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Ele Me Reivindicou2.463Z

Ele Me Reivindicou 2

ISABELLE Justo quando eu estava começando a confiar em meu marido, ele me traiu. Justo quando eu pensei que estava me apaixonando, ele me mostrou a fera que ele realmente é. Eu entendo sua sede de vingança. Mas eu não quero jogar esse jogo de peão e mestre de marionetes. Não importa o quanto suas mãos façam meu coração acelerar e meu corpo anseie pelo toque do diabo, eu não vou desistir. Eu amo a filha dele. Mas não posso me deixar apaixonar pelo pai dela. JERICHO Eu tenho exatamente o que eu quero. Vingança. Em breve tudo o que os Bishops têm será meu. Mas vai me custar mais do que eu negociei. Isabelle Bishop me odeia. Como ela deveria. Eu sei o que sou. E agora ela também. Mas me apaixonar por minha esposa nunca fez parte dos meus planos.

CAPÍTULO UM
JERICHO
— O que você fez? — Isabelle sibila. Ela está nua, de pé batendo
pequenos punhos no meu peito. Ela não tem energia, no entanto. Sua força
é destruída por dias de não ser capaz de manter qualquer comida no
estômago e provavelmente semanas de frustração.
Ao olhar para ela agora, consegui o que queria. Pelo menos os
primórdios. Uma Bishop em minhas garras. Fraca a ponto de mal conseguir
ficar de pé. Meu bebê na barriga dela.
Meu futuro deve ser brilhante. Estou a caminho de enterrar Carlton
Bishop. Mas não parece muito brilhante agora. Na verdade, não sinto nada
além de uma escuridão assustadora quando a pego em meus braços
tentando não machucá-la. Para não machucá-la.
Do que eu acusei meu irmão, sua fraqueza quando se trata do
sofrimento deste Bishop em particular, eu me tornei tão fraco? Ela me
cansou tanto quanto eu a cansei?
— O que está acontecendo? — vem uma vozinha do corredor.
— Tire ela daqui! — Eu grito para quem está ouvindo. — Tire
Angelique daqui! — Ela não vai testemunhar isso. Não vou permitir que ela
veja Isabelle nesse estado. Veja-me neste estado. Ela não pode saber o que
eu fiz.
A voz calmante de minha mãe vem sobre as acusações de Isabelle e
um momento depois ouço a porta se fechar. Minha mãe foi quem me
alertou para o ‘incomodo’ de Isabelle. Ela sabia, tenho certeza, que não era
nenhum incomodo.
— Deite-a. Vou dar a ela algo para relaxá-la. — diz o Dr. Barnes.
— Tire suas mãos de mim! — Isabelle protesta enquanto eu enrolo
uma toalha em volta dela, levanto-a, embalando-a contra o meu peito. —
Deixe-me ir seu bastardo! Seu mentiroso de merda!
— Eu nunca menti para você. — eu esclareço calmamente enquanto a
carrego para a cama. Ela luta. Ela ainda não sabe que eu não vou deixá-la ir?
Especialmente agora. Mas sua luta não importa muito. Ela só faz com que a
toalha caia no chão.
Dr. Barnes puxa o cobertor para trás, mas eu balanço minha cabeça. —
Eu a quero na minha cama. — digo a ele e deixo que ele me siga pela porta
de conexão do meu quarto.
— Não! Deixe-me ir! — Ela está meio soluçando, meio lutando agora.
— Não, Isabelle. — eu digo, a voz baixa e firme. — Eu nunca vou
deixar você ir. — Eu a deito e sento ao lado dela, mantendo seus dois pulsos
em uma das minhas mãos com pressão suficiente sobre ela para mantê-la
no colchão. — Pare de lutar comigo.
— Eu nunca vou parar de lutar com você. — ela grita, sua voz travando
enquanto lágrimas escorrem de seus olhos. Seu olhar se move além de mim
e seu pânico é renovado. Um olhar por cima do ombro me diz que é o Dr.
Barnes se aproximando com uma agulha.
— Não vai machucá-la? — Eu pergunto.
— Não. Se houver um bebê, isso não machucará a mãe ou a criança.
Eu concordo.
— Não! Por favor! — Isabelle se debate, chutando as pernas. Eu tenho
os braços dela presos ao peito. Eu a viro de lado e prendo suas pernas com
meu braço livre enquanto o Dr. Barnes esfrega uma preparação com álcool
em seu quadril e depois enfia a agulha.
Ela choraminga enquanto ele faz isso, mas o efeito é quase
instantâneo. Sinto suas pernas e braços ficarem fracos, seu corpo ficar mole.
