// LIVRO

Confissoes a Sombra da Mafia.361Z

Confissões à Sombra da Máfia +18

Luana Masseria, psicóloga respeitada e filha do chefe de segurança da Família Genovese, se vê solitária após perder seus pais e enfrentar a tristeza de uma vida sem relacionamentos. Ela é a psicóloga de Daniele Corleone, filha do Capo. Yuri Saito, um psicopata de 32 anos, entediado com sua vida de luxo, encontra uma nova obsessão: se infiltrar na rotina de Luana, vigiá-la sem que ela perceba. O jogo entre eles se torna uma caça psicológica, onde ela é a presa, mas Yuri não é o único predador. Um thriller psicológico com máfia, mistério e um relacionamento explosivo, abordando temas polêmicos e intensos. Aviso: Obra de ficção +18, com conteúdo sensível.

CAPÍTULO 1

A sensação de que alguém está me vigiando é desconcertante,
esta é a primeira vez que sinto isso, o frio na espinha que me faz
suar mesmo no inverno, meu coração acelera, meus pelos se
arrepiam e minhas mãos tremem enquanto olho em volta.
Através das lágrimas não consigo ver ninguém me observando,
todos encaram o chão enquanto o padre faz uma prece, mas a
sensação continua.
— Deus Todo Poderoso, acolha nosso irmão Miguel em seus
braços, receba-o no reino dos céus… — o padre volta a falar, as
pessoas levantam o olhar e a missa prossegue.
Passo novamente os olhos pela sala, muitas pessoas me
encaram agora, com dor ou pena estampados nos rostos tristes
molhados pelo choro. Minhas próprias lágrimas não param de cair.
Hoje é o dia em que me despeço do meu pai, o homem mais forte
e batalhador que já conheci. Meu protetor, amigo e até confidente,
aquele que sempre tinha uma palavra de consolo ou um abraço
aconchegante.
Miguel Matielo deu a vida para proteger o Capo da Família
Genovese, meu pai trabalhou e serviu à máfia até seu último
suspiro.
Sinto orgulho demais por ser sua filha, ele foi o melhor pai do
mundo, além disso, a quantidade de pessoas presentes em sua
despedida demonstra quanto foi amado e respeitado por todos que
conviveram com ele. Seus colegas de trabalho e amigos vieram
fazer uma última homenagem, reconheço cada um dos rostos aqui.
Finalmente o padre termina a missa, o corpo será levado ao
cemitério agora, minha mãe insistiu nesta parte. Seu apego a Deus
é o que a mantém de pé ao meu lado.
Desde o momento em que Alphonse Corleone, o Capo da Família
Genovese, apareceu em nossa casa junto com sua mulher, Amélia
Corleone, sua filha Daniele e o Consigliere, Lucas Costello, tudo
mudou.
Uma visita do chefe da máfia significa más notícias.
Alphonse é um bom homem, cresci com a família Corleone, já
que meus pais eram constantemente convidados para jantares e
reuniões na mansão. Eu tinha treze anos quando fui apresentada a
eles, foi em uma festa de aniversário surpresa, que mamãe
organizou para mim.
— Querida, precisamos ir ao cemitério agora — minha mãe
chama, tirando-me dos meus pensamentos e lembranças. — Eles
vão levar o caixão, você gostaria de se despedir?
Encaro seus olhos escuros e inchados de tanto chorar e nego
com a cabeça. Apesar de ter sido criada por uma mulher católica e
extremamente apegada à religião, me distanciei de tudo isso há
muito tempo, hoje me considero ateia.
O corpo no caixão é só isso, um amontoado de células que estão
em decomposição. Meu pai já não está mais lá, seu cérebro não
funciona mais, portanto não tem porque me despedir, para mim a
última lembrança, que levarei até morrer, é dele dando um beijo
carinhoso em minha mãe e saindo apressado pela porta.
Esta foi a última vez que o vi com vida, e é essa lembrança que
escolho guardar.
— Tudo bem, mãe. — Aperto sua mão e ela apoia-se em mim.
— Temos um carro esperando por vocês na saída. — Daniele
vem até nós em um conjunto de blazer e calça social pretos, seus
olhos azuis fixam nos meus, ela ficou no banco atrás do meu o
tempo todo. — Deixa que eu ajudo a senhora com isso. — Passa
por mim e pega o cilindro de oxigênio que acompanha minha mãe.
— Obrigada — agradeço e recebo um meio sorriso carinhoso. Ela
é minha paciente mais antiga e também a filha do Capo.
Caminhamos até a saída, parando por alguns momentos para
que mamãe recupere o fôlego e receba as condolências de algumas
pessoas.
Maria Masseria, a mulher forte e batalhadora que me deu a vida,
me criou e educou com carinho e amor, está no último estágio de
um câncer no pulmão.
Descobrimos a doença seis meses atrás, mas já estava em
estágio avançado e os médicos não puderam fazer nada, não que
não tenhamos tentado, Alphonse usou todos os seus contatos e
fomos aos melhores especialistas.
Porém, quando o primeiro tratamento não deu resultado e tomou
todas as forças da minha mãe, ela resolveu parar tudo e viver o
restante da sua vida com dignidade.
Meu pai e eu aceitamos sua decisão, ele se afastou do trabalho,
eu diminuí meus horários na clínica e me mudei para a casa deles,
para poder passar mais tempo com ela.
Não era para ele estar trabalhando ontem, mas Miguel Matielo
não conseguia se afastar completamente dos seus deveres como
chefe de segurança do Capo, não sei os detalhes do que aconteceu,
mas foi alguma coisa importante, para tirar meu pai de casa.
Quando o assunto era proteger a Família Corleone ninguém
conseguia pará-lo. Por isso ele nos deixou em casa e foi ajudar sua
equipe, algo aconteceu e eles foram atacados, em uma troca de
tiros meu pai foi atingido na cabeça ao se jogar na frente do Capo.
É tudo o que sabemos, sei que se algum dia quiser perguntar
sobre isso, Alphonse não irá se recusar a me contar os detalhes,
mas não fará diferença.
Ele se foi.
Meu pai não está mais aqui.
A dor deste pensamento aperta meu peito, as lágrimas ameaçam
voltar, mas me controlo, falo para mim mesma que preciso ser forte
pela minha mãe.
Ele era meu pai, mas Miguel Matielo foi o amor dela, o homem
que ela escolheu para dividir a vida, a quem se entregou de corpo e
alma. Eles tiveram aquele amor avassalador dos filmes, tão intenso
que, ao acabar, leva uma parte da pessoa que ficou e que jamais
será completa novamente.
O que faz doer ainda mais é que era para ser o contrário, meu pai
deveria estar ao meu lado, me consolando. Estávamos nos
preparando para isso, para o momento em que minha mãe
estivesse no caixão.
E isso logo acontecerá, vejo a sua dificuldade em respirar, suas
mãos frias e o corpo definhando, tão magra que o vestido preto fica
solto demais em seu corpo. Os médicos nos deram alguns meses,
mas a cada dia que passa a doença leva mais um pouco da sua
vida.
E agora sei que ela não tem mais porque se segurar a esta
existência, minha mãe se conformou com a morte, para ela sua
passagem significa um recomeço, em outro plano, ao lado do amor
da sua vida.
Droga, controle-se, Luana.
Por sorte o enterro é rápido, o dia está frio e minha mãe cansada.
Aos poucos o caixão é baixado e rosas de despedida são jogadas
no túmulo.
Olho em volta e percebo que estou cercada por muitas pessoas,
mais do que poderia imaginar, e todos estão tristes, homens feitos
que convivem com a morte constantemente — inclusive sendo eles
próprios executores — têm os olhos vermelhos e choram a perda do
meu pai.
Meu coração se aquece com a percepção de que Miguel Matielo
tocou tantos corações enquanto viveu, meu pai ficará na memória
destas pessoas e, para mim, isso é ser imortal.
Então é isso, acabou.
Apesar de frio, o dia está ensolarado e bonito demais para a
tristeza que sinto, parece errado, como se o universo não se
importasse com a minha dor.
Inspiro o ar gelado e sinto o cheiro das flores trazidas pela
funerária, lindos arranjos de rosas brancas. Quando abro os olhos
novamente, procuro seu olhar inconscientemente, mas só vejo a
grande foto que foi colocada ao lado do túmulo.
Lembro do dia que tirei esta foto, estávamos em uma viagem
para o interior e meu pai passou a tarde toda pescando no lago.
Sem conseguir pegar nada, ele voltou para a cabana em que minha
mãe e eu estávamos, só para descobrir que havíamos trazido peixe
congelado.
Ele fingiu estar chateado por não confiarmos em suas habilidades
de pescador, mas era sempre a mesma coisa, ele nunca pegava
nada, então mamãe e eu fomos preparadas porque queríamos
comer peixe.
Miguel tentou ficar emburrado no sofá e disse que não comeria o
pescado, até que minha mãe foi até ele, sentou-se em seu colo, fez
um chamego e falou algo em seu ouvido que o fez gargalhar, tirei o
celular bem na hora e eternizei o momento.
É assim que quero lembrar dele, sorrindo feliz com o amor da sua
vida em seus braços.
As pessoas já estão saindo, vejo Amélia e Rita acompanharem
minha mãe, mas preciso de um momento antes de ir embora.
— Você está bem? — Ouço a voz de Daniele ao meu lado.
— Não — Solto o ar que só agora percebo estar segurando e
respondo honestamente, se ela perguntou é porque está
preocupada. — Mas vou ficar.
— Sei que sim. — Ela encara a foto do meu pai, assim como eu,
e me entrega uma rosa branca. — Ele foi um grande homem.
Não respondo, pego a rosa que ela me dá e coloco em cima do
túmulo, não percebi que não tinha feito isso durante o enterro.
Obrigada por tudo, pai.
Com esta derradeira despedida, viro-me e caminho em direção
ao último carro preto parado na estrada, mas antes de entrar, tenho
novamente a sensação de estar sendo vigiada.
Deve ser impressão minha.
Daniele entra no carro e senta-se ao meu lado e Lucas, seu
marido, entra logo depois.
Quando o veículo está quase saindo do cemitério dou uma última
olhada para o local onde meu pai foi enterrado e posso jurar que
vejo alguém se aproximando do túmulo.
É rápido e logo não tenho mais visão do lugar, deve ser algum
funcionário que estava esperando todos saírem para limpar o local.
Novamente o frio na espinha me faz arrepiar, é como se meu
corpo estivesse em modo de alerta, mas não estou em perigo.
Eu posso simplesmente ignorar a mensagem em meu celular e
seguir com a minha vida. É só fingir que nunca a recebi, simples. Já
fiz isso muitas vezes, especialmente quando algo não é do meu
interesse. É fácil olhar para o lado, ignorar as palavras, ainda mais se
não é problema meu.
Não sou como as outras pessoas, meu senso de lealdade é
praticamente inexistente. Posso mentir, manipular, enganar, até matar
alguém, se isso significa uma vantagem para mim, nunca precisei
chegar a este extremo, porém sei que não pensaria duas vezes em
caso de necessidade.
Sou o que você pode chamar de psicopata, não me importo com a
terminologia, até acho legal e sinto um puta orgulho por ninguém
perceber o óbvio.
Meu charme e inteligência garantiram a vida que tenho hoje, sou
bonito e malho bastante para continuar em forma, também me
atualizo constantemente em meu trabalho, sou bom no que faço e
todos sabem disso.
Tenho 32 anos e uma pequena fortuna em minha conta bancária,
subi de cargo na empresa em que trabalho, você não imagina o
quanto é fácil conquistar as pessoas e convencê-las do meu valor.
Sou muito inteligente e competente com o que me disponho a
gastar meu tempo e energia, fui o melhor aluno durante a faculdade,
aprendi o que precisava para entrar nesta empresa, depois disso foi
só questão de escolher as pessoas certas como aliadas e usá-las a
meu favor.
Neste jogo de poder e manipulação chamado capitalismo, me
considero um mestre e tenho os outros jogadores em minhas mãos.
Então me pergunto, por que, justamente agora, estou parado na
minha sala de estar na cobertura de um dos prédios mais exclusivos
de Chicago, rodeado por artigos de luxo, sem conseguir me mover.
Preciso estar no trabalho em cinco minutos, o caminho leva trinta,
já estou atrasado — e eu nunca me atraso —, odeio imprevistos que
alterem minha rotina.
Mas não posso ir, tudo o que ignorei por tantos anos vem me
assombrar com uma simples mensagem.
“Chegou o dia de cobrar sua dívida”
Um endereço e o link com uma passagem só de ida para New York.
Eu era um moleque de dezesseis anos quando fiz uma promessa
em troca do caminho para a vida que tenho hoje, algo que jamais
deveria ser cobrado e que eu tinha certeza que não pagaria, porém
não consigo fechar os olhos. Não tenho senso de moral ou honra,
mas dessa vez, desta única vez, não consigo desviar da minha
promessa, talvez porque o filho da puta conseguiu montar um jogo
interessante e eu estou entediado.
Este é o problema em chegar no topo, minha vida está sem graça e
preciso de um desafio, algo que me atraia e me faça sentir vivo
novamente.
Duas horas depois estou no aeroporto de Chicago, uma mala com
tudo o que tenho de valor me acompanha, a passagem para New York
em mãos, e a certeza de que jamais voltarei.
Este será um comprometimento vitalício, não era para acontecer
tão rápido, merda, eu deveria ter mais tempo. Mas isso não importa, a
partir de agora não tem mais volta.
Maldita hora em que meu cérebro decidiu se interessar por essa
merda de jogo.
O voo é um inferno, recebi uma passagem na classe econômica e
não consegui fazer o upgrade, do meu lado uma criança de uns cinco
anos, cheia de meleca no nariz, que não parou de chorar o tempo
todo. A mãe fingiu que estava dormindo e foda-se.
Quando desembarco em meu destino, pego a mala e sigo para o
ponto de táxi. Não tive tempo para alugar um carro ainda, mas isso
pode esperar. Preciso chegar até o endereço informado na
mensagem.
O taxista para em frente a um edifício residencial de classe média
alta, o porteiro pega minha mala e abre a porta, o hall de entrada é
luxuoso, tem uma sala de espera com sofás, do outro lado encontro a
recepção.
Não é um hotel, este é um condomínio de apartamentos, portanto
os dois recepcionistas me pegam de surpresa.
— Bom dia — o homem mais novo, estatura baixa, loiro, pele clara
e olhos azuis cumprimenta com um sorriso forçado. — O senhor é
convidado?
— Deve ter uma chave para mim, me chamo Yuri Saito — respondo
sem paciência, os homens trocam um olhar rápido, então o mais
velho, alto, pele escura, cabelo negro e curto — leio seu nome no
crachá, Leandro — diz:
— Senhor Saito, preciso de um documento de identificação e a sua
assinatura neste contrato. — Ele me entrega uma caneta e aponta
para o papel em cima da mesa, entrego meu passaporte a ele,
confirmando minha identidade, assino na linha indicada e pego a
chave.
— Seu apartamento é o 1204, a vaga de garagem está no mesmo
número e pode ser acessada pela entrada leste do prédio. — O
homem passa as instruções como foi treinado. — Aqui está a cópia do
seu contrato, Ruan irá ajudá-lo com a bagagem, se precisar de mais
alguma coisa, estamos ao seu dispor.
Com um aceno rápido de cabeça viro-me e vou até os elevadores,
Ruan é o menino mais novo e me segue carregando minha mala até o
elevador. Assim que entramos, passo o cartão magnético no leitor e o
elevador começa a subir automaticamente.
Cada andar tem quatro apartamentos, encontro minha porta, mas
antes de abri-la pego a mala e dispenso o recepcionista. Não sei o
que vou encontrar atrás destas portas, por isso prefiro entrar sozinho.
O imóvel é grande e bem iluminado, nada comparado ao lugar que
deixei em Chicago, mas dá para o gasto, a porta principal abre
diretamente para uma sala e cozinha integradas, com piso de
mármore branco, móveis escuros e detalhes em metal. Uma sacada
grande ilumina o ambiente pelas portas de vidro, vou até o corredor e
encontro duas portas, uma dá para um banheiro social e outra é a da
suíte.
Tudo foi preparado para minha chegada, a roupa de cama está
limpa, abro o closet e encontro reposição de lençóis, toalhas de banho
e de rosto, até alguns produtos de higiene pessoal estão separados
em uma caixa. Fico surpreso em ver mudas de roupa penduradas em
cabides, todas do meu tamanho.
O filho da puta estava preparado.
A geladeira foi abastecida, tem comida para semanas nos armários
e despensa, é como se alguém já tivesse morado aqui, mas tenha
deixado tudo limpo e organizado antes de sair.
Largo minha mala no quarto e volto para a sala, me jogando no
sofá de dois lugares, então reparo em um envelope pardo com meu
nome ao lado da televisão.
Dentro está um relatório completo da minha mais nova obsessão:
Luana Masseria, 41 anos, psicóloga formada pela New York
University, mestrado e doutorado na mesma universidade, não tem
histórico de mudanças, somente viagens a trabalho ou lazer, e possui
uma clínica privada em Manhatan.
Pego uma cerveja da geladeira e sento no sofá para avaliar as
informações. Estão completas, toda a agenda e os compromissos
para os próximos meses descritos detalhadamente, dados de contatos
importantes, ligações pessoais, contas bancárias, chave de acesso às
câmeras de monitoramento e ao aplicativo espião no celular e no
carro.
Quando estou na metade da leitura, uma foto cai do meio dos
papéis. Ela é morena, cabelos bem escuros caídos nos ombros e
olhos castanhos, parece ser baixinha, mas não tenho certeza.
Alguém capturou este momento sem que ela soubesse, a mulher
está relaxada, sentada em um sofá, uma árvore iluminada às suas
costas e um suéter vermelho e verde ridículo indicam que foi em
algum Natal, mas o que chama a atenção é o sorriso genuíno em seu
rosto.
Luana Masseria estava feliz neste momento, reconheço todas as
características deste sentimento, mas ao ver o seu sorriso, algo
dentro de mim me faz querer sorrir também.
É contagiante e provoca um aperto em meu peito, fazendo meu
coração acelerar minimamente, coisa que poucas vezes aconteceu
comigo.
Controle-se, Yuri.
Guardo a foto de volta no envelope e largo o relatório, preciso de
outra cerveja antes de continuar, os próximos dias serão longos e
estressantes: tenho que planejar uma nova rotina e começar a minha
nova vida.
Mas de uma coisa eu tenho certeza, esse jogo é um desafio em
que estou mais do que disposto a entrar de cabeça.
Uma nova obsessão.
Depois de anos longe desta vida, evitando estas pessoas, correndo
do meu passado, sou atraído novamente para a escuridão, só que
desta vez a decisão de ficar é somente minha.
2 semanas depois
Quando sofremos uma perda em nossa vida, seja ela de uma
pessoa, de um animal de estimação, ou até de um emprego ou bem
material, entramos em um processo de luto.
E cada ser humano reage de forma diferente a cada fase desse luto:
alguns ficam anos em negação e isolamento, tentando não pensar
naquilo e sofrendo em silêncio. Outras pessoas avançam rapidamente
por esta primeira fase e encontram a raiva quando já não podem mais
negar o fato, se voltam contra o mundo, procurando explicações para o
inexplicável. Começam as perguntas:
“Por que isso aconteceu comigo?”
“Não é justo, eu não mereço isso”
Então começa a barganha, onde a pessoa tenta criar uma realidade
alternativa em que a perda é algo que pode ser impedido, ela tenta
reverter o que já aconteceu.
Quando nenhuma das fases anteriores funciona mais, volta-se ao
presente e à profunda sensação de vazio que acompanha a
depressão. A pessoa já não consegue mais esconder a tristeza e a
melancolia causadas pela perda, ter períodos de isolamento e cansaço
extremo são normais, já que você começa a se conscientizar do que
realmente aconteceu.
Depois de passar por todo esse processo, podendo ficar mais tempo
em uma das fases, apegando-se à outra, seu subconsciente começa a
querer seguir em frente, a vida pede para continuar, é quando a nova
realidade é aceita. Esta fase é necessária para reorganizar as ideias e
confrontar a nova realidade, com o tempo a dor emocional do luto fica
mais suportável, seu cérebro aceita que o sentimento de superação faz
bem.
Minha mãe está lidando com a morte do meu pai e com a própria
doença ao mesmo tempo, as fases desse luto ficam confusas.
O câncer progrediu ainda mais nos últimos dias, seus exames mais
recentes indicam metástase por todo o corpo e dois tumores no
cérebro.
Ela já não consegue mais sair da cama e fica cada vez menos
tempo acordada. Me mudei para a casa dos meus pais logo depois do
enterro, Maria Masseria se recusa a sair do seu lar, ela não quer
morrer no hospital.
Sim, minha mãe está morrendo.
Este é um fato, a cada dia suas horas neste mundo diminuem e eu
não posso parar e pensar nisso, não agora, deixo o luto pelo meu pai
para depois, forçando-me a ser forte e viver cada minuto que ainda
tenho na companhia da mulher que me deu a vida.
Alphonse acionou seus contatos e transformou um dos quartos
praticamente em um hospital, todos os equipamentos necessários
foram trazidos para cá e organizados da melhor maneira possível para
que ainda pareça nossa casa.
Uma equipe de enfermeiras foi contratada para ficar aqui pelo
período necessário e elas são anjos em nossa vida. Minha mãe
precisa de cuidados extremos, a cada dia que passa ela consegue
fazer menos coisas, já não tem mais controle sobre o próprio corpo,
precisa usar fraldas e não consegue caminhar.
Ela passa a maior parte do tempo na cama ou, quando está mais
forte e quer respirar ar puro, usamos a cadeira de rodas para levá-la
aos jardins.
Seu oncologista vem todos os dias para checar a evolução do
quadro, mesmo que não tenha nada que ele possa fazer. Acredito que
Alphonse tenha exigido sua atenção.
O Capo é assustador e ninguém tem coragem de negar um pedido à
Família Genovese.
Falando neles, Amélia e Rita tem sido dois anjos em minha vida.
Elas vêm todos os dias para fazer companhia à minha mãe e me
ajudar com o que for preciso.
Conheço Amélia Corleone desde que eu tinha doze anos, meu pai
era seu guarda-costas e sempre falava dela, quando Alphonse
assumiu a liderança da Família Genovese e meu pai passou a ser seu
chefe de segurança, conheci pessoalmente cada um deles.
Por precaução, meus pais decidiram que minha mãe e eu
manteríamos o sobrenome dela de solteira, por isso me chamo Luana
Masseria.
Meu pai fez de tudo para nos manter afastadas de seu trabalho,
para a nossa segurança. A Família tem muitos inimigos e seria fácil
atingi-lo através de nós, somente pessoas de confiança sabiam que
ele era casado e tinha uma filha enquanto eu era pequena.
Quando cresci e as redes sociais ficaram mais fortes, decidimos
manter nossas vidas privadas e separadas.
— Luana, sua mãe está chamando por você. — Ouço a voz
carinhosa de Amélia da porta do escritório, ela me encara com os
olhos verdes mais doces que já vi, estou trancada aqui há horas,
tentando organizar alguns documentos que o advogado da Família
pediu. — Daniele logo estará aqui, deixa que ela te ajuda com esses
papéis mais a noite.
Tento dar um sorriso para ela, mas estou tão cansada que só
consigo suspirar. Sabe quando falei sobre o processo de luto? Então,
como psicóloga você deve pensar que tenho mais controle sobre
esses fatores, que, pela minha formação, possuo mecanismos para
lidar com isso de uma forma mais simples e eficiente.
Não é o caso, estou com raiva e internalizei essa merda toda para
ter forças neste momento. Não posso viver o luto por meu pai quando
minha mãe está morrendo no quarto ao lado, então faço de tudo para
não pensar nestes fatos, sim, também estou em negação.
Isolo-me no escritório com qualquer desculpa que consigo para fugir
de tudo pelo máximo de tempo possível. Sou uma fraca, enquanto
minha mãe está acordada tento passar o máximo de tempo com ela,
mas quando os remédios a apagam, preciso me distrair com alguma
coisa para não enlouquecer.
— Ela está lúcida? — questiono ao me levantar e vou até Amélia,
ela é uma mulher forte, depois de tudo o que passou dedica a vida a
ajudar os outros e ainda luta contra um quadro depressivo complicado.
— Hoje é um bom dia, querida.
— Que bom. — Solto a respiração.
— O médico acabou de sair, ele quer fazer novos exames, mas sua
mãe se recusa a ir novamente ao hospital.
— Ela não precisa. — Paro na porta do quarto da minha mãe, o
barulho das máquinas é a primeira coisa que escuto, o bip dos
aparelhos faz meu peito apertar, sou tomada pelo cheiro de álcool do
ambiente que foi limpo há pouco tempo. — Obrigada por tudo, Amélia,
não tenho como agradecer o que você e sua família estão fazendo por
nós neste momento.
— Não precisa agradecer, você, sua mãe e seu pai serão sempre
partes da nossa família, jamais esqueça disso — ela fala e me envolve
em um abraço apertado, mesmo sendo menor do que eu, seus braços
transmitem conforto.
Sinto meus olhos arderem, mas não posso chorar, não agora.
Aguenta firme, Luana, ainda não é hora!
— Filha, você está aí? — a voz fraca e delicada da minha mãe me
chama de dentro do quarto, respiro fundo e engulo o aperto em minha
garganta.
Ainda não é sobre você, seja forte por ela.
— Sim, mãe, estou aqui — respondo e coloco meu melhor sorriso
antes de entrar.
Vou até ela e sento-me na cama ao seu lado, minha mãe não é mais
a mesma, a doença consumiu toda a sua força, seu corpo definha a
cada dia, a pele amarelada e pálida gruda nos ossos, ela perdeu muito
peso, pois não consegue comer nada sem vomitar, os cabelos que
cresceram depois da quimioterapia são brancos e a deixam com a
aparência mais velha.
Mas uma coisa que nunca muda é o olhar carinhoso e cheio de
amor com que ela me encara toda vez que estou aqui. Sei que está
com muita dor, o médico tem aumentado sua dose de morfina depois
que o câncer atingiu seus ossos, mas quando estou ao seu lado ela
não demonstra seu sofrimento.
— Sabe o que eu queria fazer, filha?
— O que?
— Assistir os filmes do James Bond — ela pede e sorri para a
televisão. — Seu pai e eu passávamos horas acompanhando o espião
em suas aventuras.
Sim, eu cresci com estes filmes, meu pai era fascinado por espiões
e minha mãe tinha uma queda por Pierce Brosnan, o ator que
interpretou o papel por muitos anos.
— Claro, que tal começarmos do primeiro? — sugiro para provocála.
— Não, os primeiros são chatos, começa de 007 Contra GoldenEye
— minha mãe exige e sorri para mim.
— Dona Maria Masseria, você está interessada no filme ou em um
ator em particular? — brinco, enquanto procuro o DVD em nossa
coleção particular. Sim, meus pais ainda têm todos os filmes em DVDs
originais e só assistiam assim.
— Não julgue o último desejo de uma mulher à beira da morte —
minha mãe responde e, por mais que seja uma brincadeira, meu
coração aperta ainda mais — E você acredita que Rita e Amélia nunca
assistiram esta obra de arte?
— Não acredito — respondo, fingindo espanto. — Então, senhoras,
hoje minha mãe e eu iremos apresentar-lhes o melhor espião da
realeza.
— E o mais gostoso também — mamãe complementa, arrancando
risadas das outras mulheres.
— Este é um fato questionável, eu particularmente prefiro Daniel
Craig — comento, voltando à nossa discussão de sempre sobre qual é
o ator mais atraente a interpretar o espião.
— Isso é só porque os filmes mais novos têm uma imagem melhor
— mamãe me provoca.
E é assim que passamos o tempo, minha mãe cochilou durante
algumas partes do filme, mas Rita e Amélia ficaram comigo.
Rita Costello perdeu o marido alguns anos atrás, ele era o
Consigliere da Família Genovese, agora seu filho Lucas, marido de
Daniele, é quem ocupa o cargo de conselheiro do Capo.
Depois da perda do marido, Rita passou a se dedicar às ONGs e
orfanatos administrados por Amélia. Elas fazem um trabalho incrível
com as crianças e usam os contatos da Família Genovese para bancar
os projetos.
No final do dia Daniele chega com a desculpa de buscar Amélia e
Rita, mas sei que ela está aqui para checar como estou.
Conheço essa mulher desde o dia que ela nasceu e, depois que tirei
meu mestrado em psicologia, Amélia veio até mim com um pedido de
ajuda que não pude negar.
Sou a psicóloga de Daniele desde que ela tinha cinco anos, hoje ela
é uma mulher adulta, está casada e no caminho para se tornar a
próxima líder da Família Genovese quando seu pai se aposentar.
Mas, mesmo com tudo isso, ela não se atrasa para nenhuma de
nossas sessões e provavelmente é minha paciente mais engajada na
terapia.
Daniele me ajuda com os documentos necessários, demoramos um
pouco para encontrar tudo o que o advogado requisitou, meu pai não
era muito organizado, tenho que admitir.
— Obrigada pela ajuda — agradeço quando estamos sozinhas.
Ela não responde, só acena com a cabeça e vai até o mini bar onde
meu pai guardava suas bebidas caras, que ele nunca tomava.
— Você parece precisar de um desses — Daniele comenta e serve
dois copos de whisky com gelo. — E uma massagem relaxante pelas
mãos habilidosas de um homem.
— Se for por isso, traga a garrafa, sobre a outra sugestão eu passo
— brinco, mas recebo um olhar preocupado.
— Eu sei que você é uma mulher forte e independente, mas
também sei que é fechada e sozinha.
— Estamos trocando de papéis agora? Quando foi mesmo que virou
psicóloga?
Ela ignora minha provocação e senta na poltrona em minha frente.
— Por isso vou te dar um conselho da única pessoa que você vai
ouvir agora. — Encaro seus olhos azuis, tão frios e intensos ao mesmo
tempo. — Você não é fraca por precisar de ajuda, tem pessoas que se
importam com você e estarão aqui a qualquer momento.
Sorrio quando percebo que a maldita está citando minhas próprias
palavras, a frase que falei tantas vezes para ela no consultório é
jogada contra mim.
— Acho que você está pronta para ter alta — falo e viro a bebida em
minha boca, sinto o gosto amargo do whisky que desce queimando
pela minha garganta.
— Você sabe que isso não vai acontecer — Daniele responde com
um sorriso no canto da boca, ela se recusa a ter alta, já conversamos
sobre isso. — Vai ter que me aturar até que a morte nos separe.
— Isso só vale para casamentos, e da última vez que chequei, meu
nome não é Lucas.
— Considere os mesmos termos para nossa relação, doutora —
responde e termina sua bebida. — Agora, faz o favor de descansar um
pouco, Rita pediu para ficar aqui esta noite, se estiver tudo bem para
você.
— Sem problemas, mamãe gosta da companhia e eu preciso
realmente dormir.
Daniele levanta-se, pega a pasta de documentos e me lança um
último olhar preocupado antes de sair. Tenho muito orgulho do
caminho que ela percorreu até agora e de fazer parte de sua história.
Fecho o escritório e, depois de dar boa noite a minha mãe, vou para
o meu quarto, preparo a banheira e me afundo na água quente, deixo
que os sentimentos reprimidos tomem conta e choro, enquanto estou
sozinha posso finalmente libertar minhas emoções.
Três semanas depois
Racionalmente consigo entender o choque quando alguém que você
conhece morre. Sua vida vai mudar por causa deste acontecimento,
especialmente se for dependente desta pessoa.
Uma hora as coisas estão andando linearmente e, de repente, essa
linha é cortada e você precisa encontrar uma forma de seguir adiante.
A interrupção na dependência gera todo um período de readaptação
em que é preciso aprender a continuar sem contar com o apoio
daquela pessoa.
Se a questão principal for dinheiro, readequar o estilo de vida é um
baque e pode causar stress, o que por si só já é um sofrimento.
Quando penso sobre isso, consigo entender.
Meus pais faleceram em um acidente de carro quando eu tinha oito
anos, foi estranho na época, não tenho outros parentes vivos então fui
enviado para o orfanato.
Eles eram dois advogados em início de carreira, tinham dinheiro que
herdaram de meus avós, por isso não éramos pobres, nossa casa era
grande e confortável, eu tinha meu próprio quarto e uma babá que
fazia tudo o que eu pedia.
Eles trabalhavam muito e passavam pouco tempo em casa, por isso
se sentiam culpados e me davam muitos presentes, se eu fingia estar
triste ou com saudades, ganhava qualquer coisa que pedia.
O lugar para onde fui enviado era um lixo, o padre Antônio e as
freiras tratavam as crianças como mercadorias, sair da minha casa
confortável tendo tudo do bom e do melhor e de um dia para o outro
não ter nada, foi um choque.
Senti muita raiva da situação, por ter ido parar em um lugar tão ruim
e por não conseguir sair dali, mas em nenhum momento senti falta dos
meus pais.
Não consigo lembrar de querê-los de volta, eu desejava a vida que
tinha antes de morrerem, minha casa, meu quarto, a coleção de
carrinhos que havia ganhado de um colega da escola na última festa
de aniversário que participei, mas não das pessoas que me colocaram
no mundo.
De fato, em meus 32 anos nesta terra, não sinto falta de pessoas
que saem da minha vida, no geral têm um motivo para isso e sigo em
frente.
Cada encontro é passageiro e cada um serve a um propósito, se
não tiver serventia, não tenho porque gastar meu tempo.
Eu vou atrás do que preciso no momento, se sinto tesão em alguém,
faço de tudo para conquistar a pessoa e ter o que meu corpo deseja.
Se quero mais dinheiro, busco um emprego que me proporcione um
crescimento rápido e um bom rendimento, no geral é simples, as
pessoas são muito manipuláveis e gostam de ser bajuladas.
É só falar o que os superiores querem ouvir e ser mais esperto do
que seus concorrentes, agarrar as melhores oportunidades e pronto.
Claro que ser bom no que faz e manter um charme e carisma são
pontos chave para o sucesso.
Alguém disse que um sorriso vale mais que mil palavras, e eu
concordo, tenho muitos deles, moldados para servir a cada situação
específica.
Eu geralmente consigo o que quero, se me esforçar para isso, não
tem muito mistério.
Se todos conseguissem aplicar isso à suas emoções, sofreriam
muito menos. É só entender que a vida é passageira e, assim que
acabar o tempo de alguém ao seu lado, não tem retorno, aprenda a
remodelar sua vida sem aquela pessoa e pronto.
A morte faz parte da vida, tudo tem início, meio e fim.
Não é tão difícil.
Ou não deveria ser.
Encaro novamente a mulher sentada do outro lado do bar, o terceiro
martíni já pela metade, mas ela não para de beber.
Claramente afogando as mágoas em álcool.
Péssima escolha, coração, você deveria saber melhor que isso.
Sua mãe finalmente morreu na semana passada, acompanhei de
longe a mulher definhar em vida, o corpo virar um cadáver que
respirava. No fim, ela tomava mais morfina do que água.
Foi um alívio quando parou de respirar, sua doença não tinha cura,
se fosse eu já teria acabado com a minha vida muito antes de chegar
aquele estado deplorável.
Esta é a terceira noite consecutiva que Luana sai para beber, ela
ainda não retornou ao consultório, chequei sua agenda eletrônica e,
pelo visto, decidiu tirar duas semanas de folga.
A psicóloga de quarenta e um anos é minha mais nova obsessão,
não por escolha, mas por força maior. Desde que cheguei em New
York tudo o que faço é segui-la e planejar meus próximos passos.
Voltei a usar meu nome de batismo, Yuri Saito só existiu nesta
cidade, nos registros minha ficha é limpa, saldo bancário impecável,
depois de oito anos em Chicago, em um emprego fictício, com
endereço falso e movimentação bancária inventada, estou de volta.
Na verdade, estava trabalhando em uma empresa de
telecomunicações, quase cheguei ao cargo de CEO usando uma
identidade falsa: Maicon Campbel era formado em marketing em
Harvard, tinha um currículo invejável e uma rede de contatos
influentes.
Tudo mentira, é claro, mas coloque qualquer merda em um papel e
aja como se fosse verdade: as pessoas acreditam.
Por vários anos trabalhei naquela empresa, e nesse tempo todo
ninguém se prestou a confirmar meus dados.
Já falei e vou repetir, bajule seus superiores e seja mais esperto que
seus concorrentes. Quem está abaixo de você não merece atenção.
É simples!
Precisei deixar minha identidade real para este momento, já que não
tem como enganar a máfia, especialmente a Família Genovese. Por
isso tudo tem que ser o mais verdadeiro possível, para não levantar
suspeitas.
Aqui sou Yuri Saito, tenho um currículo legal para o que preciso,
formação em contabilidade pela universidade de New York e cursos
profissionalizantes na área de marketing, somente a parte da
universidade é verdadeira.
Tudo isso será necessário para a segunda fase do meu plano, que
deve começar em breve.
Agora preciso ficar de olho em Luana, ela não veio até este bar
somente para beber, a mulher está caçando. A maquiagem pesada, o
batom vermelho e o cabelo arrumado são os primeiros indícios de suas
intenções, o vestido preto justo que mostra mais do que o necessário é
um convite para quem tiver coragem de abordá-la.
Dois homens e uma mulher já tentaram a sorte, mas ela os
dispensou depois de alguns minutos de conversa. Não sei o que está
procurando, mas fico mais curioso a cada minuto.
Qual é o seu tipo, coração?
Há mais de um mês acompanho a vida da psicóloga e, por mais que
o relatório estivesse completo, ainda sinto que ela é um mistério.
Vou até o bar e paro a duas cadeiras de distância dela, como está
de costas para mim, não repara em minha chegada. Ao perseguir
alguém é importante não ficar o tempo todo longe, o melhor é estar o
mais próximo possível, sem olhar diretamente para a pessoa, mas
ainda passar despercebido.
Peço o whisky com gelo para o garçom sorridente e me inclino
levemente em sua direção para agradecer, o local está cheio e o
burburinho alto foi a desculpa perfeita para me aproximar mais dele.
O moreno alto, de olhos pretos e pele escura foi o meu foco a noite
toda, depois de várias mulheres lançarem olhares e sorrisos para ele,
sem receber muito em troca, ficou óbvio seu interesse por outra coisa.
Abro meu melhor sorriso ao agradecer a bebida, elogio sua
tatuagem na mão como desculpa para tocá-lo, ele tem várias, mas
aquela foi feita recentemente.
— Você gosta de tatuagens? — o garçom pergunta quando me viro
para voltar à minha mesa.
Isso foi fácil.
— Adoro, mas não tenho nenhuma.
— Se quiser, posso te passar o contato da minha tatuadora. — Está
tentando conseguir meu número.
— Prefiro admirar na pele de outras pessoas — me faço de difícil e
por um momento ele recua —, mas tenho que admitir que em você é
uma obra de arte.
Seu sorriso se abre automaticamente com o elogio, os olhos pretos
brilham e pronto, tenho sua total atenção.
— Tenho mais, se quiser ver depois — provoca e me entrega um
guardanapo com seu número anotado. Do canto do olho percebo que
Luana presta atenção em nós.
— Você merece mais que isso — respondo sem pegar o
guardanapo e recebo um olhar confuso do homem, que parece
surpreso — Que tal sairmos para jantar amanhã?
Ele me encara como se eu tivesse criado outra cabeça, abro um
sorriso charmoso e pisco para ele, pelo espelho atrás do bar consigo
ver Luana, ela tirou os olhos de nós, mas está atenta à conversa e se
segura para não rir.
— Eu trabalho amanhã — o homem responde, desfaço meu sorriso
e finjo estar chateado com a notícia.
— É uma pena — comento enquanto desço do banco alto com meu
whisky, o guardanapo ainda no balcão.
No momento em que estou me virando para retornar à minha mesa,
ele pega meu braço, como sabia que faria, e se inclina sobre o balcão.
— Mas tenho certeza que consigo alguém para me substituir — fala
com a voz mais baixa, um pouco apreensivo, seus olhos escuros
fixados nos meus.
Viro-me novamente e me inclino sobre o balcão, ficando com o rosto
colado ao dele, sinto sua respiração rápida e a mão que segura meu
braço treme.
— É um encontro. — Uso minha voz mais grave, baixa e sedutora,
então sou recompensado com um sorriso tímido — Me chamo Yuri.
— Matt — responde desconcertado.
— O nome combina com o rostinho bonito. — Pisco e aperto sua
mão um pouco mais antes de largar.
Com isso me afasto, pego o guardanapo e deixo o garçom todo sem
jeito inclinado no balcão, o rosto corado e as mãos trêmulas.
Fácil demais.
Para contextualizar, não sinto atração por homens, quando estou
com tesão procuro mulheres para satisfazer meus desejos.
Já tive relações com homens, mas no geral não é por prazer e sim
para conseguir algo deles. Não sei porque o ser humano é tão
motivado por sexo, ofereça seu corpo e terá o que quiser de alguém.
Esta foi uma das formas que usei para conseguir subir de cargo na
última empresa onde trabalhei, o dono é casado com uma mulher, mas
às escondidas paga para ter relações com meninos de programa. Foi
fácil descobrir seu segredo e usar isso contra ele depois.
Contudo hoje meu objetivo é outro, preciso conquistar a confiança
de Luana antes da próxima fase do meu plano, mesmo que ela ainda
não saiba quem eu sou, seu subconsciente já percebeu minha
presença, nos esbarramos no mercado, ela me viu na padaria e agora
no bar.
Por mais que sejam passagens rápidas um pelo outro, é assim que
começa o processo de fazê-la se acostumar tanto comigo que não
perceberá minha presença quando estou vigiando seus passos.
E mulheres tendem a confiar muito mais em homens homossexuais,
acredito que seja pelo fato de que, a partir do momento em que um
homem não tem interesse sexual em você, ele não é mais uma
ameaça e passa a ser alguém comum.
Eu ainda não sei com certeza qual é a preferência dela, homens,
mulheres ou os dois. No relatório consta que Luana teve três
relacionamentos sérios durante sua vida, todos com homens, mas ela
também joga seu charme para as mulheres no bar.
No momento isso não importa, a longo prazo estes são somente
detalhes do jogo, que fica cada vez mais interessante.
Até o homem atrás do bar se deu bem hoje, e eu, nada. Algumas
pessoas já se aproximaram, trocamos poucas palavras, mas não senti
coisa alguma.
Eu só preciso transar, afogar meu sofrimento com um pau
enterrado bem fundo em mim enquanto gozo pelo menos uma vez, ou
com a boca de uma mulher gostosa me chupando. Independente do
gênero, quero alguém que faça o serviço direito e vá embora depois.
Só uma noite de sexo selvagem, é pedir muito?
Termino o terceiro martíni e minha bexiga aperta, quando tento me
levantar sinto as pernas fracas e fico tonta, preciso me segurar no
balcão para recuperar o equilíbrio.
Droga, vá para casa, Luana.
Não, ainda não!
É a terceira noite que tento pegar alguém, não saio daqui sem uma
foda. Vou até o banheiro, esvazio minha bexiga e como um chocolate
que guardei na bolsa antes de vir, isso vai ajudar a controlar um pouco
o álcool em meu organismo.
Quando volto para o meu lugar vejo um homem sentado onde eu
estava, loiro, alto, o terno e gravata de luxo combinam com o relógio
caríssimo em seu pulso, ele está tomando um whisky puro e olha para
o celular em suas mãos.
O garçom continua sorrindo como um bobo depois de garantir o
encontro com um oriental gostoso, peço uma água com gás e sentome no último banco do balcão.
Passo os olhos novamente pelas pessoas no bar, é sexta-feira à
noite, mesmo com muita gente aqui, ninguém chama minha atenção.
Respiro fundo e tomo minha água, preparando-me para terminar mais
uma noite sozinha.
— Se eu chegar em você, vou ser dispensado como os outros? —
Uma voz ao meu lado chama minha atenção, viro-me para encarar o
loiro que agora tem os olhos claros focados em mim, nos meus peitos,
mais precisamente.
— Depende, você pretende tentar me conquistar esta noite?
— Não estou aqui para isso.
Seu olhar desce para minhas pernas, ele está me avaliando sem
vergonha nenhuma, o estranho abre um sorriso charmoso quando
volta a olhar para cima.
Finalmente!
— Então estamos em sincronia.
Levanto-me e pego minha bolsa e o sobretudo, fazendo um sinal
de despedida para o garçom, então caminho dois passos até o loiro,
fico de pé em sua frente, a postura ereta faz meus seios saltarem
ainda mais e seus olhos vão diretamente para eles.
— Moro do outro lado da rua — digo diretamente em uma voz firme
e confiante, é um convite e ele entende na hora.
— Estarei logo atrás — responde com a voz grossa de tesão, toma
o restante da sua bebida e, assim que ando em direção à saída, ele
está no meu encalço.
Moro literalmente do outro lado da rua, por isso venho até este bar,
é conveniente. Os clientes no geral são pessoas que trabalham na
região, engravatados que precisam de uma bebida depois de um dia
estressante de trabalho.
O loiro não perde tempo, assim que abro a porta do apartamento
sua boca cola na minha. Apressado, porém gentil, gosto de um
homem que tem atitude.
— Sofá ou cama? — pergunto diretamente.
— Cama, preciso de espaço para desfrutar desse corpo.
Tiro os saltos e o vestido no caminho para o quarto e ele começa a
tirar suas roupas, é uma transa de uma noite só, não precisamos de
romance.
— Caralho, mulher, quanto te vi no bar pensei que queria ficar
sozinha — ele fala e me puxa pela cintura— Se soubesse que estava
com esse fogo todo, teria falado contigo antes.
Tomo sua boca e abro caminho até que nossas línguas se
encostem, ele beija bem e o gosto de whisky é provocante.
— Estamos aqui agora — provoco.
— Sim, gostosa.
O loiro está em forma, os músculos duros e definidos são uma
delícia, ele abre meu sutiã e liberta meus seios, com um olhar safado
o homem traça um caminho de beijos pelo me pescoço até abocanhar
um dos meus mamilos e chupar com vontade, não me controlo, solto
um gemido.
Sinto seu pau duro apertar minha barriga, ele ainda está de cueca,
mas posso dizer que não é muito grande.
Espero que saiba usar a boca e os dedos, pelo menos.
Depois de lamber um dos mamilos, ele me joga na cama, pegandome de surpresa, ergue meus braços e prende minhas duas mãos
acima da cabeça.
Seu corpo paira sobre o meu, estou sem fôlego com a atitude, seus
olhos percorrem meu corpo com desejo.
— Do que você gosta? — pergunta com a voz firme e a boca
colada na minha orelha, provocando arrepios.
— Só me faz gozar — exijo em um gemido. — E use preservativo.
— Não vim prevenido.
Por que eles sempre falam a mesma coisa?
— Primeira gaveta do lado direito da cama, escolha sua preferida
— falo com firmeza, deixando claro que ele não tem escolha.
— Você está preparada.
— Não é minha primeira vez.
Com isso a conversa acaba e partimos para o que realmente
interessa. Ele sorri e volta a me beijar, descendo pelos peitos, brinca
com um mamilo, alterna entre lambidas delicadas e mordidas fracas, a
dor e o prazer.
Já estou pegando fogo e não controlo os gemidos quando ele me
solta e começa a descer ainda mais, suas mãos agora acompanham a
boca, acariciando a lateral do meu corpo, sinto arrepios percorrerem
minha pele.
Com um movimento firme ele enrosca os dedos na calcinha
minúscula que estou usando e arrebenta, tirando do caminho a única
barreira que o separava do meu centro de prazer.
— Molhada pra caralho — comenta e morde a parte interna da
minha coxa, provocando-me. — Teu cheiro é inebriante. — Morde a
outra coxa, sem encostar onde realmente está pegando fogo.
Quando ele vai descer e beijar meus joelhos, agarro seu cabelo e o
forço a olhar nos meus olhos.
— Se o próximo lugar que essa boca encostar não for a minha
boceta, eu juro que te coloco para fora daqui — ordeno com a voz
firme, mas a respiração ofegante entrega meu desespero.
Ele aperta minha cintura com as mãos e me puxa para sua boca,
em um momento seus lábios estão onde quero e a língua quente e
molhada percorre o caminho do prazer.
Droga, isso é bom demais, o desgraçado sabe o que está fazendo.
Ele me beija e provoca lentamente, então coloca um dedo dentro de
mim e a língua foca no clitóris, fazendo-me gritar.
— Isso… aí mesmo… mais rápido…
E é exatamente o que o desgraçado faz, tirando tudo de mim em
um orgasmo delicioso. Agarro os lençóis enquanto vejo estrelas,
perdida em meu próprio prazer, ele não para até que meu corpo
amolece e já não tenho forças para nada.
Abro os olhos ao sentir seu rosto próximo do meu, ele me olha com
orgulho, parece uma criança feliz depois de tirar nota alta na escola.
— Muito bem, garoto, muito bem — elogio e ele volta a sorrir.
O homem desce da cama, tira a cueca e pega uma camisinha da
gaveta.
— Agora é minha vez. — E ele beija minha boca e vira meu corpo,
ergue meu quadril se posiciona entre as minhas pernas. — Vou te
fazer gozar de novo, dessa vez no meu pau.
Escuto ele abrir o preservativo e vesti-lo antes de se enterrar em
mim. Ainda estou sensível demais pelo orgasmo, mas gemo como
motivação, homens gostam disso.
— Foda-se — grita e começa a meter rápido e forte, o homem está
descontrolado em busca do próprio prazer, suas mãos apertam minha
cintura, puxando-me de encontro a ele.
Por sorte estou de costas e posso fingir os sons sem precisar fazer
expressões faciais, mas não preciso me esforçar por muito tempo, já
que logo escuto seu gemido e sinto o pau amolecer dentro de mim.
Pelo menos me chupou antes.
O loiro desaba ao meu lado, suado e sem forças. Acho que não
terei a sorte de um segundo orgasmo, então viro-me na cama e
encaro o teto.
Será que já posso mandá-lo embora?
Só quero um banho e dormir, o efeito do álcool está passando e a
consciência começa a cobrar o preço da sobriedade.
— Isso foi incrível — o loiro comenta, ofegante, só agora reparo
que ele não parece muito velho, chuto que não tem nem trinta anos.
— Me chamo Gabriel.
Estende a mão para mim como se estivéssemos em uma reunião
de negócios, o gesto me faz rir e, só por isso, pego sua mão e falo
meu nome verdadeiro.
— Luana.
— Foi um prazer, Luana. — Gabriel sorri e beija meu rosto antes de
se levantar. — Só vou usar o banheiro rapidinho, depois você pode
dormir tranquila.
— Está tão na cara assim? — questiono, sentindo-me aliviada por
não precisar mandá-lo embora com palavras.
— Essa também não é minha primeira vez, Luana. — O loiro volta
do banheiro e pisca para mim, o sorriso safado no rosto.
Gabriel se veste sem enrolação, pega suas coisas e o acompanho
até a porta.
— Acho que nos vemos por aí — fala despreocupadamente e
agradeço por não pedir meu telefone.
— Sim, nos vemos por aí — respondo por cortesia.
Tomo um banho quente antes de voltar para a cama e me jogar nos
lençóis desarrumados, será que hoje conseguirei dormir sem pensar
neles?
Luana conseguiu o que estava procurando, sexo casual com um
estranho. O cara não aguentou o tranco, mas pelo menos a fez gozar
antes do fiasco que foram os quarenta e cinco segundos em que
meteu nela.
Como eu sei disso? Bem, assisti a cena toda pelas câmeras de
segurança que instalei em seu apartamento, uma bem em frente à
sua cama. Tenho uma chave extra que estava no envelope, junto com
o dossiê sobre a psicóloga.
Agora ela está dormindo agarrada a um travesseiro e com as
cobertas no meio das pernas, o sono não é tranquilo, mas pelo menos
conseguiu fechar os olhos, levando em consideração as outras noites
em que passou assistindo porcarias na TV e chorando, já é uma
evolução.
Volto ao meu computador e leio o e-mail de Giovani, usei os
contatos de Maicon Campbel para a próxima parte do meu plano.
Preciso que a secretária de Luana se demita e saia de cena.
Elas trabalham juntas desde que a psicóloga abriu seu consultório,
então foi preciso uma proposta muito generosa para que Vivian se
interessasse por um novo emprego.
De: Giovani Rossi
Assunto: Secretária
Data: 17 de fevereiro de 2022 21:00
Por coincidência minha secretária está grávida e não pretende
voltar depois que a criança nascer, portanto consegui atender o seu
pedido.
Espero que a mulher seja competente, não prometo mantê-la se
não for.
PS: Quando você volta?
Giovani Rossi
CEO, Rossi Multimídia Company.
Não foi um pedido e ele sabe disso, mas Giovani precisa se
enganar e pensar que está no controle de alguma coisa, o CEO rico e
poderoso é uma fachada que ele tenta manter a todo custo, mas eu já
vi o que tem por trás.
Sinto um gosto amargo na boca ao lembrar dele, o nojo do homem
que se acha mais importante e inteligente do que realmente é. Ele tem
dinheiro e influência política, mas isso é herança de família, Giovani
não passa de um filhinho de papai que se acha dono do mundo.
De: Maicon Campbel
Assunto: Secretária
Data: 17 de fevereiro de 2022 23:50
Ela será uma ótima secretária, especialmente pelo salário e
benefícios que está oferecendo, só não se esqueça do nosso acordo.
PS: Já está com saudades, querido?
Maicon Campbel
Não vou voltar, mas ele não precisa saber disso agora, fiz Giovani
correr atrás de mim até me tornar uma obsessão em sua vida, ele
gosta de ser fodido por homens, mas mantém um casamento de
fachada com uma mulher, tem filhos e uma casa para brincar de
família perfeita perante a sociedade.
O grande CEO e magnata de Chicago esteve em minhas mãos por
anos, literalmente, por isso foi fácil convencê-lo a pagar o triplo do
salário que Vivian ganha e adicionar mais alguns benefícios.
Entretanto, o que tornou a proposta irrecusável foi a sorte mesmo,
os pais de Vivian moram em Chicago e sua mãe acabou de receber o
diagnóstico de esclerose múltipla.
A doença não tem cura e o quadro está evoluindo, ela precisa de
mais cuidados do que o marido pode dar e um plano de saúde mais
completo.
Vivian já estava preocupada com a mãe há um tempo, segundo as
conversas com suas amigas nas redes sociais (as quais tenho
acesso, pois invadi todas), a mulher começaria a procurar emprego
depois que Luana tivesse um tempo para digerir a morte dos pais,
mas a proposta foi tão boa que ela não conseguiu recusar, e preciso
do seu emprego o mais rápido possível.
No fim, o dinheiro e a sorte me trouxeram a oportunidade perfeita
para seguir minha querida psicóloga de perto durante o dia.
De: Giovani Rossi
Assunto: Secretária
Data: 17 de fevereiro de 2022 23:54
Sabe que sim, ainda mais quando penso no quanto você vai ficar
me devendo.
Consigo imaginar várias formas de cobrar este favor.
Giovani Rossi
CEO, Rossi Multimídia Company.
Tenho certeza que consegue, mas isso não acontecerá. Manterei
contato com Giovani enquanto for necessário, depois Maicon
Campbel pode desaparecer da mesma forma com que surgiu.
Pego o guardanapo com o número de Matt anotado e envio
mensagem para ele.
“Boa noite, lindo, te busco às oito
amanhã, me passa seu endereço.
Yuri.”
Ele não demora muito para responder o que me faz pensar que
estava esperando minha mensagem.
“Pode vir aqui no bar?
Consegui que uma amiga cubra
meu turno amanhã, mas terei que
abrir e fechar.”
Perfeito, não precisarei encontrar uma desculpa para ir até lá e
talvez consiga acesso às câmeras.
“Sem problemas, nos vemos
amanhã.”
“Não vejo a hora”
Depois de checar as câmeras no apartamento de Luana, termino
de editar meu currículo e dou a noite por encerrada.
Faz dias que não durmo direito, Luana passa horas fora de casa,
andando pelas ruas sem rumo, e quando retorna, não consegue se
desligar. Como fico de olho nela, também não consigo dormir por
muito tempo.
O pior é que só de lembrar dos seus gemidos fico de pau duro
novamente, me masturbei como um adolescente enquanto ela era
fodida pelo loiro apressadinho, mas parece que não foi o suficiente.
Não é de se admirar, desde que cheguei a New York não transei
com ninguém, na real, não senti vontade até agora, talvez deixe Matt
feliz por uma noite, assim desconto meu tesão nele e paro de pensar
na maldita psicóloga.
Merda, se controle, Yuri, ela é uma presa, mas não dessa forma.
É por este e outros motivos que amo e odeio ficar obcecado por
alguém específico. Dinheiro e poder são coisas que consigo controlar
sem perder a cabeça, mas pessoas são complicadas, e para que
meus planos sejam bem sucedidos, Luana está fora de cogitação.
***
Acordo assustado com o barulho do alarme, não é meu
despertador e sim um aviso de que Luana abriu a porta de casa.
Merda, dormi demais, olho para o relógio que marca dez horas da
manhã.
Droga, droga, droga!
Visto uma calça jeans, camiseta preta, as botas de couro pretas,
jogo um casaco de lã e um sobretudo e saio correndo. Checo a
agenda eletrônica para constatar que ela tem um compromisso
marcado de última hora, mas não tem endereço anotado.
Merda, Luana!
Abro o aplicativo que controla o GPS no aparelho do seu celular,
ela já está em movimento, checo o GPS do seu carro e ele continua
na garagem, então ela deve ter pego carona em algum destes
aplicativos.
Você sabe o quanto isso é perigoso, coração?
Saio do meu apartamento o mais rápido possível e desço até a
garagem, o carro que comprei é um Corolla cinza, último modelo do
ano, é espaçoso e confortável, tem um bom motor e não chama muita
atenção.
Checo o caminho e me surpreendo ao ver a direção, ela está indo
ao seu escritório, mas em sua agenda não tem pacientes por mais
uma semana e meia.
O trânsito está um inferno a essa hora, o apartamento não fica tão
longe do consultório, mas levo quase uma hora para chegar, Luana já
está lá há vinte minutos.
Todos os meus alarmes internos soam quando reparo em quatro
homens de terno e gravata que parecem ser seguranças. Eles estão
separados, poderiam até passar despercebidos pela multidão se não
fossem os comunicadores no ouvido.
Alguma coisa está acontecendo e não gosto de não saber o que é.
Olho para os carros estacionados na rua em frente ao prédio de
escritórios, nenhum chama minha atenção em particular, mas quando
dou a volta pelo quarteirão encontro o que procurava.
O Cadillac Escalade ESV cinza é um carro enorme, luxuoso,
blindado e o reconheço de longe. É o carro da Daniele Corleone, filha
do Capo da Família Genovese.
O relatório sobre Luana mencionava a ligação de seu pai com a
Família Genovese, já que Miguel Matielo era o chefe da segurança do
Capo, Alphonse Corleone.
A Família Genovese é uma organização mafiosa que comanda
praticamente toda a cidade de New York, já que sua influência vai dos
políticos aos agiotas que trabalham com apostas nas ruas.
Seus negócios não são somente clandestinos, dentro da Família
Genovese existem outras famílias que controlam empresas distintas e
se uniram para criar uma força absoluta nos setores mais lucrativos.
O ramo da construção civil é o principal domínio dos Corleone, que
possuem controle sobre os sindicatos e as importações e exportações
de materiais. As maiores empresas do ramo também lhes pertencem.
Se quiser construir algo nesta cidade terá que passar por eles, e
pagar uma taxa, é claro.
As outras famílias associadas possuem empresas em diversos
ramos, muitas servem só como fachada para lavagem de dinheiro,
outras são realmente lucrativas.
Já na parte clandestina, eles comandam casas de aposta ilegais,
puteiros, cassinos… Os agiotas também trabalham com empréstimos
sem precisar de garantia, bem, se você não pagar, sua vida é tirada,
então acho que a garantia é continuar respirando.
Também fazem a segurança de comércios locais que são
constantemente atacados por outras organizações ou criminosos, fora
isso tudo, ainda têm influência política e governamental, eles são
como parasitas, infiltrados em todos os níveis sociais.
A única coisa com que eles não se envolvem é o tráfico: de drogas,
de armas e humano. Isso está nas mãos dos russos e do Cartel
mexicano.
Nem todas estas informações estavam no relatório, mas se você
cresceu em New York, especialmente na parte pobre da cidade, você
sabe sobre a Família Genovese.
Um dos orfanatos em que passei minha adolescência era mantido
pela ONG criada por Amélia Corleone, que usava a influência do
sobrenome para financiar abrigos e projetos sociais, como se
precisasse se redimir pelos negócios sujos do marido.
