família são limpos. Papai pagou para que
ele ficasse fora do país por uns anos, justamente no momento em
que Emily foi adotada. O pai faleceu dois meses depois, ataque
cardíaco e quando Gideon voltou para o país, anos depois, chegou
a entrar em contato com o conselho tutelar para descobrir onde
estava a filha. Desistiu um tempo depois.
— Ele simplesmente desistiu da filha? Que porra de babaca é
esse?
— Não sei. A mãe dela morreu de overdose no dia que foi
encontrada pela polícia. O pai estava altamente chapado, tudo foi
limpo do sistema e da ficha dele, mas tem essas anotações na ficha
de adoção da Emily — Owen complementou e eu suspirei, era uma
merda. — Tudo foi abafado pela mídia, o velho não reivindicou Emily
e deixou seguir para adoção enquanto o filho provavelmente ficou
internado em uma clínica de reabilitação no exterior.
— E a família da mãe da Emily?
— É aí que disse que estava fedendo, homem. A mãe era
irmã da Kátia Rostov[5]
. O que acontece, o papai Rostov deixou um
rastro de filhos e filhas sem registro por aí, alguns também. Kátia
assumiu o sobrenome, as outras, debandaram para os sobrenomes
maternos. Em todo caso, compreendo que a mãe da Emily era uma
princesinha de uma das organizações criminosas da Rússia pelo
estilo de vida.
Foda-se, não. Qualquer idiota com um pouco mais de cérebro
sabia que Chicago era dominado pelos italianos e seus inimigos
eram os russos. Ou uma parte deles. Anos atrás, Kátia Rostov foi
assassinada em Nova Iorque. Embora a polícia tenha encerrado o
caso como briga de rua, todos nos bastidores sabiam que os
italianos tinham quantos dedos existiam entre eles envolvidos na
história.
Emily era sobrinha de Kátia Rostov.
— Será que eles sabem que Emily existe?
— Provavelmente sim, mas, não deve ser por isso que Gideon
deixou a menina escondida… Deve ter dito que morreu ou sei lá. Em
todo caso, hoje em dia, só sobrou uma Rostov, ela é casada com
um turco e vive lá. Não deve ter ideia que uma das irmãs caçulas
teve uma filha.
— Imprima tudo isso. Vou contar a Emily. Ela merece saber.
— Sim, eu concordo. Tem algo errado, sinto que tem. Por que
apagariam a existência de Emily da vida dele? Por que ele ficaria
anos sem se importar com a filha? E o avô que não a quis? Vou
cavar mais a fundo, preciso saber, estou curioso.
— Só não seja preso e nem invada o pentágono de novo, da
última vez, tivemos que fazer coisas que não gosto para o governo
— resmunguei e ele riu, porque o bastardo gostou da aventura.
Reuni as pastas e o iPad de Emily, no dia seguinte ela
estaria de volta. Ela gostava de olhar o sistema antes de dormir
todos os dias no mesmo horário, porque via no painel de acessos.
Decidi passar em casa para tomar um banho e trocar de roupa,
queria ficar relaxado ao lado dela. Só vê-la no trabalho não estava
sendo o suficiente, a última vez que estivemos juntos foi no sábado
à noite e queria aproveitar seu convite para voltar.
Emily me enviou uma mensagem com o código da garagem e
do elevador, para entrar direto que ela abriria a porta. Fiquei
chocado que uma funcionária de uma das melhores empresas de
segurança tivesse uma senha tão terrível. Seu porteiro sequer foi
olhar o carro diferente entrando na garagem, o que era ruim em
muitos níveis.
Com suas coisas em um braço, sequer avisei que estava no
prédio, porque eu já podia adivinhar qual era a senha de sua tranca
digital e alarme. Digitei os números e acertei de primeira, abrindo a
porta.
— Como adivinhou o código da porta? Você hackeou? — Ela
estava usando uma camisa longa e um short curto que facilmente
poderia ser confundido com uma calcinha. — Eu ia colocar uma
calça antes de entrar.
— Não se incomode com isso — retruquei, meio puto. — Sua
senha de entrada é o final do número do celular e a data do
nascimento do Samuel? — perguntei baixo, porque vi o menino
dormindo no cercadinho perto do sofá.
Ela me deu um olhar inocente.
— É sim, qual o problema?
— É uma das senhas mais fáceis do mundo! Qualquer pessoa
que olhar seus registros pode adivinhar!
— Outra senha eu irei esquecer! — Fez um beicinho que me
desarmou por completo. — E você só sabe disso porque é um cara
que entende de segurança, qualquer outro não vai adivinhar. —
Continuei olhando-a, tentando entender que aquilo era real. Tudo
que expliquei a ela sobre nosso trabalho entrou por um ouvido e
saiu pelo outro? — Tá bom! Vou colocar uma tão difícil que nem
você vai adivinhar.
— Só quero que fique segura. É uma mulher sozinha vivendo
com um bebê. Apesar do prédio oferecer certa segurança, me
preocupo do mesmo jeito. — Mais calmo a abracei, beijando seus
lábios. Agarrei sua cintura, doido para descer a mão para sua bunda
mal coberta.
— Fiz lasanha de abobrinha. Já estava semipronta para o
jantar, também cozinhei arroz integral e não tenho cervejas,
infelizmente — falou contra meus lábios.
— Não tem problema, eu realmente quero conversar sobre o
que descobri do seu pai biológico. Não quero que se sinta traída
porque não te contei as informações completas.
— Obrigada por ser honesto. Quero saber de tudo, vamos
sentar e conversar.
Emily recebeu muito bem as informações sobre sua família, ela
estava curiosa e querendo saber a mesma coisa que Owen, o
motivo pelo qual ninguém a reivindicou. Ao mesmo tempo, deixou
claro que não queria nenhum contato com a família biológica. Mais
calma, avisou que poderia agir profissionalmente ao redor deles se
fosse necessário. Eu disse a ela que só iria entrar no negócio depois
que descobrisse tudo. Não gostava de receber visitas do FBI.
Nós jantamos a lasanha e ficamos na sala, aos beijos e
minhas mãos definitivamente agiram por conta própria e agarraram
sua bunda maravilhosa. Pouco tempo depois, Samuel acordou e
mamou, me chutando e rindo, com seu olhar sapeca, cheio de
alegria. Brinquei com seu pé, distraído e ele soltou o bico várias
vezes para interagir.
— Ele faz muita bagunça com você. — Emily estava rindo com
os gritos que soltava com minhas cosquinhas. Samuel ignorou o
peito da sua mãe, agarrando meu nariz e meus cabelos ao mesmo
tempo, batendo as pernas nos meus ombros. — Não vai dormir tão
cedo assim.
— Quem precisa dormir, não é? — Continuei brincando com
ele.
— A mamãe. — Emily o pegou de mim. — Vamos desacelerar,
garoto.
Uma hora mais tarde, o bebê finalmente dormiu e me despedi
de sua mãe com beijos no corredor. Cheguei em casa e
imediatamente me senti sozinho, com saudades deles, do cheiro de
bebê delicioso e do cheiro floral, assim como os beijos incríveis e o
corpo quente de Emily contra o meu. Deitei em minha cama,
olhando para o teto, esperando o sono que demoraria uma
eternidade para chegar.
Por que não fiquei lá? Era uma boa pergunta.
Sexta-feira chegou depois de dias tranquilos. Infelizmente, não
fiquei com Emily depois do trabalho. Ela estava ocupada com a irmã
Regina dormindo em seu sofá enquanto o apartamento estava em
reforma. Emily possuía um quarto extra, além do de Samuel, mas
não havia móveis. Naquela noite, nós sairíamos para nosso
segundo encontro. Segundo o que li no google, estava liberado
beijar e propor coisas sacanas, mas a terceira base era somente no
terceiro encontro.
Pelo pouco que conhecia de Emily, a terceira base só iria
acontecer quando ela quisesse, sem regras, sem termos, apenas
quando estivesse confortável e querendo dar esse passo. Me
arrumei em casa, prometendo buscá-la às dezenove horas para a
reserva que fez em um restaurante à beira da baía. Ela quem
escolheu, esperava que não quisesse pagar também. Eu tinha um
limite para certos movimentos extremamente modernos.
Estacionei na frente da casa de sua mãe e desci do carro,
sem flores dessa vez, apenas eu. Pensei se realmente deveria ter
comprado mais flores ou o gesto ficaria repetitivo. Toquei a
campainha e uma mulher baixa, morena, com os cabelos pintados
de vermelho vivo atendeu a porta. Me olhou de cima a baixo, rindo e
gritou para Emily.
— Olá, sou Liam Jones.
— Regina Williams, irmã caçula da Emily. — Apertou minha
mão. Eu sabia quem era, só não disse nada.
— Samuel já dormiu?
— Não. Entre para vê-lo. — Ela abriu mais a porta e tirei o
envelope do meu bolso.
— Sr. Williams? — chamei pelo pai de Emily, que virou de seu
lugar na sala, assistindo televisão, com Samuel deitado em seu
peito. — Algumas informações. — Entreguei a ele, que pegou
ansioso. — Há mais por vir, assim que tiver, irei te repassar.
— Obrigado.
Peguei Samuel e brinquei com ele, balançando no alto, do jeito
que ele gostava. Ele abocanhou meu queixo, ansioso e brincando.
Sua alegria me fazia rir. Um movimento na escada me fez olhar e vi
Emily descer tão linda que minha boca ficou seca. Ela usava um
vestido preto, justo, até o meio das coxas e saltos altos. Seu cabelo
estava preso, deixando o pescoço lindo de fora e eu queria beijar
aquela boca brilhando.
— Olha só, Samuel. Sua mãe está maravilhosa — sussurrei
e Emily sorriu, emocionada. — Diga: mamãe, você está linda! —
Sacudi a mão dele, em direção à Emily.
— Fique confortável com o vovô e a vovó. Não deixe a Tia
Regina te ensinar besteiras. — Emily o pegou e entregou para o pai.
— Nós voltamos antes da meia noite.
— Relaxe, Emily. Vai ficar tudo bem — seu pai garantiu e
saímos de mãos dadas de sua casa.
— Você está realmente linda — afirmei ao beijar seu ombro e
abri a porta do carro. — Tem certeza que quer sair hoje?
— Deixa de bobeira! Mandei bem na arrumação e quero
desfilar do seu lado. — Sorriu e me puxou pela gola da camisa,
beijando minha boca rapidamente. — Não vamos perder nossa
reserva.
Dirigindo à noite pela cidade, me vi relaxado no banco, com
uma mão preguiçosa no volante e outra na coxa dela. Eu nunca
dirigia devagar, nem despreocupado. Emily tinha um efeito calmante
em mim. Chegamos ao restaurante, entreguei meu carro ao
manobrista e dei uma olhada no lugar. Era bonito e foi fácil invadir o
sistema de imagens. Conhecia, mas nunca cheguei a frequentar,
havia uma pista de dança, era mais moderno e definitivamente para
casais.
Emily disse nossos nomes e fomos encaminhados para o
segundo andar, onde dava para ver a maior parte do salão. Nós não
pedimos nada com bebida alcoólica, eu por estar dirigindo e ela por
ainda estar amamentando, mas não éramos o tipo de pessoa que
precisava de álcool para relaxar. Qualquer outra mulher eu estaria à
beira dos nervos. Não ela. Emily não deixava ninguém ficar quieto
ou sem rir, ela não tinha um botão de desligar.
— Vamos dançar antes do nosso jantar chegar? — pediu
depois que comemos as entradas mistas.
— Eu nunca danço. — Ela ficou de pé.
— Vai gostar de dançar comigo.
Aceitei sua mão e fui praticamente rebocado para a
improvisada pista de dança próxima à nossa mesa. Um DJ tocava
músicas pop que eu jamais ouvi. Emily começou a dançar na minha
frente, me obrigando a me movimentar com ela. Com saltos altos,
sua bunda chegava a uma altura muito interessante e valeu a pena
tê-la esfregando-se em mim, me deixando duro e querendo
continuar dançando.
Segurei sua cintura e desci as mãos para seu quadril,
seguindo seu ritmo, beijando seu pescoço. Ela virou de frente, me
agarrando e tomando minha boca em um beijo capaz de incendiar
uma floresta, meu pau estava dolorido dentro das calças. Estava
quente e eu queria sair dali o mais rápido possível, levá-la para
minha casa e aproveitar as horas restantes que tínhamos juntos.
— Nosso jantar chegou — anunciou ofegante, tão excitada
quanto eu.
— Quero jantar você — retruquei, sendo sincero. Ganhei
uma risada e um tapinha no ombro.
— Você pode ficar essa noite. — Foi tudo que disse antes
de voltar para nossa mesa.
CAPÍTULO DOZE
Liam
Depois do jantar, dispensamos a sobremesa e outra bebida.
Peguei sua mão conforme andávamos para a entrada, percebendo
que gostava de segurá-la perto. O manobrista trouxe meu carro de
volta e lhe entreguei uma gorjeta, ajudando Emily na porta e dando
a volta. Reparei que havia um grupo entrando no local, já muito
bêbados, com várias mulheres. Frank estava entre eles. Meu irmão
me deu um olhar curioso, segurando uma garrafa de água e acenou.
Respondi o aceno e fui embora. Emily decidiu que era uma
excelente ideia atentar meu pouco juízo durante o caminho para a
casa de sua mãe. Ela mordeu o lóbulo da minha orelha e sussurrou
coisas sujas, lambendo meu pescoço. Beijei sua boca e gemi,
sentindo sua mão impertinente bem acima da minha ereção
dolorosa.
Apertei sua coxa, firme, pensando que não queria assustá-la
com meu tesão e o quanto gostava de sexo. Não sabia se ela
estava preparada, nunca fiquei com uma mulher normal. Quando
jovem, as garotas eram viciadas em sua maioria, gostavam de estar
chapadas no ato, na Marinha, tive relações sexuais com colegas
marinheiras ou com garotas desconhecidas nas paradas, nenhuma
delas reclamava, porque era coisa de uma noite só.
Como funcionava o sexo em uma relação normal? Eu queria
foder Emily de tantas formas que sabia que iria ficar satisfeita e um
tanto dolorida. A questão era se ela não ficaria assustada ou
chateada, não entendia absolutamente nada sobre relacionamentos.
— Não irei demorar.
— Vou entrar com você e te ajudar. — Saí do carro também e
ajustei minha roupa. Emily foi rebolando na frente e entramos na
casa de seus pais, estava tudo silencioso. O bebê dormia no
carrinho, na sala e a mãe costurava. — Boa noite, sra. Williams.
— Eu queria ficar com ele a noite toda — a mãe reclamou
com um beicinho.
— Ele vai chorar e não posso fazer isso. Te garanto que vai
dormir aqui com você muitas noites. — Emily sorriu e pegou o
carrinho e eu as bolsas. — Nos falamos amanhã, mãe.
— Boa noite, crianças.
Dirigimos de volta em silêncio, para Samuel não acordar. Ao
entrarmos na casa, deixei as coisas dele na sala. Emily me pediu
para colocá-lo no berço. O vestido dela tinha lantejoulas que faziam
barulho e ele poderia acordar. Como se segurasse uma granada,
transferi o menino completamente adormecido de um lugar ao outro.
Ela o cobriu e ligou a babá eletrônica, me agarrando bruscamente
pela mão até seu quarto.
— Estou indo rápido demais?
— Não pra mim. Preciso saber se realmente está
confortável com esse passo.
— Eu estou muito bem e você?
— Muito confortável — garanti, sem sombra de dúvidas.
— Confio em você, Liam. Me sinto segura.
— Eu vou fazer de tudo para que nunca perca sua confiança
e segurança em mim, Emily.
Sem falar mais nada, nos beijamos no escuro. Aquela
mulher não se importava com a minha aparência marcada por
cicatrizes e conseguia tirar sarro do meu humor, sem se abalar com
as minhas caretas. Ela era doce, divertida, mas também forte e
corajosa de enfrentar o desconhecido sozinha. Eu não sabia que
existia meu tipo perfeito por aí, até que ela entrou na minha vida
espalhando adesivos coloridos nos meus arquivos e cantando
músicas infantis.
De repente, não estava com pressa, senti um desejo intenso
de adorá-la da cabeça aos pés. Desci minhas mãos por seus braços
finos, segurando suas mãos. Beijei seu pescoço e coloquei suas
mãos em minha cintura. Com calma, procurei seu zíper e deslizei
por toda suas costas. O vestido caiu fluído em seus pés.
Emily usava um conjunto de renda preto por baixo. Seus
seios eram cheios, provavelmente por causa da amamentação e eu
não me importava nem um pouco. Dei um beijo em cada um,
agarrando sua bunda e com isso, puxando a calcinha para fora do
meu caminho. Admirei seu corpo bonito, de uma mulher real, com
as coxas grossas, o quadril largo, a bunda redonda perfeita e cintura
boa de pegar.
— Deite-se na cama.
— Quero tirar sua roupa. Estou morrendo para te ver nu há
tempos. — Fez um beicinho charmoso, com o olhar brilhando
excitação. Eu amava a sinceridade dela. Emily não tinha problemas
em falar o que pensava ou o que desejava.
— Você vai me ver nu muito em breve. — Sorri e a empurrei
gentilmente. Ela caiu rindo, afastando um pouco as pernas e gemi.
Tirei minha blusa, jogando do outro lado do quarto, meu cinto,
sapatos, meias e as calças desapareceram do caminho. Emily fez
sinal para parar, ela queria me olhar. Mordendo o lábio,
praticamente nua, apoiou-se pelos cotovelos e me olhou de cima a
baixo, desejosa.
Percebi o momento que tentou franzir os olhos para enxergar
melhor as minhas tatuagens e desceu o olhar, arregalando-os um
pouco. Em seguida, mordeu o lábio.
— Me disseram que caras grandes tinham pintos pequenos,
mas você deve ser totalmente exceção à regra — disse com um
sussurro e soltei uma risada. — Só não sei se vai caber —
continuou falando com um franzir de cenho e peguei sua panturrilha,
soltando suas sandálias, uma de cada vez. Seus pés caíram na
cama, afastei seus joelhos e me encaixei entre eles.
— Tenho certeza que daremos um jeito de caber tudo. —
Beijei suas coxas torneadas. — Até as bolas. Você me quer todo,
não quer?
— Porra, sim — gemeu baixinho e beijei sua boceta, apenas
um beijo rápido, ela saltou um pouco e gemeu, empurrando a pélvis
na minha direção.
— Você vai ter que ser silenciosa. Não queremos perturbar
o sono do bebê.
— Prometo ficar muda se você simplesmente me chupar logo!
— ela gemeu e eu ri. Minha mulher não tinha inibições. Se gostava
dela antes, naquele momento podia estar caindo de amor mais
rápido que um raio. Acatando sua ordem, dei uma longa lambida
entre as fendas. Emily já estava molhada, muito excitada, gemendo
baixinho, tentou agarrar os fios do meu cabelo e não conseguiu, por
serem curtos.
Estava sem pressa, apreciando, lambendo devagar e
provocando seu clitóris, estimulando o ponto sensível tantas vezes
até que estava me xingando.
Segurei seu quadril, matando todos os desejos das minhas
fantasias. Era melhor que meus sonhos. Empurrei um dedo entre
suas dobras e senti o quão apertada era. Se o meu dedo estava
entrando com dificuldade, precisaria deixá-la ainda mais relaxada e
excitada para o meu pau. Que por sinal, estava doendo muito na
cueca.
— Liam, por favor — sussurrou e me segurou no lugar com
as pernas. — Estou quase lá — gemeu e golpeei seu clitóris com a
minha língua, empurrando o dedo no mesmo ritmo. Ela começou a
tremer, levantando o quadril e buscando por mais. Tentei empurrar
mais um dedo e ela gritou meio gemendo enquanto chupei forte.
Emily gozou e tapou a boca para abafar seus gritos.
Movendo-me para cima, cruzou as pernas na minha cintura e
impulsionou para virar na cama, querendo ficar por cima. Facilitei
seu trabalho, deixando que me montasse. Concentrada e com um
sorriso safado, tirou a minha cueca, acariciando meu pau, da
cabeça às bolas. Fechei meus olhos. Era bom demais. Espreitando
a língua para fora, lambeu minha cabeça devagar.
— Porra…
— É realmente bem grande… — ela me provocou, olhando-o
fixamente, movendo a mão para cima e para baixo.
— Puta que pariu! — Segurei seu cabelo. Emily me levou a
boca o máximo que conseguiu e deu uma senhora chupada ao
ponto de sentir os músculos da minha coxa tremerem. Não queria
gozar ainda, o que certamente aconteceria se ela continuasse me
chupando daquele jeito. — Emily… — Puxei-a para cima e joguei na
cama, tateando minha carteira no chão em busca de camisinha.
— Eu comprei camisinha quando começamos, você sabe…
tem na minha gaveta — ela sussurrou e abri a primeira gaveta,
encontrando um monte de camisinhas, coloridas e de todo tipo. —
Me empolguei. — Sorriu sem graça e ri, beijando sua boca e em
seguida, abrindo uma. Ela pegou da minha mão, querendo colocar.
Suas mãozinhas delicadas movendo-se no meu pau era
demais.
Voltei a deitá-la, beijando-a, tentando transmitir tudo que
estava sentindo. Sexo nunca foi pessoal pra mim, nem carinhoso e
muito menos tão íntimo. Era apenas sexo. Com Emily, era muito
mais. Tudo dela, sua tagarelice e carinho era o tipo de mais que
estava precisando e não sabia. Minha musa perfeita, inspiradora.
Com cuidado, posicionei meu pau em sua entrada muito
molhada e empurrei gentilmente. Emily era mais apertada do que
imaginei.
— Puta que pariu, estou virgem novamente — choramingou
e tentei me controlar. A sensação era maravilhosa. — Só um minuto
— pediu e parei no meio do caminho. — Me disseram que a
primeira vez depois do parto é normal ficar tão desconfortável
quanto uma virgem, mas porra… — gemeu e cruzou as pernas em
minha cintura. — Continue e não pare, preciso de você. — Fechou
os olhos e mordi seu lábio, empurrando todo caminho para dentro e
permiti que relaxasse um pouco, voltando a me mover devagar,
entrando, saindo e esticando. — Oh, Deus. Liam!
— Você é tão gostosa, porra! — grunhi e mordi seu ombro,
estocando firme, empurrando com tudo. — Quero te foder para
sempre — murmurei contra seus lábios.
— Sim, nunca pare! — Arranhou minhas costas e a dor foi
tão intensa quanto deliciosa.
Empurrando firme contra a cama, o som do quarto era apenas
dos nossos corpos batendo, as respirações pesadas, os gemidos,
as palavras sujas, safadas e cheias de palavrões. Emily gozou mais
uma vez, me mordendo e arranhando os músculos dos meus braços
e me deixei ir, estocando mais um pouco e estremecendo da cabeça
aos pés, tão perdido e desorientado com o orgasmo forte que me
dominou.
Nos virei de lado, acariciando seu corpo, amando sua pele
suave.
— Você é maravilhosa. — Beijei sua testa suada, seu narizinho
arrebitado e por fim, a boca macia.
— Você que é — respondeu rouca e me abraçou apertado.
— Nós somos muito bons juntos.
Tirei a camisinha e levantei para jogá-la fora no banheiro.
Emily continuou deitada na cama, com um sorriso bobo e um olhar
pós foda que brilhava, mesmo no escuro.
— Está dolorida? Quer algum remédio?
— Estou um pouco dolorida sim, pelo tempo e falta de uso. —
Sorriu e sentou com calma. — Não quero nenhum remédio, não
agora. Vou tomar uma chuveirada, me acompanha?
Tomamos banho juntos, no chuveiro apertado de seu quarto e
foi uma aventura. Eu nunca havia compartilhado o chuveiro com
uma mulher antes. A falta de espaço, meu corpo grande e o jeito
atrapalhado dela fez com que produtos caíssem e nós mal
conseguíssemos nos mover. Rimos muito e ela cobriu minha boca
ao pensar que ouviu um resmungo de Samuel.
Voltamos para a cama e, assim que deitamos, ouvimos o choro
baixo de Samuel ressoar pela babá eletrônica. Eram três da manhã.
Emily se enrolou em uma toalha e foi até o quarto dele, segui atrás,
curioso. Ele parecia irritado, vermelho, mas sem uma lágrima
escorrendo do rosto.
— A fralda está muito molhada. Ele não gosta e é bom, senão
iria vazar. — Emily o trocou com facilidade. Samuel enfiou o dedo
indicador na boca e riu para a mamãe. — Não começa, menino.
Você vai voltar a dormir. — Ela sorriu e sentou na poltrona com ele,
pegando a coberta e amamentando.
— Você quer água? — Não estava me sentindo deslocado.
Gostava de vê-la tão carinhosa e apaixonada pelo filho. Também
gostava muito dele.
— Sempre sinto sede amamentando, quero um pouco sim.
— Sorriu e voltou a olhar para Samuel, acariciando seu cabelo
revoltado.
Só de cueca, andei pela casa no escuro e olhei o alarme
piscando. Alguém mexeu na maçaneta, o que é comum em prédios
que sempre passam muitas pessoas. Ninguém tentou abrir a porta.
Reiniciei o alarme, peguei duas garrafas de água, bebi uma e levei a
segunda para ela. Cantarolando e balançando o bebê, ele dormiu
pesado de novo, como se não tivesse acordado em momento
algum.
Bebendo água, ela pegou minha mão e me arrastou de volta
ao quarto. Esperei-a terminar de beber, para jogar a garrafa fora e
Emily me deu um olhar indicando que tinha outros planos.
Segurando meu rosto, me deu um beijo. Sua língua estava gelada.
Beijando-a de volta, segurei sua cintura e voltamos para a cama.
Mesmo com ela dolorida, nós transamos mais uma vez.
Adormeci com o braço apoiado em sua cintura, de bruços,
porque ficamos conversando besteiras antes de dormir. Emily queria
que eu assistisse Toy Story para entender porque queria colocar
Andrew em Samuel, para poder chamar seu filho de Andy, mas
mudou de ideia quando nasceu porque achou que ele tinha rosto de
menino chamado Samuel. Loucuras de mãe. Ela queria comprar os
brinquedos do filme e eu disse que a levaria no shopping para fazer
tal coisa e com isso, fechei os olhos.
A próxima vez que os abri, era dia, Emily não estava na cama
e em seu lugar tinha um bebê com chupeta na boca, me olhando
com interesse e parecendo meio sonolento. Ele sorriu ao perceber
que havia acordado. Beijei sua cabecinha cheirosa, fazendo
cosquinhas em sua barriga e vi a mãe totalmente nua vestir-se no
closet. Sua bunda era ainda mais incrível à luz do dia. Assobiei
quando inclinou-se para vestir a calcinha e ela riu, rebolando um
pouquinho.
— Eu ia te acordar assim que fizesse o café da manhã. —
Voltou para o quarto vestida, de short jeans e uma camisa preta
escrita “eu amo a Disney” em verde claro.
— Vamos comer na rua. Quero te levar a um lugar legal. Antes,
vamos passar no meu apartamento — respondi, ainda brincando
com Samuel. — Prometi levar sua mãe ao shopping, tenho que
cumprir, camarada.
— Preciso ir ao mercado para comprar os mantimentos da
semana. Só programações domésticas hoje.
— Eu não me importo, apenas se arrume e vamos. Eu fico
com ele.
Emily arrumou a bolsa para Samuel passar o dia fora e as
coisas dele. Decidimos não levar o carrinho, era muito complicado,
apenas o bebê conforto para o carro. Perguntei se ela tinha aquela
coisa de carregar no peito, era mais fácil do que segurá-lo o tempo
todo.
— Canguru? Tenho sim, nunca usei. — Pegou um pacote na
última gaveta da cômoda. — Ele era muito pequeno antes. —
Guardou na bolsa. — Tudo pronto, vamos?
A primeira parada foi o meu apartamento. Depois de
aguentar Emily à toda potência com seu muito bom humor matinal e
cantando tão alto no carro ao ponto dos outros olharem, ela ficou
muda ao entrar na minha casa. Emily nunca esteve no meu
apartamento e olhou todo o espaço antes de me encarar, confusa.
— Por que nesse mundo precisa de tanto espaço?
— Me disseram que era a cobertura perfeita para um CEO. —
Encolhi os ombros. Mal ficava na minha casa, via mais como um
investimento do que como um lar.
— Provavelmente mais uns trinta com suas famílias também —
retrucou, contando quantos passos dava de uma ponta à outra,
somente da sala. — Me sinto dentro da casa das Kardashians.
— Já sei! Alguma personagem da Disney?
— Um dia vai me levar na ilha deserta que viveu nos últimos
anos? — Ela soou frustrada, me fazendo rir e a deixei para trás.
Emily me seguiu com Samuel, assobiando.
— Comprei com tudo dentro, não escolhi.
— É lindo, sofisticado e rico. Acho que nunca pensei muito
no quanto tem dinheiro até ver a sua casa — murmurou e me
perguntei se aquilo era um problema para ela. Parecia que sim. —
Na minha experiência, caras com dinheiro querem companheiras
totalmente o oposto do que sou.
— Não quero falar da sua experiência, mas um cara como
eu, quer exatamente uma mulher como você. — Segurei seu queixo
e beijei sua boca. Ela olhou em meus olhos por um tempo e pareceu
aceitar minha palavra. — Vou trocar de roupa, a casa é sua.
— Sua cama é imensa. Podemos dormir aqui um dia? —
Animada, foi com Samuel pulando na cama, me fazendo rir e ficar
preocupado dela cair de lá com a criança. Emily era boba, porém,
não imprudente.
— Um cara grande, uma cama grande.
— Masculinidade frágil tem dessas coisas. Acho que só a
cama é do tamanho do meu quarto. Foi feita por encomenda?
— A única coisa que eu comprei — disse do meu closet.
Emily entrou e decidiu mexer em tudo. Curiosa do jeito que era, não
ficaria satisfeita até fuxicar tudo. Coloquei uma bermuda cargo
escura, camisa preta e tênis. Ela disse que iria olhar o banheiro, ri
de sua bobeira, peguei mais dinheiro no cofre e troquei meu relógio.
— Estou pronto.
Saímos do meu apartamento e descemos direto para a
garagem. Prendi Samuel na cadeirinha e ajudei-a a entrar, também
prendendo seu cinto. Dei a volta e nos coloquei no trânsito.
— Adorei sua casa, mas eu imaginava algo totalmente
diferente.
— O que pensou?
— Algo como uma casa, um cachorro enorme e bravo, uma
churrasqueira grande…
Uma casa de família sem a família, era o que ela queria dizer.
Quem sabe agora, eu pudesse ter a casa dos meus sonhos.

CAPÍTULO TREZE
Emily
Depois de um café da manhã delicioso em uma lanchonete
que Regina vivia me convidando para ir, Liam deu a ideia de irmos
ao shopping passear, fazer as compras que eu queria e ele buscaria
algumas revistas que precisava. Samuel estava bem desperto e eu
também, com energia de sobra depois de uma noite incrível, intensa
e de sexo maravilhoso. Eu podia andar com a placa de que fui muito
bem fodida e algo me dizia que Liam ainda se conteve bastante por
ser a nossa primeira vez.
Não planejei que fosse acontecer, sequer planejei qualquer
coisa além do jantar. Quando tudo esquentou na pista de dança, me
perguntei… porque não? Com todos os homens que me envolvi, fui
mais consciente, mas não presa a tabus. Depois de me tornar mãe,
aprendi que podia fazer o que quisesse. Era uma mulher adulta,
podia fazer sexo a hora que bem entendesse. Éramos adultos e
esperava que ele agisse com a mesma maturidade que eu caso não
desse certo, também nunca fui do tipo que pensa que
relacionamentos podem não dar certo. Quando mergulhava em
algo, fazia de tudo.
Tanto que me dediquei dois anos a um relacionamento que
jamais daria certo. Eu sempre soube, bem no fundinho do meu
coração, que Dylan era diferente de mim. Sua vida, família, não
eram diferenças que se completavam e nem que equilibravam. Com
Liam, a gente divergia no humor, mas se entendia na conversa, na
cama e nos beijos. Era uma química e conexão que nunca
experimentei antes, em nenhum relacionamento que jurei jamais
amar alguém como amava aquela pessoa.
Até Liam.
Simplesmente não entendia o quanto ele me consumia, me
inspirava como pessoa, me deixava totalmente à vontade pra ser
quem era sem medos. Nós mergulhamos em um clímax de luxúria
que pensei que poderia gozar só de olhar para ele. Um homem
daqueles na minha cama? Meu ego estava voando junto à Marte.
— Acho que só falta prender essas tiras aqui — Liam analisou
o carrinho que alugamos no shopping. Era em formato de carro
esportivo, se Samuel fosse mais velho, iria amar. Com três meses,
ele estava apenas me olhando com curiosidade. — É um meninopiloto de fuga!
Liam parecia mais empolgado que o bebê. Depois da conversa
om o atendente, me perguntei se ele entraria no carrinho.
— Espero que ele não goste tanto de correr. Meu coração
de mãe não me permite apreciar esse tipo de aventura — murmurei
e olhei para o meu filho. — Agora entendo a minha mãe quando ela
ficou irritada por ter ido a uma corrida.
— Minha avó me ensinou a dirigir. — Liam me deu um
sorriso cúmplice. — Ele não vai gostar de corrida. — Piscou e o
olhei severa, imaginando Samuel saindo para andar de carro com
os amigos. Meu coração apertou e decidi não pensar nas aventuras
futuras do meu filho.
Empurrando o carrinho entre as lojas, percebi que Liam não
era um companheiro de compras impaciente. Entramos em algumas
lojas de roupas, apenas para olhar, depois fomos a duas livrarias
diferentes e paramos em quiosques do mesmo assunto.
Encontramos uma loja de brinquedos e o atendente me disse onde
encontrar a coleção completa dos brinquedos do filme Toy Story.
— Ao infinito e além! — Apertei o Buzz para Samuel. Ele só
me olhou, sem rir, sem nada. Okay… Muito pequeno para
compreender. Quem se importava? Eu compreendia por ele! Em
algum momento ele iria.
— Mais alguma coisa? — Liam conferiu as caixas na cesta.
— Vou comprar algo que seja da idade dele. — Sorri, sem
graça.
— É o ideal. — Liam me provocou e seguimos para o fim
das nossas compras.
Estávamos cheios de sacolas e bolsas quando retornamos ao
carro. Voltei a cantar minhas músicas e descansei a mão em sua
coxa, apertando e subindo de vez em quando. Era bom estar
confortável com alguém que não exigia perfeição a todo instante.