Eu afrouxo meu aperto e a rolo de costas. Quando eu a solto, seus
membros relaxam. Ela tenta uma vez me dar um tapa, mas não funciona. Ela
mal consegue levantar o braço alguns centímetros.
— Por que você fez isso? — ela pergunta, suas palavras começando a
se arrastar enquanto ela luta para manter os olhos abertos. — Por que você
faria isso comigo?
A culpa me agarra de uma forma que nunca aconteceu antes. Não
quando Kimberly morreu. Não quando eu levei Isabelle. Não desde então e
nunca antes. Isso, o que estou fazendo agora, estou fazendo ativamente.
Eu estou fazendo o estrago.
Causando o mal.
Estou conscientemente destruindo esta vida.
É uma escolha.
Você sempre tem uma escolha. Tudo na vida é uma escolha. Minhas
próprias palavras me assombram. Quando eu falei com ela, elas estavam
sobre algo tão inconsequente. Agora isso? É o contrário.
Eu engulo a culpa. Endureço meu coração. Eu me obrigo a pensar em
Kimberly. Como ela morreu em meus braços. Mas algo mudou. Alguma coisa
mudou. E tudo que vejo é o rosto de Isabelle. Ouça o desespero dela. A
derrota em sua voz.
— Por quê? — ela pergunta fracamente uma última vez, fechando os
olhos enquanto sua cabeça pende para o lado.
Estou salvo de responder por que ela se foi agora. Dormindo. Eu puxo
os cobertores sobre ela e escovo o cabelo molhado de seu rosto. Eu olho
para ela aqui na minha cama. Pequena e vulnerável. Tão vulnerável. E
inocente.
Eu sei o monstro que sou. Sempre soube disso. Eu simplesmente
nunca me importei. Até agora.
— Sinto muito. — eu digo tão baixinho que ninguém poderia ter me
ouvido.
Dr. Barnes limpa a garganta. Eu me recomponho e fico de pé. Puxo um
segundo cobertor para seu queixo.
— Ela vai sonhar? — Pergunto ao médico sem tirar os olhos dela.
— Perdão?
Eu me viro para o homem que eu acho que está em seus quarenta e
tantos anos. Ele é um dos novos médicos da Sociedade. Ele vai fazer
exatamente o que eu preciso que ele faça. Eu penso sobre isso. Sobre como
eu planejei cada detalhe disso.
— Sonho. Ela vai sonhar? — Eu pergunto, meu tom mais curto do que
eu pretendia.
— Não.
— Bom. — Porque eu não a quero presa naquele inferno que ela
sonhou na noite do nosso casamento.
Eu respiro fundo. — Faça o que você precisa fazer. Preciso da
confirmação de que ela está grávida. Quanto tempo. Ela está doente.
Perdeu alguns quilos. — Como eu não tinha visto como ela estava ficando
magra? — Ela vai precisar de algo para que ela possa manter a comida no
estômago. E vitaminas. Ela é vegetariana. — acrescento, me surpreendendo
porque a única coisa que deveria importar deveria ser o bebê. — O que você
puder dar a ela agora, faça.
Ele coloca a mão no meu ombro. — Ela vai ficar bem. Vá esperar lá
fora enquanto eu cuido de sua esposa.
Eu balanço minha cabeça. — Vou ficar.
— É melhor…
— Vou ficar.
Ele fecha a boca e assente. Tenho certeza de que qualquer médico que
não fosse empregado da Sociedade questionaria o que diabos estava
acontecendo, mas Barnes não faria isso. Outro benefício do meu status
dentro da Sociedade. Obrigado pai.
Pai. Porra. Preciso pegar um avião para a Áustria amanhã. Não posso
deixá-la assim. Não até que eu tenha certeza que ela está bem. Não até que
eu tenha certeza de que ela não vai machucar a si mesma ou ao bebê.
Embora ela não vá fazer o último. Eu sei o suficiente sobre Isabelle para
saber que ela não é capaz disso.
Sento-me na poltrona e observo o médico fazer seu trabalho. Ele tira
vários frascos de sangue e eu quero perguntar se ele deve ir com calma. Ela
é tão pequena. Ele a examina, tomando o cuidado de cobri-la para que ela
nunca fique totalmente exposta. Depois do que parece uma eternidade, ele
lhe dá uma dose de vitaminas e coloca dois recipientes na mesa de
cabeceira.
Eu fico de pé.
— Vou escrever uma receita que você pode reabastecer quando
precisar, mas tente as vitaminas primeiro. Elas devem ajudar com a náusea.
Se ela ainda não conseguir manter nada no estômago, você pode dar isso a
ela.