O que me deixa pensativo não é o fato de Luana estar envolvida
com a máfia italiana, e sim com a filha do Capo.
Daniele Corleone é uma das poucas mulheres que provocou uma
sensação estranha em mim à primeira vez que a vi pessoalmente.
Seu olhar frio e centrado fez meu coração acelerar, minha pele
arrepiar e posso jurar que uma gota de suor escorreu pelo meu
pescoço, não sei o que é sentir medo, mas acredito que pode ter sido
algo assim.
Isso aconteceu no enterro da mãe de Luana, o evento foi menor do
que o de Miguel, que não participei, já que desta vez somente os
Corleone e os Costello compareceram, mas foi naquele dia que
percebi a mulher de olhos azuis tão frios quanto o gelo.
Algo nela chamou minha atenção, não sei explicar, mas foi como
encontrar outra pessoa parecida comigo. Desde então venho
pesquisando mais sobre sua vida e a coloquei em minha lista de
possíveis ameaças.
Afinal, o que ela pode querer com Luana? A filha do empregado do
seu pai? Elas têm muita diferença de idade também, Amélia Corleone
teria mais em comum com Luana do que Daniele.
E por que ela deixaria seu carro e seguranças tão longe do prédio?
Luana possui três vagas de garagem para uso do consultório, uma
para ela, uma para sua secretária e uma para seus pacientes.
Não que a mulher seja uma das pacientes da psicóloga. Só o
pensamento me faz rir, já imaginou uma mafiosa fazendo terapia?
Sobre o que elas iriam conversar?
“Então, doutora, essa semana matei dois homens e tirei a casa de
uma família, mas eles mereceram, não pagaram o que deviam em
tempo.”
“Tudo bem, querida, mas o que você sentiu com isso?”
Não consigo nem imaginar a cena sem ter uma crise de risos, ela
deve estar lá por outro motivo, ainda não tive acesso ao consultório,
portanto não consegui instalar câmeras e escutas, mesmo porque
Luana não deveria estar trabalhando.
Estaciono o carro em uma rua lateral ao prédio do consultório e vou
até um café do outro lado da rua, saí tão rápido de casa que nem
lembrei de pegar algo para comer, meu estômago está se
contorcendo de fome.
Consigo uma mesa próxima à janela e peço um expresso sem
açúcar e um sanduíche natural, pego o celular no bolso e encaro a
entrada do prédio.
Quase duas horas depois vejo Luana saindo sozinha, ela se
despede do segurança e entra em um carro desconhecido,
provavelmente outra dessas caronas de aplicativo. Ao invés de segui-
la imediatamente, espero mais alguns minutos, acompanhando a
trajetória de Luana pelo GPS, que está fazendo o caminho de volta
para seu apartamento.
Vinte minutos depois e nem sinal de Daniele, vou até meu carro,
dou a volta no quarteirão novamente e seu carro desapareceu, assim
como os seguranças.
O prédio de escritórios não tem outra saída além da garagem, mas
de onde estava sentado conseguia ver as duas entradas. Se ela
tivesse saído por alguma delas, eu teria visto.
Prestarei mais atenção a partir de agora, mas por hora preciso
voltar ao apartamento, pelas câmeras de segurança vejo que Luana já
chegou e foi direto para o chuveiro.
Ela é linda, especialmente quando está livre dentro de casa, onde
ninguém consegue vê-la — que ela saiba —, então não precisa
manter a pose ou esconder seu sofrimento.
Você pode se soltar, coração, ninguém irá te atrapalhar.
Duas semanas depois
Este com certeza não é o meu ano de sorte, além de lidar com a
morte dos meus pais, Vivian, minha secretária desde que abri o
consultório, acaba de me entregar sua carta de demissão.
— Não queria te deixar assim, Luana — a mulher fala enquanto
chora descontroladamente —, mas é minha mãe — tenta se explicar,
seus óculos de armação transparente pendem do nariz, o rosto
molhado pelas lágrimas faz meu coração apertar.
— Eu sei, querida, está tudo bem. — Vou até ela e sento na cadeira
ao seu lado, pego sua mão e tento confortá-la. — Você já tem um
emprego em mente em Chicago?
Vivian me encara e seu rosto fica vermelho, ela é uma alemã de
pele branca e cabelos loiros curtinhos, mas o que mais gosto é que
não consegue esconder seus sentimentos. Vejo a culpa em seus olhos
castanhos e sorrio para ela.
— Eu juro que ainda não estava procurando, só me inscrevi em
alguns sites — desculpa-se. — Mas recebi uma proposta.
— Isso é bom. — Tento animá-la e mostrar apoio.
— Só que preciso assumir o cargo o quanto antes.
— Tudo bem, querida, eles estão cobrindo seu salário aqui?
— Sim, ofereceram o triplo, com benefícios, e o melhor plano de
saúde da cidade. — Vivian fica ainda mais vermelha.
— Isso é ótimo, amiga, você merece, e se precisar de referências,
sabe que é só me falar — comento e acaricio seu rosto, secando as
lágrimas. — Vai ser impossível encontrar uma secretária tão boa
quanto você, mas pior do que isso é saber que não terei mais minha
amiga aqui.
— Ahhh, Luana. — Ela desaba em um choro compulsivo, minha
secretária e amiga é uma manteiga derretida. — Prometo que vou te
ajudar a encontrar alguém para me substituir, e ficarei aqui pelo menos
duas semanas para treinar a pessoa.
— Eu sei, querida, eu sei.
— Inclusive já me adiantei nisso e falei com aquela empresa que
usamos de vez em quando para serviços gerais — Vivian fala e
começa a se animar. — A moça que me atendeu é uma querida, até já
me mandou alguns currículos.
Minha secretária tem uma facilidade absurda em fazer amizades,
ela é uma dessas pessoas animadas que conversa com todo mundo
sobre qualquer assunto.
— Algum interessante?
— Vários, mas o mais recomendado é de alguém diferente. — As
lágrimas param de sair dos seus olhos e ela me encara com o olhar
travesso que conheço muito bem. — Me escuta antes de descartar,
OK?
— Se você precisa me avisar antes é porque tem alguma coisa de
errado.
— Não tem nada de errado, tem coisa até certa demais, se você me
perguntar. — Ela começa a enrolar e solta uma risadinha.
— Fala logo que agora estou curiosa — exijo que pare de
embromar.
— O currículo dele é perfeito e….
— Não quero um homem como meu secretário — corto o que Vivian
ia falar, é por isso que ela enrolou tanto.
— Para com isso, Luana, é preconceito, sabia? Ele foi muito bem
recomendado, tem um currículo melhor que o meu e… — Ela respira
fundo antes de continuar — VOCÊ PRECISA VER AQUELE HOMEM
SEM CAMISA.
— Vivian!
— Eu juro, Luana, só procurei o Instagram dele porque o currículo
era bom demais.
Sei bem qual currículo ela queria analisar…
— Você é uma safada, não vou contratar alguém pela aparência,
isso não deveria nem importar. Se o currículo dele é tão bom, não
precisa nem de foto para…
Paro de falar no exato momento em que Vivian ergue o próprio
celular bem em minha frente, obrigando-me a encarar uma foto do que
só posso imaginar ser um homem saído de algum filme de samurai.
Ela mostra uma imagem em que ele está com o quimono aberto e
sem camisa por baixo, reconheço as roupas de jiu-jitsu, vejo muitas
pessoas na academia treinando com o mesmo uniforme.
Contudo o que chama realmente a atenção é a forma que o homem
encara a câmera, com intensidade, como se pudesse ver que estou
olhando para esta foto, os olhos escuros e puxados marcam sua
descendência oriental, o cabelo preto e comprido está preso em um
coque bagunçado na cabeça, a boca levemente curvada em um quase
sorriso é cativante.
Tenho a sensação de já ter visto este homem em algum lugar.
Do nada sinto minha boca seca e preciso controlar minha respiração
para não ficar ofegante, realmente esse homem tem algo a mais.
— Eu te falei, e a moça que o recomendou me disse que ele é muito
querido e carismático, levou o currículo lá pessoalmente, não tem
antecedentes criminais, saiu do último emprego porque o médico para
quem ele trabalhava se aposentou. — Vivian lista o currículo completo
do homem, mas já não estou mais prestando atenção, pois sei onde
essa conversa vai levar.
— Você já marcou uma entrevista com ele, não é mesmo? —
Encaro minha secretária e amiga, que fica mais vermelha ainda.
— Amanhã, às oito horas da manhã, você não tem nenhum paciente
— ela confirma e levanta rapidamente com um sorriso travesso no
rosto. — Não esqueça de trazer um babador.
Provoca e corre para fora da minha sala. Maldita hora que dei
confiança para esta mulher, mas como não se aproximar de alguém
que trabalha comigo todos os dias e ainda é uma pessoa incrível como
Vivian?
Estou triste por ela ir embora, de verdade, mas entendo seus
motivos, ela ama os pais e eu sabia que uma hora iria voltar para sua
cidade natal.
Por ter me apegado tanto a Vivian, tenho muito medo de contratar
alguém novo e me decepcionar, além de ser muito carismática com os
pacientes, ela é muito competente.
Vivian é a responsável por toda a contabilidade do consultório,
organiza minha agenda profissional e pessoal, marca as consultas e
conhece todas as particularidades dos pacientes, além de ser
responsável pela infraestrutura, compras, consertos, manutenção e
ainda cuidar para que o lugar esteja sempre bonito e agradável,
trocando as flores constantemente.
Pensando nisso, meu único trabalho aqui é atender os pacientes,
porque da porta da minha sala para fora, Vivian cuida de tudo,
inclusive de mim.
Droga, só agora percebo o quanto sou dependente dela, é Vivian
quem faz os pedidos das refeições, que me lembra de ir ao médico
regularmente, que me obriga a ir à academia pelo menos três vezes
por semana, me traz água a cada atendimento, ela até deixa alguns
horários vagos para que eu consiga descansar na semana em que vou
entrar na TPM.
A mulher compra meu chocolate preferido toda vez que fico irritada,
porque ela já sabe como me acalmar.
Como diabos vou sobreviver sem ela?
***
O dia de trabalho é tranquilo, meus pacientes estão voltando aos
poucos, e por terem ficado um período afastados, os problemas se
acumularam.
Ainda precisei acompanhar alguns dos meus casos mais graves,
trabalho com uma gama diferente de pessoas, uso uma visão
comportamental em minha abordagem, por isso mantenho contato
direto com os casos que precisam de mais atenção.
Meu foco são pessoas adultas, atendo alguns casais também, faço
avaliações, diagnósticos e trato do sofrimento, bem como das
limitações de cada um.
Geralmente são problemas relacionados com depressão,
ansiedade, dificuldade nos relacionamentos, abuso de álcool ou
drogas, timidez excessiva, entre outros.
Também acompanho casos de pacientes com diversos tipos de
transtorno de personalidade, juntamente com uma equipe de médicos
parceiros da clínica.
Quando chego em casa já é tarde e estou mentalmente esgotada. O
que é bom, talvez assim consiga dormir bem esta noite.
Abro uma nova garrafa de vinho tinto e me sirvo da comida
japonesa que trouxe da rua, sentada na bancada da cozinha, solitária.
Eu até gostava de cozinhar, mas hoje em dia não tenho a menor
vontade de preparar algo, honestamente nem fome sinto, acho até que
perdi peso nos últimos dias.
Antes estaria ligando para minha mãe ou meu pai, talvez teria
jantado na casa deles, aproveitado a comida caseira que dona Maria
fazia.
Tenho mais de quarenta anos, incontáveis encontros que não deram
em nada, dois relacionamentos sérios e um casamento que acabou
amigavelmente.
E é assim que me encontro aqui, completamente sozinha.
Não tenho mais o sonho de encontrar meu par perfeito, a outra
metade da minha laranja, a tampa para a minha panela ou qualquer
uma destas besteiras que enfiam em nossa cabeça, fazendo-nos
acreditar que a coisa mais importante na vida é casar, ter filhos e
depois morrer.
Meu casamento acabou exatamente por causa destas expectativas,
apesar de ter deixado claro que eu não queria ter filhos, depois que
casamos ele voltou ao assunto, exigindo que eu diminuísse minha
carga de trabalho e começasse uma família.
“— Achei que já tínhamos começado uma família no dia em que
casamos — respondi em mais uma de nossas brigas.
— Não, Luana, uma família é muito mais que um casamento —
James gritou do outro lado da sala. — Não podemos ser só nós dois.
— Eu deixei claro, desde o começo, que não quero ter filhos.
— Por quê? Do que você tem tanto medo?
— Não tenho medo, James, eu só não tenho esta vontade, e achei
que você entendia.
— Pensei que sim, mas agora eu quero mais.
— Não tenho mais para te oferecer.
— Então é isso.
— Sim, é isso.”
E foi assim que meu casamento chegou ao final.
Não vou mentir, doeu demais a separação, quando casei achei que
seria para a vida toda, que havia encontrado a minha pessoa, alguém
que me entendia e que estaria ao meu lado, compartilhando as
conquistas e ajudando nas dificuldades.
Ele era parecido comigo, envolvido com a carreira, batalhador,
inteligente, estava tão focado no próprio sucesso quanto eu e amava
viajar, nós nos envolvemos nisso e no começo concordamos que viver
a vida era mais importante do que criar filhos.
Sempre deixei claro que minha prioridade era ser livre para fazer o
que amo, isso inclui meu trabalho, conhecer lugares e pessoas
diferentes, aproveitar um bom restaurante e explorar esse mundo.
Amei James com todas as minhas forças, criei expectativas de um
futuro para nós, mas no fim saí com um coração quebrado e
desacreditada do amor.
Isso já tem mais de dez anos e, depois dele, não tive nenhum
relacionamento que chegou ao ponto do “eu te amo”.
Pode-se dizer que desisti do amor por um bom tempo, vejo o
sofrimento dos meus pacientes todos os dias, a quantidade de
corações partidos que atendo é absurda.
Talvez por trabalhar com os traumas e me afundar neste mundo, é
difícil encontrar casos de felicidade.
Casos como o de Daniele e Lucas.
Acompanhei essa história desde o começo, Daniele é minha
paciente mais antiga e um dos casos mais desafiadores que uma
psicóloga pode abordar.
Quando Daniele tinha cinco anos já era uma criança diferente e
especial, eu havia acabado meu mestrado em psicologia quando
Amélia Corleone entrou em contato.
Ela estava preocupada com a filha, Amélia via sinais de que algo
não estava certo com a menina, ela tinha muita dificuldade em
demonstrar sentimentos, criar laços com outras crianças e até mesmo
com a mãe, preferia ficar isolada com um livro ou escondida ouvindo a
conversa dos adultos.
A única pessoa com quem Daniele se conectava era o pai, Alphonse
Corleone. Ela o admirava e se baseava nele para tudo. Entretanto a
dificuldade em socializar deixou Amélia preocupada, e não é como se
eles pudessem simplesmente procurar qualquer psicólogo, afinal são
os líderes da máfia.
Como meu pai trabalhava diretamente com eles, fui a primeira, e
talvez única, opção. Sei quais são os seus negócios, assim como
sempre soube com o que meu pai trabalhava, não concordo com a
maior parte do que fazem, porém quem sou eu para julgá-los?
Em meu primeiro encontro com Daniele tive a certeza de que ela era
especial, a garota pequena e com um olhar intenso me analisou por
um tempo antes de responder minhas perguntas, tentei diversos
métodos normais da psicologia infantil, como brinquedos, desenho,
música, mas ela não respondia a isso, conforme os anos foram
passando e a menina foi se desenvolvendo, seu quadro ficava cada
vez mais complexo.
Ela começou a desenvolver uma curiosidade quase obsessiva pelo
trabalho do pai. Com o tempo, Alphonse resolveu treiná-la em defesa
pessoal, inclusive com aulas de tiro, eu só descobri sobre isso mais
tarde.
Quando ela tinha dez anos, a mansão Corleone foi invadida, Daniele
viu a mãe ser sexualmente violentada por um dos invasores dentro do
seu quarto.
O que seria uma cena chocante e traumática o suficiente se tornou
um ponto de virada em sua vida, a menina teve a calma e a frieza para
agir em uma situação extremamente perturbadora, pegou uma arma
escondida e atirou no homem enquanto ele violentava sua mãe.
Depois esperou até que o outro invasor, que estava de guarda do
lado de fora do seu quarto, abrisse a porta e entrasse, então ela atirou
nele também. Ajudou a mãe violentada a chegar até o quarto do
pânico, cuidou para que ambas estivessem seguras e esperou
calmamente seu pai vir resgatá-las.
Quando questionei o que ela sentiu no momento, Daniele respondeu
que estava com medo quando não sabia o que fazer, porém quando
sua mãe indicou a arma escondida em seu quarto, tudo ficou calmo
novamente.
Ela sabia usar a arma e tinha como salvar a mãe, só precisava
esperar a hora certa para agir.
A frieza com que ela descreveu a cena me fez arrepiar, a menina de
olhos azuis e voz fraca de criança, contou com detalhes cada instante
daquela noite, levando-me em um passeio pelo seu processo de
pensamento enquanto calculava a trajetória dos tiros.
Quando Daniele descreveu o momento em que puxou o gatilho, ela
não demonstrou ressentimento por ter tirado uma vida, ao contrário,
seus olhos brilharam de orgulho ao descrever a precisão dos tiros e
como encarou a morte no olhar do segundo monstro.
Aquele momento me fez tremer e foi a primeira vez que senti um
medo diferente, mais cru e incontrolável, que vem do nosso instinto de
sobrevivência quando estamos frente a frente com um predador.
Eu já tinha uma teoria formada de que Daniele pudesse ter um
transtorno de personalidade antissocial, porém crianças não podem
ser diagnosticadas, apenas adultos.
Pacientes com transtorno de personalidade antissocial são
mentirosos, manipuladores, impulsivos, irresponsáveis e até violentos.
Desrespeitam e violam os direitos dos outros e não sentem remorso
por isso, além de terem dificuldade para seguir planos e normas
sociais.
Tendem a ter uma opinião elevada de si mesmos e podem ser muito
teimosos, autoconfiantes ou arrogantes. Também costumam ser
charmosos, volúveis e verbalmente superficiais em seus esforços para
conseguir o que querem.
Não há remorso pelas ações. Pacientes assim podem explicar seus
atos culpando aqueles que eles prejudicam ou a forma como a vida é.
Dentro deste transtorno estão a psicopatia e sociopatia.
Os psicopatas aparentam normalidade, sendo muito educados,
inteligentes, com boas posições ou carreiras, se relacionando de forma
satisfatória com pessoas. Contudo são aparências, pois não
conseguem criar laços afetivos. São manipuladores e podem cometer
diversos crimes hediondos.
Estão determinados a não serem intimidados e a não fazerem o que
outras pessoas pensam que é melhor para eles.
Infelizmente os dados coletados sobre pessoas que foram
diagnosticadas com transtorno de personalidade antissocial no quesito
psicopatia são de casos criminais, indivíduos que foram presos
cometendo crimes e diagnosticados enquanto estavam encarcerados.
Assim, psicopatas são comumente associados a criminosos
perigosos, como serial killers e assassinos, só que nem todos chegam
a cometer este tipo de crime hediondo, existem pessoas que vivem
livremente na sociedade e usam sua personalidade para se dar bem
na vida.
Costumam ser muito bem sucedidos no âmbito profissional, onde a
sede pelo poder leva as pessoas passarem por cima umas das outras
para conseguir crescer, usando seu charme e carisma para manipular
e enganar.
Sabe aquele colega de trabalho que vive te passando a perna? Que
leva o crédito pela ideia do outro, ou cria intrigas para derrubar
competidores e até o seu chefe carrasco, que não se importa com
seus subordinados?
São pessoas que, aos olhos da sociedade, estão trabalhando e
funcionam bem, já que muitas vezes são recompensadas pelos seus
atos ao receberem um aumento ou subir de cargo às custas dos
colegas.
Psicopatas são perigosos exatamente por serem encobertos pela
sociedade capitalista competitiva em que vivemos, seu sucesso é
aplaudido de pé, mesmo que o caminho até o topo tenha deixado um
rastro de destruição.
Daniele foi meu maior desafio, e é até hoje, já que continua com
nossas sessões, a mulher é minha paciente mais pontual e nunca falta.
Hoje não acho que ela seja o que a sociedade chama de psicopata,
os estudos com crianças como ela, que passaram por um tratamento
sério durante seu desenvolvimento, são poucos, mas a mulher que
Daniele se tornou não se encaixa na definição de psicopata, mesmo
que ainda tenha traços marcantes de personalidade antissocial, ela
também demonstra ter sentimentos e empatia pelas pessoas que ama.
Se ela realmente tem estas emoções ou só aprendeu a reconhecêlas e a reproduzi-las quando precisa, jamais saberei. Inclusive
demorou anos para entender o significado de amor, foi um caminho
árduo até o momento em que conseguiu dizer “eu te amo” para seu
noivo.
Estas palavras não foram da boca para fora, Daniele analisou
metodicamente o que sentia quando estava com Lucas, como agia ao
lado dele, a forma como seu corpo respondia ao dele, os pensamentos
que surgiam em sua mente.
Ela chegou a usar um sensor de frequência cardíaca por uma
semana, recolheu os dados do aparelho e cruzou com os
acontecimentos daqueles dias, só para constatar que nos momentos
em que seu coração atingia o ápice eram quando estava com Lucas.
Daniele monitorou sua vida de forma fria e analítica antes de
concluir que o que sentia era o que todos chamam de amor, ou a sua
forma de amar.
O casamento aconteceu há poucos meses, e esta foi a união mais
linda e sincera que já presenciei, no momento em que Daniele sorriu
para seu marido antes de beijá-lo, tive a certeza de que o amor
realmente existe, só é difícil de encontrar.
Vivian está mais animada do que deveria com a entrevista do
Samurai Sarado, chegamos juntas ao consultório para repassar
alguns pontos importantes e percebo que ela se arrumou muito mais
do que normalmente faz, alisou o cabelo, passou até uma base mais
grossa na cara, as roupas parecem novas também.
Por algum motivo estou apreensiva, já contratei pessoas para
trabalhar para mim, mas eram cargos temporários, uma assistente
quando Vivian ficou doente, a faxineira, pessoas com as quais não
tenho muito contato e que não trabalham diretamente comigo por
muito tempo.
Entretanto selecionar uma nova secretária, ou secretário, não é
algo tão simples. Também não sei tudo o que Vivian faz no seu dia a
dia, por isso ela fará a maioria das perguntas enquanto avalio a
reação da pessoa.
Quando o relógio marca 7:45 ouvimos o som das portas do
elevador abrirem, Vivian me lança um sorriso animado demais e
passa a mão pelas roupas.
— Chegou antes da hora marcada, isso indica comprometimento
— ela fala antes de sair da minha sala e ir até a sua mesa na
recepção.
Decido deixá-lo esperando até o horário marcado, então, assim
que a porta da minha sala é fechada, abro as imagens da câmera
de segurança que mostra a sala de espera.
Pelas fotos que encontrei nas redes sociais, já sabia que o
homem é bonito, mas nem se ele tivesse mandado um book
fotográfico estaria preparada para o que estou vendo.
Yuri Saito de terno de três peças cinza, camisa branca e uma
gravata azul, é deslumbrante. Se não soubesse que está aqui para
a entrevista, poderia confundi-lo facilmente com um CEO de alguma
empresa.
Ele estende a mão para cumprimentar Vivian, que está ainda
mais vermelha e sorrindo feito uma adolescente, posso até imaginar
as risadinhas que escapam da sua boca. O homem não se abala,
ele exala charme e confiança, do sorriso na medida certa ao olhar
focado no rosto da secretária, tudo nele chama minha atenção.
Novamente tenho aquela sensação de que já vi esse rosto em
algum lugar.
Vivian conversa com ele e o convida a sentar-se e aguardar. Yuri
faz o que ela pede e avalio sua reação, ele não tem nada em suas
mãos, o crachá de visitante que recebeu na portaria está fixado no
paletó.
Enquanto aguarda, ele está atento a Vivian, que não para de
falar, em nenhum momento Yuri olha para o relógio ou pega o
celular, toda a sua atenção é voltada para a minha secretária. Ele
balança a cabeça conforme o rumo da conversa e responde quando
ela faz uma pergunta.
De modo geral, parece estar tranquilo, confiante e sereno demais
para alguém prestes a ter uma entrevista de emprego. Ele não é
muito novo, tem 32 anos, mas não trocou muito de emprego.
Pelo seu currículo, depois que se formou em administração fez
mais alguns cursos e trabalhou em empresas distintas, até que
começou a trabalhar na clínica do Doutor Moura, em Chicago, e
ficou lá até que o médico se aposentou, recentemente.
Confirmei seu histórico em uma ligação ao doutor, que reafirmou
as qualidades do rapaz: disse que nunca teve um secretário tão
competente e que eu seria sortuda se o contratasse.
Yuri parece ter facilidade em conquistar as pessoas, falta saber
se essa habilidade é um charme genuíno ou atuação.
— Vivian, pode acompanhar o senhor Saito até a minha sala, por
favor — falo ao telefone com a minha secretária, que faz o que pedi.
Assim que a porta se abre, levanto-me e dou a volta em minha
mesa para cumprimenta-lo, quando Yuri entra e seu olhar foca no
meu, tudo o que achei que sabia sobre ele se dissipa da minha
mente.
O cabelo perfeitamente preso em um coque não tem um fio solto,
a pele clara e lisa me faz querer saber que cremes ele usa, a barba
foi feita recentemente e ele está limpo e cheiroso, o perfume
amadeirado não é muito forte, mas me faz querer cheirar seu
cangote.
Se acalma, Luana, foca no que importa!
Sim, foca nesse olhar firme e penetrante!
Ou nos dentes perfeitamente alinhados que brilham atrás do
sorriso deslumbrante!
Ou no fato de que ele é muito mais alto que eu, mesmo que meu
salto me garanta alguns centímetros a mais, meu olhar não chega a
seu queixo, conforme se aproxima preciso olhar para cima.
Entretanto o principal é a sensação que tenho quando ele
estende a mão para apertar a minha, sinto um calafrio pelo meu
corpo ao mesmo tempo em que meu coração acelera e meu rosto
esquenta.
O que diabos está acontecendo?
— Yuri Saito. É um prazer conhecê-la, dra. Masseria — Sua voz
tem uma entonação quase musical, é grossa, mas não muito, as
palavras são ditas de forma firme e parecem sinceras.
— Pode me chamar de Luana — respondo quando consigo me
recuperar do choque inicial, indico a cadeira em frente à minha
mesa e vou até o meu lugar.
Yuri senta em uma das cadeiras e Vivian na outra, ela não
consegue tirar os olhos dele, parece hipnotizada.
— Você gostaria de um café ou algo para beber? — Ofereço, já
que minha secretária parece ter perdido o poder da fala.
— Um café seria perfeito — ele responde e abre um sorriso que
faz meu coração bater mais rápido.
— Vivian — chamo a atenção da minha amiga, que só entende
as palavras quando digo seu nome. — Poderia trazer as bebidas,
por gentileza?
— Claro — ela responde e sai da sala novamente.
— Então, senhor Saito, está gostando de New York? — Decido
começar com uma pergunta mais pessoal, deixando o clima mais
leve.
— Sim, nasci e fui criado aqui até meus 24 anos, depois me
mudei para Chicago — ele responde tranquilamente, esta parte não
estava em seu currículo, mas é bom saber que já conhece a cidade.
— Falei com o Dr. Moura ontem, você foi muito elogiado.
— Gabriel me ensinou muita coisa nos anos que trabalhei com
ele, foi um mentor exemplar e se tornou um bom amigo — Yuri fala
com carinho sobre o ex-patrão, eles parecem ter sido muito
próximos, já que usa o primeiro nome do médico.
Neste momento Vivian retorna com uma bandeja e três xícaras
de café, nos servimos antes de continuar.
— Acredito que a agência de empregos tenha lhe falado um
pouco sobre o que procuro, a clínica é pequena e não temos mais
funcionários — comento e faço um sinal para que Vivian continue.
— Além de atender o telefone, marcar horários e manejar a
agenda de Luana, você ficará encarregado pelo bom funcionamento
do consultório, assim como fazer a contabilidade, nós temos um
contador terceirizado, mas é preciso ficar de olho — Ela descreve
todas as suas funções, inclusive as mais básicas, Yuri escuta com
atenção e não demonstra surpresa, nem quando ela fala que ele
terá que ficar de olho na equipe de limpeza.
— Sei que cada consultório é diferente e tem uma rotina
particular, mas estou disposto a aprender o que for necessário —
ele fala e abre um sorriso charmoso para minha secretária, que se
derrete na cadeira.
— Algumas vezes temos emergências fora do horário de
expediente, normalmente é Luana quem atende estas chamadas,
mas caso ela não o faça, a chamada é redirecionada diretamente
para você — Vivian continua.
— Sem problemas — ele aceita, já tendo trabalhado com a área
da saúde deve estar acostumado com ligações de emergência.
— No seu currículo não estava listado seu atual endereço, você
mora próximo do escritório? — questiono, partindo para as
perguntas mais pessoais.
— Sim, moro a algumas quadras daqui, como enviei o currículo
antes de me mudar, ainda não tinha o endereço completo, moro no
Gramercy Park.
Mesmo bairro em que moro, talvez tenhamos nos encontrado
pela rua em algum momento, por isso tenho a sensação de
conhecê-lo.
— Possui veículo próprio ou outra forma de locomoção? — Seu
olhar é focado em mim agora, já que sou eu quem faz as perguntas.
— Tenho um carro, mas pretendo vir de bicicleta quando o clima
colaborar — fala enquanto toma um gole do café, ele segura a
xícara com uma mão e a outra descansa no braço da cadeira.
— É casado? — Vivian pergunta com mais curiosidade do que
deveria, nas redes sociais ele não tinha fotos com ninguém e em
seu currículo não consta o estado civil.
— Sou um lobo solitário — Yuri brinca e pisca para Vivian, ele é
charmoso, tenho que admitir, e sabe usar isso a seu favor.
— Você tem alguma pergunta para nós, Yuri? — Tomo a
liderança da entrevista novamente, dando-lhe a oportunidade de
tirar suas dúvidas.
— Vocês trabalham em parceria com algum hospital da região?
— Ele faz um questionamento inteligente.
— Sim, atendo alguns pacientes que são encaminhados pelo
hospital Bellevue — respondo.
Ele faz mais algumas perguntas sobre os planos de saúde,
horários e agenda que Vivian responde enquanto observo sua
postura. Yuri não vacilou em nenhum momento, não demonstrou
estar ansioso ou apreensivo, seus questionamentos foram diretos e
simples, assim como as respostas.
Merda, ele é um forte candidato.
Quando Vivian termina de explicar o funcionamento do
consultório, dou a entrevista por encerrada. Pelo olhar de minha
amiga ela o manteria aqui o dia todo, mas temos mais duas pessoas
para receber hoje.
— Então, senhor Saito, seu currículo é realmente bom para o que
estamos procurando — começo a falar e ele foca toda sua atenção
em mim. Sendo sincera, seu olhar é um pouco intimidador, mas
coloco isso de lado e continuo. — Com suas qualificações, tenho
certeza que pode encontrar algo melhor em uma clínica de grande
porte.
— Acho que o que a Luana quer perguntar é, porque você quer
trabalhar aqui? — Vivian questiona.
— Para falar a verdade, eu gosto da estabilidade de uma clínica
menor, o trabalho é mais variado também, não fico preso a uma
função só — Yuri responde tranquilamente — E não estou
procurando agitação.
— Entendo, só preciso que esteja certo sobre a sua escolha,
porque não quero contratar alguém que em um ano vá sair e eu
precise começar o processo novamente — explico e ele sorri.
— Se posso falar honestamente, esta não é a minha única opção,
mas se você me escolher para o cargo, só saio daquela mesa morto
ou aposentado — ele fala seriamente, mas depois de alguns
segundos sorri lindamente.
— Acho que era isso que precisávamos saber — termino a
entrevista e nos levantamos.
Acompanho Yuri até a saída da minha sala, ele segue em minha
frente, Vivian atende o telefone, então ele se vira para mim, a mão
estendida e o olhar penetrante no meu.
Meu coração acelera quando pego sua mão novamente e sinto o
aperto firme, o sorriso confiante quase me faz suspirar, mas
mantenho a pose.
— Foi um prazer conhecê-la, Luana — fala em despedida. —
Ficarei no aguardo da sua resposta.
— O prazer é meu, entraremos em contato — respondo com a
voz mais fraca que o normal. — Tenha um bom dia, senhor Saito.
— Pode me chamar de Yuri — responde e sai da sala, acenando
para Vivian, que não pode responder, mas o acompanha com o
olhar. Ela suspira no momento em que ele entra no elevador e as
portas se fecham.
Quando escuto uma risada vinda da recepção, percebo que estou
escorada na porta e provavelmente encarei o homem sair com o
olhar tão abobado quanto o da minha secretária.
Droga, vou ouvir piadinhas sobre isso pelo resto da minha vida.
Me recomponho rapidamente e volto ao meu consultório,
fechando a porta atrás de mim, sinto meu rosto queimar, preciso de
um momento para respirar antes de voltar à sanidade.
Yuri Saito é uma presença a ser sentida e um homem que exige
atenção, mas é charmoso e seu currículo é o que procuramos. Falta
saber se é realmente tão competente na vida real quanto no papel.
Luana me deixou esperando por três dias antes de confirmar o
período de teste como seu secretário, mas ela já havia se decidido
muito antes. Como tenho acesso ao seu telefone, vi as mensagens
que trocou com Vivian depois de entrevistar as outras duas
concorrentes.
Eu sou o melhor candidato que ela pode querer para a vaga, e
serei um secretário exemplar, tudo o que me proponho a fazer, faço
bem feito.
Desta vez não estou trabalhando por dinheiro, então a posição que
ocupo pouco me importa, o que me motiva é estar próximo dela, ter o
controle de sua agenda, dos seus compromissos, pelo que entendi até
o que ela come e bebe durante o dia será minha responsabilidade.
Terei sua vida toda em minhas mãos.
Sua secretária já estava sob meu encanto antes mesmo de
começarem as perguntas, ela encontrou meu perfil nas redes sociais,
não precisou muito depois disso para conquistar a mulher solteira que
exala carência: olhar para seus olhos ao invés dos peitos, sorrir
quando ela sorria, me mover na direção dela, mas sem ser forçado,
falar com a voz calma e confiante, mas o principal foi prestar atenção
no assunto e reagir com a mesma intensidade que ela.
Algo que as pessoas não entendem é que se você escutar com
atenção o que a outra está falando, especialmente se for uma mulher,
e demonstrar interesse genuíno nas suas opiniões, você a tem em
suas mãos.
Toda a linguagem corporal é algo secundário, mas que o cérebro
compreende automaticamente. Eu sei disso e uso essas ferramentas
a meu favor.
O primeiro encontro com Matt foi produtivo, ao buscá-lo no bar,
antes de abrir, consegui instalar um programa espião no computador e
tenho acesso às câmeras de segurança do local, também peguei um
porta copos como souvenir.
Já que agora Luana sabe quem eu sou, não conseguirei mais
segui-la e passar despercebido em locais pequenos, e ela frequenta o
bar com uma certa regularidade, é seu local de caça e preciso ficar de
olho nela.
Não é seguro para uma mulher solteira e sozinha procurar sexo
sem compromisso dessa forma, tantas coisas podem dar errado …
mas se ela precisa transar, garantirei que esteja a salvo. Pelo menos
nada irá acontecer enquanto eu estiver de olho.
Cuidarei de você, coração.
Preciso me introduzir em sua vida aos poucos para não a assustar.
Ela é uma mulher vivida, inteligente e solitária, isso indica que tem
dificuldade em confiar nas pessoas, por isso seu círculo de contatos é
tão exclusivo.
Contudo, ganharei a sua confiança, se tem uma coisa em que sou
incrivelmente bom é em planejamento, e este é um comprometimento
para uma vida toda.
Vivian está fazendo um tour no consultório, é meu primeiro dia do
período de experiência, passarei duas semanas acompanhando sua
rotina para aprender tudo o que preciso em minha nova função.
A secretária chega antes de Luana e organiza tudo, confirma as
consultas do próximo dia e começa seus próprios afazeres. Sua
energia logo de manhã é um pouco demais para mim, nem com três
copos de café consigo parecer tão feliz assim.
Ela fala pelos cotovelos também, de onde tira tanto assunto?
Preciso me esforçar para prestar atenção, mas porra, são sete horas
da manhã, Luana chegou tarde na noite passada, por sorte estava
sozinha, mas isso me tirou um bom tempo e me impediu de dormir o
suficiente.
Farei alguma coisa sobre sua falta de sono, nem que precise
colocar algo no vinho que toma todas as noites antes de dormir.
Ou enviar-lhe um vibrador. Quando fiz uma varredura em seu
apartamento me surpreendi ao não encontrar nenhum brinquedinho
sexual, quem sabe ter um orgasmo sem precisar gastar tempo
procurando um companheiro a ajude a descansar.
Ótima ideia, Yuri.
Quando Luana chega ao escritório parecendo cansada, Vivian leva
o café da manhã para ela, e isso é algo que a secretária me instrui
para tomar cuidado, percebo que ela é muito mais do que uma
simples funcionária.
Luana começa os atendimentos e Vivian recebe cada um dos
pacientes e garante que estejam confortáveis, depois de cada
consulta ela leva água para Luana e a obriga a tomar.
Ao meio dia as duas almoçam juntas em um restaurante italiano
que fica no prédio ao lado. Elas não conversam muito, acredito que
estão se contendo devido a minha presença, captei diversas trocas de
olhares entre elas, mas percebo que é neste momento que relaxam e
falam sobre assuntos fora do profissional.
Mais que patroa e funcionária, são amigas.
A tarde segue a mesma rotina da manhã, até o final do expediente,
quando as duas têm uma reunião para confirmar os compromissos do
próximo dia, antes de dar o turno por encerrado.
O trabalho é simples, mas solitário, não poderei contar com colegas
para me ajudar desta vez. Por um lado isso é bom, manterá minha
mente ocupada enquanto vigio os passos da psicóloga, por outro terei
que estar realmente focado nos meus afazeres.
É Luana quem fecha o consultório, já que prefere analisar alguns
casos sozinha e o turno de Vivian acaba às seis horas. Quando estou
organizando minhas coisas ela me chama para a sua sala, Vivian sorri
para mim e se despede, saindo para o elevador.
Estamos sozinhos.
Bato na porta para me anunciar.
— Pode entrar — Luana responde e indica a cadeira em frente à
sua mesa, o consultório é organizado e limpo, todo em tons de cinza e
preto, com algumas artes em azul claro, a cadeira confortável de seus
pacientes fica de frente para a mesa baixa de madeira, mas também
tem um sofá no canto. — Como foi seu primeiro dia? — ela pergunta,
sentada em sua cadeira. Percebo o olhar cansado e a postura tensa,
Luana cruza as pernas enquanto avalia minha reação, da mesma
forma que faço com ela.
— Muito bom, Vivian é uma excelente mentora e muito profissional,
confesso que me sinto intimidado. — É mentira, consigo desempenhar
todas as tarefas sem problemas, mas elogiá-la faz com que Luana
sorria e crie uma conexão comigo. — Espero continuar seu excelente
trabalho quando ela não estiver mais aqui.
— Vivian é uma pessoa única — ela fala com carinho da amiga e
sua postura relaxa um pouco — Você fez um bom trabalho hoje.
O elogio me faz sorrir e vejo ela ficar levemente vermelha, me
arrumo na cadeira e flexiono um pouco os braços, que mesmo com o
paletó ficam marcados, e seu olhar vai direto a eles.
Você gosta do que vê, coração?
Luana logo volta a focar em meus olhos e se recompõe, mas sei
que está afetada com a minha presença, então encaro seu rosto com
mais intensidade.
— Muito obrigado, Luana, será um prazer trabalhar aqui —
agradeço e controlo o timbre da minha voz para ficar mais grossa, por
poucos segundos seus olhos se abrem em surpresa, ela fica vermelha
novamente, mas logo volta ao controle.
Gosta da minha voz assim, coração?
— Então… ficarei mais um tempo, mas você pode ir — Luana me
dispensa e levanto-me para sair. Quando estou quase na porta do
consultório, ela fala: — Tenha uma boa noite, Yuri.
— Igualmente, Luana — respondo e fecho a porta atrás de mim,
recolho minhas coisas tranquilamente, sem perder a concentração, sei
que ela tem acesso às câmeras da recepção e deve estar vigiando
cada um dos meus movimentos.
Saio confiante do escritório, o elevador não demora a chegar, mas
vou até o hall de entrada, não vim de carro hoje porque ainda não
tenho acesso à garagem. Não voltarei para casa até que Luana saia,
vou até um fastfood que fica do outro lado da rua, o lugar é pequeno,
mas tenho visão da entrada e da saída do prédio, e fica aberto até
tarde da noite.
Peço um café e sento em uma mesa próxima à janela, abro meu
notebook para fingir estar fazendo algo e fico de olho no fluxo de
pessoas entrando e saindo, que a essa hora é escasso.
Vigio o lugar até que um carro chama minha atenção, o Cadillac
Escalade ESV cinza passa duas vezes pela rua, em baixa velocidade
até estacionar em uma vaga.
Já é noite, mas as luzes da rua iluminam a calçada e vejo Daniele
Corleone descer, acompanhada de dois homens que presumo serem
seus seguranças, ela fala alguma coisa com eles e entra no
restaurante italiano em que almoçamos.
Mesmo que as luzes do lugar estejam apagadas, indicando estar
fechado, a mulher abre a porta da frente tranquilamente, os
seguranças se dispersam, um entra no carro e dá partida e o outro vai
até o lado oposto da rua, em um bar com mesas na calçada.
Bem, isso é suspeito demais, olho para meu notebook e abro as
câmeras de segurança do escritório, também tenho acesso a elas, até
poucos minutos atrás Luana continuava em sua mesa, trabalhando no
computador.
Agora vejo ela caminhar até a recepção, olho a câmera que dá
visão do elevador e vejo as luzes que indicam seu funcionamento,
Luana está esperando alguém?
Não lembro de ter mais nada em sua agenda. Quando as portas do
elevador vão se abrir, as câmeras ficam pretas e perco a visão do
consultório, o que significa isso?
Tento atualizar o programa, mas nada funciona, todas as câmeras,
inclusive as que instalei clandestinamente dentro do consultório,
assim como as escutas, ficam fora do ar.
Checo o GPS do celular dela, indica que ela continua no mesmo
lugar, o carro também está na garagem, mas o que diabos isso
significa?
Meu primeiro pensamento é de que tenho que ir até lá, recolho
minhas coisas e vou até o prédio, mas sou barrado na entrada pelo
segurança noturno.
— Senhor Saito — Jared chama antes que eu consiga chegar aos
elevadores. — O senhor não foi liberado para entrar.
— Boa noite, Jared — falo com educação e abro meu sorriso mais
cativante, então invento uma história qualquer. — Acabei esquecendo
meu celular no escritório, sabe se Luana já saiu?
— A Dra. Masseria ainda não saiu, porém tenho ordens para não
deixar ninguém subir depois do expediente. — Ele para em minha
frente, indicando a saída.
— Será que você pode ligar para a clínica? Preciso muito mesmo
do meu celular, sabe como é, minha namorada vai me matar se eu
sumir uma noite inteira. — Tento usar sua empatia para fazê-lo mudar
de ideia, e por alguns segundos penso estar funcionando, quando
Jared me olha com pena.
— Sinto muito, se precisar pode usar meu celular para avisar sua
namorada, mas não posso deixá-lo subir — ele procura o aparelho no
bolso, mas o interrompo.
Merda, não vai funcionar e não tenho outra forma de chegar até a
clínica sem este elevador.
O que você está aprontando a essa hora, coração?
Sem sucesso, volto à minha vigia do fastfood, ao sair vejo os olhos
do segurança de Daniele em mim, estranho, ele deveria estar atento à
porta ao lado.
Daniele chegou no horário combinado, ela é pontual e odeia
atrasos. Estamos na metade da sessão e hoje falamos sobre os
novos desafios da vida de casada.
Ela e Lucas foram morar juntos em seu apartamento depois do
casamento, o lugar fica no último andar de um edifício de luxo, bem
de frente para o Central Park.
Faz seis meses que estão casados, a fase de lua de mel continua
ativa, mas aos poucos novos desafios surgem com a convivência.
— Lucas está muito protetor comigo, e isso me deixa louca, hoje
ele veio com um papo de aumentar minha segurança, não quero mais
homens me seguindo e posso muito bem me defender sozinha —
Daniele fala com calma, mas sinto um pouco de ressentimento em
sua voz.
— Ele pode estar preocupado com você.
— Sim, desde o atentado estamos mais atentos — ela explica e
meu coração aperta, foi neste atentado que meu pai salvou o Capo.
Por sorte Daniele não percebe minha reação e continua a falar: —
Mas Lucas está exagerando.
— E o que você sente com isso? — Esta é a pergunta que mais
faço a Daniele desde a nossa primeira consulta, ela abre um sorriso
sarcástico, como sempre faz ao ser confrontada com este
questionamento, mas pensa por alguns segundos antes de responder.
— Sinto raiva por ele não confiar em minhas habilidades, afinal foi
ele mesmo quem me treinou, sabe que sou melhor que qualquer
segurança por aí.
— Pense sobre os motivos para ele agir assim — instigo.
— Ele me ama e quer me manter a salvo — responde com um
brilho no olhar. — Eu também quero protegê-lo, por mim trancava meu
marido no apartamento e cercava o lugar com seguranças, mas temos
deveres a cumprir.
— O que o amor significa para você? — Já tivemos esta discussão,
e ela me encara com o olhar firme, sinto que começa a perder a
paciência.
— Sempre o mesmo questionamento, Luana, acabou o repertório?
— Responda à pergunta, Daniele.
Ela respira fundo e revira os olhos antes de voltar a falar.
— Para mim amor é querer a presença da outra pessoa e se sentir
bem ao seu lado.
— Como você se sente com Lucas?
— Protegida. — A resposta automática de sempre.
— O que essa sensação significa para você?
— Que ele faria qualquer coisa para me manter em segurança,
assim como eu faria o mesmo por ele. — Daniele respira fundo, seus
olhos azuis me encaram com intensidade e o brilho volta ao falar do
marido. — Só consigo relaxar com ele, quando estamos juntos me
sinto em casa.
— Então a proteção que Lucas te proporciona é algo que te faz se
sentir bem. — Volto aos sentimentos e a faço confrontá-los.
— É claro que me sinto bem, especialmente depois de alguns
orgasmos — ela brinca e me faz sorrir — Só queria que ele não
ficasse tão preocupado.
— Amar é assim, Daniele, da mesma forma que você quer protegêlo do mundo, ele sente o mesmo, e não significa que não confie em
você, mas quando se ama intensamente alguém, o medo de perdê-lo
é diretamente proporcional.
Ela para por um momento e pensa sobre minhas palavras, Daniele
é racional e analítica, usamos isso para que entenda seus
sentimentos e o das pessoas que a cercam.
Desde pequena sua maior batalha é interna, muito antes da
tragédia na mansão, Daniele já lutava contra si mesma.
— Como você está, Luana? — pergunta, encerrando a sua parte da
terapia.
— Estou triste — respondo sinceramente, não tem porque mentir
para ela, já que a mulher consegue ler a verdade na minha cara. —
Sinto falta deles, ainda é muito recente.
— Deveria tirar mais tempo do trabalho, viajar para algum lugar. A
casa de praia está vazia, mesmo no inverno é um ótimo lugar para
relaxar.
— Duas semanas já me deixaram quase louca, preciso trabalhar,
me sinto útil aqui, e ainda não estou com cabeça para viajar —
respondo e sorrio para ela.
Daniele pensa por um momento, parece ter algo para falar.
— Minha mãe gostaria de te convidar para um almoço, mas ela
está com medo da sua reação. — Ela me encara com o olhar intenso
antes de continuar. — Vou ser direta, Luana, minha mãe está
preocupada com você, mas não tem coragem de te ligar.
— Por que? Amélia ajudou muito depois que meu pai morreu e
minha mãe a adorava também.
— Ela acha que você culpa nossa família pela morte de Miguel,
afinal ele morreu no lugar do meu pai. — Direta e certeira como
sempre.
— Ninguém tem culpa nisso a não ser as pessoas que atiraram,
meu pai deu a vida pela Família por acreditar nela, era seu trabalho,
mas ele também gostava muito dos teus pais, não culpo o Capo pelo
que aconteceu, muito menos sua mãe, meu pai entrou nesta vida de
olhos abertos e morrer por ela foi sua escolha.
— Então considere este um convite irrecusável, domingo faremos
um almoço na mansão e sua presença já está confirmada — Daniele
avisa.
— Tudo bem, obrigada, Daniele — agradeço com sinceridade,
talvez seja bom sair de casa e conversar sobre assuntos diferentes.
Ela acena em concordância e levanta-se para ir embora, mas antes
de passar pela porta vira-se para mim com o olhar preocupado.
— Preciso das informações sobre seu novo secretário — exige,
pegando-me de surpresa.
— Hoje foi seu primeiro dia, ainda não sei se irei contratá-lo.
— De qualquer forma, envie as informações para Lucas, você tem
nosso contato seguro.
— Ele não é uma ameaça, Daniele, pesquisei seus antecedentes
e…
— Luana — ela me interrompe com o olhar feroz, fazendo-me
arrepiar. — Seu pai pode não estar mais aqui, mas você ainda faz
parte da família, e nós cuidamos dos nossos, então faça o que eu
falei, irá adiantar o trabalho de Lucas.
Concordo com a cabeça, esta é sua forma de demonstrar amor,
protegendo as pessoas com quem se importa.
— Nos vemos no domingo, então — falo e recebo um sorriso em
resposta antes dela sair da minha sala e fechar a porta logo depois.
Volto a me sentar e pensar sobre a sessão e o quanto minha
paciente evoluiu em todos os anos que trabalhamos juntas, nós não
debatemos suas atividades com a máfia por motivos de segurança,
mas a maior batalha de Daniele é na vida pessoal, principalmente
com sentimentos, os seus e os das pessoas à sua volta.
Ela consegue analisar o comportamento humano friamente, quase
como um experimento, mas entender o que leva a pessoa a ter tais
comportamentos é mais complicado.
Este é o foco da terapia, mas por ela estar inserida em uma vida
um tanto fora da lei, não existem muitos psicólogos que aceitariam o
desafio, mesmo porque isso vai contra o código de ética profissional.
Só que eu cresci neste meio, estas pessoas são minha família, a
máfia sempre me protegeu e fez parte da minha vida, quando Amélia
me procurou, não conseguiria dizer não, principalmente a ela. E uma
parte de mim se questiona o que seria de Daniele se não tivéssemos
interferido cedo, quando ainda estava se desenvolvendo.
Contudo isso é algo que tento não pensar sobre, a mulher que saiu
do meu consultório hoje é um exemplo de força e superação, mas
também é alguém a se temer, e precisa ser assim para viver a vida
que escolheu.
Fico cada vez mais atento à saída do prédio, não vejo mais o carro
de Daniele passar e seu segurança não está mais no bar. Não vi
ninguém sair do restaurante onde ela entrou.
Os Corleone podem ter negócios no estabelecimento ou na região,
e isso justificaria a presença da filha do Capo aqui, mas a coincidência
entre sua chegada e a falha nas câmeras de segurança do consultório
me fazem ficar desconfiado.
Quando tento novamente acessar as câmeras, tudo volta ao
normal, vejo Luana sentada em sua mesa, alguns papéis espalhados
e alguns livros abertos. É como se a última hora não tivesse
acontecido.
Preciso saber o que causou a interferência e porque até as minhas
escutas clandestinas foram afetadas, não foi como se Luana
desligasse o sistema de segurança, foi uma pane geral, talvez algum
equipamento projetado exatamente para bloquear qualquer sinal.
De qualquer forma, fico mais calmo ao ver Luana, ela parece
cansada enquanto ajeita os papéis, fecha os livros e guarda tudo
antes de desligar o computador, encerrando os trabalhos.
Espero que não vá ao bar hoje, preciso dormir, queria ir para a
academia, talvez consiga treinar uma hora na do prédio enquanto ela
janta, mesmo que o lugar seja pequeno e mal equipado, é melhor do
que nada.
Recolho minhas coisas e me preparo para sair quando meu celular
vibra, vejo a notificação de mensagem. Droga, não respondi Matt o dia
todo, estou sem paciência para isso e não tenho interesse sexual
nele, só queria acesso às câmeras do bar e isso já consegui, mas
preciso continuar com o teatrinho por um tempo, até que Luana nos
veja juntos e pense que sou homossexual.
“O movimento está fraco
hoje, quer vir tomar algo e me
fazer companhia?”
Antes de responder abro o aplicativo espião que me dá acesso ao
celular de Luana e vejo suas mensagens, Vivian perguntou se ela iria
sair hoje, mas Luana ainda não respondeu.
Do outro lado da rua o carro dela sai da garagem do prédio, me
escondo atrás de um caminhão até que ela passe. Droga, Luana,
poderia responder as suas mensagens, assim eu saberia para onde
está indo. Odeio ter que adivinhar seus próximos passos.
Sigo seu caminho pelo GPS do carro e fico feliz ao ver que ela vai
direto para casa.
Boa menina!
“Está com saudades, já?”
Respondo a mensagem de Matt, provocando-o para ganhar tempo
até ter certeza que Luana ficará em casa.
“Só entediado, o tempo
passou rápido enquanto
conversávamos na outra
noite.”
Sim, querido, passou rápido porque deixei que falasse a noite toda
sobre sua vida, o que gosta de fazer e quais são os teus hobbies, mas
foi um saco para mim, que precisei fingir interesse nas merdas que
saíam da sua boca.
“Foi legal mesmo, estou um pouco
cansado do trabalho, mas passo aí
daqui a pouco”
Respondo, deixando claro que farei um esforço para vê-lo, isso
deve me dar alguns pontos com o homem, pelo menos para enrolá-lo
por um tempo.
Se você fala que deixará de fazer algo, no meu caso descansar,
para ver a pessoa, ela fica com a percepção de que é uma prioridade
na sua vida, mesmo que não seja.
É tão simples!
Pego um táxi e vou para casa, no caminho acompanho a rota de
Luana até ela chegar no prédio, abro as câmeras de segurança da
garagem para confirmar que seu carro está lá.
Entretanto um vulto azul no canto da imagem chama minha
atenção, vejo o reflexo do que parece ser uma pessoa com um
casaco azul escuro e o capuz cobrindo o rosto refletido no vidro de um
carro, mas não tenho visão daquele ponto da garagem.
Merda, achei que não tinha ponto cego nas câmeras de segurança,
mudo para as outras câmeras, mas nenhuma delas aponta para
aquele lugar. De repente sinto um frio na barriga, vejo Luana descer
do seu carro, pegar a bolsa e ir em direção ao elevador.
Foco no lugar onde o vulto estava, mas não tem mais nada. O
elevador chega, ela entra e as portas se fecham, nada acontece,
ninguém intervém.
Continuo procurando nas outras câmeras, mas não parece ter mais
ninguém na garagem. Abro as imagens do corredor do nosso andar,
vejo Luana chegar e entrar em casa tranquilamente, como faz todos
os dias.
Só quando ela tranca a porta atrás de si e está segura dentro do
apartamento percebo que estou tenso, a mão livre fechada em um
punho apertado, sinto meus ombros relaxarem e parece até que meu
coração está acelerado.
Que merda é essa? Eu estou com medo?
Não pode ser, apreensão talvez, mas medo é impossível, salvo o
encontro com Daniele, nunca me senti ameaçado e nunca, em
momento algum em toda a minha vida, senti medo por alguém.
Isso significaria que me importo com outra pessoa além de mim
mesmo, o que é impossível.
Provavelmente foi apreensão por ter sido pego desprevenido, errei
ao não checar todos os extremos da garagem e confiei que a equipe
de segurança não havia deixado pontos cegos.
É isso, estou com raiva por não ter o controle da situação, e
ansioso para descobrir quem era a figura misteriosa que sabia sobre
esse erro de segurança e sumiu sem deixar pistas.
Parece que tenho um mistério em minhas mãos, e se isto se tornar
uma ameaça à psicóloga, terei uma nova presa, mas dessa vez a
caça é liberada.
Você pode tentar, mas não pode se esconder, o bom dos dias
atuais é que temos olhos e ouvidos em todos os lugares, é só uma
questão de tempo até que eu encontre alguma imagem sua.
Dentro do apartamento de Luana tudo está tranquilo, ela toma seu
vinho e esquenta um resto de comida do outro dia. Isso significa que
ficará em casa.
O táxi para em frente ao prédio, mas atravesso a rua e vou ao bar.
O movimento está bem fraco mesmo, é uma terça-feira e o bairro
residencial não tem uma vida noturna muito agitada.
Matt sorri ao me ver entrar, seus olhos brilham conforme me
aproximo, ao chegar próximo do balcão dou uma piscadinha para ele
e abro meu melhor sorriso. O resultado é o mesmo de sempre, um
rubor vermelho se espalha pelo seu rosto e ele desvia o olhar,
claramente tentando controlar as reações do seu corpo.
— Boa noite, gato — cumprimento com a minha voz mais grossa e
provocante, sentando-me em um banco alto no balcão, abro o casaco
e flexiono os músculos, atraindo sua atenção para meu peito.
— Você veio — ele responde e volta a me olhar. — Está realmente
com uma cara de cansado, desculpa te chamar em um dia de
semana.
Vejo arrependimento real em seu rosto, mas agora já não adianta, e
no fim eu precisava vê-lo para que mantenha o interesse, ainda tenho
planos para Matt.
— Não vou ficar muito — aviso, mas sorrio inclinando a cabeça
para o lado. — Você fica bem de preto — elogio enquanto olho seu
corpo com interesse forçado, ele é bonito, não tanto quanto eu, mas
está em forma.
Ele fica ainda mais vermelho agora, passa uma mão pelo cabelo
em sinal de nervosismo, mas deve estar acostumado a receber
cantadas, porque logo se recompõe.
— Obrigado, você fica ainda melhor de terno, não que suas outras
roupas não sejam bonitas, mas… — Matt se enrola ao tentar me
elogiar e fico confuso, ele não é nenhum garoto, tem vinte e dois anos
e trabalha em um bar, mas está falando como se nunca tivesse dado
em cima de alguém.
— Obrigado — agradeço e pego sua mão em cima do balcão, o
contato o faz parar de falar e me olhar, — Poderia me trazer uma
cerveja?
Isso o faz acordar e ele vai até a geladeira, voltando com a bebida
e um pouco mais calmo.
Matt está sozinho no bar hoje e não tem muito trabalho, então sua
atenção fica em mim por mais tempo do que eu gostaria. Ele fala
demais, não consegue ficar quieto por muito tempo e isso costuma me
irritar, ainda mais quando começa a fazer perguntas pessoais.
— Estou realmente cansado, querido, podemos marcar algo no
final de semana? — falo depois que ele volta da mesa de um cliente,
se não sair daqui agora vou perder a cabeça.
— Claro, obrigado por vir aqui hoje — Matt agradece e se inclina
em minha direção, mas desvio e levanto, fingindo não ter percebido o
gesto.
— Imagina, foi bom te ver — minto e forço um sorriso. — Nos
falamos.
Saio do bar e vou direto para casa, uso minha última energia social
para cumprimentar o porteiro de forma educada antes de subir para
meu apartamento, odeio isso, mas posso precisar de algum favor dele
no futuro.
Mesmo estando cansado, não consigo pegar no sono, Luana já foi
dormir há tempos, graças ao vinho, mas não consigo desligar minha
mente do vulto na garagem.
Quem estava lá? E porque sumiu depois que Luana chegou? Se
fosse alguém querendo fazer mal a ela teria usado aquele momento
para atacar, afinal ela estava sozinha e indefesa, não tinha mais
ninguém no lugar, era o momento perfeito.
Sim, Yuri, você a deixou vulnerável.
A semana passou voando, Yuri se mostrou um bom funcionário,
sempre atento ao que Vivian ensina, ele anota tudo, é inteligente e
consegue antecipar as necessidades da clínica, e as minhas.
Fora que está sempre bem vestido, os ternos abraçam seus
músculos e me fazem lembrar das fotos em seu Instagram, maldito
Samurai Sarado.
Minha amiga o instruiu a me trazer lanches, água e café durante o
dia, ela sabe que se não me obrigar a fazer esta pausa, passo o dia
sem parar para me alimentar, não me orgulho de precisar destes
cuidados, mas é a vida.