Liam conferiu seu relógio e por um instante, olhou pelo
retrovisor, mas não para Samuel. Disfarcei e olhei para o meu.
Havia uma sequência de carros, nada parecia incomum.
— Vamos almoçar. O que quer comer?
Deixei de me preocupar porque ele parecia bem. Liam ficava
em alerta o tempo todo, eu iria surtar se ele ficasse verificando os
lugares como um espião.
— Hambúrguer ou pizza!?
Ele me deu umas opções de lugares na rota, decidimos juntos
por hambúrguer e fritas. Samuel mamaria ao mesmo tempo.
Paramos em uma lanchonete temática. O teto colorido chamou
atenção do meu bebê e ele enfiou um dedo na boca.
— Eu quero qualquer um simples que não tenha bacon e
cebola caramelizada — pedi a Liam assim que escolhemos uma
mesa na varanda, para apreciar o dia quente.
— Hoje ele parece contemplativo — ele disse ao segurar
Samuel para mim.
— Basta estar junto e no colo, ele fica feliz.
Olhei para o meu menino no colo grande de Liam. Ele parecia
gostar de segurá-lo, sem encarar meu filho como uma bagagem
extra no nosso relacionamento. Era quem ele se interessava
também, ao julgar o carinho que brincava com ele e o incluía em
nossos planos sem neurose.
Beijei a testinha do meu bebê cabeludo e os lábios do
homem que estava dominando meus pensamentos. Liam segurou
meu rosto com carinho, pressionando um pouco mais, querendo
mais que um beijinho simples. Lambi seu lábio, beijando de volta e
logo a garçonete limpou a garganta com um sorriso brincalhão.
— Olá linda família, em que posso ajudar?
Liam apenas sorriu e fez nossos pedidos, adicionando uma
bebida e pedindo água de imediato. Samuel soltou um espirro
engraçadinho, fazendo um beicinho e estalando os lábios, o primeiro
sinal que estava com fominha e queria mamar. Decidi pegá-lo antes
de chorar. Minha blusa era de fácil acesso, ele logo sentiu o cheiro e
resmungou. Peguei a manta e nos cobri, era um local discreto, olhei
ao redor e estava vazio. Ninguém reclamaria que estava
amamentando.
— Ele tem que mamar me chutando? — Liam segurou o
pezinho de Samuel, que soltou meu seio para rir e voltou a mamar,
o tempo todo olhando para a brincadeira que Liam fazia com ele.
— Acho que ele tem a natureza implicante — respondi e
meu leite esguichou longe no momento que Samuel soltou meu bico
para rir.
— Isso que chamo de tiro ao alvo. — Liam riu.
— É por isso que não tirei o sutiã ontem à noite, é uma
bagunça. Enquanto amo amamentar, tem o lado ruim que meus
seios não são meus nesse período. — Segurei a mãozinha de
Samuel e beijei. — Amo essa conexão. Espero poder amamentar
por bastante tempo.
— É a mais bonita. — Liam beijou minha testa e sorriu.
Sempre que ele sorria, sua cicatriz fazia o olho fechar um pouco
mais que o outro, parecia que ele estava com um olhar cheio de
flerte enquanto sorria pra mim. Me inclinei e beijei sua boca,
aceitando ficar em seus braços.
— Você se incomoda com isso? Em me ver amamentar e
essas coisas? Você gostaria de ter menos interação com Samuel ou
coisa do tipo?
— Gosto das coisas assim. Ele é parte sua. Jamais pediria
que reduzisse seu tempo com ele para ficar comigo — me
respondeu com ternura. — Quando te vi, me interessei por você, te
achei linda, mas também gosto de quem você é e gosto dele,
porque é uma parte sua — finalizou e sorri, era o que sentia dele,
mas queria ter certeza.
Almoçamos com Samuel brincando com o próprio pé,
mordiscando o mordedor que comecei a usar para distraí-lo.
Consegui comer sem interrupção, um momento raro na vida de uma
mãe. Passeamos no parque por um tempo, relaxando e
desgastando a comida. Liam estava me contando sobre uma noite
que foi segurança de uma estrela do pop e foi bem louco.
— Ela era meio maluca, só que os fãs dela eram bem mais —
finalizou, jogando um graveto para um cachorro que grudou nele
desde que sentamos no banco. O cão chegava a se contorcer.
— Já pensou em ter um cachorro?
— Minha avó nunca nos deixou ter um. A casa era muito
pequena, mas ela queria ter. Acho que não teve coragem depois ou
só deixou pra lá. — Ele riu quando o cachorro voltou. A dona do
cachorro estava bebendo com as amigas, prestando atenção no cão
e deu mais que uma olhada para Liam. Elas estavam cochichando e
rindo de algo que não achei a mínima graça.
— E por que não ter um agora? — Continuei o assunto,
segurando Samuel que olhava para o cachorro com interesse.
— É uma boa pergunta. Não cheguei a pensar nisso, no
entanto. — Ele me olhou. — Vou adotar um cachorro, que tal? Será
que tem algum abrigo aberto? Não quero comprar um.
— Liam Jones… Você está sendo impulsivo? — questionei
chocada e ele ficou de pé, pegando a bolsa do bebê e Samuel.
— Conheci uma garota maluquinha — brincou e segurou
minha mão, me levando de volta ao carro. No meio do caminho,
pesquisei sites de abrigos. Liam queria um cachorro de porte médio,
não muito pequeno porque definitivamente não fazia o estilo dele.
No primeiro abrigo que chegamos, fizemos um registro para
entrar e eu segurei Samuel contra meu peito, meio preocupada dele
pegar alguma coisa sem querer, sujar as mãos e enfiar na boca.
Olhamos as baias, as grades e até então, havia diversos cães de
todos os jeitos e tamanhos. Fomos levados para a área dos filhotes
e havia muito mais.
— Nas feiras de adoção costumamos levar só os mais velhos.
Muita gente só quer filhotes, mas no caso de vocês, é bom começar
com um pequeno para poder crescer junto com o bebê. — A
veterinária nos disse, enfiando as mãos nos bolsos do jaleco. — A
interação entre criança e cachorro é maravilhosa para o crescimento
de ambos.
Eu estava pronta para dizer que Samuel não moraria com o
cachorro quando Liam me surpreendeu ao pedir para entrar nas
baias. Ajoelhando, brincou com vários, mas senti que sua atenção
estava em uma cadelinha em especial. Ela parecia um filhote
malandro.
— Ela é filhote de pitbull. Nós a resgatamos em uma rinha, a
mãe morreu semanas depois do resgate, os filhotes já eram
nascidos e já haviam cortado a orelha deles, totalmente sem
preparo e fora do tempo. Muitos dos filhotes morreram por infecção,
ela é a única saudável e forte. Por isso está para adoção, não tem
nenhuma doença e a cicatriz no olho, deduzimos ser do corte mal
feito da orelha.
— Quantos meses ela tem?
— Três meses e meio.
— Ela tem a idade do Samuel — falei com Liam e ele sorriu,
pegando-a no colo. — Será ela?
— Sim, será. — Sorriu animado, nunca vi aquele sorriso
nele, era feliz, infantil, muito vivo. Os dois compartilhavam a cicatriz
no mesmo lado.
Assinamos um monte de papelada, Liam fez uma imensa
doação ao local, deixando até a veterinária tonta. Ela já estava
vacinada com o necessário até aquela idade, medicada com
remédios contra verme. Nós saímos com ela do abrigo. Eu
segurando Samuel e Liam segurando a cachorrinha. Samuel não
tirava os olhos dela, curioso, segurando uma mecha do meu cabelo
e seus olhos arregalados.
Paramos em uma loja de ração e eu enlouqueci, comprando
tudo que achava bonito para uma cadela. Caminha rosa, coleira,
brinquedos, comida, petiscos e Liam só me olhava divertido. A
cachorrinha no carrinho, Samuel em seu colo e eu enfiando tudo
que achava legal no carrinho. Meus pais nunca permitiram que
tivesse um cachorro, porque havia crianças demais em casa e podia
imaginar o gasto a mais que um cachorro traria.
Liam podia pagar a conta.
O telefone dele tocou e era uma chamada de vídeo.
— Fala aí, babaca. — Seu irmão saudou enquanto
estávamos na fila do pet shop lotado. Todo mundo resolveu comprar
coisas para seus cachorros naquele dia.
— E aí, idiota? O que precisa?
— A vovó perdeu o telefone de novo. Estou procurando, mas a
velha tá enchendo o saco para você vir almoçar aqui amanhã —
Frank disse e ouvi o som de algo batendo. — Aí, vó. Você é velha!
— Frank gritou e Liam sorriu. — Isso foi um sorriso? Vó? Me bate de
novo! — ele provocou e tomou outra porrada. — Você está fora de
casa?
— Estou em uma loja de cachorro porque adotei uma
cadelinha — Liam respondeu e seu irmão ficou em silêncio. — Emily
está aqui. — Virou a câmera do celular pra mim. Acenei junto com
Samuel.
— Liam, meu filho? — A voz de uma senhora chegou aos
meus ouvidos. — Estou esperando os quatro para almoçar aqui
amanhã — ela ordenou e sorriu. Não era mais um convite, era uma
intimação. — Quero conhecer todos. Incluindo a cachorrinha. Te
vejo amanhã. Farei bolo de carne.
Frank apenas sorriu e encerrou a chamada.
— Parece que temos um compromisso amanhã. Tudo bem
para você?
— Já conheceu meus pais e a intrometida da minha irmã,
quero conhecer a mulher que te fez ser esse homem incrível. —
Fiquei na ponta dos pés e beijei sua bochecha.
Nós fomos para meu apartamento, porque era onde eu tinha
tudo que Samuel precisava para ficar confortável. Ele estava
cansado de um dia inteiro de aventuras, sem tirar um único
momento de cochilo, o humor já estava irritante. Conforme ia
ficando mais velho, menos dormia, mas ainda precisava dos
cochilos. Estava cedo, ele dormiria por um tempo, acordaria e
dormiria mais tarde.
Meu prédio não tinha nenhuma norma contra animais de
estimação, por isso entramos sem problemas. Espalhei o tapete de
necessidades na área, onde ela poderia usar sem sujar o restante
da casa. Espirrei o produto que dizia que ela não faria xixi fora do
lugar e o tapete a convidaria a fazer suas necessidades lá.
Coloquei comida, água, joguei brinquedos pela casa e a
levei para o banheiro da sala, para tomar banho com as coisas que
comprei. Ela ficou até bem comportada, considerando a água suja
que escorreu de sua pelagem escura. Sequei com o secador. Liam
ficou me olhando, segurando Samuel, acompanhando meus
movimentos com um sorrisinho divertido. Depois de limpa e bem
seca, deixei-a solta com as portas dos quartos fechadas.
— Agora é hora do banho do outro bebê — anunciei
empolgada, pegando meu filho e o levei para meu banheiro. Samuel
fez uma bagunça enorme no banho porque Liam estava brincando
com ele, fazendo-o rir. Penteei seu cabelinho molhado e sentei na
cama para amamentar, o que fazia meu filho dormir quase que
imediatamente.
— Posso colocá-lo no berço? — Liam pediu baixinho e olhei
para ele, surpresa.
— Claro que pode. — Sorri e ele foi, desejando um bom
sono baixinho e colocando Samuel no bercinho. — Agora vem aqui.
— Segurei sua mão e levei de volta para meu quarto. — Limpei todo
mundo. Falta você, eu vou junto para deixar as coisas bem
molhadas e escorregadias.
— É o meu tipo favorito de banho, mesmo que precise de um
banheiro maior. — Ele me ergueu em seu colo e nós fomos para o
meu banheiro, aos beijos e com toda sua graciosidade, não
batemos em nada. O homem tinha controle de tudo.
Mais tarde, relaxada do banho, com uma cachorrinha
dormindo pacificamente em sua nova cama que tentou roer por
horas, estava com meus pés no colo de um Liam indignado,
assistindo o último filme da franquia quase erótica que perdi de
assistir nos cinemas por estar na reta final da gravidez.
— Eu realmente preciso ver a bunda desse cara? — Ele
enfiou pipoca na boca. — É meio ultrajante.
— Sua bunda é mais bonita, não se preocupe — provoqueio.
— O filme não tem história, eles só fodem — continuou
falando, me ignorando, ultrajado que a indústria cinematográfica
gastou dinheiro com aquela produção.
— Nós podemos fazer isso também, topa? — Cutuquei suas
costelas com meu pé.
— Não acredito que estou perdendo tempo com esse filme
ridículo. A garota é atacada e ele fica puto com ela? Por que não
paga alguém para desaparecer com o idiota que a agrediu?
— É isso que você faria?
Liam não escondia o ódio por meu ex e me preocupava se um
dia eles se encontrariam.
— Se eu te contar, vou ter que te matar. — Piscou e chutei
suas costelas. — Certamente eu o mandaria para a cadeia na
cadeira de rodas. Que segurança estúpida, que está no
apartamento e não viu o homem lá? Não fez a verificação dos
cômodos? Eu demitiria.
Acabei perdendo o interesse no filme, assistiria sozinha
depois, só não tirei porque ele seguiu soltando comentários ácidos e
irritados, o que me divertiu mais que a história em si. Em
determinada cena, contei que tinha um vibrador e aí, ele não quis
mais assistir porcaria nenhuma, me levando para o quarto e lá me
provou que sabia ser multifacetado.
O homem me fazia implorar por coisas desconexas.
De quatro, no meio da cama, Liam estava me fodendo firme
e segurando o vibrador contra meu clitóris. Arranhei a cabeceira de
veludo da minha cama, mordendo o travesseiro para não gritar ao
ponto de a vizinhança chamar a polícia. Ele introduziu a pontinha de
seu dedo na minha porta de trás e gozei, louca, implorando por
mais. Era um lugar totalmente virgem, mas puta que pariu, foi muito
bom.
— Você me deixa louco, porra — ele grunhiu e gozou.
Caímos na cama juntos, deitei em cima dele, exausta. Mal
sentia as minhas pernas. Liam me abraçou apertado, beijei seu
braço musculoso, amando o contato tão doce após o sexo tão
bruto.
— Isso foi incrível pra caramba! Quando podemos fazer de
novo?
— Daqui a pouco — prometeu e ri, negando.
— Ontem você foi bem suave e ainda sinto que não é tudo que
gosta. — Apoiei meu queixo em seu peito.
— Sempre gostei de sexo bruto, era mais impessoal. — Deu
um beijo na minha testa suada. — Com você, eu quero fazer tudo.
Do doce ao bruto. Quero apenas estar com você. Fico com tesão o
tempo inteiro, o que vier é bom, será incrível.
— Não me faça querer montar em você quando mal sinto as
minhas pernas — falei baixinho e ele riu, sem me soltar. — Sempre
fiz sexo meio baunilha, como diria Christian Grey. Estou aberta a
conhecer novas coisas…
— Eu não deveria ter… — Ele começou a falar e sorri. — Foi
na empolgação.
— Está tudo bem. Gostei muito, porém, quando for algo além
do seu dedo, me avise com muita antecedência. — Soltei um
bocejo, sentindo o peso do dia. — Me leve para o banho ou vou
dormir agora mesmo.
Ao invés de me levantar, Liam começou a fazer um cafuné
gostoso. Foi um dia tão incrível, nós passeamos, fizemos compras e
nos divertimos tanto que parecia um sonho. Liam era tão diferente
de mim e ainda assim conseguíamos viver momentos bons juntos.
Ele era sério e mal olhava na direção das pessoas, enquanto eu era
o tipo que puxa assunto na fila com qualquer um.
Ele saiu de sua concha ao realizar algo que tanto queria desde
criança. Ter um cachorro. Sabia que ele iria cuidar bem e amá-la,
porque era um homem grande, com cara de mau, mas com o
coração imenso e realmente bondoso. Liam era bom pra mim e
Samuel. Quando meu filho nasceu, achei que ficaríamos sozinhos
para sempre, mas o destino estava me surpreendendo.

CAPÍTULO QUATORZE
Emily
Era a segunda manhã consecutiva que acordava ao lado de
Liam e eu não podia imaginar uma sensação melhor. Sempre foi
muito difícil dormir ao lado de alguém. Com o doador de esperma,
era bem complicado. Nós dormíamos juntos poucas vezes apesar
do sexo ser constante. Eu não dormia nas poucas noites em que ele
ficava no meu apartamento e raramente ia à casa dele, para não
encontrar com seus pais e irmão.
Dylan sabia da minha dificuldade de dormir, mas na
verdade, não conseguia dormir ao lado dele, porque tinha medo. Era
difícil assumir a verdade quando estava com ele. Não era dormir
com qualquer pessoa. Talvez meu subconsciente não me deixasse
confortável, porque no fundo, continuei com ele por pena de suas
crises, por amá-lo até certo ponto e por desejar que ele mudasse
para que pudéssemos dar certo.
Levantei da cama e me espreguicei, deixando-o dormir
pacificamente e fui ao banheiro, fazer xixi e minha higiene matinal.
Depois disso, encontrei a cadelinha dormindo esticada no tapete do
quarto de Samuel e alguns brinquedos dele com marcas de dente.
Não estavam destruídos, só mordidos, depois lavaria e esterilizaria.
Samuel estava dormindo desde a mamada noturna, ele mal
acordou, meio que chorou e eu sabia o que era. Amamentei e o
botei de volta ao berço. Liam até acordou também, ficou me olhando
e acariciando minha coxa conforme amamentava. Era natural,
deveria ser estranho, parte do meu cérebro se preocupava em ser
demais e parte simplesmente agia conforme o ritmo que estava se
estabelecendo entre nós.
— Você está me seguindo? — brinquei com a cadelinha
ainda sem nome. Ela estava mordendo a barra do meu pijama e
então, mordeu a minha canela. — Ai, não seja má! Que dentinho
fino, inferno! — reclamei e coloquei a minha cafeteira para funcionar.
Liam gostava de café preto, simples e sem açúcar.
Fiz suco de laranja para nós dois. Estava quase entrando
em abstinência por café. Comecei a misturar a massa para
panquecas enquanto o bacon estava na frigideira. A cartela de ovos
seria a próxima a ser usada. Ao mesmo tempo, enfiei torradas na
torradeira que minha mãe me deu de presente e nunca havia usado.
Liam continuava dormindo, estava muito cedo, sete da
manhã. Ele costumava acordar antes disso normalmente, mas
queria que descansasse um pouco. Pensei em levar uma
sobremesa para o almoço na casa de sua avó, queria que ela
gostasse de mim, já estava cheia de sogras que não iam com meu
jeito. Por mais que fosse Liam a principal pessoa, a família tinha um
papel muito importante em um relacionamento.
Verifiquei meus ingredientes no armário e liguei para Jenna.
— O que está fazendo acordada tão cedo?
— Você me ligou, vaca — respondeu irritada, mas parecia
que estava acordada há tempos.
— Então, por que atendeu?
— Tenho dois filhos que dormem na cama conosco, então,
eles estão dormindo na casa dos avós… estou transando com meu
marido loucamente — retrucou e eu ri alto.
— Estou tentando não acostumar Samuel a dormir comigo…
— divaguei e abri um sorrisão. — Liam e eu fizemos sexo!
— Tá brincando? E aí? — Soltou um gritinho e pulou na
cama, percebi que estava pelada e desatei a rir. — Desembucha
logo, conta a fofoca quente!
— Melhor sexo da minha vida, aquele homem é surreal.
Uma química e conexão louca! Eu me senti cuidada. Fiquei muito
excitada e fora de mim. Estou feliz, coisa que percebi que não
estava há muitos anos — confessei baixinho e Jenna sentou na
cama.
— Você está apaixonada por ele?
— Sim. Ele faz todas as borboletas do meu estômago
voarem, adora o Samuel, não o exclui ou me faz sentir mal porque
sou mãe solo — continuei falando e fazendo nosso café da manhã.
— Depois marcamos um jantar aqui em casa, pode trazer as
crianças e vamos conversar em códigos para que não entendam.
Agora, tenho algumas coisas e preciso fazer uma sobremesa, me dê
uma receita.
— Só um minuto, deixe-me lembrar… — Jenna repetiu meus
ingredientes. — Pudim é uma excelente ideia e tem poucas chances
de errar.
Encerrei a chamada com ela e fui até o quarto de Samuel ao
ouvi-lo chorar. Voltei correndo para a cozinha, para virar o bacon e
tirar as torradas. Joguei uma concha de panquecas em outra
frigideira, meio atrapalhada com o bebê no colo e com medo de nos
queimar. Ouvi passos pesados na sala e Liam apareceu só de
bermuda. Seu físico era perfeito.
— Bom dia, linda. — Parou atrás de mim. Ele beijou meu
pescoço e depois os lábios, apertando a minha bunda. — Deixe-me
ajudá-la. O que posso fazer?
— Segure-o, se puder. Comecei a fazer e quero terminar. Já
tem café pronto. — Entreguei Samuel a ele e virei as panquecas,
finalizando o bacon. Liam pegou uma caneca no armário, onde
apontei que estava e sentou no banquinho com Samuel. Seu peito
nu, torneado, braços malhados e várias tatuagens estavam me
deixando doida segurando um bebê. Ah meus ovários… aquilo era
sexy.
Terminei nosso café da manhã e servi nos pratos, sentando
para comer com ele. Samuel estava animado, querendo chamar
atenção, soltando cada grito e rindo sozinho que era muito bonito.
Era admirável que consegui fazer um filho tão bonito.
— Você não precisa fazer uma sobremesa — Liam comentou
ao limpar a mesa.
— Eu quero. Um doce é legal depois de comer e é educado
levar a sobremesa quando se é convidado para almoçar na casa de
alguém — retruquei e tirei os ingredientes do armário. — Vai ficar
bom. Precisa fazer alguma coisa?
— Vou em casa trocar de roupa e comprar cervejas. Vou
arrumar minhas coisas para receber essa criaturinha lá. — Pegou a
cadelinha que estava no nosso pé o tempo todo.
— Ela pode ficar aqui durante o dia, não tem problema. Apesar
das mordidas no meu calcanhar, gosto dela. — Acariciei sua
cabecinha e seu focinho. — Só precisamos de um nome.
Liam ficou me olhando, sem saber um.
— Vai pensando no caminho.
— Que nome você daria?
— Moana? Lilo? Elsa? Algum nome de princesa? — Sugeri e
ele riu, dizendo que não, não mesmo. — Então, alguma
personagem de um filme que goste? Da Marvel? DC?
— Que tal Lilo?
— Do Stitch? Eu sabia que existia uma criança dentro de você!
— gritei animada, abraçando-o.
— Quem é Stitch?
Samuel gritou em seguida e a cachorrinha latiu, assustada.
Liam riu, porque acho que ele cansou de ficar assustado com as
minhas besteiras.
— Será Lilo?
— Na verdade, eu gostei de Lilo. — Ele sorriu timidamente.
— Muito fofo! — guinchei, apertando as bochechas dele.
As orelhas dele ficaram vermelhas.
— Precisa de ajuda com algo mais? — mudou de assunto e
deixei passar.
— Não se preocupe. Eu me viro, só não demore. — Sorri e
dei um beijinho em seus lábios, ele apertou a minha bunda de forma
divertida, vestiu a camisa e saiu pela porta da frente.
Liguei a televisão em um canal de desenho animado,
testando se Samuel ficaria distraído e o prendi na cadeirinha que
balançava. Voltei para a cozinha, comecei a fazer o pudim e achei
engraçado ver Lilo pulando nas coisinhas, balançando na cadeira e
isso estava fazendo Samuel rir. Ele estava ignorando a televisão.
Com o pudim pronto e esfriando, me arrumei primeiro,
escolhendo um vestido azul claro, até os joelhos e sapatilhas.
Escovei meu cabelo, deixando-o solto e liso. Dei um banho em
Samuel. Ele estava gastando fralda pra caramba e não era barato.
Reparei que ele parecia meio assado e usei mais pomada…
Meu pequeno fazedor de merda dupla. Ele era capaz de fazer
número dois por duas crianças.
Para ele, escolhi um macacão verde escuro, fresquinho,
blusinha branca e um bonezinho do mesmo tom. Peguei um par de
tênis da Nike, coisas do meu irmão mais velho, que amava dar
roupas estilosas para meu filho.
— Emily? Cheguei! — Liam jogou alguma chave na mesinha
e parecia algo familiar. Sorri e apareci na sala, dando uma voltinha.
— Está linda! Então, vamos? Não quero atrasar…
Nós saímos de casa carregando todas as coisas que era
preciso para o bebê. Com Lilo no meu colo, Samuel atrás e minha
lista de reprodução tocando, parecia um domingo lindo pra mim. A
avó de Liam morava em um bairro próximo ao da minha mãe, em
uma casa de dois andares com um jardim lindo.
Ele cuidava muito da avó, o que para mim, dizia muito sobre
sua índole.
Frank saiu de casa assim que estacionamos na frente. Ele
me deu um grande abraço apertado antes de ajudar a carregar
todas as coisas para dentro. Era quase uma mudança. A sala era
linda, enorme, com um lustre de tirar o fôlego e fiquei preocupada
de quebrar algo. Nem soltei Lilo, com medo dela fazer xixi no tapete
fofinho no meio da sala.
— Puta merda! Eu avisei que precisava de um caralho de
um carrinho nessa casa! — Ouvi a vozinha de uma senhora no final
do corredor. Ela tinha uma boca suja. Liam riu e adiantou-se. —
Liam, venha aqui! Eu sou idosa, não posso ir até aí! — continuou
gritando.
— Eu a chamei de velha outro dia e me bateu — Frank falou
atrás de mim, carregando as bolsas e o pudim enquanto Liam só
segurava Samuel em seus braços. — Vou colocar as bolsas no
quarto que é para o Liam, já volto com o pudim. — Ele subiu a
escada e segui Liam, nervosa de ser apresentada para sua avó.
— Você demorou mil anos para trazer uma garota em casa,
finalmente, valeu a pena a espera. Você é linda! — A senhorinha era
muito pequena, morena, grandes olhos claros e cabelos brancos. —
Sou Kimberly Jones, mas todos me chamam de vovó.
— Obrigada pelo elogio. A senhora que é linda, seus olhos
são hipnotizantes.
— Deixei muitos homens aos meus pés. Ficavam tontinhos
comigo. Era ótimo na hora de…
— Vovó! — Liam cortou nervoso e eu ri mais ainda. — Esse
é Samuel!
— Deixe-me sentar para segurá-lo! Eu amo bebês. Ele é lindo
demais. — Sentou-se na cadeira. — Pode soltar a cachorrinha, ela
vai ficar livre. Na casa da vovó é tudo permitido. — Liam entregou
Samuel a ela, que não chorou e nem estranhou, apenas sorriu,
curioso. Ele ficava calmo e quieto a maior parte do tempo, sempre
fofo, com um olhar feliz.
Soltei Lilo, meio preocupada dela ficar perdida, a casa parecia
grande demais para uma única senhora. Lavei minhas mãos e me
ofereci para terminar de cortar os legumes que estavam no balcão.
Liam guardou as cervejas no refrigerador, conversando amenidades
com a avó e me incluindo no assunto. De dez palavras, nove eram
palavrões, ela era um tipo de avó muito louca.
— Acho que encontrei seu telefone, vó. — Liam riu e tirou
um iPhone do congelador.
— Sabia que essa merda estava em um lugar impossível —
ela disse e eu sufoquei a risada. — Decidi não usar mais telefones.
Essa bosta quebra, some ou para de funcionar. Enviem-me cartas
— retrucou e ri mais ainda.
Frank voltou para a cozinha com o pudim e enfiou na
geladeira, depois iria desinformar. Liam sentou do meu lado,
ajudando com os legumes, havia um cheiro delicioso de carne
assando no ar. Meu estômago ficou alegre. Eles agiam como uma
família divertida, provocando um ao outro, a avó acabava xingando
os dois. Samuel começou a ficar irritado, resmungando por tudo e
sentei em outra cadeira, me cobrindo para amamentar.
Ele continuou chorando, mesmo mamando e percebi que
era sono.
— Deixe-me passear com ele no corredor. Talvez ele durma.
— Liam o pegou de mim e foi andando, sem se abalar com o estado
irritado de Samuel. Percebi que Frank estava olhando-o fixamente e
a avó me olhava. Sorri sem graça, sem imaginar o que ela poderia
estar pensando de mim com seu neto e sendo mãe de um bebê.
Ela levantou, me ofereceu uma bebida e Frank me serviu com
suco de laranja. Vovó estava bebendo cerveja, como os meninos.
Liam voltou sozinho, levantei preocupada e ele me levou até onde
colocou Samuel dormindo. Era um quarto de hóspedes no térreo,
ele o cercou de travesseiros e ligou o ar na ventilação.
— Você me emociona com esse carinho. Obrigada. — Fiquei
na ponta dos pés e o beijei nos lábios. Lilo passou correndo pela
gente, com um pedaço de papel higiênico na boca e eu vi que no
corredor havia muito mais. — Ela bagunçou a casa da sua avó.
— Ela não liga. Vou limpar. Está tudo bem? — Ele procurou
meus olhos.
— Sim, sua avó é muito engraçada. — Acariciei seu peito,
confortável por estar com ele e sua família. Toda experiência com
Dylan me traumatizou ao ponto que estava com medo até poucos
minutos antes de chegar ali.
— Vovó é doida, boca suja e irritante.
— Engraçada é o meu tipo favorito de pessoa. — Sorri e nós
voltamos para a cozinha de mãos dadas.
— O bolo está pronto. Frank, coloque a mesa e Liam, me
ajude a tirar essa coisa imensa do forno. Fiz salada de quinoa, os
meninos não comem nada verde, sempre foi um custo.
Achei bonitinho que ela referiu-se àqueles homens enormes
como meninos, como se eles ainda coubessem em seu colo magro.
Arrumamos a mesa em um trabalho em conjunto, fiquei na cadeira
mais próxima do corredor, para ouvir Samuel. Lilo sentou no meu
pé, enroscando-se para dormir depois de ter feito um estrago no
banheiro.
— Qual a história do cachorro? — Frank perguntou
enquanto nos servíamos com as iguarias deliciosas que a avó
preparou. — Você passa o dia inteiro fora, ela vai destruir tudo
enquanto estiver nessa fase.
— Imagino que sim. Irei treiná-la, é claro. Ela é só um filhote,
vai aprender — Liam respondeu tranquilamente e em seguida
contou a história da rinha e o porque suas orelhas estavam
cortadas, assim como a cicatriz no olho esquerdo, exatamente como
a dele.
— Legal, quero participar também. Não é uma boa ideia ter um
cachorro lá em casa. Muita rotatividade. — Frank me deu uma
piscada e ri. Ele era um cafajeste sem coração. Liam revirou os
olhos e colocou a mão livre na minha coxa, apertando com carinho e
trocamos um sorriso. — O que foi, velha? Está olhando fixamente
para os dois.
— Liam demorou mais de trinta anos para me apresentar uma
namorada. Estou pensando em qual história constrangedora vou
contar primeiro — ela respondeu e soltei uma gargalhada alta, fiquei
preocupada de ter acordado Samuel. — Podemos começar com o
fato de que ele nunca queria usar cueca? Uma vez a calça dele
rasgou na escola, era criança ainda, eu não sabia que estava sem
cueca e tive que ir até lá. Em seguida, ele aprendeu que correr
pelado era a melhor sensação do mundo.
Liam ficou olhando para a avó sem acreditar.
— Isso é sério? — Virei para ele, sem me conter. — Gosta
de se exibir, bonitão?
— Depois ele descobriu que o pinto dele era legal — ela
continuou.
— Vó, por favor. — Liam parou de comer.
— Deixa de bobeira! Ela é mãe de um menino, precisa ouvir
outra pessoa experiente. Você tem irmãos?
— Sim. Todos mais novos que eu, mas já são casados e com
filhos. Começaram cedo. Lembro que meu irmão caçula também
teve a fase do pelado e quando aprendeu a fazer xixi em pé…
— Isso é verdade, mas nesse quesito, quem sempre deu
mais trabalho foi Frank. Liam era mais educado e tinha pena da
pobre avó, aí levantava a tampa da privada — ela me respondeu e
segurei a mão de Liam. — Emily. Esse meu neto vale ouro.
— Eu sei, sinto que ganhei na loteria sempre que estou com
ele — assumi timidamente. Liam sorriu e beijou minha bochecha,
Frank fez sons de vômito e a avó deles só me deu uma longa
piscada, feliz com a minha resposta.
O almoço foi delicioso, não só pela comida, muito menos pelo
meu pudim, que estava incrível. Eles eram uma família engraçada e
acolhedora. Enquanto a minha era extremamente carinhosa no
sentido emocional, podia ver o quanto os Jones se amavam
somente com as gritarias, apelidos terríveis e palavrões.
Depois de comermos, sentamos no pátio.
Samuel acordou e ficou sociável. Liam sentou na grama
com ele no colo, brincando com Lilo e filmei com meu celular,
enviando para meus pais, irmãos e melhor amiga. Samuel gritava
toda vez que Lilo vinha correndo e com o grito dele, ela voltava na
direção oposta, rosnando e saltando, de brincadeira.
A avó de Liam me fez sentir bem vinda, querida e me fez rir
como nunca. Foi mágico.
CAPÍTULO QUINZE
Liam
A vida real era o principal motivo pelo qual eu não
acreditava nos filmes da Disney. Nas últimas semanas da minha
vida, foi o que mais assisti na missão de Emily em me fazer
apaixonar pelas histórias. Eu também sabia, no fundo da minha
mente, que as coisas entre nós não ficariam para sempre fáceis e
totalmente divertidas. Meus próprios demônios fariam o serviço.
E eles não me decepcionaram.
Na última noite que dormi na casa de Emily, tive um pesadelo.
Isso não acontecia na casa dela, somente na minha e ironicamente,
estava atribuindo que a presença feliz e iluminada dela não me
permitia ter pesadelos. Sentei assustado, suado e percebi que
minhas mãos estavam fechadas em punhos. Uma vez soquei Owen
no meio da noite quando tentou me acordar de um pesadelo.
Entrei em pânico ao imaginar que poderia fazer o mesmo com
Emily.
Um soco meu em uma mulher delicada como ela era
destruição na certa.
Emily já tinha um passado traumático, ela sempre falava o
quanto o ex-noivo a machucou e eu nunca seria esse tipo de
homem em sua vida.