— Eles são seguros para ela e o bebê?
— Sim. Embora a náusea deva desaparecer sozinha com o tempo. Vou
pedir ao meu consultório por e-mail alguns panfletos. Ela está bem magra.
Olho para a forma leve sob os cobertores e aceno com a cabeça. É por
causa da gravidez ou eu já tinha começado o processo de derrubá-la no
momento em que a trouxe para esta casa e a fiz minha prisioneira?
— Vamos ficar de olho nela. Você apenas certifique-se de dar a ela o
que ela pode suportar. Alimentos simples. Muitos lanches em vez de
grandes refeições.
— Ok.
— Eu gostaria de vê-la em meu consultório em breve. Essa semana.
Eu concordo. — Quando você saberá os resultados do teste de
gravidez?
— Em poucas horas. Eu vou deixar você saber assim que eu ouvir.
— Obrigado, Dr. Barnes.
— Claro, Sr. St. James.
Uma batida vem na porta então. É minha mãe. Ela olha para Isabelle e
depois para o médico e para mim.
— Você pode levar o Dr. Barnes para fora? — Eu pergunto a ela. —
Gostaria de ficar com minha esposa. — Minha esposa. Como soa estranho.
Quão fora de curso a vida se foi em cinco anos.
— Claro, Jericho. Por aqui, Dr. Barnes.
Eles saem e a porta se fecha atrás deles. Quando isso acontece, vou
até o quarto de Isabelle para pegar uma calcinha e debaixo do travesseiro,
encontro aquela camiseta surrada que ela gosta de usar para dormir. Eu
cuidadosamente a visto antes de colocá-la de volta para baixo. Percebo
como seus pés estão frios, então volto para o quarto e encontro um par de
meias felpudas. Eu coloco isso também antes de aconchegá-la. Sua
respiração está suave e calma, tão oposta a como ela estava há pouco
tempo. Eu olho para ela por um longo, longo minuto antes de me inclinar
para beijar sua testa.
A porta se abre no momento em que estou fazendo isso. Eu educo
minhas feições e me viro, esperando encontrar minha mãe. Mas não é ela. É
Angelique. Eu posso ver que ela está chorando e seus olhos se arregalam
quando param em Isabelle.
— Ela está machucada? — ela pergunta, um soluço quebrando a frase,
seu lábio tremendo.
Eu vou até ela, levantando-a para carregá-la para sua cama. — Não,
ela vai ficar bem. Ela simplesmente não está se sentindo bem, então o Dr.
Barnes deu a ela algo para ajudá-la a dormir.
— Quando ela vai acordar?
— Daqui a pouco, querida. — eu digo, afastando o cabelo do rosto. Ela
herdou os cachos selvagens de Kimberly.
— Eu vi você beijando ela. — Ela sorri, mas seus olhos ainda estão
tristes.
Eu não digo nada, mas sorrio de volta.
Ela toca minha bochecha. — Você está sangrando, papai.
Olho para seu pequeno polegar, vejo a mancha vermelha. Eu limpo o
dedo dela. Isabelle deve ter me arranhado quando estava lutando.
— Não é nada. Apenas me cortei me barbeando. — Eu assisto
Angelique. — Ela não é sua mãe. Você sabe disso certo?
Seus olhos voam para Isabelle novamente e ela assente. — Por que eu
não tenho uma mamãe?
Porra.
Ela já perguntou isso antes e nunca fica mais fácil.
Porque o irmão de Isabelle a assassinou. É por isso.
— Sua mãe morreu antes de você nascer, querida. Eu sei que ela
estava triste por não estar com você. Ela te amava muito. Posso dizer-lhe
isso. Ela estava tão animada para conhecê-la.
— Mas ela não podia. — Ela sabe essas respostas. Essa conversa nunca
muda.
Eu concordo. Minha garganta está fechando. É o olhar em seus olhos.
Sua mente jovem incapaz de processar. Para entender algo tão antinatural.
Tão errado.
— Por que ela morreu?
— Eu não sei. — eu minto. — Vamos consertar seu livro, ok? Eu sei
que Isabelle gostaria de fazer isso, mas já que ela não pode, eu vou te
ajudar. Se você me deixar. — acrescento.
— Por que você estava lutando? — ela pergunta, olhos tão parecidos
com os meus que é como se eles enxergassem direto no meu âmago. Ela vê
o monstro lá?
— Como ela está? — minha mãe pergunta da porta me poupando de
ter que responder.
— Ela vai ficar bem.
Minha mãe me olha um pouco mais, mas sabe que não deve fazer a
pergunta que todos queremos que seja confirmada. Isabelle está grávida?