O horário de almoço ainda é estranho, minha secretária fala pelos
cotovelos e tenta introduzi-lo na conversa, o que é bom porque
geralmente demoro a confiar nas pessoas e me abrir com elas.
Yuri é charmoso, educado, inteligente, e consegue conversar
sobre qualquer assunto sem olhar para os meus peitos. O que para
um homem é sempre uma coisa difícil. Vivian também reparou e
acha que ele é gay.
Mas não o vejo olhar com desejo para as pessoas, sejam elas
homens ou mulheres. E ele é um gostoso, toda vez que vamos
almoçar, recebe encaradas nada discretas ao entrar no restaurante,
ainda mais porque sabe se vestir com elegância e seu cabelo
sempre está bem arrumado.
Yuri tem um ar de celebridade, sua confiança e carisma atraem
qualquer pessoa que olhe para ele.
Além disso, seu perfume é uma delícia, ainda mais logo de manhã
quando chego e o odor amadeirado entra pelo meu nariz, tenho
vontade de cheirar seu pescoço bem de pertinho.
A atendente de vinte e poucos anos com o cabelo rosa e toda
sorridente já entregou seu telefone em um guardanapo para ele duas
vezes, mas Yuri fingiu que não recebeu e deixou em cima da mesa.
O homem é um mistério que está consumindo meu tempo livre,
tenho que admitir. Suas fotos nas redes sociais seguem gravadas
em minha mente, especialmente à noite quando não tenho nada
para fazer, preciso encontrar um hobby ou voltar para a academia.
Maldita hora em que fui fuçar sua vida online, aquele peitoral
malhado e o tanquinho definido foram combustível para alguns
sonhos muito quentes.
Ele será seu secretário, Luana, esquece isso!
Deixo o pensamento em Yuri de lado e volto a focar no caminho à
minha frente, é domingo, e como prometido, estou indo para a
mansão Corleone. O frio diminuiu um pouco, já estamos em março,
hoje não tem previsão de neve, porém o vento é cortante e o sol não
deu as caras.
Vejo o céu nublado, talvez chova no fim da tarde, só espero
conseguir voltar para casa tranquilamente, odeio dirigir com tempo
feio.
Já participei de diversos eventos na mansão Corleone, a festa de
fim de ano é a mais famosa e exclusiva da cidade de New York e sou
convidada sempre, mas os que eu mais gostei foram os encontros
casuais.
Amélia Corleone é uma especialista em organizar eventos e
reuniões, e desde que o casamento de Daniele e Lucas uniu ainda
mais os Corleone e os Costello, a mulher vem planejando cada vez
mais momentos em família.
Quando meu pai estava vivo, minha mãe e eu éramos convidadas
e tratadas como parte da família, a mansão é um local seguro, por
isso podíamos vir sem correr riscos.
Desde que eles morreram não estive mais aqui, e agora sei
porque evitei o lugar por um tempo. Os portões grandes de ferro da
entrada da mansão são intimidantes, mas ao passar por eles a
tristeza abre um buraco em meu peito e meus olhos se enchem de
lágrimas.
Tudo aqui lembra meu pai, ele costumava nos receber com um
sorriso quando abria os portões e entrava no carro com a gente,
minha mãe ficava mais tranquila e feliz com ele ao lado, e eu
adorava a sensação de proteção que só sentia em sua presença.
Miguel foi o tipo de pai coruja e orgulhoso, me fez passar muita
vergonha quando adolescente quando contava para todos os
concursos que ganhei na escola, todas as competições de redação
em que fiquei entre os melhores, ele assistiu cada apresentação de
balé, foi em todas as minhas formaturas, mesmo que escondido e
distante, chorou junto com a minha mãe com orgulho, esta era sua
forma de amar. E agora tudo o que eu mais queria neste mundo era
ter minha mãe e ele aqui.
O coração aperta ainda mais quando vejo Amélia, Alphonse e
Daniele me esperando em frente à mansão. Eles são uma família
linda e unida, como a minha era.
Mal tenho tempo para parar o carro e Amélia abre minha porta,
me puxando para um abraço apertado, um barulho alto me assusta,
até que percebo que são bombinhas de confete, os papéis coloridos
caem ao nosso redor.
— FELIZ ANIVERSÁRIO, LUANA — os três falam juntos e
sorriem para mim.
Aniversário? Merda, esqueci que é hoje. Minha cabeça está tão
ocupada com outras coisas que não lembrei do meu próprio
aniversário.
Alphonse me puxa para um abraço de urso, ele é muito alto, forte
e musculoso, poderia me quebrar em duas com facilidade, mas seu
aperto é protetor e carinhoso.
— Muitos anos de vida, querida — Alphonse fala antes de me
soltar e sorrio para ele. — Seu pai me fez prometer que
comemoraríamos este dia todos os anos. — Vejo as lágrimas se
formarem em seus olhos azuis, o Capo é forte e poderoso, mas é
uma manteiga derretida.
— Não era para contar — Amélia o repreende com um tapinha no
braço. — Agora não vamos mais conseguir fazer surpresa.
— Luana odeia surpresas, mãe — Daniele adverte, mas pisca
para mim.
— Obrigada, Alphonse — agradeço, já sentindo minhas próprias
lágrimas escorrerem, meu pai não deixou de comemorar nenhum
dos meus aniversários, mesmo quando eu escolhi o tema de
princesas, ele se vestiu de Cinderela e obrigou todos os homens
presentes a usarem asas de fada e chapéu com glitter.
Mesmo depois de partir, garantiu que isso continuaria.
A próxima que vem até mim é Daniele, seu abraço é mais rápido e
contido, mas ela tem um sorriso travesso nos lábios.
— Sua danada, por que não me avisou? — digo quando ela pega
meu braço para segui-la para dentro.
— É uma festa surpresa, Luana, todo o conceito de ser uma
surpresa é a aniversariante não saber com antecedência — Daniele
responde tranquilamente enquanto seus pais riem atrás de nós. —
Vamos, os convidados estão à sua espera.
— Convidados? — questiono assustada, mas entendo no
momento que entramos em uma área de festas interna, com piscina
aquecida e um deck com jardim de inverno, onde mais de dez
pessoas nos esperam.
Lucas está na churrasqueira com Roberto, seu segurança
pessoal, e Alberto, segurança de Daniele, os três vestem um avental
vermelho e levantam o copo para mim com um sorriso no rosto.
Sara Vitturi é a primeira a vir me cumprimentar, ela é irmã do
Lucas e casada com o Underboss do Brooklyn, uma perfeita esposa
da máfia, como Daniele adora falar.
— Feliz aniversário, querida, te desejo muitos anos de vida,
cheios de saúde e felicidade. — Seu rosto se ilumina, ela é uma
mulher linda e feliz com sua vida.
Seu marido vem logo atrás, com um abraço rápido e felicitações,
volta para o lado da mulher, passando um braço pela cintura dela,
como quem marca uma posse. Quero revirar os olhos para isso, mas
me controlo.
Daniele, por outro lado, faz cara de nojo atrás do casal, ela
percebe a dominância de Marcos com Sara e odeia. Agradeço aos
dois e logo sou puxada para os braços de Rita Costello, que já está
chorando enquanto fala sobre minha mãe.
Demora um bom tempo, mas todos vêm me cumprimentar,
percebo que os Corleone reuniram em uma sala os amigos que
tinham meu pai como parte da família, e por isso sempre me
trataram com carinho e proteção.
O fato destas pessoas fazerem parte da máfia que domina a
cidade de New York é só um detalhe, nunca me senti mal por estar
na presença deles, a maioria dos homens aqui, e Daniele, cometem
crimes, têm sangue em suas mãos e são temidos e respeitados por
toda a cidade.
Contudo, para mim, são só os amigos do meu pai, os mesmos
que participaram de tantas festinhas de aniversário na minha casa,
que levaram os melhores presentes — ainda tenho a mansão da
Barbie que Roan Romagnoli me deu em meu aniversário de catorze
anos, eu já era uma mocinha, mas adorava colecionar bonecas.
Essas pessoas fizeram parte da minha vida e agora estão aqui, e
não posso deixar de sentir a presença dos meus pais neste
momento, mesmo que não estejam neste mundo de corpo, eles não
me deixaram sozinha.
— Venha, temos um presente especial para você. — Amélia me
conduz pelo braço até uma mesa, onde vejo várias caixas
embaladas com papel de presente, como se esta fosse uma festinha
de criança.
— Não precisava de tudo isso, estou sem palavras. — Minha voz
sai tremida devido à emoção. — Muito obrigada.
— Você faz parte da família, Luana — Alphonse diz ao lado da
mulher e me entrega uma taça de vinho branco, meu preferido. —
Pode beber, um dos nossos homens a levará para casa depois.
Agradeço e tomo um gole da bebida, tentando conter o turbilhão
de emoções que estou sentindo.
Amélia me entrega uma caixinha de veludo roxa com um laço
amarelo em cima.
— Não precisava de presente — começo a falar, mas então vejo o
cartão com uma caligrafia familiar.
— Não é nosso — é Alphonse quem explica e meu coração
acelera, é a letra do meu pai no bilhete. — Seu pai me fez prometer
que cuidaria de você caso algo acontecesse, infelizmente este dia
chegou.
— Ele e sua mãe te amavam mais que tudo no mundo, Luana. —
Amélia passa o braço pelos meus ombros enquanto fala. — Maria
planejou muita coisa antes de nos deixar, ela queria garantir que
você não ficasse sozinha e que continuasse vivendo sua vida, este
presente foi uma escolha da sua mãe e um pedido do seu pai, que
nos fez prometer não te deixar esquecer do seu aniversário.
Não consigo falar nada, minha garganta aperta e a voz não sai,
são muitos sentimentos, a dor em meu peito pela falta deles é forte,
mas estou feliz por estar aqui, rodeada de pessoas que se importam
comigo e que amavam minha família.
Abro o bilhete e leio a caligrafia delicada do meu pai:
“Para minha filha, o orgulho da minha vida e meu bem mais
precioso: não se isole, meu amor, você não está sozinha.
Te amo mais que tudo.
Seu pai.”
Logo abaixo, em outra letra mais redonda e um pouco tremida,
estão as palavras da minha mãe:
“Feliz aniversário, meu amor, sei que deve estar sofrendo agora e
se sentindo sozinha com a nossa partida, mas estaremos sempre
com você.
Te amo ao infinito, mamãe.”
Não consigo mais controlar o choro, Amélia me conforta em um
abraço enquanto as lágrimas se intensificam e estou soluçando em
seus braços.
Por mais triste que eu esteja, sinto o peso em meus ombros ficar
mais leve conforme deixo as emoções saírem, é como se estivesse
guardando tudo isso dentro de mim, acumulando em uma represa
toda a dor, e finalmente as comportas se abriram e a pressão na
barragem diminuiu.
Estou triste e feliz ao mesmo tempo, a partida deles ainda dói,
mas sinto sua presença nas pessoas que me olham com carinho,
que me abraçam, confortam e demonstram que também sentem a
falta deles, que meus pais foram importantes em suas vidas.
Quando as lágrimas diminuem e consigo me acalmar, vejo que
não fui só eu a me emocionar, fora Daniele que me encara com seu
olhar analítico, todos estão com os olhos vermelhos.
— Posso? — Alphonse chama minha atenção para o presente,
percebo que não reparei no que estava dentro da caixa, só no
bilhete, então vejo uma pulseira linda de ouro branco com um
pingente de borboleta azul pendurado, minha mãe e eu sempre
amamos borboletas.
Estendo meu braço direito, o Capo pega a joia com delicadeza e
coloca no meu pulso. É lindo e a cara da minha mãe, a visão da
borboleta me faz lembrar do seu sorriso.
Apesar de ter sido pega de surpresa, o que eu geralmente não
gosto, fiquei feliz com a festa. Depois das emoções iniciais, a
comemoração ficou mais animada conforme o álcool e a comida
circulavam.
Não é sempre que me permito beber assim, só em festas ou em
viagens, mas me senti segura naquele momento, o que é um pouco
contraditório, sabendo que algumas das pessoas mais perigosas da
cidade estavam lá.
Amélia quase implorou para que eu ficasse com eles, mas recusei,
visto que precisava trabalhar cedo no outro dia e o caminho entre a
mansão, que fica em State Island, até meu consultório em Manhatan é
longo, e na segunda-feira o trânsito é um caos.
Dois dos guarda-costas da Família me trouxeram para casa e
garantiram que eu chegasse até meu apartamento em segurança,
lembro vagamente desta parte, mas acredito que precisei me apoiar
em um deles para conseguir sair do carro e me manter de pé.
A dor de cabeça neste momento quase me faz sentir
arrependimento pela quantidade de vinho que bebi, mas na minha
idade já estou acostumada com a ressaca e posso funcionar muito
bem enquanto meu cérebro lateja dentro do crânio.
Entro no consultório e sou recebida por uma Vivian alegre demais,
que me puxa para um abraço apertado.
— Feliz aniversário, amiga, sei que era ontem, mas tentei te ligar e
seu telefone estava fora de área. — Sua voz fina e alta faz minha
cabeça latejar ainda mais e fecho meus olhos com a dor, então ela me
solta e lança um olhar avaliativo. — Agora posso ver o porquê, saiu
comemorar não foi?
— Fui surpreendida por uma festinha surpresa e esqueci o celular
no carro — desculpo-me com um meio sorriso forçado, mas é mentira,
qualquer aparelho telefônico é proibido dentro da mansão Corleone
por motivos de segurança.
— Fico feliz que tenha comemorado, como foi? — Ela me solta e
vai até a cozinha.
— Minhas amigas da faculdade fizeram uma surpresa para mim. —
Uso a mesma desculpa de sempre, Vivian não sabe sobre meu
envolvimento com a família Corleone, é pela sua segurança e pela
minha também, portanto, sempre que vou me encontrar com eles, falo
que são colegas da faculdade com quem ainda tenho contato.
— Que bom, e o que vocês fizeram?
— Acho que tinha churrasco, mas só tenho certeza do vinho. —
Faço uma careta e ela solta uma gargalhada. — Vivian, querida, eu
amo que você seja animada assim logo de manhã, mas se não baixar
a voz vou ser obrigada a te mandar embora antes do previsto.
— Ai, desculpa, está com dor de cabeça? — Ela me estende uma
garrafa de água enquanto avalia meu rosto com cuidado.
— Você nem imagina — respondo com um meio sorriso, é o
máximo que consigo. — Pode me trazer um comprimido e café?
— Claro, vou pedir para Yuri trazer algo da rua para você comer,
sua primeira consulta é só à tarde, então tem tempo para se
recuperar.
Só quando ela menciona seu nome que percebo que ele não está
na recepção, olho em volta e nem sinal do homem.
— Falando nisso, onde ele está? — questiono e Vivian me lança
seu olhar de quem fez algo errado — Vivian…
— Mandei ele resolver algumas papeladas no cartório, é começo
de mês, aquilo vai estar lotado, então aproveitei que estamos em dois
e o mandei lá — ela explica, minha amiga odeia pegar fila, é uma das
poucas coisas que conseguem tirá-la do sério.
— Ele vai ficar lá a manhã toda — comento enquanto vou até a
minha sala, coloco a mão no scanner de leitura de digital, só então
digito a senha da semana e a porta destranca.
— Assim podemos conversar um pouco sozinhas. — Vivian entra
logo atrás de mim e senta-se na cadeira em frente à minha mesa.
— Você não teria que estar em outro lugar, não? Quem sabe
trabalhando? — digo em tom de brincadeira, mas sorrio para ela,
realmente não tivemos tempo sozinhas na última semana, já que Yuri
estava aqui em período integral.
— Não tenho nada para fazer além de atender o telefone — Vivian
responde e dá de ombros.
— Pouco trabalho, querida? Como sua chefe posso resolver isso.
— Não é isso, mas passei tudo para Yuri resolver, ele realmente é
muito competente e já está bem situado nas funções do consultório.
— Ela respira fundo e finge uma voz triste. — Você nem vai sentir
minha falta quando eu sair.
— Para com isso, amiga, por mais competente que ele seja, você é
única — sorrio para ela enquanto falo. — E tenho certeza que não vou
conseguir me livrar de você assim tão facilmente.
— É obvio que não, vou te mandar mensagem todos os dias, e
espero sua visita em Chicago o quanto antes — Vivian responde
rapidamente. — E podemos planejar férias juntas, quem sabe um mês
em uma praia do Brasil, cheia de homens gostosos e caipirinha?
Agora que vou ganhar bem mais, posso te acompanhar nas suas
viagens.
— Você está dizendo que eu te pago pouco, é? — brinco, mas
minha cabeça lateja.
— Claro que não, o salário aqui é muito mais alto que em qualquer
outra clínica particular e você sabe disso — Vivian responde com a
voz mais baixa ao perceber minha dor. — Sabe também o quanto sou
grata por isso, você é a melhor chefe que alguém poderia ter.
Posso ouvir sua voz ficar mais grossa e vejo as lágrimas se
acumulando em seus olhos, então volto ao assunto de antes, se
começarmos a chorar, a gente não para mais.
— Um homem gostoso me fazendo uma massagem seria
maravilhoso agora, vamos programar essa viagem para suas
primeiras férias? — comento entrando no assunto, realmente não
tenho muito para fazer de manhã no consultório. — Um brasileiro
bronzeado, uma cerveja bem gelada e sexo selvagem, é tudo o que
preciso.
— Sua safada, está na seca, é?
— Não, mas estou cansada dos homens daqui, é sempre a mesma
coisa — reclamo e lembro do último que levei para casa — será que
os brasileiros têm pau grande?
Vivian não se aguenta e solta uma gargalhada alta, o som martela
na minha cabeça, mas rio junto com ela.
— Desculpa, amiga. — Ela percebe minha careta de dor e vai
pegar o comprimido e o café. — Toma isso aqui.
— Obrigada — agradeço e tomo o remédio.
— Mas respondendo sua pergunta, tamanho não significa nada.
— Você já pegou alguém de pau pequeno?
— Sim, meu ex-embuste não era bem dotado — Vivian comenta e
faz um sinal com os dedos, indicando o tamanho do membro do
homem.
— Por isso é seu ex, se bem me lembro você vivia reclamando que
o sexo não era bom — relembro os tempos em que o embuste ainda
fazia parte da sua vida.
— Realmente, mas o problema não era o tamanho, e sim a pessoa
que vinha com aquilo — Vivian responde e revira os olhos. — Mas ele
fazia um oral muito bom.
— Uma vez por mês não adianta, amiga — retruco e ela sorri. —
Se não é para transar no mínimo três vezes por semana, para que
estar num relacionamento?
— Falou a pessoa super experiente no assunto — Vivian provoca.
— Posso te falar com certeza que a maioria das reclamações que
escuto neste consultório, especialmente de pessoas casadas ou
comprometidas, poderia se resolver com um pouco mais de sexo.
E isso é algo que posso falar com propriedade, as maiores
reclamações dos meus pacientes são sobre isso, ou suas vidas muito
agitadas resultam em problemas no relacionamento, diminuição da
libido, falta de interesse.
— Realmente, um orgasmo por dia é melhor que uma maçã — ela
comenta e não entendo sobre o que está falando. — Sabe o ditado?
Uma maçã por dia mantém o médico longe?
Não me aguento e quase cuspo a água que tinha na boca.
Por este motivo que não pretendo me envolver com alguém no
momento, primeiro porque não estou emocionalmente preparada, e
segundo que será preciso alguém muito interessante para me atrair
neste nível.
Meus relacionamentos passados só aconteceram porque eu era
nova e ingênua, acreditava em um amor fácil, sonhava com o conto
de fadas prometido pela Disney.
Quando mais tempo vivido nesta terra, mais experiências boas e
ruins acumuladas, menos acredito que exista uma pessoa para mim.
Vivian e eu passamos a manhã toda sozinhas, inclusive no almoço,
Yuri avisou que não voltaria até o começo da tarde, pois o cartório
estava cheio.
— Então, fala a verdade, qual é a sua avaliação do nosso novo
secretário? — Vivian questiona enquanto devora a lasanha à
bolonhesa em sua frente.
— Ele é competente, carismático, faz um bom trabalho e não
parece interessado nos meus peitos — respondo com sinceridade —
Mas ainda preferia contratar uma mulher.
— Eu sei, mas as duas outras candidatas eram completamente
inaptas para o serviço. — Ela começa a rir lembrando-se das outras
mulheres que entrevistamos. — A primeira não sabia nem como
funciona nosso sistema de agenda compartilhada, fora que ela não
tinha noção nenhuma de contabilidade, você teria que entregar tudo
ao escritório do Centro.
— Nós já tentamos isso e não dá certo, a clínica é pequena demais
e eles não nos dão atenção suficiente, lembra do caos que foram
aqueles seis meses?
— Não precisa nem falar. — Vivian arregala os olhos e suspira. —
E a segunda candidata parecia estar drogada, você lembra o tempo
que ela levava para responder uma simples pergunta?
— Você não viu as pupilas dilatadas e o olho avermelhado? —
Solto uma gargalhada com a cara de espanto de Vivian. — Ela fumou
um logo antes da entrevista, tenho certeza.
Minha amiga quase cospe a comida da boca, realmente não
tivemos sorte com as outras candidatas, e a empresa não tinha mais
ninguém que pudesse começar com tão pouco tempo de aviso.
No fim Yuri acabou sendo nossa melhor, e única, opção. Por sorte
ele está dando conta do trabalho, só espero que quando Vivian não
estiver mais aqui, consiga continuar assim e não me deixe na mão
depois do primeiro mês.
— Ele é competente e tudo, mas você tem que concordar, aquele
olhar é de fazer qualquer calcinha cair. — Vivian tenta imitar os olhos
puxados de Yuri e me faz sorrir ainda mais. — E combinado com o
sorriso perfeitamente branco, o homem é um deus grego, ou melhor
um Samurai Sarado.
— Provavelmente é gay, mas sim, é uma delícia de se olhar —
respondo.
— Não sei, quem sabe ele é assexual?
— Seria um desperdício, aquela delícia toda sem ninguém
aproveitar.
— Sua safada.
— Foi você que começou.
Vivian passa o restante do almoço falando sobre sua mudança para
Chicago, apesar de estar triste pela sua partida, fico feliz que ela
conseguiu um emprego que pagará ainda mais do que recebia
comigo, e ainda estará ao lado da família.
A tarde passou voando com os atendimentos, minha dor de cabeça
diminuiu, mas não cessou completamente, então resolvo encerrar o
expediente junto com Vivian e Yuri. Sou a droga da dona dessa
clínica, deveria sair antes de todo mundo.
E estou cansada. Além da ressaca, dormi pouco durante à noite e
não descansei no final de semana. Preciso voltar para a academia,
estou enrolando desde que descobrimos a doença da minha mãe,
então tudo foi piorando e não fiz mais nada de exercício físico.
Meu corpo está cobrando o preço da rotina desajustada, devo ter
ganho alguns quilos, ando muito indisposta e com pouca energia, fora
a maldita dor nas costas. Quando fazia musculação, não tinha estes
problemas.
Você precisa cuidar de si mesma, Luana, não tem mais ninguém
para fazer isso por você.
Marco na minha agenda para amanhã, sem falta, caminhar no
parque antes de vir trabalhar.
Chego em casa, mas quando vou tirar os sapatos o interfone toca.
— Senhora Masseria, desculpe incomodá-la a esta hora, mas
ontem chegou uma encomenda para a senhora. — Reconheço a voz
do recepcionista do prédio.
— Boa noite, Leandro, não estou esperando nenhuma encomenda,
e ontem era domingo — falo com surpresa. — Tem certeza que é para
mim?
— Sim, chegou por UBER e tem indicação para entregar para a
senhora, tentei fazer isso ontem… — ele fala calmamente, mas
percebo que sua voz fica evasiva. — Mas quando a senhora chegou,
bem, não consegui entregar.
Realmente meu estado não era dos melhores, ainda mais escorada
em dois homens.
— Desculpa por isso, logo mais vou descer para comprar o jantar e
passo para retirar, obrigada, Leandro — agradeço antes de desligar o
interfone.
Faço o pedido de um hambúrguer e salada para retirar no bar em
frente ao prédio, vai demorar alguns minutos ainda, então aproveito
para me trocar.
Tomo um banho rápido e coloco uma roupa mais confortável, o
conjunto de moletom cinza é aconchegante e quentinho, jogo o
sobretudo preto e coloco minhas botas pretas. A noite é gelada nesta
época do ano, e só vou até o outro lado da rua mesmo.
Luana sumiu no domingo e voltou amparada por dois homens, o
GPS do carro e do celular indicavam que ela estava em State Island,
pelo que consegui pesquisar sua localização batia com a da mansão
dos Corleone.
Entretanto, no momento que seu carro chegou lá, perdi o sinal do
GPS e o celular ficou fora de área. Quase fui até a ilha para me
certificar que estava tudo bem, porém a mansão é bem afastada e
não conseguiria passar despercebido, então fiquei o dia todo
atualizando sua localização e esperando qualquer sinal seu.
Aproveitei este tempo para sair com Matt, fomos a um jogo de
baseball qualquer, não me importo com esportes, mas estava ficando
difícil de me esquivar das suas investidas enquanto estávamos
sozinhos.
No final fingi que o cachorro quente não me fez bem e encerrei o
encontro antes que ele criasse expectativas. Até agora só trocamos
alguns beijos e ele me pagou um boquete no carro, não foi o pior que
já tive, mas não pretendo fazer mais do que isso.
Ele é só uma ferramenta e preciso que Luana nos veja juntos logo,
assim posso acabar com esse teatro todo e focar na minha psicóloga.
Falando nela, sigo seus passos pelo GPS até o bar do outro lado
da rua, abro as câmeras do lugar para vê-la entrar, Matt entrega seu
pedido, trocam algumas palavras e ela sai logo em seguida.
Abro a câmera do hall de entrada do prédio e Leandro entrega o
presente que enviei a ela no domingo. Luana volta para seu
apartamento e parece muito curiosa quanto ao pacote. Sorrio ao
assistir sua movimentação.
Espero que goste, coração.
Ela deixa o lanche em cima da mesa e abre o presente, quero
gargalhar quando encontra o vibrador modelo bunny na cor preta, a
expressão de choque em seu rosto é impagável. Luana procura nos
papéis e encontra o bilhete impresso que enviei junto.
“Espero que isso te ajude a dormir melhor.”
Vira o papel várias vezes, na esperança de encontrar mais alguma
coisa escrita, mas não tem nada. Posso escutar daqui as
engrenagens trabalhando em sua cabeça, gostaria muito de saber
quem ela pensa que enviou.
Durante o restante da noite observo seus movimentos pelo
apartamento, ela comeu o lanche e agora está deitada na cama,
tentando assistir a um seriado qualquer na TV.
Contudo seu olhar não sai da caixa ainda fechada com o meu
presente, até que ela cansa de lutar contra si mesma e retira o
vibrador da embalagem, examinando o brinquedinho novo. Vejo um
sorriso presunçoso em seu rosto.
Luana lava o vibrador no banheiro, coloca uma música no lugar do
seriado, desliga as luzes e deixa somente o abajur ao lado da cama
ligado.
Isso aí, coração, use e abuse do seu presentinho.
Como se ela estivesse me ouvindo, Luana tira a calça e o casaco
de moletom, ficando somente de calcinha e sutiã pretos, seus peitos
deliciosos apertados contra o tecido, as curvas do seu corpo ainda
mais atraentes com a pouca iluminação.
Ajeito-me no sofá para apreciar o que vem pela frente.
Já vi seu corpo nu diversas vezes, por isso fico surpreso ao sentir
meu pau duro contra a calça quando ela deita na cama e começa a se
tocar por cima da calcinha, ainda sem usar o vibrador, somente com
os dedos.
A música “Daddy Issues” do The Neighbourbood dita o ritmo dos
seus dedos, que acariciam sua boceta coberta pelo tecido fino, a outra
mão passa pela lateral do seu corpo, logo ela tira o sutiã e começa a
massagear o mamilo direito.
“Você me pergunta sobre o que estou pensando
Eu te digo que estou pensando sobre
O que quer que seja que você está pensando
Diga-me algo que eu vou esquecer
E você talvez tenha que me contar de novo
É loucura o que você faz por um amigo”
Seus olhos se fecham e sua boca se abre conforme os movimentos
das mãos vão ficando mais rápidos, ela abre mais as pernas e tenho a
visão privilegiada da sua boceta molhada, a maldita sabe se dar
prazer e tem experiência com o próprio corpo.
Não me aguento e abro o zíper da calça, a visão da psicóloga se
tocando é demais, estou pegando fogo, começo a acariciar a cabeça
sensível do meu pau na mesma intensidade com que ela passa os
dedos pela sua calcinha.
Consigo ouvir o primeiro gemido que sai dos seus lábios, doce e
contido, seu corpo se contorce de prazer, a mão na boceta abaixa a
calcinha, tirando-a do caminho, então ela pega o vibrador.
Luana liga na primeira velocidade, sente a intensidade em suas
mãos, com um sorriso safado lambe a ponta e passa o brinquedo pelo
mamilo, vai descendo de vagar pela barriga até chegar ao meio das
suas pernas.
“Vá em frente e chore, garotinha
Ninguém faz isso como você
Eu sei o quanto isso importa para você
Eu sei que você tem problemas com seu pai
E se você fosse minha garotinha
Eu faria tudo o que pudesse
Eu fugiria e me esconderia com você
Eu amo que você tenha problemas com seu pai
E eu também tenho”
É como se a música estivesse em sincronia com seu prazer, as
palavras no autofalante fazem Luana mover o vibrador diretamente
para seu clitóris e vejo seu corpo arquear de prazer.
Aperto meu pau com mais firmeza e aumento a velocidade dos
movimentos, não consigo desviar o olhar da tela do computador,
posso sentir minha respiração acelerar enquanto minhas mãos sobem
e descem na mesma velocidade que o vibrador entra e sai da sua
boceta.
É como se eu estivesse lá, entrando e saindo dela, sentindo suas
paredes apertarem meu pau, cuspo na mão e volto a passar por ele,
como se fosse a boceta dela pingando em mim.
Ela geme cada vez mais e começa a soltar palavrões.
A mão que estava no peito agarra o lençol e seus olhos estão
fechados com tanta força, que tenho certeza que ela está perto do
orgasmo, seus movimentos se intensificam e as costas arqueiam na
cama.
“Eu tentei escrever o seu nome na chuva
Mas a chuva nunca veio
Então, eu fiz isso com o Sol
A sombra sempre vem nos piores momentos”
Estou quase lá, e como se ela pudesse sentir isso, Luana chama
meu nome enquanto explode em prazer, sua voz é como um fodido
comando, gozo forte na minha mão, como a merda de um
adolescente assistindo pornô no computador.
Minha respiração acelerada combina com a dela, e é como se
tivéssemos acabado de transar.
Só agora percebo que ela gozou invocando meu nome, a maldita
estava pensando em mim enquanto se masturbava, foi vendo este
rostinho, e provavelmente meu corpo sarado, que Luana se entregou
ao prazer.
Isso foi inesperado, coração.
Inclusive para mim. Espero minha respiração voltar ao normal e vou
tomar um banho. Por sorte ela não pareceu perceber o que falou
durante seu orgasmo, porque logo depois Luana desligou tudo, virou e
dormiu.
Já eu não consigo tirar a imagem dela da minha mente, gritando
meu nome, chamando por mim enquanto se tocava. Merda, agora
quem vai perder o sono sou eu.
***
Finalmente é o último dia de Vivian no escritório, não sei como
aguentei duas semanas com ela, só por isso fiquei com um enfeite de
chave rosa dela, como souvenir.
Gosto de guardar uma lembrança simples de cada pessoa que faz
parte de um propósito em minha vida, digamos que são meus
pequenos troféus.
Quem acorda cinco horas da manhã para fazer exercícios e chega
ao trabalho cantando não é uma pessoa de confiança, e isso vindo de
um psicopata significa alguma coisa. Por sorte Luana dormiu melhor
durante a semana, e usou seu novo brinquedinho todos os dias.
Não preciso nem falar que gozei com ela todas as vezes, em
alguns dias assisti as gravações e repeti o ato mais de uma vez.
Maldita mulher gostosa pra caralho.
A princípio Luana questionou Vivian sobre o presente, mas ela não
sabe de nada, então continuou curiosa. Resolvi almoçar em outro
lugar nestes dias, para deixá-las a sós, não fui longe, pois preciso
manter minha psicóloga à vista.
Foi uma merda, odeio comer fastfood com esta frequência, e o
único lugar que me dá visão do restaurante é este. Não vejo a hora da
secretária ir embora.
Checo meus e-mails e abro o último de Giovani.
De: Giovani Rossi
Assunto: Secretária
Data: 18 de março de 2022 11:44
Temos um problema.
Minha secretária não vai mais sair, não tenho mais a vaga para sua
amiga.
Giovani Rossi
CEO, Rossi Multimídia Company.
Este incompetente não consegue nem contratar uma merda de
secretária sem ajuda. Tenho certeza que é só mais uma tentativa sua
de chamar atenção.
De: Maicon Campbel
Assunto: Secretária
Data: 18 de março de 2022 12:11
Este não é um problema meu, você garantiu a vaga, agora faça
ficar disponível.
Maicon Campbel
Com Giovani é preciso ser cuidadoso, ele é fácil de manipular, mas
sentimental demais, no geral é mais fácil enganá-lo com promessas
vazias do que com ameaças, mas se o primeiro não funcionar, tenho
uma carta na manga.
De: Giovani Rossi
Assunto: Secretária
Data: 18 de março de 2022 12:12
Não posso demitir uma funcionária de anos só porque você pediu
um favor, vou tentar uma vaga em outro departamento, mas não vai
ser nas mesmas condições.
Giovani Rossi
CEO, Rossi Multimídia Company.
Desgraçado, isso pode fazer com que Vivian desista e fique aqui
por mais tempo. Eu odeio pessoas que acham que têm todo mundo
aos seus pés, por ter dinheiro e um pouco de poder se colocam em
um pedestal de superioridade.
Giovani pode ser um cara rico e controlar uma empresa
multimilionária, mas é um idiota como tantos outros, que caiu nas
minhas garras e agora vai saber do que sou capaz.
Fique registrado que eu tentei não o chantagear, mas ele me
deixou sem saída, e quando você encurrala um caçador, ele irá usar
de todas as armas que possui para virar o jogo.
De: Maicon Campbel
Assunto: Secretária (ABRA O ARQUIVO)
Data: 18 de março de 2022 12:14
Tentei ser legal com você, mas não adianta, não é mesmo?
Demita sua secretária ou a transfira para outro setor, não dou a
mínima para o que acontecerá com ela, mas segunda-feira Vivian
estará ali para assumir seu lugar, e é bom que tudo esteja preparado.
E Giovani, se eu descobrir que meu nome foi citado por você, ou
qualquer pessoa desta empresa, estas fotos serão capa de todos os
sites de fofoca do país.
Não me provoque novamente, e esqueça que eu existo, por
enquanto.
Se as fotos não forem o suficiente, posso enviar os vídeos também.
Maicon Campbel
Envio quatro fotos de um dos nossos encontros, onde o grande
CEO da Rossi Multimídia Company aparece de quatro,
completamente nu, na cama da sua casa, o quarto enorme onde
dorme todos os dias com sua esposa e tem uma foto do seu
casamento pendurada acima da cabeceira, mas diferente do homem
sorridente que olha para sua mulher no quadro, Giovani está com os
braços amarrados nas costas e uma merda de coleira no pescoço, o
filho da puta adora um joguinho de submissão.
Completamente dominado, a boca aberta e os olhos fechados
enquanto grita de prazer com meu pau enterrado em sua bunda é o
foco das imagens.
Claro que o meu rosto está cortado. Não tenho tatuagens ou
qualquer marca que possa ser usada para me reconhecer, sou só um
homem fodendo outro.
E mesmo que ele afirme que as fotos são montagens, não tem
como justificar os vídeos em que está gritando feito uma cadela no cio
pedindo por mais.
Giovani usa seu casamento de fachada para fazer parte dos
círculos sociais mais exclusivos de Chicago, é assim que contratos
grandes são fechados, engana-se quem pensa que competência ou
bom trabalho contam para alguma coisa.
Homens ricos e brancos se reúnem em seus clubinhos para discutir
negócios com outros homens ricos e brancos, para entrar nisso você
precisa manter as aparências, casar com uma mulher bonita e que
não provoque escândalos, ter filhos para continuar a linhagem, mas,
principalmente, manter as merdas escondidas.
Todos temos segredos, o quão bem você consegue enterrar os
seus é a chave para o sucesso em nossa sociedade.
Ele não responde o e-mail, não precisa, tenho acesso ao seu
computador e vejo que já está fazendo o que mandei. Como o filho da
puta medroso que ele é.
Luana pediu para buscar um bolo e docinhos em uma padaria para
montar uma despedida surpresa no consultório. Enquanto elas
almoçam pela última vez juntas, saio para organizar tudo.
Na real, preferia não estar no consultório à tarde, tenho certeza que
elas ficarão emotivas pela despedida, e odeio lidar com pessoas
tristes ao meu redor.
Felicidade eu até posso aguentar, não algo tão irritante quanto
Vivian, mas tristeza e choro são coisas que me deixam irritado. Não
sou bom em trazer algum conforto nesses momentos, não entendo
porque não conseguem só aceitar e seguir em frente.
Não é como se uma delas estivesse morrendo!
E neste caso é só uma mudança na rotina, ao invés de se
encontrarem todos os dias, vão se ver pessoalmente com menos
frequência, mas tenho certeza que não irão perder o contato.
Luana tem poucas pessoas em sua vida, não deixará que uma
delas se afaste assim, ela já pesquisou passagens para Chicago, e irá
visitar a amiga com frequência.
Organizo tudo no consultório, olhei online alguns exemplos para
agradar a Luana, não sei fazer estas merdas, mas se ela quer uma
droga de festinha de despedida para a amiga, é isso que ela vai ter.
Coloco uma faixa escrito “boa sorte” em letras douradas atrás da
cadeira de Vivian, que agora será minha, tiro as coisas de cima da
mesa e coloco o bolo, docinhos e uns salgados.
No Pinterest as imagens tinham bebidas e papéis coloridos
espalhados pela mesa, então comprei um vinho e bombas de confete
colorido, espero que Luana goste e me dê alguns pontos pelo esforço.
Ela me pediu para manter a agenda de hoje vazia, sem Vivian
saber, então reorganizei seus compromissos para a próxima semana.
O horário de almoço está quase acabando quando Luana me
manda mensagem, avisando que estão subindo. Pego uma das
bombas de confete e forço meu melhor sorriso, até caminho de um
lado para o outro fingindo estar ansioso, preciso manter a encenação
para as câmeras do consultório.
Quando as duas saem do elevador, estouro os papéis em cima de
Vivian enquanto Luana bate palmas e fala que vai sentir saudades.
Como eu imaginava, elas logo estão chorando, então levo uma taça
de vinho para cada uma e envolvo Vivian em um abraço apertado.
— Espero que sua nova jornada seja maravilhosa, você merece —
falo o que imagino que seja apropriado para o momento. — Obrigado
por me escolher.
Aparentemente consigo tocar a mulher com as palavras, porque ela
chora mais ainda em meus braços.
Inferno, será que ainda dá tempo para colocar um calmante na sua
bebida?
Luana encara a situação com um sorriso lindo no rosto, ela está
triste, mas seu rosto parece feliz. Suas emoções me confundem.
— Vou sentir sua falta, amiga — Luana fala enquanto caminha até
a recepção, onde organizei três poltronas em volta da mesa.
— Nem acredito que é meu último dia aqui — Vivian lamenta com a
voz de choro. — Nunca pensei que esse momento chegaria.
— Achei que iríamos nos aposentar juntas quando nossa memória
começasse a falhar — Luana graceja e elas começam a contar os
planos que tinham para a aposentadoria.
— Ainda vamos, como sou mais nova que você, vou garantir seu
lugar em um asilo bem legal, cheio de homem gostoso e uma piscina
— a secretária brinca.
— São dois anos de diferença só, mas você provavelmente está
certa, já ando esquecendo minhas chaves por aí.
— Isso é culpa sua que não faz mais nada além de trabalhar, sabia
que stress mata mais neurônios que maconha? — Luana quase cospe
a bebida com a frase da amiga, — E nem dá um alto legal.
— Vivian!
— Ah, como se o Yuri não fumasse um baseado de vez em quando
— ela me provoca e sorrio.
— O objetivo da faculdade é esse — respondo.
— Da faculdade, mestrado, doutorado, seminários médicos,
palestras… — Luana beberica o vinho e nós rimos da sua confissão.
— Danadinha, eu sabia que você voltava relaxada demais desses
eventos.
— Antes uma erva natural e calmante do que os remédios que
alguns tomam para se manter acordados — Luana fala e
concordamos.
Depois disso contribuo pouco com a conversa, uma por não ter
interesse e outra porque é um momento delas, não acho que seria
apropriado chorar por alguém que conheço há menos de um mês, e
Luana pode pensar que estou exagerando na encenação.
Por sorte Vivian lembra que tem alguns papéis para retirar na
contabilidade e me voluntario para ir buscar, deixando-as sozinhas.
Sinto até alívio ao sair do consultório, odeio pessoas chorando, não
sei o que fazer para que parem com as lamentações e fico estressado
por ter que consolar alguém. Nunca fui bom com isso e nem quero
ser.
Acompanho a conversa delas pelas escutas da recepção, coloco o
fone de ouvido enquanto faço o caminho até o escritório de
contabilidade que fica a uma hora de distância.
Não presto realmente atenção no que estão falando até que escuto
meu nome.
— Mas vamos falar sério, Luana — é Vivian quem fala. — Yuri é
um gostoso, e mesmo que seja gay, é um colírio para os olhos.
Ela ainda pensa que sou homossexual só porque não demonstro
interesse nela, Vivian é bonita, tem uns peitos grandes e chamativos,
assim como Luana ela não é magra, o que é bem melhor porque
garante uma boa bunda, porém ela não chama minha atenção. Já a
maldita da psicóloga consegue ser uma grande gostosa e deixar meu
pau duro feito pedra só com a lembrança de suas mãos safadas.
— Realmente a visão da recepção sofreu um upgrade — a
psicóloga responde em um tom de voz um pouco enrolado,
aparentemente o vinho começou a fazer efeito.
— Está me chamando de feia, é?
— Claro que não, mas não é a mesma coisa do que o Samurai
Sarado.
Solto uma gargalhada ao ouvir o apelido, faço uma anotação
mental de que, se algum dia for fazer uma tatuagem, será um
samurai.
— Controla esses hormônios aí, não quer levar um processo por
assédio sexual no primeiro mês de trabalho do homem.
— Eu sei, mas olhar não tira pedaços e é por isso que temos
câmeras na recepção.
— Achei que era por segurança.
— Claro, porém se já estão lá mesmo, podem ter um segundo
propósito.
— Você vai assistir o Samurai Sarado como se fosse pay-per-view,
não é mesmo, sua safada?
— Eu pago um bom salário para isso — Luana comenta e solta
uma gargalhada.
— Lembra do baile beneficente no hospital? Você não pode
aparecer lá sozinha de novo, convida o Yuri — Vivian sugere e fico
atento, não vi nenhum baile na agenda da psicóloga.
— Não quero ir, esses eventos são chatos demais, e não vou
convidar meu secretário para sair, você está louca?
— Tecnicamente é um compromisso de trabalho, e ele pode querer
ir, fora que você já pensou naquele corpo todo dentro de um smoking?
Escuto o som de alguém cuspindo e uma gargalhada, faço uma
anotação mental de assistir às câmeras depois porque tenho certeza
de que foi Luana quem se exaltou e preciso ver essa cena.
— Puta que pariu, amiga! — A voz de Luana está alta, tenho
certeza que ela deve estar completamente rubra de vergonha.
— Só estou falando, e você comprou aquele vestido vermelho
maravilhoso e caríssimo naquela crise existencial, lembra?
— Nem me fale, odeio quando a TPM se encontra com o caos da
minha vida amorosa e eu acabo gastando com coisas supérfluas.
— Para com isso, você tem dinheiro, não se faça de coitada —
Vivian xinga a amiga e preciso rir. Realmente Luana não é pobre, mas
pelo seu extrato bancário ela não costuma gastar muito com coisas
para ela. — Pega aquele vestido incrível, que custou quase meu
salário, o secretário gostoso que você contratou e vai jogar toda sua
riqueza e poder na cara dos médicos que se acham os maiorais.
— Amiga, você sabe que odeio isso, não preciso esfregar meu
sucesso na cara dos outros, já basta aquele bando de homens que
levam umas mulheres com a metade da idade deles para desfilar por
lá — Luana faz voz de nojo.
— Fodam-se eles, só não vai sozinha. Se quiser, minha amiga tem
o número de alguns acompanhantes de luxo, posso conseguir alguém
mais velho para você — Vivian sugere e meu sangue ferve ao ouvir
isso, maldita mulher. — Que tal passar como Sugar Baby?
— Não tenho mais nem idade para isso — Luana reponde
seriamente. — Acho que vou mencionar o baile para o Yuri e ver qual
será a reação dele.
— Só me promete uma coisa?
— Tudo para você, amiga.
— Tira muitas fotos daquele homem, por favor, o maldito Samurai
Sarado quase não posta nada nas redes.
— Pode deixar, vou fazer um book dele escondido para adicionar
ao processo que vou receber por assédio no consultório.
— Tecnicamente vocês vão estar fora daqui.
— Gosto da forma que seu cérebro trabalha, amiga.
As duas soltam gargalhadas, Vivian continua provocando Luana,
até que elas pegam os celulares e começam a comentar em cada
uma das fotos do meu perfil.
Tenho que me segurar para não rir ainda mais dentro do Uber e
parecer um louco. Então a psicóloga vai ficar me olhando enquanto
trabalho?
Ah, coração, se você soubesse o quanto isso me agrada… ainda
mais quando posso provocá-la durante o dia e ouvir teus gemidos à
noite, gritando meu nome enquanto goza com o vibrador que eu te
dei.
Merda, só de lembrar meu pau fica duro e preciso respirar fundo,
por sorte a pasta com documentos está no colo e esconde o volume
nas calças. Maldita mulher que me deixa com tesão tão rapidamente.
Você vai pagar por isso, coração.
É um show que você quer? Vou te proporcionar o melhor seriado
da sua vida.
Minha cabeça parece que vai explodir, quero matar Vivian por me
convencer a ir até o bar e continuar bebendo depois que a garrafa de
vinho acabou, não que eu precise de muito incentivo para isso, sempre
amei sair com ela para beber, mas fazia tempo demais que não
curtíamos a vida noturna.
Não lembro até que horas ficamos lá, mas por sorte Yuri nos
encontrou e ficou responsável por levar as duas velhas bêbadas para
casa. Tenho a vaga memória dele ajudando Vivian a entrar em seu
prédio, mas depois nada.
Abro os olhos aos poucos, a luz do dia queima enquanto tento
assimilar onde estou, vejo o lustre familiar no teto, as cortinas cinza e a
obra de arte vermelha, rodeada por minhas fotos de viagens
penduradas na parede em frente à cama e solto um suspiro, aliviada.
Provavelmente falei onde moro, porque este é o meu quarto.
Passo a mão na cama, sentindo meu coração acelerar, mas não tem
ninguém, jogo o cobertor e tento me levantar, só então percebo que
estou apenas de calcinha e uma camiseta preta larga que não uso há
anos.
Devo ter me trocado antes de deitar.
Parabéns, Luana, pelo menos uma vez na vida você foi uma bêbada
consciente e não dormiu com a roupa apertada, só espero ter tirado a
maquiagem também ou minha dermatologista vai me matar.
Rastejo até o banheiro, tomo uma aspirina antes de olhar para o
espelho e ver o rosto limpo, tiro o restante da roupa e escovo os
dentes, o gosto amargo me provoca ânsia de vômito.
A água quente cai como um calmante em meu corpo, um bom
banho é tudo o que preciso para começar a pensar direito. Relaxo por
um tempo, até que me sinto um pouco melhor, enrolo uma toalha em
meu cabelo e outra em meu corpo, passo um creme cheiroso na pele e
o firmador no rosto.
Vou até a cozinha, abro a geladeira para pegar um pouco de água,
mas quando me viro com a jarra de vidro na mão, vejo alguém de pé
na sala e meu coração dispara, o susto me faz largar o recipiente que
se espatifa no chão e espalha água e cacos de vidro por todo lado.
— O que você está fazendo aqui? — grito quando percebo que Yuri
está parado na minha sala, vestindo uma calça de moletom solta na
cintura, e sem camisa.
— Desculpa, não queria te assustar. — Ele levanta as mãos e posso
jurar que a droga da calça desce ainda mais, deixando seu abdômen e
cada um dos seis gominhos marcados — Não se mexa, vou pegar
uma pá e uma vassoura para recolher os cacos de vidro.
Ele sai em direção à despensa e volta com os utensílios e um par de
chinelos de borracha, que me entrega antes de começar a recolher os
pedaços de vidro do chão.
— Você me assustou — falo e coloco a mão no peito, sentindo meu
coração acelerado, só agora me dou conta que estou só de toalha em
sua frente. — Vou me trocar.
Corro de volta ao quarto e coloco a primeira calça e blusão de
moletom que encontro, me cobrindo ao máximo, tiro a toalha da
cabeça e escovo os cabelos, tentando ajeitá-los rapidamente. Quando
retorno para a sala ele já terminou de recolher o vidro e está passando
o mop para secar o piso.
— Desculpe assustá-la, você não estava nada bem ontem e fiquei
com medo de deixá-la sozinha — Yuri se justifica.
— Já tive porres piores, não precisava se preocupar.
— Você vomitou no meu carro e depois desmaiou antes de
chegarmos à garagem, te carreguei para cima, mas fiquei com medo
que vomitasse durante a noite e se engasgasse. — A cada palavra sua
meus olhos se arregalam mais com tamanha vergonha.
Não sei nem o que falar, meu rosto queima e deve estar vermelho
como um pimentão, Yuri me olha tranquilamente.
— Desculpa, não lembro de nada, mas pode ficar tranquilo que vou
pagar a limpeza do seu carro — digo com ainda mais vergonha.
— Não se preocupe, essas coisas acontecem, fico feliz que esteja
melhor — ele responde enquanto termina de secar o piso. — E fique
tranquila, eu dormi no sofá, só fui até seu quarto algumas vezes para
garantir que estava virada de lado se caso vomitasse novamente.
— Obrigada pela preocupação, Yuri, não vai mais acontecer —
agradeço, mas então uma dúvida passa pela minha mente. — Espera,
como você entrou na garagem? Eu só tenho uma vaga e meu carro
está aqui. E você trocou de roupa, também…
— Eu moro no apartamento ao lado do seu — Yuri responde e abre
um meio sorriso. — Não sabia que éramos vizinhos até você me falar
seu endereço.
— Desde quando você é meu vizinho?
— Me mudei há pouco mais de um mês, quando vim de Chicago
para New York — responde com tranquilidade.
— Como não nos encontramos antes?
— Não sei. — Ele dá de ombros e abre um sorriso, passando a mão
pelo cabelo comprido que cai lindamente emoldurando o rosto. —
Nossos horários são diferentes e não saio muito desde que cheguei,
no máximo fui ao bar do outro lado da rua e ao mercado.
Penso por um tempo, realmente não vejo meus outros vizinhos,
New York não é uma cidade pequena em que todos conhecem todo
mundo, Yuri entra antes na clínica, portanto não nos esbarramos no
elevador, ele também chega antes.
— Agora eu sei porque você parecia tão familiar na primeira vez que
te vi — falo ao me lembrar da noite do bar. — Matt, o garçom, te deu o
número de telefone dele.
Ele me encara com espanto no rosto, então parece ficar
constrangido e desvia o olhar.
— Bem, a gente está saindo — diz se justificando. — Espero que
isso não influencie na sua decisão de me contratar.
— Por que fala isso? — questiono sem entender sobre o que ele
está falando.
— Pelo fato de me relacionar com homens. — Ele respira fundo e
sua postura muda, Yuri está acuado, com medo do que eu vá falar. —
Não saio expondo minha vida privada por aí, algumas pessoas não
gostam e…
— Você acha que vou te demitir por sua orientação sexual? — falo
com calma. — Não é da minha conta com quem você se relaciona e,
francamente, sou uma psicóloga, tenho meus defeitos, mas se tem
algo que não admito, é preconceito.
— Desculpa, não quis assumir nada, mas sabe como o mundo é —
Yuri tenta se explicar. — E eu queria muito este emprego.
Com a última frase seu olhar encontra o meu e vejo uma
intensidade verdadeira, a percepção de que ele realmente quer
trabalhar na clínica me deixa mais calma.
— Não tem porque se desculpar, entendo seus motivos, mas espero
ganhar a sua confiança com o tempo — falo e ele abre um sorriso
lindo, seus ombros relaxam e isso faz meu corpo arrepiar.
— Igualmente, Luana — Yuri responde e anda até a porta. — Agora
que sei que você está bem, vou para casa, se precisar de alguma
coisa estou a uma porta de distância. — Ele pisca para mim e minha
boceta pisca de volta.
A visão do seu corpo praticamente nu acende alguma coisa dentro
de mim, sem perceber estou sorrindo como uma adolescente
encantada pelo menino novo da escola.
Controle-se, Luana.
— Obrigada — consigo encontrar minha voz para responder. — E
desculpa, não vai acontecer de novo.
Com isso Yuri me dirige um olhar intenso, daqueles destruidores de
calcinhas, sei que não é intencional, afinal ele gosta de homem, então
porque diabos meu corpo está reagindo assim?
Toda vez que saio para procurar alguém, é esta sensação que
procuro ao encontrar a pessoa certa, aquela que acabará com todo o
meu tesão acumulado e me fará gritar de prazer.
Por isso fico assustada ao perceber que Yuri, só com um olhar e seu
sorriso, consegue me fazer pegar fogo.
Por que justamente meu secretário tem esse poder sobre mim?
E o que diabos vou fazer agora que sei disso e preciso conviver com
ele de segunda a sexta-feira, trancados em uma clínica particular,
praticamente sozinhos na maior parte do tempo?
Você está ferrada, Luana!
***
Não tenho coragem de sair do apartamento pelo resto do final de
semana. Depois da vergonha que passei no sábado de manhã, fiquei
com medo de encontrá-lo pelos corredores, agora que sei que mora no
apartamento ao lado.
E não consigo tirar a visão do Samurai Sarado da minha mente,
aquele corpo maravilhoso, a calça de moletom pendida na cintura, os
braços fortes e o peitoral musculoso me fazem salivar, mas o pior é
lembrar da forma que ele me olhou antes de sair, me masturbei o final
de semana todo tentando tirá-lo da cabeça, mas parece que só piorou
a situação.
Estou nervosa enquanto dirijo para o trabalho, hoje seremos
somente Yuri e eu. E é segunda-feira, deixo sempre a manhã do
primeiro dia da semana para organizar a agenda e planejar meus
atendimentos, isso também inclui uma reunião com meu secretário
para repassarmos todos os compromissos.
Ou seja, uma manhã toda com Yuri em minha frente.
Não vá por esse caminho, Luana.
Tento controlar meus pensamentos, mas eles sempre voltam para o
Samurai Sarado, quer dizer, Yuri Saito. Nada de apelidos para o
secretário, não quero levar um processo por assédio sexual no
trabalho.
Minhas mãos estão suando enquanto o elevador sobe para o 13º
andar, nunca estive tão nervosa para chegar em minha própria clínica,
mas não consigo controlar.
As portas se abrem e lá está ele, em um terno cinza escuro colado
no corpo, o cabelo comprido amarrado em um coque. Com um sorriso
leve, Yuri me cumprimenta, mas o que faz minhas pernas tremerem
são esses malditos olhos puxados.
E o cheiro de pós-barba masculino, essa desgraça deveria ser
proibida.
— Bom dia, Yuri — respondo tentando manter minha voz o mais
calma possível. — Vou organizar algumas coisas e logo podemos
começar a reunião semanal.
Muito bem, diretamente para o lado profissional, agora respira e se
controla.
— Claro, vou levar seu café, você prefere donuts ou croissants? —
Yuri pergunta, me pegando de surpresa. — Abriu uma padaria nova a
uma quadra daqui, Vivian me deixou instruído a servir algo para você
comer de manhã, então pensei em aproveitar e ver se o lugar é bom.
— Você não precisa fazer isso, Vivian se preocupava demais —
respondo um pouco sem jeito, mas nessa hora meu estômago resolve
roncar, estou tão acostumada a tomar meu café da manhã no
consultório que esqueci de comer antes de sair de casa, então engulo
minhas palavras e respondo — um croissant de frango seria perfeito.
— Certo, volto em dez minutos. — Yuri me lança um sorriso lindo,
deixando-me ainda mais desconcertada, antes de pegar seu casaco e
sair.
O dia vai ser longo se continuar reagindo assim ao meu secretário.
Destranco a porta da minha sala e respiro fundo, decido me concentrar
no trabalho e em meus pacientes, assim talvez consiga desviar o
pensamento do Samurai Sarado na recepção.
***
A missão foi um fracasso, depois da nossa reunião de manhã, Yuri
ficou em sua mesa a maior parte do tempo, confirmando as consultas
e organizando a agenda.
Como eu sei disso? Digamos que não consegui desviar as vistas
das imagens da câmera de segurança da recepção. Geralmente pouco
olho para elas, mas hoje foi como se o computador tivesse um imã,
puxando meu olhar, sugando minha atenção.
O almoço foi outra tortura, Yuri é um completo cavalheiro, abre a
porta do restaurante para que eu entre antes, puxa a cadeira para eu
me sentar, e o pior de tudo, ele conversa como se nada tivesse
acontecido.
Sem Vivian aqui achei que não teríamos assunto, inclusive
considerei a ideia de almoçarmos separadamente, afinal ele não tem a
obrigação de passar seu horário de descanso comigo.
Vivian e eu fazíamos isso porque somos amigas, e nunca falávamos
sobre trabalho enquanto almoçávamos, da porta do consultório para
fora não tínhamos mais um vínculo de chefe e secretária.
Então foi bom saber que talvez consiga manter isso com Yuri,
especialmente porque temos muita coisa em comum: assim como eu,
ele adora vinhos, passamos o almoço todo falando sobre a última
caixa da Winebox.
E é isso, encontramos um assunto em comum e a conversa
simplesmente fluiu com naturalidade.
Aproveitei para comentar sobre o baile beneficente no mês que
vem, ele ficou animado e fez várias perguntas sobre o evento,
aparentemente o Doutor Moura não participava dessas coisas, por já
estar velho.
Então joguei verde e falei que não estava a fim de ir sozinha, Yuri
abriu seu sorriso mais lindo, que quase me fez suspirar, e sugeriu que
seria legal me acompanhar, se eu quisesse.
E foi isso, tenho um acompanhante para o baile!
À tarde passei em atendimentos e consegui manter minha cabeça
em meus pacientes, é preciso concentração e calma para trabalhar
com saúde mental, cada pessoa é única e tem seus desafios, sua
personalidade e uma forma específica de aceitar tratamento.
Não vejo a hora passar até que a sensação de ser observada me
faz levantar o olhar para a porta e me assusto, encontro Yuri parado
com as mãos no bolso e a postura relaxada, seu olhar focado em mim.
— Não quis te assustar — ele fala e caminha confiante em minha
direção, como a porra de um modelo na passarela. — Você precisa de
mais alguma coisa, Luana? — pergunta com a voz grossa e me faz
arrepiar.
Preciso que você me coma em cima dessa mesa…
SE CONTROLA, LUANA!
— Não — consigo responder, mas minha voz sai mais fraca do que
o normal. — Nem vi que já deu seu horário, pode ir, tenho algumas
coisas para finalizar aqui ainda.
— Tudo bem, nos vemos amanhã — ele se despede e caminha em
direção à saída, meu olhar é automaticamente atraído para a bunda
firme e marcada na calça social, e na forma que ele rebola enquanto
anda. — Boa noite, Luana — Yuri fala e só então percebo que ele está
me olhando com canto do olho, e o sorriso escancarado em seus
lábios indica que fui pega no flagra.
— Boa noite, Yuri — respondo desviando o olhar para os papéis em
minha frente, mas sei que meu rosto está vermelho de vergonha.
Duas semanas depois.
As coisas ficam cada vez mais divertidas no consultório, não pensei
que diria isso, mas estou adorando trabalhar com a psicóloga.
Os motivos não são minhas funções como secretário, nem lidar com
os pacientes ou fingir que me importo com as merdas de suas vidas,
como podem gastar uma fortuna em terapia só para reclamar de tudo?
Não, eu não dou a mínima para eles, o que deixa meus dias mais
interessantes é a psicóloga safada que não consegue tirar os olhos do
meu corpo.