Fiquei de mau humor, preocupado, nervoso, como sempre
ficava quando tinha esses malditos sintomas pós-traumáticos, nos
dias seguintes, mergulhava em uma loucura que perdia apetite,
ganhava as melhores dores de cabeça que um ser humano não
merecia ter e náuseas.
Emily não entendeu nada quando acordou e nós ficamos
estranhos um com o outro. Ela estava perdida e não sabia como
dizer que eu era totalmente fodido da cabeça.
Cheguei ao escritório depois de descobrir que ela foi trabalhar
sozinha. Me perguntei como levou Samuel para sua mãe e foi
trabalhar. Ela ainda não havia terminado de juntar o dinheiro para
comprar seu carro e estava me sentindo um imbecil por nem desejar
ficar perto de mim. Owen não estava no andar e nem Emily na
mesa. Entrei em minha sala, batendo a porta, irritado.
Sentei na cadeira, segurando a cabeça e tentei achar o maldito
remédio nas minhas coisas.
— Liam? — Emily chamou da porta. Olhei e Owen estava
parado atrás dela, ambos com expressões preocupadas. Naquele
momento eu soube que meu amigo deu com a língua nos dentes.
Olhando para Owen em uma conversa silenciosa com o olhar, Emily
fechou a porta. — Quando ia me contar?
— Agora não, Emily — resmunguei, virando tudo que tinha
na minha bolsa na mesa para procurar os malditos remédios.
— Agora sim. — Ela cruzou os braços com um olhar
ameaçador. — Não começamos um relacionamento somente para
os bons momentos. É para estarmos juntos em tudo. Eu jamais iria
saber que tem estresse pós-traumático se você não me contasse.
— Owen maldito.
— Bom! Ele foi o único com pena de mim! Estava pensando
que tinha feito algo ou a rotina com Samuel fosse demais para você!
Não sabe o que pensei nos últimos quatro dias e a falta fodida que
senti, quando na verdade, poderia ter ajudado! — Exaltou-se e
percebi que ela estava longe de calar a boca. — E me dê licença.
Afaste-se da mesa — ordenou e irritado, fiz o que mandou. Emily
sentou na minha frente e milagrosamente achou o frasco do meu
remédio. Leu o rótulo, tirou dois, me entregou e engoli sem água. —
Agora deite sua cabeça aqui.
— Emily…
— Deite sua cabeça aqui agora mesmo! — Ela me puxou pelo
cabelo e colocou minha cabeça em suas coxas. — Agora abrace
minha cintura e relaxe os ombros. — Continuou ordenando e
obedeci. Emily esfregou minha nuca, fazendo círculos, depois
apertou meus ombros e por fim, massageou meu couro cabeludo
com calma, bem devagar, me deixando todo arrepiado. Fechei meus
olhos, aceitando a massagem e relaxando, minha dor foi
gradativamente diminuindo, até que consegui me movimentar sem
dor. Ergui meu rosto, beijei a barriga dela e os seios. Rindo, Emily
veio para o meu colo. — Não pense que você vai ganhar alguma
coisa hoje.
— Sinto muito — pedi humildemente.
— Por que não confiou em mim? — Seu olhar mostrou
mágoa.
— Não queria te assustar e principalmente, te machucar.
Fiquei apavorado com a possibilidade de te machucar de
madrugada…
— Você não vai — ela falou com muita certeza.
— Não tem como saber. Eu dei um soco em Owen
quando…
Emily sorriu com paciência.
— Sei disso, mas ele é um homem, você o atacou porque
estava revivendo sua missão onde havia outros homens. Eu sou
mulher e não vou te sacudir como ele fez, confie em mim e se você
me machucar, não vai ser de propósito. — Me deu um beijinho na
pontinha do nariz.
— Marquei uma consulta com minha terapeuta. Sempre que
me sinto assim, faço uma sessão e melhoro por alguns meses.
— Eu vou com você para te apoiar. Te espero do lado de
fora e depois jantamos só nós dois, juntinhos e talvez eu te perdoe…
— Sorriu maldosamente e beijei sua boca, encerrando o assunto e
me sentindo perdoado. Continuamos abraçados na minha sala até
que os telefones começaram a tocar e Emily se afastou por precisar
começar a trabalhar. Eu também, afinal de contas, ela não me dava
sossego.
Owen entrou na minha sala com o notebook e começamos a
trabalhar. Era preciso terminar o treinamento dos novos seguranças
e gostava de estar à frente, para ter certeza que eles iriam
responder à qualidade da empresa. Troquei de roupa no escritório e
desci com ele, também de roupa trocada. Emily estava passeando
pela empresa, ela sempre dava um jeitinho de desaparecer e
tagarelar com as pessoas.
Os novos seguranças já estavam se aquecendo, alguns
antigos conversando no canto e quando entrei, chamei um grupo
para o tatame, a fim de começar o treino logo. Suado e algum tempo
depois, percebi que a atenção dos homens se dispersou. Owen me
cutucou e olhei para a porta. Emily estava acenando meio frenética.
As luzes vermelhas do alarme da empresa dispararam.
Desci o tatame correndo e fui até ela.
— Estava no sistema quando tudo ficou escuro e teve o sinal
de alerta dos computadores. Os computadores da sala de Owen
estão frenéticos! — gritou, nervosa. Ela sempre surtava com os
alarmes e a maior parte deles era para nos chamar atenção.
— Owen, precisamos subir! — chamei e ele largou o que
estava fazendo, vindo na minha direção.
Emily correu do nosso lado, explicando detalhadamente tudo
que conseguiu ver e empurrei a porta da escada. Se fosse uma
invasão ao sistema, poderíamos ficar presos no elevador. Entramos
na sala de Owen, percebendo que se tratava mesmo de uma
invasão e a pessoa estava quase conseguindo passar pelo nosso
bloqueio. Owen xingou e digitou algo, puto da vida.
— Precisamos sair daqui agora! — Ele puxou Emily pelo
braço. Só deu tempo de empurrá-la para fora e cobrir seu corpo com
o meu. Os computadores explodiram, voando peças por todo lado.
Virei para Owen, desejando matá-lo. — Eu programei uma recarga
aos servidores se sofrêssemos algum tipo de invasão. É uma das
barreiras que temos, meu computador é o servidor registrado…
O sistema de incêndio começou a jorrar água do teto.
— Acha que eles entraram? — Emily perguntou, espiando
os cacos de vidros e peças.
— Nós somos equipados para isso, as informações se
espalham criptografadas e migram para os servidores extras. É algo
que só eu tenho, é o meu código. Pelo menos sei que meu
computador não foi o único a explodir. O que acontece aqui,
acontece lá. — Ele suspirou e olhou para a sala molhada.
— Emily, evacue a empresa. Nós precisaremos fazer uma
varredura nos acessos e é um longo processo. Preciso que liberem
todos os andares e computadores, em seguida, use seu código para
bloquear o acesso remoto de todos os aplicativos e computadores
externos — pedi, ela arregalou os olhos e saiu imediatamente.
Depois disso, a correria começou. Era a parte chata do
nosso trabalho, fazer varreduras e verificações de segurança. Emily
precisou ir embora, foi até mais tarde que seu horário usual.
Entreguei a chave do meu carro e apartamento, para que buscasse
Lilo e levasse para sua casa para passar a noite, prometi que
chegaria em algum momento e que não me esperasse acordada.
Owen ficava com um humor ridículo quando tentavam invadir
nosso sistema. Era um mercado competitivo, queriam mesmo saber
se cumprimos o que prometemos e claro, sempre tentavam fazer
com que nossos sistemas caíssem e nossos clientes ficassem
expostos.
— Quando você me disse que ia fazer o computador explodir
quando tentassem nos invadir, achei legal. Agora temos Emily aqui.
Ela é diferente de Bárbara e entrou em sua sala. Se explodisse com
ela lá dentro? — Minha preocupação estava fazendo as veias da
minha testa latejarem.
— Eu sei, cara. Não vou refazer isso e quer saber? Está tarde
e não pode me ajudar nessa parte, vou ficar bem sozinho. Emily
está em casa, com o bebê, um cachorro e cansada. Vocês estavam
brigados, então, vá ficar com sua mulher. — Ele me dispensou e
levantou para fazer café.
Como se eu não tivesse criado o sistema com ele, mas aceitei,
eu precisava valorizar meu tempo com Emily e Samuel.
— Me ligue se precisar de qualquer coisa. — Reuni minhas
coisas, porque realmente queria me desculpar adequadamente com
Emily. Ela ficou na merda com meu humor estúpido e na verdade,
ainda estava com uma dor de cabeça irritante e com muito sono,
devido a quatro noites em claro, sofrendo com a ansiedade.
Chamei um táxi e felizmente, ele não demorou três minutos
para chegar e em menos de quinze estava no prédio dela. Sem
trânsito à noite, era possível andar rápido na cidade. Passei pelo
porteiro noturno, que me deixou entrar sem anunciar e no elevador,
o único vizinho que Emily conhecia me olhou torto antes de sorrir
amigavelmente. Ele foi até a porta dela um dia, pedindo açúcar e
querendo se aproximar.
Emily me contou que o conheceu na academia e foi simpático.
Claro que foi simpático! Uma mulher bonita e jovem na academia
era o ambiente perfeito para caçada. Só que ele deu de cara
comigo, somente de bermuda e com Samuel de fralda no meu colo.
Lilo latindo feito louca no modo irritante que conseguia entrar ao
redor de estranhos. Desde então, o vizinho só acenava de longe e
não teve mais conversas à beira da esteira.
Entrei no apartamento dela, estava tudo quieto e meio escuro.
Lilo veio correndo da sua cama, balançando o rabo, soltando sons
de felicidade e arranhando minhas pernas. Acariciei sua cabeça,
ajoelhei e deixei que me cumprimentasse até ficar calma. Ela estava
crescendo muito rápido e eu precisaria me mudar para acomodá-la
melhor.
Deixei minha pasta no sofá, tirei minha blusa e fui até o
quartinho de Samuel. Ele estava dormindo com a chupeta caída do
lado. Puxei sua coberta e beijei sua cabeça, morrendo de saudades.
Além de perder Emily esses dias, perdi meu menino sorridente, que
deixava escorrer baba por toda minha roupa e tinha o cheiro mais
doce do mundo. Entrei no quarto dela, encontrando-a dormindo.
Me inclinei na cama, ela se assustou um pouco.
— Sou eu, amor. — Beijei seus cabelos e se espreguiçou. —
Não precisa levantar, vou apenas tomar banho.
— Deixei um prato de comida pronto, só aqueça e coma.
— Volte a dormir, já venho deitar do seu lado.
Dormir era meu maior medo e maior desejo. No banho, decidi
que se me sentisse remotamente agitado, iria dormir na sala.
Deitaria um pouco com ela para testar as águas, caso acordasse
com algum pesadelo, iria para o sofá. Me sequei, vesti uma cueca
que já estava na casa dela, assim como peças aleatórias das
minhas roupas e outras coisas.
A comida guardada lembrou da minha avó. Emily a adorava e
era totalmente mútuo, as duas até conversavam separadamente.
Minha mãe ficou sabendo do almoço em família, ficou chateada,
mas ainda não estava pronto para envolver meu relacionamento
com minha mãe. Tudo era muito complicado entre nós. Eu não tinha
certeza se acreditava nela, em seus sentimentos e mudanças. Ela
voltou porque não tinha mais para onde ir e nem mais idade para
realizar nada.
Não foi por amor ou por saudade.
Terminei de comer e até da comida dela estava com saudades.
Não queria mais ser um homem fodido, estava com a oportunidade
verdadeira de ser feliz e não podia perder tudo.
— Está tudo bem? — Ouvi Emily perguntar do corredor. Lilo
foi correndo até ela, fazendo festa. — Você acabou de me
atormentar querendo subir na cama, me dá um tempo — reclamou e
veio até mim, só de calcinha e uma blusinha fina. — Parece perdido
em seus pensamentos. Atrapalho?
— Só estava pensando no quanto senti sua falta e não quero
estragar isso. — Fui sincero e seu olhar curioso amoleceu. Emily se
colocou entre minhas pernas e me abraçou apertado.
— Basta não me empurrar para longe — sussurrou e segurei
seu rosto, admirado com a sorte grande em tê-la. — Essa é a hora
de me contar tudo, vamos lá.
— Não posso ter filhos. — Soltei, meio sem pensar. Emily ficou
muda e com o rosto em branco. — Deveria ter te contado antes, não
é?
— Deveria. Você não está tentando ter uma família substituta
comigo e Samuel, certo?
— Eu quero ter uma família com vocês, não porque eu não
posso ter filhos, mas porque me apaixonei por você e por ele. Não
posso te amar sem amar seu filho.
Emily sorriu abertamente.
— Então, está tudo bem! — Ela sentou no meu colo, me
abraçando. — Lamento que não possa ter filhos, deve ser difícil
conviver com isso, mas não é preciso fazer um filho para ser pai. Se
o nosso relacionamento evoluir para aumentar a família um dia,
podemos adotar. Você acha que é capaz de amar uma criança, não
feita por você, como seu filho? — questionou pensativa e eu a olhei
como se fosse louca.
— Qual a parte que eu amo Samuel você não entendeu?
— Estamos acertados. A parte boa? Adeus camisinhas! —
Saiu do meu colo e me puxou para ficar de pé. — Vamos transar
loucamente sem camisinha a partir de agora.
Antes de irmos, segurei-a no lugar.
— Estou falando sério em fazer parte. Não é uma questão de
se o nosso relacionamento evoluir para adotarmos uma criança,
mas sim de quando chegar o momento certo. Quero estar com você,
chegar em casa e te encontrar. Mais almoços de família, ensinar Lilo
novos truques e cuidar de você, do Samuel e quantas mais crianças
puder.
Emily ficou emocionada.
— Eu ia te deixar de castigo por ser um idiota, mas tudo que
quero é pular em você agora.
Abri meus braços de brincadeira.
— Sou todo seu.
Apesar de ser muito triste pra mim não ter meus próprios
filhos, Emily me dava esperança em olhar para a vida positivamente.
Sou grato que sobrevivi àquela missão. Posso andar, lutar, comer, o
que era bem diferente de muitos amigos e companheiros de equipe
que sofreram ataques. Tinha sequelas fodidas, tanto que depois de
fazer amor com Emily, precisei tomar mais uma dose da medicação
e rezar para não ter pesadelos.
Owen tomava medicação para dormir sempre que ficava
agitado, ele conseguia relaxar, mas não perdia seus sentidos. Talvez
devesse começar a ceder também. Não queria estar irritado e
intransigente o tempo todo a partir de picos de estresse.
Acordei assustado e dessa vez, não foi um sonho e sim o
choro baixo de Samuel que soava na babá eletrônica bem no meu
ouvido. Levantei sem acordar Emily e fui até o quarto dele. Era a
hora de sua mamada noturna, apesar de dormir mais tempo, ele
continua acordando com fome de madrugada ou molhado de xixi.
Samuel não ficava com a fralda mijada, ele começava a chorar.
Ele parou de reclamar alto quando me viu.
— Eu nunca troquei a sua fralda antes, mas a sua mãe está
cansada e você vai cooperar comigo — conversei com ele, que riu e
chorou ao mesmo tempo. Levei-o para o trocador e fiz todo o
procedimento que vi Emily fazer mil vezes nos últimos meses. Ele
cresceu tanto, estava parecido com ela, com cabelos escuros que
deveria ser herança do doador de esperma. No mais, era uma
criança muito alegre como a mãe.
Troquei sua fralda com sucesso, peguei-o no colo e fui até a
geladeira. Eu sabia como preparar seu leite materno que ficava
reservado e ele resmungou, mas esperou. Chupando a chupeta,
jogou longe ao ver a mamadeira. Sentei na sala com ele e Lilo quis
subir no sofá. Sem Emily ver, porque não gostava, a deixei subir
também, deitando do meu lado enquanto Samuel mamava e batia o
pezinho devagar na pelagem escura da cadelinha, como se fizesse
um carinho.
Eu os queria para sempre. Qualquer pessoa me chamaria
de louco, estávamos juntos há apenas alguns meses, só tivemos
brigas pequenas e não passamos nenhuma dificuldade. Por que
sentia que estava pronto para começar uma vida em família?
Justamente com ela, a maluca que me fazia assistir filmes de
princesas e me fez prometer ir à Disney para o aniversário de um
ano do Samuel.
Enquanto Samuel mamava, comecei a procurar casas grandes
o suficiente para todos nós. Quem sabe ela aceitaria morar
comigo…
Bastava pedir, certo?
Meu estômago torceu de pura ansiedade.

CAPÍTULO DEZESSEIS
Liam
Demorou mais de uma semana para conseguir marcar a
primeira visita a uma casa. Emily achou uma excelente ideia para
Lilo crescer com mais espaço. Eliminei uma série de imóveis que
não tinham muito a ver comigo, assim como também não tinham
muito a ver com ela. Apesar de ainda não ter feito o pedido para vir
morar comigo, queria que ela gostasse do lugar.
Imaginava que se ela gostasse da casa também, facilitaria
aceitar o pedido.
Ao meu lado, no elevador, bocejou pela terceira vez. Nós
não dormíamos separados desde a noite em que fizemos as pazes
e claro, tivemos mais duas brigas irritantes no caminho, porém,
ficamos bem no mesmo dia. Samuel estava com seis meses agora,
era um menino bem grande, lindo, mas o dentinho estava rompendo
e isso fazia com que chorasse o tempo todo. Ele queria ficar
mamando ou deitado em cima de mim, era impossível dormir.
Lidava com a privação de sono melhor do que ela.
Emily estava quase despencando.
Insisti para que ficasse em casa, que descansasse enquanto
Samuel estava com a mãe, mas, ela não queria ser favorecida
porque estávamos namorando. Era uma tremenda estupidez. Eu
precisava de uma folga dela. Emily era uma excelente assistente, só
não me dava sossego. Empurrava todos os compromissos para os
dias da semana, me impedindo de trabalhar aos domingos para
poder ficar em casa com ela.
Nos dias que estava com raiva de mim, mal me dava a
oportunidade de tirar meu horário de almoço. Entendi perfeitamente
que ela sabia como se vingar sem ferir.
Saímos no nosso andar e Owen estava brincando de socar
Frank, os dois viviam nessa palhaçada, como crianças.
— Olá, casal feliz. — Frank nos deu um sorriso. — Estou
pronto para meu primeiro dia.
— Sua sala está pronta, idiota. — Sorri, verdadeiramente feliz
que meu irmão finalmente deixou o escritório pomposo do outro lado
da rua para assumir o setor jurídico da minha empresa. — Agora a
equipe está completa.
— Estou feliz que esteja aqui, Frank — Emily disse e
bocejou. — Desculpe, preciso de algo para acordar. Acho que vou
beber café. — Saiu de perto, indo para o nosso refeitório. Marisa já
deveria ter passado por ali, porque a mesa estava repleta de
comida.
— Você tem que deixar a garota dormir… — Frank bateu no
meu ombro.
— Não sou eu o homem que está deixando-a de pé a noite
inteira. É Samuel, ele chora se o colocamos no berço, o dente está
nascendo, coçando e fica agoniado — respondi e olhei a hora. —
Vamos comer, quero sair mais cedo. É o jantar de aniversário da
irmã da Emily hoje à noite.
— A garota maluquinha? — Owen veio atrás de mim.
— Sim. Vocês deveriam ir também. Ela vai gostar de revê-los
— Emily disse da mesa, bebendo seu café forte. — Ela os adorou.
— Eu também a adorei — Frank disse rindo.
Eles se conheceram em um jantar que Emily ofereceu para me
apresentar à sua melhor amiga, Jenna e o marido, Zayn. Nós
tivemos uma chamada de vídeo com Olívia e Justin, combinamos de
nos encontrar em breve. Regina estava lá e se aproximou do meu
irmão e amigo. Eu percebi imediatamente que eles estavam
interessados.
Owen fez uma careta atrás dele, parecendo decepcionado,
mas não percebeu que eu vi. Regina era bonita, extrovertida,
tagarela e fazia milhões de insinuações sexuais por minuto. Era bem
mais o tipo de Frank do que dele, mas aquilo era algo que eles
poderiam resolver sozinhos.
Emily começou a trabalhar e a me perseguir, ela estava com
mil pastas de contratos e documentos na mão, recebendo ligações,
bocejando e com os olhos lacrimejando. Depois do almoço com
Samuel, que chorou a maior parte do tempo, ela ficou insuportável,
distribuindo patadas aleatórias e eu decidi que naquele momento ela
seria apenas a minha assistente e de ninguém mais. Enviei a ela um
pedido para contratar uma assistente para Owen e Frank, já que o
trabalho deles era bem mais resumido que o meu.
— Você quer outra assistente? — Emily invadiu porta adentro,
enquanto eu estava no meio de uma ligação. Sua expressão era de
pura fúria.
— Obrigado por sua compreensão, vamos trabalhar nessas
falhas e já enviarei novos seguranças para substituição — continuei
falando no telefone e ouvi meu cliente me convidar para jantar em
sua casa. Ele sempre era muito amigável, como um avô querido. —
Obrigado pelo convite, irei com prazer. Até mais. — Encerrei a
chamada e olhei para ela, ainda bem furiosa. — Você está
sobrecarregada.
— Isso quer dizer que não estou dando conta do meu
trabalho?
— Você é minha assistente, Emily. Não de Owen ou Frank,
fazer mais de uma função é contra a lei. A não ser que seja paga
para isso, mas como é uma pessoa só e não quer ser favorecida
pelo nosso relacionamento pessoal, estou contratando mais uma
assistente que trabalhará para eles… — Dei a ela um sorriso porque
ela ficou desconcertada. — Você. é. só. minha. — Pontuei cada
sílaba.
Sem resposta, grunhiu e deu as costas.
— De nada! — gritei, olhando para sua bunda o tempo todo.
No final do dia, reuni minhas coisas e um monte de trabalho
para terminar após o jantar. Frank e Owen estavam sorrindo como
idiotas, eles pensavam que eu estava dominado. Meu irmão me
perturbava a cada oportunidade que tinha sobre o quão rápido o
nosso relacionamento evoluiu. Eu não me arrependia. Nunca me
senti tão feliz e apaixonado, encontrei a pessoa da minha vida.
Descemos os quatro no elevador, Emily bateu em Frank
quando ele tentou mexer na orelha dela, implicando. Ela também
poderia estar de TPM, o que descobri que não era um bom
momento no mês. Fiz a anotação mental de comprar chocolates,
porque ela gostava de comer assistindo televisão enquanto
colocava uma bolsa quente no ventre para cólica.
Eu nem sabia que a bolsa quente aliviava cólicas. Estava
aprendendo muitas coisas sobre o mundo feminino, inclusive, que
ela nunca tinha absorventes o suficiente e me fazia comprar toda
maldita vez. Fiquei parado em uma farmácia me perguntando onde
encontraria com abas, era difícil, havia muitas opções, mas
consegui. Não era homem de abandonar missões complicadas.
Ela voltou a menstruar a pouco tempo e ficou assustadora.
Meu telefone tocou e era Louis[6], enviando informações sobre
a família de Emily na Rússia, que ele conseguiu com um contato da
Inteligência Britânica. Por duas vezes, acreditei que estávamos
sendo seguidos, carros fora do comum e em lugares de fácil fuga.
Seria alguém me seguindo pelo meu trabalho ou por causa dela? De
fato, era curioso e eu precisava saber mais.
A família de seu ex-namorado pesquisou sobre ela mais de
uma vez nas redes sociais. Owen implantou um guardião nos
computadores deles, que rastrearia as palavras que queríamos,
como Samuel, Emily, Williams e Chicago. Alguém lá gostava de
verificar o perfil de Emily. Ela ficou um pouco irritada quando contei,
mas não costumava publicar nada, só olhar as atualizações dos
outros.
Louis avisou que havia uma Rostov no país, morava em D.C
e não usava mais o sobrenome, estando casada com um italiano. A
outra Rostov não parecia envolvida nos negócios. Restava um
pequeno braço da organização criminosa que Kátia comandava.
Não havia qualquer registro deles nos Estados Unidos há um bom
tempo.
Sobrava minha outra opção: o pai de Emily não ser quem ele
dizia ser.
— Minha mãe está pedindo para pegarmos o bolo. Ela não
conseguiu sair porque Samuel está chorando desde cedo — Emily
disse no carro e me passou o endereço da confeitaria. — Dentes.
Eles não podiam nascer sem fazer meu bebê chorar?
— Só está coçando e ele não entende como reagir a isso.
— Como sabe disso? — Ela virou no banco.
— Li na internet ontem. Queria entender para saber como
ajudar.
— Você é tão fofo — ela disse, rindo. Realmente estava
dominada pelo sono, porque eu não tinha nada de fofo.
Pessoas fofas eram chatas.
Ao chegar na casa, Owen e Frank já estavam nos fundos,
com a família de Emily. Já estive ali algumas vezes, em churrascos
de família, em outros almoços e claro, todos os dias buscando
Samuel com Emily.
— Vou contratar uma babá, mamãe. A senhora está cada dia
mais sobrecarregada com Samuel e eu sei que meus irmãos estão
reclamando que você não está com tempo para seus outros netos.
— Emily pegou Sammy no colo, que seguiu coçando os dentes. —
Eu vou te dar o mordedor gelado, meu amor. Mamãe vai fazer
passar!
— Deixa que faço isso. Vem comigo, garoto — chamei e ele
esticou os bracinhos gordinhos, com seus grandes olhos e cílios
grossos molhados de lágrimas. Peguei-o e o beijei, ouvindo a mãe
de Emily me dizer onde estava o mordedor no congelador.
— Não quero uma babá, não precisamos de uma. Estamos
bem e seus irmãos são dois idiotas, vou chamar atenção deles por
serem tão ciumentos. Quando os filhos deles nasceram,
praticamente me mudei para a casa deles. Tem vovó pra todo
mundo! — Joana disse com a mão na cintura. Eu estava proibido de
chamar os pais de Emily de senhor e senhora, era muito estranho
porque não foi assim que fui criado. Minha avó arrancaria a minha
pele se faltasse com respeito a qualquer adulto. — Vá dormir um
pouquinho, minha filha. Ainda estou assando a carne. Regina está
com os amigos lá fora.
Emily aceitou ir deitar na sala de televisão, mas pediu que a
acordasse se Samuel ficasse muito irritado. Fiquei com ele do lado
de fora, sentado no banco de balanço, observando a maluquinha da
irmã dela rir e brincar com os amigos, junto ao meu irmão e amigo,
assim como seus irmãos com as esposas distraindo as crianças. O
pai de Emily estava o tempo todo servindo bebidas, ocupado em
manter os convidados satisfeitos.
— Posso te fazer companhia? — Jenna parou ao meu lado
com duas garrafas de cerveja. Samuel se agitou um pouco com a
voz dela e o acalmei. — Você leva jeito.
— Acho que é ele que leva jeito comigo. — Voltei a ninar
Samuel. Ele estava chupando o mordedor gelado com força. —
Estou aprendendo.
— Isso é bom. Emily merece alguém que ame Samuel tanto
quanto ela.
— Então tenho seu selo de aprovação? — provoquei.
— Basta deixar Emily ser quem ela é e amá-la
incondicionalmente. Sejam felizes.
— Sua amiga me faz muito feliz.
Samuel soltou o mordedor, fechando os olhos para dormir.
Comecei a niná-lo com mais concentração e Jenna me deixou
sozinho, para não incomodá-lo e ao mesmo tempo que ela levantou,
Emily saiu de dentro da casa com o rosto todo amassado e uma
mamadeira na mão. Seus mamilos estavam doloridos de tanto que
Samuel mastigava para aliviar o dente.
Sentando do meu lado, me entregou a mamadeira e deitou a
cabeça no meu ombro. Ela fechou os olhos e os dois adormeceram
contra mim. Não havia melhor sensação. Owen e Frank estavam se
divertindo, no meio de garotas bonitas e solteiras, mas eu estava
muito mais feliz com uma única mulher ao meu lado e um bebê nos
meus braços.
Fomos embora para casa tarde da noite. Desliguei os
despertadores, para que dormisse até mais tarde. Poderíamos fazer
um trabalho remoto antes de visitarmos uma das casas que a
corretora selecionou.
— Bom dia. — Ela me deu um beijo suave nos lábios. —
São nove horas da manhã. Essa noite todo mundo apagou.
Inclusive a Lilo. — Deitou-se em cima de mim. Lilo estava em pé ao
meu lado da cama, jogando bafo de ração no meu rosto. Samuel
agarrou meu cabelo, enfiando o dedo em meu olho. — Isso que
chamo de amor. Oh, garoto bruto.
— Espere só quando ensiná-lo a brincar de lutinha — murmurei,
ainda sonolento. A terapeuta passou um remédio para dormir, mas
não precisei tomar na noite anterior, de tão cansado. Não era
preciso remédio quando um bebê te deixava na privação de sono
por muitos dias. Até o estresse pós-traumático corria pela janela
quando Samuel começava a chorar e não parava mais.
— Coisa de meninos. — Revirou os olhos e prendeu o
cabelo. — Não tem muita coisa boa para o café da manhã, vou dar
um pulo na lanchonete da esquina. Perdemos a hora, não ouvi meu
celular despertar.
— Eu os desliguei. Imaginei que trabalharia de casa, mas
agora temos que sair.
— Eu vou lá e já volto, não vou conseguir sair sem comer e
não quero encontrar a corretora cheirando a bacon. Se comportem.
— Levantou e saiu do quarto, reparei que já estava vestida com
jeans e camiseta larga.
Coloquei Samuel sentado em meu peito. Ele estava só de
fralda, um fio de baba escorreu de sua boca para meu pescoço.
Beijei sua barriguinha, fazendo cosquinha e ele riu alto, gritando.
Lilo deu um salto e subiu na cama, rolando com a gente. Era
engraçado que ela nunca o machucava, mesmo quando ele
conseguia agarrar uma parte dela. Acalmei a brincadeira depois de
um tempo, colocando os dois deitados e fazendo carinho.
— Quer comer uma banana antes da mamãe voltar? Vem, Lilo.
Se Emily te vê em cima da cama ela vai brigar comigo.
Quando Emily voltou, cheia de sacolas com comida, Samuel
estava com banana até nos ouvidos, de tanto que ele zoneava a
fruta enquanto comia. Era um pouco na boca e o resto em todo
lugar. Ela tirou várias fotografias como sempre e nós nos dividimos
para arrumar a bagunça e sair de casa a tempo.
Entrei no chuveiro com Samuel, era mais rápido tomar banho e
dar banho nele ao mesmo tempo. Emily encostou na pia, de braços
cruzados e um olhar contemplativo.
— O que foi?
— Gosto de te ver com ele. Dá um quentinho no meu coração.
— Esticou uma toalha, para entregá-lo limpinho. Samuel gritou por
sair da água, sacudindo as pernas e reclamando com a mãe como
se brigasse com ela. — Ei garoto, já começamos tão cedo? Você é
um resmungão!
— Igual à mãe — murmurei e ela me deu um olhar bravo antes
de sair do banheiro com ele fingindo chorar. Já havíamos aprendido
a diferenciar o choro falso dele de um bem verdadeiro. Terminei meu
banho e me vesti tão rápido que ela mal havia conseguido passar a
camisa pelo pescoço dele. Samuel não gostava de se vestir
também.
Emily olhou desanimada para ele, meio puta, porque sempre
era uma luta e ri. Seis meses de extrema personalidade. Ajudei-a,
porque seria mais rápido e dez minutos depois estávamos no
elevador em direção ao carro.
A primeira casa que vimos não era bem o que imaginava, a
segunda muito menos, era grande demais. A terceira e a quarta
eram longe do trabalho e havia coisas desnecessárias, como uma
quadra de tênis. Na quinta, já não estava mais com paciência com a
corretora e por fim, havia a sexta, que era em um bairro próximo ao
da minha avó e apenas quinze minutos da casa dos pais de Emily
se pegássemos a estrada estadual.
Antes de sair do carro, nós olhamos a casa. Era bonita,
também um pouco grande, cinco quartos… parecia muita coisa. A
fachada de pedra era bonita e impressionante. Não havia
palhaçadas, além de um quintal nos fundos, um jardim na frente e
piscina com área gourmet. A casa toda por dentro era normal,
bonita, piso de madeira, grandes janelas, tudo bem espaçoso e
confortável com os móveis que estavam dentro.
— A casa vem com tudo, toda mobília é nova. Os donos
reformaram a parte da frente e construíram o restante para o
casamento, só que precisaram se mudar para outro estado pelo
trabalho de um deles, nem chegaram a morar. Estão vendendo com
tudo dentro — a corretora nos informou e vi o olhar admirado de
Emily com o lustre. Ela tinha uma coisa com lustres.
Cresci em um lar do tamanho da sala. Quando comprei uma
casa para minha avó, dei-lhe uma mansão. Ela reclamava, mas
amava o lugar. Eu prometi que quando mudasse de vida, daria a ela
a melhor casa que pudesse comprar. Aquela seria pra construir
minha família, um lugar onde pudesse dar estabilidade e segurança
à mulher e ao bebê parados no meio da sala, ouvindo a corretora
discursar sobre o bairro.
Samuel quis vir no meu colo e Emily o entregou, relaxando os
braços. Ele deitou a cabecinha no meu ombro, sonolento.
— Vou deixá-los a sós para conversarem. — A corretora
saiu por um momento.
— O que você achou?
— Ela é linda, tem bastante espaço e acho que estou
apaixonada pelo teto. Tem portões grandes, dá para Lilo crescer
livre sem fugir para a vizinhança…
— Você gostou ao ponto de considerar viver aqui? — Joguei,
incerto sobre como fazer o convite formalmente.
Emily me deu um olhar engraçado e depois riu.
— Você pensou por um segundo que moraria aqui sozinho? Já
até escolhi o quarto do Samuel. — Piscou e eu ri, sem jeito. —
Estou brincando, mas você não é muito sutil, querido. Tem falado
repetidamente, ao ponto de me irritar, que é importante que eu
gostasse da casa também, não só hoje, como nos últimos dias.
Você quer dar esse passo?
— Nós não ficamos separados…
— Não ficamos e eu amo a nossa rotina, a vida a dois como
casal e três como família. Quando me disse que queria aquilo todos
os dias entendi que chegaríamos a isso, principalmente depois que
falou de procurarmos casas. Então sim, eu amei a casa e mal vejo a
hora de nos mudarmos.
— Vou fazer a oferta. — Meu sorriso era impossível de
conter.
Emily me deu um beijo e esmagamos o bebê entre nós.