Viro-me para Angelique novamente. — O que você disse? Vamos
pegar o seu livro e vamos consertá-lo. Dessa forma, quando Isabelle acordar,
podemos mostrar a ela.
— Você vai ler a história para mim depois?
— Sim.
— Ok. Mas deixe a porta aberta no caso de Belle precisar de nós. —
Angelique diz enquanto eu a carrego para o corredor, deixando a porta
aberta para o caso.
CAPÍTULO DOIS
ISABELLE
Acordo lentamente com a visão embaçada enquanto absorvo a luz
filtrada por cortinas fechadas. Na mesinha de cabeceira está um livro. Não
consigo ler o título na lombada. Está muito vincado. Há uma jaqueta
pendurada nas costas de uma cadeira. Atrás dela há uma porta.
A porta que liga o meu quarto ao do meu marido.
Está aberta. Minha toalha está no chão. E eu me lembro do por que,
assim que meu olhar pousa no homem sentado do outro lado da sala na
grande poltrona de couro.
Jericho St. James.
Meu marido.
Meu diabo.
O mentiroso.
Eu mudo para sentar e ele coloca seu material de leitura de lado.
Percebo que é meu caderno.
— O que você está fazendo com isso? — Eu pergunto, embora existam
cerca de mil perguntas mais importantes que precisam ser respondidas.
Ele caminha até mim. — Você escreve sua própria música. — diz ele.
Não é uma pergunta. — Por que você não está na faculdade?
— Eu sou lenta, lembra?
— É bom. — Ele enfia as mãos nos bolsos e vejo a linha de
preocupação entre suas sobrancelhas. Ele parece diferente do que era
antes. É culpa que vejo em suas feições? Em sua postura?
Não. Um homem como Jericho St. James não sentiria culpa. Não está
no DNA dele.
— Minha música não é da sua conta. — digo a ele.
— Eu gostaria de ouvir você tocar.
O cobertor cai quando me sento. Percebo que estou vestindo a
camiseta de Christian.
Jericho se move para ajustar os travesseiros atrás das minhas costas e
embora eu gostasse de dizer a ele para se foder, eu não faço. Preciso
conservar minhas forças. Vou precisar delas se o que suspeito for verdade.
— Como você está se sentindo? — ele pergunta.
Eu olho para ele. Essa arrogância habitual não está lá e ele é mais
bonito por isso. Suas feições de alguma forma mais suaves.
Não. Eu apago o pensamento. Este homem não é gentil. Ele é um
diabo. Um mentiroso. Ele é meu inimigo.
Julia sabia o tempo todo. Eu disse a ela que não era verdade. Afinal, eu
tinha minhas pílulas anticoncepcionais. Ele não as tinha levado embora.
Deus. Que tola eu sou.
— Eu me sinto uma merda. Como se eu tivesse sido enganada.
Enganada da pior maneira possível. Devo continuar?
Alguém bate na porta e Jericho fala para eles entrarem. É Leontine
carregando uma bandeja. Quando sinto o cheiro reconfortante de sopa,
meu estômago ronca. Eu estou faminta.
— Isabelle. — ela diz com um sorriso enquanto Jericho pega a bandeja
dela, colocando-a na mesa de cabeceira. — Estou feliz em vê-la acordada.
— Você sabia? — Eu pergunto a ela.
Ela está em silêncio e aí está sua resposta.
— Você sabia que ele estava trocando minhas pílulas? — Eu digo as
palavras em voz alta, acusando os dois. Ouvi-los torna a traição mais feia.
Mais monstruosa. Olho para Jericho, que não faz barulho. Não nega. Nada.
Ele apenas me observa.
Ela olha para o filho. — Vá. — ele diz a ela sem tirar os olhos de mim.
— Certifique-se de que não somos perturbados.
Ela acena com a cabeça e sem outro olhar em minha direção, sai.
— Você tem todos sob seu controle, não é?
Ele se senta na beirada da cama, estendendo a mão para ajustar os
cobertores.
— Não me toque!
Ele para, sem comentar, mas não me toca.
Eu levanto meus pés, vejo as meias rosa felpudas com suas bolinhas
brancas. Ele me vestiu? Eu estava nua quando eles me nocautearam. Eu
tinha acabado de sair do chuveiro.
Não importa, no entanto.
— Você precisa comer, Isabelle. Eu vou alimentá-la.
— Eu posso me alimentar.
— Você está fraca.
— Eu me viro.
— Preciso amarrar você na cama para fazer isso?