Mas quem pode julgá-la? Voltei a me exercitar na academia do
prédio e meu físico está retornando à sua melhor forma, saber que
Luana gosta do que vê é mais uma motivação.
Quando a deixei em casa depois do porre com Vivian, fiquei com um
de seus batons que encontrei no banheiro, um pequeno pagamento
por ter feito meu trabalho.
Não deixo que ela esqueça, sei como me mover de forma
provocante, sem ser vulgar ou dar na cara que estou fazendo isso
intencionalmente, também uso meu sorriso mais atrativo quando tenho
a oportunidade, e Luana fica vermelha toda vez, chega a ser fofo de
ver.
Voltei a postar mais fotos e stories, especialmente enquanto malho,
os bumerangues do meu corpo suado nos melhores amigos sempre
têm a visualização dela.
As fotos no feed são mais genéricas, tirei algumas pela cidade para
que ela pense que tenho uma vida interessante, fiz até um story com
Matt, isso só vai confundi-la ainda mais.
É tão legal brincar com Luana… posso ver sua reação todas as
vezes que fuça minhas redes sociais, ela geralmente faz isso em casa,
com uma taça de vinho em mãos e o vibrador na outra.
Minha presa está tão atraída por mim que não consegue controlar
as reações do próprio corpo, e isso fica ainda mais intenso quando ela
está em casa. Depois de passar o dia todo me olhando, minha doce
psicóloga precisa extravasar o tesão acumulado.
As imagens dela se masturbando no sofá da sala, na cama, na
banheira… Fico de pau duro só de lembrar, e é ainda mais sexy
quando ela goza com força falando meu nome, desde que descobriu
que moro no apartamento ao lado, Luana não grita mais, mas sua voz
sussurrada é ainda pior.
O que eu não faria para tê-la gemendo assim com meu pau
enterrado em sua boceta molhada…
Merda, agora quem não está se controlando sou eu.
Toda vez que a maldita tem um orgasmo pensando em mim, eu
gozo com força assistindo às câmeras e ouvindo sua voz. Seu prazer é
como uma chama, feita especificamente para acender meu
combustível e me fazer queimar loucamente por ela.
Nunca precisei me masturbar tantas vezes assim, nem quando era
um maldito adolescente com os hormônios à flor da pele.
Meu celular vibra em cima da mesa e a mensagem tira minha mente
da psicóloga, é sexta-feira e estou me preparando para terminar meu
turno no consultório, ou melhor, para sentar no bar da esquina e vigiar
a saída do prédio, esperando Luana ir embora.
“Olá, lindo. Como você está?
Hoje tem karaokê no bar, por
que não vem mostrar suas
habilidades vocais?
Estou com saudades.”
Droga, meu humor vai lá embaixo ao ler a mensagem, não tenho o
mínimo interesse nele e agora que Luana pensa que sou gay, Matt já
cumpriu sua função em meus planos.
Venho desviando dele e seus convites para sair, falo que estou
cansado do trabalho e que não tenho tempo, mas ele continua
tentando, não se toca que não estou interessado.
É tão óbvio, se uma pessoa não consegue tirar uma hora da sua
semana para te ver, é porque ela não quer, não porque não pode.
Ninguém está ocupado 24 horas por dia e quando você quer realmente
ver alguém, encontra tempo para isso.
Se a pessoa usa a desculpa que não tem tempo, significa que ela
pode sim estar ocupada com trabalho ou outros problemas — e que
para estas coisas ela tem tempo —, porque são importantes em sua
vida.
Consegue chegar à mesma conclusão que eu?
Priorizamos nosso tempo para gastar com o que realmente nos
interessa, portanto, se não tenho tempo para te ver, é porque não
tenho interesse em você.
Simples assim.
— Yuri — Luana me chama e vou até a porta da sua sala. — Você
pode ir, ainda vou ficar um tempo aqui.
— Tudo bem, se precisar de mim, sabe como me encontrar —
respondo e dou uma piscadinha rápida para ela. — Tenha um ótimo
final de semana, Luana.
— Obrigada, você também — ela retorna agora com a voz mais
fraca, tenho certeza que está vermelha, mas não olho novamente em
sua direção, pego minhas coisas e saio.
No momento em que chego ao bar, meu celular apita com uma
mensagem, respiro fundo antes de olhar, deve ser Matt novamente.
Que inferno, ele não se toca mesmo.
Contudo, para minha surpresa, é meu programa espião do celular
de Luana.
“Não aguento mais ficar em casa,
amiga.”
Luana enviou para Vivian, que já está em Chicago, devidamente
empregada como a secretária do CEO.
“Então saia, simples assim.”
Vivian responde e tenho que rir do seu jeito direto.
“Não queria sair sozinha, apesar de
gostar da minha companhia, eu quero
um encontro.”
Esta é nova, ela nunca demonstrou estar interessada em algo
assim, pensei que não estivesse procurando nada mais que sexo
casual.
“Então entra no Tinder,
coloca as melhores fotos que
você tem e veja a mágica
acontecer.”
Péssima ideia, Vivian, estes aplicativos não são seguros, estão
cheios de caçadores à procura da próxima presa. E Luana já tem
alguém assim…
“Talvez seja uma boa opção”
Luana responde e tenho vontade de matar a ex-secretária por
sugerir algo tão perigoso. Puta que pariu, elas não assistem noticiário,
não?
Acompanho a tela do celular da psicóloga e vejo quando ela baixa o
aplicativo. Merda, preciso fazer alguma coisa.
Mando mensagem para Luana antes que ela comece a criar seu
perfil.
“Hoje tem karaokê no bar em frente
ao nosso prédio, Matt acabou de me
avisar, gostaria de me acompanhar?”
Aperto enviar e abro as imagens das câmeras de segurança que
instalei dentro da sua sala, vejo a cara de surpresa que ela faz
enquanto lê, mas não responde na hora.
Ao invés disso, Luana envia mensagem para Vivian:
“Você não vai acreditar, Yuri acabou
de me convidar para ir ao bar em frente
ao nosso prédio para a noite de
karaokê.”
“Sério? O Samurai Sarado gosta de cantar?
Sorrio com a utilização do apelido que elas me deram.
“Não sei, mas se esse homem
cantar bem, terei que comprar outro
vibrador, porque o meu não vai mais
dar conta.”
Sério, coração? Você gostaria de me ouvir cantar? Não é algo que
eu particularmente sinta prazer em fazer, mas minha voz é bonita e
afinada.
“Sua safada, você deveria
recusar e procurar outro
homem para ficar obcecada.”
“Não estou obcecada por ele, é só
novidade, logo me acostumo com seu
charme e paro de pensar nele durante
a noite.”
“Não esqueça de parar
durante o dia também, porque
tenho certeza que você já
escapou para o banheiro do
consultório uma ou outra vez.”
Ah, pronto. Agora preciso pôr câmeras no banheiro da clínica
também? Luana, você é uma safadinha.
“Você tem razão, talvez não seja uma boa ideia.”
Droga, Vivian, você tem que se intrometer nisso? Envio outra
mensagem para Luana, agora com um apelo emocional maior.
“Desculpa te convidar assim, não
conheço mais ninguém na cidade e
Matt vai estar trabalhando, então
pensei que poderia me fazer
companhia, se quiser posso passar
vergonha e cantar uma música.”
Com isso tenho certeza que ela vai se sentir na obrigação de me
acompanhar, ainda mais quando prometi cantar, é bom ter a vantagem
de saber o que ela gosta.
Novamente ela não me responde na hora e manda mensagem para
Vivian.
“Droga, ele falou que gostaria da
minha companhia porque não conhece
mais ninguém, não havia pensado
nisso, mas realmente Yuri acabou de
se mudar e nunca perguntei se ele
tinha algum conhecido na cidade,
família ou amigos.”
“Talvez seja bom, vocês
moram no mesmo prédio, o bar
é bem na frente e nada melhor
que algumas cervejas para
criar um laço com seu
funcionário, lembra quantas
vezes saímos beber quando
você abriu o consultório?”
“Realmente, nos conectamos muito
mais depois de um pouco de álcool, se
não me engano, na época ainda
aguentávamos os shots de tequila.”
“Nem fala essa palavra, tem
mais de cinco anos que não
consigo sentir o cheiro.”
Vejo Luana gargalhando em seu consultório e involuntariamente
sorrio ao vê-la feliz.
“Tudo bem, devo chegar em
casa em meia hora, vai
pegando uma mesa e nos
encontramos lá. Obrigada pelo
convite, Yuri.”
Luana me responde e por um momento sinto algo que nunca
experimentei na vida, fico ansioso com a perspectiva de encontrá-la.
Que merda é essa, Yuri? Você segue a mulher 24 horas por dia,
está sempre de olho nela., mas por uma droga de karaokê seu coração
acelera.
Não posso estar nervoso, isso não acontece comigo.
Espero Luana sair do consultório e a sigo até em casa, aguardo
alguns minutos, para entrar na garagem somente depois que ela já
está dentro do próprio apartamento.
Tomo um banho rápido e coloco uma camiseta preta com a estampa
dos Beatles atravessando a rua. Jogo um casaco de couro por cima, a
calça jeans escura e as botas complementam o visual de bad boy que
acho ser apropriado para a noite.
Se minha psicóloga quer um show, é isso que ela vai ter. Eu não sou
obcecado por um gênero musical específico, nem por uma banda ou
cantor, comprei esta camisa recentemente para passar despercebido
nas noites de rock no bar.
Vejo o momento em que Luana sai do banho pelas câmeras e
começa a se arrumar, é minha hora. Saio antes que ela termine e vou
até o bar.
O lugar está mais cheio que o normal, mas consigo uma mesa na
parede, mais afastada do palco e não tão perto do balcão. Pelo canto
do olho vejo Matt me encarando, ele seguiu meus passos até a mesa
desde que cheguei e ficou com a expressão confusa estampada no
rosto porque não fui diretamente até ele.
— Não sabia que viria, posso conseguir um lugar no balcão para
você. — Matt se aproxima e passa a mão pelo meu ombro, então se
abaixa e me beija. Deixo que faça, mas não retribuo mais que o
necessário.
— Hoje não, lindo. Convidei minha chefe para vir também, ela deve
estar chegando a qualquer minuto — respondo com meu melhor
sorriso.
— Que bom, assim você não fica sozinho enquanto trabalho. — Ele
claramente pensa que estou aqui por sua causa, doce cordeirinho
iludido. — Quer alguma coisa para beber?
— Uma cerveja.
— Vou trazer. — Matt parece ter algo a mais a dizer, olho fixamente
em seus olhos até que ele respira fundo e fala: — A Shirlei vai cobrir o
bar a partir de uma hora da manhã… Depois disso estou livre, se você
quiser ir lá em casa.
Droga, eu não quero transar com Matt. Por sorte Luana chega
exatamente neste momento e só sussurro um “depois conversamos”
para ele antes de me levantar e chamar a atenção dela para nossa
mesa.
A maldita psicóloga está gostosa pra caralho; com um vestido preto
colado no corpo, meia arrastão e uma bota que vai até o joelho, ela
está de matar. Luana caprichou na maquiagem também, mas o que
chama a atenção é o batom vermelho nesses lábios grossos.
Maldição, só de olhar para ela assim meu pau já está duro.
— Desculpa a demora — ela fala, antes de sentar na cadeira em
minha frente.
— Cheguei há pouco tempo também — respondo e encaro seu
sorriso, só percebo que estou olhando fixamente para ela quando sinto
Matt apertar meu ombro. — Luana, este é o Matt. — Introduzo os dois.
Ela estende a mão sobre a mesa e cumprimenta o homem do meu
lado, que por algum motivo ridículo encara a psicóloga com o
semblante fechado.
— Já te vi aqui algumas vezes, não sabia que era a chefe do meu
namorado — Matt assinala e me pega de surpresa, o cordeirinho está
marcando território.
— Moro do outro lado da rua e o bar é legal — Luana parece não
perceber e responde educadamente. Ele não diz mais nada e me olha
estranho, como se esperasse que eu falasse algo.
— Vai beber alguma coisa, Luana? — pergunto, já que o garçom
aparentemente não vai oferecer nada.
— Uma cerveja seria bom — ela responde e sorri levemente para
Matt.
— Vou trazer. — Com isso ele aperta meu ombro uma última vez e
sai com a cara fechada.
Luana espera um tempo e solta uma gargalhada linda antes de me
encarar, do que ela está rindo assim?
— Ele acabou de fazer xixi ao seu redor — ela conclui baixinho
enquanto se perde em risadas. — Tinha que ver a sua cara, Yuri.
— Dá risada, vai, quero ver se fosse com você… — finjo estar com
vergonha da situação, mas não controlo o sorriso por vê-la feliz.
Matt volta com as nossas cervejas, mas não fala mais nada, seu
rosto continua fechado e ele não tira os olhos de mim durante a noite.
O que serve para que Luana solte algumas piadinhas, ela percebeu
que não estou tão envolvido assim com ele, a mulher é experiente e
tem um olhar atento.
Aos poucos o bar enche e as pessoas começam a cantar, uma pior
que a outra, estragando as músicas com vozes desafinadas. Algumas
não são tão ruins, mas estão tão bêbadas que se enrolam com a letra.
Luana é uma ótima companhia, depois que Matt quebrou o gelo, e
quando a cerveja começou a fazer efeito, ela se soltou. Falamos sobre
música, filmes, livros, até política surgiu na conversa.
Em alguns momentos me esqueço de que esta é minha chefe e eu
sou seu secretário-vizinho-protetor-perseguidor e me perdi na
conversa.
A última pessoa termina de cantar e o homem que está organizando
a noite anuncia que o microfone ficará disponível. Já passa da meia
noite e Luana está levemente embriagada, assim como eu, devo
admitir.
— Você me prometeu uma música — ela cobra com a voz enrolada.
— Só vim aqui esta noite para te ouvir cantar e até agora nada.
Seu sorriso é acompanhado de um olhar cheio de desejo que ela
não consegue esconder, normalmente Luana estaria completamente
vermelha agora, mas o álcool tira sua inibição.
— Bem, se eu prometi então vou ter que cumprir. — Pisco para ela
e levanto, sentindo o mundo girar por um momento. — Prepara o
celular, sei que vai querer ver esse show de novo amanhã. —
Concentro-me em meus passos e vou até o palco. Escolho a música A
Hard Day’s Night da banda The Beatles e pego o microfone.
Quando o som começa, solto a voz e olho na direção da minha
chefe, no momento que ela percebe qual é a música, abre um sorriso
lindo e mexe a cabeça de um lado para o outro.
It’s been a hard day’s night
(Hoje foi um dia difícil)
And I’ve been workin’ like a dog
(E eu tenho trabalhado como um cachorro)
It’s been a hard day’s night
(Hoje foi um dia difícil)
I should be sleepin’ like a log.
(Eu deveria estar dormindo como uma pedra)
Continuo cantando, cada vez mais motivado ao ver seu rosto se
iluminar com a música, ela sabe que é para ela, não tiro meus olhos do
seu batom vermelho, não consigo nem pensar em olhar para outro
lugar.
Luana começa a se mover no ritmo da música, ainda sentada com o
celular escorado na cerveja e focando em mim, é contagiante, nunca
senti essa energia tão atrativa com outra pessoa, e não me lembro a
última vez que fiquei animado em cantar.
Além do mais, vejo o olhar das pessoas na plateia, sim eu sou
gostoso, a camiseta colada e a jaqueta de couro chamam a atenção,
também aproveito a luz direta no palco e faço minha melhor
performance, até solto o cabelo e deixo que os fios caiam pelo meu
rosto de forma teatral.
Quando a música termina, vejo que outras pessoas batem palmas
para o meu pequeno show, Luana ergue sua cerveja em minha direção
em um brinde.
— Esta música foi dedicada à minha querida chefe, que, por acaso,
está naquela mesa próxima a parede — falo no microfone e todos
começam a rir e a olhar para Luana, que finalmente fica vermelha com
a atenção do bar sobre ela.
Saio do palco e caminho até a minha psicóloga, que não tira os
olhos de mim, como uma maldita leoa encarando sua presa. Só que eu
não sou a caça, coração, eu sou o caçador.
— Não sabia que estava trabalhando tanto — Luana instiga quando
volto a sentar na cadeira em sua frente. — O trabalho é mais do que
você consegue aguentar?
Ela está me provocando, sabe que foi uma brincadeira.
— Ah, chefe, posso aguentar muito mais que isso — respondo com
a voz grossa e pisco para ela, claramente colocando uma conotação
sexual na frase, deixo isso evidente quando encaro seu rosto
intensamente, então faço meu olhar descer para a sua boca e depois
para seus peitos, que estão pulando do decote, molho os lábios com a
língua antes de subir novamente para seu rosto e encontrar seus olhos
castanhos fixos em mim.
Sim, querida, isso sou eu te olhando com desejo, você sente esse
fogo, sei que sim. É como se o restante do mundo não existisse, o
burburinho do bar é silenciado em minha mente e fico preso em nossa
conexão.
Meu celular vibra no bolso da calça e me tira do encantamento,
quero matar a pessoa que teve a coragem de me mandar mensagem
agora.
“Saio em 20 minutos, você vai para a minha casa?”
Tinha que ser o desgraçado do Matt, posso sentir a raiva cinza que
começa a nublar meus pensamentos, droga de homem que não tem
noção da própria insignificância.
Minha mente é tomada pela ira e só consigo imaginar diversas
formas de fazê-lo sofrer por interromper o momento, sinto necessidade
de colocá-lo em seu lugar, destruir suas esperanças e mostrar que ele
não significa nada para mim.
Vou levá-lo para o beco ao lado do bar e quebrar sua cara, talvez
assim aprenda a não confiar em qualquer um que manifeste o mínimo
de interesse por ele, especialmente quando esta pessoa demonstrou
de todas as formas possíveis sua indiferença.
Mas antes que eu possa por meu plano em prática, vejo Luana
arregalar os olhos e correr para o banheiro com a mão na boca.
Merda, ela vai passar mal.
A preocupação por ela dispersa meus pensamentos e corro para
ajudá-la, por sorte a porta ficou aberta e consigo chegar até ela,
seguro seus cabelos antes que a primeira onda de vômito saia em
direção ao vaso sanitário.
Ela despeja todo o conteúdo do seu estômago até que não tenha
mais nada para sair, está sentada no chão imundo do banheiro, parece
tão frágil. Fico ao seu lado, segurando seus cabelos, depois acaricio
suas costas até ela se acalmar.
Então vejo Shirlei na porta encarando a situação com uma garrafa
de água em mãos.
— Ufa, pelo menos ela acertou o vaso. — A mulher baixinha vestida
de preto, com cabelo rosa e um batom roxo olha com pena para
Luana. — Pode ficar aí até ela melhorar, só não fecha a porta. — Ela
indica a placa que sinaliza ser o banheiro feminino e assinto com a
cabeça.
Luana se afasta do vaso sanitário e dou a descarga, fechando a
tampa, ajudo-a a se levantar do chão sujo e sentar no vaso.
Seu rosto está pálido e o batom borrado, a maquiagem escura dos
olhos escorreu com as lágrimas, mas ela continua linda.
— Você está bem? — pergunto e entrego a garrafa de água para
ela.
— Desculpa, essa é a segunda vez que vomito em sua frente — ela
responde com o semblante envergonhado.
— Tudo bem, pelo menos dessa vez você chegou até o banheiro —
brinco e consigo arrancar um pequeno sorriso dela.
— Não foi uma boa ideia beber de estômago vazio — comenta
enquanto toma a água.
— Não, Luana, não foi — retruco com raiva, porque ela não avisou
que não tinha comido nada? Poderia ter pedido um lanche na cozinha,
merda, eu deveria ter previsto isso e pedido algo para ela. — Vamos,
vou te levar para casa.
— Seu namorado não vai gostar nada disso — ela responde com
uma brincadeira, mas não estou mais com humor para esse joguinho.
— Ele não tirou os olhos de você à noite toda.
— Ele não é meu namorado e não tem que gostar de nada. — As
palavras saem mais intensas do que planejei, mas foda-se, ela é
minha prioridade. — Vem, vou cuidar de você.
Luana me encara com o olhar surpreso, mas não deixo que pense
sobre minhas palavras, passo meu braço pela sua cintura e a coloco
de pé, ela precisa se segurar em mim para conseguir andar.
Pago nossa conta rapidamente, vejo Matt me fuzilando com o olhar,
mas é Shirlei quem nos atende, espero que com isso ele entenda e
pare de me encher o saco.
Luana parece um pouco melhor depois que saímos do bar, colocar
para fora toda a bebida foi bom, mas ela está fraca e sinto suas pernas
bambas, então passo um braço por trás dos seus joelhos e pego-a no
colo, ela se assusta com o gesto, mas se segura em meu pescoço.
Por um momento seus olhos encontram os meus e sinto a mesma
conexão de antes, mas volto a olhar para frente e sigo em direção ao
nosso prédio.
Antes de entrar algo chama a minha atenção na rua, um homem
caminha logo atrás de nós, não viro o rosto diretamente para ele, mas
consigo vê-lo pelo canto do olho, ele não desvia seu olhar até que
entramos no prédio.
Passo pelo porteiro e faço sinal para os recepcionistas, que
chamam o elevador, tento olhar para trás para ver se o homem nos
seguiu, mas não tem ninguém.
Ao chegar ao nosso andar, deixo que Luana saia dos meus braços,
ela consegue ficar de pé e procura o cartão na bolsa e abre a porta.
— Obrigada — é só o que ela consegue dizer, claramente
esperando que eu vá embora e a deixe sozinha, mas isso não vai
acontecer.
— Não tem de que, mas não vou deixá-la sozinha até ter certeza de
que está bem. — Passo por ela e entro em seu apartamento, vou até a
cozinha, encho um copo com água e entrego a ela. — Aqui, você
precisa se hidratar.
Luana me olha indignada, ainda com a porta aberta, pega o copo
com água e parece não saber o que fazer. Então tomo a iniciativa,
fecho a porta e a conduzo até o sofá.
— Eu sei curar uma ressaca, Yuri, não sou nenhuma criança.
— Se realmente soubesse, teria me falado que não comeu nada
antes de ir, poderíamos ter pedido algo no bar e isso não estaria
acontecendo. — As palavras saem mais firmes do que planejei, mas
foda-se, ela tem que entender que foi irresponsável.
— Eu sei, desculpa.
— Agora tira essas botas que devem estar te matando, eu vou
procurar alguma coisa para você comer.
Luana faz o que eu mando sem contestar.
Boa garota.
Vou até a sua geladeira e como já imaginava, não tem nada além de
restos de comida velha, procuro nos armários, mas as caixas de cereal
e enlatados não são a melhor opção.
Então pego sua chave de cima da mesa e saio sem falar nada. Vou
até o meu apartamento e trago duas caixas de pizza congelada, não é
a melhor opção, mas vai dar conta do recado.
Quando volto, Luana se assusta no sofá, já sem as botas ela me
acompanha com o olhar.
— O entregador chegou. — Ergo as caixas de pizza e forço um
sorriso, mesmo estando puto por sua irresponsabilidade, me sinto
aliviado por cuidar dela. — Temos calabresa e salame italiano, qual a
sua preferida Dra. Masseria?
— Escolha difícil, senhor Saito, visto que as duas são tão diferentes.
— Ela entra na brincadeira e sorri para mim, ainda vermelha de
vergonha, mas vejo seus ombros relaxarem um pouco.
Coloco uma das pizzas no forno sem realmente ver qual, não que
importe muito, ambas têm o mesmo gosto de comida industrializada,
vou até a sala, sento na poltrona ao lado do sofá em que Luana está.
— Não precisa perder sua noite comigo, já estou melhor – Luana
fala envergonhada e me analisa com o olhar, sei que está prestando
atenção em cada movimento meu, então sorrio e relaxo no sofá.
— Fico aliviado, mas como tecnicamente as pizzas são minhas,
nada mais justo que eu fique e as coma com você — provoco com
uma piscadinha e começo a tirar as botas e o casaco de couro, ficando
mais à vontade em seu apartamento.
Ela pensa por um momento, então vai até seu quarto, quando
retorna está de moletom e sem maquiagem.
— Se vamos comer pizza, podemos assistir um filme também —
comenta enquanto liga a TV. — O que você sugere?
Recordo nossa conversa no bar e de como ela nunca viu Star Wars,
então sugiro começarmos pela ordem de lançamento, que é o quarto
filme da série, chamado Uma nova esperança.
Luana aceita com a condição que eu assista 007 contra GoldenEye,
segundo ela é um dos seus filmes favoritos. A pizza logo fica pronta e
conforme comemos os efeitos do álcool vão se dissipando.
Não conversamos durante o filme, o que eu agradeço, porque odeio
pessoas que começam a fazer perguntas enquanto tento prestar
atenção.
Minha psicóloga encara a TV atentamente e se diverte com os
personagens, porém ela está cansada, depois da metade do filme vejo
seus olhos começarem a baixar, ela pisca algumas vezes, até que
perde a batalha e pega no sono.
Acho que chega de filme por hoje, coração.
Pego Luana no colo como uma criança, ela não acorda, então a levo
até sua cama e cubro seu corpo com o cobertor macio. Logo ela
abraça o travesseiro e sorri inconscientemente.
Sinto uma vontade enorme de sentir a textura dos seus lábios nos
meus, sem conseguir me controlar, abaixo-me e a beijo. É rápido, mas
sentir seu calor faz meu coração acelerar no peito e meu pau apertar
nas calças.
Merda, Yuri, saia logo daqui antes que você faça uma besteira.
Desligo as luzes, mas antes de sair pego uma caneta que encontro
em cima da mesa da sala, meu troféu por salvá-la mais uma vez.
Devo ter dormido durante o filme e Yuri me trouxe para a cama,
porque não tenho lembranças de como cheguei até aqui. A noite foi
melhor do que o esperado, fora a parte em que vomitei e ele se sentiu
obrigado a cuidar de mim.
Acordo e agradeço por não sentir dor de cabeça, a pizza e a
quantidade de água que ele me fez beber realmente funcionaram.
Agora tenho o final de semana livre, quem sabe vou para a academia
do prédio, ou caminhar no Central Park.
Será que Yuri gostaria de ir comigo? Ele comentou ontem que não
conhece ninguém na cidade, não tinha parado para pensar nisso até
ele falar, mas talvez ele esteja sozinho.
Primeiro preciso de um banho e ir às compras, o fiasco de ontem
não pode mais se repetir. Quando voltei para o meu apartamento,
depois da morte da minha mãe, não reabasteci a despensa, estava
praticamente vivendo de Ifood.
Faço uma lista de tudo o que preciso comprar para não esquecer
nada realmente essencial e vou até o mercado. Consigo tudo o que
estou precisando e muito mais, adiciono algumas caixas de pizza
congelada ao carrinho, vou devolver para Yuri as que ele trouxe
ontem e o restante fica para emergências.
Deixei meu carro no estacionamento externo, o dia está bem frio,
mas é mais fácil de parar aqui, ao sair e começar a guardar minhas
compras no porta-malas, escuto um som fraco próximo ao pneu
dianteiro.
Abaixo-me para verificar e encontro um filhote de gato preto, todo
encolhido de frio, escorado no pneu. Ele é muito pequeno e o miado
agudo corta meu coração.
— O que você está fazendo aí, fofura, cadê a sua mãe? — Olho
para os lados à procura de alguma gata, mas não consigo ver nada,
então tiro o cachecol que estou usando e pego o gatinho no colo,
enrolando-o no tecido fofinho.
Ele mia desesperadamente enquanto tento acalmá-lo, mas assim
que está quentinho, para de gritar e se aconchega no tecido.
— Não vou deixar você nesse frio sozinho, vamos procurar sua
mãe.
Ando pelo estacionamento, olhando embaixo dos outros carros, o
filhote é realmente pequeno e não sobreviveria sozinho, então sua
mãe deve estar por perto.
Meus olhos são atraídos para algo preto no meio da rua e meu
coração aperta, é um gato atropelado. Não sei se é realmente a mãe
do gatinho, mas pode ser, e isso significa que ele está sozinho.
— Vou cuidar de você, não se preocupe — prometo para o felino
em meus braços, então pego o carro e vou até o primeiro veterinário
que encontro. Não tenho experiência com pets, nós tivemos um
cachorro quando eu era criança, mas depois que ele morreu minha
mãe não quis mais nenhum animal de estimação.
O veterinário logo nos atende e faz a primeira consulta, dando
alguns remédios para o filhotinho, ele já faz xixi e cocô sozinho, o que
é bom, mas está magro e fraco, provavelmente ficou muito tempo sem
a mãe.
Como ele é muito novinho ainda, terei que dar um leite especial até
que ganhe peso e comece a comer ração. Ainda na clínica veterinária
compro tudo o que a atendente indica, potes de ração, caixinha de
areia, a areia específica, ela me ensina como e com que frequência
fazer a limpeza.
Também aproveito e escolho uma caminha alaranjada linda, um
bebedouro automático, caixa de transporte, ração, patês e vários
brinquedos, são tantas opções que não sei o que escolher, então
pego de tudo.
Lembro do que Vivian comentou sobre não gastar meu dinheiro,
então compro tudo o que acho que o gatinho vai gostar.
Luan, o veterinário que deve ter se formado há pouco tempo,
porque tem uma carinha de bebê, também falou que é um macho, e já
me instruiu sobre os tempos para as vacinas e futura castração.
Deixo marcado o retorno e pego o telefone da clínica. Luan anotou
seu celular particular atrás do cartão, caso haja alguma emergência.
Saio de lá deixando uma pequena fortuna em itens para gato, porém
mais calma e bem instruída para cuidar do filhotinho.
Ao chegar à garagem do prédio, tiro primeiro a caixa de transporte
com o gato, quando dou de cara com Yuri estacionando do meu lado,
ele desce do veículo e vem até mim, curioso.
— Quer ajuda aí? — pergunta quando vê a quantidade de sacolas
que tenho no chão.
— Seria ótimo, vou precisar fazer umas quatro viagens para levar
tudo para cima — reclamo e o gatinho mia ao ouvir minha voz.
— Não sabia que você tinha um gato — ele comenta e me olha,
curioso.
— Não tinha, encontrei esse filhote no estacionamento do mercado,
acho que a mãezinha foi atropelada — explico e aponto para as
sacolas cheias. — Então levei no veterinário, e agora tenho um gato.
Ele me encara como se não tivesse entendido, então acena com a
cabeça e começa a reunir as sacolas maiores. Yuri me ajuda a levar
tudo para cima, precisamos fazer duas viagens.
Começo a organizar as coisas do gatinho, abro a caixinha de
transporte e deixo que saia. Ele fica assustado e não quer sair da
manta onde está enrolado, então deixo ele lá enquanto ajeito as
coisas com a ajuda de Yuri, ele guarda as compras do mercado
enquanto eu vejo onde vou pôr os itens que comprei.
— Já pensou em um nome para… ele ou ela? — Yuri questiona.
— É um macho, segundo o veterinário — respondo e sorrio, não
pensei em um nome ainda.
— Que tal Vader? — sugere e sorri para mim.
— Você realmente gosta desses filmes, não é mesmo?
— Sim, mas acho que combina com um gato preto — explica
seriamente. — E assim você será obrigada a assistir toda a sequência
para entender o personagem que deu o nome ao seu gato.
— Ou eu posso escolher um personagem que eu já conheço, assim
não preciso passar quase 15 horas em frente à TV.
Ele solta uma gargalhada alta com minha brincadeira, então
responde:
— E isso são só os seis primeiros filmes — Yuri fala, me pegando
de surpresa.
— Tem mais que seis?
— Ah, coração, você não sabe onde se meteu.
— Eu não tenho tempo ou paciência para assistir tudo isso sozinha.
— Mas você não está mais sozinha — Yuri contesta com uma
piscadinha e fico sem palavras. Ele percebe minha confusão e
complementa: — Agora você tem um gato.
— É verdade — respondo rapidamente, mas sinto que estou
ficando vermelha.
— E não tem graça nenhuma assistir Star Wars sem ter alguém
para debater as teorias que irão surgindo pelo caminho, por isso me
disponibilizo a fazer esse grande sacrifício e te acompanhar nesta
jornada.
Ele parece estar falando sério, então penso um pouco sobre o
assunto, já ia convidá-lo para caminhar comigo, mas agora com o
filhotinho, tenho que preparar o leite e amamentar o bichinho, não
posso deixá-lo sozinho em casa.
— Se não tiver planos para o final de semana, podemos começar
hoje mesmo. — Yuri praticamente tira as palavras da minha boca,
fazendo-me sorrir para ele e aceitar a maratona.
— Combinado, vou preparar o almoço e depois podemos continuar
de onde paramos no primeiro filme — sugiro.
— Você quer dizer, de onde você dormiu? — provoca, com um
sorriso de canto.
— Ou um pouco antes, não lembro muita coisa.
Com isso vou até o gatinho, que resolvi aceitar a sugestão de Yuri e
chamar de Vader. A bolinha de pelos continua dormindo, então
resolvo cozinhar um macarrão à bolonhesa para nós.
Pego os ingredientes que preciso e começo a lavar e cortar os
legumes, estou concentrada na tarefa e levo um susto quando Yuri se
aproxima silenciosamente e seu braço toca no meu.
— Posso ajudar com alguma coisa? — oferece com a voz grossa.
— Não precisa, mas se quiser escolher o vinho para acompanhar o
almoço, a senha da adega é 4789, o decanter e o abridor estão no
balcão.
— Sem ressaca hoje? — implica, mas vai até a adega e começa a
ler os rótulos dos vinhos especiais. — Você tem garrafas premiadas
aqui. — Yuri me olha com curiosidade.
— Ganhei algumas de pacientes, outras trouxe da casa dos meus
pais depois que eles faleceram — explico normalmente, mas meu
peito aperta ao falar sobre eles, então volto a picar os temperos, logo
meus olhos se enchem de lágrimas.
Yuri percebe a mudança, posso sentir seu olhar em mim.
— Você está bem?
— Sim — respondo com a voz fraca, sinto o aperto na garganta e
sei que as lágrimas não são da cebola. — Meus pais faleceram há
pouco tempo, ainda é difícil lembrar deles.
— Meus pêsames, Luana — Yuri responde mecanicamente e sinto
uma frieza em suas palavras, olho mais atentamente em sua direção,
ele continua lendo os rótulos dos vinhos e, diferente de outras
pessoas, não pede mais detalhes ou tenta me consolar.
O que é bom, não quero falar sobre isso no momento.
Ele comentou que perdeu os pais muito novo, também disse que
não tem família ou amigos aqui, sua reação fria pode ser por não ter
familiaridade com isso.
Quando mais penso nisso, mais percebo o quanto Yuri está
sozinho, assim como eu.
Volto a me concentrar no almoço e uma hora depois está tudo
pronto, Yuri escolheu um Cabernet Sauvignon para acompanhar o
macarrão, decantou e serviu duas taças.
Ele fala sobre o filme e em que parte peguei no sono, então estou
atualizada com o enredo. Assim que terminamos de comer, Vader
acorda e começa a miar desesperadamente, finalmente saindo da
caixinha de transporte.
— Deixa que eu lavo a louça e você cuida dele — Yuri sugere, já
recolhendo os pratos e arrumando a bancada onde almoçamos.
— Obrigada — agradeço e corro preparar o leite especial para
gatos da forma que o veterinário mandou, coloco na mamadeira
especial e pego Vader no colo.
Assim que ele sente o gosto do leite, começa a sugar a com
ferocidade, deve estar morrendo de fome. Nunca me imaginei com um
animal de estimação, antes estava sempre fora de casa, entre o
trabalho e a casa dos meus pais, vinha só para dormir, e olhe lá.
Quando estava casada, ele era alérgico e dizia que ter um animal é
muita responsabilidade, mas me pressionava para ter filhos, como se
uma criança não fosse um compromisso vitalício, enfim a hipocrisia.
Vader termina de mamar, coloco-o no cercadinho que preparei no
canto da sala, onde estão a caixa de areia e todo o restante das
coisas dele.
O veterinário instruiu a delimitar seu espaço no começo, assim ele
aprende onde fazer suas necessidades, e conforme for crescendo
pode ter mais liberdade pela casa.
Yuri já está no sofá com o controle em mãos, procurando o filme,
então vou até o quarto, coloco uma camiseta, uma calça de moletom
e uma meia grossa, pego um cobertor e levo junto até a sala.
Abro a parte de baixo do sofá maior, transformando-o quase em
uma cama, organizo as almofadas e jogo a coberta. Sento
confortavelmente e aceito a taça de vinho que Yuri me entrega. Ele
desliga as luzes e, para minha surpresa, senta na poltrona ao lado do
sofá.
— Aqui está bem mais confortável do que essa poltrona dura —
comento, indicando o lugar ao meu lado. Ele sorri e aceita o convite,
sentando-se tão próximo que posso sentir o calor do seu corpo.
Foca no filme, Luana.
É o que tento fazer nas horas que seguem, mas posso jurar que
quando o primeiro filme termina, Yuri está ainda mais próximo e não
consigo mais ignorar sua presença.
Fica ainda mais difícil quando ele tira o casaco e fica só de
camiseta, esses braços malhados e as mãos grandes atraem meu
olhar, minha mente viaja para lugares perigosos ao imaginar suas
mãos em mim, me tocando, fazendo-me tremer de…
Acordo assustada e percebo que estava dormindo, sinto uma mão
acariciando meu cabelo e noto que estou deitada no colo de Yuri.
Merda, merda, merda…
Só espero não ter falado enquanto dormia, por favor, se existe
alguma divindade, diga que não falei enquanto dormia…
— Acho que precisamos de energético, e não de vinho, para
acompanhar o filme — Yuri fala e saio do seu colo rapidamente,
sentando-me mais afastada no sofá, sinto meu rosto queimar e sei
que estou ficando vermelha.
— Desculpa. — Levanto-me e vou até a cozinha em busca de
água.
— Tudo bem, eu gosto de ver você dormir. — Suas palavras me
pegam de surpresa, mas o que me faz tremer é aquele olhar matador
e o sorriso de molhar calcinha, que me deixa ainda mais
envergonhada.
Levanto e vou checar o Vader, que está dormindo na caminha que
comprei para ele, abro a cortina da sacada e deixo o sol entrar, depois
de dias nublados, a claridade e calor é bem-vinda.
— O sol está lindo hoje — comento e lembro que iria convidá-lo
para caminhar. — Você gostaria de dar uma volta no Central Park?
Yuri surge do meu lado, tão silencioso que nem ouvi seus passos
até sentir sua presença muito próxima a mim, viro para o lado e
encontro seus olhos castanhos fixos em meu rosto.
— Boa ideia — ele responde. — Vou me trocar, passo aqui em
quinze minutos.
— Combinado.
Coloco uma roupa térmica de ginástica e um sobretudo, apesar de
ter sol, a temperatura marca 2°C. Preparo mais uma mamadeira para
Vader e dou para ele antes de sair. Deixo o filhote no cercadinho com
tudo o que ele precisa, mas não pretendo ficar fora mais que duas
horas.
Como combinado, Yuri toca a campainha exatamente quinze
minutos depois e vamos juntos até a garagem, ele insiste em usarmos
seu carro, mesmo eu tentando convencê-lo de que conheço mais da
cidade.
O parque está cheio de pessoas correndo, caminhando ou só
sentadas aproveitando o dia com suas famílias, respiro o ar gelado e
deixo que o calor do sol aqueça meu corpo. Faz muito tempo que não
faço algo assim, minha rotina se tornou fria e mecânica.
Lembro de quando vinha aqui com minha mãe. Depois que meu pai
conseguiu comprar uma casa para nós em State Island e saímos do
subúrbio do Brooklyn, a vida mudou muito para melhor, especialmente
quando Alphonse se tornou Capo e o promoveu a chefe de
segurança.
Depois disso dinheiro não foi mais um problema em nossa casa,
mesmo que para isso meu pai passasse mais tempo fora do que com
a gente.
Tudo o que ele fez na vida foi para me dar conforto, estudei nos
melhores colégios, fiz todos os cursos que tive interesse, passei na
melhor universidade da cidade, tudo isso sem precisar dividir meu
tempo entre estudo e trabalho.
Só comecei realmente a trabalhar quando fui fazer os estágios
obrigatórios e depois de formada, mas mesmo assim dinheiro nunca
foi uma preocupação, ganhei meu primeiro carro quando fiz dezesseis
anos e o apartamento com 21, quando decidi que estava na hora de
sair da casa dos meus pais e morar sozinha.
Mesmo assim, minha mãe me visitava toda semana e reabastecia a
geladeira e os armários, para falar a verdade, ela cuidou de mim até o
último dia de sua vida.
Sinto tanto a falta deles, da risada da minha mãe, do abraço
apertado do meu pai, ainda dói saber que nunca mais sentirei suas
presenças assim.
— Um centavo pelos seus pensamentos. — A voz de Yuri ao meu
lado me assusta e tento sorrir para ele, mas sinto meus olhos
embaçados pelas lágrimas contidas e a garganta apertada — Você
está com o rosto estranho, quer fazer outra coisa? Podemos só sentar
em um banco e observar o lago.
— Desculpa, estava só lembrando dos meus pais — respondo e
continuo caminhando. Yuri me encara pensativo, mas novamente não
pede por mais detalhes. — E preciso me exercitar um pouco,
consumava fazer academia pelo menos três vezes por semana.
— Também estou precisando, voltei semana passada a me
exercitar na academia do prédio, mas ela não é muito equipada — ele
comenta e lembro de suas fotos no Instagram.
— Não, só temos o básico no prédio, mas tem uma academia muito
boa a duas quadras de onde moramos — comento, lembrando do
lugar que frequentava um tempo atrás.
— Gosto de treinar, mas do que realmente sinto falta são as aulas
de jiu-jitsu.
— Se não me engano eles têm algo assim lá, vi várias pessoas
usando o mesmo quimono que você veste nas fotos do Instagram. —
Na hora que as palavras saem eu me arrependo, merda, agora ele vai
saber que andei fuçando seu perfil.
— Você viu meu Instagram, é? — O sorriso convencido em seu
rosto confirma o que eu temia. — E posso saber por que não me
seguiu?
— Bem, não acho que seja apropriado, sabe… sou sua chefe… —
Me enrolo com a explicação. — Não queria que achasse estranho.
— Visto que já participei de dois porres seus e você já me viu
cantar, acho que não tem porque ter algo estranho em sermos amigos
nas redes sociais. — Ele encosta o braço no meu, chamando a
atenção para seu olhar. — Você é a única pessoa que conheço nesta
cidade.
Ah, merda, esse olhar de cão sem dono me mata, reconheço essa
solidão e quero abraçá-lo.
— Você precisa fazer mais amigos da sua idade, e não andar por aí
com uma velha de 42 que não consegue mais segurar os próprios
porres — brinco com ele, mas ele não ri, ao invés disso me encara
com seriedade.
— Prefiro a sua companhia a qualquer outra, Luana — A voz
grossa está carregada de confiança e faz meu coração acelerar.
Puta que pariu, porque ele fala isso?
— Logo você se enturma com o pessoal da academia e vai estar
rolando no tatame com outros homens tão gostosos e malhados
quanto você. — Que merda eu estou fazendo hoje? Assim que
termino a frase Yuri solta uma gargalhada alta e várias pessoas viram
o rosto para nos olhar.
Eu acabei de chamá-lo de gostoso, puta que pariu, preciso parar de
falar.
— Gostoso e malhado, é? Acho que sei qual foto chamou sua
atenção. — Ele continua rindo e eu fico cada vez mais vermelha. —
Não precisa ficar com vergonha, sei que sou um gostoso, quer dizer,
olha para esses braços. — Yuri para no meio do caminho e começa a
flexionar os músculos, a camisa térmica preta colada no corpo se
estica quando ele faz pose.
Não me controlo e começo a rir dele, várias pessoas passam por
nós e encaram a situação, um homem se exibindo como se estivesse
em uma apresentação de fisiculturismo e uma mulher se dobrando de
rir.
— Chega — imploro, secando as lágrimas. — Nesse ritmo não
vamos caminhar nem dois quilômetros.
— Desculpa, eu me empolgo quando estou mostrando meu
CORPO GOSTOSO E MALHADO — ele grita as últimas palavras e
me faz gargalhar.
Não lembro qual foi a última vez que ri tanto, a ponto de chorar e
ter que prender o xixi para não me mijar nas calças. Sua companhia é
diferente, ele tem a presença marcante, mas me sinto leve e segura
ao seu lado.
Mesmo assim, algo no fundo da minha mente diz para eu me
afastar, não dou ouvidos à essa voz, não hoje, afinal ele não tem
interesse em mim dessa forma, então não pode me machucar.
Caminhamos mais uma hora, conversando e rindo o tempo todo,
meu relógio digital marcou três quilômetros quando resolvemos voltar
para casa.
— Obrigada pela companhia — falo enquanto abro a porta do meu
apartamento. — Estava precisando de umas boas risadas.
— Você não vai se livrar de mim assim tão fácil, Luana — A voz
grossa e provocativa de Yuri me faz tremer, então viro-me para
encontrá-lo muito próximo, com uma mão no batente da porta, seu
rosto está a centímetros do meu e ele levanta suavemente meu
queixo, forçando-me a olhar para cima e encontrar seus olhos escuros
e intensos. — Farei o possível para vê-la sorrir mais vezes, mas agora
ainda temos cinco filmes para assistir.
— Você quer continuar a maratona? — pergunto, mas estou
dominada pela sua presença, posso sentir sua respiração quente e o
cheiro de homem suado, meu coração quase pula do peito com o
toque da sua mão.
— Só preciso de um banho, logo estarei de volta — ele responde e
tenho certeza que molhei a calcinha, porque com as suas palavras
minha mente é dominada por imagens dele embaixo do chuveiro, a
água quente descendo por seu corpo, as mãos grandes massageando
os cabelos compridos e molhados…
ACORDA, LUANA, CRIA VERGONHA NESSA CARA.
— Precisa mesmo — falo sem pensar —, quer dizer, também
preciso. — Tento me corrigir, mas ele já está com um maldito sorriso
no rosto — Então vamos tomar banho, depois…
— Isso é um convite? — provoca, mas antes que eu consiga ficar
mais vermelha, ele solta meu rosto e se afasta sorrindo. — Estou
brincando, pode respirar agora.
Só depois que ele fala, solto o ar dos pulmões e percebo que
estava segurando o ar. O que esse homem está fazendo comigo?
Yuri abre o próprio apartamento e entra sem falar mais nada,
deixando-me parada em minha porta, os joelhos bambos, a boceta
encharcada e o coração disparado.
O miado exigente de Vader me tira do transe, preciso parar de
pensar nele dessa forma, isso é tudo tesão acumulado, desde o cara
de pau pequeno, não transei com mais ninguém.
Além disso, ter orgasmos quase todos os dias pensando no
secretário só pode confundir minha cabeça mesmo. Como vou manter
meu pensamento limpo ao lado dele, se à noite grito de prazer
imaginando aquela boca chupando meu clitóris, os dedos grossos me
penetrando enquanto ele me olha e…
Preciso de um banho frio urgentemente.
Tento dar mamadeira para Vader, mas ele não toma muito e
continua miando, o que ele quer agora?
Tento mostrar os brinquedos espalhados no cercado, mas ele não
se interessa, então pego o gatinho no colo, ele se agarra com toda a
força ao meu casaco e se aninha na curva do pescoço, só então os
miados agudos e desesperados param e ele começa a ronronar.
É tão fofo que não tenho coragem de afastá-lo dali, deito no sofá
ainda com a roupa de ginástica e suada até que a campainha toca,
abro a porta e Yuri me olha dos pés à cabeça.
— Achei que ia tomar banho — comenta com o olhar curioso,
entrando no apartamento, só então vejo que trouxe uma sacola com
latas de energético e barras de chocolate. — Para manter uma certa
pessoa acordada — alfineta, enquanto coloca as coisas na geladeira.
— Poderia ficar com ele enquanto tomo um banho rápido? — peço
e aponto para Vader, que continua deitado em meu ombro. — Se
tento colocá-lo de volta no cercado ele grita, já dei comida e tudo,
acho que ele quer contato físico e carinho.
Yuri me encara como se não estivesse entendendo o que estou
falando, mas pega o gatinho, que parece ainda menor em suas mãos
grandes. Vader volta a miar e se contorcer em suas mãos, então
indico o sofá. Quando Yuri senta, cubro-o com a coberta e coloco
Vader em seu peito.
— Faça carinho nele, assim ele se acalma — ensino e Yuri passa a
mão na cabeça do gatinho, um pouco desajeitado e com o olhar
receoso.
Saio antes que ele mude de ideia e corro para tomar banho. Quinze
minutos depois estou de volta em um conjunto de moletom vermelho e
uma pantufa branca quentinha nos pés. Quando retorno para a sala,
Yuri continua na mesma posição e Vader está deitado em seu colo.
Vou até a cozinha e faço uma bacia de pipoca, pego dois copos
com gelo e encho com o energético que ele trouxe, talvez assim
consiga me manter acordada.
— Pronta para continuar a maratona? — ele pergunta quando volto
e sento no sofá ao seu lado.
— Agora sim, vou levar como um desafio pessoal assistir esses
filmes até que o final de semana acabe.
Yuri sorri para mim e o segundo filme começa, penso em tirar Vader
do seu colo, mas não quero acordá-lo, então coloco a pipoca entre
nós e foco meu olhar na TV.
É isso, a bacia fazendo uma barreira e o filme silenciando minha
mente, talvez assim consiga parar de pensar no maldito SAMURAI
SARADO ao meu lado.
Luana bem que tentou disfarçar a atração que está sentindo por
mim, mas a cada pouco tempo seu olhar desviava da tela da TV e
vinha parar em meu peito, braços, mãos e rosto.
Claro que não deixei de provocá-la, ela é linda demais quando fica
vermelha de vergonha, então encarei suas olhadelas e abri meu
sorriso mais matador. Eu sei o efeito que causo nas pessoas, ela não
é especial por reagir assim ao meu charme.
Passamos o final de semana todo juntos, no sábado à noite fingi
pegar no sono no sofá para ver o que Luana faria, se ela me
acordasse e falasse para ir embora, é porque ainda não confia em
mim, porém ela só me cobriu e deixou que eu ficasse em seu sofá.
Isso significa que estou no caminho certo, consegui conquistar sua
confiança. No domingo tomamos café juntos e fomos para a academia
do prédio. Ao meio-dia fiz um yakissoba especial para ela, é uma das
minhas melhores receitas e Luana aprovou.
À tarde assistimos o restante dos filmes de Star Wars, ela estava
empolgada depois que começou a entender o enredo todo.
O gato foi uma surpresa, eu não odeio animais, mas não consigo
entender a fascinação das pessoas por eles, nunca senti uma
conexão especial com qualquer tipo de bicho de estimação.
Se fosse eu a encontrar o filhote, não levaria para casa, isso tenho
certeza. Não sentiria pena por ele estar sozinho ou algo assim, como
ela sentiu, talvez só tivesse tirado ele do caminho e seguido em
frente.
Nunca cheguei a matar ou torturar animais por diversão, não vejo
motivos para isso, mas também não sinto uma urgência em cuidar
deles ou ter a sua companhia.
Apesar disso, foi bom passar um tempo com Luana, me poupou de
ficar dois dias vigiando as câmeras de segurança, seu celular e GPS.
Estando ao seu lado consigo segui-la para todos os lugares sem
precisar me esconder.
Eu gosto do jogo, de acompanhar seus passos sem que ela saiba
que estou espionando-a, porém é bom mudar, assim não fica
enjoativo.
E brincar com seus sentimentos é muito mais interessante, posso
manipulá-la como bem entender, mas ainda preciso tomar cuidado
para que não se aproxime muito.
Essa é a parte mais intrigante, já que ela é uma psicóloga e eu um
psicopata, enganá-la é a prova de que sou superior.
Agora estou curioso para ver como ela irá se comportar quando
chegar à clínica. Pelos GPS do seu carro e celular, ela está entrando
agora na garagem.
Coloquei meu melhor terno cinza escuro, a gravata azul que
sempre que uso e Luana olha com aprovação em todas as vezes,
comprei croissants e café na padaria e estou aguardando minha chefe
chegar.
O elevador abre as portas e ela entra, com uma saia risca de giz
preta, camisa social branca e um lenço azul amarrado no pescoço, ela
caminha confiante em seu salto alto, vindo em minha direção, mas
vejo a tensão em sua postura.
— Bom dia. — Abro meu melhor sorriso para cumprimentá-la,
entrego seu café e pego o casaco de suas mãos.
Ela responde rapidamente, agradecendo o café, mas desvia o olhar
e passa diretamente para a sua sala, vejo aquela bunda redonda e
marcada na saia rebolar em minha frente.
Gostosa pra caralho!
Pouco tempo depois Luana me chama para passar a agenda da
semana e confirmar os compromissos, como de costume. No
consultório ela volta a ser a chefe comprometida com seus pacientes
e quase solto uma gargalhada ao lembrar da mulher do final de
semana, jogada no sofá, discutindo comigo sobre Darth Vader ser um
psicopata.
Ah, coração, se você realmente soubesse que psicopatas não são
somente os assassinos e vilões dos filmes…
Quando terminamos de repassar os compromissos, fazemos uma
pausa para comer os croissants e vejo seu celular vibrar em cima da
mesa, mas ela encara o aparelho de canto e não abre as mensagens.
Estranho, o telefone vibra insistentemente, alguém está tentando
entrar em contato com ela com urgência. Resolvo sair da sala com a
desculpa de ter que responder alguns e-mails, mas vou ver quem é
pelo programa espião.
“Terra para Luana, amiga, quero saber como foi o karaokê.”
Tinha que ser Vivian, reparo que ela havia mandado mensagem
durante o final de semana também, mas Luana desviou de suas
perguntas. Parece que a mulher não vai aceitar ficar sem resposta.
“Se você não me falar
agora, pego o primeiro voo até
New York e tiro essa
informação de você
pessoalmente.”
“Foi legal.”
Luana responde e quase solto uma gargalhada, Vivian não vai se
contentar com isso.
“Isso só me diz que
aconteceu alguma coisa, conta
logo mulher, estou ficando
preocupada.”
“Você quer saber? Lá vai então.
Bebi de estômago vazio, vomitei tudo,
ele cuidou de mim, me levou para casa
e acabamos comendo pizza e
assistindo Star Wars no sofá.”
Resumiu bem, porém esqueceu a parte em que você ficou
molhadinha pelo seu secretário.
“Isso nem é ruim, achei que
você tinha finalmente dado uns
beijos no Samurai Gostoso.”
“Você está louca? Ele é meu
secretário, Vivian, e está confirmado
que é gay. Lembra daquele garçom do
bar que sempre atende a gente com
um sorriso no rosto, mas nunca flerta
de volta?”
Então ela já tentou flertar com o Matt, essa é novidade, está tão na
cara que ele é homossexual.
“Nem me fale, cansei se ser
ignorada por aquele pedaço de
mal caminho.”
“Acho que ele e Yuri têm alguma
coisa, o homem passou a noite me
fuzilando com o olhar e tentou marcar
território, chamando Yuri de
namorado.”
“Nossa, e o que o Samurai fez?”
“Ele desviou, acho que não estão na
mesma sintonia, durante o final de
semana Yuri não falou nada sobre o
garçom.”
“COMO ASSIM, DURANTE O FINAL DE SEMANA?”
Posso imaginar o grito de surpresa de Vivian ao ler a mensagem,
agora Luana não tem escapatória.
“Bem, digamos que nós passamos o
sábado e o domingo juntos, ah, e eu
adotei um gatinho.”
“Safada, você adotou um
tigre, isso sim, e esse felino vai
te comer todinha.”
“Não estou falando do Yuri, se bem
que não me importaria nada em ser
comida por ele, adotei um gatinho
mesmo, o nome dele é Vader.”
Luana envia uma foto do filhote de gato de olhos amarelos, para
provar seu ponto.
“Eu sabia que não
demoraria muito para você
virar a louca dos gatos, mas
realmente é uma fofura, eu
sou a madrinha, hein, vou
enviar um presente para ele.”
Então elas começam a falar sobre o gato e perco o interesse no
assunto.
A manhã termina e vou até a sala dela para confirmar o almoço,
mas Luana já está com a chave do carro em mãos.
— Ah, Yuri, essa semana não poderei almoçar fora, o veterinário
falou que Vader precisa se alimentar em curtos períodos de tempo,
então vou aproveitar o meio-dia para passar em casa.
— Tudo bem — respondo, penso em oferecer companhia, mas ela
já está saindo na minha frente, parece até estar me evitando.
Acompanho sua localização pelo GPS e depois pelas câmeras da
garagem, instalei pontos complementares e agora tenho a visão
completa.
Droga, almoçar sozinho não é tão interessante. Saio do prédio e
vou para o restaurante italiano ao lado, a essa hora as ruas estão
lotadas de gente, consigo uma mesa e peço o de sempre.
Quando a comida chega, foco minha atenção na imagem de Luana
sentada em sua cozinha, comendo sushi e rindo de algo que o gato
está fazendo na sala.
Queria estar lá com ela.
Com este pensamento, desvio minha atenção do celular e sinto o
olhar de alguém em mim, calmamente vasculho o ambiente e vejo um
homem de meia idade, alto, não muito forte, cabelo escuro com fios
grisalhos, barba bem feita, vestido com um terno não muito luxuoso. O
estranho finge ler algo no tablet em suas mãos, mas seu olhar desvia
para mim de tempos em tempos.
Merda, quem é esse cara?
Termino meu almoço e vou até o banheiro do restaurante para
descobrir o que ele vai fazer, quando retorno o homem não está mais
em seu lugar. Olho em volta e não o vejo em lugar algum.
Bem, pode ter sido só impressão minha, ou ele estava interessado
em mim de outra forma. Decido usar o restante do meu horário de
almoço para caminhar até o Central Park, que fica a duas quadras
daqui.
No caminho tenho a mesma sensação de ser vigiado, não olho
para trás, vou até um banco e sento na sombra, como tantas outras
pessoas ali, tentando ter algum contato com a natureza em meio à
grande cidade de pedra.
Não demora muito e vejo o mesmo homem do restaurante sentado
em um banco mais distante de mim. Claramente estou sendo vigiado,
mas quem é o desgraçado?
Checo a localização de Luana e percebo que ela já saiu de casa,
então volto para o consultório, mas antes de entrar, vasculho a
garagem do prédio comercial para garantir que não tenha mais
ninguém aqui quando ela chegar.
Ao sair do parque, o estranho já tinha desaparecido, porém antes
de subir ao escritório dou uma olhada rápida ao redor, mas não o vejo.
A tarde passa normalmente, entre receber os pacientes e minhas
outras funções, fico bem ocupado. Mesmo tendo escutas na sala de
Luana, não ouço o que falam durante os atendimentos, meu interesse
nos problemas das pessoas é praticamente zero.
Luana resolve acabar o expediente ao mesmo tempo que eu, por
causa do gato que a espera em casa, isso pode ser bom.
Futuramente podemos vir juntos trabalhar, assim posso garantir que
ela esteja segura ao meu lado.
Minha chefe passou o dia todo evitando falar comigo de qualquer
forma que não fosse profissional, então não forcei, até gostei de
perceber seu descontrole toda vez que eu entrava na sua sala.
Ela reage à minha presença intensamente, posso sentir, é como
uma presa atraída pelo seu caçador, agora mesmo, fechados no
elevador, sei que seu coração bate mais rápido que o normal e sinto a
sua respiração acelerada.
Ela está na minha frente, olhando para as portas metálicas,
segurando a pasta com documentos em frente ao corpo, como
proteção. A tensão é palpável no lugar fechado.
Me abaixo e finjo amarrar o cadarço, só para me aproximar
sorrateiramente dela, meu rosto está tão próximo das suas pernas
que posso sentir seu cheiro. Ela se mexe e troca o peso de um pé
para o outro, apertando as coxas, mas não se move do lugar.
Ao me levantar, fico propositalmente mais próximo dela, ouço o
suspiro que Luana solta e vejo-a apertar a alça da sacola. Minha
querida psicóloga está completamente atraída por mim.
Quero sorrir com este pensamento, mas o elevador chega à
garagem e ela sai, praticamente correndo, em direção ao seu carro.
— Luana — chamo sua atenção antes que ela entre no veículo,
caminho lentamente até ela e me escorro na lateral do automóvel. —
Estava pensando em conferir a academia que você me indicou,
gostaria de ir comigo?
Ela me encara com surpresa, mas logo se recompõe antes de me
responder.
— Preciso ir para casa.