Samuel me agarrou, sinal que não queria me soltar e nós dois, os
homens da casa, procuramos a corretora e fizemos a nossa oferta.
Ela sorriu, provavelmente exultante com uma venda e marcamos de
fechar a papelada o mais rápido possível.
— Temos muito o que comemorar hoje, filho! — Emily brincou
com Samuel.
Ele nos olhou e apenas sorriu, em sua simplicidade e
inocência. Manter aquele olhar feliz e de amor era minha missão de
vida. Emily e Samuel sempre seriam felizes ao meu lado porque eu
os amava incondicionalmente.
CAPÍTULO DEZESSETE
Emily
Liam estava me olhando esquisito a manhã inteira. Eu não
fazia ideia o que deu nele nas últimas semanas, mas era o dia da
comemoração de sete meses do Samuel e a primeira noite oficial na
casa nova. Nós levamos um mês entre o processo burocrático e a
mudança. Eu achava a parte de empacotar e desempacotar muito
chata, ele resolveu isso contratando pessoas e nós só fizemos o
que era muito íntimo e confidencial.
Sempre esquecia que Liam tinha dinheiro, ele não era
ostentoso e nem esnobe, nossos gastos eram bem simples
considerando o quanto ele realmente tinha em sua conta bancária.
Ele fugia do estereótipo de pessoa que cresceu rica, porque não foi
o caso e fugia da pessoa que ficou rica depois de adulto. Era
íntegro, honesto, honrado, com os dois pés no chão e todos esses
motivos me faziam amá-lo demais.
— O que foi, sr. Jones? Você está me olhando…
— Admirando sua beleza, srta. Williams — respondeu e
roubou um docinho do bolo que encomendamos para o
aniversariante do mês, que estava sujo de frutas no momento.
— Você não é muito fã de festas, não é?
— Não é isso. É a primeira vez que iremos receber a sua
família e a minha…
— Está preocupado com a sua avó?
Liam ficava meio temeroso de sua avó soltar palavrões e
ofender alguém. Não que ela se importasse.
— Ela é meio louca, Emily.
— Licença poética da idade e por criar dois meninos. Deixe-a
em paz e a minha família vai amá-la. Eles já adoram Frank e Owen,
mesmo os dois querendo a Regina — provoquei e ele grunhiu.
Minha irmãzinha pervertida conseguiu a proeza de ficar com os dois,
como sabia que ela não tinha limites, imaginava que foi ao mesmo
tempo. Regina era do tipo livre para voar e fazer o que bem
entendesse. Se eles toparam, são todos adultos e poderiam se
resolver sozinhos.
Liam achava que não rolou em grupo porque Owen era
muito tímido e inseguro com sua aparência. Eu o achava um homem
realmente bonito e gentil. Ele era doce e engraçado, inteligente e
muito querido. Claro que Regina ficaria com ele. Já Frank, além de
bonito, era bobo, piadista e um tanto safado. Os dois eram a
combinação do que ela adorava em um homem.
Eu decidi que não precisava de dois. Sexo com Liam era uma
maratona. Ele realmente gostava muito, o que me fez descobrir
sexo de um jeito diferente. Apesar de ficar excitada e ter alguns
orgasmos, sexo sempre foi “ok”. Se tivesse tudo bem, sentia um
pouco de falta, mas não morria por isso. Já fiquei mais de dois anos
sem nada, incomodada porque afetou minha autoestima, mas não
realmente sentindo falta.
Até Liam me mostrar o quanto tudo podia ser delicioso e
saudável. Ele era criativo e safado, aprendemos muito juntos e
exploramos nossa intimidade.
Nós nunca fizemos sexo no escritório, havia câmeras por todo
lugar. Me pegava sentada na minha sala, imaginando invadir a sala
dele e tirar minha roupa, sendo rudemente fodida em cima da mesa
gigante.
— Emily? Você está com aquele olhar safado que
basicamente me obrigou a te comer contra a parede duas horas
atrás — Liam disse do outro lado da ilha, no meio da cozinha e eu
sorri, mordendo o lábio. — O que você está pensando? —
Movimentou-se lentamente, como um leão espreitando sua presa.
— Em você me fodendo na sua mesa do escritório. — Fui
honesta e ele fechou os olhos, respirando fundo e veio para trás de
mim, me segurando pelo quadril. Empurrei minha bunda para trás,
ao seu encontro.
— Aquela saia de ontem me deu tantas ideias… —
sussurrou e mordeu o lóbulo da minha orelha. Provoquei-o com um
beijo safadinho, esfregando minha bunda que tanto amava em seu
pau só para endurecer. — Sorte a sua estar de calça, ter um bebê
no ambiente e menos de meia hora para sua família chegar.
— Vou guardar esse fogo em um potinho e abrir a tampa no
quarto.
— Olha só como você me deixa? Porra… só de pensar fico
duro. Você me mata, mulher. — Trocamos um beijo aquecido e
então, Samuel começou a gritar. Ele cismou de gritar toda vez que a
gente se beijava e queria um beijo também. Liam riu, se afastando
de mim e ergueu o bebê no alto, fazendo bagunça.
Samuel gritou de alegria. Não existia amor maior. Ele
realmente amava meu filho não só nos bons momentos. Era o mais
rápido trocador de fralda, aquele que ficava acordado de madrugada
quando Sammy ficava com febre e imitava a voz do Buzz “ao infinito
e além” para fazê-lo rir. Liam ia a consultas médicas e fazia
perguntas pertinentes. Nós nunca falamos sobre rótulos, mas ele
era um pai incrível para o meu filho.
Vi a tristeza profunda em seu olhar quando me contou que não
podia ter filhos. Liam possuía um coração tão bonito e era o tempo
todo julgado por sua aparência. Eu via que a insegurança dele sobre
si mesmo não era totalmente infundada. Algumas mulheres davam
em cima dele e existiam outras que o olhavam com certo desprezo
por suas cicatrizes. Sorte a minha, porque além de enxergar a
beleza interior, ele era lindo.
Todo grandão, forte, gostoso até o último fio de cabelo.
Quando usava jeans, ficava descalço, sem parecer um CEO era
uma coisa. Logo que nos mudamos, ele usou um cinto de
ferramentas. Se Jenna não estivesse me ajudando a arrumar
minhas roupas no closet, certamente iríamos transar e deixar a
porra da mudança para depois.
— Emily! Pare de me olhar assim! — Liam brigou comigo,
grunhindo. Soltei uma gargalhada e me pendurei nele, beijando seu
pescoço. — Respeite a presença do Samuel, sra. Impertinente.
— Você sempre pode me punir mais tarde.
— Tchau, nós vamos ver tevê — ele disse e saiu da
cozinha.
Continuei rindo sozinha e voltei a minha tarefa de tirar os
docinhos da caixa. Terminei de arrumar o aparador da sala de jantar
com o bolo, docinhos e alguns cupcakes. Era apenas nós, tentava
comemorar todo mês, nem sempre fazia algo com bolo, mas
passava o tempo todo comemorando com meu bebê. O nascimento
dele mudou a minha vida, e para melhor.
Subi para trocar de roupa e em seguida, pedi que Liam
colocasse a roupinha limpa de Samuel e o limpasse da bagunça da
laranja. Decidi deixar Sammy só na mamadeira e beber um pouco
de vinho no jantar. Assei lasanha e uma torta de queijo, fiz uma
salada verde bem elaborada e Liam fez as entradas. Ele cozinhava
muito bem.
Prontos, ele quis verificar se a casa estava perfeita e revirei os
olhos.
— Não fica nervoso, todo mundo vai se amar assim como
eu amo você. — Beijei sua boca e a campainha tocou. — Vão
atender, os dois. Estão lindos. — Incentivei e ele foi, meio tenso.
Meus pais foram os primeiros a chegar e minha mãe teimosa
trouxe mais comida e uma torta, sendo que bolo era sobremesa. Ela
nunca me ouvia. Tinha que fazer tudo e se ocupar
desnecessariamente. Abracei os dois ao mesmo tempo e meu pai
logo roubou o neto, arrulhando. Liam ofereceu a ele uma bebida.
Mamãe elogiou a casa com carinho, reparei que seu rosto brilhava
tanto quanto pisca-pisca.
— Você passou iluminador demais. Precisa parar de assistir
vídeos de maquiagem no Youtube e fazer um curso. — Passei um
guardanapo por seu rosto, diminuindo o brilho. — Regina te zoaria
até o ano que vem se te visse assim.
Mamãe apenas revirou os olhos, um ato que puxei dela.
Meus irmãos chegaram juntos, eles sempre andavam juntos,
mesmo. Minhas cunhadas entraram com as crianças e Lilo resolveu
acordar de seu canto, levantando com preguiça. Ela não fazia
nenhum alarde com pessoas estranhas. Definitivamente não servia
para guardar a casa. Só era meio ciumenta comigo, como quando
minha cunhada me abraçou, ela se enfiou entre nossas pernas e
sentou no meu pé.
Depois disso, sentou do lado de Liam, olhando todo mundo.
Nós dois tínhamos a política de que ela morava conosco e não
ficaria presa por causa de visitas, então, nossos visitantes
precisavam se adequar a ela. Como não era agressiva e nem chata,
de ficar pulando em cima, não via motivos para privá-la da
companhia de outras pessoas.
Ficamos de pé quando a família de Liam chegou. Owen e
Frank chegaram carregando mais pratos, que a vovó trouxe. Ela
também não levou a sério que eu fiz comida. Será que estavam com
medo da minha culinária?
Havia tanta comida que não cabia na mesa.
— Puta que pariu, Liam! Eu quero um sofá desses! Trocaria
minha cama por ele — vovó disse logo que sentou e eu vi o olhar
surpreso dos meus pais ao dar de cara com uma senhorinha de
aparência doce soltando a bomba com P de primeira. Não aguentei
e explodi em risos.
Frank e Owen me acompanharam e Liam só me olhou
exasperado, acabou rindo também.
— Vou comprar um, vovó — ele respondeu e Samuel gritou
com a correria dos meus sobrinhos. Ele queria estar lá. Meu pai o
colocou sentado no chão, Lilo imediatamente deitou atrás dele. Ela
sempre fazia isso, ninguém a ensinou e Samuel a usava de apoio
para tudo, inclusive para esfregar seus biscoitos.
— Alguém quer vinho? — ofereci, bem animada em termos
visitas.
Um ano antes jamais imaginaria que viveria um momento
tão mágico.

CAPÍTULO DEZOITO
Emily
Nossa vida entrou em um ajuste pelos próximos meses. Liam e
eu nos adaptamos bem à vida a dois. Ele não era bagunceiro,
lavava a própria roupa e às vezes até as minhas, mas tinha medo
de estragar minhas blusas mais finas. Lavava a louça e cozinhava
deliciosamente bem. Eu poderia pedir alguém melhor? Eram anos
de treinamento militar e cuidando de si mesmo para depender de
uma mulher.
Samuel estava crescendo em uma velocidade incrível,
perdendo roupas de um jeito frustrante e aumentando o número da
fraldas também. Ele seria alto, puxou a mim, seu doador de
esperma não era um homem alto. Raramente pensava em Dylan,
não fazia falta em nossas vidas.
Não sabia como eu era quando criança e nesses momentos, tinha
vontade de procurar meu pai biológico e perguntar. Devido ao
histórico de vícios, achei que não lembraria. Havia uma
nova assistente no andar e ela era maravilhosa, sofria com a
implicância dos meninos e por vezes, precisava comprar uma briga
com eles por causa dela. Meu trabalho ficou mais tranquilo por focar
apenas em Liam e ele me convidou para participar de mais projetos.
Eu estava adorando nossa parceria em casa e na vida profissional.
Ele e Samuel eram um grude só, eu podia sair tranquilamente,
sem medo, que os dois se viravam muito bem sem mim. Liam ainda
não queria que Sammy fosse para uma creche, não até os dois
anos e eu respeitei sua opinião por amar e cuidar do meu bebê
tanto quanto eu.
Em um dia comum na empresa, recebi a informação de que
havia uma mulher me procurando no saguão. Pedi que ela fosse
encaminhada para o primeiro andar, na recepção principal e a
receberia ali em algum lugar, porque seu sobrenome era familiar e
achei que a conhecia.
Desci sem avisar a Liam, estava ocupado em uma ligação,
só falei com a outra assistente que iria descer. Riley era tímida, mas
ótima em seu trabalho e por causa dela, não precisava mais chegar
à empresa com as galinhas. Ela morava há duas ruas do edifício,
num micro apartamento e era aquilo: o novato sempre se ferrava.
Passei a minha vez.
Assim que desci, falei com algumas pessoas e estaquei na
recepção ao ver quem me aguardava. Era a filha do meu pai
biológico.
— Emily? — Ela se aproximou meio insegura. Era tão jovem,
mal parecia ter saído da adolescência. — Sou Cristina Russo. Sei
que não deveria vir, mas desde aquele encontro… fiquei pensando…
— Me acompanhe, por favor — pedi, mantendo a calma e
abri uma sala de visitas. — Quer um café ou chá? Água?
— Estou bem, obrigada. — Ela abriu seu casaquinho e
sentou onde apontei.
— O que precisa, Cristina?
Ela respirou fundo.
— Nós sempre soubemos que tínhamos uma irmã mais
velha.
— Nós? — retruquei, com a garganta seca. Cristina tirou o
celular do bolso e mostrou uma foto. Três meninas, a caçula ainda
era uma criança pequena. — Todas meninas?
— Sim, bem, a mamãe está grávida mais uma vez e não
sabemos o sexo — contou e senti uma dor no coração. Foi como se
um punho apertasse minha garganta. — Isso deve ser doloroso e eu
vi no seu rosto naquele dia, também vi como papai ficou tão mal que
decidi contar o lado dele da história. Talvez pra você ele seja o cara
mau, mas pra mim ele é a melhor pessoa que conheço.
— Eu não o conheço, Cristina. Ele pode ser bom pai para
você, mas não é e nunca foi meu pai.
— Papai me contou que namorava a sua mãe por muitos anos,
que eles eram meio aventureiros, o que traduzo como
inconsequentes, devido ao histórico dele com vícios. — Ela era bem
honesta. — Nós sabemos que papai teve muitos problemas com
drogas e bebidas, hoje ele é limpo, não bebe nada. E a sua mãe era
de algum tipo de família muito influente na Rússia, algo assim. Eles
viviam de festas, viagens, gastos exorbitantes…
Fiquei quieta. Queria ouvir, ao mesmo tempo que não.
— Ela morreu de overdose do lado dele — Cristina disse com
pesar. — Ele estava chapado demais para se dar conta. Uma
vizinha a viu caída pela janela, chamou a polícia e foi a noite que te
pegaram e levaram para o conselho tutelar — continuou falando e
meu coração apertou. — Papai foi preso, o pai dele conseguiu leválo para uma clínica de reabilitação e uma espécie de prisão
domiciliar, mas o pai dele também não era uma boa pessoa. Não sei
dos motivos particulares, além de uma tremenda maldade horrível,
ele abriu mão de você. Também não sei sobre a sua família
materna, papai não sabe porque eles não te reivindicaram. Quando
saiu da cadeia, ele foi te procurar e você já havia sido adotada. Ele
disse que seguiu sua família por dias e viu que era feliz, amada,
bem cuidada e tinha alguém que podia ser um melhor pai que ele.
Não queria voltar e estragar toda a estabilidade e segurança que
conseguiu com sua família. Achou que te faria sofrer e te confundiria
se aparecesse novamente. Durante muitos anos, ele acompanhou
seus passos, até quando se mudou para a faculdade. Ele nos disse
que você era adulta e que estava encaminhada na vida.
— Ele sempre me acompanhou? Ele sabia que estaria no
restaurante?
— Não. Ele jurou pra mim que não sabia, papai tem
defeitos, mas não é mentiroso. Ele falou que quando se mudou para
a faculdade, deixou de te acompanhar. Não havia mais esperanças
para ele. Nós fomos criadas em um sistema rigoroso, porque ele
não queria repetir os mesmos erros.
— Quantos anos você tem? — questionei, querendo calcular
o tempo que ele saiu da prisão e reconstruiu sua vida.
— Tenho dezessete.
Dez anos de diferença.
— Minha mãe era advogada do papai. Eles se apaixonaram,
ela o ajudou a superar algumas coisas e quando engravidou,
começaram a nossa família. Minhas duas irmãs foram planejadas,
eu e o bebê que está na barriga viemos de surpresa — comentou.
Era muito madura e segura. — Espero que você saiba, que papai te
amava, ele só estava perdido e destruído pelo vício. E o pai dele,
pelas histórias que ouço, não era um bom exemplo ou a pessoa
mais familiar do mundo. Não estou aqui para você procurá-lo ou
sentir pena, mas eu queria sentir a paz de que você poderia saber
da verdade. E, para te dizer, que papai tem inimigos e eles sabem
sobre você.
Meu coração despencou, mas ela só tinha dezessete anos e
eu não demonstraria nada.
— Obrigada. Você é muito jovem e tem um coração muito
bonito, Cristina. Eu realmente tenho uma família e agora estou feliz
em ouvir isso tudo, apesar de doloroso. — Segurei sua mão e
apertei, com um sorriso. — Eu não posso prometer que vou procurar
vocês e que seremos amigos ou coisa do tipo. Tudo isso é muito
novo pra mim. É confuso, mas você pode dizer a seu pai que eu me
formei com honras na faculdade, tenho um filho de nove meses que
vai fazer dez em breve. Sou comprometida a um homem incrível e
que ele não precisa sentir culpa. O destino foi infeliz conosco, mas
no fim, nós encontramos a felicidade e isso é o que importa. Quanto
a esses inimigos, eu vou conversar com Liam e tomaremos algumas
providências juntos.
Cristina sorriu, um pouco tensa. Tirei meu cartão do bolso.
— Esse é meu número de telefone, você e suas irmãs
podem me ligar se precisarem de ajuda. Obrigada por vir aqui.
— Obrigada por me ouvir, Emily. Eu vou contar a ele.
Nós trocamos um abraço bem apertado, estava admirada e
orgulhosa daquela menina como uma irmã mais velha e foi o
sentimento mais louco e mais rápido que senti na minha vida.
Cristina foi embora toda independente, sem precisar de ajuda para
nada. Era tão bonita. Fiquei com a imagem que me mostrou das
outras meninas na cabeça e iria guardar no coração.
Liam estava encostado na recepção, me dei conta que nos
observou o tempo todo. Ele parecia preocupado que tivesse outro
surto, mas na verdade, estava feliz. Não importava mais o caminho
que trilhamos, tive sorte de ser adotada por uma família
maravilhosa, que me acolheu com amor e respeito. Muito melhor
que ser criada por pais ricos, mas viciados em drogas e que se
destruíam mutuamente. Duvidava que houvesse amor na minha
família biológica.
Me aproximei de Liam e deitei a cabeça em seu peito.
— Sabe por que a minha família materna não me
reivindicou?
— Está no arquivo que te dei.
— Eu não li — respondi, sem graça.
— Estão quase todos mortos, tem só uma tia, casada e mora
em Londres e na Turquia. A maioria morreu na prisão ou
assassinado. Eles eram envolvidos com a máfia russa.
— Isso existe de verdade?
— Existem muitas coisas de verdade — Liam disse com um
enigma.
— Ela pode não ter me procurado por causa disso?
— Provavelmente, sei lá. Era muito jovem quando a irmã
morreu, talvez não pudesse te assumir. O que ela queria? Quando
Riley me falou o sobrenome de quem veio encontrar, desci
preocupado. — Me abraçou ali, no meio da recepção, para todo
mundo ver. Não era como se não soubessem que tínhamos um
relacionamento, as fofocas corriam nos corredores. — Está
realmente bem?
— Ela é uma menina incrível, tão madura e linda.
— Eles aparentam ser boas pessoas, Emily. Além do
histórico, não há nada comprometedor deles, nem debaixo dos
tapetes. Ele nem sonega imposto, o que é um milagre hoje em dia
— Liam disse e eu ri. Ele sabia os podres de todo mundo. — Se um
dia você quiser conhecê-los, não tem problema. Eu vou com você.
— Um dia, não agora — respondi sinceramente. — Cristina
me falou sobre inimigos. Sabe de algo sobre isso?
— Seu pai é um herdeiro de uma família envolvida com a
máfia russa. E é um advogado ativista, então, não é impossível ter
inimigos. Irei pesquisar seus desafetos. Agora chega de enrolar,
srta. Williams. Eu vou ter metade dos meus funcionários fofocando
que sou um bobo com você e estou te dando vantagens. E não é
isso que você quer, não é?
— Vai jogar isso na minha cara até quando?
— Para sempre, talvez.
Liam queria ficar comigo para sempre.
CAPÍTULO DEZENOVE
Liam
Samuel engatinhou até uma série de pastas na minha estante
e puxou uma, fazendo com que todas caíssem no chão. Em alguns
minutos, o garoto conseguiu destruir meu escritório, que não era à
prova de crianças. Emily precisou da manhã de folga para ir a uma
consulta médica e sua adorável mãe estava ajudando Cole com a
esposa, com isso, Samuel estava no trabalho comigo porque eu
tinha coisas a fazer e não confiava em babás.
Emily estava lentamente tentando me convencer do contrário,
mas eu iria verificar até o antepassado da candidata que
conseguisse aceitar. Eu preferia esperar que ele tivesse idade o
suficiente para estar na creche a maior parte do dia e ajustaria
minha agenda em torno das necessidades dele.
— Garoto! Você não consegue parar por um minuto? — Owen
resmungou, puxando as folhas marcadas com dedos molhados de
baba. — Como vocês conseguem aguentar esse pequeno furacão o
tempo todo?
— Não temos coisas interessantes no alcance dos olhos dele
— falei, digitando o meu contrato para enviar rapidamente para
Riley. — Você não sabe o quanto ele é capaz de encontrar coisas
para enfiar na boca. Absolutamente tudo tem um gosto interessante
para a boca dele.
— Samuel, tenha dó — Owen reclamou ao vê-lo puxar alguns
cabos. — Vem, vou te exibir por aí e pegar alguns números de
telefone na empresa do primeiro andar.
— Não deixe que ninguém encoste nele. Emily terá um ataque
ao saber que Samuel foi tocado por pessoas desconhecidas.
Emily não ligaria, eu sim, mas já tinha fama de insuportável o
suficiente.
— Sim… certo. A mulher que deixa a criança rolando na grama
se importa que peguem nele — Owen murmurou e saiu da minha
sala com Samuel muito sorridente em seu colo. Ele nunca chorava
quando saía com alguém que gostava, exceto se estivesse doente
ou um pouco chateado por qualquer um dos seus motivos de bebê.
Ele tinha uma personalidade muito alegre e arteira, teríamos
trabalho, mas ficava sentido e com muitos beicinhos ao ser
chamado atenção no que aprontava. Já fazia birra e se rebelava.
Em algumas noites, nos fazia lembrar porque era extremamente
difícil criar uma criança, educá-la para ser um humano decente e os
motivos pelos quais ter filhos deveria ser uma decisão muito
pensada.
Emily e eu tínhamos um plano futuro. Ela nunca falava sobre
casamento, para minha adorada namorada, já vivíamos juntos, mas
eu queria a coisa toda. Noivado, casamento, uma festa para nossas
famílias e um lar saudável para Samuel. Ela me amava sabendo ter
partes feias e eu a adorava por completo.
Nossas personalidades eram completamente diferentes. Emily
acordava cantando, dançando, era feliz pela manhã enquanto eu
mal conseguia lembrar meu nome e precisava de um café para
processar. Ela ficava nojenta com a privação de sono e não
aguentava dez minutos com fome. Seu humor se transformava
completamente enquanto eu ficava tranquilo. Poucas coisas me
tiravam do sério no dia a dia. Emily podia virar um dragão cuspidor
de fogo por qualquer coisa e depois sorria como se nada tivesse
acontecido.
Já desistira de compreender a sanidade mental da minha
mulher.
Owen ficou com Samuel por quase meia hora. Devolveu o
garoto faminto e com a fralda cheia. Tive um problema em trocá-lo
no banheiro da empresa, eu mandaria instalar um fraldário em todos
os andares. Samuel não estava com espírito para colaborar. Ele
mamou um pouco e quis a papinha de frutas, que eu preparava toda
manhã. Garantir uma alimentação natural era minha religião. Eu
cozinhava seus legumes, triturava e organizava em potes.
Os pais de Emily estranharam no começo, ficaram um pouco
chateados, mas eu evitava comidas processadas e nós queríamos
que ele tivesse um crescimento saudável.
Com quase onze meses, o garoto tinha muita energia. Depois
de comer, reconheci seu choro de sono. Ele ficou deitado no meu
colo, brincando com o botão da minha blusa até adormecer. Apenas
quando pegou no sono pesado que eu coloquei no carrinho, perto
de mim.
Emily chegou na hora do almoço, como sempre, preocupada
com o trabalho e com Samuel. Eu sabia que ela confiava em mim,
aprendi a respeitar que era instinto maternal colocar o filho como
prioridade. Ela era muito protetora. Leoa. Me amava, eu a amava,
mas o amor que tínhamos por Samuel era completamente diferente.
Eterno e indestrutível.
Ele era meu filho e ninguém poderia dizer o contrário.
Nem mesmo a porra do doador de esperma.
— Você tem um minuto? — Ela voltou para minha sala, com as
mãos vazias.
— Como está sem as intermináveis pastas, sim. — Sorri para
seu olhar irritado. — O que precisa?
Emily encostou a porta. Samuel estava quieto no carrinho,
ainda acordando do cochilo e nos encarou com expressão de
poucos amigos. Ainda não queria ser incomodado. Sua mãe, no
entanto, era quem queria colo. Ela sentou em cima de mim e se
encolheu, querendo um abraço e um chamego.
— Aconteceu alguma coisa na rua?
— Não. Foi tudo bem, meus exames estão ótimos e eu até
pensei em suspender o anticoncepcional, já que não temos riscos.
Conversei com a médica e vou pensar mais sobre — falou baixinho
e beijei sua testa. — Acho que só preciso de uns minutinhos de
chamego.
— Sou todo seu.
— Ainda tem energia para ficar com ele hoje à noite?
— Claro. Nós meio que temos um encontro de meninos sem a
mamãe por perto.
— Eu vou dirigir para que Jenna possa beber. Duvido muito
que Regina voltará para casa conosco, mas se sim, eu vou deixar
as duas antes de ir embora.
— Está nervosa porque é a primeira vez saindo sozinha? —
Esfreguei seus braços arrepiados.
— Deus, sim. Estou a um passo de te pedir para me levar e
buscar, fiquei tão nervosa indo apenas ao médico e não sei em que
momento passei a ter medo de fazer o que sempre fiz. — Sua
expressão mudou um pouco. — Desde que Cristina disse que o pai
dela tem inimigos que sabe sobre mim, estou preocupada.
— A segurança remota não identificou ninguém nos seguindo
nas últimas semanas. Você está sendo observada pelos meus
homens o tempo todo. Se te fizer sentir mais segura, posso recrutar
James para dirigir, ficar no bar e levar todas em casa. Prefere
assim?
James estava trabalhando na minha segurança há anos, ele
era solteiro, sem filhos e basicamente vivia para o trabalho. Foi
indicação de Marco Moretti[7]
, um amigo que tinha uma empresa de
segurança como a minha em Detroit e pegou um dos contratos que
eu não podia fornecer na época para a Família Price[8]
, aqui em
Chicago. Nós fizemos uma parceria, eu fornecia o treinamento e
orientação física, ele ficava com o restante.
Meu segurança era de confiança e desde que a coisa sobre a
família biológica da Emily ficou suspeita, ele estava cuidando da
proteção dela sempre que eu não estava por perto. Ela fazia poucas
coisas sozinha, com Samuel e Lilo, era difícil. Emily aprendeu a
pedir ajuda e aceitar sempre que necessário. Ela era muito
independente em tudo e eu adorava quando me buscava para ter
apoio e carinho, porque nem sempre estava disposta e mantinha
espaço.
— Acha que devo procurar meu pai biológico?
— Apenas se for te fazer bem.
— Eu não quero que ele seja meu pai, apenas queria nunca têlo encontrado porque assim, não sentiria esse aperto no meu
coração. — Seu olhar triste encontrou o meu.
— Mmm baba! — Samuel chamou. Ele esticou os bracinhos. —
Baba!
— Ele quer seu baba. — Emily saiu do meu colo e virei a
cadeira, soltando o cinto e tirando-o do carrinho. Há algum tempo,
Samuel começou a me chamar de Baba sozinho. Ele falava
algumas coisas ou nós entendíamos o que ele queria dizer. Lilo era
apenas Lo, mamãe era Mama, Vovó era Uó e Vovô algo como Uou.
Ele dizia oi perfeitamente e soprava beijos para qualquer um que
ganhasse sua atenção.
Como era meu dia de ficar com Samuel, planejei assistir ao
jogo em paz, dar seu jantar e fazer com que dormisse na cama
comigo até a mãe dele chegar da rua. Mudar para uma casa em um
bairro tranquilo foi um dos maiores acertos da minha vida adulta.
Emily caminhava pelas manhãs com Samuel no carrinho, ela não
gostava de malhar, no retorno, fazíamos o café juntos e quando
havia tempo, tirávamos trinta minutos brincando com Sammy no
quintal antes do trabalho.
Não havia barulho de vizinhos ou de carros. Samuel não
acordava assustado com alguma porta batendo e buzinas
excessivas da rua. Ele estava dormindo a noite inteira, acordava
seis horas em ponto com um sorriso enorme e chamando por Lilo.
Minha cadela estava enorme e ficando pesada, mas ela era tão dócil
que as crianças da vizinhança sempre paravam para dar um olá. Ela
era obediente em seu treinamento, carinhosa com todos e
provavelmente, até com quem não deveria.
Decidi assistir ao jogo no quarto. Emily estava se arrumando,
Samuel alimentado e com energia explodindo pelos ouvidos. Lilo
estava exausta depois da nossa caminhada noturna. Enquanto o
jogo passava, observei minha mulher desfilar com um belíssimo
conjunto de lingerie. Eu gostava daquelas peças pequenas, não me
importava que, no cotidiano, ela escolhesse roupas confortáveis
porque nem eu tolerava as cuecas.
Emily tinha cada coisa bela que me dava vontade de tirar.
Morar junto estava sendo a sétima maravilha para nós. Apesar dos
desentendimentos sobre coisas bobas, nós raramente brigávamos.
Sexo era estupendo. Até o momento, eu só via vantagens em ser
dois ao invés de um.
— O que acha desse vestido, amor? — Ela saiu do nosso
closet com um justo vestido vermelho, que delineava seu corpo e
tinha um decote de fazer babar.
— Está gostosa pra caralho.
— Então, será esse. — Sorriu, lisonjeada e deu uma voltinha.
— Promete me esperar acordado para me ajudar a tirar o vestido?
— Estarei mais que acordado.
James avisou que estava aguardando e fui até a porta, com
Samuel no colo. Jenna e Regina já estavam no carro, devido a rota,
elas gritaram obscenidades para Emily, que me fez rir alto. Ainda
bem que o bebê ainda não compreendia que as tias eram malucas.
Fiquei atento às mensagens do segurança e da própria
atualização de Emily. Ela estava tão nervosa de estar na rua que
não parava de falar comigo. Alguma coisa a chateou, tanto que
retornou para casa mais cedo. Levei Samuel para o berço e desci as
escadas, esperando-a com um vinho na cozinha. Ela entrou e parou
na porta, tirando os sapatos.
— Esses peitos… — Cantarolei para seu decote.
— Essa mulher sexy quer seu homem e esse vinho. — Ela
apontou para a garrafa ao meu lado.
— Quer falar sobre o que aconteceu na rua?
— Eu acho que tirando Jenna, não estou mais na vibe de
nenhuma das minhas amigas antigas. A maioria ainda não casou ou
teve filhos, os assuntos acabavam divergindo. — Ela puxou um
banquinho e sentou, balançando as pernas. — Fiquei muito
chateada quando uma delas sugeriu que eu saí de um
relacionamento com um homem rico e caí no colo de outro porque
estava desesperada para sustentar Samuel.
— E o que ela tem a ver com isso? Nada? — sugeri, porque
era verdade. Quem tinha alguma coisa a ver com o nosso
relacionamento? — Está chateada por isso?
— Não é legal ser taxada de caçadora de fortuna.
— Hum… — Dei a volta e parei ao seu lado. — E se eu te
disser que se parar de trabalhar, ficarei pobre? Talvez não seja tão
rico assim.
— Eu conheço sua conta bancária. — Ela bufou e tirei seu
cabelo do caminho. Eu adorava longo como estava, ficava com
cachos lindos nas pontas. Quando a conheci, estava curto e mais
prático para Samuel. Beijei seu pescoço, ignorando seu temor de
parecer uma caçadora. Eu nasci pobre, passei a maior parte da
minha vida muito pobre, ganhei bem o suficiente na Marinha e
estava fazendo dinheiro em outro país.
— Quem se importa?
— Eu amo esse sotaque maldito — resmungou, me fazendo
rir.
— Quase não tenho mais… muitos anos vivendo aqui e
compartilhando o teto com você, que não tem sotaque algum. Sabe
o que não tenho mais?
— O quê?
— Vontade de te ver com essa roupa. O vestido é lindo, mas
eu prefiro tirá-lo. — Comecei a abrir os botões de seu decote e com
a outra mão, puxei o zíper. Fui beijando cada pedaço de pele. —
Esse sutiã é muito sexy. Quer continuar aqui ou vamos para o
quarto?
— Vamos para o quarto. — Ela decidiu e saiu do lugar,
agarrando a garrafa e a taça.
Verifiquei os alarmes mais uma vez antes de subirmos. Emily
fez um showzinho ao terminar de tirar o vestido, jogando longe e
agarrei sua cintura, sem dar-lhe tempo para pensar. Ela amava meu
assalto. Tomei sua boca com um beijo feroz, agarrando de forma
rude suas nádegas e ela retribuiu, arranhando minha nuca. Levei-a
para a cama, caindo por cima com cuidado, pressionando meu peso
o suficiente. Abraçando minha cintura com as pernas, senti o calor
de sua boceta contra meu pau.
Aos beijos, rolamos na cama até que ficou por cima, com o
sorriso safado que eu era apaixonado. Inclinando-se sobre meu
corpo, distribuiu beijos provocantes com a língua, arrastando a unha
pelo meu peito e descendo com a boca até minha cueca. Ela tirou,
com paciência, pelas minhas pernas longas e montou em mim
novamente, admirando meu pau com o olhar de mulher faminta que
me envaidecia.