— Lembro de alguém me falando que queria voltar a fazer
exercícios, eu também não gosto de ir sozinho, então pensei que
poderíamos nos motivar juntos. — Ela não vai recusar, ainda mais
quando abro meu melhor sorriso e fixo meu olhar no seu.
— Então, tem o Vader e…
— Isso é desculpa, doutora — interrompo. — Vamos, vai te fazer
bem, se quiser pode lutar comigo.
Sua reação de espanto me faz rir, e consigo arrancar um sorriso
lindo dela.
— Esportes de contato físico não são minha praia, mas acho que
você tem razão, preciso voltar a me exercitar — ela finalmente
concorda e relaxa um pouco.
— Combinado, passo na sua porta em uma hora. — Viro de costas
e vou até o meu carro, mas antes de entrar lanço meu melhor sorriso
para ela e falo: — Não vejo a hora de ver você pegando pesado.
Não espero uma resposta, entro no meu carro e saio da garagem,
com uma última olhada vejo Luana ainda parada com a porta aberta,
olhando fixamente em minha direção.
Foi uma provocação baixa, eu sei, mas não consegui me controlar,
adoro deixá-la vermelha de vergonha e sem palavras. E só de pensar
em Luana com as roupas de academia coladas ao corpo, deixando
aquelas curvas deliciosas à vista, meu pau já está duro como pedra.
Pratico jiu-jitsu desde a faculdade, quando meu período de
descontrole chegou ao ápice e senti a necessidade de extravasar. Por
sorte um dos meus professores no curso de contabilidade viu algo em
mim e me levou para a sua academia.
Foi então que fiquei obcecado pelo esporte que usa o corpo como
instrumento de combate, beneficiando-se da energia do oponente
para derrotá-lo.
A característica fundamental do jiu-jitsu é a grande necessidade de
domínio e equilíbrio do próprio corpo, é uma arte suave e utilizada
principalmente como autodefesa.
Sou mestre faixa vermelha e preta, mas nunca me envolvi em
competições sérias, geralmente só praticava na academia em
Chicago e nas competições internas, meu maior desafio pessoal é
conseguir parar antes de realmente matar meu oponente.
Pesquisei sobre o lugar que Luana indicou e eles têm um bom
programa de treinamento, com professores experientes e vários
alunos faixa preta, o que é bom, significa que terei com quem treinar
para valer, sem precisar me controlar com pessoas menos
qualificadas.
Como eu imaginei, Luana está incrivelmente gostosa em um
conjunto de legging e top azul marinho, sua bunda grande e os peitos
cheios ficam ainda mais evidentes com as roupas coladas ao corpo.
Não consigo me segurar e a encaro dos pés à cabeça, sinto minha
boca salivar e mordo o lábio inferior, respirando fundo para me
controlar. A maldita psicóloga fica com os mamilos duros quando meu
olhar passa por seus peitos.
Gostosa pra caralho!
Quando meus olhos sobem até os seus, tem um sorriso no canto
da boca, ela percebe minha avaliação, quem sabe com isso pare de
pensar que sou homossexual.
Droga, não!
Ela precisa pensar isso para me deixar entrar, você só vai provocála, Yuri, não é para comer a psicóloga de verdade.
— Aparentemente a quarentona aqui ainda consegue chamar
atenção — Luana brinca e fecha o casaco, cobrindo-se antes de
trancar a porta do apartamento.
— Desculpa. — Não me arrependo de nada, mas é o que ela
espera que eu fale.
— Tudo bem. — Ela pisca para mim e vamos até o elevador. —
Faz bem para a minha autoestima.
— Jamais poderia imaginar que você tem problemas com isso,
doutora — provoco, Luana é uma mulher forte e confiante.
— Não é sempre, mas a sociedade exige padrões impossíveis e
inalcançáveis, especialmente quando não se pode parar o tempo e
continuar uma menina de 22 anos para a vida toda.
— Ainda bem, já pensou se o mundo fosse povoado
exclusivamente por crianças de 22 anos que se acham maduras o
suficiente para a vida adulta, mas não têm nem ideia do que significa
viver?
— Realmente seria um inferno — ela concorda. — Eu teria ainda
mais trabalho.
— Não acho que esteja faltando agora. — Sorrio para ela. — Afinal
uma profissional com as suas credenciais é bem requisitada, você tem
noção da fila de espera para uma consulta com você?
— Estudei e batalhei muito para ser reconhecida — Luana
responde com orgulho e seriedade. — Gostaria muito de poder
atender a todos que me procuram, mas é impossível.
— Você tem razão, e sua lista de indicações para outros
profissionais é bem útil.
Conversamos durante o caminho até a academia, nós vamos a pé,
já que é perto. Eu passei no lugar antes para avaliar o ambiente, fiz
um tour com uma moça animada demais e que não parou de rebolar a
bunda na minha frente.
Era gostosa, tenho que admitir, mas só de pensar nela gritando
com aquela voz fina e irritante enquanto eu a comia por trás, já me
desanimou.
Por sorte não é a mesma mulher daquele dia que está na recepção,
um homem na casa dos quarenta, de pele bem escura, muito alto e
forte vem nos atender.
Ele olha para mim por apenas um segundo quando abro a porta
para Luana entrar, depois sua atenção está completamente nela.
— Quem é viva sempre aparece — ele fala e abre um sorriso
branco e charmoso para a mulher à minha frente, então sai de trás do
balcão e me surpreende ao envolver minha psicóloga em um abraço
íntimo e apertado.
Quero pular no pescoço do maldito, mas ele tem uns bons cinco
centímetros a mais que eu, é muito mais forte, e não está
machucando-a.
Se controla, Yuri.
— Como você está, querida? — o homem pergunta enquanto suas
mãos seguram Luana pela cintura. — Espero que tenha recebido as
flores, infelizmente não pude estar presente no enterro.
— Recebi sim, obrigada, Samuel — Luana responde e posso jurar
que ela fica um pouco vermelha e desvia o olhar. — Não tem porque
se desculpar.
— Gostaria de estar lá por você, mas precisei viajar naquela
semana e não consegui reagendar. — Ele só pode estar tentando
puxar o saco, ninguém pede tantas desculpas assim por nada.
— Eu imagino que a vida esteja uma loucura, quantas academias
são agora? — Luana questiona e, com um passo para trás, sai dos
braços do homem.
— Cento e duas, você acredita? — Samuel responde com orgulho.
— Mas se você está aqui, é porque finalmente vai voltar a movimentar
esse corpo.
Ele se afasta ainda mais e descaradamente avalia Luana dos pés à
cabeça, com um sorriso provocativo no rosto.
— Sim, Yuri não me deu escapatória. — Luana parece finalmente
lembrar que estou aqui e isso me deixa puto. — Desculpa, esqueci
meus modos em casa. Samuel, este é Yuri, meu vizinho e secretário
— ela me apresenta e dou um passo à frente, colocando meu corpo
intuitivamente em sua frente e encarando o homem com confiança. —
Samuel é dono desta rede de academias e um amigo de longa data.
Amigo, é? Pela interação entre eles tenho certeza que já foram
muito mais que isso, e o olhar de Samuel indica que ele ainda tem
interesse nela.
— Prazer — cumprimento o homem com um aperto firme, só para
ter meus dedos praticamente esmagados. Guerra de testosterona,
odeio isso, não preciso ser o mais forte fisicamente para ganhar, afinal
esse jogo já é meu.
— Obrigado por tirar esta daí de casa — Samuel agradece, agora
com um sorriso falso em minha direção, vejo sua postura mudar e ele
fica ainda mais alto, está tentando marcar território. Vai mijar no chão
também?
Controlo o riso que tenta escapar, ele pode ser grande e
musculoso, mas não tem chances contra mim, afinal é exatamente por
isso que meu esporte é jiu-jitsu, não preciso ser o maior cara em uma
luta, ou o mais musculoso, é só saber usar a força do adversário
contra ele mesmo.
— Então, o que você está fazendo na recepção? Continua tão pão
duro que prefere fazer o trabalho todo sozinho? — Luana fala
brincando, ela é perceptiva e claramente está tentando dissipar os
hormônios do ambiente.
— Quatro funcionários estão com gripe esta semana, e um se
demitiu sem aviso, mas só estou cobrindo enquanto a Mandy não
chega para o turno da noite.
— Não é fácil ser o chefe — Luana responde e sorri para ele.
— Você sabe que não, mas vamos começar, então, ela logo deve
estar voltando e posso acompanhar vocês no treino, ainda tenho a
sua ficha aqui, mas é bom atualizá-la.
— É necessário, não consigo fazer o treino de oito meses atrás.
— Você já tem cadastro, Yuri? — Samuel pergunta.
— Preenchi os formulários quando fiz a visita — respondo
confiante.
— Certo, vou abrir o sistema e liberar a entrada de vocês, então
podemos começar a musculação. — Samuel vai até o computador.
— Eu estou aqui pelas aulas de jiu-jitsu, se não me engano tem
uma em quinze minutos — falo e ele assente com a cabeça.
— Ah, sim, sua ficha está em ordem aqui, pode passar, os
vestiários ficam na primeira porta à direita e a aula é na sala de vidro.
— Ele indica o corredor e libera minha passagem na catraca. —
Marcos será o instrutor de hoje, boa sorte.
Concordo com a cabeça e volto minha atenção a Luana ao meu
lado, coloco a mão em seu braço, só para tocá-la, e sinto o olhar do
brutamontes em mim.
— Bom treino, Luana, nos vemos no final. — Sorrio para ela e dou
uma piscadinha descarada só porque Samuel está avaliando nossa
interação.
— Obrigada, e toma cuidado lá, Marcos não pega leve. — Quase
solto uma gargalhada pela sua preocupação, mas só aceno em
concordância e saio.
Essa academia é perfeita para meus objetivos, o tatame em que os
treinos de jiu-jitsu acontecem fica em uma sala com paredes de vidro
transparente, o que me dá visão de toda a academia.
Posso treinar e acompanhar minha querida psicóloga com o olhar.
A única desvantagem é que estou quase matando o instrutor
enquanto assisto Luana fazer agachamento, aquela bunda redonda
deliciosa se empina toda vez que seu corpo desce, ela não é fraca,
está com quinze quilos em cada lado da barra.
O que me deixa puto é que não sou o único atento demais, Samuel
não sai do lado dela, acompanhando cada passo da minha psicóloga
na academia, avaliando todos os movimentos.
Contudo isso seria normal, é o trabalho dele, se o filho da puta não
estivesse flertando descaradamente com ela, posso ver que se
conhecem há tempos porque Luana não recua quando ele se
aproxima, também não se importa em ter as mãos do homem em seu
corpo.
— Yuri… Yuri… YURI. — Escuto um grito e volto a olhar para meu
adversário, que quase perdeu a consciência em uma chave de perna.
Solto o aperto quando vejo que ele está batendo no tatame com a
mão, desistindo da luta. Essa foi por pouco.
— Você me pegou de jeito — Marcos fala quando consegue se
levantar, ele tem a minha altura, aproximadamente 1,80 metros, a pele
escura, músculos definidos e o cabelo raspado.
— Desculpa, viajei por um momento — digo e tento fazer uma cara
de arrependido, mas por dentro continuo com raiva. — Faz tempo que
não treino.
— Acontece — Marcos responde. — Você é muito bom, realmente
merece a faixa que usa.
— Obrigado, mas não me importo com isso, só pratico para
extravasar.
— Entendo, nós temos competições internas na academia, porém
para a sua graduação são poucos adversários — Marcos começa a
explicar sobre as competições, mas não estou interessado, por sorte a
aula de hoje está tranquila, os outros alunos são faixa azul e branca e
estão sentados estudando nossa luta.
— Agradeço o convite — falo e saio, sentando-me em um lugar que
me dá visão de Luana.
Quando vejo que ela está se alongando, recolho minhas coisas,
agradeço Marcos pela aula, e vou para o vestiário trocar de roupa.
Decido por tomar banho em casa para não ficar muito tempo sem
visão da minha psicóloga.
Ao retornar Luana me aguarda na recepção, com um Samuel
novamente perto demais, mas dessa vez ela está com a bolsa em
frente ao corpo, claramente um sinal de desconforto.
— Está pronta, querida? — falo diretamente a ela, passo uma mão
pela sua cintura e puxo seu corpo mais próximo do meu, pegando-a
de surpresa, mas Luana não se afasta, ao contrário, ela sorri e se
escora em mim.
— Claro — responde com um meio sorriso. — Obrigada pelo treino,
Samuel.
Só então viro-me para o homem que nos encara, espantado, é isso
aí, amigo, ELA É MINHA!
— Não tem de quê. — Samuel limpa a garganta antes de
responder e dá dois passos para trás. — Espero que tenha gostado
do treino, Yuri.
— Foi muito proveitoso — replico com o olhar fixo nele. — Marcos
é um bom oponente.
Samuel me encara com curiosidade, claramente não esperava que
eu fosse páreo para o seu melhor professor, afinal eu percebi que
Marcos não estava pegando leve comigo, ao contrário, ele deu o seu
melhor hoje.
Mas não foi suficiente, eu sou bom demais para ele.
Sem esperar resposta, conduzo Luana para fora, ainda com o
braço em sua cintura. Quando chegamos na rua ela tenta sair do meu
controle, mas mantenho seu corpo próximo do meu.
— Não precisa mais me salvar — Luana comenta e me olha com
vergonha.
— Eu sei — respondo simplesmente, mas não tiro a mão da sua
cintura. — Qual é a história com ele?
— Estava tão na cara assim?
— Ele não tirou os olhos de você — respondo tentando manter a
calma — E não parecia que você estava incomodada, não até o
momento em que cheguei.
— Samuel é um bom homem, chegamos a sair alguns anos atrás,
mas nossos objetivos são diferentes.
— Vago demais, Luana — provoco e ganho um meio sorriso em
resposta, ela não quer falar sobre isso, mas agora eu preciso saber.
— Ele quer casar e ter filhos.
— E você não?
— Já fui casada, mas não estou fechada a isso.
Espero ela continuar falando, mas ela fica quieta.
— Então você não quer ter filhos — concluo e ela acena em
concordância.
— Desde que parei para pensar no assunto, muitos anos atrás,
percebi que não me via sendo mãe, dedicando minha vida a cuidar de
outra pessoa assim. — Ela me olha e respira fundo. — Eu gosto de
crianças, só não quero ser responsável por uma.
Não respondo, só concordo com a cabeça.
Para falar a verdade, não entendo o motivo das pessoas procriarem
tanto, especialmente em um mundo capitalista, onde a principal
motivação é o dinheiro e temos cada vez menos tempo para viver,
gastar esse tempo tendo que cuidar de outra pessoa é burrice, pela
minha visão.
Hoje é o dia do baile beneficente, Luana esteve ansiosa a
semana toda, falou várias vezes que se eu não quisesse ir, não era
obrigado, mas fiz questão de tranquilizá-la, minha única ressalva é a
Família Corleone.
No dia que descobri sobre o evento, fui em um dos melhores
alfaiates da cidade e mandei fazer um smoking sob medida, o
italiano cobrou uma pequena fortuna, mas foda-se, eu tenho
dinheiro suficiente para viver uma vida luxuosa.
Como Maicon Campbel garanti isso e investi na bolsa de valores,
se quisesse, poderia me aposentar e viver em alguma praia, mas
que graça tem isso?
O salário que Luana me paga é uma mixaria comparado a meus
ganhos diários com os investimentos, mas já faz um bom tempo que
dinheiro não é minha motivação. Me olho novamente no espelho,
conferindo as abotoaduras de ouro e a posição da gravata
borboleta. Depois de garantir que tudo está perfeitamente no lugar,
mando uma mensagem para o motorista da limusine que aluguei,
garantindo que está nos aguardando na saída do prédio.
Estou completamente perfeito, sei que Luana irá babar no
Samurai Sarado, como ela gosta de pensar em mim. Amo usar
roupas caras, que elevam ainda mais meu poder, já posso escutar
as mulheres suspirando no evento, os homens me encarando com
inveja.
Entretanto, o que importa é que minha psicóloga estará tão
deslumbrante quanto eu, decidi não olhar as câmeras do seu
apartamento enquanto ela se arruma.
Luana contratou uma equipe para fazer seu cabelo e maquiagem
mais cedo, e isso eu acompanhei pelas imagens, para garantir sua
segurança, mas assim que eles saíram e ela foi colocar o vestido,
desliguei o celular.
Às 20 horas em ponto toco a sua campainha, trouxe uma rosa
vermelha para ela, sei que a deixará surpresa e posso até imaginar
seu rosto ficando ruborizado.
Para o que eu não estava preparado é a visão da mulher mais
linda desse mundo, abrindo a porta de sua casa em um vestido
vermelho sem alças, colado ao seu corpo, os peitos preenchendo o
decote. O tecido cai até seus pés e, quando ela se movimenta, vejo
a fenda lateral que deixa sua perna direita à mostra.
Perco a fala quando meu olhar desce para seus pés em um salto
alto preto que a deixa mais alta, fito a mulher descaradamente,
babando pelo seu corpo, quando nosso olhar se encontra e ela sorri.
Maldita provocadora, minha vontade é de rasgar o vestido e me
enterrar nela, fazendo-a gritar meu nome para tirar esse sorrisinho
convencido do seu rosto.
— Acho que você deixou escorrer saliva… — Luana brinca e
passo a língua pelos meus lábios, era para ela ter reagido dessa
forma comigo, e não o contrário.
— Desculpa. — Que merda estou falando? Entrego a rosa para
ela e abro meu melhor sorriso, fixando meu olhar nos seus, dou um
passo à frente e fico mais próximo dela, arrancando a reação que eu
queria quando ela abre a boca minimamente e prende a respiração.
— Obrigado pelo convite.
Luana me encara com surpresa, mas aceita e a vejo enrubescer.
— Obrigada, Yuri — responde e vai até a cozinha, colocando a
flor em uma jarra de vidro com água. — Faz muito tempo que não
ganho uma rosa.
Te traria um buque com cem rosas vermelhas, se não fosse cedo
demais.
Cedo demais para quê?
— É só um pequeno agradecimento — falo e uma mecha do seu
cabelo cai, passo a mão pelo seu rosto e coloco-a atrás da orelha,
no momento em que meus dedos tocam sua pele sinto a
eletricidade fluir pelo meu corpo, e pela sua reação ela também
sentiu — E você merece muito mais do que isso.
Que merda é essa, Yuri?
Respiro fundo e me afasto, estendo meu braço para que ela se
apoie e, assim que fecha a porta, seguimos para o elevador. Aperto
o botão do primeiro andar e recebo um olhar confuso de Luana.
— Meu carro está na garagem — comenta e se adianta para
apertar o botão do subsolo, mas seguro sua mão.
— Não vamos de carro, é um evento importante, estamos ambos
muito chiques e bem vestidos, se é para impressionar, faremos com
estilo.
Ao chegar na recepção, vejo o olhar espantado dos seguranças e
porteiros, mas os ignoro, Luana aperta minha mão ao ver a limusine
parada na entrada, o motorista abre a porta assim que nos vê e a
ajudo a entrar no carro.
— Eu amo limusines — Luana comenta como uma adolescente
animada. — Pode pôr na conta do consultório, Yuri.
— Nem pensar. — Sento-me ao seu lado, mais próximo do que
deveria e me inclino sobre ela, puxando seu cinto de segurança e
afivelando no encaixe. — Pronto, agora você está segura.
Faço o mesmo com meu cinto e pego a garrafa de champanhe ao
meu lado, sirvo uma taça para ela e outra para mim. Este seria um
primeiro encontro perfeito, mas não é, e preciso manter o foco.
— À uma noite luxuosa. — Brindo e bato em sua taça com
delicadeza. — Vamos nos divertir muito hoje.
Luana fica vermelha, mas acena em concordância, tomando um
gole da bebida.
— Se posso falar abertamente — ela comenta, sem me olhar nos
olhos —, você está maravilhoso de smoking.
Demorou para notar, hein, coração?!
— Finalmente, achei que tinha me produzido todo e não ganharia
um elogio sequer — brinco, recebendo um sorriso aberto. — Acho
que deixei claro o quanto você está linda hoje, mas não custa nada
complementar.
— Obrigada, tinha até esquecido o quanto é bom me arrumar
assim para sair, nos últimos tempos não tive muitas chances.
— Deveria ter, o mundo está perdendo a oportunidade de ter uma
visão dessas.
— Eu amo viajar e explorar o mundo, mas faz muito tempo que
não vou a um lugar que permita uma produção destas, já pensou
usar este vestido no bar? — ela solta uma gargalhada, mas eu só
sorrio e a olho com intensidade.
— Você está deslumbrante, Luana — digo com seriedade, ela
percebe e me encara, curiosa. — Entretanto não são as roupas ou a
maquiagem, você exala beleza e poder naturalmente, é uma mulher
forte e confiante, e o melhor, você sabe disso. — Pisco para ela, que
está com a boca levemente aberta.
Tenho que controlar a vontade de passar minha língua nos lábios
vermelhos, então pego minha mão e seguro a dela até que paramos
em frente ao local do evento.
Vejo que realmente é algo grande quando vários fotógrafos se
reúnem ao redor da entrada, aguardando o momento em que as
pessoas saem dos carros.
— Não sabia que eventos de médicos seriam tão importantes
assim — comento e Luana sorri.
— Não há somente médicos ou pessoas da área da saúde, esta
festa é uma arrecadação de fundos para o hospital, então várias
celebridades e pessoas importantes também foram convidadas.
— Interessante, você costuma fazer doações também? —
questiono, já pensando se ganharia alguns pontos com a minha
chefe se largasse uma quantia em dinheiro.
— Sim, todos os anos deixo minha contribuição, uma parte
também é destinada a uma organização responsável por vários
orfanatos em New York. — Luana explica e já sei de quem ela está
falando, não preciso nem olhar para a porta do evento para
confirmar, mas faço mesmo assim.
Vejo o grande cartaz com a foto de Amélia Corleone estampada,
ela é a imagem da sua ONG, também reconheço o rosto que anos
atrás era uma presença constante em minha vida, talvez consiga
algumas respostas ao observar a interação de Luana com eles.
Chega a nossa vez na fila de limusines, faço questão de sair
antes, dou a volta no carro e abro a porta para Luana, ajudando-a a
descer com cuidado, passo uma mão pela sua cintura enquanto
caminhamos pelo tapete preto.
Vários flashes praticamente nos cegam, mas não tiro os olhos
dela, vejo seu rosto ficar vermelho, porém ela mantém a pose e sorri
tranquilamente para as fotos, deixando-me guiá-la até a entrada do
salão.
Isso mesmo, coração, desfile com um homem mais novo e
elegante ao seu lado, mostre ao mundo o poder que você tem, me
exiba, eu deixo.
— Não precisa fingir que estamos juntos — Luana murmura ao
entrarmos e o barulho diminuir. — A noite será bem chata, então se
quiser aproveitar e fazer contatos, fique à vontade.
— Luana — chamo sua atenção. — Hoje eu sou seu
acompanhante, nada nem ninguém vai me tirar do seu lado, então é
melhor se acostumar. — Prendo novamente a mecha do seu cabelo
que caiu em seu rosto, estou começando a pensar que ela deixou
solta de propósito. — E se depender de mim, a noite será bem
movimentada.
Somos recebidos por uma mulher toda de preto que confere a
lista de convidados, depois nos acompanha até uma mesa próxima
ao palco.
Reconheço Amélia e Alphonse Corleone já sentados em seus
lugares, eles sorriem ao perceberem que Luana está chegando e se
levantam para recebê-la com abraços, por um momento penso que
Amélia vai falar alguma coisa, afinal ela administrava o orfanato em
que fiquei por muitos anos, mas logo ela se recompõe e age como
se fôssemos dois estranhos.
— Este é Yuri Saito, meu secretário, que foi gentil o suficiente
para me acompanhar esta noite — Luana me apresenta. — Estes
são Amélia e Alphonse Corleone.
— É um prazer conhecê-lo, Yuri. — Amélia cumprimenta
gentilmente, mas seu olhar a entrega, ela sabe quem eu sou, e por
algum motivo escolheu não falar nada.
Ela está com um vestido vermelho, mais escuro que o de Luana e
mais fechado, porém tão luxuoso quanto, ela acena e Alphonse
passa a mão protetoramente pela cintura da mulher, seus olhos
azuis estão fixos em mim, avaliando-me, posso jurar que sua
postura mudou e está ainda mais alto.
— O prazer é meu — respondo e aperto a mão dela. — Parabéns
pelo evento, Luana me contou um pouco sobre os orfanatos. —
Jogo a informação como uma isca, mas ela só sorri e se aconchega
ainda mais no abraço do marido.
— Minha mulher é incrível — Alphonse comenta e aperta minha
mão, mais forte e mais firme que o necessário. — Prazer, Yuri, esta
é Rita Costello — ele me apresenta e cumprimento a outra mulher
sentada ao lado de Amélia, que olha de mim para Luana, como se
estivesse nos julgando.
Quando estávamos quase sentando, um casal chega e atrai a
atenção de todos. Daniele Corleone e seu marido, Lucas Costello,
são uma presença marcante.
A mulher de olhos azuis e cabelos pretos caminha em nossa
direção em um vestido verde esmeralda cheio de pedras preciosas,
o tecido é justo e abraça suas curvas.
Seu olhar logo encontra o meu e ela rapidamente me avalia dos
pés à cabeça, focando no local onde minha mão descansa nas
costas de Luana.
Seu marido vem logo atrás dela, com um smoking escuro e
perfeitamente moldado ao seu corpo, parecendo uma parede de
músculos comparado à mulher baixinha e pequena, porém o frio em
minha espinha é causado pelo olhar penetrante dela, novamente
esta sensação de apreensão.
— Filha, você está atrasada — é Amélia quem fala e recebe um
olhar carinhoso de Daniele.
— O evento ainda nem começou — a mulher se justifica, então
vem até Luana e a cumprimenta com um aperto de mãos. — Você
está linda, fico feliz que tenha aceito o convite.
— Obrigada, querida — Luana agradece e sorri verdadeiramente,
percebo que ela está tranquila ao redor destas pessoas. — Este é
Yuri, meu secretário. Yuri, esta é Daniele Corleone e seu marido,
Lucas Costello.
— É um prazer conhecê-los — cumprimento novamente com um
aperto de mãos e me seguro para não perguntar sobre seus
sobrenomes diferentes, já que são casados. Diferente do seu pai,
ela não tenta esmagar meus dedos, mas seu olhar é o suficiente
para traduzir a ameaça implícita.
Lucas também me avalia, mas antes de continuar as
apresentações, ouvimos o microfone chiar e o mestre de cerimônia
começa o evento. Sento-me com Luana no meu lado direito e
Daniele no esquerdo.
O início é chato, várias pessoas sobem ao palco para fazer um
discurso ridículo e receber aplausos para massagear o ego,
ninguém aqui faz doações para o bem dos outros, é tudo uma
fachada.
Amélia é a última a falar, todos na mesa a seguem com os olhos,
Alphonse encara a mulher com um sorriso orgulhoso e o olhar
brilhando de admiração, o cara é um cachorrinho, só falta babar.
Ela faz um discurso rápido sobre a ONG ser importante para a
comunidade e no final agradece a um tal de John pela inspiração,
então recebe as palmas e volta para a mesa. Logo o jantar é servido
e as conversas paralelas começam.
Mantenho as respostas simples e o mais verdadeiras possíveis,
mas percebo que estou sendo calmamente interrogado por cada
membro da família, Daniele e Alphonse se revezam em perguntas
mais pessoais e importantes, pego até algumas pegadinhas.
Não me importo, sei ser charmoso e fazer parte deste grupo.
Dinheiro ou poder nenhum são capazes de me intimidar, minha
conta no banco é gorda, claro que não tanto quanto a deles, mas
nunca vou me sentir inferior a alguém por causa disso.
Se pensar bem, sou muito mais inteligente do que eles, afinal os
homens desta mesa só faltam latir para suas mulheres, nem
percebem o quanto isso é uma fraqueza neste mundo.
A única que posso considerar uma oponente a altura é a mulher
de olhos azuis, tão fria quanto eu, Daniele não responde ao meu
charme como os outros e parece ver por trás do teatro todo, ela com
certeza está com o pé atrás, por isso, quando a música começa,
trato de levar Luana para a pista de dança e desviar das perguntas.
— Eles são intrometidos demais — ela comenta quando toco
suas costas com a mão e aproximo nossos corpos para começar a
conduzi-la pela pista. — Desculpa por isso.
— Acho que só estão preocupados com você — disfarço e sorrio
para ela. — Qual é sua ligação com a família Corleone?
— Eu ajudo Amélia a encontrar profissionais especializados para
as crianças do orfanato, há anos trabalhamos juntas para garantir
que os meninos e as meninas tenham apoio psicológico enquanto
passam pelo processo de adoção — sua voz fraqueja enquanto
conta a história, não é completamente mentira, mas sei que não é
só isso. — Acabei conhecendo o restante da família assim.
— Percebi o carinho e a proteção.
— Sim. — Ela respira fundo e ficamos em silêncio por um
momento, ouvindo a valsa lenta tocando e nos movendo em
sincronia. — Então, além de cantar muito bem, ser inteligente,
charmoso, lutar jiu-jitsu e gostar de coisas nerds, ainda dança
assim?
Sorrio para ela e aproximo ainda mais nossos corpos, encosto
meu rosto no dela e sussurro a resposta em seu ouvido.
— Sou um homem de muitos talentos, coração. — Vejo sua pele
se arrepiar e ela quase tropeça nos pés, forçando-me a segurá-la e
nos aproximando ainda mais. — Cuidado, ou eles irão pensar que
estamos juntos de outra forma.
— De-esculpa — Luana gagueja e tenta se afastar, mas não
deixo e sorrio para ela, admirando seu rosto ficar vermelho.
— Relaxa, estou brincando. — Continuo a conduzi-la pela pista,
observo em volta para constatar que os Corleone nos encaram com
curiosidade e Daniele me fuzila com desconfiança. — Gosto de te
deixar sem jeito, mas agora vamos aproveitar a música e as bebidas
chiques.
— Pelo menos hoje jantei antes — ela responde e começa a
relaxar. — Prometo que irei me controlar nas bebidas.
— Não precisa disso, se divirta, comigo você está segura.
Ela passa os braços pelo meu pescoço quando a música fica
ainda mais lenta, seus olhos castanhos fixos nos meus.
— Então vamos aproveitar.
Com isso minha querida psicóloga se anima e aproveita a noite,
dançando e bebendo alegremente, os Corleone se provaram um
grupo bem animado e o centro das atenções.
Posso jurar que cada pessoa ali dentro veio cumprimentá-los pelo
menos uma vez, até que o Capo e sua mulher sumiram por um
tempo, só vi a hora em que Amélia arrastou seu marido por uma
porta nos fundos do palco.
Ele deve usar uma coleira dentro de casa.
Daniele e Lucas também sumiram por uma saída de emergência,
imaginei que talvez estivessem em alguma reunião secreta, mas
quando os quatro retornaram quase ao mesmo tempo, Amélia já
não tinha mais batom e seu vestido estava levemente amassado.
Já Daniele estava impecável, porém o smoking de Lucas
denunciava o que havia acontecido.
— Não fala nada — Luana chama minha atenção ao perceber
que estou encarando a família Corleone. — Eles sempre fazem isso,
só finge que não percebeu. — Sua voz está baixa, mas ela
claramente se segura para não rir.
Rita Costello, que havia saído para conversar com algumas
pessoas, retorna e revira os olhos para os casais, seu filho fica
vermelho, mas logo leva Daniele para a pista de dança.
— Vamos cumprimentar alguns colegas, depois podemos ir
embora, se quiser. — Luana me chama e a acompanho pelo salão.
Não imaginava o quanto minha psicóloga era conhecida, mas
vários médicos muito mais velhos que ela, acompanhados de
mulheres que não pareciam ter mais de dezoito anos, a tratavam
com respeito.
Luana me apresentou a todos como Yuri Saito, sem comentar
que sou seu secretário, então fiquei como seu acompanhante.
Aproveitei a brecha para manter minhas mãos nela, especialmente
quando algum velho tarado se aproximava demais.
Ou pior, quando ficavam olhando para seus peitos enquanto ela
falava, que merda os homens pensam que são? Por diversas vezes
pensei em quebrar alguns pescoços, mas me controlei e encontrei
uma forma de lidar com isso.
Toda vez que um homem não prestava atenção no que Luana
estava falando, eu me dirigia à sua acompanhante e a enchia de
perguntas, fazendo-a falar sobre si e interrompendo o homem
quando ele tentava cortá-la.
As mulheres ficavam receosas, mas foda-se, é maravilhoso ver
homens que se acham poderosos sendo excluídos das conversas.
Eu me controlo com a bebida para não acabar falando o que não
devo, especialmente sob o olhar atento dos Corleone, mas deixo
que Luana se divirta, logo ela já está bem alegre e solta, sem perder
a compostura.
— Você é uma boa companhia — fala quando estamos sozinhos.
— Deveríamos ser amigos.
— Mas nós já somos — respondo e pisco para ela, que desvia o
olhar do meu e observa Daniele e Lucas dançando. — Você tem um
carinho especial por eles — comento na tentativa de descobrir
alguma coisa.
— Sim, eu vi essa menina nascer, acompanhei sua vida e a
história de amor do casal. — Luana respira fundo antes de continuar
— Eles se completam.
— E você quer algo assim também?
— Quem não quer? A solidão é triste, Yuri, mesmo que eu goste
da minha companhia, sinto falta de ter alguém para dividir alguns
momentos.
Ora, ora, a bebida deve ter feito efeito já, minha querida chefe
está abrindo o coração.
— Você vai encontrar alguém. — Encaro seu olhar triste. — Até
lá, estou aqui para te fazer companhia.
Passo a mão pelo seu rosto e acaricio a pele macia da bochecha,
Luana se entrega ao meu toque e sinto aquele aperto no peito
novamente, que merda é essa?
Ficamos mais um tempo no evento, faço uma pequena doação
para a ONG dos Corleone, poderia usar meu dinheiro real e
aumentar os números, porém podem desconfiar de algo.
Então deixo cinco mil dólares em meu nome com a certeza de
que eles irão notar, e talvez ganhe alguns pontos com essas
pessoas. Nunca é ruim estar no lado bom dos mafiosos que
comandam a cidade.
Luana já está um pouco embriagada quando saímos do local, não
há muitos fotógrafos do lado de fora, mas mantenho minha
companheira segura e firme ao entrar na limusine.
Assim que sento ao seu lado ela relaxa no banco e passa as
pernas por cima das minhas, tirando os sapatos e apoiando a
cabeça no meu ombro, presa pelo cinto de segurança.
— Obrigada por hoje — murmura e sorri, vejo seu rosto cansado,
os olhos castanhos quase fechando de sono, então seguro seu
corpo ainda mais próximo, passo um braço por seus ombros e deixo
que durma escorada em meu peito.
— Não tem de quê, coração. — Aproveito que sua respiração fica
mais leve e contínua e beijo sua testa, abraçando-a e acariciando
seus cabelos.
Estarei ao seu lado para sempre, coração, você é meu maior jogo
e a melhor obsessão da minha vida.
A semana seguinte passou voando, entre atender meus pacientes
na clínica, cuidar do Vader e ir para a academia com Yuri, já é sextafeira novamente.
Olho para a tela do computador, minha última consulta foi
cancelada, então tenho uma hora livre para atualizar as fichas, quem
sabe consigo sair mais cedo, preciso mesmo descansar.
Meu corpo está todo dolorido devido aos exercícios. Samuel fez
questão de aparecer no horário em que eu estava lá e não saiu do
meu lado.
Confesso que no começo me senti bem, ele é um homem bonito e
com certeza está interessado, mas já seguimos por este caminho.
Quando ele me chamou para sair no primeiro dia, achei que estava
brincando, por sorte Yuri apareceu bem na hora e me salvou, mas ele
continuou insistindo, até que neguei e falei que é melhor sermos
amigos.
Samuel aceitou, porém uma frase dita por ele ficou marcada em
minha mente:
“Não é uma boa escolha se envolver com seus funcionários.”
Quis rir na hora, porque justamente ele estava me dando esse
conselho, o homem que usa a própria academia como local de caça e
já se envolveu com várias funcionárias, além das alunas.
Mas depois comecei a pensar no assunto, na forma que Yuri me
olha, em suas brincadeiras, mesmo Amélia me perguntou se tínhamos
algo depois do baile, até agora não havia realmente cogitado esta
possibilidade.
Sim, eu já me masturbei pensando nele tantas vezes que perdi a
conta, mas era uma fantasia, como quando penso em um
personagem de filme ou um ator famoso, só alguém para focar o
tesão e deixar meu vibrador trabalhar.
Afinal, sou uma mulher com necessidades, eu gosto de sexo e um
orgasmo por dia me mantém sã e controla a libido sem que precise ir
à procura de alguém.
Projeto uma expectativa e crio um personagem em minha cabeça
que me faça sentir tesão.
E Yuri gosta de homens, sei que suas brincadeiras e avanços são
só isso.
— Você fica linda quando está pensativa. — A voz grossa dele me
faz pular na cadeira, pegando-me desprevenida. — Desculpa, não
quis te assustar.
Olho para a porta e ele está lá, escorado no batente, o paletó cinza
escuro aberto, as mãos no bolso, a postura leve e descontraída, e
aquele maldito sorriso sedutor no rosto que faz meu coração acelerar.
— Só estava perdida em pensamentos — respondo e começo a
desligar o computador, na esperança de que ele volte para a sua
mesa e faça o mesmo.
Mas não, Yuri caminha em minha direção, contorna minha mesa e
fica de pé na minha frente, o olhar fixo em mim e o sorriso de canto,
logo seu perfume amadeirado invade meus sentidos e me faz
suspirar.
Não sei porque, mas sua aproximação repentina não me deixa
apreensiva, estou ansiosa e curiosa.
— Posso fazer uma pergunta pessoal? — reúno toda a coragem
que consigo para falar.
— Claro.
— Você gosta de homens? — A frase fica entre uma afirmação e
uma pergunta, ruborizo na hora que as palavras saem da minha boca,
eu sou uma maldita psicóloga, sei que estes assuntos não devem ser
abordados assim, especialmente com meu funcionário. Que merda
estava pensando?
Yuri sorri ainda mais e se abaixa colocando uma mão em cada lado
da minha cadeira, seu rosto um pouco mais alto que o meu, fazendome erguer a cabeça para olhá-lo.
— Por que pensa isso?
— Matt, o cara do bar…
— Eu gosto de pessoas, Luana — Sua voz é baixa e sedutora,
posso sentir o cheiro do café que tomamos há pouco tempo em seu
hálito quente, a visão da boca em minha frente é tentadora. — Por
que o interesse?
Merda, merda, merda… Esta é uma pergunta perigosa.
— Só curiosidade — respondo, mas minha voz falha e não consigo
manter o olhar no dele.
— Mentira. — Yuri pega meu queixo e ergue meu rosto, forçandome a encará-lo. — Você está interessada.
Não é uma pergunta, e isso me desarma.
— Claro que não, você é meu funcionário e…
Não tenho tempo para me defender, Yuri cola sua boca na minha,
pegando-me de surpresa, seus lábios quentes e macios tocam os
meus com firmeza, ele morde meu lábio inferior, forçando-me a abrir
mais minha boca, então sua língua me invade e perco o juízo.
Com uma pegada firme, suas mãos estão na minha cintura e ele
me ergue da cadeira, fazendo-me sentar em cima da mesa de
madeira enquanto me beija intensamente. Yuri se aproxima mais, me
seguro em seu pescoço enquanto enlaço sua cintura com as pernas.
Minha saia sobe quando ele se esfrega na minha boceta, que já
está encharcada, posso sentir seu pau duro contra suas calças e não
controlo um gemido, estou pegando fogo.
Suas mãos grandes e fortes percorrem o meu corpo, acariciando
minhas costas, firmando minha cintura, controlando a intensidade dos
movimentos, ele me come com a boca, morde meu lábio, me invade
com a sua língua, em um momento posso jurar ouvir um rosnado sair
dos seus lábios.
— Yuri, isso não…
Ele me cala e começa a abrir os botões da minha camisa,
libertando meus peitos espremidos no sutiã branco de renda. O
maldito solta minha boca e encara meu corpo, o olhar feroz me faz
arrepiar.
— Gostosa pra caralho. — Ele beija e lambe meu pescoço,
enquanto esfrega o pau duro na minha boceta, neste ponto já estou
entregue e afrouxo sua gravata, recebendo um sorriso safado de
volta, ele se afasta o suficiente para se despir. Descarta o paletó, a
gravata e a camisa branca no chão do escritório, dando-me a visão do
seu corpo malhado, o peitoral duro e quente me faz querer passar a
língua pelos seus mamilos.
— Foda-se. — Yuri rosna e toma minha boca novamente, agora
mais intenso, suas mãos arrancam minha camisa e logo meu sutiã vai
junto. — Você não imagina o quanto me segurei, Luana.
— O que…
— Shiii, agora não adianta tentar me afastar. — Seus dentes
passam pela minha clavícula e a língua sobe por meu pescoço. —
Você quer que eu te foda em cima dessa mesa?
— Yuri, eu não deveria… —Tento me conter, mas ele baixa a boca
e lambe meu mamilo, que já está duro.
— Só aceito sim ou não como resposta, coração — Seus lábios se
apertam contra o bico do peito e ele começa a me torturar.
Não consigo pensar, só sentir seu pau no meio das minhas pernas
e sua boca nos meus peitos, todo o meu corpo pega fogo enquanto
suas mãos apertam minha cintura, mantendo-me no lugar.
— Sim — confirmo o que ele já sabe e recebo um sorriso safado
como resposta, Yuri toma minha boca novamente e solta meu cabelo,
agarrando os fios com sua mão grande e puxando minha cabeça para
trás.
— Finalmente — sussurra contra meu ouvido.
A mesa range embaixo de nós e escuto o barulho de coisas caindo,
então Yuri me ergue com um braço e com o outro joga tudo o que
estava em cima da mesa no chão, deixando somente o computador,
que está do outro lado.
Ele me coloca de volta, ergue ainda mais minha saia, amontoandoa na cintura, então sua mão está no meio das minhas pernas, naquele
lugar em que seu pau se esfregava há pouco tempo.
— Como eu imaginava, você está molhadinha para mim — fala e
me beija.
Estou dominada por ele, completamente sob seu controle, meu
corpo responde ao dele, todo o tesão que sentia enquanto me
masturbava pensando em Yuri é ainda mais intenso agora. Não tenho
palavras, e também não quero falar.
Seu dedo sobe e desce pela minha boceta ainda coberta com a
calcinha de renda branca, só com o toque delicado me contorço e
gemo enquanto ele me beija. Yuri provoca até que estou me
esfregando em sua mão, sedenta por mais.
Então ele agarra o tecido delicado da calcinha e puxa com firmeza,
vejo o momento em que guarda o tecido rasgado no bolso e sua mão
volta para o meio das minhas pernas, seus dentes mordem meu lábio
quando ele me penetra com dois dedos e massageia meu clitóris com
o dedão.
Maldito controle.
— Yuri — gemo seu nome como muitas vezes fiz sozinha em
minha casa e vejo o sorriso orgulhoso em seus lábios.
— Grita meu nome, Luana, bem alto para todos saberem quem
está te fazendo gemer — ele instiga e abocanha um mamilo.
Passo as mãos pelo seus cabelos e desfaço o coque, soltando os
fios macios e sedosos, como muitas vezes sonhei em fazer.
Tento me segurar, mas seus dedos entram e saem mais
rapidamente, e quero mais, sinto o orgasmo se formando, meu corpo
todo reage a ele, ao seu toque, às mordidas e lambidas no meu peito.
Então ele me empurra e deito na mesa, Yuri beija meu corpo, diminui
a intensidade da mão e substitui os dedos pela boca.
E isso me leva ao paraíso, seus lábios quentes encontram os meus
já inchados e sensíveis, ele lambe e chupa com vontade, focando
seus esforços no clitóris. Olho para baixo e encontro seu olhar fixo em
mim, em cada reação do meu corpo e é só o que preciso para me
entregar.
A intensidade com que libero meu prazer é inebriante, gozo com
força e Yuri não para, sua língua continua me lambendo, ainda mais
forte, mais rápido, ele suga meu orgasmo e toma tudo para si.
Grito seu nome como um maldito chamado, porque seu rosto é a
única coisa que consigo lembrar agora, por ele, me entrego ao
momento e tudo o que quero agora é mais.
Meu corpo começa a amolecer devido ao orgasmo, mas
Yuri não para, estou sensível, quero afastá-lo da minha boceta, mas
quanto mais ele lambe e se delicia, mais tesão eu sinto e, aos poucos,
estou gemendo novamente de prazer.
— Não acabou ainda, coração — ele fala contra a minha boceta e
olho para baixo, então vejo Yuri pegar um preservativo, tira o cinto
rapidamente e abaixa a calça e a cueca, liberando seu pau. — Quero
te foder de quatro nessa mesa maravilhosa e resistente.
Suas palavras me fazem queimar, nunca senti uma atração tão
forte assim por alguém, é feroz, intensa e perigosa. Ele é como uma
maldita droga, proibido e fodidamente viciante.
Mas agora, só por um momento, decido esquecer quem somos e
só sentir, chega de brincar de boa moça, já não sou mais a filha
perfeita, a psicóloga de respeito, agora eu sou uma vagabunda que
está fodendo seu secretário em cima da mesa.
E puta que pariu, esse é o melhor papel de todos!
Yuri me levanta, colocando-me de pé, de costas para ele, curvo
meu corpo até que meus peitos encostem na madeira fria, ele passa
uma mão pela minha coluna delicadamente, me fazendo arrepiar.
— Está esperando o que? — provoco e olho para trás, encontrando
seu rosto ardendo de tesão. Assim como eu, Yuri não é mais o
homem controlado de antes, a fera está solta.
Afasto minhas pernas, sabendo o que ele quer, e empino a bunda
em sua direção. Olho para trás só para garantir que ele está tão
entregue quanto eu, então seu pau duro me invade de uma vez,
fundo, forte, me fazendo gritar e agarrar a mesa, que balança embaixo
de mim.
Yuri começa a me penetrar devagar, entrando e saindo sem pressa,
até que começo a empurrar a bunda de encontro ao seu pau,
precisando de mais, sinto o tapa na mesma hora que ele aumenta a
velocidade e gemo forte.
— Me fode com vontade, Yuri — peço e ele responde com um tapa
do outro lado da bunda.
— Caralho — ele exala e me penetra com ainda mais força, sinto
que estou perto de gozar novamente, e aperto minha boceta, ouço
seu gemido e logo seus dedos trabalham no meu clitóris. — Goza
para mim, coração.
Seu comando é o que preciso para liberar meu prazer, aperto seu
pau, sugando-o enquanto ele mete com força, sinto o momento em
que Yuri goza dentro de mim e geme alto, entrando e saindo mais
uma vez, até que estamos os dois respirando com força, suados e
esgotados.
Vai, pensa com o pau, agora reclama que deu merda.
Foder Luana não estava na programação do dia, muito menos
encontrar aquele olhar confuso em seu rosto depois que saí dela. Não
sei lidar com isso, então só saí de lá com a calcinha rasgada dela no
bolso, e acompanhei minha presa remotamente.
Deveria ter parado as provocações há muito tempo, o plano era ela
continuar achando que sou gay e confiar em mim. Simples assim, mas
eu tive que ir lá e complicar.
E puta que pariu, não me arrependo do sexo, Luana é gostosa
demais, seu cheiro, seu gosto, seus gemidos diretamente
direcionados a mim, tudo nela me envolve.
A maldita psicóloga é a melhor parte desse jogo, só que ela nunca
deveria entrar no tabuleiro, ter Luana para mim não era o combinado,
agora eu quero mais, neste momento o único prêmio que aceito é ela.
Foi bom e eu estou fodido, porque só de lembrar do meu pau
enterrado nela, fico duro de novo. Isso não pode acontecer, ela é a
única pessoa que está fora de cogitação, se nos envolvermos, ela vai
saber que sou um maldito psicopata, não consigo esconder por muito
tempo, ainda mais de uma psicóloga tão boa quanto ela.
Luana é inteligente e logo vai entender que não sou capaz de dar a
ela o que quer, então a missão ficará mais difícil, quase impossível,
isso poderia ser um motivo a mais para me instigar, foder minha presa
enquanto manipulo o jogo para abraçar as novas regras, o
pensamento é tentador, mas não vai funcionar a longo prazo.
Vou fingir que nada aconteceu, agir como se estivesse arrependido,
coisa que não estou, ela vai se magoar no começo, como toda mulher
que acha que foi usada só para sexo, mas depois vai entender que é
melhor não nos envolvermos e tudo voltará ao normal.
Ao contrário do outro final de semana, neste faço questão de evitar
encontrá-la pessoalmente, sigo seus passos pelo GPS e pelas
câmeras de segurança, assisto cada minuto do seu dia e vigio seu
sono conturbado.
Luana passou muito tempo olhando o celular, esperando alguma
coisa e, quando não encontrava, largava o aparelho, decepcionada.
Ela focou no filhote de gato e passou o tempo todo com ele, mas vi
seus olhos desviarem para a porta do apartamento, como se
esperasse alguém.
Eu não vou aparecer, coração, por mais que queira te comer de
novo, nesse sofá macio, na sua cama grande e confortável, não vai
acontecer.
Ela logo vai se tocar que eu só queria foder uma vez, tirar do meu
organismo a atração, e nada mais. Só espero que até lá meus planos
não se compliquem.
É domingo, quase nove horas da noite, e Luana começou a se
arrumar para sair.
Para onde a mulher vai a essa hora? Não vi nenhuma mensagem
em seu celular, nem e-mails.
A maldita coloca uma calça jeans preta, um salto e uma camisa
vermelha, faz até maquiagem.
Puta que pariu, coração, você vai caçar?
Troco de roupa como garantia, e quando ela sai do apartamento,
me preparo para ir atrás. Assim que o elevador se fecha e começa a
descer, saio e pego as escadas de emergência, pulando de dois em
dois degraus chego no saguão de entrada pouco tempo depois e a
vejo saindo do prédio.
Estou ofegante e suando, então não passo pelo recepcionista, ele
vai estranhar alguém saindo pela escada de emergência, pego o
celular e a localizo, por sorte minha psicóloga está no bar aqui em
frente.
Não posso entrar lá e fingir que não a vejo, o lugar é pequeno, e
ela está caçando, o que significa que estará atenta a todos que
entram ou saem.
Volto ao meu apartamento e abro as câmeras de segurança do bar,
aguentar Matt por um tempo serviu para uma coisa, pelo menos, e
tenho visão da minha mulher sentada no balcão com uma Marguerite
em mãos, ela não comeu nada antes de sair.
Droga, Luana, isso é forte demais.
Assisto o show enquanto ela faz sua jogada, postura ereta, olhar
perdido, bebida feminina em mãos. Sei que prefere uma cerveja ou
um vinho, mas os homens são inseguros e preferem uma mulher que
fique bêbada facilmente com esses drinks fortes.
Por mais de uma hora ela fica lá, vejo alguns caras tentarem se
aproximar, sem sucesso, até que um homem senta do seu lado sem
permissão e começa a mexer no celular.
O bar não está lotado, mas tem bastante gente para um domingo à
noite. Luana olha para o estranho, mas ao perceber seu desinteresse
nela, vira-se para o outro lado.
Matt está ocupado com um cliente no balcão quando Luana tenta
chamar sua atenção, ela descansa o copo ao seu lado por um minuto,
e é só o que o homem precisa para colocar algo em sua bebida e sair.
Merda, merda, merda…
Levanto rapidamente, olho o celular só para ver Luana virar o
restante do conteúdo do copo na boca. Puta que pariu!
Saio correndo e chamo o elevador, que parece demorar um século
para chegar, enquanto isso outro homem se aproxima dela, o cara de
meia idade, alto, não muito forte, cabelo escuro com partes grisalhas,
barba bem feita: é o mesmo que estava me seguindo, porém agora o
terno é muito mais caro do que antes.
Ele se aproxima dela e fala algo em seu ouvido, vejo Luana sorrir
educadamente, mas já consigo perceber seu olhar caído, a droga
deve estar fazendo efeito. Ele coloca uma mão em sua cintura, como
quem não quer nada, mas ela se apoia em seu braço.
O elevador finalmente chega no lobby e corro para fora do prédio,
meu coração acelerado, não sei o que estou sentindo, apreensão,
talvez, a adrenalina do momento corre pelas minhas veias.
No tempo em que desvio a atenção do celular para chegar até o
bar, Luana está saindo, praticamente escorada no estranho, que já
tem a porta de um carro aberta em sua frente.
Chego antes que ele consiga colocá-la dentro do veículo e acerto
um soco no rosto do homem, que vai ao chão com uma Luana
praticamente desacordada em seus braços. Arrasto o desgraçado de
cima dela e dou mais dois socos antes que alguém me contenha por
trás.
Vejo as pessoas parando para assistir a cena, mas só consigo focar
no homem que quero ver morto. Ele parece surpreso com a minha
presença, então se levanta e entra no carro, só depois que a porta se
fecha o outro me larga e assume o volante do veículo.
Eles estão fugindo? É dois contra um, poderiam facilmente me
derrubar, que merda é essa?
Esbravejo com ódio enquanto olho o carro sair cantando pneu,
memorizo a placa mesmo tendo certeza que é falsa, só quando
consigo me acalmar, escuto o barulho de alguém vomitando. Luana!
Ela consegue se agachar e despeja todo o conteúdo do estômago
na sarjeta, mas seu corpo está lento devido à droga, vejo que está
prestes a cair novamente, então a seguro em meus braços.
Por um momento ela se vira e parece me reconhecer, então seus
olhos voltam a ficar nublados e o corpo mole. Consigo erguê-la, mas
ela não tem forças para andar, levanto seu corpo em meus braços e a
levo para casa.
O porteiro me encara em choque, mas abre a porta e me ajuda com
o elevador. Luana não é pesada, mas está mole por estar dopada.
Enquanto a carrego para cima, ouço palavras desconexas saírem
de seus lábios, não consigo entender o que ela fala, mas no final meu
nome é pronunciado, antes que ela perca a consciência e escore a
cabeça em meu peito.
Pego a chave do seu apartamento e a levo até o banheiro, tiro sua
roupa, ligo o chuveiro e entro com ela em meus braços. Luana está
fria devido ao entorpecente e à bebida, um banho quente irá ajudá-la
agora.
Ela volta à consciência aos poucos, firmando-se em mim, mas
ainda preciso segurá-la. Espero até que seus olhos foquem nos meus,
mas ela logo volta a desmaiar.
— Você está segura — falo em seu ouvido, mesmo que ela não
entenda. — Estou aqui agora.
Depois do banho, seco seu corpo na toalha e a levo para a cama,
visto-a com uma camiseta larga que encontro em seu armário e uma
calcinha confortável, Luana está desmaiada.
Corro para a minha casa e tiro as roupas molhadas, coloco uma
calça de moletom e camiseta, e volto ao seu apartamento. Ela
continua na mesma posição em que a deixei.
Quando me aproximo, o filhote de gato começa a miar e corre para
os meus pés, lembro de Luana comentando que ele precisa de
comida constantemente, então vou até a cozinha e preparo a
mamadeira, como ela fez no outro dia.
Alimento o filhote logo depois, então ele para de gritar e volta a
dormir.
Vou até Luana na cama e toco seu rosto, ela está gelada, cubro-a
com mais uma coberta, mas logo vejo que seu corpo treme de frio,
então tiro a camisa e a calça e deito do seu lado, puxando seu corpo
para mim, suas costas se aconchegam no meu peito em um encaixe
perfeito.
Passo um braço por sua cintura, mantendo-a no lugar, e o outro
embaixo do travesseiro onde ela descansa a cabeça. Sinto o cheiro
do cabelo molhado e percebo que aos poucos ela para de tremer.
— Quero te matar por se colocar em perigo assim, coração —
reclamo em seu ouvido, por saber que ela não está escutando. —
Você vai me pagar por isso quando acordar.
Tento ao máximo não fechar os olhos, mas em algum momento o
sono me venceu e durmo abraçado nela.
Acordo com a sensação de ter uma coisa vibrando em cima do meu
peito, levo a mão até o local e sinto algo quente e peludo, abro os
olhos e encaro assustado o filhote de gato dormindo tranquilamente
em cima de mim.
Estou de barriga para cima, o cobertor na cintura, e sozinho em
uma cama que conheço muito bem, mas que não é a minha.
As memórias da noite passada começam a voltar e levanto
rapidamente, pego o gato e o coloco no travesseiro, ele reclama por
ser movido, mas logo volta a dormir.
Merda, onde ela está?
Pego as roupas que deixei do lado da cama e me visto antes de
sair à sua procura, no momento em que abro a porta do quarto o
cheiro de café faz meu estômago gritar.
Ao fundo escuto uma música tocar baixinho da Alexa, olho para a
cozinha e vejo Luana, de costas para mim, dançando calmamente no
ritmo de Sunrise, da Norah Jones. Ela está com um pijama comprido
azul e uma pantufa branca, o cabelo bagunçado caído acima do
ombro.
Luana mexe em alguma coisa no fogão, sinto o cheiro de bacon e
ovos, demoro alguns segundos para absorver a cena toda e voltar a
me mover. Planejava ir para casa logo depois que ela pegasse no
sono, mas agora não posso fazer isso.
Caminho lentamente até ela, tentando não fazer barulho, o plano
era sentar na banqueta e esperar ela se virar para me notar, mas não
resisto e passo as duas mãos em sua cintura, Luana se assusta e
joga a espátula para trás quando pula em meus braços.
— Bom dia — falo muito próximo do seu pescoço e sou
recompensado com minha mulher ficando vermelha e toda arrepiada.
— Dormiu bem?
Luana demora um tempo para responder enquanto se recompõe do
susto, então se vira de frente para mim, o rosto ruborizado de
vergonha.
— Melhor do que eu mereço — responde sem olhar em meu rosto.
— Você vai achar que é mentira, mas eu não me lembro do que
aconteceu ontem, acordei com você, então imagino que em algum
momento da bebedeira tenhamos nos encontrado, e peço desculpas
por isso, eu não sou assim normalmente, devo ter abusado dos…
— Você foi drogada por um entranho no bar — corto suas
desculpas, é normal ela não lembrar do que aconteceu, por isso falo
com tranquilidade e explico calmamente. — Por sorte eu estava a
caminho da farmácia quando vi você saindo carregada, percebi que
tinha algo errado e consegui interceptar antes que ele te colocasse no
carro. — A primeira parte é mentira.
— Eu… você está falando… — Luana me encara com os olhos
arregalados de pavor, é o que esperava dela, a noite poderia ter
terminado de uma forma muito trágica.
— Sim, você precisa se cuidar mais quando sair sozinha assim. —
Quero falar mais, jogar em sua cara o perigo que correu, mas me
seguro ao ver seus olhos encherem de lágrimas. — Calma, não
aconteceu nada, mas poderia. Porra, Luana, você não é nenhuma
menininha inexperiente.
— Yuri, eu… não sei como aconteceu. — Ela começa a chorar e
quero sair correndo, que merda, o que eu faço? Seu corpo está muito
próximo do meu então a abraço apertado, forçando-a a desviar do
meu rosto para que não veja meu desconforto.
Merda, não sei lidar com pessoas chorando, deveria ter ido embora
e acompanhado sua noite pelas câmeras.
— Tudo bem, não aconteceu nada — pontuo com a intenção de
acalmá-la. — Eu te trouxe para casa, mas você estava com a
temperatura muito baixa, te dei um banho quente e te coloquei na
cama, mas não pareceu adiantar, então deitei um pouco para
esquentá-la.
— Você cuidou de mim. — Não é uma pergunta.
— Óbvio, você paga meu salário. — Tento fazer uma piada e ela
sorri, mas ainda sinto as lágrimas em meu peito. — Devo ter pegado
no sono, não tinha a intenção de dormir na sua cama.
Ela fica tensa em meus braços, então me empurra calmamente,
saindo do meu abraço. Luana vai até a pia e pega um guardanapo,
seca as lágrimas antes de voltar a me olhar.
Agora tenho certeza que algo mudou, porque a forma com que
seus olhos focam nos meus indicam que ela quer me fazer
desaparecer.
— Desculpa o incômodo, não vai acontecer novamente — ela fala
em um tom frio e controlado, diferente de antes. — Temos a manhã
praticamente vaga no consultório e ainda é cedo, eu dou conta das
coisas por lá, pode descansar.
— O que está acontecendo agora? — questiono, há um minuto
atrás ela chorava em meus braços e agora me olha como se eu fosse
o culpado pela merda toda.
— Estou te dando a manhã de folga, só isso.
— Não, você está me olhando como se fosse me matar — rebato
ficando cada vez mais confuso. — Não foi culpa minha, Luana.
— Eu sei que não, mas claramente você não queria se envolver e
acabei te arrastando para cá — ela responde com a voz mais firme e
acusatória. — Entendi o recado, Yuri, não precisa se preocupar.
— Que recado, porra? — falo mais alto.
— Que foi só sexo, uma tara pela chefe, talvez, já nem importam
mais os motivos. — Ela joga na minha cara. — Você saiu do
consultório tão rápido quanto entrou.
— É sobre isso?
— Sim, é sobre isso, esperava o mínimo de maturidade depois do
que aconteceu entre nós.
— A gente transou, Luana, você gozou na minha boca e com o
meu pau enterrado nessa boceta gostosa, e foi só isso. — A cada
palavra avanço mais sobre ela, até que nossos corpos ficam a
centímetros um do outro.
— Tem certeza? — Sua provocação é a faísca necessária para
acender o combustível dentro de mim, e explodo.
Tomo sua boca com raiva, prendendo o lábio inferior em meus
dentes, ouço o gemido de Luana na mesma hora em que sua mão
agarra a barra da minha camiseta e força o tecido para cima.
Faço o mesmo com ela, desgrudando do seu beijo somente para
despi-la, sinto sua respiração rápida contra a minha quando volto a
dominar sua boca, nossas línguas em uma batalha por controle, sua
mão entra pelo cós da minha calça e agarra meu pau, o aperto firme
me faz rosnar como um animal.
Perco todo o controle quando ela passa o dedo pela ponta e
espalha a umidade na cabeça sensível, Luana é habilidosa, sabe
como me domar, mas eu também tenho meus truques.
Agarro sua bunda com as duas mãos e a coloco sentada na
bancada da cozinha, puxo a calça e a calcinha com brutalidade,
deixando-a nua e exposta para mim, suas mãos apertam meu cabelo
e puxam meu rosto para si.
Vejo o fogo no seu olhar, o tesão misturado com a raiva em cada
um dos seus gemidos, e sou arrebatado por ela, pelo ódio de antes
que se transformou em um desejo carnal, quero estar dentro dela,
senti-la ordenhar meu pau, fazê-la gritar meu nome enquanto fodo
todas as suas inseguranças para fora dela.
— Camisinha — Luana consegue falar contra meus lábios.
— Merda. — Mordo seu pescoço, deixando uma marca vermelha,
marcando meu território, então saio correndo, completamente pelado,
vou até seu quarto, pego o pacote de preservativos na mesa de
cabeceira e retorno o mais rápido possível.
Quando retorno, Luana já está com uma expressão arrependida no
rosto.
— Yuri, eu não acho que essa seja uma… — Não deixo que
continue falando, ela não vai me fazer parar agora.
— Não é uma boa ideia — falo contra seus lábios carnudos
enquanto deslizo a camisinha no meu pau. — Mas você consegue
parar?
Sei a resposta no momento em que ela prende meu olhar com o
dela, suas pernas se abrem e enlaçam minha cintura, forçando meu
quadril para frente.
— Me fode — Luana ordena com a voz rouca e faço o que pede.
Entro nela de uma vez só, me afundando completamente na boceta
quente e molhada, pronta para mim. Ela grita e joga a cabeça para
trás, dando-me acesso ao pescoço delicado. Inspiro seu cheiro, é
doce e sinto o aroma de jasmim do seu shampoo.
Logo sinto suas unhas compridas arranharem minhas costas, como
uma gata feral, Luana me marca e a dor é mais um incentivo, fodo sua
boceta com movimentos rápidos e brutos, e ela geme cada vez mais
alto.
Abocanho um dos seus mamilos e aperto os lábios contra o bico do
peito, com uma mão seguro a sua cintura e com a outra desço para o
meio das suas pernas, encontrando o clitóris inchado, começo a
massageá-lo e sinto suas pernas tremerem nas minhas costas.
— Mais forte, Yuri, me fode com vontade. — O tom exigente me faz
sorrir, minha maldita psicóloga gosta de brutalidade.
— Isso é bom, coração? — pergunto ofegante e mordo seu ombro.
— Sim.
— Você ainda acha que é só uma tara qualquer pela minha chefe?
— Agora subo mais e mordo o lóbulo da sua orelha. — Responde —
exijo quando ela não o faz.
— Sim.
— Não sabe o quanto está enganada.
Sinto que ela treme ainda mais contra a minha mão, sua boceta
começa a apertar meu pau, então paro de estimular o clitóris e agarro
seu pescoço, forçando-a a abrir os olhos e me olhar enquanto meto
fundo dentro dela.
— Isso é o que você faz comigo, coração — rosno contra a sua
boca. — Esse maldito fogo só você é capaz de provocar.
— Yuri… — Luana perde o controle e se esfrega ainda mais contra
mim, ela não aguenta e leva a própria mão ao lugar onde antes
estavam meus dedos, masturbando-se, procurando pela própria
libertação.
E assim que ela trava as pernas e curva a coluna, sinto seu canal
apertar ainda mais meu pau e gozo junto com ela. Perdendo a lucidez
por um momento, seguro seu corpo suado contra o meu, nos
aproximando mais, e sinto sua respiração ofegante em harmonia com
a minha.
Puta que pariu, porque isso é tão intenso?
O que diabos essa mulher faz com o meu corpo que não consigo
me controlar, é uma mistura de tesão e obsessão que toma conta dos
meus pensamentos.
E o pior, eu quero mais, não lembro de sentir isso antes, mesmo na
melhor foda da minha vida, essa coisa de desejar continuar aqui
depois de gozar… isso nunca aconteceu.
— Não se afaste agora. — A voz baixa e tranquila de Luana me
ancora à realidade. — Eu sei que é complicado, que não tem futuro e
todas essas coisas, mas foda-se.
O que eu faço? Por que não consigo simplesmente sair? É o que
deveria fazer, não estava em meus planos me envolver assim com
ela.
Sai, Yuri, você já teve um orgasmo, já gozou como há muito tempo
não fazia, só vira e vai embora.
— Tudo bem. — Escuto minha voz, mas não acredito nas palavras,
é como se meu corpo estivesse desconectado da mente, eu não
ganho nada por ficar aqui, isso só vai prejudicar ainda mais meu jogo,
mas não consigo me forçar a sair.
Luana me abraça mais apertado, e só então um cheiro forte de
queimado nos atinge.
— Droga, esqueci o café da manhã. — Ela se desvencilha dos
meus braços e me afasto a tempo de ver as panelas ainda no fogão, a
fumaça saindo do bacon queimado a faz tossir e abanar com as
mãos.
Rapidamente pego a tampa na pia e fecho a panela, desligo o
fogão e mantenho a fumaça contida.
— Você estava fazendo café da manhã para mim? — pergunto com
um sorriso ao ver a quantidade de ovos mexidos separados em uma
bacia e o tamanho da panela de bacon.
— Eu estava com fome, e se já ia preparar algo para mim, não
custava nada fazer o dobro — ela responde, mas o sorriso travesso
entrega a mentira.
— O que você achou que tinha acontecido? — pergunto com
curiosidade, se ela não lembra de ter sido dopada, deve ter criado
alguma teoria nessa cabeça esperta.
— Simples, quando acordei com você praticamente pelado atrás de
mim, deduzi que em algum momento da noite passada, depois de uns
drinks, eu liguei para você.
— E porque você foi para aquele bar ontem, Luana? — Tento
manter minha voz calma, mas o tom firme a faz desviar o olhar. —
Estava procurando uma foda de uma noite para me esquecer?
— Convencido demais, Yuri, quem disse que eu tinha algo a
esquecer? Como você mesmo falou, foi só sexo.
— Acho que já deixamos claro que não é só isso, coração, agora
assume.
— Tudo bem, eu queria ser fodida até esquecer como você me
usou e depois foi embora.
— Se minha memória não falha, você teve dois orgasmos. — Abro
meu sorriso mais provocante e pisco para ela. — Se alguém foi usado
naquele dia, fui eu.
— Você está contando? — Luana me encara e passa a língua pelo
lábio inferior. — Bem, teremos que igualar este placar depois.
— Não vejo a hora.
— Mas antes, café — ela fala e corta o momento, vai até a cafeteira
que ainda está quente e serve duas xícaras com o líquido escuro —
Não sei como você gosta do seu.
— Forte e sem açúcar — respondo, pegando a xícara que ela me
oferece. — Assim está perfeito.
— Como um verdadeiro psicopata — ela brinca, vai até a geladeira
e coloca leite na sua xícara antes de voltar para a cozinha. —
Contudo eu estava falando sério, pode tirar a manhã de folga.
— Quer me usar mais um pouco? — gracejo, já sentindo meu pau
endurecer.
— Infelizmente tenho um compromisso fora do escritório. — A
resposta evasiva chama minha atenção.
— Não lembro de nada em sua agenda — digo, tentando manter a
calma.
— É algo pessoal. — Novamente nada de detalhes e Luana desvia
o olhar ao falar, ela está mentindo.
— Tudo bem, acho que vou aproveitar a folga e fazer algumas
tarefas que estão atrasadas — minto e sorrio para ela, que relaxa
pensando que aceitei as desculpas.
Como se soubesse o melhor momento para aparecer, o filhote de
gato começa a miar desesperadamente e se joga nos pés de Luana.
— Tem alguém com fome — ela fala e se veste rapidamente antes
de pegar o gato no colo. — Vou dar comida para esse moço, fique à
vontade, Yuri.
— Eu já vou indo. — Uso o momento como desculpa para sair. —
Nos vemos à tarde no consultório — falo e por impulso beijo seu
rosto, só percebo o que fiz quando saio pela porta e encaro o corredor
vazio.
Que merda foi essa?
Assim que Yuri sai pela porta, tudo o que acabou de acontecer
entra em perspectiva. A atração que sinto por ele mais uma vez levou
a melhor, mas o que mais me assusta é saber que não quero parar.
Pego meu telefone e vejo duas ligações perdidas de Amélia
Corleone de poucos minutos atrás, e como se soubesse que estou
com o celular na mão, o telefone toca novamente.
— Bom dia, Amélia — atendo curiosa.
“Bom dia, Luana, desculpa
te ligar a essa hora, mas
gostaria de conversar com
você sobre a ONG. Poderia vir
até a mansão hoje pela
manhã?”
Este é nosso sinal para marcar uma consulta para Daniele. Sempre
que ela não pode vir ao escritório, Amélia me liga e fala sobre sua
ONG, que ajuda diversos orfanatos da cidade.
— Claro, tenho a manhã livre, posso estar aí em uma hora — ela
sabe que segunda-feira de manhã não atendo pacientes, então
quando marcamos sessão de emergência, geralmente é neste
momento.
“Perfeito, já aproveita e fica
para almoçar, estamos com
saudade.”
— Hoje vou agradecer o convite, adotei um gatinho e ele precisa
ser alimentado com frequência, mas deixamos para um próximo
momento.
“Claro, querida, espero você aqui.”
Desligo e começo a me arrumar, tem semanas que Daniele cancela
as consultas, na última sessão ela falou que provavelmente teria que
viajar e não sabia quando voltaria, por isso não marcamos
pessoalmente.
A família Corleone não lida com negócios ao telefone, nunca falo
com Daniele diretamente, porque ninguém pode saber dos nossos
encontros, marcamos as consultas pessoalmente ou Amélia faz a
ponte.
Eles mantêm o mais secreto possível, para sua proteção e a minha
também, a máfia tem muitos inimigos e qualquer informação é uma
arma nas mãos erradas.
Eu sabia disso quando a aceitei como paciente e os Corleone
garantiram que manteriam tudo sob sigilo absoluto. Poucas pessoas
sabiam e meu pai garantiu que ficasse em segredo.
Ele foi um homem que dedicou sua vida para proteger a Família
Genovese e a nossa, todo este esquema foi montado por ele.
Aos olhos públicos eu sou uma das pessoas que ajuda Amélia com
a ONG, uma parte do lucro do consultório é direcionada aos orfanatos
administrados por ela, também sou eu quem indico profissionais que
fazem o acompanhamento psicológico das crianças.
Ainda é um risco ter meu nome envolvido com ela, mas
precisávamos de alguma justificativa para nossos encontros, afinal
participo de eventos na mansão com certa constância, sendo o mais
luxuoso a festa de final de ano, então constantemente tenho fotos nos
mesmos lugares em que eles estão, por isso o disfarce é necessário.
Ao sair da garagem vejo o carro preto me seguindo, provavelmente
homens da Família que farão minha escolta até a mansão, já estou
acostumada.
Amélia me recebe com um abraço apertado, a mulher é mais baixa
e muito menor do que eu, porém seu carinho lembra o da minha mãe.
Daniele me espera no escritório do Capo com um café em mãos e
o olhar perdido em pensamentos, só de ver sua postura tensa sei que
a sessão de hoje será longa.
Como esperado, saio da mansão já passadas as onze horas da
manhã. Depois de uma hora e meia de terapia, Daniele finalmente
conseguiu se acalmar, os últimos dias foram complicados para ela,
mas estou orgulhosa da forma com que lidou com os problemas na
viagem.
Chego ao apartamento depois do meio-dia e sou recebida por um
Vader escandaloso gritando nos meus pés, ele já começou a comer
ração úmida, então abro o sachê e despejo em seu potinho.
— Quando você crescer mais, vou comprar aqueles comedouros
automáticos, assim não precisa berrar toda vez que eu chegar —
converso com o gato, mas sou completamente ignorada. — Nem um
miado de resposta? Tudo bem, então.
Meu estômago torce de fome e percebo que não tenho muito
tempo, quando vou pegar a pizza congelada, a campainha toca.
— Ouvi você chegar — Yuri fala assim que abro a porta, ele está
com um prato nas mãos e me olha com aquele sorriso perfeito. —
Aproveitei minha manhã de folga e fiz uma lasanha, trouxe um pedaço
para você, caso ainda não tenha almoçado.
— Obrigada — agradeço e dou espaço para ele entrar, sinto o
cheiro de comida assim que ele passa por mim e meu estômago
ronca mais alto. — Você me salvou de uma pizza congelada.
Aponto para a caixa na bancada e ele sorri enquanto leva o prato
ao micro-ondas.
— Realmente essas coisas não são as melhores, só servem para
emergências. — Yuri pega a caixa e guarda no freezer, abre a
geladeira, tira o pote em que guardo a salada de folhas, pega um
tomate e leva tudo para a pia.
Só então percebo que ele tomou conta da minha cozinha.
— Não precisa fazer isso — vou até ele, mas sou parada antes de
chegar à pia.
— Só senta aí e aproveita, vou preparar uma salada para
acompanhar a lasanha.
— Obrigada — agradeço e me jogo na banqueta alta. — Já que
está aqui, podemos ir juntos ao consultório hoje.
— Perfeito. — Yuri coloca a salada em uma vasilha, pega o prato
com a lasanha e me entrega a comida, que está maravilhosa, por
sinal, além de ser um gostoso o maldito ainda sabe cozinhar, então
senta-se em minha frente e me assiste comer.
— Vou ficar mal acostumada assim — comento e recebo um sorriso
lindo em resposta.
— Eu te deixo pagar um café naquele lugar novo no Central Park.
— Sabia que esse almoço não sairia de graça — brinco, enquanto
como mais um pedaço de lasanha. — Só porque isso aqui está muito
bom, eu pago o café, aliás aonde você aprendeu a cozinhar assim?
— Tenho várias habilidades, coração. — Ele pisca e minha calcinha
umedece, droga, acho que vou ter que começar a andar com algumas
roupas de baixo extras na bolsa. — Para de me olhar assim ou seus
pacientes ficarão sem terapia hoje.
Rio da piada e termino meu almoço. Yuri decide ir com o próprio
carro depois de dar uma olhada nos meus pneus, segundo ele, está
na hora de trocar, não é seguro andar com eles assim.
Para falar a verdade, não entendo nada de carros, quem fazia a
manutenção e mantinha o meu em dia era meu pai, toda vez que eu ia
para casa ele passava um tempo averiguando o veículo e, se
precisava levar ao mecânico, eu ficava com o da minha mãe por um
tempo.
Só mais uma coisa que preciso adicionar à lista de tarefas que não
estou acostumada a fazer, quando percebo algo assim tenho dois
sentimentos conflitantes, o primeiro é a gratidão que sinto por ter tido
pais que me amaram e protegeram a vida toda.
A segunda é mais complicada, pode-se dizer que por causa dessa
proteção, não fui realmente preparada para viver sem eles, e agora
tenho que descobrir isso sozinha.
— No que você está pensando? — Yuri chama minha atenção
enquanto dirige, o dia chuvoso é perfeito para a tristeza que sinto e
tenho certeza que transparece em meu rosto.
— Só reparei no quanto sinto falta dos meus pais — respondo com
sinceridade. — Eles foram muito presentes na minha vida, mesmo
depois que sai de casa, acho que nunca cortei o cordão umbilical.
— Vocês eram próximos?
— Da nossa forma, sim. Não nos falávamos todos os dias ou
passávamos todas as férias e finais de semana juntos, mas eles
sempre estavam lá para o que realmente importava.
— Parece bom — Yuri responde mecanicamente e me sinto mal
por falar sobre isso, ele perdeu os pais quando ainda era uma criança.
— Desculpa, você deve me achar uma sem noção por reclamar
assim.
— Por que você pensa isso?
— Bem, aqui estou eu triste por não ter meus pais ao meu lado,
quando tive o privilégio de passar 41 anos com eles.
— E você acha que eu estou triste porque não tive isso? — Ele me
olha de canto e, quando não respondo, Yuri continua em um tom
sério. — Você está no seu direito de sentir falta deles, sua vida mudou
de uma hora para a outra, e pode falar comigo sobre isso, já lidei com
a morte dos meus pais.
— A questão é que me sinto uma menina mimada quando percebo
o quanto era dependente deles, quando você falou do carro reparei
que não sei nem quando preciso fazer manutenção, porque meu pai
tratou disso desde que me deu o primeiro veículo — despejo as
palavras nele e sinto meu rosto aquecer com a vergonha.
— A partir de agora fico responsável pelo seu carro e por tudo o
que seu pai fazia por você, se você não se sente preparada para lidar
no momento — ele fala em tom de promessa e, não sei porque, mas
me sinto mais tranquila.
— Não precisa fazer isso, eu consigo assumir meus perrengues.
— Eu sei que você consegue, que é uma mulher forte e
independente, mas estou aqui para te ajudar, você não precisa
carregar tudo sozinha.
É como se suas palavras ativassem algo em mim, desde que Yuri
entrou na minha vida, não me sinto mais sozinha. E isso me assusta
mais do que posso aguentar agora.
Chegamos ao consultório em silêncio e, desde então, estou em
minha sala e ele na recepção, meu primeiro paciente deve estar
chegando, então organizo a ficha para o seu atendimento.
Checo as câmeras, vejo o elevador parar em nosso andar e me
levanto para abrir a porta, mas a pessoa que sai de dentro não é meu
paciente e sim um homem branco, alto, cabelo grisalho, terno caro e
elegante, que anda confiante com uma mão no bolso e olha
diretamente para Yuri.
E é a reação do meu secretário que me faz congelar no lugar, seu
olhar está fixo no homem, a postura tensa, vejo uma mão fechada em
punho e o conjunto todo me faz tremer, Yuri parece um animal prestes
a atacar.
— Yuri Saito. — Escuto a voz grossa do desconhecido que para
bem de frente para meu secretário. — Então é aqui que você se
esconde.
— O que você está fazendo aqui? — Yuri levanta e contorna sua
mesa, ficando de costas para a câmera, mas de frente para o homem.
— Estou em uma viagem de negócios e resolvi visitar um velho
amigo — o estranho fala e abre um sorriso falso, é uma provocação.
— Infelizmente estou em horário de trabalho, não tenho tempo para
conversar agora. — A voz baixa e fria de Yuri é claramente um aviso.
Como se fosse um sinal, o elevador apita e Dr. Carlos, meu paciente,
entra no consultório.
Yuri muda completamente ao ver o Dr. e volta para trás de sua
mesa, por fora ele parece calmo, mas a tensão de antes não acabou.
Ele me avisa da chegada do paciente e vou até a porta para recebêlo.
Mas antes que eu possa chamar o Dr. Carlos, o estranho se
adianta e vem em minha direção com a mão estendida.
— Luana Masseria, é um prazer finalmente conhecê-la — fala com
o tom mais falso que já ouvi de alguém, aperto sua mão, mas encaro
Yuri.
— Este é Giovani Rossi, um velho amigo — meu secretário
apresenta e tenho certeza que a última parte é mentira.
— Você é o chefe da Vivian — comento ao lembrar onde já ouvi
este nome, ele abre um sorriso ainda maior e acena em concordância.
— Sim, uma secretária incrível, obrigado por treiná-la.
— Se alguém foi treinada nos anos em que trabalhamos juntas,
esta pessoa sou eu — brinco para tentar aliviar o clima. — É um
prazer conhecê-lo senhor Rossi, agora se me dá licença. — Passo por
ele e olho para meu paciente, que encara a situação sem entender
nada — Dr. Carlos, pode entrar, por favor.
Abro meu melhor sorriso e dou passagem para meu paciente e
encaro Giovani.
— Foi um prazer conhecê-la — ele diz antes que eu feche a porta.
Acompanho Dr. Carlos, que escolheu o sofá para a sessão de hoje,
então vou até a minha mesa, pego o bloco de anotações e a caneta, e
antes de me virar e focar em meu paciente, olho de relance para as
câmeras da recepção e vejo a hora em que Giovani se inclina e fala
alguma coisa no ouvido de Yuri.
Desligo a tela e foco em meu paciente, decido falar com meu
secretário depois do horário de trabalho.
O filho da puta teve a coragem de vir me confrontar no consultório,
onde não posso fazer nada com Luana na outra sala. Mas Giovani
sabe disso, ele veio até aqui para me provocar.
— Espero que seu novo emprego seja tão bom quanto o antigo —
instiga e preciso controlar meus impulsos para não pular em cima dele
e arrancar esse sorriso falso no soco.
— É muito melhor — respondo com calma e vejo seu controle
vacilar por um segundo. — Não tenho tempo para conversar agora,
Giovani, sei que entende isso.
— Sim, você é um homem muito ocupado — ele abaixa o volume
ao falar a última parte. — Estarei na cidade até amanhã de manhã,
você sabe como me encontrar.
Ele deve estar com vontade de morrer, só pode. Giovani não
espera resposta e sai, mas não sem antes olhar para trás e me lançar
um sorriso convencido, ele acha que tem um trunfo contra mim.
Realmente pensa que pode entrar neste jogo, mas não funciona
assim, Giovani, nesta mesa quem criou o baralho e dita as regras sou
eu, e você vai aprender logo que não é uma boa ideia apostar na sua
mão de merda.
O restante da tarde passa lentamente, Luana não toca mais no
assunto, apesar de eu ter certeza que está se controlando, ela é
inteligente demais para não ter percebido a tensão entre Giovani e eu,
e tenho certeza que deve ter mil questionamentos naquela cabecinha.
Tudo o que eu não precisava agora é esse maldito aparecer para
estragar meus planos, justamente quando ela começa a confiar em
mim.
Quando entramos no carro para voltar para casa, Luana está quieta
demais, então decido falar antes que ela pergunte alguma coisa ou
pense que tenho algo a esconder.
— Giovani Rossi é o CEO da Rossi Multimídia, uma grande
empresa em Chicago — explico com calma e ela me olha
atentamente. — Esta próxima parte não é algo que eu me orgulhe,
mas vai explicar a estranheza que presenciou no escritório hoje. —
Preparo o terreno e relaxo os ombros, baixo meus olhos e fecho a
mandíbula, formando uma expressão de arrependimento. — Nós nos
envolvemos por um tempo, ele é casado e tem filhos, mas é fachada
para esconder sua homossexualidade.
Luana controla a expressão de surpresa em seu rosto, como
psicóloga deve fazer muito isso nos atendimentos, então continuo a
falar.
— Não é um momento da minha vida do qual eu me orgulhe —
mentira, atrair Giovani e usar isso contra ele foi uma conquista —,
ficamos juntos por um tempo até que o Dr. Moura anunciou que iria
fechar a clínica, foi o melhor momento, eu vejo agora, e me deu uma
desculpa para sair de lá e recomeçar em outro lugar.
Meu envolvimento com Giovani não é mentira, só os motivos que
me levaram a isso e a parte final da história, não crio narrativas
completamente falsas, modifico a verdade, isso torna tudo mais
natural e evita que eu caia em minha própria mentira algum dia.
— Acho que deu para perceber que ele não aceitou bem minha
decisão de terminar tudo — continuo falando e agora suavizo minha
voz para que pareça que estou com pena de Giovani. — Ele pensa
que está apaixonado, mas não faço a menor ideia de como descobriu
que estou aqui.
— Você sabia que Vivian ia trabalhar para ele?
— Ela comentou nos primeiros dias que eu estava aqui, mas não
quis falar nada, Giovani não é uma pessoa ruim. — Vivian realmente
falou sobre isso, mas fingi que não sabia de nada.
Luana fica séria por um momento, absorvendo as informações que
acabei de falar.
— Você sente algo por ele? — ela finalmente pergunta.
— Não mais — respondo e novamente moldo uma falsa expressão
de tristeza. — Na época achei estar apaixonado, mas cansei de ser o
segredo sujo de alguém — apelo para sua simpatia e recebo um olhar
carinhoso de Luana. — Agora vejo que não passei disso, ele veio até
aqui para me provocar, porque sumi sem dar explicações.
— Talvez seja bom ter uma última conversa, ele pode precisar
desse ponto final — ela sugere, e sim, ele precisa de um ponto final,
mas na própria vida.
— Tem razão, vou ligar para ele depois. — Relaxo no banco e abro
meu melhor sorriso para ela. — Desculpa por trazer esta confusão
para o consultório.
— Não é sua culpa, você não tinha como saber que ele iria
aparecer lá.
Na verdade tinha, mas fiquei tão concentrado em você nos últimos
tempos que deixei de fiscalizar os passos de Giovani, e também não
pensei que ele seria tão burro a esse ponto, especialmente depois da
minha última ameaça.
— Quero te levar para um encontro — falo para desviar do assunto
e sou recompensado com a expressão de surpresa de Luana.
— Como assim?
— Um encontro, onde duas pessoas que estão interessadas uma
na outra saem para fazer algo brega, porém romântico. Tenho certeza
que já teve alguns desses — brinco e pisco para ela.
— Sim, mas você é meu secretário, não é apropriado.
— Achei que você já tinha superado isso.
— Não quero que o que quer que esteja acontecendo entre nós,
interfira em nossa relação no consultório — Luana responde e fica
vermelha, claramente se referindo ao sexo em cima de sua mesa.
— Prometo não deixar que isso aconteça. — Ergo o dedo mindinho
como um gesto de promessa infantil. — Só não garanto que não vou
te comer em cima da sua mesa de novo.
Ela solta uma gargalhada que me faz sorrir.
— Yuri.
— É só não fazermos isso em horário comercial e fica tudo bem. —
Pego sua mão e entrelaço nossos dedos, como um casal normal. —
Qual é a sua resposta para o encontro?
— Você não fez uma pergunta — Luana aperta minha mão —, mas
a resposta é sim.
— Sexta-feira à noite. — Entro na garagem do nosso prédio e
quando paro o carro na vaga ao lado da dela, volto toda minha
atenção para Luana. — Você não vai se arrepender.
Com isso tomo sua boca na minha em um beijo delicado, seus
lábios quentes e macios se abrem para mim e logo nossas línguas se
encontram, passo uma mão pelo seu pescoço para controlar os
movimentos e Luana morde meu lábio inferior.
Adoro a forma com que ela se entrega facilmente a cada toque
meu, é delicioso observar suas reações e ter o controle sobre ela.
Merda, meu pau já está duro contra a calça e se continuar assim,
vou pular em cima dela dentro do carro mesmo.
— É melhor parar se não quer dar um show para as câmeras de
segurança — digo com a respiração acelerada. — Agora preciso ir ao
mercado, na volta passo no seu apartamento.
É uma ordem e ela não precisa de mais explicações para saber o
que vai acontecer, então a safada sorri e sai do carro, caminha
rebolando como uma diaba em direção ao elevador.
Acompanho Luana com o olhar e um sorriso bobo no rosto até que
as portas do elevador se fechem, abro as câmeras do seu
apartamento e confiro as imagens, garantindo que não tem ninguém
lá, assim que ela entra em segurança, arranco com o carro.
Giovani está em um hotel de luxo no centro de Manhatan, o mesmo
que sempre usa quando vem à cidade, como esperado meu nome já
está liberado na recepção, ele sabia que eu viria, o único motivo para
ter ido pessoalmente até o consultório foi não me dar a opção de
ignorar seus e-mails ou ligações.
Ele acha que tem um trunfo sobre mim.
O elevador para no 24º andar, vejo a porta já aberta, Giovani está
escorado no batente, vestindo o roupão do hotel, a postura relaxada e
as mãos no bolso. Contudo o que me faz perder o controle é o sorriso
vitorioso estampado em seu rosto de merda.
Caminho rapidamente até ele, agarro seu pescoço com firmeza e o
jogo com força para dentro do quarto, fechando a porta atrás de mim.
Posso ver o exato segundo que ele percebe a merda em que se
meteu, mas já é tarde, assim que seus olhos alarmados encontram os
meus, estou em cima dele e acerto um soco na boca do estômago,
fazendo-o se contorcer de dor.
Uso este momento para virá-lo de barriga para baixo, puxo seus
dois braços para trás e com o joelho aplico pressão na base da sua
coluna até que escuto o estalar dos ombros.
Giovani grita de dor, mas prendo suas duas mãos com uma minha,
e tapo sua boca com a outra, imobilizando-o completamente.
— Você vai escutar calado cada palavra que vou te dizer agora. —
Minha voz é um rosnado profundo em seu ouvido. — Sua vida é
insignificante para mim, mas pensei que você se importava com sua
reputação. Vejo agora que não, então lembre-se, é sua culpa que
preciso chegar a estes extremos.
— Maicon, o que você… — ele praticamente chora embaixo de
mim, mas o calo novamente.
— Eu sei todos os passos da sua mulher e dos seus filhos, os
horários da escola, dos cursos, acompanho cada passo que eles dão
nesse mundo — baixo o volume da minha voz enquanto falo —, um
único acidente de carro é capaz de mudar tudo na sua vida, ou quem
sabe a merenda da escola esteja contaminada? Talvez os dutos de
gás da sua casa apresentem vazamento, uma faísca só faria o
serviço… São tantas opções, Giovani, mas no fim o resultado será o
mesmo.
— Maldito, não vou deixar…
— Não me importo com o que você pensa que pode fazer, você é
um verme nojento que eu usei enquanto precisava e depois descartei,
aceite isso, suma da minha vida e me esqueça. — Puxo seus braços
mais para trás, quase quebrando-os, sinto a necessidade de fazer
isso, quero que ele sofra, que grite de dor e medo, preciso colocá-lo
em seu lugar — Se mesmo com isso você ainda tiver ideias nessa
cabeça de merda e tentar fazer alguma coisa contra mim, lembre-se
de um nome, Alphonse Corleone.
Giovani treme ao ouvir o nome do Capo da Família Genovese, ele
sabe quem é, sua família não enriqueceu com a força do trabalho
honesto, seu pai é filho de um imigrante italiano que foi obrigado a sair
de New York quando tentou bater de frente com a Família.
O próprio Giovani me contou a história em uma noite de drogas e
bebedeira, ainda não sei como consegue manter em segredo sua
sexualidade, porque é só tomar umas a mais que o homem conta
tudo.
É uma ameaça vazia, não tenho contato com o Capo e duvido que
faria qualquer favor a um simples secretário, mas Giovani não sabe
disso e a máfia é seu maior temor, portanto uso esse medo contra ele.
— Agora repete comigo: eu sou um verme e vou esquecer que
Maicon Campbel ou Yuri Saito existem — falo em seu ouvido e
espero, quando ele não fala nada, forço seus braços mais ainda.
— Eu sou um verme e vou esquecer que Maicon Campbel ou Yuri
Saito existem…
— Bom garoto, agora vou te soltar, fique exatamente onde está e
nem pense em chamar alguém, se eu ver a sua cara nesta cidade
novamente… bem, você já sabe!
Deixo o homem gemendo de dor enquanto arrumo minhas roupas,
sinto meu coração bater tranquilo no peito, nem sequer acelerou com
a adrenalina, antes de sair encontro a caixa aberta com as
abotoaduras que Giovani costuma usar durante reuniões importantes
e fico com uma delas, um pequeno troféu que simboliza o ponto final
nesta história.
É isso, sou um maldito predador, se eu tivesse como esconder o
corpo do desgraçado que está no chão e fazê-lo desaparecer sem
que isso colocasse meus planos em perigo, Giovani já não estaria
mais respirando a uma hora dessas.
Vader está crescendo rápido e fica cada dia mais esperto, agora
começou a andar atrás de mim o tempo todo, até que eu pare e o
pegue no colo. Então o pestinha tenta morder meus dedos.
Estou brincando com ele no sofá desde que Yuri me deixou em
casa, alcanço o celular e vejo que são 21 horas, também tem uma
notificação de mensagem dele.
“Você prefere pizza ou comida japonesa?”
“Ambos.”
Respondo quando meu estômago ronca de fome.
“E a sobremesa?”
Abro um sorriso ao digitar a resposta.
“Aceito você coberto com sorvete de
morango.”
Penso por um segundo e quase apago tudo de vergonha, mas
aperto enviar.
“Seu pedido é uma ordem, coração.”
O apelido carinhoso que ele coloca no final da mensagem faz meu
coração acelerar, eu estou muito, mas muito fodida mesmo.
Tomo um banho e lavo o cabelo, estava precisando mesmo,
quando saio do chuveiro e me enrolo na toalha, escuto a campainha.
Droga, achei que ele fosse demorar mais.
Saio quase correndo e, assim que abro a porta, encontro um Yuri
segurando uma caixa de pizza, sacolas de sushi e um pote de
sorvete, mas o que me faz ficar vermelha é a forma com que ele me
encara, passando o olhar dos pés à cabeça, quando chega em meus
olhos, o maldito prende o lábio inferior nos dentes e sorri.
— Foda-se o jantar — Yuri praticamente rosna, entrando no
apartamento, larga as coisas na bancada da pia e me puxa para um
beijo.
Consigo fechar a porta antes que ele tire a toalha em que estou
enrolada, me ergue pela bunda e imprensa meu corpo contra a
parede. Sua boca procura a minha enquanto envolvo minhas pernas
em sua cintura, seguro-me em seu pescoço e me esfrego nele.
Escuto o gemido brutal de Yuri contra meus lábios, ele pega uma
camisinha do bolso da calça, abre o zíper e abaixa até o joelho,
libertando seu pau duro e pronto para mim.
— Olha o que você faz comigo, Luana — declara com a respiração
ofegante. — Eu prometi que ia me controlar até a sobremesa.
— Por que? — instigo e mordo seu lábio inferior, sou respondida
com um rosnado, então ele abre o preservativo com os dentes e
desenrola rapidamente com uma mão só, a outra me mantém presa
contra a parede.
— Maldita provocadora — fala ao entrar em mim de uma vez só,
seu pau me abre e grito com a leve dor da penetração, mas logo ele
começa a se mover e o prazer toma conta. — Geme para mim,
coração.
— Mais forte — peço e não controlo os sons que saem da minha
boca, Yuri me fode com mais intensidade, sinto minhas costas
batendo na parede, seus dentes se arrastam pelo meu pescoço e jogo
a cabeça para trás. — Yuri, eu vou…
— Ainda não. — Ele diminui a velocidade dos movimentos e
começa a me torturar só com a ponta do pau, entrando até uma parte
e saindo. — Você vai gozar quando eu mandar.
— Não — retruco e levo uma mão até o meu clitóris, mas ele
interrompe o movimento antes que eu consiga me tocar e prende meu
pulso em cima da minha cabeça.
— Se tentar se tocar novamente, vou comer o seu cuzinho
apertado depois — ameaça contra meu ouvido e sinto um arrepio na
coluna, mas sorrio e levo a outra mão ao meu clitóris, se ele acha que
me foder por trás é castigo, Yuri ficará decepcionado.
— Vai precisar encontrar outra forma de me parar, porque eu amo
anal. — Vejo o sorriso de canto e o olhar feroz que ele me encara,
então começo a me tocar, Yuri desiste e volta a me foder com força,
minhas pernas começam a tremer enquanto ele me beija com mais
intensidade.
— Goza para mim, coração. — Sua voz é uma ordem e sou tomada
por um orgasmo intenso, minhas pernas tremem descontroladamente
e gemo seu nome. Como um chamado, Yuri se enterra em mim e
sinto seu pau pulsar enquanto ele goza.
Com a respiração ofegante e o corpo mole, me agarro em seu
pescoço e deixo que ele segure meu peso. Yuri me beija
carinhosamente antes de se afastar. Estou completamente nua, os
cabelos molhados e o corpo suado, se soubesse que seria atacada
assim, não teria perdido tempo tomando banho antes.
— Acho que preciso de outro banho — gracejo quando ele me
entrega a toalha que estava jogada no chão.
— Vou guardar o sorvete e te encontro lá. — Yuri abre seu sorriso
safado enquanto tira o preservativo e ergue as calças. — Só vou
pegar uma muda de roupa e já volto.
— Se quiser pode ficar sem roupa mesmo — brinco e arranco um
sorriso dele, mas como se precisasse provar algo, vejo Vader se jogar
nas pernas de Yuri.
— O que diabos… — o homem reclama, então sua cara de dor
confirma que o gato conseguiu enfiar as unhas em suas pernas e
agora tenta subir. — Tira isso daqui.
Tenho um ataque de risos com a cena, Yuri se contorce e Vader
sobe ainda mais rápido, mas quando está quase chegando na bunda,
pego o gato com cuidado, sem trazer muito perto de mim, já que estou
pelada e o pestinha vai cravar as unhas finas em qualquer lugar a que
tenha acesso.
— Desculpa, ele começou com essa mania de subir na gente e
morder os dedos — explico enquanto levo o gato para a sala. —
Pensando bem, é melhor você não ficar pelado, vai que ele confunda
as coisas.
Aponto para seu pau e Yuri me encara e franze a testa em uma
expressão ofendida.
— Sério que você vai comparar meu pau com um dedo, Luana?
— Já viu o tamanho da sua mão?
— Já viu o tamanho do meu pau?
— Já sim, inclusive senti ele todinho dentro de mim — saliento e
me enrolo na toalha.
— Você é uma diaba provocadora, espera só a hora que eu for
comer esse cuzinho lindo, aí você me fala se meu dedo é parecido
com meu pau. — Ele fecha a calça e sai do apartamento.
Quando volta, tomamos um banho juntos e transamos embaixo da
água quente do chuveiro. Depois sentamos no sofá em frente à TV
com as caixas de pizza e comida japonesa abertas, Yuri exagerou na
quantidade, mas achei fofo ele trazer os dois.
Não pergunto sobre Giovani, se algum dia ele quiser me contar
algo é escolha dele, também tenho meu passado e coisas que prefiro
que fiquem lá.
Nossa relação ainda é recente, somos adultos e carregamos
bagagens do passado, com o tempo iremos nos conhecer melhor, um
relacionamento funcional não é aquele em que os dois sabem tudo
sobre a vida um do outro, mas sim onde ambos aceitam que têm um
passado, mas focam no futuro.
O que vivemos moldou quem somos agora, mas não define quem
seremos daqui para frente.
Termino o terceiro pedaço de pizza, que inclusive está maravilhosa,
olho a caixa e leio o nome da pizzaria do Tio Giovani, enquanto Yuri
devora o restante do yakissoba. Colocamos um episódio de Daredevil
na Netflix, ele disse que nunca assistiu, como já estava na minha lista
resolvemos ver juntos.
O momento é estranhamente confortável, faz muitos anos que não
sinto essa leveza ao estar com alguém, especialmente um homem. Se
me lembro bem a última pessoa com quem dividi um momento
parecido foi meu ex-marido.
Depois a vida entrou no caminho e já não tirávamos tempo para
ficar assim, à toa, ele estava sempre trabalhando ou fazendo algum
curso de especialização depois do trabalho, e eu aproveitava para
estudar meus pacientes e me atualizar nas revistas médicas e artigos
mais recentes.
Éramos parecidos demais, ambos envolvidos em nossas carreiras
sem realmente querer focar no relacionamento, até que nos tornamos
dois estranhos em um apartamento.
— Se eu pudesse escolher um superpoder, gostaria de ler mentes
— Yuri fala do meu lado e só agora percebo que o primeiro episódio
acabou e ele pausou o início do segundo. — Só para saber o que
você está pensando agora.
— Confia em mim, os pensamentos das pessoas devem ser
mantidos em segredo — falo com um sorriso tímido. — Sou paga para
que elas me contem o que pensam, e você não imagina as coisas que
escuto diariamente naquele consultório. Isso que a cada história que a
pessoa me conta, tem mais cem escondidas que ela está muito
envergonhada para compartilhar.
— Não queria ler a mente de outras pessoas, só a sua já estava
bom.
— Você pode perguntar, não tenho esqueletos no armário. — Dou
de ombros e encaro seus olhos escuros.
— No que estava pensando?
— Em quanto tempo faz que não me sinto tão confortável com
alguém, a última pessoa foi meu ex-marido, e foi antes de nos
casarmos.
— O que aconteceu?
— Acho que estávamos tão focados em nossas carreiras que
esquecemos de viver.
— E você quer viver agora? — Sua pergunta me pega de surpresa,
não parei para pensar sobre isso, os últimos meses foram
conturbados e, para falar a verdade, estava só sobrevivendo a um dia
após o outro.
— Acho que voltei a querer. — É a única resposta que tenho agora,
ele parece aceitar, então levanta-se e vai até a cozinha, quando volta
vejo o pote de sorvete e uma colher.
— Sofá ou cama? — Yuri me faz escolher, e só pelo sorriso safado
estampado em seu rosto, sei exatamente o que vai acontecer.
— Cama, e é melhor deixar a porta fechada, o Vader já consegue
subir, vai que ele encontra seu dedo — provoco e recebo uma
gargalhada em resposta.
— O tanto que vou gozar nessa bunda gostosa — ele promete e o
sigo até a cama. — Mas antes, tira a roupa — Yuri ordena e decido
seguir seus comandos, tiro a camiseta e o calção de pijama que vesti
depois do banho, ficando somente com a calcinha de renda vermelha.
Puxo as cobertas da cama e deixo somente o lençol, que por sorte
é preto, já que vamos brincar com sorvete e outras coisas mais, abro
a gaveta da mesa de cabeceira, pego as camisinhas e um frasco de
lubrificante, deixo tudo preparado enquanto Yuri segue meus
movimentos com o olhar de águia.
— Boa garota — elogia com a voz rouca que atinge o meio das
minhas pernas. — Agora deita na cama e se abre para mim.
Faço o que ele pede, sem desviar o olhar do dele, Yuri coloca o
pote de sorvete na mesinha de cabeceira, tira a roupa, ficando
somente de cueca.
— Quero assistir enquanto você se dá prazer, Luana. — Ele se
aproxima, mas não me toca, então levo meus dedos à boca e lambo
antes de descer para o meio das minhas pernas, coloco a calcinha
para o lado e acaricio minha boceta, que já está encharcada.
— Você gosta de assistir? — insinuo quando vejo seu olhar seguir
o caminho da minha mão. — Gosta de acompanhar enquanto me dou
prazer?
— Você não faz ideia do quanto. — Ele lambe os lábios e vejo o
volume no meio das suas pernas. — Quero que circule seu clitóris
com calma, mas não feche os olhos.
— Assim? — pergunto e faço exatamente o que ele manda. — O
que mais você quer?
Yuri pega sorvete com a colher e leva à boca, passa a língua
teatralmente pelo doce e faz sua melhor cara de prazer. É como se
ele estivesse lambendo minha boceta, o pensamento me faz gemer e
ele sorri com isso.
— Mais rápido, Luana, imagine que seus dedos são os meus e
estou te tocando.
— Sim — respondo já com a respiração ofegante.
— Agora fecha os olhos. — Obedeço e sinto o colchão abaixar
quando ele sobe na cama, sua mão passa delicadamente pelas
minhas pernas até chegar na calcinha, que ele arranca com um
puxão. — Continua se tocando.
Faço o que manda e sinto algo gelado passar pelo interior da
minha coxa, logo depois a língua quente de Yuri faz o mesmo
caminho e gemo com a sensação.
— Agora tira as mãos e olhe para mim, coração.
Quando meus olhos encontram o dele, Yuri coloca o restante do
sorvete gelado que estava na colher no meu monte de vênus, sua
boca passa pelo doce e desce até minha boceta depilada, sinto a
mistura de frio e quente chegar ao meu clitóris. Então ele começa a
chupar e lamber com vontade, no mesmo ritmo que antes meus dedos
trabalhavam, e eu só consigo gritar de prazer.
Eu me esfrego em sua boca, procurando mais contato, mas ele
coloca as duas mãos em meu quadril e me segura com firmeza,
mantendo-me presa à sua boca e ao seu ritmo, ele domina meu
prazer enquanto me leva do céu ao inferno.
— Chupa mais forte — exijo e ele o faz, intensificando os
movimentos com a língua, sinto seus gemidos vibrando contra minha
carne. — Eu vou… — não tenho tempo de falar e um orgasmo me
atropela, tão intenso que aperto os olhos com força e vejo estrelas,
minhas pernas travam e agarro o lençol com as mãos, Yuri não para
de me chupar, o que só prolonga ainda mais o prazer.
Ele suga até a última gota do meu orgasmo e só para quando
amoleço em seus braços, perco a força e o controle do corpo e me
sinto flutuar, tão leve quanto uma pluma.
— Este é o melhor sabor de sorvete do universo. — Escuto a voz
de Yuri em meu ouvido. — Boceta e morango. — Sorrio para a sua
brincadeira, mas ainda não tenho forças para abrir os olhos.
— Isso foi… não sei…
— Só o começo, coração — Yuri promete e pela primeira vez na
vida tenho medo de não aguentar uma noite de sexo. — Mas pode
tirar um minuto para se recuperar, você vai precisar.
Ele sai e quando volta me entrega um copo com água, sinto minhas
forças voltando quando abro os olhos e sento na cama, meu corpo
está mais cansado do que quando volto de um treino na academia.
Yuri vai até o banheiro e pega uma toalha molhada, deita atrás de
mim e me puxa para seu peito, então começa a me limpar, seu
carinho e cuidado fazem meu coração martelar ainda mais rápido no
peito.
Deixo Luana se recuperar por alguns minutos enquanto limpo o
sorvete nela, para não ficar grudento, ainda sinto seu gosto na minha
boca e meu pau dói de tão duro.
Gosto de fazê-la gozar antes, de sentir que tenho esse poder sobre
ela, que só com a minha boca controlo seu prazer, sei que sou bom
na cama, seus gemidos selvagens só confirmam isso.
Quando termino jogo a toalha no chão e passo meus braços por
seu corpo, beijo o pescoço frágil e sensível, sinto sua pele se arrepiar
novamente.
Alcanço o pote de sorvete e pego o doce com a colher, então levo
até a boca de Luana, que sorri ao sentir o gosto de morango. Ela se
delicia em meus braços, tão linda e gloriosa tomando sorvete quanto
gemendo meu nome.
Luana reage ao meu toque intensamente, seu corpo todo parece
me querer, inspiro o perfume de jasmim do seu shampoo e passo uma
mão pela lateral do seu corpo, até chegar nos peitos grandes e
macios que enchem minha mão.
Brinco com um mamilo, sem pressa, só estou aquecendo-a para
me receber, então quando Luana solta uma respiração profunda, sei
que está de volta.
— Tenho algo a mais na gaveta, se quiser usar. — Sua voz sai
mais fraca que o normal. — A não ser que você não queira.
Sei do que ela está falando, meu presentinho, e é uma ótima ideia.
Alcanço a gaveta e pego o vibrador.
— Minha masculinidade não é frágil ao ponto de competir com um
vibrador, quando posso usá-lo ao meu favor. — Aproximo o brinquedo
da sua boca. — Chupa.
Ela sorri e faz o que mando, não é necessário, sei que sua boceta
já está molhada novamente, mas gosto de assistir enquanto sua
língua contorna o objeto cilíndrico, meu pau aperta na cueca.
Ligo na primeira velocidade e desço pelo seu corpo, parando nos
mamilos arrebitados, as mãos de Luana apertam minha perna quando
brinco com seus peitos sensíveis.
— Deita de ladinho, coração — instruo e ela faz o que falo, tiro a
cueca e liberto meu pau, pego uma camisinha e deixo ao meu alcance
antes de deitar atrás dela.
Coloco uma perna no meio das suas para abri-la e começo a
brincar com o vibrador em seu clitóris, descendo até a boceta
molhada, é um modelo bunny que tem duas partes, uma para
estimular a vagina e a outra o clitóris.
Quando introduzo o brinquedo calmamente nela, Luana geme de
tesão e quase me descontrolo, ela empina mais a bunda contra mim.
Deixo o vibrador agindo na primeira velocidade dentro dela,
lambuzo com lubrificante meus dedos e levo para a entrada do seu
cu, a posição é perfeita para o que pretendo fazer.
Com a minha perna ergo mais a dela e abro sua bunda, acaricio
calmamente o buraquinho e escuto os gemidos de Luana, ela se
empina contra minha mão e sorrio em seu pescoço.
— É assim que eu gosto, toda aberta e receptiva — provoco e
coloco a pontinha do meu dedo na sua entrada, ela se contrai por um
momento, até que se acostuma e relaxa novamente, tiro e coloco de
novo, espalhando o lubrificante e circulando sua entrada.
— Para de brincadeira e mete logo esse pau em mim — Luana
exige, desesperada, quando continuo com a provocação, colocando
só a pontinha do dedo nela enquanto o vibrador trabalha em sua
boceta e clitóris.
— Então você sabe a diferença do meu dedo e do meu pau.
— Sim, porra sim!
Coloco o dedo todo nela, ainda preciso alargá-la para que não sinta
tanta dor, e deixo que se acostume antes de introduzir mais um dedo,
Luana rebola contra minha mão, perdida em seu prazer ela geme e
agarra o travesseiro.
Quando sinto seu anel relaxado e bem aberto, coloco a camisinha e
troco os dedos pelo meu pau, ela se retrai com a primeira penetração,
vou entrando nela lentamente, deixando que se acostume e relaxe,
até que estou enterrado no seu cu apertado.
Puta que pariu, é bom demais!
Começo a me mover, sem tirar completamente, com calma e
controlando meus movimentos, volto a segurar o vibrador com a mão
e aumento a velocidade, arrancando gemidos de prazer de Luana,
que se esfrega contra mim, completamente entregue.
Sinto a vibração do brinquedo no meu pau enquanto meto cada vez
mais fundo, seu cu apertado me enlouquece, eu amo anal, ainda mais
com a mulher entregue em minhas mãos, solto a respiração que não
percebi estar segurando e começo a meter mais rápido.
Luana grita meu nome, suas pernas tremem e ela empurra a bunda
contra meu pau, fodo sua boceta com o vibrador, subindo a
velocidade para o máximo e seu cu com meu membro, tomado por
uma ferocidade animal, mordo seu ombro e pescoço.
— Yuri, caralho, eu vou…
Luana não tem tempo de terminar a frase quando sinto seu anel
apertar ainda mais, as costas arqueiam e ela empina a bunda, suas
pernas tremem descontroladamente quando grita meu nome, é uma
maldita perdição, meto mais algumas vezes, ainda mais forte, à
procura do meu prazer e gozo com força, ainda segurando o vibrador,
tirando tudo dela enquanto ela tira tudo de mim.
Posso estar fodendo essa mulher em vários sentidos, mas neste
momento parece que é ela quem tem minha vida em suas mãos.
***
A semana passou rápido e entramos em uma rotina confortável,
levei o carro de Luana para o mecânico e mandei fazer mais alguns
reparos, então ela está indo e voltando do trabalho comigo.
Acho que vou pagar para o cara segurar mais uns dias, é muito
mais fácil vigiá-la quando ela depende de mim.
A sexta-feira está chegando e preciso planejar um encontro, droga
de ideia ruim que eu tive para fazê-la esquecer de Giovani. Todos os
restaurantes bons dessa cidade não aceitam reserva de última hora, e
eu não quero sair para comer em alguma espelunca por aí.
— Está pronta? — pergunto na porta do consultório dela, ela
parece cansada, hoje o dia foi cheio de consultas. — Quer ir na
academia ou ficar em casa?
— Preciso de um banho de espuma, um vinho, e qualquer coisa
que tire minha atenção do que ouvi hoje — Luana responde e suspira
de tristeza.
Não tenho interesse nos problemas dos seus pacientes, na minha
opinião são todos um bando de fracos que não conseguem controlar a
própria vida, aí pagam uma fortuna para descarregar seus problemas
em cima de outra pessoa, que nem pode ajudá-los a resolver.
Está com problemas financeiros? Vai se atualizar no mercado e
consiga um emprego melhor.
Seu marido quer o divórcio? Tira tudo o que ele tem e gasta com
outro, talvez alguém novo consiga te dar orgasmos.
Seu filho morreu? O que uma psicóloga pode fazer para te ajudar?
Ressuscitar alguém ainda não é possível, e mesmo que fosse, já
pensou como seria um mundo em que ninguém morresse?
Às vezes as coisas são tão simples, mas esse bando de inúteis
adora complicar!
— Banho de banheira e sexo é o que temos para hoje, então —
respondo e fecho a porta da frente do consultório.
— Eu não falei nada sobre sexo.
— Bem, você não quer ir para a academia, e ambos precisamos de
exercício, então a única forma é essa. — Pisco para ela e consigo
arrancar um sorriso, ainda que pequeno. — Posso até conseguir um
sorvete diferente dessa vez, Luana e chocolate belga deve ficar
saboroso demais.
Agora sim consigo fazê-la rir verdadeiramente, pode até ter sido
uma brincadeira, mas estou salivando só de pensar na combinação de
sabores.
— Temos que ir ao supermercado — Luana comenta e concordo.
Quando saio da garagem do prédio um carro preto com faróis
baixos chama minha atenção, ao entrar atrás de nós na rua lateral
bem na hora que passamos.
A noite é fria e choveu o dia todo, então as ruas estão molhadas e
escorregadias.
Dirijo com atenção redobrada enquanto Luana fala alguma coisa
sobre um livro que está lendo, no espelho retrovisor lateral, uma moto
vem em alta velocidade e para logo atrás de nós.
Entro em uma rua que não está em nosso trajeto e eles viram
também, sem dar seta, outro carro aparece em meu campo de visão,
vidros escuros e farol baixo. Aumento a velocidade e os três me
acompanham, viro à direita em uma rua mais estreita e, como
imaginei, a moto e os dois carros viram também.
— Estamos sendo seguidos — aviso e Luana me encara em
choque. — Dois carros e uma moto, aperta o cinto.
— Dirige para Long Island — Luana instrui e a encaro com dúvida,
é muito longe. — Só confia em mim.
Ela pega o telefone e vejo quando disca o contato de emergência,
então acelero, cortando caminho pelas ruas menos movimentadas, os
carros percebem e começam a perseguição.
A moto tenta me ultrapassar primeiro, mas bloqueio seu caminho,
vejo dois homens apontando as armas para o carro, mas eles não
atiram.
— Alphonse, estamos sendo seguidos — Luana fala com o Capo
no celular, não escuto o que ele responde. — Sim, Yuri está indo em
sua direção. — Ela fica mais apreensiva enquanto escuta. — Sim, ele
é. — Então me encara, alarmada. — Acelera, Yuri, eles vão tentar nos
interceptar depois da ponte.
É o que faço, aproveito a estrada reta e acelero o máximo que o
Corola permite, mas a moto é mais veloz e os carros atrás também,
logo somos jogados para frente quando um deles bate na traseira do
nosso carro, por pouco não perco o controle.
Vejo a moto no retrovisor esquerdo e, quando eles estão passando,
jogo o veículo para o lado, pegando-os de surpresa e tirando-os da
estrada, agora só falta os carros.
— Merda, merda, merda! — grito quando um deles consegue me
alcançar, tento bater na lateral, mas não surte efeito, o outro atrás
encosta no para-choque, então tudo entra em câmera lenta quando
eles atiram no pneu e nosso carro rodopia no asfalto.
Os airbags explodem em nossa cara, não consigo ver mais nada,
só sei que rodamos na pista, escuto o barulho de aço bater no asfalto,
vidro estilhaçado. Um grito agudo ao meu lado me faz abrir os olhos e
vejo Luana completamente em pânico.
Quando o carro finalmente para, estamos de cabeça para baixo,
por sorte o cinto nos salvou, mas ela está com um corte na cabeça e
sinto algo quente escorrer pelo meu rosto também.
— Finja-se de morto e liga para o número de emergência do meu
celular. — O comando desesperado de Luana me faz acordar, então
aceno e relaxo meu corpo, fecho os olhos bem na hora em que escuto
portas batendo e vozes berrando.
— Pega ela logo e elimina o outro — um deles dá as ordens, então
a porta de Luana é aberta, ela grita e escuto sons de luta, mas não
abro os olhos, Luana briga até que sua voz para abruptamente. —
Não é para machucar ela.
— É só uma pancadinha, relaxa — o outro responde, sinto o
movimento do carro quando eles a arrastam para fora, então escuto
sons de sirene se aproximando.
— Merda, deixa isso aí, já pegamos o que queríamos — eles gritam
e saem correndo, portas se fecham e logo o som de pneu cantando
no asfalto me faz abrir os olhos.
Consigo me desvencilhar do cinto antes que os carros de polícia
cheguem e encontro o celular dela, desbloqueio a tela trincada e disco
o mesmo número que ela ligou antes.
— Alguém a levou — finjo desespero quando ele atende. — Por
favor, preciso de ajuda.
— Estamos chegando, não fale com a polícia — a voz grossa do
Capo responde, então ele corta a ligação.
Não faço a menor ideia de como os malditos policiais chegaram
aqui tão rápido, mas tem umas dez viaturas me cercando, ninguém
fala nada, uma ambulância chega logo depois e sou examinado,
porém não tentam me levar daqui.
O mais estranho é que ninguém veio me fazer perguntas, parecem
estar esperando alguma coisa, ou alguém.
Minhas suspeitas são confirmadas quando o Cadillac Escalade
ESV cinza chega com uma escolta atrás e Daniele Corleone vem em
minha direção..
A mulher se detém um momento para falar com um dos policiais
enquanto seu pai vem até mim, continuo fingindo estar abalado, até
umas lágrimas consegui soltar enquanto me examinavam.
— Yuri — ele chama minha atenção quando chega próximo, mas
vejo que sua mão descansa na lateral do corpo, provavelmente tenha
uma arma ali. — Preciso saber o que aconteceu.
Sim, eu sei.
— Ela me mandou ligar… — calibro minha voz para ficar mais fraca
e instável —, não sei o que aconteceu, estávamos indo para casa,
então Luana começou a gritar que estavam nos seguindo, foi tudo tão
rápido… — Consigo produzir outra lágrima que escorre pelo meu
rosto.
Alguém consegue um Oscar para a minha apresentação!
— Certo, preciso que venha comigo — Alphonse responde, mas
não parece abalado com o que falei, sua postura é imponente e o
olhar firme e controlado.
— Onde está Luana? Por favor, você tem que me ajudar — imploro
enquanto caminho até o carro, mas sou contido por um dos
seguranças, esse sim parece preocupado. — Ela me mandou ligar
para você, ela disse que…
Não consigo terminar o que ia falar, sinto uma dor aguda na cabeça
e perco a força do corpo, a última coisa que vejo são os olhos azuis
de Daniele Corleone.
***
— Que merda foi aquela, Daniele? — Escuto uma voz grossa que
parece estar atrás de mim. — Não precisava ter apagado o homem.
— Confia em mim, pai — outra voz responde, mais fina e
controlada. — Ele está acordado.
Abro os olhos lentamente e percebo que estou em uma sala
completamente branca, ergo o rosto com calma, então foco o olhar na
janela de vidro blindado em minha frente, exatamente como uma sala
de interrogatório de delegacia, porém a claridade e a limpeza não
condizem com o ambiente policial.
Não, estou em outro lugar. Tento mover minhas mãos e pés e
consigo, eles não me amararam, passo os dedos onde sinto dor na
lateral da cabeça, estou com um corte que parou de sangrar e talvez
alguma contusão.
Avalio rapidamente o restante do meu corpo, sinto dor no peito e no
ombro esquerdo, provavelmente resultado da contenção do cinto de
segurança durante o acidente, mas nada quebrado.