Emily não se importava com as marcas do meu corpo. Ela me
fazia sentir homem e viril como nenhuma outra, nem mesmo antes
do acidente. O desejo que sentíamos um pelo outro era explosivo.
Com os olhos em mim, desceu a boca para meu pau e chupou.
Agarrei seu cabelo e gemi, permitindo que ficasse à vontade e
controlei o desejo de foder sua boca.
— Oh, baby. Eu amo a sua boca, porra.
— Eu amo o seu pau. — Ela sorriu, safada. Mordendo o lábio,
tocou uma punheta deliciosa.
— Traga essa boceta aqui.
Emily me permitiu chupá-la por um tempo, mas aquela noite
era sobre seus desejos, porque estava chateada e como um bom
namorado, permiti que usasse meu corpo para seu bel prazer. Ela
montou de costas, uma das minhas posições favoritas. Eu podia
passar toda minha vida olhando meu pau se perder em sua boceta
somando com a bunda linda virada para mim.
— Toda vez que estiver chateada, por favor, me use — falei,
olhando para o teto.
— Toda mulher merece sexo de conforto, sorte a minha ter um
homem desses.
— A sorte é toda minha. — Beijei sua testa suada. — Se eu te
chamar de caçadora, você vai ficar com raiva e poderemos começar
tudo novamente?
Emily riu e me deu uma cotovelada. Abracei-a apertado.
— Você é a mulher que amo e admiro por ser forte e corajosa.
Sei o quanto batalha para dar o melhor a si mesma e a Samuel, que
nunca pestanejou diante das dificuldades, pensando nele. Seu amor
de mãe é admirável, sua personalidade como mulher é apaixonante,
eu te amo e não importa o que os outros irão dizer. Conheço sua
história e seu coração. — Segurei seu queixo e beijei sua boca.
Ela fungou. Definitivamente os comentários a magoaram mais
do que estava me dizendo. Eu sabia que a família do doador de
esperma a machucou muito e ela ainda não havia superado.
— Que droga, estou chorando e puta merda, como te amo. —
Ela me agarrou. — Obrigado por ser o melhor companheiro que
uma mulher como eu merece. Você é mais que tudo. Te amo.
Trocamos um sorriso e ela chutou o lençol longe.
— Já se recuperou?
CAPÍTULO VINTE
Liam.
Acordei um pouco mais tarde, cansado da noite que dormimos
pouco e ouvi o choro de Samuel. Ele estava rabugento, só pelo tom.
Poucos segundos depois, uma música pop ecoou pelos corredores
e parei na porta ao ver Emily fazer uma banana de microfone,
dançando para nosso bebê, que estava dividido entre rir e chorar.
Ele decidiu rir. Soltou uma gargalhada alta com o rebolar maluco de
sua mãe.
— Apenas J-Lo é capaz de fazer esse menino rir. Educadores,
aprendam comigo! — Emily brincou, ofegante. — Bom dia, amor.
— Bom dia, bela bunda.
— Ele está chorando desde que acordou e eu precisei chegar
a medidas extremas.
Dei-lhe um beijo e fui falar com meu menino.
— Bom dia, garoto. O que está acontecendo? Você dormiu
bem?
Samuel apenas soltou um resmungo com um beicinho. Havia
dias que ele demorava a ficar bem humorado pela manhã, não
sendo uma bola de energia como a mãe. Enquanto Emily cozinhava
nosso café de adultos, dei a ele frutas e um pouco de biscoito com
leite para que pudesse ir para o chão. Engatinhando feito um
ligeirinho, foi até seu cesto de brinquedos e virou.
Lilo bocejou de sua cama e se moveu até ele, deitando ao
lado. Ela ainda tinha a energia de um filhote, logo que acordasse,
soltaria para brincar no quintal dos fundos. Eu não a deixava solta
porque era dócil e poderia ir com qualquer um. Além de não querer
problemas com a prefeitura em ter denúncias de mantê-la livre, não
queria que roubassem minha cadela.
Emily deu a ela as frutas do seu café e um pouco de ração
para começar o dia.
— Boa menina, coma tudo. — Acariciou Lilo, lavou as mãos e
sentou ao meu lado. — Poder voltar a beber café é uma das
melhores coisas da minha vida pós parto. Eu senti tanta falta.
— Quais são os nossos compromissos para o dia?
— O bezerro que criamos não para de crescer e está ficando
sem roupas. Desde o natal que não compro nada e acho que os
sapatos estão apertando. Tem ânimo para um passeio no shopping?
— Claro. Não podemos deixar o menino com as calças
pescando. E depois?
— Meus pais nos convidaram para almoçar amanhã, como
trabalhamos segunda normalmente, deveríamos descansar… ficar
só em família.
— Parece a programação perfeita para mim.
Emily brincou com a caneca de café.
— Ontem o bar estava lotado e havia vários homens como
você, empresários solteiros ou aparentemente solteiros, usando
roupas boas e sendo galantes. Sente falta de estar livre para
frequentar bares e restaurantes repletos de gente bonita?
— Como posso sentir falta de uma vida que eu não vivia
antes?
— Bom, sim. Imaginei isso, mas sei lá, eu adoro os dias
tranquilos. Depois que Samuel nasceu e todo trabalho de cuidar de
um bebê me faz desejar ter mais dias para dormir do que para sair.
— Ela riu e analisei sua expressão. — É que amo tanto a nossa vida
que fico com medo de que você queira algo diferente.
— Sua insegurança é infundada. Tenho tudo que preciso bem
aqui.
— Que bom, porque a irmã maluca é a Regina. — Ela sorriu
contra meus lábios.
— Em falar nisso… sua irmã maluca bebeu ontem e encheu a
nossa secretária eletrônica de mensagens aleatórias.
— Eu não tenho coragem de compartilhar os áudios que me
enviou abraçada com o sanitário. Acho que ela e Frank se
estranharam por ciúmes. Eu me preocupo, porque Regina bebe
demais e não é uma boa influência para seu irmão…
— Baby… — Segurei sua mão. — Frank é um homem adulto
que precisa ter controle do vício. Ele está acostumado a sair, a
maioria dos amigos bebem muito e ele segue limpo. Acredito que
sua irmã teria que se esforçar demais para fazê-lo voltar ao vício.
Emily não conseguia não se preocupar com nossos irmãos, eu
acreditava que se eles eram adultos para festinhas de sexo, eram
adultos para aguentar as consequências dos seus atos. Não perdia
um segundo do meu sono pensando neles e tentava fazer com que
ela também não se importasse. Owen, Joseph e Cole faziam parte
das nossas vidas ativamente como tios legais para Samuel e noites
de jogos em casa.
Frank e Regina eram os únicos na loucura.
No shopping, Samuel estava no meu colo enquanto a mãe
escolhia roupas. Algumas vendedoras se aproximaram, mas nunca
ficavam em cima, por ser uma enorme loja de departamento para
crianças. Ele não cooperava para experimentar, precisávamos medir
por fora e levar a grande parte no olho e na sorte.
— Olha essa roupa! Se encontrar do mesmo estilo em
tamanho grande, vocês poderão sair iguais. Precisaremos ter uma
menina para que possa me vestir igual a ela também! — Emily
ergueu uma camisa.
— Já vamos pensar em ter outro?
— Não agora, imediatamente, mas não podemos levar muito
tempo. Apesar de ter sido adotada já grandinha, meus irmãos e eu
nos divertimos muito juntos. Não posso imaginar minha vida sem
eles… — Ela colocou umas peças de roupas no carrinho. — Acho
que peguei tudo da lista. Ele tem mais meias do que essa loja
possui no estoque e as roupas de engatinhar pedirei para minha
mãe reforçar nos joelhos.
— Logo ele vai andar.
— Meu menininho está crescendo. — Emily agarrou as
bochechas de Samuel e ele guinchou, apertando as dela de volta.
De repente, ela ficou séria, olhando para alguém além de mim.
Pelo reflexo do espelho, reconheci Cristina Russo, a irmã biológica
de Emily, acompanhada de uma mulher grávida. Ambas pareciam
felizes e distraídas, acompanhadas por dois guarda-costas.
— Acho que podemos pagar nossas compras e ir embora. —
Emily soou desconfortável. Entreguei Samuel a ela e peguei o
carrinho, empurrando para pagarmos a conta. — Será que aquela é
a nova esposa dele?
— E se for?
— Eu me odeio por sentir curiosidade. Minha vida estava muito
melhor antes daquele desastroso encontro no restaurante —
resmungou e ficou emburrada. — Reparou nos seguranças?
— Sim. Se ele tem inimigos, é o certo a fazer.
Não sabia ao certo quem eram os inimigos de Russo, mas
tinha uma breve noção depois que fucei um pouco mais suas
finanças. Por muitos anos, ele viveu com a renda da esposa,
principalmente enquanto estava estudando. Depois, sem “nenhum
motivo aparente”, assumiu as empresas do pai para fechá-las e
romper com os associados. Foi um processo sorrateiro, o pai era
diretamente envolvido com a organização criminosa russa, que já
não estava mais no poder.
Na minha experiência, unicamente baseada na vez que fomos
chamados ao Pentágono para tentar invadir os sistemas da
organização criminosa italiana, que comandava silenciosamente
vários estados do país, ninguém faz parte e sai com vida para
contar história. Eles tinham uma forte proteção em seus sistemas,
criados por um inventor que Owen morria para conhecer.
Não deveria ser diferente com os russos.
Pensando em jogar as cartas limpas na mesa e limpar o quarto
para Emily, marquei uma reunião com seu pai biológico. Ele teria
uma única chance para falar a verdade. Eu não era o tipo de homem
que tolerava mentiras, mas daria uma oportunidade. Estava
cansado de buscar informações por fora, aumentando minhas
preocupações e o medo de que qualquer um acreditasse que Emily
estivesse minimamente envolvida com a família biológica.
Assim que chegamos em casa, soltei Lilo no quintal dos fundos
e deixei Samuel brincando no chão da varanda, no tapete térmico e
com um casaco por estar ventando um pouco.
Emily ficou na cozinha, preparando nosso jantar, bebendo
vinho e ouvindo música. Pelo meu telefone, encomendei um buquê
de rosas vermelhas que tinha detalhes em dourado. Digitei uma
mensagem para o cartão, que eu sabia que ela iria adorar quando
recebesse. Voltei a me concentrar em Samuel, revezando em jogar
a bola para Lilo. Ela estava cheia de energia.
— A campainha tocou. Está esperando alguém? — Emily
questionou da cozinha.
— Não. — Me fiz de sonso.
— Já volto! — ela gritou e saiu.
— Mamãe vai adorar a surpresa, amigo. Aprenda uma coisa
com seu velho homem, bebê. Faça de tudo para deixar a mulher
que você ama feliz e protegida. — Peguei Samuel e beijei sua testa.
Ele estava começando a ficar sonolento.
— Liam Jones! — Emily gritou. — Ah, que lindas! Veio com
uma cúpula! — continuou gritando e levantei para vê-la pular no
lugar de pura felicidade. — Ah! Meu Deus! Você fez o meu dia! —
Saltou repetidamente e me abraçou apertado. Samuel gritou com
nosso aperto. — Eu amei, amei e amei! Muito obrigada! — Me deu
um beijo e correu para o telefone, colocando a música tema de A
Bela e a Fera, dançando pela cozinha, me fazendo rir.
Aquele sorriso feliz era tudo que eu queria ver brilhando em
seu rosto.
Ela me convenceu a dançar, o que fez com que Samuel
batesse palmas. Ele ainda era desengonçado no movimento e era
muito bonitinho de ver.
Minha avó decidiu nos visitar sem aviso, o que não foi um
problema. Ela chegou agitada, fazendo barulho com seus palavrões
e querendo ficar com Samuel.
— Esse sofá que você me deu é simplesmente maravilhoso.
Passo a porra do dia inteiro deitada no meu, com os pés para o alto
e obrigando Frank a me servir como uma vadia. — Ela soltou,
fazendo com que Emily gargalhasse. Esfreguei meu rosto,
pensando no desastre que seria quando Samuel aprendesse algum
palavrão porque a louca da minha avó não conseguia se controlar.
— Veio com a casa, nós não conhecíamos a marca ou a
empresa. É simplesmente maravilhoso, sim. — Emily se esticou. —
Quer beber mais alguma coisa?
— Vim brincar com meu netinho, deixarei para ficar bêbada em
outra oportunidade.
— Eu não quero a senhora pegando táxi sozinha — falei do
meu lugar no outro sofá com Lilo deitada aos meus pés. — É
perigoso. Ainda mais que não avisou a ninguém que sairia.
— Eu te criei, garoto. Desde quando lhe devo satisfações?
— Desde que entrou na terceira idade — rebati, ela riu e me
ergueu o dedo médio.
— Muito educado da sua parte. — Revirei os olhos, ela
assoprou um beijo.
— Vou verificar a carne no forno, já volto e não briguem.
Frank acabou ficando preocupado ao não encontrar a vovó em
casa quando passou lá para deixar algumas frutas frescas. Ele
chegou e Emily adorou colocar mais um lugar à mesa. Seu filé
assado com batatas era muito melhor que o meu.
— Como você faz a batata frita ficar temperada por dentro? —
Frank questionou, se deliciando. Emily riu. — Receita de família?
— Na verdade, quando aprendi a fazer algumas papinhas com
batata para Samuel, descobri como fazer essa batata temperada.
Dá um pouco de trabalho, faço em grandes quantidades e deixo
congelada, assim sempre tenho porções. Vou te passar a receita por
e-mail — respondeu, rindo.
— Virei comer aqui sempre. Será mais prático. — Frank sorriu.
— Fora da minha casa, maluco. — Apontei para a porta. —
Vovó pode vir aqui quando quiser e você não vai aparecer aqui sem
aviso.
— Claro que pode, Frank. Ignore o seu irmão. Vou buscar a
sobremesa. — Emily saiu da mesa e me deu a língua.
Ter uma noite em família era um dos melhores momentos da
minha vida. No meio da noite, recebi um alerta dos sistemas da
empresa e trabalhei a madrugada inteira. Fiz o máximo de silêncio
que consegui, para não acordar Emily ou ela pararia para trabalhar
comigo. Tentativas de invasão no sistema era quase rotineiro,
principalmente por causa do nível de informações que mantinha
criptografado na minha nuvem bloqueada.
Aproveitei que era madrugada para conversar com meus
amigos. Algumas diferenças de fuso-horário causavam um pouco de
desencontro, normalmente eu estava ocupado demais, mas sempre
conseguia rir de Louis infernizando Ethan[9] por estar casado e
apaixonado. Charlotte[10] era maluquinha. Justin era o mais quieto e
discreto, ele vivia para Olívia e preocupado com o bem-estar de
Tristan.
Logo cedo, mesmo sendo domingo, recebi o retorno do sr.
Russo, confirmando nossa reunião durante a semana.
— Você passou a madrugada trabalhando? — Emily me
abraçou por trás.
— Aconteceram algumas invasões. Owen e eu já resolvemos.
— Esfreguei seus braços e soltei um bocejo. — Vou dormir um
pouco antes de sairmos.
— Não precisamos ir. Meus pais vão entender, estamos lá
quase todos os dias e aos domingos. — Ela beijou minha bochecha.
— Venha dormir. Vamos aproveitar que Samuel ainda está com um
sono pesado.
Eu estava me sentindo agitado demais, talvez fosse o cansaço.
Com precaução, tomei uma dose leve da minha medicação para
conseguir dormir sem ter pesadelos e muito menos reagir
bruscamente com Emily na cama. Fazia muito tempo que eu não
sofria com estresse pós-traumático. Atribuía a minha nova rotina.
Uma mulher e um filho ocupavam bastante o tempo de um
homem. Toda vez que Owen me zoava sobre isso, eu ria e brincava
de volta, mas a verdade, era que nunca trocaria minha vida por
nada que fosse minimamente atraente para homens solteiros.
CAPÍTULO VINTE E DOIS
Liam
Quando imaginei que um dia estaria na Disney? Nunca
nessa vida. Ao que parecia, quando amamos uma pessoa, nós
fazemos coisas que jamais imaginamos. A pessoa que eu amava
estava pulando na minha frente porque estávamos na fila mais
longa do universo para tirar foto com algum personagem que não
fazia a mínima ideia que existia. Samuel estava olhando a mãe dele,
provavelmente se perguntando quem era aquela mulher peculiar à
sua frente.
Emily estava possuída.
— Amor, olha aquilo lá! — Ela soltou um gritinho e então
parou. — Estou com sede. — emendou e eu nem olhei o que ela
apontou. Tirei uma garrafa de água da bolsa e a entreguei. —
Obrigada. Faltam só trinta pessoas na nossa frente.
Ca-ra-lho.
Abri um sorriso e resolvi ignorar o tempo, tentar me divertir.
Se ela estava gostando tanto, tinha que existir alguma coisa legal
ali. No fundo, pouco me importava se iria me divertir ou não. Aquele
era o sonho dela e aniversário de um ano do nosso menino. Ele não
estava entendendo nada ainda, um dia entenderia a importância. A
única vez que ficou realmente louco foi quando reconheceu os
personagens de Toy Story. Ele gritou de verdade e riu, se jogando
para o Buzz.
Emily recebeu um e-mail e meu coração acelerou, imaginando
ser parte do meu plano. Owen, Jenna e Regina estavam
controlando tudo nos bastidores porque eu não podia ficar o tempo
todo no telefone, ou ela perceberia.
— Eu não acredito! — Seus olhos começaram a brilhar. —
Nossa reserva no hotel foi selecionada para um jantar no castelo da
Bela e a Fera! Eu quero ir! Será que é menininha demais para o
Sammy? — Parou um pouco e franziu o nariz. — Salsichas com
mostarda? Eu quero!
— Querida… Tome um fôlego. O que diz sobre a reserva?
— Ah, sim! Nós podemos ir?
— Claro! Acho que Sammy não vai se importar que a
comemoração dele seja pela manhã. — Beijei sua testa. Ela
continuou procurando a barraquinha das salsichas empanadas. —
Eu vou comprar.
— Obrigada, amor.
Não era difícil imaginar o motivo pelo qual estava com fome.
Ela foi em milhares de brinquedos, andamos metade do parque,
olhamos tantas atrações quanto possível. Agitada, estava gastando
o dobro de energia.
Retornei com seu lanche e Emily me deu apenas um sorriso
empolgado, voltando a observar a fila com olhos atentos.
Felizmente, nós conseguimos fotografar com os bonecos. Samuel
sorriu para as fotografias, tanto as do meu celular quanto às muito
caras que o fotógrafo cobrava.
— Nós somos uma linda família! — Emily ficou emocionada
ao ponto de ter lágrimas nos olhos. — Feliz aniversário, bebê.
Mamãe te ama muito! — Agarrou Samuel bem apertado, enchendo
de beijos. — Só faltou Lilo conosco.
— Owen está cuidando bem dela.
Passeamos pelo parque e fomos a alguns brinquedos juntos,
outros ela foi sozinha e eu esperei com Samuel preso em mim no
canguru. Paramos para almoçar um pouco mais tarde que o
habitual. Voltamos para o hotel e descansamos um pouco a tarde
para assistirmos à queima de fogos da noite. E claro, jantarmos no
famoso castelo.
Parecia que o parque estava ainda mais cheio à noite. Emily
usava jeans, tênis e uma regata. Os olhos dela brilhavam, estava
feliz em fazer parte daquele momento, por mais que não
compreendesse o que havia de interessante na Disney, era
importante para ela. Queria realizar todos os seus sonhos, fazer
parte deles e que ela ficasse feliz, inteira, segura e sentisse muito
amada.
Meu avô fazia da minha avó uma mulher feliz e
independente. Eu admirava isso, mesmo sendo um militar e vivendo
num ambiente onde mulheres estavam sempre atrás dos maridos,
por dinheiro ou pela família. Nunca desejei ter uma companheira,
muito menos alguém que não tivesse seus próprios sonhos e
firmeza para caminhar entre seus objetivos.
— Acho que ficaremos bem para ver e não tão próximo à
multidão. — Emily ficou em pé em cima do banco, com as mãos
apoiadas no meu ombro e Samuel firme no peito, preso no canguru.
Toda aquela multidão, fantoches, bonecos, crianças,
purpurinas e gritinhos era uma experiência nova e muito
estressante. Fiquei parado, olhando ao redor, tentando captar algo
que pudesse ser perigoso. Até que o parque era bem seguro, com
seguranças e guias passando o tempo todo.
Devido à minha surpresa, nosso jantar seria um pouco mais
tarde. Filmei toda a queima de fogos e fiz algumas fotografias dos
dois, mas nós precisávamos responder ao número falso da reserva.
Emily estranhou que o castelo estava vazio, foi difícil conseguir,
paguei uma nota alta para que ficasse livre após o horário comum
de funcionamento.
— Srta. Williams? — Uma jovem mulher se aproximou. — Eu
sou Joana e irei te auxiliar. O sorteio dá o direito de fantasiar-se
como os personagens.
— Sério? — Emily me encarou. — Você topa?
— Tudo por você, amor.
Sorrindo feito louca, ela foi praticamente pulando atrás da
funcionária e eu fui conduzido para o outro lado, com Samuel. Jenna
mandou fazer com antecedência a roupa formal que a Fera usava
no filme, para caber em mim e eu me vesti rapidamente, depois,
troquei Samuel. Ele estava curioso, com dedo na boca, olhando
tudo ao redor com interesse.
Meu bolso estava pesado, esperando o momento certo para
colocar o que faltava no dedo de sua mãe. Quando confirmei que
poderíamos viajar no primeiro aniversário de Samuel, eu também
decidi que era a hora de me tornar um homem honesto.
Emily não era uma mulher reduzida a pérolas e cetim, mas
sabia que amaria que nossa família se tornasse oficial, assim como
eu a queria sendo minha do começo ao fim, precisava ser dela por
inteiro. Nós mencionamos o casamento algumas vezes, não era e
nunca foi seu grande sonho, aquela coisa de festa, gritar
enlouquecidamente e tudo mais. Ela já foi noiva uma vez e me
perguntava se não foi uma boa experiência ou se ela realmente não
se importava com a festa.
Por mim, se ela quisesse uma festa, nós faríamos, se ela
quisesse apenas o civil, nós faríamos. Contanto que ela fosse a
minha sra. Jones no final do dia, eu estava bem com qualquer
planejamento.
— Está vendo isso aqui? Mamãe vai dizer sim?
Samuel riu e balançou a cabeça, como se tivesse entendido.
Joana sinalizou que estava tudo pronto. Samuel ficaria no
carrinho no pé da escada, no alcance dos meus olhos e com rápido
acesso. Ele ficou tranquilo me observando subir e esperei com
ansiedade o momento que as portas foram abertas e Emily foi
revelada. Ela estava linda, usando o clássico vestido amarelo que
eu só sabia por ter assistido ao filme umas trezentas vezes, forçado
por ela.
— Você está lindo! — Gesticulou e ri, fazendo charme.
Nós descemos o primeiro lance de escada e paramos de frente
um para o outro.
— Está disposto a enfrentar a dança também?
— Tudo vai depender de uma resposta sua. — Enfiei minha
mão no bolso. Emily arquejou, cobrindo o rosto ao ver a caixinha da
aliança. Fiquei de joelhos à sua frente, nervoso, esquecendo o texto
que escrevi e memorizei. — Emily Williams. Eu quero compartilhar
toda minha vida ao seu lado como seu marido e pai dos seus filhos,
quero oficializar o amor que sinto por toda eternidade.
— Você fez tudo isso com um dos meus filmes favoritos para
me pedir em casamento? — Ela chorou e assenti. — Meu Deus!
Você é perfeito! É claro que digo sim, eu te amo e quero viver com
você para sempre! Sim! Mil vezes sim!
Soltando um gritinho para a aliança que deslizei em seu dedo,
ela ergueu a mão e fez graça para quem nos assistia.
— Mamãe e papai vão casar, Samuel! — gritou e eu ri, tão
absurdamente feliz que ela havia dito sim a pleno pulmões.
Descemos a escada e pegamos nosso menino, que começou
a ficar irritado por ficar longe. Os garçons nos conduziram para a
mesa e cumpriram o que prometeram. Foi a noite mágica dos
sonhos de Emily, que por consequência, eram meus sonhos
também. Nós tivemos a famosa dança, ela riu e chorou, porque
éramos péssimos valsando. Precisaríamos ensaiar muito para
nosso casamento e perto do horário de Samuel dormir, voltamos
para o hotel.
Tomamos banho praticamente juntos e deitamos com ele, que
queria muita atenção.
— Eu te odeio por me pedir em casamento no dia que meu
cabelo estava uma zona. Foi difícil arrumar. — Ela me deu a língua,
falando baixinho para não me atrapalhar com o bebê. — Minha
bolsa rompeu nesse horário, eu estava sozinha e fui para o hospital.
Minha mãe chegou na manhã seguinte, eu ainda estava em um
longo e doloroso trabalho de parto. Pensei que não fosse conseguir
fazer aquilo sozinha, parir, criá-lo, dar um lar decente e tão
maravilhoso quanto eu tive. Há mães solos por aí, que enfrentam
isso todos os dias. Você chegou como ar fresco, assumindo tudo
comigo, não me diminuindo e somando na criação dele. Eu penso
que passei pelo parto sozinha porque estava no meu destino te
encontrar. Te amo por ser um homem incrível comigo, mas, eu te
amo mais ainda pelo pai foda que é.
— É um amor diferente. O que sinto por você e o que sinto por
ele. Não sei explicar o quanto a minha vida é nada comparada à
vida dele.
— É assim que me sinto desde que descobri a gravidez e ficou
ainda mais forte depois que ele nasceu. — Ela segurou a mãozinha
dele e beijou. — Preciso te confessar uma coisa.
— O que, baby?
— Já tem uns dias que estou notando sintomas diferentes e
achei ser coisa da minha cabeça, porque bem, você não pode ter
filhos. Não fiz um teste para não me sentir maluca, também fiquei
com medo da sua reação.
— Medo da minha reação?
— É infundado, eu sei. Por isso que estou falando agora. —
Ela mordeu o lábio. — No desespero, fiz algo ainda pior. Procurei
seus exames e liguei para seu médico, ele disse que você não
voltou para fazer um checkup e confirmar o primeiro diagnóstico. Ele
disse que alguns casos a produção de espermas ativos se recupera
quase que completamente, mas não poderia me dizer com certeza,
porque iria ferir a confidencialidade médico-paciente e por não te
examinar.
— Sério? Ele falou isso? — Me afastei um pouco de Samuel.
— Falou tanto que estou pensando em fazer um teste. Já tem
anos, Liam.
— Porra! Vamos fazer um agora! — Saltei da cama.
— Ei, calma. Um dos meus medos era te dar esperanças sem
fundamentos, não quero te magoar e ver aquele olhar triste de novo.
— Ela segurou minha mão. — Eu te amo muito e não me importo se
não teremos filhos biológicos, porque os que virão, receberão o
mesmo amor que Samuel tem.
— Sua menstruação está atrasada? Pensei que seus mamilos
sensíveis eram porque Samuel ficou doente e mamou além do
normal. — Franzi o cenho, com minha mente correndo para todo
lado. — Vou atrás de uma farmácia, não vou conseguir dormir
pensando nisso.
— Ai que droga, não queria te agitar. Só estava morrendo por
dentro ao não contar isso. Tudo bem, vou ver se consigo um teste
com o serviço de quarto.
Era tarde, mas a recepcionista foi atenciosa e pediu que um
dos funcionários fosse até a farmácia do próprio resort, para
comprar e debitou na nossa conta do quarto. Recebi com
ansiedade. Emily tentou me convencer que era melhor fazer pela
manhã, mas a sua menstruação estava atrasada por duas semanas.
Eu não quis esperar.
Ela estava com vontade de fazer xixi e foi para o banheiro. Nós
mantivemos o quarto escuro, Samuel estava dormindo entre nós,
por estranhar o berço do quarto. A comemoração do noivado seria
em casa, só quem tinha filho era capaz de entender o malabarismo
para namorar. Ainda assim, eu não trocava minha vida por uma de
solteiro.
— E agora? — questionei, abraçando-a.
— Tem que esperar… opa, não temos. — Emily ofegou com os
olhos arregalados. — Puta merda, Liam! Tem uma segunda listra!
— O que isso significa?
— Nós vamos ter outro bebê! — Emily pulou no lugar. — Ai,
meu Deus!
Meu mundo estava girando muito rápido. Emily não parava de
pular e puxar os cabelos, ela estava me enlouquecendo. Agarrei-a e
segurei-a pelos ombros, percebendo as lágrimas brilhando em seus
olhos. Nós dois estávamos em choque. Considerando os meses
sem camisinha, levou bastante tempo. Eu nunca considerei a
possibilidade de ter filhos naturalmente depois do diagnóstico,
apenas aceitei, porque havia certas coisas na vida que não tinha
conserto.
— Nós vamos ficar felizes ou vamos surtar?
Emily guinchou.
— Estou surtando porque nem parei de amamentar um bebê e
terei que cancelar minha matrícula na pós-graduação, mas, estou
feliz! Estou confusa! — Ela disparou a falar. — O que você está
sentindo?
— Parece que meu peito vai explodir — confessei, com meu
tom mais calmo e mais baixo que o dela. — Você chegou na minha
vida e virou tudo de cabeça para baixo, tornou tudo melhor com
suas bagunças coloridas e agora, está me fazendo pai de novo. Eu
te amo tanto!
Ainda era preciso ir ao médico e saber se tudo estava bem,
com ela e comigo, mas naquele instante, a felicidade e o surto eram
tudo que nos dominava.

CAPÍTULO VINTE E TRÊS
Emily
Eu odiava os hospitais desde que era menina. Para ter
Samuel, precisei treinar minha mente por várias semanas e estar ali,
sentada em um corredor, aguardando uma consulta para Liam me
deixava ansiosa. Nos últimos quinze dias, desde que retornamos da
Disney, minha vida estava de cabeça para baixo e minha mente
confusa ao descobrir uma gravidez quando Liam, supostamente,
não podia ter filhos.
Apesar de estarmos felizes, havia um sentimento de apreensão
que deixou Liam agitado e ativou seus gatilhos do estresse póstraumático. Nós precisamos voltar a sua terapeuta, que nos
encaminhou mais uma vez ao psiquiatra para aumentar a dosagem.
Também precisou ser submetido a novos exames, assim estávamos
ali, aguardando sermos atendidos em um encaixe.
Normalmente, o médico nos atenderia em seu consultório, mas
ele estava de plantão e pediu que fôssemos até o hospital. Era um
ambiente que me afligia. Comecei a sacudir a perna e mordi o
cantinho da minha unha, tirando a pele. Liam estava trabalhando
pelo celular, resolvendo o problema de um cliente insatisfeito e
precisava dar toda atenção para não perdermos o contrato.
Ele encerrou a chamada e se pudesse exemplificar o som que
saiu de sua garganta, só podia dizer que foi um rugido.
— É por isso que te chamam de Fera — brinquei, tentando
aliviar a tensão.
— Esse cara é um idiota. Sempre atrasa os pagamentos e é o
primeiro a exigir modificações que não cabem no pacote. — Bufou e
seu telefone tocou novamente. — É uma mensagem de
agendamento de reunião.
— Quem é? Não lembro de nada na sua agenda…
— Vou descobrir se seu pai mentiu para mim naquela reunião e
se todas as vezes que achei que fomos seguidos é verdade ou não
— respondeu enigmático e mordi o lábio. Briguei com ele por se
reunir com meu pai biológico. Eu ignorei o encontro, tomando a
atitude de fingir que a Família Russo não existia. Não era certo que
chegassem agora e tomassem tanto da minha mente e coração.
— Com quem vai falar?
— Enrico Di Fabrizzi[11]
. Ele é chefe dos italianos aqui em
Chicago.
— Liam, não. Isso é demais, não nos quero envolvidos com
essas pessoas! — Agarrei sua mão. — Quem se importa com minha
família biológica? Eu não tenho nada a ver com eles!
— Esse é o ponto. Seu pai provoca pessoas através da
esposa, ele tem derrubado negócios de pessoas que são envolvidas
com os russos. Sabe o que isso pode significar para os italianos?
Que ele está se reagrupando. Eles podem ter nos seguido naquele
dia para ter certeza do envolvimento, estão observando e eu quero
deixar claro que você não tem nada a ver. — Liam beijou minha
mão. — Não fique nervosa.
— Liam…
— Por que é tão difícil confiar em mim?
— Claro que confio em você. — Franzi o cenho. — Confiar não
significa que não sinta medo.
Ele me deu um olhar divertido.
— Acho que sentir medo é não confiar.
Será que ele tinha razão?
— Não quero que ninguém que amo se machuque.
— Eu sei, baby. Você vive para se preocupar. — Ele beijou
meus cabelos e finalmente fomos chamados. Levantamos juntos,
ele abriu a porta para que passasse na frente e cumprimentei seu
médico.
O laboratório enviou o resultado diretamente para ele, assim
Liam e eu não sabíamos o que ele iria falar e por algum motivo, não
mencionamos a gravidez, que foi confirmada por um exame de
sangue e uma consulta médica, faltavam os exames de imagem. O
bebê estava tão real que me trazia um belíssimo enjoo ao longo do
dia e ele estava começando a surgir enquanto o médico lia os
papeis enviados.
Liam passou o indicador em sua cicatriz e segurei sua coxa.
Ele fazia aquilo sempre que ficava nervoso.
— Definitivamente, sr. Jones — o médico murmurou. — Há
uma boa contagem de espermas saudáveis. Não o suficiente para
um homem da sua idade e com a sua saúde, mas, o suficiente para
que precisem de cuidados. Vejo que sua esposa é jovem, aparenta
saúde…
— Muita saúde — Liam murmurou. — Tanta, que ela já está
grávida.
Dr. Rulian tirou os óculos e riu.
— Digamos que ficamos muito tempo sem proteção e só veio a
acontecer recentemente — falei com uma risada. Liam apertou
meus dedos.
— Como disse, a contagem é baixa para um homem como
Liam. Direi o que meus colegas médicos não acreditam, mas em
alguns casos, simplesmente acontece o que tem que acontecer.
Vamos seguir acompanhando, se terá uma evolução ou ficará
estagnado.