— Onde estou? — Mantenho a voz baixa e fina, espremo os olhos
enquanto encaro as figuras que agora estão na minha frente. — O
que aconteceu? — Finjo desentendimento e olho do Capo para sua
filha.
— Você sofreu um acidente — Alphonse responde. — Lembra
disso?
— Acho que sim. — Começo a abrir os olhos como se só agora
minha memória estivesse retornando. — Luana, onde ela está? —
Aumento o tom de voz em cada palavra. — Quem levou ela? — quase
grito ao me levantar e me jogar no homem.
Então sinto o cano frio da arma encostar na lateral da minha
cabeça.
— Mais um passo… — A voz cortante de Daniele é uma ameaça
completa, então recuo dois passos e levanto as mãos, faço minha
melhor expressão de desespero, olhos arregalados, boca aberta,
respiração ofegante, até consigo fingir um tremor nas mãos. — Agora
fale exatamente o que aconteceu, sem movimentos bruscos.
— Eu não sei, eu…
— Daniele, ele está confuso, acabou de sofrer um atentado e bateu
a cabeça — Alphonse intervém e troca um olhar com a mulher em
uma conversa silenciosa, o Capo parece entender o que a filha quer,
então vira e sai da sala. Escuto as trancas da porta logo depois.
E assim estou preso em uma sala com Daniele Corleone.
Acordo com o cheiro forte de urina entrando pelas minhas narinas,
tento mover meus braços e pernas, mas as cordas apertam e contêm
meus movimentos.
Abro os olhos lentamente, porém o ambiente é escuro demais.
Estou deitada no chão de concreto frio com as mãos amarradas nas
costas, uma fita na boca e as pernas contidas.
Então lembro da perseguição, Yuri tentando despistar os carros que
nos seguiam, Alphonse falando no telefone, o carro girando até
ficarmos de cabeça para baixo e aí não lembro mais de nada.
O que aconteceu com Yuri?
Quem estava nos seguindo?
Onde eu estou?
O medo me atinge como um soco no estômago, meu coração
dispara no peito, tento gritar, pedir ajuda, sinto as lágrimas escorrerem
pelo meu rosto, mas não consigo fazer nada com a fita na boca.
— Ela acordou. — Ouço uma voz estranha. — Avisa o chefe.
O medo começa a dominar meu corpo e tento forçar ainda mais as
cordas, mas não consigo me libertar, chamar ajuda não está
funcionando, o que eles querem comigo?
— Ele mandou levá-la para a sala de interrogatório — outra voz
responde, alguém abre a porta e um feixe de luz entra, mas não
consigo distinguir a figura a tempo.
— Por favor, não me machuque, por favor — imploro quando eles
tiram a fita da minha boca e me arrastam pelo corredor.
Eu já tratei de pessoas que sofreram traumas, li sobre como agir
em situações extremas assim, inclusive tem um episódio de Grey’s
Anatommy que não sai da minha cabeça neste momento, onde um
homem armado invade o hospital e atira em várias pessoas
procurando o Mc. Dreammy. Quando encontra seu alvo, o
personagem principal e galanteador quase consegue convencê-lo a
largar a arma, mas a ruiva entra sem avisar e atrapalha tudo.
O que me chamou atenção neste episódio foi o momento em que a
mulher, acho que é April o nome dela, implora para que o atirador não
a mate, falando sobre sua família e pessoas que ama.
Ela grita que tem pais que se importam com ela e irão sentir sua
falta, fala sobre suas irmãs e sobrinhos e o quanto é amada por eles,
isso gera uma conexão, mesmo que momentânea, com o atirador, que
desiste de atacá-la.
Neste momento da minha vida, enquanto sou amarrada em uma
cadeira por dois homens desconhecidos, no meio de uma sala suja,
percebo que não posso usar da mesma tática.
Não tenho uma família me esperando em casa, ninguém além do
Vader depende de mim, e se eu sumir meus pacientes podem sentir
minha falta, mas eles conseguem encontrar outra psicóloga.
O que Yuri e eu temos é novo demais, ele é jovem e um gostoso,
logo encontra outra mulher, ou homem, para se relacionar.
Vivian vai sentir minha falta, somos amigas há muito tempo e tenho
certeza que ela se importa comigo da mesma forma que faço com ela,
mas sua vida mudou e ela tem outras prioridades.
Então tem os Corleone, que me acolheram como parte da família,
Daniele, minha paciente mais peculiar. Espero que sua escuridão,
como ela chama, não tome conta da sua vida. Ao contrário do que
muitos pensam, ela é um caso que considero de sucesso.
A menina fechada e confusa aprendeu a identificar os sentimentos
das pessoas a sua volta, mas o mais importante, ela conseguiu
desenvolver seus próprios sentimentos, de forma única e que faz
sentido para ela.
Mas nem Daniele depende de mim para viver, ela ainda me procura
para ter alguém com quem conversar e descarregar o peso das suas
obrigações, mas já está pronta para enfrentar o mundo sozinha.
Eu não tenho ninguém por quem implorar misericórdia da pessoa
que entra na sala, com uma mala em sua mão e um sorriso diabólico
no rosto.
O homem tem meia idade, cabelo grisalho, barba bem feita, o terno
que usa, todo preto com camisa e gravata da mesma cor, é luxuoso,
mas o que me faz saber que não tenho chances se implorar é o
sorriso em seu rosto.
— Peço perdão pelos meus homens, são trogloditas — fala com a
voz grossa e marcante. — Você deve saber como isso funciona, eu
faço perguntas, você responde, ninguém sai machucado.
Ele arrasta uma mesa pequena de madeira e coloca a mala em
cima, então começa a tirar várias facas, martelos e ferramentas que
não sei o que são, mas posso imaginar seu propósito.
Tento gritar por ajuda, mas ele me lança um olhar mortal antes de
continuar a falar.
— Agora, se você dificultar as coisas — pega uma caixa com luvas
de borracha e coloca uma em cada mão —, terei que tirar estas
informações à força.
— O que você quer comigo? Não sei de nada, eu não sou ninguém
— as lágrimas escorrem pelo meu rosto enquanto imploro com a voz
fraca.
— Luana Masseria, filha de Miguel Matielo — o homem solta uma
gargalhada ao falar o nome do meu pai. — O maldito conseguiu
escondê-la por 41 anos, isso foi brilhante, tenho que admitir.
— O que você quer? Meu pai não está mais aqui.
— Eu sei, querida, porque foi exatamente no enterro do seu pai que
descobrimos o pote de ouro.
— Não entendo, eu não sou ninguém.
— Também pensava assim, mas fiquei tão curioso com o quanto a
família Corleone se importa com a filha de um segurança. — Ele
arrasta uma cadeira e senta-se em minha frente, pernas cruzadas e
postura levemente inclinada para mim, um frio sobe pela minha
espinha fazendo-me contrair no lugar. — Então resolvi segui-la.
— Você estava me seguindo? — pergunto, assustada por não ter
percebido, mas ele ri novamente e faz minha espinha congelar.
— Você é muito desligada para alguém tão inteligente.
— Do que está falando?
— Isso não importa, o que descobri ao acompanhar sua rotina
nestes meses é o que importa. — Ele passa a mão pela barba e me
olha fixamente para mim. — Qual é o motivo de Daniele Corleone, a
filha do Capo da Família Genovese, visitar tanto um certo restaurante
ao lado do seu consultório.
— Não entendo o que…
— Então invadi o lugar, e tenho que dar os parabéns para aquela
família, construir uma passagem que liga os dois prédios e um
elevador privativo com uma parada só foi brilhante.
Ele para de falar por um momento, deixando o silêncio consumir
meus pensamentos, fico com mais medo a cada segundo, ele sabe
sobre Daniele, é por isso que estou aqui.
— Quando descobri o andar em que o elevador parava, realmente
não acreditei, a filha do Capo, possível herdeira da máfia, faz terapia
— sua risada fria e calculada se intensifica enquanto ele fala. — Eles
realmente estão tentando quebrar barreiras, não é mesmo? Primeiro
iniciando uma mulher na máfia, depois deixando claro que ela será a
próxima líder, e agora descubro que a monstrinha faz terapia.
— Não sei do que você está falando. — Tento manter a voz
confiante. — Conheço Daniele desde criança, mas é só isso.
— Sério? Vai querer ir por este caminho? — Ele para de sorrir
instantaneamente. — Ao contrário da sua querida Daniele e do pai
dela, eu odeio fazer isso — indica os instrumentos na mesa. —
Aqueles dois são fodidos da cabeça, já diagnosticou a psicopatia da
menina ou vai esperar até que tenha 25 anos? Andei pesquisando
sobre isso e é realmente fascinante.
Ele espera minha resposta por um tempo, mas isso não vai
acontecer, quando aceitei Daniele como minha paciente, o Capo foi
enfático sobre os perigos que eu correria daquele momento em
diante.
Posso não ter um treinamento de resistência física, e não faço a
menor ideia de como vou aguentar a dor, mas prometi que manteria a
boca fechada, mesmo em situações extremas.
— Não vai responder mesmo? — Ele respira fundo, pega uma das
facas e vem em minha direção — É uma pena.
A próxima coisa que sinto é a lâmina cravar em minha mão e a dor
que sobe pelo meu braço.
Os olhos azuis intensos avaliam cada movimento que faço, posso
jurar que ela está contando minha respiração, Daniele me analisa
como se eu fosse um experimento, um ratinho preso em seu
laboratório particular.
— Pode parar com a encenação — ordena com a voz fria e
confiante. — Não funciona comigo.
Não adianta mais fingir, ela sabe, afinal um predador reconhece o
outro.
— O que quer saber? — relaxo minha postura, respiro fundo e
desfaço a expressão de antes, espelhando sua frieza e controle.
— Quem levou a Luana? — Direto ao ponto.
— Não sei, eram dois carros pretos e uma moto, os homens não
tinham sotaque e planejavam me matar como queima de arquivo.
— Você viu alguma tatuagem ou marca neles?
— Não, Luana disse para me fingir de morto.
— E você fez isso? Ficou lá parado de olhos fechados enquanto
eles a levavam? — É uma acusação, mas sua voz não se altera e sua
postura demonstra calma e controle, Daniele não usa o lado
emocional, parece até estar falando sobre uma desconhecida.
— Eles estavam em maior número e armados, as chances de sair
vivo eram nulas — falo a verdade, se tivesse tentado reagir, estaria
morto e não adiantaria de nada.
Daniele para e pensa por um tempo, ainda com o olhar firme no
meu, sinto o mesmo frio na espinha da primeira vez que isso
aconteceu, o gosto amargo na boca e a vontade inexplicável de me
abaixar, meu corpo responde a ela como uma ameaça.
— Vamos acertar alguns pontos, Yuri Saito. — Ela caminha e se
escora na parede, cruzando os braços. — Uma semana antes de você
aparecer na cidade, meu pai sofreu uma emboscada, o ataque
resultou na morte do nosso chefe de segurança, Miguel Matielo. Você
reconhece este nome?
— Sim.
— Imaginei, depois você retorna à cidade, vai morar no
apartamento ao lado de Luana e começa a procurar emprego como
secretário de clínica médica. Confirma se meu relatório está correto.
— Tudo certo, por enquanto — constato e cruzo meus braços,
imitando sua posição.
— Um tempo depois a secretária de Luana recebe uma ótima
proposta para trabalhar em Chicago para ficar junto da família, e lá
está você, com o currículo perfeito para a vaga.
— Qual é a sua pergunta?
— Por quê?
— Para ficar próximo dela.
Daniele me encara e não consigo decifrar o que se passa pela sua
cabeça, ficamos calados por um tempo, ambos avaliando as reações
do outro, até que o barulho da fechadura sendo destrancada nos faz
desviar o olhar para a porta.
Lucas entra na sala, seus olhos escuros logo encontram sua
mulher, ele carrega uma pasta com documentos. No momento em que
olho para o homem, Daniele entra em minha linha de visão e bloqueia
a porta com seu corpo, sua postura agora está em alerta, a mão
dentro do blazer, provavelmente em uma arma, como um aviso para
que eu não tente nada.
Está protegendo o marido, que não entra na sala, apenas entrega a
pasta para ela e me avalia com o olhar cansado, então sai e a porta
volta a trancar.
Ela pega a pasta, caminha até uma mesa de ferro no canto da sala
e começa a avaliar os documentos, a expressão neutra e o olhar
concentrado.
— Yuri Saito, a cada nova informação que consigo sobre você,
mais perguntas surgem — comenta.
— É só usar a sua bela voz para perguntar — provoco, mas não
obtenho uma reação.
— O problema é que não confio nas suas respostas.
— Não tenho porque mentir, quero encontrar Luana tanto quanto
você.
Ela levanta o olhar e pende a cabeça para o lado, posso jurar que
vejo seus olhos brilharem com o que só posso supor ser curiosidade.
— O que você sabe sobre a ligação de Luana com a minha família?
— Miguel Matielo é o pai dela, Luana frequenta a mansão para
eventos sociais e é muito próxima da sua mãe e da sua sogra. — Isso
é o que eu sei, imagino que por seu pai trabalhar há tantos anos para
a Família Genovese, elas tenham se aproximado.
— Curioso, Miguel escondeu sua ligação com Luana a vida toda,
inclusive ela não tem seu sobrenome para não ser rastreada até ele.
— Daniele retira uma arma do coldre no peito e coloca em cima da
mesa, então agora ela vai começar as ameaças. — Como você sabe
sobre isso?
— Estava em meu relatório sobre ela. — Dou de ombros, ela já
sabe sobre o relatório, reconheço o papel pardo entre os documentos
que seu marido lhe entregou, tenho certeza que reviraram meu
apartamento e o de Luana enquanto fiquei desacordado.
— Quem te contratou para segui-la? — Sua mão descansa na
arma ao seu lado.
— Miguel Matielo.
Ela não reage por um momento, então a porta se abre
abruptamente e o Capo entra na sala como um touro, narinas infladas,
gravata frouxa e arma em punho.
Ele vem diretamente em minha direção, acerta um soco na lateral
do meu rosto e coloca a arma na minha testa.
— O que você está falando, filho da puta? — grita na minha cara,
apesar do descontrole, a mão da arma é firme e tenho certeza que ele
não hesitará em atirar.
— Exatamente o que você ouviu, foi Miguel quem planejou tudo, e
tenho certeza que você conseguirá rastrear o dinheiro usado para a
compra do apartamento em que moro, meu carro e as passagens de
avião, para a conta do seu ex-chefe de segurança — explico
calmamente. — E se ficar alguma dúvida, pode perguntar para sua
mulher.
Com essa última informação, Alphonse é pego de surpresa e troca
um olhar com a filha, antes de continuar me ameaçando.
— Ele está morto, MORTO! E não vou deixar que você manche o
seu nome, nem que envolva a minha mulher nas suas mentiras —
Alphonse continua falando e me empurra, imprensando-me na parede
pelo pescoço.
— Pai, abaixa a arma, ele está falando a verdade — Daniele chama
a atenção do outro lado da sala, ainda calma e fria. — O que eu quero
saber é, por quê? E o que a minha mãe tem a ver com isso?
— Finalmente você fez a pergunta certa, e nisso seu pai aqui pode
confirmar minha história. — Sorrio sem medo para o homem em
minha frente. — Padre Antônio.
Vejo o momento em que a expressão do Capo muda de raiva para
surpresa, ele tira o braço do meu pescoço e abaixa a arma
calmamente, ainda me encarando.
— Quando você chegou ao orfanato, ele estava prestes a abusar
de um menino de oito anos — compartilho minhas memórias —, você
deve lembrar, uma criança pequena, magra demais, cabelos escuros
e olhos puxados. Lembro até hoje do olhar de pena que vi em seu
rosto, não foi a primeira vez que alguém me olhou assim, por isso
reconheci a expressão.
— Era você? — ele pergunta e se afasta.
— Sim, e enquanto você arrastou o padre para a outra sala e fez
justiça com as próprias mãos, Miguel ficou comigo, ele achou que eu
estava em choque por causa dos gritos do padre, mas não demorou a
perceber que não era o caso — explico e vejo quando Alphonse olha
para a filha. — Ele encontrou a faca embaixo do meu travesseiro e
entendeu quais eram meus planos.
— O padre abusou de você? — A pergunta vem de Daniele.
— Não, mas ele ia fazer isso naquela noite, outro menino havia me
avisado que o padre esperava duas semanas, depois que uma
criança chegava, até começar os abusos, então roubei uma faca da
cozinha e esperei minha vez.
— Você planejou matá-lo? — Alphonse questiona, o olhar
assustado.
— Óbvio, não entendia como os outros deixavam o velho maldito
fazer o que queria e ainda não ganhavam nada com isso — olho do
pai para a filha antes de continuar —, mas você chegou antes, acho
que preciso te agradecer, foi o que Miguel falou aquele dia, que se eu
conseguisse matar o padre provavelmente seria jogado em algum
hospício ou lugar pior.
— E onde minha mãe se encaixa nisso tudo? — Daniele questiona.
— As outras crianças foram mandadas para orfanatos distribuídos
pela cidade, mas Miguel viu algo diferente em mim e fez com que eu
fosse enviado a um dos orfanatos da Família, ele me visitava
constantemente e manteve um olho em mim, sua mãe administrava o
lugar.
— Miguel gostava muito de ajudar nos orfanatos — Alphonse
confirma.
— Quando fiz dezesseis anos as coisas começaram a ficar
complicadas, entrei em brigas, não entendia o que estava
acontecendo e porque todos sentiam medo, só estava fazendo o que
era melhor para mim, cuidando do meu futuro, precisava de dinheiro
para sair daquela vida. — Fodam-se quem eu precisava passar por
cima.
— Seus pais te deixaram uma boa herança — Daniele fala e
aponta um dos papéis na mesa.
— Sim, que eu poderia usar somente com 21 anos, e mesmo assim
não seria suficiente para pagar uma faculdade. Eu estava começando
a perder o controle quando ele fez uma proposta.
— Que tipo de proposta? — Alphonse pergunta.
— Miguel pagou todos os meus estudos, conseguiu que eu
entrasse na New York University, me deu uma boa mesada por mês e
utilizou seus contatos para que eu tivesse meu primeiro emprego.
— Em troca do que? — agora é Daniele quem questiona.
— Essa é a parte curiosa, ele disse que na hora certa cobraria o
favor e me fez prometer que cumpriria o que for que ele mandasse. —
Sorrio ao lembrar do que pensei na época. — Confesso que achei que
ele estivesse brincando, mas Miguel cumpriu sua parte, então antes
de me mudar para Chicago ele mandou a primeira carta dizendo que
se algo acontecesse a ele, eu receberia instruções para retornar a
New York e cuidar do seu bem mais precioso.
— Como assim? — Alphonse passa as mãos pelo cabelo,
absorvendo minhas palavras.
— É isso, ele me fez prometer que cumpriria a minha palavra, se o
momento chegasse.
— Quando Miguel morreu, você veio para fazer o que prometeu? —
Daniele caminha em minha direção, agora com um sorriso sarcástico
nos lábios. — Realmente quer que eu acredite que está vigiando
Luana para manter a sua palavra para um homem morto?
— Claro que não, quando fui para Chicago pensei que estaria livre
dessa merda toda, criei uma nova identidade e Yuri Saito
desapareceu.
— Até que… — Alphonse não consegue completar a frase.
— Até que recebi as passagens só de vinda para New York no meu
nome antigo, em anexo estavam todos os documentos e a conta
bancária.
— Está fazendo isso por dinheiro? — Daniele provoca.
— Claro que não, tenho muito mais dinheiro do que Miguel poderia
oferecer, estava chegando ao maior cargo da empresa em que
trabalhava e tudo andava bem.
— O que te atraiu? — ela pergunta e continua sorrindo.
— Ele me deu um novo jogo — fixo meu olhar no dela —, depois
que consegui muito dinheiro e influência, a vida ficou vazia e sem
propósito, Miguel me deu algo que preencheu esse espaço.
— Ele te deu alguém para proteger — Alphonse fala, entendendo
onde quero chegar.
— Para perseguir — corrijo-o. — Miguel planejou todos os
primeiros passos que segui quando cheguei e deixou instruções
claras para que eu tornasse Luana minha prioridade e a protegesse, e
foi isso que fiz, eu controlo toda a vida dela, seus horários, o que ela
come, onde vai e com quem conversa.
— Até agora — ela atiça e respiro fundo antes de continuar.
— Eu tenho uma pergunta. — Encaro a mulher que desfaz o
sorriso, mas escuta calada. — Qual é a sua ligação com Luana?
Pai e filha trocam um olhar significativo demais e não acredito no
que vou falar agora.
— Você é paciente dela.
Daniele não reage à minha afirmativa, a expressão fria e controlada
é inabalável, mas seu pai é outra história, por isso foco minha atenção
nele.
Alphonse arregala minimamente os olhos, dá um passo para trás
em direção a filha e sua respiração fica mais rápida.
— Merda, pai, é exatamente por isso que te falei para me deixar
lidar com ele — claro que ela também percebeu —, agora ele sabe.
— Uma mafiosa fazendo terapia. — Não controlo o sorriso em meu
rosto. — Nem em mil anos poderia imaginar algo assim. — Solto uma
gargalhada por ter sido tão ingênuo, claro que era coincidência
demais Daniele estar rodeando a clínica fora do horário.
— Por quê? — ela pergunta.
— Se você precisa perguntar significa que Luana não fez um bom
trabalho — respondo secando algumas lágrimas, então outra coisa
me deixa curioso — Se você é como eu, por que procurar ajuda?
— O que te faz pensar que somos iguais?
Encaro a mulher com a minha melhor cara de “você está zoando
comigo”.
— Sabe, eu sempre me perguntei como eu seria sem a
interferência de Luana, se me tornaria alguém incapaz de ter
sentimentos, de criar uma conexão verdadeira com as pessoas.
— Isso tudo é uma fraqueza, e você sabe disso, somos a evolução
do ser humano, monstros perfeitamente criados para sobreviver e
progredir nesta sociedade — analiso seu rosto, mas não obtenho
reação —, por que você acha que pessoas como nós assumem
cargos de liderança? O capitalismo exige a sobrevivência do mais
forte, aquele que não se importa em quem precisa pisar para subir a
escada do sucesso.
— Concordo, realmente sua teoria é válida, mas me responde, qual
é a linha de chegada? — Sua pergunta me pega despreparado. —
Quanto dinheiro significa sucesso? Qual é o topo da cadeia alimentar?
E quando você chegar lá, qual será o próximo passo?
— Sempre tem mais a ser conquistado — respondo calmamente.
— Já percebeu que quanto mais alto você sobe, mais próximo do
nada você fica? O topo é uma utopia fria e solitária. — Daniele vem
até mim, ficando próxima o suficiente para não precisar erguer a
cabeça devido à nossa diferença de altura — Qual será o seu
propósito depois?
É isso, eu não tenho respostas.
— Não consegue pensar em um, porque não existe, você pode ter
todo o dinheiro e o poder do mundo e mesmo assim não ter um
motivo para viver, por isso sempre procura o próximo desafio, um
novo jogo que te tire do vazio existencial.
— Não, você está enganada — tento contestar, mas já não sei se
ela está errada e isso faz meu peito ficar estranho.
— Sabe essa sensação que você está sentindo agora, o coração
acelerado e a vontade de atacar? — Maldita mulher perceptiva do
caralho. — Isso é a reação de um predador quando encontra outro
ainda mais forte e perigoso que você, porque podemos ser
semelhantes em muitos aspectos, mas eu tenho algo que você não
tem, o que me torna muito pior do que pode imaginar.
— O quê? — a pergunta sai sem que eu consiga controlar, a
maldita entrou na minha mente.
— Tenho um propósito muito maior do que a minha vida.
— Qual?
— Eu protejo as pessoas que são importantes para mim —
responde com um meio sorriso. — Sabe, não existe um jogo que seja
interessante jogar sozinho, afinal, qual é a graça de vencer sem tem
com quem comemorar ou alguém para esfregar a derrota na cara?
Travamos uma pequena batalha de olhares, mas ela sabe que
ganhou essa rodada, não tenho resposta para suas perguntas. Por
sorte a porta é destrancada novamente e Lucas entra.
— Temos a localização — reporta na direção do Capo.
— Certo, você fica aqui e mantenha isso em segredo, somente
nossos homens de mais confiança virão conosco — Alphonse começa
a ditar ordens, mas Daniele continua me olhando.
— Eu vou com vocês, Luana está em perigo, não vou ficar aqui
sentado esperando — falo quando percebo que eles pretendem me
deixar para trás.
— Você não vai a lugar algum, e quando a recuperarmos, ela vai
escolher o que fazer sobre você — Daniele é quem responde
ameaçadoramente, tento passar por ela, mas sou atingido por um
soco na boca do estômago. — Prendam-no, não preciso de mais
problemas — ela ordena e dois homens entram na sala, amarandome em uma cadeira chumbada no chão.
— NÃO — grito de frustração quando ela me dá as costas e
percebo que não conseguirei sair daqui. — ELA É MINHA!
Isso chama a sua atenção, com um sorriso sarcástico no rosto,
Daniele se vira para mim e responde:
— Ela não é sua propriedade!
Saio da sala com Lucas e meu pai logo atrás, não sei o que está
acontecendo entre Luana e este homem, mas não deixarei que
atrapalhe o resgate.
— Daniele — Lucas me chama com sua voz mais carinhosa, a
mesma que usa quando quer alguma coisa e sabe que não vou
concordar. — Eles estão envolvidos, talvez seja bom que ele…
— Ele não é confiável, ou você acreditou em tudo o que disse?
Quem garante que ele não ajudou no sequestro ou que não tem
envolvimento no atentado ao meu pai? — Apesar dos documentos
comprovarem que Yuri estava em Chicago, ainda podem ser falsos. —
Não vou correr riscos desnecessários, assim que Luana for resgatada,
ela decidirá o que fazer sobre ele.
— Se fosse eu…
— Não é a mesma situação, Lucas — Já estou perdendo a
paciência com ele, desde que me entregou o relatório sobre Yuri, está
com essa cara estranha. — Conseguiu rastrear a pulseira?
— Sim, eles estão em uma casa no Bronx. — Merda, justamente
onde estamos em guerra por território e ainda não conseguimos
consolidar um Underboss. — Temos imagens aéreas e os drones já
estão a caminho.
— Bom, reúna a elite dos soldados, nada mais que quinze pessoas,
quero Alberto comigo — começo a dar ordens, mas vejo o olhar
preocupado do meu pai. — Vocês ficam aqui.
Ambos me encaram como se eu estivesse louca, com os olhos
arregalados e furiosos, meu pai passa por Lucas e vem até mim com
a postura de Capo.
— Você está esquecendo que ainda sou o Capo, e não vou sentar
e esperar que resolvam as coisas por mim — rebate com confiança.
— Tudo indica que estes são os mesmos homens que atentaram
contra a sua vida no dia em que Miguel morreu, provavelmente
descobriram a existência da filha e sua ligação com a nossa família —
explico uma linha de pensamento. — Luana é um ponto fraco, uma
isca para atraí-lo a uma emboscada.
Ele pensa por um momento, mas continua batendo de frente
comigo, quanto mais espaço eu ganho dentro da organização, mais
meu pai precisa dividir as tarefas e isso não tem sido tão fácil quanto
imaginávamos.
— Merda, eu sabia que deveria ter posto alguém para fazer a
segurança dela — meu pai lamenta, mas agora não é hora para isso.
— Miguel vai se revirar no túmulo com isso.
— Mortos não pensam pai, e muito menos se movem, agora quero
você e Lucas quietinhos aqui, enquanto vou resgatá-la, reúnam mais
homens para o caso de precisarmos de reforços e nos acompanhem
com os drones — ordeno, eles sabem que é o certo, não podem
arriscar outra emboscada.
— Se o Capo não vai, eu vou junto com você. — Lucas me encara
intensamente, sei que está lembrando do resgate dos meus pais,
quando o deixei de fora em uma missão praticamente suicida, mas
não posso tê-lo ao meu lado, correndo perigo.
— Você sabe que é mais perigoso para mim se você estiver lá. —
Tento manter a voz calma e segura. — Não consigo me concentrar
tendo que me preocupar com meu marido, ainda mais com a visão
dessa bunda deliciosa — brinco e arranco um meio sorriso dele.
— Puta que pariu, Daniele — meu pai esbraveja e tapa os ouvidos
com as mãos. — Faz o favor de guardar essas coisas para quando eu
não estou por perto.
— Quem é você para falar alguma coisa? — Viro-me em direção ao
meu pai e faço uma expressão de escárnio — Semana passada
mesmo estava trancado com a minha mãe no escritório, as paredes
não são à prova de sons — provoco e solto uma gargalhada. — A
cara dos soldados do lado de fora ao ouvirem os gemidos foi
impagável.
— Não sei do que você está falando — meu pai responde, mas fica
vermelho e desvia o olhar do meu. — E para de fugir do assunto, vai
ser perigoso, Daniele.
— Eu sei, mas estaremos cobertos pela noite e com os melhores
atiradores da Família, não entrarei sem ter certeza de que a missão
será um sucesso — prometo com a voz firme. — Você me conhece,
pai, não colocaria a vida dos meus homens em risco.
— E a sua? — Lucas pergunta e prende meu rosto com as mãos,
fazendo-me encarar seus olhos escuros como a noite. — Me promete
que vai voltar, e dessa vez sem mentiras.
— Eu prometo, meu amor. — Tomo seus lábios nos meus, tão
grossos e quentes, logo nossas línguas se tocam e o beijo é
aprofundado, mas me afasto antes de perder o controle. — Só vou
resgatar minha psicóloga para que ela possa me manter sã, sabe que
só assim esse casamento vai dar certo — gracejo e consigo fazê-lo
sorrir.
— Tudo bem, mas no primeiro sinal de que algo está errado,
mandarei reforços — Lucas anuncia e aceito.
Contudo, antes de sair encaro o Capo e o Consigliere com
seriedade.
— Não entre naquela sala e fique de olho nele — alerto, agora com
seriedade. — Isso vale para você também, pai — falo mais alto e saio
dos braços de Lucas.
Estamos lidando com uma crise depois que meus tios nos traíram,
e isso abre as portas para que nossos inimigos tentem nos derrubar,
mas vou pegar a pessoa que está por trás disso, uma hora ou outra
as cobras saem para se alimentar.
Reúno meus melhores homens, armados até os dentes, como é
noite e o local é escuro, usaremos equipamento militar que nos dará
visão dos inimigos.
Venho participando de treinamentos com Michael, um aposentado
dos Seals, a elite do exército americano. Ele aceitou o convite do meu
pai, acredito que para sair do tédio de não fazer nada, e está
treinando um grupo de soldados especiais, e eu, claro.
— Michael, você irá coordenar o ataque — ordeno para o homem
que me aguarda na sala de seguranças, ele é uma parede de
músculos, tão alto quanto meu pai, pele negra, careca, e está sempre
de preto. — Lembrem-se que esta é uma missão de resgate — dirijome agora aos outros homens. — Quero Luana em segurança, e
façam o máximo de prisioneiros que conseguirem, mas se algum
tentar escapar, atirem para matar.
Recebo um sorriso orgulhoso de Michael.
— Quando o local estiver cercado, cortaremos a comunicação
deles, a casa é pequena, mas tem porão e uma mata densa logo ao
lado, cubram qualquer possível rota de fuga. — Sua voz de comando
é tão forte e firme quanto a do meu pai. — E salvem a executora.
Sim, essa sou eu e odeio que os homens ao meu redor sejam
instruídos a me proteger, e não o contrário.
Dou um soco em seu braço com a última parte, mas não posso
contestar, desde que quase morri da última vez, todos estão
garantindo que eu volte viva das missões.
Michael tem me ensinado todas as técnicas de combate e
sobrevivência que aprendeu durante sua vida como um Seal, mas o
principal é trabalhar em equipe.
Reunimos quatro carros e uma ambulância clandestina para chegar
próximo da cabana, os drones sobrevoam alto no momento, quando
faltam dois quilômetros, deixamos os veículos escondidos na mata e
seguimos a pé.
“Câmeras de segurança em todo o perímetro da base”
A voz de Michael é a única na escuta.
“Cinco homens na entrada, dois aos fundos, semiautomáticas, meia
luz.”
Encobertos pela floresta e pela escuridão da noite, nos
aproximamos. Vejo os homens de vigia e faço sinal para nossos
snipers entrarem em posição.
“Vá pelo Oeste, tem um ponto cego lá, 05, conecte-se às câmeras
de segurança.”
Ando com um time até o local indicado por Michael e aguardo
enquanto nosso ratinho da tecnologia invade o sistema de segurança
deles.
“Feito, temos imagens internas e externas, o alvo está em um
quarto nos fundos da casa, um homem com ela, dois na porta, seis
dentro da casa.”
Aguardo as instruções, pelas minhas contas temos homens
suficientes para a missão, mas é Michael quem decide.
“Ao meu comando, snipers eliminem os alvos externos, executora,
acione o dispositivo de interferência de sinal, entre pelo Oeste, passe
o corredor, na última porta à direita está nosso alvo.”
Faço sinal para os homens do meu time se prepararem, a porta é
de madeira e a casa antiga, será fácil derrubar mesmo que esteja
trancada, o maior soldado se prepara para se jogar contra ela
enquanto aguardamos ordens.
“Aguardem mais um minuto, o homem com o alvo está em
movimento, saindo da sala, assim que a porta fechar, vocês entram.”
Cada segundo é uma tortura, odeio esperar, mas a vida de Luana
depende disso, e se não tiver ninguém com ela maiores são as
chances de tirá-la de lá com vida.
“Snipers, confirmem posição”
Michael orienta.
“Alvo na mira”
Cada um deles responde.
“Executora, confirme posição”
Agora ele fala comigo.
“Confirmado.”
Respondo baixo na escuta.
“Assim que eu der o sinal, corte a comunicação e siga o plano.
Preparar, AGORA”.
Aciono o dispositivo em meu cinto que interfere em todos os
aparelhos de comunicação em um raio de cem metros, isso inclui os
nossos, por isso tudo fica mudo.
Assim que os snipers eliminam os guardas externos, corremos para
a casa, nosso soldado se joga na porta e o inferno começa. O baque
denuncia nossa entrada, mas eles estavam despreparados, então são
alvos fáceis, abatemos dois homens que estavam prontos para atirar
e corremos pelo corredor.
Limpamos cada quarto até chegar em nosso alvo, três homens
atiram contra nós, mas somos em maior número, logo eles caem, por
sorte dois continuam vivos, um deles, que identifico como o mais
importante, abraça uma maleta enquanto se arrasta, tentando fugir
para a porta dos fundos.
— Amarre este daí — ordeno e desligo o aparelho que corta a
comunicação. — O caminho está livre — anuncio para Michael antes
de entrar na sala.
Pego a chave do corpo ao lado da porta e encontro o alvo, meu
coração dispara por um momento, Luana está praticamente nua, com
vários cortes pelo corpo, vejo hematomas em seus braços e rosto, as
unhas das mãos foram arrancadas e seus pés têm sinais de
queimadura.
Ela foi torturada.
Corro até ela e avalio os ferimentos, por sorte está inconsciente no
momento, presumo que tenha desmaiado pela dor.
— Traga a ambulância, ela precisa de um médico — ordeno antes
de começar a desamarrar seus braços e pernas, um dos homens traz
uma coberta e me ajuda a carregá-la para fora.
A ambulância nos aguarda na porta da cabana e deixo Luana aos
cuidados de Axel, nosso enfermeiro nas missões.
— Levem todos ao armazém três, vivos ou mortos, recolham
qualquer equipamento de segurança, façam a varredura completa,
depois queimem o local, não quero resquícios de que estivemos aqui
— comunico à minha equipe, eles sabem o que fazer, então entro na
ambulância e saímos rapidamente em direção a mansão — Michael,
providencie para que Lyane esteja a postos quando chegarmos.
Lyane é minha melhor amiga e uma médica incrível.
“Ela já está a caminho.”
Reconheço o tom de preocupação em sua voz, algo está errado.
— O que aconteceu? — questiono.
“Problemas, vá diretamente à mansão”
Sua resposta vaga me deixa ainda mais nervosa.
— Fala logo, que merda está acontecendo? — agora estou quase
gritando, ele me conhece e sabe que não suporto ficar às escuras.
“Lucas está levando o prisioneiro para a mansão”
Michael responde, tão preocupado quanto eu, afinal o homem é
treinado para reconhecer monstros, foi assim que ele aceitou a
proposta do meu pai.
Merda, Lucas, que diabos você está pensando?
— Ele foi sozinho?
“Não, o Capo e um grupo de seguranças estão escoltando o
prisioneiro”
— E porque você não impediu essa merda, Michael?
“Eles saíram no meio da missão de resgate.”
Que beleza, o Capo e o Consigliere trabalhando juntos contra a
equipe de segurança, a cada dia que passa eu quero trancar os dois
dentro de casa e mantê-los seguros até que consiga eliminar nossos
inimigos um a um.
— Minhas ordens eram claras…
“Controle-se, siga o plano, nos encontramos na mansão.”
Michael está aprendendo quando preciso de ajuda com meus
impulsos, suas ordens tiram minha mente do espiral monstruoso em
que ela gosta de se enfiar, e foco no presente.
— Só os mantenha longe do prisioneiro, chegamos em uma hora —
respondo e foco minha atenção em Luana. Axel limpa seus ferimentos
mais profundos. — Como ela está?
— Nada bem, mas vai sobreviver — ele responde confiante
enquanto coloca o soro no braço dela.
Chegamos à mansão e Lyane nos aguarda na porta, minha amiga
raspou o cabelo e pintou de azul, quero sorrir para ela, mas sua cara
fechada indica que não está para brincadeiras.
Ela é minha melhor amiga e uma médica de primeira, mas odeia
quando a chamo, porém o médico da Família sofreu um AVC
recentemente, e ainda não encontramos alguém capacitado.
Para falar a verdade, eu quero que Lyane assuma a tarefa, ela é a
mulher mais inteligente que conheço, mas não quer se envolver com a
máfia, por isso o olhar de ódio que me lança ao correr com Luana
para a sala que preparamos para estes momentos. Temos todos os
equipamentos que um pequeno hospital precisa, tudo para não dar
entrada oficialmente no sistema hospitalar a não ser que seja uma
emergência.
Só falta a médica, e quero que seja Lyane.
— Você fica aqui — ela vocifera em minha direção quando tento
entrar na sala.
— Eu posso ajudar, estudamos juntas, lembra? — Abro meu sorriso
mais charmoso para ela, que não cai na tática.
— Foda-se, vai querer me dar ordens como da última vez, eu só
tratarei desta mulher se você ficar do lado de fora, é minha condição,
Daniele — Lyane fala firme e impositiva.
— Tudo bem, Axel pode te ajudar — aceito e ela parece mais
aliviada quando fecha a porta da sala.
Agora tenho que lidar com a desobediência do meu querido marido,
por que diabos Lucas não pode fazer o que mando uma vez na vida?
Minha existência seria muito mais fácil se ele não tivesse essa
mania de me desafiar!
Encontro meu pai e ele no escritório, a postura dos dois vacila
quando entro e alterno meu olhar entre eles, mal consigo controlar
minha raiva.
— Quero uma explicação — são as únicas palavras que consigo
falar sem gritar.
— Eles estão em uma relação — é Lucas quem reúne coragem
para responder primeiro, como se suas palavras explicassem tudo.
— Ela caiu no jogo dele, Luana não é nada mais que uma presa, foi
perseguida, vigiada, estudada, tenho certeza que o maldito tocou uma
enquanto assistia ela trocar de roupa, ou fazer coisa pior. — Sinto um
gosto amargo na boca só de pensar nisso. — Ela é a vítima de um
homem manipulador e descontrolado.
— Você precisa parar de tirar conclusões, Yuri parecia
genuinamente preocupado com ela. — Agora é meu pai quem entra
na discussão.
— Ele foi desmascarado, vai falar e fazer qualquer coisa para
manipular quem quer que seja, a fim de pensarmos que é só mais
uma vítima. — Levo minhas mãos às têmporas e massageio, já
sentindo o cansaço da noite me atingir. — Achei que vocês fossem
mais espertos do que isso — minha voz soa cansada e desapontada.
— Não me insulte assim, Daniele. — Meu pai levanta e vem em
minha direção, a pose forte do Capo só é quebrada pelo olhar doce
com que me encara. — Ele estava tentando enganar muita gente
naquela sala, mas acho que acima de tudo, tentou se enganar.
— Ele está apaixonado — Lucas comenta e não controlo a
gargalhada debochada que solto.
— Psicopatas não são capazes de amar, Lucas. — As palavras
tristes que saem da minha boca são um eco de pensamentos antigos
— E não o compare a mim, vocês podem pensar o que for e sei que
não sou a pessoa mais empática do mundo, mas não sou uma
psicopata, não completamente.
— Eu sei, minha filha, não é isso que queremos falar.
— Essa discussão é inútil e estou cansada, espero que os dois
tenham tido o mínimo de juízo e o prenderam na cela com
seguranças? — Olho para eles, que confirmam com a cabeça. Pelo
menos isso. — Então a única pessoa que pode tomar uma decisão
neste quesito é Luana, e ela está aos cuidados de Lyane.
— Qual é a situação? — Lucas pergunta, preocupado.
— Ela foi torturada, ainda não sabemos a extensão real dos danos,
nossos homens devem estar chegando ao armazém com as
informações e os homens que capturamos. — Vou até a mesa do meu
pai e pego um comprimido para dor de cabeça, engulo com uma dose
de whisky antes de voltar a falar: — Preciso voltar lá e conseguir
respostas.
— Você precisa dormir um pouco. — Meu pai acaricia meu rosto e
vejo seu olhar preocupado. — Deixa que eu cuido deles, afinal preciso
fazer alguma coisa ou nossos homens vão pensar que já me
aposentei.
— Ainda não está velho suficiente para isso pai, sossega — brinco
para fazê-lo relaxar. — O homem grisalho é o torturador, foque nele,
também recuperamos uma maleta que possivelmente contenha as
informações que ele tirou de Luana.
— Você acha que ela falou algo? — Lucas pergunta, a
preocupação do Consigliere estampada em seu rosto bonito.
— Luana não tem treinamento e não faz parte da máfia,
deveríamos ter cortado os laços com ela depois que Miguel morreu —
explano minhas conclusões. — Ela é um alvo fácil demais, e se esses
caras a descobriram, é só questão de tempo até nossos outros
inimigos a encontrarem, mas ela não sabe nada sobre nossos
negócios, não falamos destes assuntos em nossas sessões, o melhor
é cortar relações completamente.
— Não vou deixá-la sozinha no mundo, Daniele. — A voz da minha
mãe chega antes que eu consiga ouvir seus passos, ela estava
espionando. — Tenho certeza que podemos protegê-la, era isso que
Miguel queria quando pensou neste plano.
— A senhora sabia de tudo e não nos falou nada — acuso com
ressentimento. — Contudo agora não adianta debatermos isso, só
Luana pode decidir sobre a própria vida, e não sei se ela vai querer
isso, mãe — respondo. — A senhora, mais do que ninguém, sabe o
que significa viver assim, cercada por seguranças, a vida dela jamais
seria a mesma.
— Você sabe a resposta, isso tudo é escolha dela, não adianta
vocês ficarem debatendo algo que não têm controle sobre, no
momento em que Luana melhorar, sei que tomará a melhor decisão
para a própria vida. — Amélia anda até meu pai, que passa uma mão
protetora pela sua cintura como um reflexo e a puxa para perto. — Eu
não me arrependo da minha escolha e Miguel fez o que achou melhor
para proteger sua filha.
— Por mais que eu queira acreditar, ainda não entendo. Por que
não me falou nada? — meu pai pergunta com ressentimento na voz.
— Eu prometi que manteria segredo, e Luana estava mais feliz do
que a muito tempo não a via — minha mãe se defende. — Miguel
pediu para dar uma chance a Yuri e fez de tudo para manter o menino
fora de problemas, não acho que ele seja uma pessoa má, nem todo
transtorno de personalidade esconde um monstro atrás de si.
— Mesmo assim deveria ter falado algo depois do baile — meu pai
repreende, triste, mas já está entregue.
Eles se beijam e quero revirar os olhos, são tão grudentos. Desde
que saí de casa parece que piorou, antes eles se controlavam na
minha frente, agora quando Lucas e eu os visitamos ou trabalho em
casa com meu pai, sou obrigada a presenciar coisas demais.
— Vem, amor, vamos dormir um pouco. — Estou tão perdida em
pensamentos que nem percebo Lucas em minha frente, sua mão
estendida é um convite e penso por um instante em recusar, mas não
quero.
— Quero saber tudo depois — falo seriamente para meu pai
enquanto deixo Lucas me conduzir até meu quarto, que ainda
continua o mesmo.
Quando a porta se fecha meu marido me ataca, tirando a roupa
preta e colada do meu corpo, Lucas beija meu pescoço e passa as
mãos pelos meus seios.
— Estava tão preocupado com você, meu amor. — Sua voz é
grossa e carregada de sentimentos. — Por que você me testa assim?
— ele sussurra em meu ouvido e morde o lóbulo da orelha enquanto
me segura contra seu peito, tão afoito e apressado que sei que está
duro por mim.
— Porque eu posso — respondo com uma provocação, a mesma
que ele usou depois do nosso primeiro beijo, e sou presenteada com
um sorriso safado.
Meu marido arranca minha roupa em tempo recorde, me ergue em
seus braços e me joga na cama, tiro sua gravata e o seu terno, agarro
a camisa branca e, com um puxão forte, estouro os botões, Lucas
sorri e franze a testa.
Esse vai ser um sexo selvagem, ele precisa saber que estou bem,
e quero acalmá-lo, também preciso gozar, a adrenalina do resgate
combinada com a raiva que ainda sinto por ele ter me desobedecido
se transformou em tesão, preciso liberar essa energia toda com o pau
dele me fodendo enlouquecidamente.
Meu marido coloca uma camisinha e me penetra rapidamente,
arrancando um gemido dos meus lábios tão logo começa a se mover,
arranho suas costas e sou recompensada com uma mordida no
ombro, enlaço minhas pernas pela sua cintura.
— Você me deixa louco — Lucas geme contra minha boca e sorrio
para ele.
— Você também, agora cala a boca e me fode — exijo e sua mão
desce pelo meu corpo até chegar ao clitóris inchado, ele massageia e
sinto o orgasmo chegar, forte e avassalador, me atropelando no
mesmo momento em que ele perde o controle e se derrama dentro de
mim.
Terminamos com a respiração descompassada, ambos ofegantes e
suados, Lucas deita em meu peito e acaricio seus cabelos, quero
fundir sua vida à minha para tê-lo sempre comigo e protegê-lo dos
monstros do nosso mundo.
Estou trancado nesta merda de sala por tempo demais, quem essa
garota pensa que é para me deixar aqui?
Conforme os minutos passam, meus pensamentos são desviados
para as novas descobertas.
Minha primeira teoria depois do sequestro foi a de que eles
estavam atrás de Luana por causa do pai dela, pela ligação com a
Família Corleone, mas no momento em que Daniele contou sobre a
sua parte nesta história, as coisas ficaram confusas.
Talvez eles queiram informações sobre a filha do Capo, ela é
diferente de outras mulheres da máfia e parece mais envolvida, afinal
foi essa diaba quem tomou a liderança do meu interrogatório.
Ela sabe como identificar minha manipulação, mas começo a
pensar que realmente não seja tão parecida comigo quanto eu
imaginava.
Primeiro porque se importa demais com o seu marido, a forma com
que se colocou na frente do homem, protegendo-o com o próprio
corpo, foi uma das bandeiras vermelhas.
Mesmo assim, ela não reage como os outros e é tão analítica e
observadora que consegue capturar minhas mentiras. Ela pode não
ser completamente igual a mim, mas meu corpo sentiu sua presença
como uma ameaça, e isso não é pouca coisa.
Quando estou prestes a levantar e gritar para que alguém me fale o
que está acontecendo, escuto uma voz feminina no corredor.
— Eu trouxe café, vocês devem estar cansados — fala com os
guardas — aproveitem os donuts, vou falar rapidinho com ele e…
— Desculpe, Senhora Corleone, mas ninguém tem permissão para
entrar na sala — um dos homens responde.
— Então não vou entrar — ela retruca e escuto seus passos do
outro lado da porta. — Olá, Yuri, fico feliz em te ver novamente,
gostaria de ter mais tempo, mas só vim avisar que ela passou por
alguns procedimentos médicos e está fora de perigo, se recuperando,
deve ficar desacordada por um tempo por causa dos remédios para
dor.
— Obrigado — respondo e solto o ar que não sabia que estava
segurando. — Pode me avisar quando ela acordar?
— Vou tentar — a mulher murmura com a voz triste. — Luana é
importante para esta família, tenha isso em mente nos próximos dias.
— Amélia — chamo antes que ela saia. — Luana tem um gato,
seria bom mandar alguém para alimentá-lo — Não me importo com o
gato, mas Luana sim, e vou precisar do máximo de pontos que
conseguir para quando ela descobrir quem eu realmente sou.
— Vader está aqui, Lucas o trouxe para ficar com ela. — Sua voz
parece surpresa, mas feliz.
Então escuto os passos dela se distanciarem e volto aos meus
pensamentos.
Luana é importante para eles ou para o tratamento da filha? Ela
tem um propósito para esta família, só por isso eles a mantêm por
perto.
Sei como essas pessoas funcionam, sua organização é tão suja
quanto o governo, podem falar o que for, dar uma parte do dinheiro
para orfanatos, ajudar um pobre aqui e outro ali, mas por trás de tudo
isso têm casas de prostituição, de jogos clandestinos, extorsão e
muito mais, é assim que eles controlam a cidade.
Dois dias se passam e continuo aqui, Amélia voltou como
prometeu, mas só com informações superficiais, Luana está se
recuperando.
Ficar trancado com meus pensamentos por tanto tempo me fez
refletir em muita coisa, esta missão começou como um jogo que eu
não pensei que gostaria de entrar, mas foi o desafio que me manteve
focado.
Gosto da sensação de controle que tive enquanto tudo dava certo,
isso me manteve motivado, mas algo mudou no meio do caminho, e
ainda não sei explicar o que foi.
***
Cinco dias neste inferno de sala e já estou a ponto de explodir
quando a porta se abre e Daniele aparece. Vestida com um macacão
social azul e tênis all star amarelo, ela parece realmente a menina de
22 anos que é, ainda mais com todas as tatuagens em seus braços e
o cabelo preso em um coque bagunçado.
A única coisa que a entrega é o olhar frio e a pose controlada,
além, é claro, da arma em sua cintura.
— Ela está acordada e pediu para ver você — anuncia friamente
enquanto avalia minha reação.
— Finalmente. — Levanto da cama improvisada, mas sou parado
quando ela entra e fecha a porta.
— Contudo antes teremos uma conversa. — Daniele senta-se na
cadeira e aponta para que eu volte para a cama. — De um monstro
para outro. — Seu sorriso de canto me faz apertar os olhos
desconfiado, mas estou interessado.
— O que você quer?
— Simples, quero você bem longe daqui, na verdade o que eu
realmente quero é pôr uma bala na tua cabeça, ou cortar a garganta,
mas prometi que não faria nada. — Ela descansa a arma no colo,
dando-me uma falsa sensação de segurança.
— Fico feliz em saber que continuarei vivo. — A brincadeira a faz
dar de ombros.
— Você vai entrar lá e contar toda a verdade a ela, sem mentiras
ou desvios, se eu perceber que está tentando manipulá-la ou usar os
sentimentos dela a seu favor, acabo com a sua vida.
— Por que você mesma não conta? Tenho certeza que conseguiu
documentos suficientes para provar o que eu disse, é por isso que
continuo vivo.
— Luana está chamando pelo seu nome desde que acordou, antes
mesmo de se importar com ela mesma, estava perguntando por você.
— Daniele me encara e ambos sabemos quão confuso é este
sentimento. — Ela está apaixonada.
— Não, Luana estava sozinha, triste, perdeu a família e a melhor
amiga em pouco tempo.
— Uma presa fácil.
— Acredito que foi por isso que Miguel bolou este plano.
— Para você comê-la enquanto vigiava seus passos?
— Para manter outros predadores longe. — Agora não é mais uma
brincadeira. — Ele sabia que viriam atrás dela, e sem ninguém ao seu
lado, ela estava vulnerável.
— Nós a protegeremos a partir de agora.
— Ela é minha responsabilidade. — Minha voz é firme e
ameaçadora, assim como seu olhar. — Este jogo é meu e somente eu
posso jogá-lo.
— Isso não é um jogo, mas se ela decidir continuar com essa
merda toda, o que eu duvido muito, então teremos alguns pontos a
acertar. — Daniele levanta e vai em direção à porta. — Entretanto se
ela decidir que não quer mais a sua presença, é bom ouvir e aceitar.
— Daniele — chamo sua atenção e foco em seu olhar. — Eu nunca
me afastarei, nem se ela implorar.
— Então serei obrigada a tirar a sua vida.
— É a única forma de me fazer parar. — Esta é a única certeza que
tenho e ela acena com a cabeça.
A primeira coisa que vejo quando entro no quarto em que Luana
está é a quantidade de aparelhos médicos, parece mais um hospital,
também reparo que não estamos sozinhos, além de Daniele que entra
atrás de mim, vejo dois homens com armas em punho, nos fundos do
quarto, os olhares fixos em mim. Lucas, Alphonse e Amélia também
estão aqui, parados próximos ao leito de Luana.
Então meu olhar cai na mulher deitada na cama hospitalar, cheia de
fios ligados ao seu corpo, suas mãos estão com inúmeros curativos,
assim como os braços, vejo hematomas escuros em sua pele
conforme vou avaliando o corpo, ela está magra e parece fraca.
Seus cabelos foram penteados recentemente, mas o que me faz
fechar as mãos em punhos é a visão do rosto de Luana, o lábio
cortado, marcas roxas nos olhos e o nariz torto, ela foi espancada.
Daniele avalia minha reação e quando troco um olhar com ela, seu
sorriso volta a aparecer, deixando-me saber que quem fez isso com
Luana teve o que mereceu.
— Yuri, você está bem? — Sua voz fraca e preocupada me faz
congelar no lugar, é frágil demais, não combina com a mulher forte
que ela é. — Me perdoa, não queria te arrastar para isso, eles
estavam atrás de mim.
Encontro seus olhos castanhos e sinto um aperto no estômago ao
ver as lágrimas caindo pelo seu rosto machucado, Luana está
chorando por mim?
Ela levanta a mão em um convite para me aproximar, então dou um
passo à frente, mas Daniele me intercepta antes que possa tocá-la.
— Desculpa, Luana, isso vai ser difícil de ouvir, ainda mais no seu
estado atual, mas ele vai te contar a verdade.
— Do que você está falando?
Luana encara Daniele completamente confusa antes de me olhar
novamente, seu rosto tomado pela dúvida. Então começo a falar,
despejo toda a verdade que contei aos Corleone, desde minha
infância até o momento em que a conheci.
Pela primeira vez na vida não estou tentando manipular a história a
meu favor, nem finjo sentimentos falsos, deixo que as palavras saiam
como se estivesse narrando um livro, não existe emoção em minha
voz, assim como não sinto nada ao lembrar de tudo o que fiz até
agora.
Vejo todas as reações de Luana, ela fica com pena quando falo
sobre o orfanato, então começa a juntar as peças, afinal de contas a
mulher é uma psicóloga incrível, quando chego à parte do seu pai, ela
começa a soluçar, quero parar e deixá-la absorver tudo, mas ela
precisa saber de toda a verdade.
Depois de terminar a história, Luana fica em silêncio por muito
tempo, tentando se recompor, posso ver seu olhar perdido enquanto
ela forma suas teorias.
Ninguém na sala interferiu, vi Amélia tentar se mover, mas
Alphonse colocou a mão em sua cintura e a segurou, Daniele ficou em
minha frente, bloqueando a visão do marido e protegendo Luana, mas
todos aguardaram pacientemente.
— Foi tudo mentira? — é a primeira coisa que ela pergunta quando
consegue falar, a dor e ressentimento são palpáveis em sua voz. —
Você se envolveu comigo por causa de um plano maluco do meu pai?
— Não — respondo olhando diretamente para seu rosto. — Essa
parte não estava nos planos.
— E quer que eu acredite nisso?
— Não tenho porque mentir agora.
— Quero ficar sozinha com ele — Luana fala com os Corleone,
agora mais séria e forte. — Não precisam se preocupar, Yuri não vai
me atacar.
— Não acho que seja uma boa ideia, Luana — o Capo nega com
carinho e preocupação. — Ele pode querer te usar como refém para
sair daqui.
— Não precisa disso, vocês não farão nada contra ele. — Agora
sim, tenho um vislumbre da mulher que conheço. — Em respeito a
mim, Yuri sairá ileso daqui.
Daniele olha para sua psicóloga por um tempo, então acena em
concordância e faz sinal para todos saírem da sala, ela é a última, e
quando passa por mim, para e fala ao meu lado.
— Nem pense em tentar alguma coisa. — A ameaça explícita faz
meus pelos da nuca arrepiarem.
Maldita mulher!
A porta se fecha e estamos sozinhos, posso sentir o olhar de Luana
em mim, também sei que está cheio de lágrimas que agora ela tenta
conter.
— Muita coisa faz sentido agora — ela fala e levanta a mão em
minha direção, novamente me chamando para me aproximar. — Vem
aqui.
Com esforço obrigo minhas pernas a andarem e pego sua mão
enfaixada, em um impulso passo os dedos pelos hematomas do seu
braço e novamente sinto um ódio intenso dentro de mim.
— Estou feliz por ver que não se machucou — ela diz
carinhosamente enquanto afaga minha mão com a sua. — Agora
quero ouvir de você, por quê?
Eu sei o que ela quer ouvir, mesmo sabendo que não sou capaz de
amá-la, ainda guarda uma fagulha de esperança de que tudo o que
vivemos não foi uma mentira. É a forma com que humanos normais
lidam com seus sentimentos, encontrando desculpas para dar sentido
à confusão interna.
Eles não conseguem controlar o que sentem ou por quem, então
precisam encontrar explicações para o caos.
— Foi um impulso — respondo com sinceridade. — Você é uma
mulher linda, forte, inteligente e muito gostosa, não consegui conter a
atração que senti.
— Não sentiu nada além de atração física? — Seus olhos brilham
com o que presumo ser esperança, mesmo depois de tudo o que falei.
— Não pretendia me envolver com você, isso complicou as coisas,
o plano era ficar próximo o suficiente para ter a sua confiança.
— Conseguiu o que queria. — Ela tenta manter a voz firme, mas
está magoada, consigo sentir.
— Não sou capaz de amar, Luana, esse sentimento que pessoas
normais simplesmente têm dentro de si e entregam aos outros, essa
coisa inexplicável que os faz pensar nos outros antes de si mesmos,
não consigo sentir ou entender.
— Eu sei — confirma.
— Consigo reconhecer sentimentos primários como raiva e
felicidade, mas é diferente. Eu me importo com você, mas não pelos
mesmos motivos que você se importa comigo.
— Conheço os motivos do meu pai e o que o levou a bolar este
plano, mas quero saber quais são os seus, o que te faz continuar no
jogo?
— Durante minha vida senti como se não tivesse um propósito real,
cresci sem saber o que ou quem eu era, foquei minhas energias no
que achava mais necessário, ganhar dinheiro e buscar poder, porque
era o único caminho que via para me manter ocupado — penso sobre
isso enquanto falo —, então atingi um ponto em que tudo ficou fácil
demais e perdi o interesse, neste momento recebi a carta do seu pai.
— Então eu fui só uma distração?
— Sim, para falar a verdade eu nem sabia se conseguiria fazer o
que ele pediu por muito tempo, cheguei a cogitar não vir a New York e
só esquecer aquilo, quase peguei um avião de volta no mesmo dia —
lembro de querer desistir —, mas algo mudou.
— O quê?
— Não sei. — É minha primeira mentira.
Ela desvia o olhar por um tempo e fica calada, espero que me
mande embora ou que seu olhar magoado me faça sentir remorso
pelo que fiz, mas nada disso acontece, continuo inabalável.
— Preciso de tempo para pensar — Luana fala e aperta minha
mão. — Mas não se preocupe, eles não farão nada contra você.
— Não estou preocupado com eles. — Sinto um aperto diferente
em meu peito, então escuto um miado familiar antes de sentir as
unhas afiadas do felino que escala minha perna. — Droga de gato,
ainda não aprendeu a pular?