Liam foi para a mesa ser examinado e fez uma expressão
emburrada. Sempre que levávamos Samuel ao pediatra, ele se
tornava um bobo, protegendo o menino e ao mesmo tempo, fazendo
palhaçadas para que sorrisse e não sentisse medo. Fiquei fazendo
caretas e palhaçadas por trás do médico e ele riu, com as pontas
das orelhas vermelhas de vergonha.
Mais exames precisariam ser feitos, mas já tínhamos a
resposta que precisávamos. Liam ficou quieto por todo trajeto até
nossa casa. Samuel estava com minha mãe e combinamos de
buscá-lo no fim do dia. Entrei e sentei, ouvi os latidos de Lilo na
casa do nosso novo vizinho, brincando com a cadela deles. Elas se
tornaram melhores amigas e viviam brincando entre nossos
quintais.
— Você está bem? — Ele sentou na poltrona.
— Estou digerindo tudo — falei com sinceridade.
— Eu te devo desculpas. — Liam esfregou os peitos. —
Deveria ter ido ao médico, verificado com mais afinco antes de nos
colocar nessa posição. Estamos esperando um filho quando nós
não planejamos…
— Sim, você deveria ter ido ao médico, mas caramba! Teremos
um bebê, fizemos com amor, mesmo sem planejamento e nós
estamos aumentando a nossa família, como sempre foi nosso
sonho. — Saí do meu lugar e mudei para o seu colo. Ele me
abraçou e enfiou o rosto no meu pescoço. — Sei que parece
surreal, mas aqui, cresce o seu bebê.
— Estou tão feliz que parece um sonho. — Sua voz soou
embargada.
— Ah, amor. Você quer chorar? — Ergui seu rosto. — Estou
bem com a maneira que o destino escolheu nos dar um filho. Com
Samuel, eu me arrependo muito de todas as vezes que me ressenti
por estar grávida, mesmo amando-o muito na minha barriga. Ele
tornou a minha vida muito melhor. Eu não quero ficar magoada com
essa gravidez, já está sendo diferente porque não passarei por ela
sozinha.
— Nunca vou te deixar sozinha — ele prometeu. — Vocês três
são absolutamente tudo para mim. Não estamos magoados ou
tristes com o bebê, até porque, dentro do meu coração, só tem
felicidade. Quando poderemos ouvir o coração?
— Na próxima consulta. — Beijei seus lábios. — Agora que
tudo está esclarecido e temos mais quarenta minutos antes de
ficarmos online para o trabalho, eu me pergunto se meu noivo e o
pai dos meus filhos está disposto a ter uma conversa bem picante lá
no quarto?
— Seu homem concorda plenamente. — Ele me ergueu no
colo, me assustando e soltei uma risada alta, segurando-o. Fiquei
com um pouco de medo de cair na escada, mas ele me levou até
nosso quarto sem demonstrar cansaço.
Jenna e Regina brincavam que toda noite eu escalava o
Everest, mas sendo uma mulher alta que sempre teve dificuldade de
ter encontros com homens da mesma altura, ter meu gigante
particular era a realização de um fetiche. Liam me colocou no centro
da cama e comecei minha tarde montando nele e matando meu
desejo de ser saciada pelo meu homem.
— Descansa um pouco. Eu vou trabalhar e buscar Samuel,
você está com horas acumuladas e eu sou o seu chefe. — Ele me
deu um beijo antes de sair.
Até queria discutir, mas o sono me venceu. Fiquei exausta
como se tivesse corrido uma maratona. Com o quarto na
temperatura perfeita e Lilo esparramada aos meus pés, dormi tanto
que acordei já estava escuro e o jantar completamente congelado.
Desci de pijama, Lilo correu para o quintal, provavelmente apertada
e de repente, começou a latir.
Era tão raro seus latidos que me assustei, deixando cair o
pacote do frango dentro da pia. Lilo nunca agia com raiva.
Parei perto da porta dos fundos e a chamei, ela entrou
correndo e eu fechei tudo, acionando os alarmes até das janelas.
Liguei a televisão e sintonizei no canal das câmeras, não
encontrando nenhuma movimentação estranha. Acionei a
segurança remota e questionei se havia alguém perto da
propriedade.
Meu telefone tocou segundos depois.
— Emily? Estou no carro com Samuel e Owen. O que está
havendo?
— Lilo começou a latir para a escuridão e eu não sei o que é,
não consigo ver o que tem na parte das árvores que dá para o
parque. Ela nunca é arisca.
— Estou chegando e irei verificar a propriedade. Não saia da
cozinha — ele avisou e assenti, muda. Depois percebi que ele não
podia me ver. — Emily?
— Sim, estou aqui com ela.
Puxei uma cadeira e sentei contra a parede, tendo uma boa
visão para as janelas. Nos fundos, nós tínhamos um quintal grande,
com uma casa de hóspedes, piscina, uma área gourmet e um bom
pedaço de grama, onde Lilo brincava. Eu vi o momento que Liam
passou pelas espreguiçadeiras, olhando todos os cômodos com
cuidado até fazer a liberação.
Owen entrou com Samuel, que quis meu colo, cheio de
saudades. Dei um beijo em suas bochechas gordinhas, ele estava
cheiroso e sorridente, falando sem parar. Fiquei com ele nos meus
braços, apesar de me sentir segura com Liam em casa e Owen
basicamente a dois passos de mim, meu instinto materno sempre
me fazia estar pronta para correr.
Proteger meus bebês era a minha prioridade em qualquer tipo
de ameaça.
— Não encontrei nada. A cerca parece torta, mas isso sempre
acontece quando Lilo se joga nela. Provavelmente foi algum bicho,
algum cachorro solto e ela estranhou. Nada que pareça humano. —
Liam entrou pelos fundos já falando, mas precisou parar para dar
atenção a Lilo. — Boa menina, minha protetora. Cuide sempre da
mamãe. — Ele esfregou as orelhas dela e ficou de pé. — Está
melhor agora?
— Fiquei só um pouco nervosa, mas estou bem. — Abracei-o
com Samuel entre nós.
Owen ainda não sabia da gravidez. Liam e eu queríamos fazer
todos os exames antes de anunciar para nossa família e amigos.
Não era nem sobre esperar o terceiro mês, apenas ter mais
detalhes sobre nosso pacotinho de amor que se desenvolvia no
ventre. Como eu era festeira, já planejava um grandioso jantar para
soltar a notícia e comemorar.
Ninguém estranharia o fato por ainda amamentar Samuel e eu
era conhecida por ser boba e emocional a maior parte do tempo.
Os homens assumiram o comando da cozinha, eles ainda
precisavam falar sobre o trabalho e eu tomei notas sobre as
decisões tomadas enquanto Samuel brincava no chão, no seu
tapete de atividades. Estava distraída digitando rapidamente uma
ideia de Owen para aprimorar os sistemas quando Liam me cutucou
e sinalizou para ficar em silêncio. Virei para o lado e cobri minha
boca.
Owen foi rápido em agarrar o telefone e começar a filmar
Samuel dando seus primeiros passos sozinho no corredor em busca
do seu caminhão de bombeiros. As lágrimas de ver meu filho
andando pela primeira vez sem apoio brotaram nos meus olhos. Ele
nos percebeu em silêncio, acabou caindo de bunda, riu e levantou
de novo.
— Papai! Cainho! — Ele apontou para o caminhão.
— Vem, filho. — Liam se moveu e ajoelhou. — Vem no papai.
Samuel riu e virou ainda incerto, mas deu passos certeiros para
simplesmente se jogar nos braços de Liam. Ele riu com as palmas e
quis fazer de novo, não parou mais de andar e mexer em seus
brinquedos. Ele nos chamava sempre que conseguia pegar um de
seus carrinhos de pelúcia e levar para o cesto.
— Bom que já vai aprender a guardar esse monte de
brinquedos que deixa espalhado — Owen falou atrás de mim. Ele
iria descobrir que não era tão simples assim depois que se tornasse
pai. Eu guardava os brinquedos de Samuel de um lado e ele
espalhava do outro, quase ao mesmo tempo.
Nós comemoramos o avanço de Samuel e ele gritou de alegria
por estar no centro das atenções. Cada minuto de felicidade
naquela noite compensou a tensão em nossos ombros das últimas
semanas. O medo que assombrou a boca do meu estômago se
dissipou. Liam era o pai dos meus filhos, perfeito mesmo com suas
manias. Samuel e o bebê poderiam crescer certos de que sempre
teriam um pai disposto a fazer tudo por eles.
Como mulher e mãe, não havia paz maior.
CAPÍTULO VINTE E QUATRO
Emily
— Samuel! Por favor, não! — falei mais alto, ele parou de se
debater. — Seu pai está chegando, espera um minuto! —
argumentei, agarrada a um fio muito delicado de paciência que meu
filho estava consumindo desde que abriu os olhos.
Quanto mais crescia, mais difícil de lidar ele ficava. Filhos não
carregavam um manual de instruções conforme a personalidade
desenvolvia. Era simplesmente uma aventura nova a cada novo dia.
Ele saiu mais rápido, não exatamente correndo, na direção oposta
do banheiro. Joguei a toalha nele, para cobrir seu rosto e caí na
gargalhada pela maneira que ele parecia um fantasminha andando
com as mãos na frente.
Agarrei-o e enchi de beijos. Meu sapequinha.
Aproveitei para tomar banho com ele quando fiquei molhada
demais com suas bagunças. Secar seu cabelo e colocar a fralda
quando Samuel planejava fugir pelado era exaustivo. Bufei,
cansada, com meu cabelo molhado por todo lugar, mas pelo menos
ele ficou vestido. Coloquei-o no centro da minha cama, vigiando,
porque sabia descer e começava a mexer em tudo.
— Família? Cheguei! — Liam gritou da sala. — Lilo fez uma
festa com o papel higiênico!
— Vaquinha — murmurei para ela, que deitada estava,
continuou fingindo que não tinha nada a ver. — Você deveria descer
e limpar.
— Certo. A cadela vai limpar a própria bagunça. — Ele entrou
no quarto, rindo. — Uau! Uma mulher pelada, que delícia — falou
baixinho.
— Papai! Banho eu! — Samuel gritou da cama.
— Você tomou banho, moleque? Lavou tudo direito? Sabe que
precisa lavar direitinho ou vai ficar muito fedido! — Liam o pegou e
jogou para o alto. Meu coração sempre falhava uma batida quando
aquilo acontecia. — Está cheiroso e lindo! Do jeito que o papai
ama!
— Vocês dois se comportem enquanto me visto.
— Nós vamos assistir alguma coisa divertida. — Liam o
segurou e me deu um beijo. — Não precisa correr. Frank ainda
estava no mercado comprando bebidas.
— Tudo bem, vão se divertir que irei me maquiar um pouco.
Era raro conseguir sair totalmente arrumada com Samuel. Liam
ficava com ele para que pudesse me vestir, mas nem sempre havia
tempo de sobra e a maquiagem nunca era prioridade. A avó de Liam
nos convidou para almoçar, fazia tempo que não nos víamos, desde
o aniversário dela de oitenta anos. Ela sentia falta de ter a casa
cheia, ou pelo menos com Samuel deixando tudo virado.
A casa dos meus pais era mais equipada para crianças porque
meus sobrinhos também viviam por lá, mas a da avó de Liam tinha
mais coisinhas interessantes.
Assim que finalizei com o batom, reparei que meu telefone
estava com várias chamadas perdidas de um número desconhecido
do Canadá. Podia ser da área de Toronto, mas eu não tinha certeza.
Não era Olívia, muito menos Justin. Liam e eu tivemos uma
chamada de vídeo com eles na noite anterior e permaneciam com o
mesmo número.
Descartei a ideia de ser alguém do meu último trabalho, porque
meu número era local e eu não mantive contato com ninguém. Foi
grosseira a maneira que simplesmente desapareci e duvidava que
qualquer um deles quisesse manter uma conversa amigável depois
do que fiz. Alguns até poderiam compreender, dado o escândalo do
que aconteceu no restaurante. Sorte que o pai de Olívia interveio ou
o assunto ainda seria pauta nos canais de fofoca do Canadá.
Não atendi o telefone por já estar atrasada. Liam recolheu as
bolsas, assobiou para Lilo e a prendi atrás, ao lado de Samuel.
— Precisaremos de um carro maior — ele comentou, fechando
o porta-malas. — Não vai dar para os três no mesmo banco sem ter
brigas.
— Só se comprar um caminhão.
— Ou uma minivan para a mamãe.
— Eu não vou dirigir uma minivan — rebati imediatamente. —
Quero um carro esportivo.
— Depois diz que não quer que Samuel tenha gosto por
corridas — ele me provocou.
Meu telefone voltou a vibrar na bolsa, estava no fundo dela e
senti uma preguiça enorme de revirar tudo e procurar. Se fosse
urgente, qualquer um próximo sabia que era só ligar para Liam. Ele
sempre estava com o telefone por perto, não só por minha causa,
como principalmente pelo trabalho, que exigia muito de sua atenção.
Nós tiramos aqueles dias de folga para ir à Disney, mas a previsão
de próximas férias era incerta.
A empresa estava em pleno crescimento, Liam com muitos
novos contratos e projetos. Ele estava começando uma parceria
com uma empresa de segurança em Detroit de um amigo, também
buscando outra em Seattle. Simon, seu amigo selvagem (apelido
que Olívia e eu demos), viria para ajudar a criar os módulos de
segurança.
Às vezes, perguntava se Liam sentia falta da Inglaterra, mas
ele disse que quando se feriu, solicitou a transferência para Chicago
logo que possível. Sua família gastou um bom dinheiro trazendo-o
de avião, com médicos e enfermeiras, porque ele não suportava o
som dos cavalos treinando do lado de fora do hospital militar. Ele fez
todo tratamento com a avó e Frank ao lado.
Owen chegou depois.
Samuel passou o trajeto inteiro conversando com Liam e a
cada começo de frase com suas palavrinhas engraçadas e
confusas, ele chamava papai. Era muito fofo. Eu amava ouvir sua
voz suave me chamando de mamãe e fazendo dengo pelas
manhãs, ao longo do dia, o ato podia dar nos nervos, mas sempre
seria a palavra mais linda do mundo.
Vovó nos recebeu com alegria e seus clássicos palavrões.
Frank apareceu mais sério, parecendo tenso, o que me deixou em
alerta. Para minha surpresa, Margareth estava na cozinha, lavando
a salada.
— Oi, Emily! Que feliz em te ver! — Ela sorriu, empolgada.
Apesar da resistência de Liam, a mãe dele sempre me tratou
muito bem e nós tínhamos boas conversas ao longo do tempo
trabalhando juntas. Dei-lhe um abraço e expressei minha felicidade
em vê-la, apresentando Samuel pela primeira vez, que estava no
colo de Liam. Ele deu um aceno para a mãe sem falar nada,
enquanto nosso bebê sorria e acenava com sua clássica simpatia.
— Espero que não se importe de passar o dia com vocês —
Margareth falou com Liam.
— Claro que ele não se importa, porra. A casa é minha. —
Vovó passou por mim.
— Eu não me importo — Liam falou de forma seca. Ele não se
importava porque a mãe dele era indiferente.
Há muitos anos, ele a colocou numa caixinha dentro de sua
mente e a jogou no canto mais escuro. A ausência dela teve um
impacto muito grande. Ser abandonado não era fácil e lidar com
esse sentimento era complicado. Liam cresceu, amadureceu, mas
nunca iria esquecer que a mãe deles foi embora. Sorte que a avó
sempre esteve presente, ou aqueles irmãos poderiam estar
perdidos. Seria um dano irreparável.
Liam espalhou os brinquedos de Samuel no chão da sala,
pegou um refrigerante e ficou de fora com Frank. Passei a ajudar na
cozinha, no preparo do almoço e ignorei algumas tentativas de
Margareth em saber mais sobre nossa vida. Eu entendia a
curiosidade e a necessidade que tinha de fazer parte, mas não
cabia a mim ferir o limite que Liam estabeleceu.
— E o casamento? Já decidiram alguma coisa? — vovó nos
questionou.
— Estamos pensando em algo que tenha a ver conosco dois e
ao mesmo tempo, seja acolhedor e familiar. Entrei em contato com
alguns profissionais para ver datas e descobri que o mercado de
casamentos aqui em Chicago é agressivo. — Lavei as vagens. —
Todo lugar que olhei parece grande demais e ostentoso. Estou
quase aceitando a ideia de fazer um casamento em casa. Tem
alguns bem bonitos.
— Na minha época, era moda casar em casa. Um bolo
enorme, cheio de pedrinhas comestíveis e uma massa seca de
quebrar os dentes — vovó comentou. — Hoje em dia ainda fico para
morrer com esses bolos duros feito tijolo que fazem só para ficar
bonito.
Entendi imediatamente de onde Liam cismava que bolo tinha
que ser macio. Ele perguntou se o nosso podia ser massa caseira
com bastante recheio, eu ri e não compreendi direito na hora.
O clima no almoço foi amistoso, mas todos pareciam pensar
muito bem no que falar. Samuel deu um ataque sem nenhum
motivo, podia ser sono ou qualquer coisa. Liam aproveitou para
dizer que deveríamos voltar para casa e fazê-lo dormir. Ele não
queria ficar mais e respeitei. Em casa, não quis falar sobre a mãe,
deitou com Samuel e dormiu.
— Parece que teremos um momento de garotas. Quer me
acompanhar fazendo as unhas e assistindo a um filme idiota? —
Acariciei a cabeça de Lilo. — Depois dizem que somos
temperamentais, mas o que dizer dos homens dessa casa?
Lilo latiu e me seguiu pela escada.
Meu telefone estava vibrando na bolsa e peguei, era o número
desconhecido de novo.
Por algum motivo inexplicável, senti um aperto no coração ao
atender.
— Olá?
— Oi amor, quanto tempo não nos falamos? — A voz de Dylan
soou debochada e me trouxe arrepios. Ouvi um fungar e me
perguntei se ele estava cheirando cocaína enquanto me ligava. —
Antes que desligue, tenho algo a dizer. Não merece essa cortesia,
mas direi mesmo assim. Meu pai e eu estamos buscando nossos
advogados para ter a guarda do meu filho. Minha adorável
secretária deixou de ser inútil e encontrou exames que fiz no mesmo
dia que assinei. Eu estava alto. Fui induzido pela vaca da minha
mãe e a vadia da minha ex-noiva em abrir mão do meu filho.
Felizmente, meu pai me entendeu e você vai deixar de brincar de
casinha com aquele filho da puta.
— Dylan? Não faça isso!
— Tarde demais, bebê. Era melhor ter me perdoado. — Ele
encerrou a chamada.
Sem ar, encostei contra a parede, sentindo meu coração bater
tão forte que doía. Olhei para a escada e meu instinto gritou para
correr. Agarrar o máximo de roupas e correr com Samuel. Subi
rapidamente e parei na porta do quarto, tomada pela visão do meu
bebê protegido nos braços do pai. Mergulhei em uma espiral de
medo e horror, voltando para todas as vezes que fui humilhada e
perseguida pela família de Dylan.
Eu sabia que eles tinham muito dinheiro, poder de influência e
um time de advogados cruéis.
— Baby? Aconteceu alguma coisa? — Liam acordou e sentou
na cama. — Está sentindo-se mal?
— Liam, vem aqui — pedi, ainda acelerada. Ele saiu do lado de
Samuel com cuidado e atravessou o quarto. — Dylan me ligou. Ele
disse que vai tirar Samuel de mim. Ele falou que tem exames que
comprovam que estava drogado no dia que assinou os papéis
abrindo mão do Samuel.
— Ei, ei! — Liam segurou meu rosto. — Ele não vai fazer isso.
— Olhou em meus olhos. — Confie em mim. Samuel nunca vai sair
dos nossos braços. Dylan não tem esse poder de tirá-lo de nós.
— Mas os advogados…
— Emily! — Liam falou mais alto e mais brusco. — Nosso filho
não vai sair daqui, fui claro? Eu sei que está com medo e que sofreu
muito com eles, mas preciso que confie em mim. Você confia?
Liam estava falando muito sério, ao ponto de ser assustador.
Me senti acuada e angustiada, mas também entendi que era vital
para nosso relacionamento aquela confiança. Se eu dissesse que
não, seria a nossa ruptura. Nos levaria diretamente para um lago
superficial, afundando todos os bons momentos em família e a
certeza de que estaríamos juntos para sempre.
— Estou com muito medo, me assustou, mas eu confio em
você. Não posso viver sem meu filho. Eu…
— Ei, amor. Calma. — Ele beijou minha testa. — Vou cuidar de
tudo.
— Não lembrei de gravar a ligação.
— Tudo bem, vamos dar um jeito. — Ele me abraçou. — Você
está tremendo, Emily. Por favor, se acalme. Samuel e o bebê
precisam da mamãe forte.
— Eu serei forte por eles e por nós, mas por que isso?
— Nós vamos descobrir e iremos vencer.
Liam me deixou sentada no quarto, pegou meu telefone e foi
para seu computador no escritório. Incapaz de ficar longe do meu
filho, deitei ao seu lado e o abracei. Prometi que ficaríamos bem.
Ainda estava com medo, com vontade de correr, me sentindo
exposta e vulnerável.
Eu tinha que confiar. Aceitar que nada no mundo me tiraria
meu filho porque Liam cuidaria de nós.
CAPÍTULO VINTE E CINCO
Liam
Emily finalmente dormiu depois de ficar horas abraçada com
Samuel na cama. Nós mal nos falamos. Ela estava em choque e
parte disso, dado ao medo da família de Dylan. Eu não tinha medo
deles e só não liguei de volta, porque não era moleque para fazer
ameaças por telefone. Já tinha avisado ao bastardo que se voltasse
para o caminho da minha mulher, as consequências seriam
pesadas.
Eu não estava brincando.
Nunca brincaria com a proteção da minha família.
Pedi que Owen deixasse o que estava fazendo e ficasse na
minha casa. Solicitei a segurança remota e recrutei James para me
acompanhar em um encontro. Enrico Di Fabrizzi não parecia muito
feliz com a minha ligação pedindo para adiantar nosso encontro mas
aceitou, então, era tudo pelo que podia ficar satisfeito.
Não contei a ninguém além de James o que iria fazer. Owen
tentaria vir comigo e falaria para Frank, mas, era algo que deveria
ser mantido entre o mínimo de pessoas e eu confiava que meu
amigo protegeria minha mulher e filho em casa. Sem saber o que de
fato estava acontecendo e o que realmente a família Mitchell
planejava, eu precisava ser muito cauteloso.
James ficaria à distância, dando cobertura. Entrei no pátio de
uma antiga casa no bairro italiano. Enrico estava sentado, sozinho,
mas eu sabia que seus homens estavam espalhados pela casa e de
olho em nós. Ele não ficou de pé, permaneceu em sua falsa calma,
sem esboçar nenhuma reação e apontou para a cadeira à sua
frente.
— Veio pedir desculpas por tentar invadir os sistemas da minha
família?
— Não. Eu fiz o que estava sendo pago, não posso me
desculpar por isso. Vim aqui esclarecer o envolvimento da minha
mulher com sua família biológica.
Enrico inclinou a cabeça para o lado.
— E qual seria?
— Nenhum. Emily foi adotada ainda nova e perdeu todo
contato com o pai. Ela não sabe sobre os negócios do avô biológico
e nós não fazemos ideia da real intenção da família Russo reunindose novamente em Chicago.
— E por que isso me interessaria?
— Porque vocês me seguiram e a seguiram, para averiguar os
fatos e eu entendo o motivo, mas como pai e marido, estou
protegendo minha família.
— Eu respeito isso mais do que imagina e sim, nós já
sabíamos que sua esposa não tinha nenhum envolvimento. Em uma
das vezes, percebemos que ela estava sendo observada pelos
associados de Russo e por isso, mandei meus homens ficarem por
perto só para dar um recado. Emily é cidadã dessa cidade, que me
pertence, nós não mexemos com pessoas inocentes e não
permitimos que mexam com eles também. — Enrico foi enfático. —
No entanto, essa cortesia não se estende ao pai dela.
— Eu não me intrometeria nisso — afirmei com tranquilidade.
— Acho que estamos entendidos agora. — Ele sinalizou para
que um de seus homens se aproximasse. — Gostamos do seu
trabalho em Nova Iorque, apenas desejamos que não o faça
novamente.
— Sua família tem negócios com os Mitchell? — Fui direto ao
ponto.
— Essa é uma informação muito cara. — Ele sorriu torto e
pegou o envelope. — Aqui está o que me pediu. Tudo sobre eles
está em um pendrive.
Enfiei minha mão no bolso da camisa e entreguei a ele a minha
parte.
— Tudo sobre o governador. — Empurrei em sua direção.
Não senti nenhum arrependimento. O governador não era meu
cliente e eu não feri nenhuma confidencialidade, apenas entreguei
informações sobre as ações dele em uma região e determinadas
pessoas que a família italiana estava com acesso restrito.
Com tudo que estava ali, era questão de tempo que
conseguissem invadir mais um território.
Como um cidadão honesto, aquilo ardia na boca do meu
estômago, mas em uma cidade comandada pelo crime organizado,
do qual Emily tinha laços sanguíneos e sendo a razão de todo meu
amor, eu não pensaria duas vezes antes de fazer o necessário para
que ela e nossos filhos tivessem a vida normal e dos nossos
sonhos.
— Grazie. — Enrico ergueu a mão e entregou, seu homem se
afastou. — Nunca esqueça que ao derrubar os Mitchell, você dará
espaço para minha família entrar em Toronto. Esse é um favor que
sempre terá da minha parte e do meu irmão. Aguardo seus
próximos passos.
Aquilo significava que estaria para sempre relacionado a eles.
Era um preço alto a se pagar, mas eu não estava pensando nas
consequências, apenas mirando no meu alvo. Na marinha, aprendi
que tudo tinha um meio para concluir a missão.
A reunião foi encerrada e eu saí sem problemas. Não estava
com medo, ser cauteloso era uma coisa, mas eu sabia que os
italianos não atiravam pelas costas. Eles tinham a palavra honra
marcada em todo lugar. Era por isso que não toleravam traições ou
que entrassem em seus territórios. James me encontrou no meio do
caminho e nós não fomos seguidos.
Eu tinha uma missão e não falharia, fiz um acordo prévio com
demônios para livrar Emily e Samuel da perseguição sem limites
que os Mitchell poderiam começar. Se Dylan queria uma guerra, ele
seria derrubado antes da primeira batalha.
Ao invés de retornar para casa, fui direto para o escritório e me
tranquei em minha sala. Ativei o módulo de segurança para poder
conectar o pendrive nas minhas máquinas e ler tudo que tinha ali.
Enrico não brincava em serviço. Ele tinha todos os podres sujos e
financeiros dos Mitchell, além de fotos comprometedoras de Dylan
em orgias, do pai dele com diversas amantes e até vídeos.
A intenção de derrubá-los provavelmente se dava ao fato do
pai de Olívia, o Senador Spencer[12]
, ser associado aos Vaughn, que
só a grande massa de manobra não percebia que estavam ligados
aos italianos. Pelo menos, Vince Vaughn [13]e Enzo Rafaelli [14]foram
colegas de fraternidade e segundo minhas pesquisas, o italiano
ficava mais nas festas da universidade do que realmente estudando.
Fiz a minha própria pesquisa. Era difícil saber como, onde ou
porquê, mas os italianos tinham um acesso ao Canadá pela região
francesa. Há alguns meses surgiram rumores de que recebiam
carregamento de armas na fronteira, a polícia fez um show, a mídia
deu cobertura especial e nada foi provado. No dia da emboscada,
havia qualquer coisa por lá, menos armas e os homens da máfia.
Podia ter um pouco de verdade nessa informação.
Em todo caso, eu já havia apertado a mão do diabo e precisava
fazer minha parte, até porque, eles não iam parar por minha causa.
A família de Dylan seria derrubada cedo ou tarde, a única diferença
era que eu precisava dessas informações para serem o meu trunfo.
Peguei meu telefone e liguei para Simon. Ele não atendeu.
Enviei uma mensagem, pedindo que retornasse o mais rápido
possível. Quando ele ia pegar madeira ou estar em sua plantação,
desaparecia por horas, principalmente com a reforma de um dos
galpões. Deixei meu telefone de lado e massageei minhas
têmporas, preocupado e um tanto estressado. Owen me avisou que
Emily estava acordada e na cozinha, alegando estar faminta e ele
faria comida para ela.
Simon me ligou de volta.
— Estava fora.
— Imaginei. O quão rápido pode estar aqui?
— Pegarei o próximo voo.
— Obrigado, amigo.
Separei as pastas de acordo com meus próximos passos,
precisando pensar rápido e ao mesmo tempo, sendo cauteloso
porque não podia falhar. Levei horas para conseguir voltar para
casa. Emily estava na sala, brincando com Samuel de montar
blocos. Ela ergueu o rosto e sorriu, aliviada, com o brilho de quem
chorou em cada oportunidade que teve.
Deixei minha pasta no canto, dando atenção a Lilo. Samuel me
chamou com a mãozinha, soprando beijos babados e eu sentei no
chão, ao lado. Ele subiu no meu colo, mostrando as cores de seu
brinquedo. Passei meu braço por trás de Emily e a puxei para mim.
Ela relaxou, recostada no meu peito, com um suspiro choroso.
— A mãe dele me ligou. Ela disse que foi expulsa de casa e
que François pediu o divórcio ao descobrir que ela escondeu a
existência de Samuel e induziu Dylan a abrir mão da guarda —
comentou baixinho. — O estopim para Dylan foi que ele pegou
Adelle na cama com o personal trainer. Ela saiu de casa, pediu o
divórcio e foi morar com o amante, que agora, é namorado. Parece
que ele contou sobre mim e Samuel para a esposa na noite do
feriado, ela ficou furiosa que havia um bebê e decidiu que daria uma
chance ao homem por quem estava apaixonada. Carina está muito
preocupada que ela, Adelle e eu sejamos alvos deles.
— A mãe dele concordava com as atitudes deles?
— Ela sempre foi amargurada e rancorosa comigo, mas hoje
eu vejo que era uma mulher oprimida, que apanhava do marido,
sem apoio e no fundo, o que fez por mim foi o melhor. Ela usou a
desculpa de um escândalo para me libertar com Samuel. Talvez
tenha sido o que sempre quis para si mesma e nunca pôde. —
Emily fungou e secou o rosto. — O que passou o dia inteiro
fazendo?
— Conversamos na cama. — Beijei sua testa.
— Tudo bem. Não me esconda nada, por favor — pediu
baixinho.
Emily era forte para milhares de situações, mas seu ponto fraco
e maior medo sempre seria nossos filhos. Ela entrava em colapso
pelo desespero, por instinto, agia como uma leoa e isso fazia com
que reagisse, arisca e desconfiada. Eu sabia que ela me amava
muito e isso batia de frente com o lado mãe, que queria controlar
tudo.
Eu precisava que ela confiasse em mim para poder protegê-la.
Essa entrega era a mais difícil de todas para ela, eu sabia
disso. Tudo que passou sozinha com Samuel criou essa casca
grossa, que fui descamando lentamente ao longo do nosso
relacionamento.
— Ainda sente vontade de correr?
— Inicialmente, sim. Muito. Não quero que se ofenda, Liam. Eu
te amo e consigo enxergar claramente seu amor por mim e por
Samuel, e agora… pelo bebê — falou a última parte mais baixo.
Owen estava com seu computador na sala de jantar. — Mas é meu
instinto. Proteger meus filhos acima de qualquer coisa.
— O meu instinto é proteger vocês e é isso que preciso que
acredite.
— Eu acredito, juro. É por isso que estou aqui, sentada e
brincando, planejando nosso casamento e o dia que iremos contar a
grande novidade a todos. Estou seguindo a nossa vida porque eu
sei que isso não vai passar de uma sombra. — Ela me olhou nos
olhos. — Me desculpa por isso, eu sei que é muito importante para
você minha entrega e confiança, estou aqui de verdade e não vou
sair no meio da noite para me esconder com Samuel em uma
caverna. Só se você vier junto.
— Obrigado por compreender isso. Pensei que fôssemos brigar
de novo pelo mesmo assunto…
— Também pensei, mas na verdade, nós dois queremos a
mesma coisa: manter nosso filho em segurança. Eu agi de maneira
irracional de manhã cedo, foi de supetão, depois eu senti a nossa
ligação. A potência que somos juntos. — Ela se inclinou e beijou
meus lábios. — Você me mostrou que a maternidade não é a parte
feia da minha vida, é a mais bonita e se sempre tive forças para ser
mãe desse menino, é porque você chegou quando ele tinha três
meses e me deu suporte.
Emily me abraçou e suas palavras trouxeram calma ao meu
coração.
Ela continuou brincando com Samuel e eu fui falar com meu
amigo enquanto comia alguma coisa. Owen estava desconfiado e
querendo saber o que fiz, mas até Simon chegar, era melhor manter
meu plano apenas para mim mesmo, não sabia se os dois iriam
concordar. Eu agiria sozinho, se fosse o caso. Não pediria um
envolvimento a Justin, porque ele tinha um filho pequeno e se algo
desse errado, Olívia me acertaria com uma flecha no peito.
Ethan e Louis eram pessoas públicas demais para passarem
despercebidos por aí.
— Vou dormir no seu quarto de hóspedes — Owen avisou. —
Frank está trazendo umas roupas. Ele vai dormir com a avó, apenas
no caso…
— Obrigado por isso.
— Nunca me agradeça por proteger a sua família, vocês são
tudo que tenho. — Owen bateu com o punho no meu. — Mesmo
que Emily tenha vomitado com o cheiro do meu macarrão. Sempre
achei que cozinhava bem. Tive que dar alguns legumes cozidos e
ovos para ela.
Eu quis rir. Não tinha nada a ver com a comida dele e sim com
seus enjoos fora de hora. Emily não estava suportando cheiro de
café, o gosto do queijo e estava apaixonada por legumes em
conserva, mesmo sendo a última coisa que deveria comer. Eu podia
me encher de suplementos e ignorar os alimentos saudáveis, ela e
Samuel não. Podiam me chamar de hipócrita à vontade.
— Ela está nervosa, não fique ofendido.
— Se eu fosse o tipo de homem sensível, Emily já teria me
fodido. Ela questiona tudo e implica comigo desde o segundo que
ficou confortável. — Owen bufou e dessa vez, eu ri alto. Emily tirava
todo mundo de sua zona de conforto, e de um jeito bom.
Olhei para ela no chão, assoprando a barriguinha de Samuel e
ele gritava de alegria.
Eles seriam felizes daquela maneira para sempre.
CAPÍTULO VINTE E SEIS
Liam
Emily sentou no centro da cama, roendo as unhas, nervosa por
tudo que havia lhe contado. Felizmente, não questionou muito,
parecia estar disposta e entender tanto quanto eu (até um pouco
mais), que a família de seu ex-noivo usaria artifícios pesados para
tirar Samuel de nós. A ligação da ex-sogra foi a cereja do bolo. Eu
sabia quem era o grupo de advogados que trabalhava para os
Mitchell.
— Acha que seu primo vai nos ajudar? — Ela mordeu o lábio.
— Pagaremos a ele, é claro.
— Acredito que sim. Não seria pelo dinheiro, mas Adam[15] é
focado em outro segmento. Se ele não puder, o irmão poderá vir.
Logan é tão bom quanto — expliquei e brinquei com meu telefone.
— Já enviei a mensagem, logo terei um retorno.
Minha avó tinha dois irmãos e uma irmã. Essa irmã, teve uma
filha, que vivia em Chicago com o marido e três filhos, Adam, Logan
e Saori Byrne. A família Byrne ficou famosa com os feitos do
patriarca como advogado e filantropo. Eles eram muito ricos e
dominavam bem o meio que viviam, em diversos momentos,
assumiram o papel de inimigos dos italianos, mas tudo jogo político.
Eu sabia que Adam estava casado com a mãe de seu filho, que era
uma famosa advogada em D.C.
Vovó foi ao casamento. Eu nunca fui o mais sociável na minha
família.
Meu telefone tocou.
— Ei, Liam! Acabei de ler sua mensagem. — Adam soou
animado. — Estava fora em uma reunião. Sim, sei quem são. Estou
na equipe do Senador Spencer pelo último ano e li o histórico.
Também recebi certo pedido de um sócio aí em Chicago e acho que
não é coincidência. Me dê dois dias e estarei aí para resolver tudo
pessoalmente.
— Eu agradeço por isso, primo.
— Não precisa. Família sempre em primeiro lugar. Até breve!
— Ele encerrou a chamada e Emily esfregou as mãos juntas.
— Tudo bem, vai ficar tudo bem. — Ela segurou minha mão e
beijou. — Estou mais calma agora. Tão calma que seu bebê está
me fazendo sentir fome de novo. Sempre fui comilona, não lembro
de sentir tanta fome e tanto enjoo na gravidez do Samuel.
— Quer um sanduíche de rosbife? Sei que rejeitou o jantar do
Owen…
Emily arregalou os olhos.
— Não fui eu! — Ela ofegou. — Subiu um cheiro de cebola
refogada que esse bebê simplesmente odiou! Eu queria comer e ele
me fez vomitar tudo!
Agarrei seu rosto, sem conter a risada de seu embaraço e lhe
dei um beijo. Deixei-a na cama e desci, a casa estava silenciosa por
Samuel já estar dormindo. Lilo ficou no quarto. Ela raramente me
seguia se Emily estivesse em casa. Preparei o lanche rapidamente
e vi que o telefone dela estava carregando na mesinha, a tela
acendeu com uma notificação de chamadas perdidas e havia uma
mensagem no correio de voz.
— Espero que seja burro o suficiente para registrar suas
ameaças, merdinha — falei sozinho e dei play.
“Estou contando os dias para acabar com sua vida, Emily. Você
deveria ter aprendido a não mexer comigo”. Ele riu antes de
encerrar a mensagem.
Era ridículo o quão covarde aquele pedaço de merda era. Eu
quebrei seus dedos e ele a atacava. Foi ele quem a agrediu mais de
uma vez em um relacionamento e deu-lhe um soco ao ponto de
deixá-la desacordada e internada por vários dias. Não podia nem
chamá-lo de homem. Iria ensiná-lo a mexer com alguém do
tamanho dele.
Meu peito queimou com a vontade de ir até lá e encher o rosto
de Dylan de porrada, mas precisava ser frio e vencer aquilo com
mais inteligência do que com os punhos.
Terminei o sanduíche de Emily e voltei para o quarto, ela
estava assistindo a um filme e trinta minutos depois me fez descer
para fazer pipoca e pegar mais suco. Se ela continuasse comendo a
cada meia hora, eu precisaria comprar um mercado. Me inclinei
sobre sua barriga e beijei, falando baixinho com o bebê e brincando
sobre a fome da mamãe.
— Tem alguma sugestão de nome? — Ela acariciou meu
cabelo.
— Não sei. Qual princesa da Disney nomearemos se for
menina? — Dei-lhe um olhar brincalhão. Ela sorriu, marota.
— Fui pedida em casamento no castelo da Bela e a Fera. Será
uma enorme blasfêmia não nomear minha filha de Bela e se for
menino, quero tentar Andy. — Apertou minha bochecha e passou o
polegar em minha cicatriz com carinho. — Estou ansiosa para fazer
tantas coisas e sei que vou precisar ir com calma, mas quero ter
uma sessão de fotos, planejar meu parto com mais carinho, ter tudo
registrado, como não tive ânimo para fazer com Samuel.
— Você terá tudo que precisa, baby — prometi e beijei seu
ventre. — A chegada desse bebê será uma grande festa em nossas
vidas.
Nós fomos dormir muito tarde, precisei levantar para trabalhar
diversas vezes e aproveitei para assumir os cuidados noturnos com
Samuel. Ele acordou com fome por ter ido dormir cedo e depois,
pedindo para trocar a fralda. Minha avó dizia que ele iria desfraldar
rápido, era muito esperto e sabia como deixar claro os seus desejos.
Emily precisava descansar e foi difícil convencer o menino de que
não podia acordar a mamãe.
Cada fase era uma nova mania e a atual, era que ele não
queria que ninguém dormisse quando estava acordado.
Aproveitei que dormiu novamente para deitar com Emily. Ela
estava meio acordada, apenas na preguiça matinal e parecia ser um
bom dia, porque não estava enjoada ou reclamando de dor de
cabeça. Ficar no aconchego da cama era o melhor momento. Ela
odiava dormir com qualquer pessoa, ficávamos cada um de um
lado, porém, de manhã era o nosso momento.
— Sabe o que estava pensando nesse exato segundo? —
Emily falou baixinho.
— Ainda não alcancei o tão sonhado dom de ler mentes.
— Ah, isso é só com o gostoso do Edward Cullen. — Ela riu e
ergui meu rosto. — Não é nenhum príncipe da Disney. Jesus, Liam.
Sério, me leva na caverna que viveu. — Revirou os olhos e voltei a
deitar, rindo. Por que era tão difícil entender que tínhamos gostos
completamente diferentes no quesito entretenimento? — Enfim,
estava pensando que faz tempo que não fazemos sexo pela manhã.
— Tem dois dias, Emily.
— No meu mundo, isso é uma eternidade. — Deu de ombros e
subi sua blusa. — Eu amo um homem que entende uma indireta
como ninguém.
— Consigo compreender a linguagem do sexo, a cultura pop é
que não faz sentido.
— Eu ainda vou te converter a um grande apaixonado pela
Britney Spears. — Ela tirou as calças. — Estou apenas facilitando o
caminho.
Nós fizemos amor deliciosamente, não muito barulhento para
não acordar o restante da casa e voltamos a dormir. Quando desci,
mais tarde que meu horário normal de acordar, Owen estava pronto
para o trabalho e fazendo panquecas. Ajudei-o e montamos a mesa.
Emily desceu semi-pronta, com Samuel já preparado para sair e nós
comemos.
— Sua rotina é uma loucura pela manhã, como conseguem
chegar no trabalho inteiros com esse moleque fazendo bagunça e
tirando tudo do lugar está longe da minha concepção. — Owen
agarrou Samuel e fez cosquinhas. — Tu sossega, garoto! Tio Owen
vai te ensinar alguns mantras, músicas de meditação, que tal
acalmar o fogo?
— Como se música de meditação fosse acalmar Samuel. —
Emily riu, arrumando sua bolsa. — Ok! Temos que comprar fraldas
no caminho!
— Puta merda — Owen murmurou.
Ele vivia uma tranquila vida de solteiro, de vez em quando
aparecia com uma namorada, mas nunca eram garotas da agitação.
Depois de tudo que passou, preferia manter a calma e uma criança
pequena definitivamente equivalia a um pequeno terremoto
diariamente. Principalmente depois de andar, conforme cresciam,
tudo piorava.
No caminho, Owen descobriu que Samuel podia ser uma
peste.
— Acho que ele não vai querer ter filhos — Emily cochichou
quando paramos e ele se ofereceu para comprar fraldas.
— Ele vai querer ter no momento certo. Eu não sabia o que
queria até te conhecer.
— Fofo. — Apertou minha bochecha. — Carinha de malvadão
e coração de ursinho.
— Emily… — Bufei, esfregando meu rosto. Ela me matava me
chamando de fofo.
Owen voltou com os pacotes de fralda e colocou na mala,
chamando Samuel de cagão. Meu filho repetiu, ou ao menos
tentou.
— Não aprenda essas palavras, meu filho. Tio Owen não sabe
que bebês são como esponjas — Emily falou ao meu lado. — Irei
me vingar quando seu filho nascer.
— Convivendo com Samuel, acho que isso vai demorar muito.
— Owen sorriu, despreocupado.
Entregamos Samuel para a avó ansiosa em ficar com os netos
e seguimos para o escritório. Emily comeu rapidamente e foi
adiantar seu trabalho. Riley conseguiu controlar tudo muito bem na
nossa ausência, mas era jovem e muito tímida, mal conseguia falar
com os demais sem ficar muito vermelha de vergonha. Ela tinha um
namorado igualmente tímido, eu adorava deixá-lo com medo. Frank
e Owen atormentavam a vida da menina por pura diversão.
Na minha sala, dediquei a manhã para organizar o sistema
com os itens pendentes. De tão distraído, percebi que Owen estava
encostado na parede, perto da minha porta, me encarando sem nem
disfarçar que queria falar e me irritar.
— Solta a bomba logo. — Ajeitei um grupo de pastas na mesa.
— O que está fazendo que eu não sei? — Ele enfiou as mãos
nos bolsos. — Eu te rastreei ontem. Você esqueceu de me bloquear
para não ver seu trajeto. O que foi fazer no bairro dos italianos?
— Eu fui falar sobre Emily e o envolvimento dela com a família
biológica.
— Só isso?
— Não. Eu fiz um acordo com eles em troca de umas
informações sobre os Mitchell e meu primo, Adam, estará aqui para
me ajudar. Chamei Simon e vou esperar que todos cheguem para
contar o plano.
Owen puxou a cadeira e sentou do outro lado da minha mesa.
— Você tem certeza sobre isso?
— Sim. É perigoso, eu sei. Mas é a minha família.
— Se é o que você quer, não importa o que seja, estou do seu
lado.
— Por que sinto que tem mais a dizer? — Franzi o cenho.
— Nada demais. Lutamos a vida inteira contra o crime, criamos
uma empresa de segurança e no final, a vida mostrou que é mais
que a utopia de proteger. Do lado de fora é isso aqui, uma guerra
fria, poder, dinheiro… status — ele refletiu e soltei a minha caneta.
— Essa é a vida da alta sociedade. Eu não estava me
importando com nada disso, até que se tornou necessário. Eu acho
que seguirei não me importando, contanto que as pessoas que amo
estejam seguras.
— Não há dúvidas quanto a isso. — Owen me deu um aceno.
— Liguei para meu pai e pedi alguns dados financeiros dos Mitchell
no Canadá, ele tem os contatos certos e logo vai me dar um retorno.
— Sei que odeia falar com seu pai, portanto, sou grato.
— De vez em quando o velho tem utilidade, além de me
pressionar por casamento e filhos. — Ele me deu um meio sorriso.
— Em falar nisso, seu filho enfiou um brinquedo no meu olho ontem
a noite. Ensine o moleque a ter modos — me provocou e saiu da
minha sala antes que o acertasse por pegar no pé do meu bebê.
Emily entrou com os braços cheios.
— Tenha dó, mulher.
— Estamos com um problema, não sabemos o dia que
poderemos precisar de uma folga ou passar o dia fora do escritório.
Temos que adiantar o que pudermos, anda, sem preguiça. Posso
colocar minha lista de reprodução de dias felizes para ajudar. — Ela
despejou tudo. — Estão com notas por todo lado.
— Você usou caneta de glitter? Quantos anos tem?
— Sou mãe, quase casada, formada em um monte de coisa e
pago as minhas contas. — Deu a língua e a puxei para meus
braços, ela sentou no meu colo. Pensei que ganharia beijos, mas
ganhei uma explicação muito detalhada do que precisava fazer em
cada arquivo.
Seu telefone tocou e no identificador de mensagens estava
registrado um número local. Emily abriu a mensagem e leu.
— É Cristina, minha irmã biológica. Ela está contando que o
bebê nasceu e enviou uma foto. Fico na dúvida se quer se
aproximar de verdade ou está apenas sendo usada em um jogo
muito maior, que em sua jovem idade, não é capaz de compreender
totalmente.
— Eu não sei das intenções dela, minha única certeza é que
devemos ficar longe.
— Sem sombra de dúvidas. — Ela me deu um beijo. — Vá
trabalhar e se concentre, não quero chegar tarde em casa.
Perdi o memorando quando ela deixou de ser minha assistente
para ser minha chefe. Talvez tenha sido quando começamos a
namorar.
CAPÍTULO VINTE E SETE
Emily
— Mamãe! Mama! — Samuel empurrou o dedo no meu olho.
Liam riu ao meu lado.
— Por que você quer que a mamãe acorde? — Ele tirou
Samuel de cima de mim. — Vamos descer e comer uma banana ou
quer mamadeira?
— Nana, papai — Samuel respondeu de seu jeito fofo e tive
vontade de abrir meus olhos só para mordê-lo, mas se ele me visse
acordada, não me deixaria quieta. Ficou mamando até tarde, cheio
de fogo com Liam na cama, foi dormir no berço por um custo e eu
queria descansar um pouco mais por estar com muita dor de
cabeça.
Normalmente, eu era ativa pelas manhãs, mas o bebê estava
me tornando uma dorminhoca de primeira. Assim que eles saíram,
abracei o travesseiro e voltei a dormir. Era questão de tempo que a
fome me chutasse da cama, esperava que Liam preparasse um
desjejum bem gostoso. Apesar da noite agitada com Samuel e todas
as preocupações que cercavam minha mente por causa dos
Mitchell, consegui dormir e descansar.
Acordei com vontade de ir ao banheiro, fiz xixi e ouvi os latidos
de Lilo no quintal dos fundos. Liam devia estar gastando a energia
dos dois do lado de fora. Lavei minhas mãos e prendi meu cabelo,
como usava um pijama do meu lindo futuro marido, era comportado
e largo para ficar de dia em casa. Owen devia estar na cozinha,
usando o computador. Nunca soltava aquele aparelho.
A campainha tocou quando estava no meio da escada. Espiei
pela janela do alto, era um homem alto, barbudo, usando uma
camisa vermelha com uma mala militar no chão. Não tinha nenhum
carro na frente ou na garagem. Desci rapidamente e digitei o alarme
para desbloquear. Abri a porta e engoli o suspiro. Ele era de arrepiar
de medo e ao mesmo tempo, de assobiar e bater palmas. Uma bela
espécime de macho viril.
Também era familiar.
— Simon?
— Olá, Emily.
— Ei, homem! — Owen surgiu atrás de mim. — Que bom que
chegou!
— Entre, Simon! — Dei espaço, lembrando de ser educada e
uma boa anfitriã. — Fez uma boa viagem? Owen te levará até o
quarto de hóspedes para deixar sua mala e se quiser se refrescar.
— Foi excelente, minha senhora. — Ele pegou sua mala no
chão. O sotaque era tão forte que mal conseguia entender o que ele
estava falando. — Agradeço a sua hospitalidade.
Owen levou nosso convidado para o andar de cima e eu fui
atrás do meu noivo. Liam estava jogado na grama com Samuel em
cima dele, ambos sujos de terra, com Lilo ao lado. Pela maneira que
a língua dela estava pendurada e respirava ofegante, eles brincaram
muito. Como era possível alguém querer destruir aquilo?
Dylan não conhecia os choros de Samuel, suas comidas
favoritas, a posição que gostava de ser ninado e muito menos
abdicou de noites de sono, de namoro, da sua própria comida, em
favor de um menino que era um bebê e precisava de todo amor e
cuidado. Liam fez isso tudo sem pestanejar. Sem que fosse pedido.
Ele era meu 50% em tudo na vida. Um pai que eu não precisava
pedir para me ajudar, que olhasse o nosso filho rapidinho para me
aliviar. Ele simplesmente sempre esteve ao meu lado, assumindo o
que podia, desde o primeiro dia em que colocou os olhos em
Samuel.
Assobiei e Lilo ergueu o rosto, ela latiu e trotou na minha
direção para me dar bom dia. Cocei atrás de suas orelhas, onde
mais gostava, depois ela correu para seu pote de água.
Liam se aproximou com Samuel no colo.
— Simon chegou e está com Owen, é melhor que vocês dois
tomem banho enquanto arrumo a mesa para o nosso hóspede. —
Tirei uma grama de seu cabelo. Fiquei na ponta dos pés. — Se
pudesse, entraria no chuveiro com você. — Beijei seus lábios.
— Hoje é dia do papai, de noite serei seu.
— Combinado.
Owen preparou uma mesa para nosso café que rivalizava com
a de hotel. Ele cozinhava muito bem, suas panquecas eram
deliciosas e no meu prato, um avocado toast de me fazer salivar.
Simon estava sendo galante e educado, nós esperamos Liam
descer com Samuel para começar a comer. Quer dizer, eles
esperaram, eu belisquei um pouco de tudo para acalmar minha
fome.
Os homens fizeram um rápido trabalho recolhendo tudo,
lavando e guardando. Samuel me queria a todo custo. Ele ficou me
chamando, puxando minha blusa e fazendo um beicinho de derreter
meu coração. Prestei atenção na conversa deles, mas Liam só
contaria o plano exato quando Adam chegasse. Eu sabia de tudo,
concordava e lhe dava apoio. Esperava que todos os outros
concordassem também, não iríamos desistir, por mais complicado
que fosse gerenciar as etapas sozinhos, íamos conseguir.
Nunca desistiríamos de lutar pela nossa família.
Samuel ouviu o latido de Lilo e soltou meu peito, sentando
rapidamente e chamando por ela com os dedinhos. Ela parou de
olhar pela janela, ganiu para ele e deitou aos meus pés. Ele voltou a
mamar. Amava incondicionalmente a conexão dos dois. Minha
cadela já sabia que estava grávida, parou de pular em mim e
cheirava minha barriga, dando lambeijos a cada oportunidade que
tinha.
Perto da hora do almoço, saí da preguiça e troquei de roupa.
Samuel estava sujo novamente, não só a fralda, como a blusa. Ele
ficava imundo de rolar no chão do quintal, de comer e por
simplesmente ser uma criança cujo pais não se importavam com um
pouco de anticorpos. Mais uma vez, assim que estava descendo
com ele no colo, a campainha tocou.
Liam apareceu e abriu a porta. Espiei atrás dele um casal. O
homem eu sabia quem era sem nunca ter visto. Eles se pareciam,
mesmo sendo primos de segundo grau e a mulher, conhecia da
televisão. Seu nome era Sienna Miller [16] e ela era poderosa, já
havia trabalhado para o presidente e vários políticos importantes.
Era bizarro pensar que meu tímido noivo, humor de fera, era
relacionado com príncipes e pessoas que a sociedade conhecia e
admirava.
— Olá! Sejam bem-vindos! — Me adiantei alguns passos.
— Oi! Que prazer te conhecer, Emily! — Sienna entrou e
trocamos um rápido abraço. — Vovó Jones sempre fala muito de
você e Samuel para nós.
Eu sabia que Adam ligava de vez em quando para a tia-avó, já
que a avó dele faleceu há alguns anos. Liam era o único que não se
aproximava muito. Frank e Logan eram bons amigos, mesmo há
distância.
— E esse bebê lindo? — Sienna brincou com Samuel, que
simplesmente foi para seu colo. — Ai que delícia!
— Estou pronto para ter mais um sempre que quiser, querida
— Adam falou atrás dela e segurou a mãozinha do meu filho.
— Sai fora. — Sienna bufou.
Eles estavam hospedados em um hotel não muito longe. Adam
era simpático, tão assustador quanto Liam, deveria ser coisa de
família ou dos irlandeses. Não saberia dizer. Ela foi agradável e
simpática, mas na hora certa, mostrou porque era muito bem paga
por seu trabalho. Sienna era pequena, batia no meu ombro,
dominou todos os homens ajustando o plano que Liam e eu
elaboramos. Adam e Owen correram atrás dos contratos.
Simon desceu com Liam para o porão, o que significava que
eles veriam armamentos. Liam tinha porte e licença avançada, ele
consumia produtos dentro da lei e não revendia. Uma de suas
armas ficava no cofre, no quarto, outra na gaveta do lado dele, mas
Samuel não tinha acesso. Não havia nenhuma má intenção da
nossa parte, porém, não podíamos ignorar que nos próximos dias
iríamos provocar pessoas muito poderosas.
— Você está bem? — Sienna sentou ao meu lado depois de
falar ao telefone.
— Sim.
— Parece enjoada. Eu já estive grávida algumas vezes, sei
como é.
— Ninguém sabe ainda.
— Os homens não perceberiam, eles mal conseguem pensar
sobre si mesmos. — Ela revirou os olhos. — Acabei de falar com
minha equipe e eles já estão a postos.
— Sei que pelo seu trabalho, tudo isso é do seu direto
interesse, mas estou grata mesmo assim. Muito obrigada por essa
mobilização.
— Não me agradeça. Não é só pelo meu trabalho, somos uma
família, independentemente das circunstâncias e para o meu
marido, isso é muito importante. Quando ele descobriu sobre Jamie,
estava disposto a engolir o próprio ódio por mim para sermos uma
família pelo nosso filho.
— Foi difícil?
— Foi horrível. — Ela fez uma careta. — Em todo caso, eu
odeio os Mitchell com todas as minhas forças. Faria de graça,
independente do trabalho, e com os pés nas costas.
— Algo pessoal? — Inclinei-me para trás, respirando fundo
para controlar a náusea.
— Estudei com o irmão embuste do seu ex-noivo e tive
vontade de arrancar os olhos dele mais de uma vez durante a
faculdade. O homem me infernizava porque eu era mãe solo. Ele
tentava destruir tudo que fazia. Até que um dia, foi acusado de
estupro por uma das alunas, sei que a família pagou para que ela
retirasse a queixa, ameaçou a família da garota e ele foi embora
para Toronto novamente — ela me contou e eu ouvia Dylan dizer
que o irmão não era tão perfeito quanto o pai deles queria passar.
Talvez fosse por isso e muito mais. Havia tantos podres nas
informações que Liam conseguiu, que eu não tive estômago para ler
tudo.
O sabor amargo de que um dia quase fiz parte daquela família,
me fazia querer vomitar. Todo mundo me perguntava o que fez com
que me apaixonasse por Dylan. Nos primeiros meses, ele era um
príncipe, encontros maravilhosos, acabei agindo de forma maternal
com seus problemas e acreditava que poderia ser a sua salvação.
No final do dia, fui surpreendida com uma ligação de um
escritório, alegando representar os Mitchell legalmente e eles
queriam uma reunião, com os detalhes a serem informados
pessoalmente. Juridicamente falando, todo processo que Dylan
alegou que entraria para tirar Samuel de mim, levaria mais do que
alguns dias.
— Eles querem jogar com o emocional, acreditam que Emily
ainda está desamparada, como foi no nascimento do Samuel —
Sienna analisou palavra por palavra. — Estão ouvindo? A mulher
não estava sozinha na sala. Talvez fosse o velho babão. Ele usa
disso, seu nome e poder, para massacrar quem estiver no caminho.
— A quem podemos pedir para começar a vigiá-los agora? —
Adam questionou a si mesmo e trocou um olhar com a esposa. —
Não custa nada tentar.
— Peça você. Eu odeio dever qualquer favor a ela. — Sienna
fez um beicinho.
— Qualquer coisa, jogue na minha conta — Liam brincou.
— Eu jogaria mesmo. — Sienna riu, mas não disse quem era.
Seriam os associados na comunidade francesa do Canadá? Eu
não queria sair fazendo perguntas, porque poderia parecer invasivo.
O trabalho deles era muito delicado e exigia segredos. Eu sabia
guardar, mas ainda não me conheciam para confiar em mim
cegamente.
Adam se afastou para fazer uma ligação e ficou do lado de fora
com Liam por um longo tempo. Sienna me orientou a ligar de volta
para a advogada intimidadora e escreveu o que eu tinha que dizer,
manter um tom de voz choroso e deixar com que pensassem que eu
estava sozinha e fragilizada. Não foi difícil. Eu estava fragilizada,
mas não sozinha.
Nunca estaria.
Uma reunião foi agendada para falar sobre Samuel e eu fingi
que concordaria com os termos, bancando a mãe desesperada
disposta a fazer qualquer coisa pela felicidade do filho. Eu jamais
permitiria qualquer convivência. Eles não queriam meu bebê por
amor. Era vingança.
— Teremos que adiantar a fase um por algumas boas horas,
mas vai ser o suficiente. Chegaremos no Canadá no meio do
primeiro caos em que arrastaremos a família. Será complicado, mas
vai valer a pena. — Liam apertou meus ombros. — Podemos deixálo com seus pais?
— Sim, é claro. Eu não contei a eles, precisarei dar uma versão
editada.
— James e mais dois dos melhores da minha equipe ficarão na
vizinhança dos seus pais. Samuel ficará seguro.
Apertei sua mão em concordância. Era questão de dias para
me livrar de uma vez por todas da história dos Mitchell em minha
vida.
— Ei, vocês — Owen chamou da sala. — Sua família biológica
acaba de receber uma visita dos italianos. Acho que eles
aproveitaram que a mãe está no hospital com o recém-nascido e as
filhas. O pai estava sozinho em casa.
Meu coração acelerou.
— Como você sabe, Owen? — questionei, com o estômago
revirado.
— Eu coloquei uma câmera na casa da frente à deles. Não
durmo no meu trabalho. — Ele piscou. — A senhorinha só precisava
de um pouco de conversa, alguém que molhasse suas plantas e
comesse seus biscoitos.
— Ele está bem?
Owen encolheu os ombros.
— Ninguém saiu carregando um corpo, mas Enrico Di Fabrizzi
foi pessoalmente dar o recado. Se seu pai permanecer na cidade, é
porque realmente nunca fez nada, agora, se ele sair correndo o
mais rápido possível… significa que tudo aquilo era só uma fachada.
Ele estava tentando fazer com que os russos entrassem na cidade
novamente e terminar os negócios, parte de um plano maior.
Troquei um olhar com Liam. Eu sentia pena pelas meninas,
elas eram apenas garotas que acreditavam no pai cegamente e a
esposa, com um bebê nos braços. Quando concordei que Liam
procurasse os italianos, eu sabia que eles não ficariam quietos,
principalmente por confirmarem que não eram os únicos me
observando.
Se ele fosse inocente, ficaria bem. Caso contrário… estava em
maus lençóis.
CAPÍTULO VINTE E OITO
Emily
Quando saí de Toronto com Samuel, disse para mim mesma
que se não fosse para visitar Olívia e Justin, eu não voltaria ali para
nada. Quando chegamos no hotel, tive uma enorme crise de
ansiedade e passei a noite toda acordada. Era a primeira vez que
viajava sem Samuel e isso me fazia sentir rasgada no meio,
somando todas as preocupações.
Liguei para minha mãe, só para que me mostrasse ele
dormindo com meu pai. O rosto sereno, tranquilo e amoroso do meu
filho dormindo encheu meu coração de paz. Fiquei um bom tempo
nos braços de Liam e nós vimos todas as fotos de Samuel, desde o
nascimento, passando por quando Liam e eu começamos a
namorar. Eles tinham muitos momentos juntos, todos lindos, meu
filho só exibia sorrisos.
— Acho que não existe bebê mais sorridente.
— Fazemos um bom trabalho criando-o. — Liam beijou meus
ombros. — Durma um pouco. Teremos um dia cheio e precisa estar
descansada.
— Vou tentar. — Fechei meus olhos, cochilei várias vezes e
não peguei no sono necessário para me sentir bem.
Acordei nauseada e com dor de cabeça. Liam pediu um café
simples para não piorar minha condição e me arrumei com o
conjunto social branco conforme a orientação da equipe de Sienna.
Seriam expostas as mensagens que Dylan me mandou na caixa
postal, assim como o convite da reunião formal. Eu abri para o
mundo que Samuel era filho biológico dele e apenas isso. O
primeiro escândalo que abateria as pernas da família seria um
viciado, alegando estar alto, no dia que abriu mão da paternidade do
filho.
Em seguida, viria os vídeos dele consumindo drogas e
participando de orgias quando ainda era comprometido comigo e
depois, já casado com Adelle.
Sienna a procurou e ela concordou em dar uma entrevista para
um canal de fofocas no Youtube, contando tudo que sofreu na mão
de Dylan. Eu não era a única com sangue nos olhos. Não estava me
importando se era certo ou errado, moralmente falando, parecia
muito dúbio me igualar no jogo sujo, mas eu era mãe acima de tudo.
Quaisquer julgamentos sobre meus atos ficariam subjugados pela
minha necessidade de proteger meu filho de ser uma peça de um
jogo de vingança.
Prendi meu cabelo e usei pouca maquiagem, meus olhos
estavam inchados, exatamente a mensagem que desejávamos
passar para a mídia, que estaria acampada na porta do prédio
comercial onde estávamos sendo aguardados. Liam usou preto, a
imagem de homem rude e protetor. Era o que ele representava
diariamente, Sienna só quis reforçar com o corte de cabelo e a
barba feita.
— Tudo indo bem? — Liam ligou para Simon.
— Já estou em posição e observando. Eles já chegaram e
parecem discutir com a equipe de advogados — Simon respondeu.
Ele estava no telhado de um prédio próximo, verificando tudo do
alto. — Acho que o circo vai pegar fogo.
— Ótimo. Não quero que eles tenham oportunidade para correr
e muito menos que tenham brecha para continuar nos perseguindo
— Liam respondeu.
— Sienna já buscou o advogado que irá representar Emily aqui
e Adam está nos fundos dos prédios, fazendo uma varredura a pé.
Justin chega em dez minutos. Ligo daqui a pouco. — Simon
encerrou.
— Eu preciso de tradutor com o sotaque carregado desse
homem. Que língua ele fala o tempo todo?
— Gaélico escocês, a comunidade que ele vive fala em inglês
também, mas a família é muito tradicional — Liam me explicou e
assenti. — Um dia, irei te levar lá. É um lugar pequeno, com muito
verde, rochas, lagos gelados e animais selvagens.
— Estava animada até a parte dos animais. — Franzi o nariz.
Liam terminou de se arrumar.
— Está pronto para isso? Eu sinto muito que a sua vida
extremamente discreta esteja tão exposta agora.
— Isso vai passar, em pouco tempo vão nos esquecer e
seguiremos criando nossos filhos no lar harmonioso que sonhamos.
A ideia foi minha, não me arrependo. — Ele segurou meus ombros e
desceu as mãos pelos meus braços até segurar minhas mãos. —
Sempre juntos.
— Sempre e para sempre. — Beijei seu queixo.
Liam abaixou o rosto e beijou minha boca carinhosamente. Me
derreti contra ele, me sentindo amada e segura. Saímos no horário
combinado. Justin iria nos conduzir. Ele deu um sorriso e uma
piscadinha do volante, usando um uniforme de motorista particular
que parecia quase irreconhecível. Tudo para fazer a nossa
segurança, porque parecia incerto o ataque que poderíamos sofrer
em retaliação. Seria estupidez confiar.
Por todo o trajeto, não soltei a mão de Liam. Estava nervosa
sobre reencontrar Dylan. Ele me assustava um pouco, mas havia
uma raiva borbulhando dentro de mim, que não tinha certeza qual
seria a minha reação ao vê-lo pessoalmente de novo.
Nós chegamos quinze minutos depois e a imprensa avançou
no carro. Minha expressão de susto foi real. Eles estavam
pipocando porque ao mesmo tempo em que chegava, Adelle fazia
uma live com um famosíssimo canal de fofoca local. Eu podia ver
alguns telefones assistindo à transmissão. Enquanto isso, Owen
aproveitava a cortina de fumaça para invadir o sistema de imagens
do prédio e nos vigiar de perto.
Foi difícil entrar com o empurra de todos os lados. Nós
conseguimos passar pela barreira e rapidamente fomos
encaminhados para o elevador. Liam e eu ficamos em silêncio
conforme subíamos com um dos funcionários. Logo que as portas
se abriram, vimos Sienna e o nosso advogado, Lauro O’Brien. Ao
fundo, havia uma gritaria.
— Faça essa vadia calar a boca! — Dylan gritou e arremessou
uma cadeira contra a parede. — Eu te disse, papai! Nunca foi uma
boa ideia casar com ela!
— Acalme-se, Dylan. O que queria que fizesse?
— Eu te pedi para casar com Emily e você não deixou! Colocou
aquele monte de regras estúpidas e ela foi embora!
Eu fui embora porque ele havia me agredido e pediu para
abortar o bebê. Tão estúpida quanto era, capaz de ter casado,
mesmo com as regras para fazer parte da família Mitchell.
Uma funcionária entrou na sala nervosa e avisou que
estávamos aguardando. Podíamos ouvir a equipe tentando acalmar
Dylan e sem sucesso, ele foi levado para outra sala. Senti seu olhar
de ódio na minha espinha e apertei um pouco mais os dedos de
Liam. Mantive minha cabeça erguida, com o queixo empinado. Dez
minutos depois, fomos levados a uma sala de reuniões e
esperamos.
Sienna ficou quieta, deixando que Lauro agisse como o
advogado principal. Eles deixaram que os advogados falassem
primeiro, apresentando a queixa de Dylan, que acusava a mãe de
ter oferecido remédios para que ele ficasse calmo e fizesse o que
ela queria. Senti enjoo quando Dylan e seu pai entraram na sala.
Liam manteve a expressão neutra conforme foi combinado.
— O que? Que porra é essa? — Dylan explodiu ao olhar algo
em seu telefone.
— Dylan! — Seu pai sibilou. — Tudo que eu quero é que o
tempo que me foi tirado com meu neto seja reparado. Não me
interesso com quem a srta. Williams está se relacionando, mas ele
não pode ser pai do meu neto. Dylan é o pai. Eu sou o avô e quero
que Samuel passe o ano aqui em Toronto, como todos os Mitchell
foram criados. Ele deverá ter o nosso sobrenome.