Luana sorri involuntariamente quando pego Vader e coloco ao seu
lado, sabendo que é onde ele queria chegar, o gatinho se aconchega
nela com cuidado, como se sentisse que Luana está frágil, então
começa a ronronar.
Sei que preciso sair e deixá-la sozinha, mas antes que possa me
controlar, passo minha mão pelos seus cabelos e acaricio a lateral do
seu rosto com delicadeza, fixo meu olhar frio no dela, cheio de
emoções confusas, me abaixo e beijo sua testa, por um milésimo de
segundo sinto meu coração acelerar.
— Independente do que decida, sempre estarei ao seu lado —
prometo com a voz baixa e saio sem olhar para trás.
Como esperado os Corleone me aguardam no corredor, a postura
tensa e preocupada me faz querer bater em um deles, parece que não
entenderam nada.
A única pessoa tranquila e com um meio sorriso no rosto é Daniele,
a maldita mulher mais fria que já vi parece ler no meu rosto a
confusão que sinto internamente.
— Vem, você parece a ponto de explodir. — Ela faz sinal para
segui-la.
Chegamos a uma academia no subsolo da mansão, ela logo tira o
calçado e as armas que tem presas pelo corpo, pega uma das luvas
de boxe, preparando-se para subir ao ringue.
— Você luta? — Lucas me pergunta quando vai até a mulher e a
ajuda a fechar as luvas.
— Prefiro jiu-jitsu, mas como não estou em posição de escolha,
posso brincar de uma forma diferente hoje — respondo já sentindo
meu corpo aquecer com a adrenalina de uma possível luta.
Para falar a verdade, não gosto de boxe, acho limitante demais,
não é nada gracioso e quando a luta se intensifica tudo fica
descoordenado.
— Sobe aqui, samurai — Daniele convida enquanto se alonga no
ringue. Pego as luvas que Lucas me lança e subo atrás dela. — Se
você jogar sujo comigo, farei o mesmo, lembre-se disso.
— Não sou eu o mafioso apelidado de executor nesta sala —
respondo e começamos a luta.
— Nem todos os monstros precisam matar para serem perigosos
— ela retruca e me ataca com uma sucessão de golpes, consigo
desviar de alguns, mas logo sou atingido, Daniele é rápida e certeira.
— Você está certa. — Parto para cima dela, mas ela desvia e me
acerta na costela. — Nunca matei ninguém, o que não significa que
não o faria se precisasse.
— Espero que nunca chegue a este extremo — ela responde e
continua os ataques, mas percebo que está se contendo, mais
interessada na conversa. — Principalmente se Luana estiver
envolvida.
Só o fato dela mencionar Luana e sugerir que eu possa machucá-la
me enfurece e começo a lutar sério, forçando-a a ficar na defensiva e
a desviar dos meus ataques, consigo acertá-la no estômago uma vez,
mas ela logo se recupera.
— O que vai acontecer quando ela não for mais interessante?
Penso nisso enquanto lutamos, essa mesma pergunta já rondou
minha mente diversas vezes, mas ainda não tenho resposta.
E se ela me aceitar de volta e eu perder o interesse com o tempo?
Não sei quanto posso aguentar em uma vida pacata, mesmo ao
lado dela, Luana atiça a minha mente por ser uma incógnita em minha
vida, a única que causa um conflito interno dentro do meu peito, só ela
tem esse poder.
O que a torna única, mas será que isso é suficiente a longo prazo?
— Eu não sei — respondo com sinceridade.
Me apaixonei por um psicopata.
É a primeira constatação que tenho quando ele sai do quarto e me
deixa sozinha com meus pensamentos e Vader ronronando do meu
lado.
Sei disso porque é a única forma de explicar meu coração
acelerado e a vontade de beijá-lo, mesmo depois de saber de tudo.
Somente um sentimento tão forte conseguiria passar por cima da
razão.
Que merda, Luana, você é uma maldita psicóloga, fez diversos
cursos e estudou durante anos sobre transtorno de personalidade
antissocial, e mesmo assim seu cérebro tenta enganá-la.
Como não percebi os sinais?
Por que o local onde seus lábios tocaram parece queimar?
Por que seu cheiro ficou impregnado no quarto?
Por que, apesar de tudo, eu só queria que ele me abraçasse e
falasse que foi tudo uma mentira, uma brincadeira de mau gosto, que
tivesse encontrado qualquer desculpa esfarrapada?
Por que ainda quero cair na sua manipulação e não consigo ver o
que está bem na minha frente?
Sinto-me traída, enganada, subjugada, fui feita de trouxa pela
pessoa que eu mais amava neste mundo, meu próprio pai armou esse
esquema todo com a desculpa de me proteger.
Que droga de proteção é essa que controla minha vida e me deixa
sem escolhas? Que merda de pai pode imaginar que algo assim seja
aceitável?
As lágrimas voltam a rolar pelo meu rosto, meus olhos ardem e já
não controlo os soluços, mesmo com a dor nas costelas toda vez que
preciso respirar mais profundamente, nada machuca mais do que o
aperto em meu peito.
É como se alguém tivesse entrado aqui, serrado os ossos que
protegem meus órgãos internos, aberto a gaiola e arrancado meu
coração enquanto eu olhava e absorvia a dor, sem anestesia ou
preparação.
Ele mentiu para mim, me enganou e manipulou cada um dos
nossos encontros, porque essa é a forma como ele sabe viver nesta
sociedade, Yuri tem todas as bandeiras vermelhas de perigo, olhando
novamente para as nossas interações, aquele sentimento de alerta
esteve lá, no fundo da minha cabeça, mas eu ignorei.
Meu corpo tentou avisar a mente, gritou para eu me afastar, mas
não ouvi, e aqui estão as consequências. Todas as palestras sobre
pessoas narcisistas, manipuladoras, controladoras, os artigos e
cursos, nada me preparou para realmente viver algo assim.
E mesmo sabendo de toda a verdade, não quero acreditar.
Agora entendo as vítimas de relacionamentos abusivos que caem
na conversa do abusador diversas vezes, são atraídas pelo charme e
carisma, até que estejam completamente dominadas pelo outro, então
não conseguem se desprender emocionalmente ou fisicamente
daquela relação.
Encontram desculpas para as atitudes lamentáveis do parceiro,
vivem sonhando com os momentos bons que não voltam mais,
imploram pelo carinho que recebiam enquanto estavam sendo
conquistadas, mas que no momento em que caem nas garras do
outro, se transforma em um pesadelo.
Yuri se aproveitou da minha vida solitária, inclusive foi o
responsável por afastar minha única amiga, ele usou de momentos de
fraqueza para se infiltrar, tornando-se rapidamente alguém importante.
Ele estava lá desde o começo, naquela noite no bar em que fui
para casa com o pinto pequeno, Yuri estava me vigiando, entrando na
minha vida aos poucos, sem que eu percebesse.
Caralho, ele tinha câmeras no meu apartamento, o maldito assistiu
tudo, até mesmo…
Isso é doentio, ninguém tem o direito de ter a sua privacidade
invadida assim, eles não tinham o direito de fazer isso comigo.
***
Depois da conversa com Yuri, passei cinco dias trancada no quarto,
ainda me recuperando dos ferimentos em meu corpo e do choque
emocional de tudo o que descobri.
Amélia ficou comigo a maior parte do tempo, Rita também vinha me
visitar durante o dia, elas me ajudaram a manter a cabeça erguida,
mesmo que a noite tenha chorado escondida abraçada ao Vader.
Ele está em algum lugar da mansão, Daniele falou que a decisão
do que acontecerá com Yuri é minha, acredito que ela quis dizer que
eu decido se ele vive ou morre, mas não usou essas palavras.
A verdade é que não sei o que eu quero, ainda estou em choque e
só de pensar nele, meu coração dói, estou vivendo novamente um
processo de luto que parece não acabar nunca.
Primeiro meu pai, depois minha mãe, então Vivian foi embora e
agora meu mundo virou de pernas para o ar novamente.
Veja bem, nós vivemos o luto não só quando alguém morre, mas
em várias etapas da nossa vida, quando somos demitidos, quando um
relacionamento acaba, quando um amigo vai embora, são vários os
momentos em que o luto é sentido, em intensidades diferentes.
Quando há uma mudança brusca em nossa rotina, que transforma
todos os planos e expectativas que tínhamos, experimentamos as
fases do luto.
Primeiro estágio: negação e isolamento;
Segundo estágio: raiva;
Terceiro estágio: barganha;
Quarto estágio: depressão;
Quinto estágio: aceitação.
Isso tudo faz parte de estar vivo e inserido em uma sociedade, é
normal e precisa ser vivido para que, quando a fase de aceitação
chegue, estejamos preparados para seguir em frente.
Nestes dias eu passei pelas três primeiras, indo e voltando de uma
para a outra, e agora estou na depressão, me sinto triste e sozinha
novamente, é como se o mundo não fizesse mais sentido.
Ele continua aqui, mas não é mais a mesma pessoa que eu pensei
conhecer, o Yuri que conquistou meu coração era uma farsa, alguém
moldado especialmente para mim, a personalidade criada para me
atrair.
Estou tão perdida em minha dor que não escuto a porta se abrir e
Lucas entrar, o terno caríssimo o faz parecer um CEO importante,
mas a forma com que passa a mão no cabelo ao me olhar demonstra
seu desconforto.
— Desculpa te incomodar — ele fala enquanto sorri para mim. —
Podemos conversar um pouco?
— Claro — respondo e seco as lágrimas que insistiram em sair. —
Sente-se, Lucas, em que posso ajudar?
Não lembro de ter conversado em particular com ele em algum
momento, geralmente ele está com Daniele, então é estranho vê-lo
sozinho.
— Quero saber… como você está? — pergunta carinhosamente.
— Melhorando, Lyane avaliou minhas costelas hoje e disse que
logo estarei curada, os hematomas e cortes também estão
cicatrizando, nada como o tempo para curar as feridas — respondo e
tento sorrir.
Lucas acena com a cabeça e passa a mão na barba, ele está
nervoso, parece que quer falar algo.
— Yuri tem perguntado sobre você. — Só de ouvir seu nome meu
peito aperta e preciso me segurar na cama. — Olha, eu não sou
psicólogo para avaliar alguém assim, e também não leio mentes, mas
ele não mentiu, todas as informações foram confirmadas e, não sei
como explicar, mas ele parece preocupado.
— Deve estar apreensivo por não ter o controle da situação.
— Provavelmente, mas tem algo a mais, Yuri não fala com
ninguém, mas todos os dias pergunta sobre você, minha sogra vai até
ele e repassa seu estado de saúde.
— Eu ainda não sei o que fazer, Lucas.
— Não vim cobrar uma decisão, só preciso saber uma coisa, e
você provavelmente não tem permissão para me falar, mas vou
perguntar do mesmo jeito. Daniele já chegou a ser diagnosticada com
alguma forma de transtorno de personalidade antissocial?
Ele me encara com preocupação no olhar, Lucas é um homem
intenso e completamente apaixonado pela sua mulher, por isso
entendo de onde vem esta preocupação, agora que ele viu como
alguém que possivelmente é um psicopata se comporta, deve ter
conectado as semelhanças.
— Você sabe que não posso te responder essa pergunta, Daniele é
minha paciente.
— Imaginei. — Ele olha para um ponto na parede, pensativo, então
volta a falar: — E eles são parecidos, recuperei todas as imagens que
Yuri tinha e refiz seus passos desde o momento em que chegou em
New York, também encontrei arquivos com anotações pessoais dele.
— Lucas, eu não quero saber…
— Daniele é muito protetora com quem ela ama, é a sua linguagem
afetiva, às vezes minha mulher passa um pouco do ponto, mas eu
consigo ver a diferença em seu olhar quando ela está preocupada
comigo, é diferente, mais intenso e doloroso, Daniele só me olha
assim quando luta internamente com seus sentimentos.
— Ela é uma mulher especial e te ama mais do que tudo no mundo.
— Pego sua mão que descansa ao lado da cama e Lucas volta a me
encarar.
— Ele tem o mesmo olhar todas as vezes que Amélia fala sobre
você — ele aperta minha mão enquanto absorvo suas palavras —, é
um gesto pequeno e difícil de ver, a não ser que você esteja
acostumado a procurar por isso.
— Como você procura nela.
— Sim, digamos que estou treinado para perceber estas pequenas
mudanças.
— Não significa nada, Lucas, ele pode estar preocupado com o que
aconteceria se eu morresse.
— Pode ser, como falei, não sou psicólogo, mas acredito que as
pessoas experimentam o amor de formas diversas, Daniele tem sua
linguagem única e, mesmo sendo diferente da minha, não tenho
dúvidas de que o que ela sente é amor.
— Não discordo, mas são situações distintas, ele até pode sentir
algo por mim, afinal não posso diagnosticar ninguém dessa forma, só
ouvindo uma história, mas não muda o fato de que o que ele fez foi
errado.
— Sim, Miguel poderia ter conversado com Alphonse, a Família
jamais deixaria você desprotegida, especialmente Daniele. — Lucas
levanta e beija minha mão. — Ela tem um carinho especial por você,
só não demonstra porque não quer perder a psicóloga, então prefere
manter uma relação mais profissional.
— Foi ela quem planejou a festa de aniversário, não foi? — indago
o que já suspeitava e recebo um sorriso genuíno de um homem
apaixonado. — Você não precisa que eu confirme algo, Lucas, no
fundo já tem suas respostas.
— Sim, mas você ainda precisa obter as tuas — ele fala
seriamente. — Peça para um dos seguranças me chamar quando
estiver pronta.
— Não sei quanto tempo vou levar. — Respiro fundo e volto a
acariciar o Vader, que está deitado no meu colo.
— Ele está esperando.
— Yuri está preso?
— Não, Alphonse deu uma escolha para ele, as portas estão
abertas se quiser ir embora, oferecemos até dinheiro e uma
passagem só de ida para qualquer lugar do mundo, mas caso faça
isso, não tem volta. — Lucas caminha em direção à porta, mas antes
de sair vira o rosto e fala: — Ele nem pensou antes de recusar.
Yuri continua aqui por vontade própria? Não, tem alguma coisa a
mais, ele está nessa pelos desafios do jogo, Lucas pode pensar que é
por algum sentimento que tenha por mim, mas ele só acha isso
porque compara as ações dele com as de Daniele.
Eu nunca cheguei a diagnosticá-la com algum transtorno de
personalidade antissocial, ela até tem traços que se encaixam, mas
ela não é uma psicopata, e pode ter sido por causa dos anos de
terapia que começou a entender e desenvolver sentimentos por outras
pessoas, inclusive um amor puro e genuíno.
Mas o fato é que cada caso é diferente e cada pessoa é única.
Estou há mais de um mês na mansão Corleone, as portas estão
abertas, com seguranças no corredor, é claro, mas a questão é que
tenho liberdade para ir embora, inclusive ofereceram um incentivo
financeiro, contanto que eu suma do país e jamais retorne.
Como se eu precisasse disso.
Eles não entendem, nada do que façam ou falem me fará sair
daqui, somente as ordens de uma mulher têm poder para mudar meu
destino.
Mesmo assim, já não sei se teria forças para ficar longe dela, cada
dia que passo aqui sem poder vê-la é uma tortura. Estamos a poucos
metros de distância, porém separados por palavras.
Aguardo seu chamado, quando Luana estiver pronta, ela vai me
receber, o que vai acontecer depois disso eu já não tenho a mínima
ideia, mas sei que será uma escolha dela.
O que me mata é que, mesmo querendo estar ao seu lado, não
consigo pensar em mentir para ela, enganá-la ou fazê-la pensar que
sou algo que não sou.
Antigamente isso seria diferente, poderia fingir sentimentos e
chorar, implorando por perdão, eu sei as palavras que ela quer ouvir,
mas não consigo iludi-la, não ela.
Estou em um dos quartos de hóspedes, é grande e luxuoso como
todo o padrão da mansão, as janelas francesas proporcionam uma
visão privilegiada dos jardins.
E é no gramado verde com o sol ameno da primavera, às nove
horas da manhã, que vejo Amélia passeando com Luana, a visão dela
mais forte e corada faz meu coração acelerar, os hematomas sumiram
e seu cabelo está mais longo, ela ganhou peso e parece saudável,
mas o que me faz congelar no lugar é que Luana sorri com alguma
coisa que Amélia fala.
Sua expressão leve e feliz me traz lembranças dos nossos
momentos juntos, do sofá do seu apartamento, de como ela se
concentra quando está interessada em um filme, a forma com que
ronca suavemente ao pegar no sono no sofá, seu rosto amassado
quando acorda e a gargalhada sincera que me faz sentir felicidade
sem saber por quê.
Me escondo atrás da cortina para que ela não me veja, mesmo
depois de tudo o que aconteceu, ainda é um jogo, Luana continua
correndo perigo, ainda mais agora que outras pessoas podem saber
sobre sua ligação com a máfia.
Não sei o que acontece na organização, mas imagino que tenham
lidado com aquela ameaça.
Escuto os passos pesados antes de ouvir a porta abrir, Lucas entra
no quarto, o semblante sério, mas cansado. Ele está com as mãos
nos bolsos e a gravata levemente desalinhada.
— Ela quer falar com você — avisa e por um momento sinto alivio.
— Não sei o que vai acontecer a partir de agora, mas nós estaremos
de olho.
— Imaginei — respondo e dou de ombros.
— Fique pronto às vinte horas — informa e sai, deixando-me
sozinho novamente, mas desta vez sinto uma gota de suor escorrer
em meu pescoço. Estou nervoso?
Minhas roupas foram trazidas do apartamento logo depois que
cheguei à mansão, então escolho a melhor calça jeans preta, camisa
polo cinza que marca meu peitoral e o sapato social, lembro que ela
olhou com atenção demais para um homem que usava estas mesmas
roupas enquanto estávamos almoçando, então fui lá e comprei.
Os minutos se arrastam até que um guarda abre a porta e faz sinal,
eles estão proibidos de falar comigo, ordens diretas de Daniele, não
era necessário, não tenho o que conversar com eles e nem preciso
manipulá-los para nada.
Ao contrário do que imaginei, os guardas me escoltam até um
quiosque mais escondido no jardim, a escuridão da noite é quebrada
por pequenas luzes que indicam o caminho, está frio, mas o lugar é
fechado por paredes de vidro, o interior parcialmente escondido atrás
de prateleiras com plantas, quando piso no caminho de pedra, os
guardas me deixam seguir sozinho.
A cada passo que dou fico mais apreensivo e não tenho a menor
noção do porquê, minhas mãos estão suando e tenho vontade de
correr, então tenho o primeiro vislumbre dela, em uma calça social
azul escura, ela fica linda de azul, uma blusa branca de seda que
deixa seus braços à mostra e marca os peitos.
Entro e percebo a lareira no canto, sinto o calor aquecer meu
corpo, sei que seu olhar me segue enquanto me aproximo, mas por
algum motivo, não consigo encará-la diretamente.
Estive obcecado por este momento há semanas, me preparei e
estava confiante de que sabia o que aconteceria, mas parece que
esqueci a merda toda só por estar no mesmo ambiente que Luana.
Faço uma breve avaliação pelo seu corpo, como vi pela janela, ela
parece estar curada, algumas cicatrizes dos cortes mais profundos
ainda estão visíveis e me fazem querer ressuscitar o filho da puta que
a machucou para poder acabar com ele com minhas próprias mãos.
O local foi preparado para um jantar, com a mesa de dois lugares
onde ela está sentada. Em frente à lareira tem dois sofás e uma
poltrona, várias plantas foram penduradas e suas folhagens caem
como cascatas pelas paredes de vidro, a estrutura de madeira rústica
é a mesma do piso e deixa o ambiente com cara de casa de campo.
Este poderia ser nosso primeiro encontro, se não fosse pela
expressão de dor em seu rosto.
Ela está linda, o cabelo foi cortado e arrumado em ondas que caem
até seu ombro, percebo um pouco de maquiagem e o batom vermelho
escuro, da cor do vinho, gostaria de saber se sua boca tem o gosto da
bebida também.
Não vá por este caminho, Yuri.
Finalmente encontro seus olhos castanhos, um delineado acentua
a intensidade com que ela me encara e percebo a dor e o desconforto
por trás da pose controlada.
Puxo a cadeira e sento em sua frente, Luana cruza as pernas e
encosta seu torso no espaldar da cadeira, inconscientemente
afastando-se de mim, sua mão alcança a taça de vinho de cima da
mesa, que ela usa mais para ter uma distração do que beber.
Não sei o que falar, a verdade é que planejei tantos rumos para
este momento, mas agora, olhando diretamente para ela, minha
mente está em branco.
— Como você está? — vocifero a primeira coisa que vem em
minha mente, a pergunta que venho fazendo todos os dias e não faço
a menor ideia do porquê.
— Melhor, quase todas as feridas estão cicatrizadas. — Sinto algo
como alívio conforme ela fala e solto o ar que nem sabia estar
prendendo. — Liguei para alguns pacientes, mas eles já haviam sido
informados que sofri um acidente de carro, imagino que tenha sido
você?
— Sim — respondo simplesmente, depois que Luana foi resgatada,
consegui permissão para lidar com a clínica de forma remota e avisei
aos pacientes que ficaríamos fechados por um tempo, até que ela se
recuperasse. — Os casos mais críticos foram enviados à Doutora
Costa, como especificado em suas instruções.
— Obrigada por isso.
— É meu trabalho — tento sorrir e fingir confiança, mas não
consigo —, ou era.
Luana me avalia com o olhar enquanto beberica o vinho, quero
perguntar se ela pode beber, mas é melhor conter minhas palavras e
manter-me somente no essencial.
— Pensei muito nas últimas semanas, depois que o choque passou
e pude analisar tudo o que aconteceu, com a mente mais tranquila,
cheguei a algumas perguntas para as quais gostaria de respostas, e
acho que só você pode me dar.
— Estou aqui para isso.
— Por que você aceitou a proposta do meu pai? — Ela tenta
esconder a mágoa, mas percebo que a palavra pai sai mais fraca.
— Porque precisava do dinheiro e nunca pensei realmente que
cumpriria minha palavra — respondo sinceramente.
— Alguma vez se arrependeu ou sentiu remorso pelo que fez?
— Não sou capaz de sentir remorso — Ela sabe disso, espero que
esta conversa não seja sobre coisas óbvias. — Contudo me
arrependo de ter falhado.
— O que quer dizer?
— Você foi capturada e torturada enquanto estava sob minha
reponsabilidade. — Minha voz sai mais áspera do que pretendia, mas
não consigo controlar. — Se tivesse comprado um carro mais veloz,
seguido outra rota, avistado as ameaças antes, fiscalizado as
câmeras de segurança da rua, eu deveria prever o perigo e protegê-la
dele.
— Não foi sua culpa, a Camorra estava atrás de informações.
— Isso não importa, eu falhei e você se machucou. — Sei que
minha raiva é mais pela decepção em ter errado do que pelas
consequências, sou melhor do que isso.
Ela pensa por um momento e absorve minhas palavras, enquanto
isso, sirvo uma taça de vinho, preciso beber alguma coisa para
continuar esta conversa.
— Você sabia quem eu era antes de vir para New York?
— Não, recebi uma foto sua com o relatório quando cheguei ao
apartamento. — A merda do meu coração acelera novamente ao
lembrar daquele dia.
— Se envolver sexualmente comigo fazia parte dos planos? —
Luana pergunta e seu rosto fica vermelho, ela tenta esconder, mas
está com vergonha.
— Não, digamos que foi incontrolável. — É óbvio que não era para
acontecer.
— Como assim?
— Você sabe, Luana. — Foco meu olhar diretamente no dela antes
de falar. — O plano era me envolver com Matt para você pensar que
sou gay, então daria mais abertura, confiaria em mim e assim
estaríamos mais próximos.
— Você fez isso. — Confirmo com a cabeça e ela continua. — O
que mudou?
— Chame de hormônios, química, atração irresistível, as palavras
são o de menos, só não consegui dominar meu corpo e minha mente,
estou sempre no controle, mas quanto mais te provocava, mais me
perdia no caminho.
— Isso é verdade?
— Acho que deixei claro que não vou mentir para você, Luana, não
tenho motivos para isso.
— Foi por causa disso que você saiu do consultório e sumiu depois
da nossa primeira vez? — Não controlo um sorriso de canto ao
lembrar dela, quase nua, completamente aberta para mim em cima da
sua mesa. — Não faça isso, por favor — Luana implora e volto a ficar
sério.
— Sim, corri do que aconteceu, prometi que seria só aquela vez e a
deixaria em paz.
— O que mudou?
— Você é uma mulher decidida, sabe o que quer, acompanhei seus
passos até o bar naquela noite, quase precisei beber para me segurar
e não correr até lá quando o cara se aproximou — minhas mãos se
fecham em punhos ao lembrar do que poderia ter sucedido —, eu não
ia interferir no que quer que acontecesse, mas vi quando ele colocou
droga na sua bebida, por sorte cheguei a tempo.
— Você viu?
— Tenho controle das câmeras do bar — respondo como se fosse
evidente.
— Você me salvou.
— Não vá por este caminho, eu sei o que você quer que eu fale,
mas nada vai mudar o que sou de verdade e essa versão não é
suficiente para você.
— Está enganado — fala com a voz firme. — Não sabe o que
quero que fale, você me vigiou, manipulou, me seguiu e controlou
meus passos.
— Sim — não sei se era para responder, mas faço mesmo assim,
quero que esteja ciente de que sei o que fiz. — Faria tudo novamente,
com mais cuidado na parte final.
— Não se envolveria comigo?
Inspiro profundamente, como pode essa mulher tão inteligente
ainda não ter entendido? Largo a taça na mesa e me inclino para
frente, fixo meu olhar nela antes de falar.
— Não mudaria um segundo sequer do que vivemos, nossos
momentos juntos foram inesperados, mas foram as únicas vezes, em
toda a minha existência, que me senti pertencer a algum lugar. — É a
mais absoluta verdade.
— O que você sente com isso?
— Não sinto coisas, vivencio momentos, por toda a minha vida
nunca senti que conseguia ser autenticamente eu, sempre fui o que
precisava para sobreviver, adaptando-me a cada espaço de uma
forma diferente — explico como consigo —, eu sou um predador nato,
posso moldar minha personalidade, meus gostos, caraterísticas, até a
minha forma de agir, conforme a necessidade.
— E o que você sente com isso?
— Nada.
— Por que continua aqui?
— Não sei. — Merda, não tenho outra resposta para sua pergunta.
Por que não aceitei a proposta dos Corleone, peguei o dinheiro e
sumi? Recomeçar em outro país seria fácil, normal até.
— Tenho pensado sobre nossos momentos juntos, antes de nos
envolvermos meu corpo demonstrava medo quando você estava por
perto, a forma com que você era charmoso demais, controlado
demais, atrativo demais, tudo isso foi parte do jogo.
Não confirmo porque ela não espera isso, deixo que Luana tome
seu tempo e fale o que tem em mente.
— Mas algo mudou, antes mesmo de transarmos no consultório,
você parecia descontraído, mas contido, seu olhar desviava do meu
em alguns momentos.
— Está procurando justificativas para o que aconteceu, não faça
isso. Você sabe que sou geneticamente limitado em sentir isso, não
posso aprender a ligar uma parte do meu cérebro, nunca vou ser o
que você merece, coração.
— Essa é uma decisão que somente eu posso tomar.
— Para você é um sentimento, algo irracional e incontrolável, sei
disso, vejo como seu corpo reage a mim, a forma com que sua
respiração acelera, as pupilas dilatam, posso jurar que seu coração
está batendo mais rapidamente neste momento, seu rosto ficando
vermelho é a confirmação disso.
— Não estou…
— Use a parte racional do seu cérebro, Luana — agora falo
seriamente, preciso que me entenda, que escute o que tenho a dizer.
— Nunca vou amar você na mesma intensidade com que me ama, e
sim, eu sei que você me ama, esse sentimento tão puro e intenso
para você é algo que jamais sentirei, coração, quanto antes você
aceitar isso, mais rápido conseguirá seguir em frente.
Ela toma um gole do vinho enquanto absorve minhas palavras,
finalmente Luana está caindo na real, por mais que eu queira mentir
agora, falar que posso ser o que ela quiser, não farei isso com ela.
— Não sou um dos teus pacientes que você pode curar, nasci
dessa forma e vou morrer assim, não existe como mudar o
funcionamento do meu cérebro.
— Eu sei disso, e pode ter certeza que não tenho intenção em ser
sua psicóloga ou te tratar como um paciente — ela respira fundo e
relaxa os ombros —, para falar a verdade, se você fosse diferente,
não seria você.
— São só palavras, você não está pensando direito, ninguém em
sã consciência escolheria amar um psicopata.
— É porque o amor que sinto não é uma escolha, Yuri, mas
continuar me entregando a isso é.
— Você sairá magoada e decepcionada. — As palavras que saem
da minha boca são a verdade crua e dolorosa, mas que ela precisa
ouvir. — Vou usar você, manipular seus sentimentos, fazê-la pensar
que quer coisas que pode não querer, vou controlar sua vida e cada
aspecto do teu dia, porque é a única forma que consigo viver com
outra pessoa.
— Vai me machucar?
— Provavelmente, ninguém gosta de viver uma vida assim, Luana.
— Essa é uma decisão que somente eu posso tomar.
Depois de beber quase todo o vinho da sua taça, ela se inclina para
a frente, da mesma forma que fiz antes, coloca as mãos na mesa e
olha no fundo dos meus olhos.
— Por que você me chama de coração?
Que merda de pergunta é essa? Arregalo os olhos ao pensar na
primeira vez que o apelido surgiu em minha mente.
— Quando vi a sua foto no relatório, foi a primeira vez que senti
meu coração disparar — respondo sem pensar demais e novamente
tenho a mesma sensação daquele dia.
— Está disparado agora?
— Não entendo, Luana, por mais que você queira encontrar algum
sentimento em mim, é impossível.
— Então deixa que eu te explico, o amor é uma habilidade e não só
um sentimento, então só responde o que perguntei, você sente seu
coração disparado agora?
— Sim, caralho, eu sinto essa merda bater mais rápido — quase
grito ao confirmar em palavras o que está acontecendo em meu peito.
— E você está com medo? — ela provoca com a voz calma, o que
me faz perder o controle.
— SIM, LUANA, NÃO SABER O QUE É ISSO ME DEIXA COM
MEDO — grito e levanto da mesa rapidamente. — Meu corpo nunca
se comportou assim, nem quando meus pais morreram, ou quando o
padre estava entrando em meu quarto, até no momento em que
aquela monstrinha colocou a arma na minha cabeça esse órgão
maldito que bombeia sangue pelo meu corpo estava inalterado, mas
basta um olhar seu para o desgraçado acelerar.
— Isso é um sentimento, Yuri — ela aparece ao meu lado, no canto
do olho posso ver os homens se aproximarem da porta, mas já não
me importo com porra nenhuma.
Aproximo-me mais dela, nossos corpos quase se tocando, sinto
sua respiração acelerar, mas ela não se afasta, seus olhos castanhos
brilham quando ergo a mão e toco seu rosto, ainda lembro dos
hematomas, passo os dedos na pele macia, acaricio seu lábio com a
pequena cicatriz rosada, Luana abre a boca e inspira profundamente.
— Esta é minha versão verdadeira, Luana, eu não vou mudar, se
não me mandar embora agora, estarei do seu lado — sussurro em
seu ouvido, sinto o cheiro do shampoo de jasmim e roço meus lábios
no canto da sua boca. — Pensa nisso, quando estiver pronta, é só
bater no apartamento vizinho.
— Yuri, eu…
— Shii… — Pressiono delicadamente meu dedo em seus lábios. —
Não quero uma resposta agora, posso esperar o tempo que for
necessário, foram 32 anos até que finalmente encontrei um propósito,
não é agora que apressarei as coisas, se tenho uma qualidade
sequer, fora ser um Samurai Sarado, é a habilidade de esperar
pacientemente pelo que mais quero na vida.
Beijo sua testa por mais tempo do que o esperado, me afastar dela
é mais difícil do que imaginei, mas faço isso e saio sem olhar para
trás.
Luana tem uma escolha, devolvi o controle da sua vida e agora só
posso esperar.
Ele saiu e me deixou sozinha novamente, o local onde seus lábios
tocaram ainda queima, como se com um beijo Yuri marcasse minha
alma a fogo.
Estava pronta para mandá-lo embora, exigir que me deixe em paz e
suma da minha vida, sei que não deveria acreditar nele,
racionalmente é impossível que me ame, então porque parece tão
verdadeiro?
Porque não consigo duvidar das suas palavras, mesmo que dentro
de mim todos os meus instintos gritem para correr?
A coisa certa a fazer é me afastar, procurar outra pessoa para
trabalhar comigo e seguir a minha vida. Só que ele se importou a
ponto de ligar para cada um dos meus pacientes, mesmo os mais
sensíveis.
Yuri tomou conta do consultório, só não sei o porquê, e são muitas
dúvidas para uma pessoa só. Me jogo no sofá e me cubro com a
manta, desde que ele saiu voltei a sentir frio.
Encaro as chamas da lareira, escuto o estalar da madeira
queimando, o fogo consumindo cada parte do que um dia já foi uma
árvore.
Sinto-me como as cinzas que caem no fundo da lareira, um
amontoado frágil e sem vida de pequenas moléculas que, com um
sopro de ar, somem no vazio.
Não quero me sentir assim, voltar à solidão de antes, não depois de
ter alguém com quem me sentia queimar. Yuri foi o fogo e eu a
madeira, ambos dependentes um do outro para continuar vivo, mas
neste processo morremos lentamente, nos tornando cinzas levadas
pelo vento.
— Tudo bem com você, Luana? — A voz grossa e carinhosa de
Lucas me assusta e pulo no lugar, virando-me bruscamente para a
entrada. — Não queria te assustar, meus homens relataram que ele
chegou próximo demais.
— Sim, próximo demais — repito suas palavras sem responder à
pergunta.
— Gostaria de conversar? — O homem se aproxima e senta-se no
sofá em minha frente. — Ele fez alguma coisa?
— Disse que seu coração acelera quando me vê — falo
lentamente, pronunciando cada palavra com ênfase no coração.
— Acredita nele?
— Sim. — A confirmação sai antes que eu consiga pensar no
assunto. — Ele estava assustado.
— Com medo pela própria vida?
— Pelos sentimentos que não reconhece.
Lucas se escora no sofá e passa a mão na barba, vejo um sorriso
de canto se formar e seus olhos se iluminam, claramente lembrando
de algum momento.
— Ela provavelmente já te contou isso, mas eu disse que a amava
antes mesmo da nossa primeira vez — confirmo com a cabeça,
Daniele me falou sobre a noite do baile e o que fizeram nos tatames
da academia. — Depois de… você sabe, fingi estar bêbado para ficar
na mansão e passar a noite com ela.
— Ela me contou, não preciso saber dos detalhes íntimos.
— Daniele estava com tanto medo quando entrei em seu quarto
que não tive coragem de me aproximar, então ela perguntou como eu
conseguia ter certeza do que sentia, e naquele instante percebi que
os sentimentos, que para mim eram transparentes como a água,
Daniele via através de uma espessa camada de gelo.
— Ela não acreditava porque não tinha os mesmos sinais.
— Já conversamos sobre isso, minha mulher é especial.
— É suficiente para você? — Minha voz sai mais fraca e carente do
que previ.
— Muito mais que isso, quando ela finalmente teve coragem de
admitir o que sentia, foi verdadeiro e intenso, porque não tinha mais
dúvidas ou confusão, somente certeza.
— Como saber se é de verdade?
— Sabe a sensação de terror que nosso corpo produz quando ela
aparece? Aquela que é involuntária, fazendo os pelos da nuca
arrepiarem e o estômago contorcer? Seus sentidos ficam mais
vigilantes e sensíveis, isso vem de anos de evolução. É por este
instinto que os animais sobrevivem.
— Eu deveria correr…
— A questão é se você está contente em passar os poucos anos
que temos nessa terra somente sobrevivendo. Ou prefere arriscar e
viver algo que fará o medo se transformar em adrenalina?
Suas palavras fazem sentido, não respondo à pergunta, mas
acredito que Lucas não precisa de uma resposta.
Ficamos olhando para o fogo por um tempo, ele me faz companhia,
mas não força a conversa, é bom não estar só.
***
Um mês depois
Amanhã retorno à clínica, depois de mais de dois meses afastada.
Precisei encaminhar alguns pacientes mais críticos para meus
colegas, mas a maioria esperou por mim.
Admito que deveria ter tirado mais tempo depois que meus pais
morreram, ficar longe de tudo me fez bem, Amélia fez questão de me
levar para a casa de praia dos Corleone e, quando chegamos lá,
percebi o quanto precisava descansar.
Quando eles retornaram resolvi ficar por mais tempo, Daniele
deixou um time de seguranças comigo e me fez prometer que não
faria nenhuma gracinha.
Ainda estava frio, mas a serenidade do local me fez refrescar a
cabeça e pensar no que viria a seguir.
Voltei para casa ontem, Vader adorou a praia, ensinei a ele a andar
com a coleira e tudo, o gatinho já está maior e parou de morder
minhas mãos, mas ainda adora brincar e correr de um lado para o
outro, cheio de energia.
Pergunto-me porque nunca cogitei a ideia de ter um animal de
estimação antes, Vader é a melhor companhia que posso querer, isso
quando não está tentando roubar comida. Ele me dá amor
incondicional, dorme comigo e posso jurar que sente quando estou
triste.
Agora terá que se acostumar novamente com o apartamento,
Lucas confirmou que todas as câmeras foram retiradas, assim como
os pontos de escuta, o GPS do meu celular e do carro também foram
desativados.
Yuri monitorava todos os meus passos, ainda é assustador pensar
nisso, pior é saber que foi meu próprio pai quem instalou a maioria
das câmeras e deu acesso a ele.
Não vi meu vizinho desde que cheguei, nem tive notícias dele
durante minhas férias, escolhi assim, precisava ter certeza da minha
decisão, sem influências externas.
Então o momento da verdade chegou, tomei um banho relaxante
na banheira, escolhi meu melhor vestido social preto, de alcinhas,
comprido e com uma fenda na lateral direita, escovei o cabelo e fiz
uma maquiagem meio termo, olho gatinho e batom vermelho.
Coloquei o sapato de salto que só uso em ocasiões especiais e saí
de casa.
Os cinco passos que distanciam a minha porta da dele mais
parecem cem, usei o espaço para respirar fundo e tomar coragem
antes de tocar a campainha e aguardar.
— Você está aqui — Yuri fala com a voz grossa e firme ao abrir a
porta e fixar seu olhar no meu.
— Sim — respondo apreensiva, sinto meu coração explodir no
peito, sei que estou vermelha, mas ao ver que ele está vestindo seu
melhor terno cinza escuro, camisa azul clara e gravata azul escura,
sei que estava me esperando, — Você me deve um encontro.
Yuri franze a testa e solta o ar, então seus lábios se curvam em um
sorriso lindo, daqueles que chegam ao olhar, fazendo-o brilhar.
— O que significa isso, Luana? — Ele dá um passo em minha
direção, seu corpo a poucos centímetros do meu, consigo sentir o
cheiro de loção pós barba e do perfume amadeirado. — Preciso ouvir
da sua boca.
— Significa que quero conhecer o verdadeiro Yuri Saito, sem jogos
e manipulações, ou com o mínimo possível. — Respiro fundo e solto
as próximas palavras junto com o ar. — Quero você na minha vida.
— Você sabe que não posso prometer ser o melhor parceiro para
dividir a vida?
— Sim, eu sei.
— Provavelmente irei magoar você em algum momento — ele
continua falando com a voz fria que usa para tentar me intimidar com
sua verdadeira face.
— Estou ciente disso.
— Não sou uma boa pessoa, Luana, e não vou mudar por você.
Dessa vez só confirmo com a cabeça e deixo que continue a falar,
ele precisa ter certeza de que eu estou cem por cento nisso, que
reconheço e aceito sua verdadeira personalidade, quem ele realmente
é.
— Não posso retribuir seus sentimentos, só posso te prometer uma
coisa — sua mão chega a milímetros do meu rosto, sinto o calor e a
eletricidade do seu toque sem que ele me toque —, enquanto você for
meu propósito para viver, eu vou estar aqui, do seu lado, e ninguém
vai encostar no que é meu. Isso é o suficiente para você?
Esta é a questão principal, viver uma vida com ele não é a mesma
coisa do que com uma pessoa normal, pensei muito sobre esse
assunto durante nosso afastamento, mesmo assim continuo sem uma
resposta.
— Não tenho uma solução para isso, mas a única coisa de que
tenho certeza é que neste momento quero você na minha vida. —
Inclino meu rosto para que seus dedos finalmente toquem minha pele.
— Tenho 42 anos, já passei por um casamento que achei que seria
meu final feliz, tive relacionamentos em que jurei que a pessoa era
minha alma gêmea, mas nada disso realmente existe, Yuri.
— Tem certeza?
— Para uma relação dar certo é preciso muito mais do que essa
baboseira de destino e almas gêmeas, o mais importante é saber
quando se é feliz com a outra pessoa e trabalhar nas dificuldades —
explico o que tenho entalado na garganta. — Por algum motivo
distorcido, me sinto bem ao seu lado, quando sei que está próximo
fico leve, quando me toca todo o meu corpo responde e pega fogo,
como se você fosse a energia que preciso para viver.
— E quando tudo isso virar rotina, ainda assim serei o suficiente?
— Então só precisaremos agitar as coisas. — Pego sua mão e dou
um beijo na palma. — Como qualquer casal normal, quero viajar com
você, conhecer o mundo lá fora, experimentar os melhores
restaurantes, fazer os passeios mais perigosos e viver aventuras ao
seu lado.
— Estou sempre pronto para uma nova aventura, ainda mais se for
com você.
— Não sei como será nosso futuro. Se em algum momento o
sofrimento for maior que a felicidade, então tudo chegará ao fim, mas
até lá quero você na minha vida.
— Não vou a lugar algum — ele responde e passa as mãos na
minha cintura, aproximando nossos corpos até que meus seios
encostam em seu peito e preciso erguer a cabeça para fitar os olhos
escuros que me encaram intensamente. — Sou seu até que você não
me queira mais.
Consigo sentir seu coração bater rapidamente contra meu peito,
uso os centímetros a mais do salto para me impulsionar e colar minha
boca à sua. Beijo seus lábios macios sem pressa, me delicio com o
toque da sua língua pedindo passagem para tocar na minha, em uma
provocação deliciosa, enquanto suas mãos exploram meu corpo,
acaricio os cabelos da sua nuca e o puxo mais próximo.
Não é um beijo desesperado. Mesmo que eu tenha sentido
saudade, é diferente, é como se nossas bocas estivessem se
conectando pela primeira vez, mas com uma sensação de
pertencimento.
Estou em casa novamente, em seus braços torno a me sentir
quente, a eletricidade circula pelo meu corpo e parece que voltei a
viver.
— Vem. — Yuri encosta a testa na minha e separa nossas bocas.
— Nosso encontro já foi adiado tempo demais.
— Como você sabia? — questiono e acaricio seu braço.
— Estou preparado desde o momento em que soube que estava
em casa. — Yuri sorri ainda mais e sinto minha calcinha ficar
molhada. — Posso ter tomado mais de um banho e aguardado ao
lado da porta por um tempo, mas valeu a pena, você está
maravilhosa, coração.
A forma que sua voz engrossa ao falar o apelido carinhoso é tão
verdadeira que preciso conter uma lágrima.
— Você também não está nada mal, Samurai Sarado — respondo
e arranco uma gargalhada dele. — Entretanto precisamos estabelecer
limites de agora em diante.
— Farei o que você quiser, contanto que esteja em segurança.
Mostro meu braço e toco o pingente na pulseira que os Corleone
me entregaram no meu aniversário.
— O pingente de borboleta é um localizador, foi assim que eles me
encontraram, vou te dar acesso ao sinal porque sei que precisa disso,
mas nada mais de câmeras dentro do apartamento ou do consultório
— estabeleço meus limites. Pensei muito sobre isso, e Daniele foi
enfática ao determinar que a partir de agora terei que tomar medidas
de segurança extras.
Infelizmente o homem que me sequestrou conseguiu enviar uma
parte dos dados antes de ser interceptado, Daniele não me falou se
eles localizaram o mandante do sequestro ou o que aconteceu depois,
são assuntos internos da Família Genovese e confio nela para tratar
deles.
— Também ganhei um destes. — Ele puxa uma correntinha de
prata com um pingente em formato de larva. — Aparentemente não
sou evoluído o suficiente para ganhar uma borboleta, mas essa foi
uma das condições de Daniele para me libertar, eles têm controle dos
meus passos agora e estão de olho em mim. — Yuri pisca para mim.
— Bom, então onde o senhor planeja me levar? — Pego sua mão e
entrelaço nossos dedos, o olhar dele passa do meu rosto para nossas
mãos unidas e ele sorri enquanto fecha a porta com a outra mão.
— Temos uma reserva no melhor restaurante da cidade, cortesia de
Lucas Costello. — E ele pisca para mim e caminhamos lado a lado até
o elevador.
Sinto seus olhos em mim, mas parece certo, o calor da sua mão na
minha me dá a certeza de que, apesar do frio na barriga que teima em
continuar comigo, o calor no coração é dominante.
— Você tem certeza disso? — Yuri questiona uma última vez.
— Por enquanto sim — respondo com sinceridade. — Só vivemos
o presente, o passado não volta mais e o futuro é uma utopia, por isso
escolho agarrar a felicidade momentânea do presente, sem pensar no
futuro.
— Se isso mudar algum dia…
— Então é um problema para depois, no momento só o que importa
é o presente.
É a verdade, cansei de viver na expectativa do que pode acontecer,
a vida é cheia de reviravoltas e o futuro pode nem existir, quem
garante que amanhã ainda estarei viva?
Só quero desfrutar de como me sinto agora, com o homem que
amo ao meu lado e viver essa história, se sair machucada em algum
momento, pelo menos terei a certeza de que vivi intensamente a
minha felicidade.
4 meses depois
A rotina voltou ao normal e nunca pensei que me sentiria tão
relaxado assim, mas por incrível que pareça, me sinto animado com
cada dia.
Claro que Luana é responsável pela maior parte desta felicidade,
depois de tentarmos ficar separados no começo, mas falhar
miseravelmente ao dormirmos abraçados todas as noites, resolvemos
morar juntos e já planejamos uma pequena obra para unir os dois
apartamentos.
Acordar com ela fazendo meu coração acelerar e meu pau latejar
todos os dias é excitante. Luana é linda de manhã, com o cabelo
bagunçado e a cara amassada, durante o dia é toda profissional, em
seus conjuntos sociais, e à noite cansada e entregue aos meus
cuidados.
Eu amo essa mulher, ou o que quer que seja esse sentimento que
faz meu coração acelerar. É difícil policiar meu próprio comportamento
e ter que me lembrar constantemente a pensar no que faz bem a ela,
mas preciso disso para não a magoar.
Espero que seja como andar de bicicleta, uma vez que você
aprende jamais esquece, mas ficar me perguntando “o que Luana vai
sentir se eu fizer tal coisa?” toda hora é cansativo.
Falando na minha linda psicóloga, ela está estranha há uns dias, já.
Desde o atentado os Corleone nos impingiram uma escolta particular,
dois homens ficam de vigia quando saímos de casa e durante o dia no
consultório.
Se precisarmos sair à noite, algum homem da Família aparece para
fazer a segurança, não me importo com isso, se é para manter Luana
a salvo, e estamos quase sempre juntos.
Fora alguns almoços com Amélia e Rita, ela não sai muito sozinha,
e foi isso que me pegou de surpresa quando disse que precisava
comprar algumas coisas no shopping, mas recusou minha companhia.
Juro que quase a segui da mesma forma, mas o olhar mortal que
me deu antes de sair do consultório ao meio-dia foi um aviso de que
ela sabia o que eu estava pensando.
Como tenho acesso ao seu localizador da pulseira, mantive um
olho à distância.
Luana fez exatamente o que falou, foi ao shopping, ficou menos de
uma hora lá, e retornou com um maldito sorriso misterioso no rosto.
Até estou tentando foder seu segredo para fora quando a peguei
por trás dentro do banheiro para uma rapidinha, faltam apenas vinte
minutos para o primeiro paciente chegar, mas ela não dá o braço a
torcer, me deixa louco com a cara debochada enquanto meto com
força e arranco gemidos contidos da mulher escorada na pia.
— Sabe o que não é uma boa ideia, coração? — sussurro em seu
ouvido enquanto agarro seus peitos e ela empina ainda mais a bunda
gostosa, rebolando no meu pau. — Manter segredinhos de um
psicopata.
— Eu sei, meu amor. — Ela sorri enquanto geme, suas mãos estão
brancas da força com que se segura na borda da pia. — Mas se você
está me fodendo assim para me fazer falar, acho que vou manter o
mistério por mais alguns dias.
Maldita provocadora!
— Estou tentando ser um homem bom, coração. — Acaricio sua
bunda e dou um tapa com força suficiente para deixar vermelha. —
Mas você está deixando o processo muito difícil.
— Yuri, caralho. — Luana se descontrola e vejo seus olhos
fechados no reflexo do espelho em nossa frente, a boca aberta e os
cabelos caídos no rosto quase me fazem gozar. — Você vai saber
amanhã — ela fala e levo minha mão até seu clitóris, sinto seu corpo
todo tremer com o meu toque e ela rebola ainda mais, empurrando a
bunda contra meu pau.
— Não adianta, eu vou te foder até você me contar o que está
escondendo de mim. — Agarro seus cabelos com a outra mão e puxo
sua cabeça, fazendo-a arquear o corpo ainda mais, beijo seu pescoço
enquanto trabalho em seu clitóris, sinto a boceta molhada de Luana
apertar ainda mais meu pau e sei que ela está quase. — E se eu te
proibir de gozar?
Falo brincando, não conseguiria parar agora nem que alguém
entrasse aqui, e a maldita provocadora sabe disso, observo o sorriso
safado em seus lábios e o olhar matador encontra o meu no espelho.
— Eu terminaria sozinha. — Luana morde o lábio inferior para
prender um gemido. — Agora me faz gozar logo, amor, porque nós
dois sabemos que você quer isso tanto quanto eu.
Não respondo, soco meu pau ainda mais rápido, os sons que
nossos corpos produzem ao se encontrar é um afrodisíaco, quando
sinto que ela se contrai em minha mão, mordo o pescoço delicado e
falo as palavras mágicas.
— Goza para mim, coração.
Sou presenteado com uma Luana entregue ao prazer que lhe
proporciono, ela já não controla mais os gemidos e meu nome escapa
dos seus lábios enquanto perde as forças do corpo, sinto sua boceta
ainda mais molhada e me perco dentro dela, gozando com força na
camisinha.
Preciso segurá-la com as duas mãos contra mim, ainda mantendo
nossos corpos conectados, as duas respirações ofegantes são os
únicos sons no banheiro.
— O que você fez comigo, coração? — questiono enquanto beijo a
pele suada do seu pescoço.
— Eu te amo — Luana responde e passa a mão carinhosamente
em meu rosto. — Não precisa se preocupar, é uma surpresa boa.
— Quando?
— Á noite — ela responde com a voz carinhosa. — Agora vamos,
tenho cinco minutos para arrumar o estrago que você fez e desfazer
minha cara de bem fodida.
Não controlo a gargalhada, Luana tem um senso de humor que
consegue me surpreender mais a cada dia, especialmente com a
liberdade que fala sobre sexo, ela é uma mulher bem resolvida e sabe
do que gosta na cama.
— Por mim pode ficar assim mesmo, não me importo se mundo
todo souber que minha mulher está satisfeita.
— Sua mulher, é? — vejo o deboche estampado em seu rosto.
— Não combina, né? Até tentei, mas você é selvagem demais para
o título de pertencimento. — Sorrio enquanto saio dela, descarto o
preservativo e começo a me ajeitar.
— Também acho que não, ainda prefiro coração. — Luana pisca e
sobe a calcinha. — Mas você é meu amor.
— E isso não soa estranho ou errado — constato e a abraço por
trás. — Sou seu psicopata particular, coração.
O restante do dia foi normal, Luana atendeu seus pacientes
enquanto desempenhei minhas funções como seu secretário, só que
não consegui tirar da minha cabeça o fato de que ela está
escondendo algo.
Chegamos em casa e somos recebidos por Vader, que mia
descontroladamente em nossos pés, Luana comprou um comedouro
automático para ele e controla a quantidade de ração de forma
remota.
O negócio tem até uma câmera que pode ser acessada pelo
celular. Quando apontei a familiaridade naquilo, recebi um olhar
matador e não falei mais nada.
— Já chegamos, querido. — Luana entra primeiro e pega o gato no
colo, dando a atenção que ele exige. — Acho que ele se sente
sozinho — fala para mim. — Estava pesquisando e os sites sugerem
ter sempre dois gatos, assim eles fazem companhia um ao outro, já
que passamos a maior parte do dia fora.
— Você pode ter quantos gatos quiser, coração — respondo com
sinceridade. Honestamente, não vejo a necessidade disso, mas se é
algo que Luana quer, ela vai ter. — Há muitos abrigos de animais que
estão lotados, posso procurar amanhã alguns contatos.
— Sério? — Ela parece uma criança feliz, até seus olhos brilham
enquanto aperta ainda mais o gato em seus braços.
— Sim, agora preciso de um banho e comida, o que vamos fazer
para o jantar? — questiono enquanto vou até o quarto e começo a me
preparar para uma boa chuveirada.
— Vou pedir alguma coisa, vai indo na frente que eu logo te
alcanço.
Não discuto, apesar de preferir comida caseira, o dia foi cansativo e
não estou com muita energia para passar uma hora de pé preparando
algo.
A água quente relaxa meu corpo e sinto meus olhos pesados,
aparentemente o sexo selvagem do meio dia consumiu minhas
energias.
Nem percebo que Luana não se juntou a mim até que chego ao
quarto com a toalha enrolada na cintura, vejo uma caixa rodeada de
pétalas de rosas em cima da cama e percebo que as luzes estão mais
baixas.
Então meu olhar é atraído para a porta, onde a mulher mais sexy
desse mundo está escorada, um sorriso safado no rosto e no corpo o
sutiã preto de renda e uma cinta de couro preto, que serve de suporte
para um pau de borracha vermelha.
— Feliz aniversário, meu amor. — A maldita provocadora desliza a
mão direita pelo peito, acariciando um mamilo, desce pela barriga e
segura o vibrador. — Gostou do seu presente?
Só então lembro que é meu aniversário, ela deve ter visto nos
documentos do orfanato, não costumo comemorar na data certa,
geralmente uso uma data diferente que me traga algum benefício.
— Não sabia que você curtia uma inversão de papéis — respondo
e passo a língua nos meus lábios, já sinto meu pau duro contra a
toalha e vejo que o olhar de Luana vai direto para ele.
— Eu gosto de dar prazer tanto quanto receber, isso se você quiser,
é claro — já conversamos sobre sexo diversas vezes neste tempo em
que estamos juntos, Luana sabe que eu gosto de penetração anal,
para mim qualquer coisa que me dê prazer é bem-vinda — Não sabia
o que te dar de presente, então lembrei de uma coisinha que ganhei
no meu aniversário, de uma pessoa anônima, e tive uma grande ideia.
— Você bem que aproveitou seu presente — provoco e vejo seu
rosto ruborizar. — Inclusive gozou chamando meu nome.
— Será que meu subconsciente já sabia quem era o remetente?
— Acho que foram as fotos sem camisa do meu Instagram que
fizeram a mágica acontecer.
— Safado. — Luana caminha até mim calmamente. — Acho que
você também merece ter seu próprio vibrador, e eu quero muito comer
esse cuzinho e te ouvir gritar meu nome.
— Oh, coração, ouvindo você falar assim não tenho certeza se o
presente é para mim ou para você. — Tiro a toalha da cintura e deixo
cair aos meus pés, ficando completamente nu e de pau duro para ela.
— Independente disso, faça o que quiser comigo, sou seu de corpo e
alma.
— Eu amo quando você se entrega assim. — Luana passa a mão
pelo meu peito e desce delicadamente até chegar na base do meu
pau, então ela acaricia as bolas e fica na ponta dos pés. — Hoje vou
saber qual é o gosto de Yuri com sorvete de baunilha.
Sua mão habilidosa passa pela cabeça sensível do meu pau e não
contenho um gemido quando os dedos espalham a umidade do prégozo. Luana lambe o lábio e me encara fixamente, avaliando cada
reação minha ao seu toque.
— Não vejo a hora de saber qual será meu presente de Natal —
provoco antes de tomar a sua boca, mordo o lábio que antes sua
língua umedeceu e solto um rosnado ao sentir o gosto doce e
delicioso de Luana. — Para cada vez que você me fizer gozar hoje, te
concedo três orgasmos amanhã.
— Oh, isso parece um desafio.
— Pode ter certeza disso.
Luana sorri e me empurra de costas na cama, a caixa ao meu lado
guarda um pote de sorvete com uma colher, já preparados para o
banquete.
Ela pega uma colherada do doce gelado e coloca na minha boca,
fazendo-me provar um pouco, antes de levar o restante aos lábios e
lamber o metal frio.
Então se ajoelha e passa a língua gelada da base do meu pau até
a ponta, me fazendo tremer com a temperatura, até que coloca toda a
minha extensão na boca e começa a chupar, esquentando
novamente.
— Como eu imaginei, Yuri combina muito bem com baunilha.
Seus olhos castanhos me encaram intensamente, enquanto as
mãos acariciam minhas bolas em uma provocação dupla, Luana pega
um tubo de lubrificante que não sei de onde ela tirou, passa nos
dedos e lambuza a entrada do meu ânus.
As sensações combinadas entre sua boca chupando meu pau e o
dedo provocante me fazem murmurar de prazer, quando escuto seu
gemido quase gozo na sua boca, mas ela percebe e diminui a
velocidade dos movimentos.
— Relaxa, meu amor — pede com aquela voz grossa de tesão. —
Você não tem noção do quanto estou molhada só de te ver tão
entregue.
— Caralho, coração.
— Agora coloca os pés em cima da cama e abre bem as pernas
para mim, mas fica na beiradinha. — Faço o que ela pede e sinto a
pontinha do seu dedo entrando e saindo, então ela volta a rodear o
buraco apertado, com a outra mão Luana me masturba lentamente. —
Bom garoto.
Sinto seu dedo entrar de novo, e logo o outro acompanha, me
alargando aos poucos enquanto meu pau pulsa em sua mão, ela sabe
o que está fazendo, seu olhar não desvia do meu em momento algum,
então ela coloca o terceiro dedo e sinto meu corpo retrair.
Luana percebe e para até que relaxo, só então ela volta a me
penetrar calmamente, preparando o lugar para receber o vibrador.
— Você está pronto, meu amor? — ela pergunta e só consigo
acenar uma confirmação com a cabeça, vejo o sorriso confiante em
seu rosto, ela passa mais lubrificante na minha entrada e no vibrador.
Escuto o som baixinho do consolo antes de senti-lo, a vibração é
diferente dos seus dedos, mais intensa e constante, então ela
empurra e sinto a pontinha entrando, a dor me faz retrair os músculos
por um momento, até me acostumar e relaxar, então Luana entra mais
um pouco e recua, sem tirar tudo, até que estou distendido o
suficiente para sentir somente prazer.
— Mais forte, coração — solto entre gemidos e ela começa a se
mover mais rápido. — Fode o meu cu da mesma forma que fodeu a
mente desse psicopata que é todinho seu.
— Com o maior prazer — responde e volta a me masturbar com a
mão firme enquanto me fode com o vibrador, as sensações são
intensas demais e agarro o lençol, seguro o máximo que consigo, mas
quando Luana chama meu nome, liberto meu prazer e gozo
intensamente em sua mão, ela tira tudo de mim, me fazendo gritar
enquanto ordenha meu pau até que desabo no colchão.
Ela sai de mim lentamente e abaixa minhas pernas, não tenho
forças para nada enquanto tento recuperar o fôlego. Arrasto-me para
o centro da cama e assisto enquanto ela pega uma toalha no banheiro
e vem me limpar, depois tira a cinta e deita do meu lado.
Luana acaricia meu cabelo e planta beijos delicados pelo meu
rosto, seus gestos de carinho e cuidado fazem meu coração acelerar
como só ela consegue fazer.
— Eu te amo, coração — confesso ainda com os olhos fechados
—, de uma forma completamente deturpada e destrutiva, meu
coração só responde a você.
— Eu sei, prometo cuidar muito bem dele. — Seus lábios
encontram os meus e selam a promessa das palavras.
Como eu sou dela, sei que Luana também é minha.
Minha para perseguir, minha para proteger, minha para amar!
Fim.

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