Nem fodendo.
— Quero que conste que Emily me deixou e não me deu tempo
para ser pai. — Dylan me encarou com um sorrisinho, mas sua
expressão ficou furiosa novamente ao receber outra mensagem. Ele
entregou o telefone para uma das advogadas, ela franziu o cenho e
saiu da sala sem falar nada.
Mantive meu olhar treinado. Sienna foi enfática sobre troca de
olhares ou apertar a mão de Liam se ficasse nervosa. Qualquer
movimento impensado poderia denunciar nossas ações. Por mais
que eles soubessem que nós estávamos por trás dos ataques,
teriam dificuldade de provar. Não poderiam usar o vídeo como
análise comportamental.
Os únicos descontrolados eram eles.
— Nós rejeitamos a ação e levaremos o caso para o juizado.
Minha cliente não está disposta a dividir a guarda do menor e nós
apresentaremos nossos fatos diante do conselho de juízes. — Lauro
reuniu suas coisas. — Sem mais nada a dizer.
— Tem certeza que quer sair dessa sala sem um acordo,
Emily? — François me encarou diretamente. — Essa é a sua única
chance de termos paz, mesmo com todo esse circo. A presença
dessa mulher não me intimida em nada. Irei com tudo que tenho
para cima de você.
— Muita certeza.
— Emily… sempre querendo bancar a corajosa. — Dylan
estalou a língua.
Percebi que Liam flexionou os punhos.
Pela minha visão periférica, vi um grupo de policiais saindo do
elevador.
— Vocês não vão conseguir nos derrubar — Dylan prometeu
entredentes.
— Reunião encerrada. — A advogada deles pulou antes que
seus clientes se comprometessem ainda mais com as ameaças.
Liam ficou de pé e me ajudou a levantar. Sienna e Lauro foram
por um lado.
— Sua vadia miserável, eu vou acabar com a sua vida — Dylan
murmurou conforme passei. Sienna segurou meu braço, me levando
para fora. Eu olhei para Liam, ele sorriu e simplesmente virou,
dando um murro em Dylan, que caiu entre as cadeiras, debaixo da
mesa.
— Agora nós podemos ir embora. — Ele estalou o pescoço e
me seguiu para fora.
O lobby estava uma confusão por causa da polícia. Adam nos
informou que havia uma movimentação estranha por parte dos
seguranças (que estavam mais mercenários) em nossa direção.
Devido ao caos, Justin levou o carro para a lateral, passou por umas
salas onde todos nos olharam confusos e saímos por um banco,
entrando no carro e saindo rapidamente.
Um dos principais pontos do nosso plano era entrar e sair do
Canadá em segurança. Meu advogado entraria com uma ação e
seria necessário esperar os próximos passos. Com a família sendo
queimada pela mídia e alvo de uma investigação importante para a
polícia, eu tinha tudo a meu favor para seguir tendo a guarda total
de Samuel. Assim que tudo isso passasse, Liam teria seu nome na
certidão do nosso filho, porque era assim que tinha que ser.
Retornamos para Chicago em segurança. Liam precisou se
reunir com várias pessoas por toda semana, acalmando alguns
clientes que pareciam assustados com a prisão repentina do
Governador e para quem tinha o rabo preso, com medo que os
italianos continuassem fazendo a limpa, mostrando que eles
dominavam Chicago e outros territórios.
Nossos clientes não sabiam do envolvimento de Liam com as
notícias vazadas do governador, mas estavam preocupados que
suas transações financeiras fossem reveladas ao público.
Foi muito estressante aguentar a mídia. Aguentei porque fomos
nós que provocamos. François foi preso com acusações de fraude,
lavagem de dinheiro, envolvimento com crime organizado e seu filho
mais velho também. Dylan ainda estava sendo investigado.
Não recebemos nenhum retorno por parte dos advogados e eu
estava com fé de que não entrariam com a solicitação da guarda e
não jogariam de maneira suja como pretendiam, porque nós
levamos o fogo diretamente para eles.
Dylan parecia estar cooperando com a polícia, até que
conseguiu sair do país. Eu não sabia onde estava e os contatos de
Liam disseram que não havia imagem dele entrando nos Estados
Unidos. Sienna e Adam seguiram com parte do plano, que
interessava unicamente a seus associados e clientes, com isso, o
circo continuaria por mais algumas semanas.
Aprendi a respeitar meu limite e fiquei em casa, de folga, com
minha mãe me mimando, meu pai fazendo comida e aproveitando
cada segundinho com Samuel e Lilo. Logo que me recuperasse da
maratona que foi arquitetar e executar todo plano, voltaria ao
trabalho. Precisava de uns dias para colocar minha mente no lugar e
voltar a ser eu mesma.
Voltei a me sentir feliz quando fizemos um exame e pudemos
ouvir o coração do nosso bebê. Eu chorei, Samuel não entendeu
nada e Liam ficou rindo feito um bobo. Não decidimos se queríamos
saber o sexo, era cedo para descobrir por imagem, mas podíamos
fazer a sexagem fetal. Liam queria surpresa. Eu estava ansiosa
demais para decidir se aguentaria esperar o parto.
De tarde, Liam chegou em casa com seus amigos e com a
expressão séria, mais do que o usual. Simon ficou mais uns dias
para trabalhar em um novo módulo de segurança. Justin passou
dois dias, também criando com eles, mas precisou ir embora porque
Tristan teve uma crise. Era a noite que contaríamos para nossa
família e amigos sobre o bebê.
Eu decorei a casa com balões, coloquei mais cadeiras na
nossa mesa de jantar e fiz aquela organização de mesa posta digna
de um Pinterest. Minha mãe estava me ajudando na cozinha e meu
pai, olhando Samuel, que parecia ter engolido uma bateria de
caminhão.
Owen sinalizou para Simon segui-lo até a cozinha.
— Aconteceu alguma coisa? — questionei a Liam, soltando os
guardanapos de linha extra que iria dobrar e deixar na gaveta caso
alguém precisasse de reposição.
— Dylan foi declarado como fugitivo e está na lista da
INTERPOL. Ele tem muito a dizer e desapareceu. Nossa casa terá
segurança vinte e quatro horas, agora. James vai usar o quarto dos
fundos com os rapazes até que tudo se resolva.
Recebi a notícia com muita preocupação. Dylan era instável e
tinha dinheiro, amigos com dinheiro. Era para ter sido preso junto
com o pai e o irmão.
— Vamos ficar bem — falei, por fim, me segurando a um fio de
esperança.
— Claro que iremos. — Ele me abraçou.
— Algo mais?
— Um dos italianos me ligou. Não sei quem, não se identificou,
mas… ele disse que seu pai saiu da cidade no meio da noite com a
esposa e o bebê recém-nascido. As outras filhas, cada uma foi
levada por um carro preto, seguindo em direções diferentes. — Liam
beijou minha testa enquanto tudo que sentia era decepção. Foi
inevitável não sentir. — Na mesma noite, houve ataques
organizados em pontos conhecidos da cidade, que pertencem aos
italianos. Ele achou melhor me avisar, por me dever um favor por
toda a coisa com os Mitchell e a entrada deles em Toronto.
— Estou chateada. Por um segundo, acreditei neles. Será que
até Cristina sabia sobre?
— Existe a possibilidade que sim e, a possibilidade de ele ter
se assustado e saído daqui para proteger a família.
— Coincidências não existem — concluí, sentindo que eles até
poderiam querer me contar a verdade, mas não significava que a
família havia desistido dos negócios.
Tomei a decisão certa em não me envolver.
CAPÍTULO VINTE E NOVE
Liam.
A barulheira da minha casa era de fazer qualquer um correr.
Antigamente, ter tantas pessoas na minha sala me faria surtar.
Simon estava quase pulando a janela. Aquela noite era muito
especial porque iríamos contar para todas aquelas pessoas que nos
amavam, que a nossa família iria aumentar. Samuel estava
brincando no chão com os primos sob o olhar atento de Tullia.
Minha avó divertia meus sogros com alguma história bizarra da
minha infância.
Olhei para a escada e fiquei de pé, deixando Cole falando
sozinha, porque Emily estava linda demais para ficar parado. Segui
até os últimos degraus só para ter o prazer de segurar sua cintura e
dar-lhe um beijo. Todo mundo gritou, batendo palmas e exibi minha
mulher muito linda. Eu amava quando usava amarelo, combinava
com sua alegria esfuziante.
— Vocês dois vão anunciar que sairão de lua de mel? — Cole
brincou.
— Na verdade, não. — Emily sorriu e pegou os envelopes.
Como a maioria atrasou, nós decidimos contar tudo logo para
podermos jantar em clima de comemoração. — Mãe, pai e vovó,
aqui está um pequeno mimo que preparei para vocês. Espero que
gostem.
— Eu quero ganhar presentes! — Joseph resmungou.
— Cale-se, moleque. — Regina deu a língua.
Deve ter sido divertido crescer com muitos irmãos, em um
clima amistoso. Frank e eu sempre fomos bons amigos, mas, nossa
vida foi um pouco mais difícil. Vovó nos salvou e amou
incondicionalmente. Eu devia muito a ela. Com seu jeito louco,
muitos palavrões e excentricidade, nos criou com o melhor que
podia dar.
— O que é, sogra? — Tullia pulou no lugar.
— Estou tentando abrir ainda!
— Ai meu Deus, porra! — vovó gritou. — Frank, me levante
agora mesmo!
Comecei a rir do escândalo dela e meu irmão identificou o que
tinha no cartão, arregalou os olhos e começou a chorar. Owen
explodiu em risadas.
— Liam e eu estamos esperando um bebê! Samuel foi
promovido a irmão mais velho! — Emily gritou para a nossa família.
Todos saltaram de pé, no supetão da notícia, gritando como se
fosse final de um campeonato. As crianças ficaram assustadas.
Samuel chorou e o peguei, para acalmar enquanto recebia infinitos
abraços de felicitações. Emily chorou entre sua melhor amiga e a
irmã. Jenna e Regina eram loucas, mas amavam minha noiva
incondicionalmente.
Foi gostoso sentir o amor de todos. Emily havia me dito que
seria assim, mas era uma sensação nova, até mesmo para ela, já
que a notícia de Samuel foi dada no hospital enquanto ela estava
internada. Nós seguimos com a nossa família para a sala de jantar,
o assunto girou entre o bebê e o planejamento do casamento, que
seria apenas para alguns convidados.
— Estive pensando que deveríamos fazer um jantar da
paternidade — Emily comentou depois que todos foram embora. Ela
ainda comida bolo, com as pernas esticadas na poltrona. — Assim
que os papéis forem assinados e a nova certidão de Samuel chegar,
será importante registrar o momento. Quero que ele veja as fotos e
tenha orgulho.
— Tudo é motivo para festa com você, não é?
— Eu adoro comemorar. Graças a Deus, acima de qualquer
coisa, tenho muitos motivos. — Ela sorriu e me deu um beijo com
gostinho de açúcar.
— Isso parece bom. — Soltei um gemido com sua língua
brincando com a minha.
— Gostinho doce, é? — ela me provocou, deixando o prato de
lado e subiu no meu colo. — Samuel está espalhado bem no meio
da nossa cama, acho que se formos experimentar algo doce será
bem aqui.
— Você quer aqui e agora?
— Quero uma foda gostosa. — Chupou meu lábio inferior.
Agarrei sua bunda, erguendo seu vestido e passei meus dedos
em suas coxas para marcar. Emily tomou minha boca, abrindo meu
cinto e o botão da calça. Ela me fez tirar a blusa, jogando longe e
começamos o tipo de pegação desenfreada, como dois
adolescentes. Chegando sua calcinha para o lado, ela gemeu com o
estímulo dos meus dedos em seu clitóris e me deliciei com a
expressão de puro prazer e safadeza.
Mordi de leve cada seio, chupando os bicos com cuidado. Ela
ainda amamentava, mas não saía tanto leite quanto antes e eu não
estava me importando.
Emily empurrou minha cueca e abaixei a calça até os joelhos.
Ela montou em mim com maestria, rebolando gostoso, descendo
maravilhosamente e me fazendo ver estrelas. Agarrei sua cintura,
apaixonado pelo vai e vem de seus quadris e os seios balançando
bem na direção do meu rosto. Arranhando meus braços, jogou a
cabeça para trás e levou a mão para esfregar seu clitóris.
— Ai que delícia, amor. Continua, baby.
Aquela visão era simplesmente incrível.
Emily me tinha na palma das mãos quando montava em mim.
Nós transamos na sala e subimos como dois adolescentes que
podiam ser pegos pelos pais. Tomamos banho juntos, namorando
no chuveiro em silêncio para não acordar Samuel. Eu o colocaria no
berço somente quando pegasse no sono, enquanto isso, nós nos
divertimos.
Observar minha família dormir era uma das minhas atividades
favoritas. Emily pegou no sono depois da última mamada do nosso
menino. Ela ainda não tinha nenhum sinal físico de uma nova
gravidez. Nada expressivo. Eram mais sintomas do que uma grande
barriga. Peguei no sono após trabalhar um pouco pelo celular.
Pela manhã, com Simon e Owen hospedados conosco, a casa
ficava um pandemônio. Owen reclamava que Samuel era
bagunceiro, mas era ele quem incitava a maior parte das bagunças
do meu filho, que aprendeu que era muito divertido correr pelado.
Ele correu de sua mãe, usando meias, uma toca e o pinto de fora.
— Vá colocar a fralda, Samuel! — ordenei.
— Ei, garoto! Volta aqui! — Emily chamou da sala.
— Pinto livre! Pinto livre! — Owen brincou.
— Depois você diz que Frank e Regina que ensinam besteiras
para o garoto! — reclamei, pegando Samuel e devolvendo-o para
sua mãe.
Emily estava tirando uns dias de folga. Ela trabalhava de casa,
sempre atenta ao sistema, mas ainda não estava disposta a ficar
fora e longe de Samuel. Eu entendia. Sua mãe estava vindo toda
manhã para passar o dia e ajudar nos cuidados do pequeno
furacão.
— Nos vemos na hora do almoço. — Me despedi de Emily na
porta de casa.
— Talvez eu te sequestre e não permita mais que volte ao
trabalho.
— Será que vai conseguir? — brinquei e segurei seu queixo,
beijando seus lábios.
Abri a porta da frente e ela me seguiu. Como sempre,
encostaria na porta e acenaria até que não pudesse mais ver meu
carro.
Ouvi certa agitação na lateral da casa e virei. Ao mesmo
tempo, Emily ofegou e me agarrou. Dylan estava no meio do nosso
gramado da frente, desgrenhado, parecendo muito chapado e
segurando uma pistola. Empurrei Emily para trás de mim a tempo do
impacto. Senti o primeiro, com a dor dilacerante me fazendo apagar
por alguns segundos, mas ainda lúdico o suficiente para ver James
atirar contra Dylan.
— Liam! — Emily gritou, pressionando minha ferida. Não fazia
ideia como fomos parar no chão. — Owen! Me ajuda, tem muito
sangue! — ela gritou.
Aos poucos, fui deixando de ouvi-los, preocupado se ela estava
ferida, mas não tive forças para lutar contra a escuridão que me
puxava cada vez mais para o fundo da minha mente. Sem entender
o tempo, ouvi gritos, sirenes, senti dor ao ser movido, mas eu não
sabia se estava reagindo. O choro da mulher próximo a mim parecia
ser de Emily.
Era confuso. Muita dor. Apaguei por muito tempo, quando voltei
a me sentir consciente, percebia o ambiente ao meu redor como um
zumbido. Ouvia um beep suave, um som de respirador, vozes
baixas e muito frio. A agonia de não conseguir acordar me deixava
nervoso, mas a escuridão me abraçava apertado e não me soltava.
— Sei que está me ouvindo — Emily cochichou no meu ouvido.
— Já tem dias que eu estou sem ouvir sua voz e ver seus lindos
olhos. Isso é o maior castigo. Um tipo de privação que eu não posso
suportar por muito mais tempo, então, seja a fera que eu conheço.
Aquele homem forte como um touro, que nunca desiste e reage.
Ah, minha doce mulher que podia ser brava como uma leoa.
— Eu cresci como uma garotinha, apaixonada pelos contos de
fadas. Quando tudo aconteceu com Dylan, estava certa de que não
seria possível viver um amor como das princesas. Era apenas uma
garota comum, tentando vencer na vida como qualquer outra, não
uma princesa. Depois de me tornar mãe, acreditar em conto se
tornou besteira. — Ela se inclinou e senti o roçar de seus lábios na
minha testa. — Até você chegar. Não é um príncipe de verdade,
mas é um de corpo, alma e coração. É o homem honrado que
segurou minha mão e me deu suporte, que me ensinou que não
havia nada de errado comigo e me ama incondicionalmente, dia e
noite.
Emily segurou minha mão.
— Todos os dias, tenho um pequeno garotinho que pergunta
quando o baba papai vai chegar em casa. Ele aponta para a porta e
te chama. Todos os dias, sinto novos sintomas do nosso outro bebê
crescendo na minha barriga.
Porra! O quanto queria abrir meus olhos e beijá-la.
Anda, Liam! Acorde! Anda!
Sua mulher e filhos precisam de você.
— Sei que deve ter doído. Foi assustador para mim — ela
sussurrou. — Te amo e estou aqui com você todos os dias.
Ela me beijou nos lábios, pressionando a boca na minha. O
calor dos seus lábios substituiu todo frio que sentia. Me encheu de
ânimo e eu usei toda minha força para sair da escuridão que estava
para tentar abraçá-la.
— Você se mexeu? — Emily sussurrou, um pouco chocada.
Movi novamente, ela soltou um gritinho. — Não me faça gritar que o
beijo de amor é algo real. Ai meu Deus! Vou chamar os médicos,
continue por aí!
Tive vontade de rir porque podia imaginar toda sua agitação.
Abri os olhos de repente e me assustei com a claridade e todas
as pessoas ao meu redor. Enfermeiros e médicos. Tentei tirar os fios
do meu rosto, fui segurado por um médico e ele pediu para me
acalmar. Era difícil quando não estava entendendo nada do que
acontecia ao meu redor. Alguém pediu que Emily se aproximasse,
ela chorava e imediatamente, segurou minha mão com um doce
sorriso de alívio e o olhar de amor que me fazia sentir o homem
mais especial do mundo.
Com ela ali, tudo ficou bem.
Mais tarde, ainda lúcido, porém cansado, Emily me explicou o
que havia acontecido.
— Você teve complicações na cirurgia. Tudo parecia muito
promissor quando os médicos não conseguiram controlar sua
hemorragia. — Sentou na pontinha da cama e colocou minha mão
entre as dela. — Levou muito tempo até que eles tivessem alguma
notícia para nos dar e quando saiu da cirurgia, não acordou. Você
teve mais uma complicação, voltou para centro cirúrgico e passou
alguns dias desacordado na UTI.
— Me sinto exausto como se tivesse corrido uma maratona
sem preparo.
— Eu imagino, amor. Agora, está tudo bem. Os médicos estão
muito otimistas com seu tratamento e só de te ver acordado, me
sinto esperançosa. — Ela sorriu. Seu rosto aparentava cansaço, as
roupas amarrotadas e uma palidez que não parecia saudável.
— Você precisa ir para casa descansar. — Ergui minha mão e
acariciei sua bochecha.
— Estou muito bem aqui. Passo as noites em casa com
Samuel e o dia inteiro ao seu lado. Owen, Frank, Simon e Justin
estão revezando as madrugadas. Olívia está lá em casa ajudando.
Ethan e Louis ligam o tempo todo, eles queriam vir, mas seria uma
loucura com a mídia e garanti dar os boletins médicos o tempo
todo.
Eu precisava fazer a pergunta que não queria muito.
— O que aconteceu com Dylan?
Emily fez uma ligeira careta.
— Ele não resistiu. James o desarmou e prestou socorros, ele
passou por uma cirurgia, mas acabou falecendo um dia depois.
— James está sendo assistido juridicamente? — A
preocupação era evidente no meu tom de voz. Ele protegeu minha
família de uma catástrofe. Pela mira de Dylan, ele queria acertar
Emily, a mulher que odiava.
— Seu tio Carise chegou no dia seguinte e resolveu tudo em
um piscar de olhos — ela garantiu. — Não se preocupe com nada.
Somos abençoados com uma rede de apoio e amigos maravilhosos.
Eles estão ajudando em cada mínimo detalhe.
— Não tenho palavras para agradecer.
— Todos querem a mesma coisa que eu: que fique bem. O
pesadelo acabou.
Puxei-a para um abraço e ela deitou contra mim.
— O que acontece agora se fosse uma das suas histórias
favoritas?
— Acontece o felizes para sempre e não se engane, a nossa
vida, é o meu conto de fadas favorito. — Ela beijou meu braço e
sorriu, os olhos brilhando com a alegria que me apaixonei
perdidamente desde a primeira vez em que a vi.
Nossa história, definitivamente, era melhor que muitos contos
de fadas. Emily era a minha princesa predileta.

CAPÍTULO TRINTA
Liam
Alguns meses depois.
Emily apareceu na sala com um bico enorme. Sua barriga,
esticada na frente, fez uma ondulação com nosso bebê se
movendo. Ela estava exausta por não conseguir dormir na reta final
da gravidez. Samuel jogou a bola, com sua firmeza de quase dois
anos de idade. Ele estava falante e andando por todo lado, era um
pimentinha de primeira e o amor das nossas vidas.
Eu estava sem camisa, jogado no sofá, bebendo uma cerveja
com prazer. Tudo tinha um sabor diferente depois que saí do
hospital. As duas marcas na minha barriga se uniram às outras,
contando parte da minha história. Nada no meu corpo doía mais e
me recuperei completamente depois de vários dias internados.
Fiz fisioterapia, ganhei peso e voltei a viver como antes. Tirei
algum tempo para cuidar de mim mesmo e da minha família, nós
viajamos enquanto Emily ainda podia andar de avião e tivemos uma
experiência maravilhosa com Samuel na praia. Ao retornar, voltei
para o trabalho com Emily ficando cada vez maior e tendo
oscilações de humor assustadoras.
O acontecido fez com que nós adiássemos a nossa festa de
casamento para depois do nascimento do bebê. Casamos no civil
logo que recebemos a feliz notícia que a família de Dylan havia
desistido completamente de brigar por ele. Com o pai e o irmão
preso e Dylan morto, a ex-sogra de Emily nos informou que
desejava que Samuel crescesse em um lar amoroso, com pais que
podiam dar a ele a melhor vida.
Samuel passou a ser um Logan Jones como eu, tendo meu
segundo nome e sobrenome. Emily ficou meio sentida, queria
manter o Williams, mas para enlouquecer a todos, decidiu que
ficaria apenas com o meu depois de muito pentelhar. Se não
houvesse adrenalina, não seria Emily. Ela transformava tudo em
uma gigante aventura.
Ser o marido dela era uma delícia.
— Louis está de namoro com essa Cat? Ela é linda. Me conta a
fofoca, vai! — Sentou-se ao meu lado e ri. Como se eu soubesse…
eu não fazia a mínima ideia. Talvez Ethan abrisse o bico. — Você
podia ser um amigo curioso, ia facilitar muito a minha vida.
— O amigo curioso é o Louis. — Dei de ombros.
— Um saco. Será que Simon sabe?
Gargalhei. Simon seria o último interessado em quem Louis
estaria namorando.
— Caramba! Eu vou ligar e me apresentar a Charlotte, direi
que sou sua esposa e quero saber se o pentelho do Louis
finalmente foi flechado. — Acariciou a barriga. — Poxa, neném.
Mamãe está exausta…
— Quer dormir um pouco?
— Eu quero, mas Samuel…
— Vamos todos dormir.
Com ela e a barriga tão grande, fiz da sala de televisão um
quarto de descanso. Havia uma cama ali, cheia de travesseiros,
para Emily descansar durante o dia e ficar confortável. O médico
proibiu que ela subisse as escadas o tempo todo, quando ficava
muito cansada à noite, fazíamos acampamento para que não
dormisse sozinha.
Eu já tinha muitos truques para derrubar Samuel. Lilo foi a
primeira a começar a roncar, Emily em seguida e depois ele, que
ainda ficou me dando sorrisinhos charmosos para me convencer a
brincar um pouco mais. Eu o amava tanto que não cabia em mim.
Beijei sua testa, mantendo-o em meus braços, pensando no dia em
que ele não caberia mais no meu colo.
Esperava ter muito tempo com ele bem assim, pequeno e
maroto, inteligente, nos chamando para tudo e descobrindo o
mundo com a alegria que puxou da mãe.
Peguei no sono assistindo a um filme e acordei com Emily
gemendo. Senti algo quente molhar minha perna e sentei,
percebendo a mesma coisa que ela.
Sua bolsa havia rompido.
Nós treinamos aquele momento umas mil vezes com as aulas
de parto. Levei-a para o banheiro, ajudei a lavar suas pernas e
enrolei uma toalha para aplacar o líquido que ainda escorria. Mandei
mensagens no grupo da família. Cole ficaria com Samuel para que
minha sogra nos acompanhasse no hospital.
Em menos de trinta minutos, meus cunhados estavam na
minha casa e eu com Emily vestida para sairmos. Ela estava tendo
contrações espaçadas, devido ao plano de parto, fomos
encaminhados para o quarto que reservamos e assim passamos
toda tarde e noite com a equipe monitorando-a. Eu estava calmo,
porque confiava nos médicos, nela e acima de tudo, na força do
nosso bebê.
Foram horas que ela cantou, chorou, dançou, chupou gelo,
tomou banho, sentou na bolsa e xingou mais que um caminhoneiro
quando o tempo entre as contrações ficou ainda menor. Quando
chegou o momento de empurrar, ela estava suada e gritando com
qualquer um, menos comigo.
— Essa criança precisa nascer logo! — Emily gritou.
— Vamos lá, mamãe! Você consegue!
A equipe médica que nos acompanhou durante a gravidez foi
muito bem pensada e pesquisada. Eu fui muito enfático com cada
um deles depois que li sobre violência obstétrica. Nós tivemos
meses de trabalho em conjunto para chegarmos ali, onde o parto
que trouxe meu bebê ao mundo aconteceu da maneira natural,
como Emily queria e em paz, como eu desejava.
— Parabéns, papais! É uma menina!
Emily me olhou com os olhos arregalados e sorriu,
emocionada. Fui levado para cortar o cordão e em meus braços,
havia a maior preciosidade do mundo. Entreguei-a para minha
esposa ansiosa e quando nossa garotinha chorona foi colocada em
seu peito, Emily desabou com lágrimas de amor.
Uma menina.
Minha pequena Bela.
— Olhe só para nossa princesa, baby. — Emily soou ofegante.
— Ela é perfeita como você. — Beijei sua testa suada. — Estou
tão feliz, tão feliz.
— Oi, Bela! Mamãe ama tanto você, minha pequena.
— Oi, amor do papai. Seja bem-vinda à nossa família. —
Acariciei a cabecinha careca. Havia uma rala penugem escura ali.
Bela era linda e encantou nossa família e amigos. Eu podia
passar horas com ela nos meus braços, admirando seu rostinho
perfeito e todos os seus movimentos. Samuel sabia que seria um
irmão mais velho, embora não entendesse completamente o quadro
geral do que o status implicava, ficou bem comportado quando a
colocamos em seus braços para apresentá-la.
— Olha só a sua irmãzinha, meu amor. — Emily apresentou.
— Bebezinha. — Ele sorriu, passando a mãozinha na
cabecinha da irmã com muito cuidado.
— Ela é uma bebezinha. — Eu ri e o beijei.
Emily me deu um olhar emocionado, deitou a cabeça no meu
peito e observamos nossos filhos juntos. Era a maior benção da
minha vida.
Ter minha família me fez um homem completo. Meus negócios
iam bem e nada do que fiz para proteger Samuel me trouxe
arrependimentos, não porque não houve nenhuma reação a longo
prazo além do ataque de Dylan. Os Mitchell foram derrubados com
um processo que eu comecei e outros terminaram. Não fui um herói
para o mundo daquela vez. Ajudei o que sempre lutei contra, mas
pela minha família, eu estava disposto a fazer qualquer coisa.
Para ter Emily, Samuel e Bela compartilhando sorrisos e
momentos únicos de amor, tudo valeu a pena.
Nós levamos nossa menina para casa dois dias depois que
nasceu. As primeiras noites foram um completo pesadelo. Samuel
ficava agitado cada vez que a irmã chorava e a menina tinha uma
potência nos pulmões que deixaria um cantor de ópera com
vergonha.
— Ela vai arrancar os meus mamilos fora. — Emily cantarolou,
amamentando. — Doce, isso é doce, como um amor doce.
— Quer que eu dê a mamadeira? — ofereci, colocando Samuel
adormecido na cama.
— Não. Vai passar. É assim no começo, depois nós duas
vamos nos entender e tudo dará certo. Estamos nos ajustando. —
Ela acariciou o pezinho da nossa filha. — Imaginou que ela seria tão
perfeita?
— Eu nunca imaginei que seria possível. — Beijei o bracinho
da minha filha.
— Assim que essa barriga de pós-parto ir embora, estou pronta
para vestir branco, caminhar no altar e passar pelo rito completo.
— Eu sei. Estou mais que pronto, também. — Segurei sua mão
e entrelaçamos nossos dedos. — Ser seu marido é muito bom.
— Todo mundo tem direito a um romance de tirar o fôlego,
inclusive um CEO taciturno cheio de manias como você.
— Ah, Emily… — Suspirei, fingindo estar bravo por tirar sarro
de mim. — Tem sorte que te amo incondicionalmente mais a cada
minuto.
— Tem razão. A sorte é toda minha. — Ela me deu um beijo.
A sorte de verdade, era ter o amor na mulher que também era
minha melhor amiga e mãe dos meus filhos.
EPÍLOGO
Emily
Um ano depois.
Bela engatinhou pela casa, fugindo de Samuel e eles riam na
brincadeira boba de pega-pega. Liam estava na cozinha,
preparando o jantar e eu quebrando minha cabeça para instalar na
televisão o aplicativo que havia comprado mais cedo. A pessoa
muito boa com tecnologias continuava sendo Liam e Owen. Eu era
do tipo que precisava de um tutorial para absolutamente tudo.
Apanhando do controle, ri dos meus dois filhos se pendurando em
mim.
— Seus pestinhas, cuidado com a Lilo! — chamei atenção dos
dois.
— Já conseguiu, amor? — Liam questionou da cozinha. Ele iria
rir se dissesse que não.
— Quase! Está carregando! — menti. Eu mal havia conseguido
terminar de digitar a senha. — Está com disposição para perder
hoje?
— Da última vez que competimos, você ficou furiosa!
— Prometo que não irá dormir no sofá, porque sei que serei a
grande campeã dessa noite!
Liam apenas bufou.
Depois que passamos pela recuperação dele, minha gravidez,
parto, pós-parto e os primeiros meses de um bebê, nós
conseguimos voltar a sair juntos como casal. Minha mãe ficava com
as crianças ou uma babá que, com muito custo, consegui convencer
meu marido a deixar nossos filhos. Quando viajamos de lua de mel,
levamos os pequenos, mas eu comecei a sentir a necessidade de
fazer coisas só com ele e foi uma das decisões mais acertadas da
nossa vida em casal.
Nem sempre era um encontro romântico, às vezes era só
conversa e vinho na cozinha ou saída com nossos amigos. Jenna e
Zayn eram animados e inimigos do fim. Frank e Regina, com todo
vai e vem, seguiam juntos aproveitando cada minuto como jovens
despreocupados. Owen estava namorando uma mulher muito legal,
que completava o nosso grupo.
Uma vez ao ano, Olívia e Justin nos visitavam. Liam foi até
Londres ajudar Louis e depois, nós nos encontramos em um grande
grupo. Foi uma das viagens mais divertidas da minha vida e
conhecer todos eles foi ainda mais doce para a história desses
amigos que eram marcados, cada um à sua maneira, pela tragédia
que sobreviveram.
Sem querer, apertei o botão de voltar para o canal de
noticiários e bufei.
A reportagem me chamou atenção.
JOVEM É PRESA EM UNIVERSIDADE POR ENVOLVIMENTO
COM CRIME ORGANIZADO.
Por um segundo, o rosto na tela me chamou atenção, meu
coração chegou a falhar uma batida, mas ao ler o nome identificado
ali, não tinha nada a ver com minha irmã. Eu tinha vontade de
procurar Cristina, algo no nosso encontro me marcou para sempre,
mas desde que eles saíram da cidade, eu soube que foram viver em
Atlanta e nunca mais tive notícias. Sabia que a região era populosa,
com facilidade de saída para vários lugares do país, mas podia ser
apenas neurose da minha cabeça e muita desconfiança sobre as
atitudes do meu pai biológico.
Não pensava nele, apenas nas minhas irmãs. Ele era
indiferente, depois de muito pensar. Eu fui agraciada com um pai
amoroso, que era um avô maluquinho que inventava os melhores
brinquedos para os netos e largava tudo para me ajudar sempre que
precisava. Seu colo continuava sendo o mais gostoso desde o dia
que cheguei na nossa casa e me tornei sua filha.
Um dia, quem sabe, poderia encontrar com as meninas e sanar
o desejo do meu coração de saber mais delas.
— Sério mesmo que não precisa de ajuda? — Liam apareceu e
pegou o controle. Com rápidos toques, configurou o aplicativo. —
Quer escolher a primeira música?
— Claro! — Agarrei o microfone e pedi para colocar Britney
Spears. — Vamos começar antes do jantar?
A primeira vez que obriguei Liam a cantar, eu ainda estava
grávida da nossa princesa Bela. Ele disse que não tinha jeito, que
não gostava muito, mas foi vencido pela minha clássica insistência.
Ganhei um adversário de primeira. Nós aprendemos a nos divertir a
dois. Nossa vida não era feita de problemas, descobrimos como
driblar as adversidades e dar valor aos nossos momentos em
família.
Competir se tornou uma paixão.
Ficávamos um contra o outro nos jogos, nas barracas dos
parques e existia até uma disputa boba, sobre quem as crianças
gostavam mais de ficar. Juntos, éramos completamente inabaláveis.
Liam me fez transbordar como mulher. Sem a coroa de príncipe,
com um ar de fera e um coração grandioso, ele era o homem que
parecia um sonho para muitos e a minha completa e feliz realidade.

FIM

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