— Você faria isso, não faria? Existe alguma coisa que você não vai
fazer? Alguma linha que você não cruzará? Ou a decência humana está além
de sua compreensão? Não é realmente sua preocupação?
— Eu preciso amarrar você? — ele pergunta novamente.
— Não. — eu digo a ele porque a verdade é que eu sou fraca. De
tantas maneiras.
Ele pega a tigela. Eu vejo um caldo claro com pequenos bolinhos
dentro dele.
— É caseiro e vegetariano. — diz ele. — Catherine fez isso para você.
— Vou vomitar.
— Nós vamos devagar. O médico deu-lhe algumas vitaminas. As
vitaminas B, especialmente, devem ajudar com a náusea. Ele deixou outros
medicamentos se você não conseguir manter a comida no estômago.
Olho para o criado-mudo, vendo dois frascos. Estou inundada de
emoção de repente. Eu pressiono as palmas das minhas mãos nas órbitas
dos meus olhos. Elas saem molhadas.
— Está confirmado então? Estou grávida? — Minha voz soa estranha.
Grossa e cheia de emoção que estou tentando muito reprimir.
Ele concorda. — Nós iremos ao consultório médico em alguns dias e
descobriremos mais então.
— Eu tenho dezenove anos. — Lágrimas enchem meus olhos e um nó
faz minha garganta fechar. — Isso não é o que eu queria. — O que eu
esperava. Imaginava.
Jericho coloca a tigela de lado e segura meus braços. Sua mandíbula
está tensa e seu aperto não é duro, mas é sólido. — Eu vou cuidar de você,
Isabelle. Eu prometo.
Eu quero empurrá-lo para longe, mas é bom tê-lo me segurando. Ele é
como uma âncora. Alguém mais forte do que eu posso me apoiar. É bom
porque eu não tive alguém me segurando por tanto, tanto tempo. Assim
não. Não como se ele pudesse se importar.
Mas então eu me lembro de que ele não se importa. Não sobre mim.
Ele se preocupa com seu bebê. Ele é um monstro. Uma fera. Então eu dou
de ombros fora de seu alcance.
— Você trocou as pílulas. Julia as encontrou. As verdadeiras.
Ele está em silêncio.
— Se ela não tivesse, você teria mentido? Diria que deve ser um
acidente?
— Eu não menti para você nenhuma vez, Isabelle.
— Não, você fez muito pior.
Ele pega a sopa e prepara uma colher de caldo. — Abra.
Eu olho para ele, com fome. Eu abro e ele é cuidadoso enquanto traz o
líquido quente para minha boca. É sem graça, mas quente e bom. Simples.
Como eu gosto de sopa.
Estou grávida.
Tomo outra colherada de caldo, saboreio o sal de uma lágrima que
escorre pelo meu lábio.
Estou grávida do bebê de Jericho St. James.
Ele limpa meu queixo, em seguida, me dá outra colherada, está com
um bolinho. Eles também são bons, pastosos e salgados. Eu como em
silêncio. Ele é paciente, não está me apressando.
Quando a tigela está vazia, ele a coloca na mesa e pega o prato de
fatias grossas de pão branco com manteiga. — Sal? — ele pergunta,
pegando o saleiro.
Ele se lembra da outra noite.
Concordo com a cabeça, observando-o enquanto como o pão que ele
me alimenta. Penso no quanto estou sob o controle desse homem. Como
ele é o ditador da minha vida. Eu estou na casa dele. Na cama dele. Sua mão
é a que me alimenta. Literalmente. Sua marca está gravada em minha pele.
Ele pode me trancar naquele porão se quiser. Mantendo-me lá até o bebê
nascer e tirar a criança de mim. Ele pode me deixar lá para morrer. Enterrar
meu corpo ao lado do de Nellie Bishop e ninguém saberia. E se o fizessem,
ninguém me ajudaria. Angelique pode se lembrar de mim, mas tenho
certeza que ele poderia inventar uma história para distraí-la até que ela se
esqueça de mim também. Alguém se importaria? Julia? Carlton? Matty
talvez.
— Eu preciso saber uma coisa. — ele finalmente diz enquanto coloca o
prato vazio de lado. Eu engulo o último bocado.
— Eu sou toda ouvidos. — eu digo de uma forma otimista simulada.
Por dentro, algo está me torcendo e as lágrimas continuam fluindo.
Ele olha diretamente para mim, os olhos procurando os meus. — Você
vai tentar prejudicar meu bebê?
Eu estremeço. E levo um minuto inteiro para dissecar suas palavras.
Vou tentar fazer mal ao bebê dele?
Prejudicar um bebê.
Seu bebê.
— Você vai me acorrentar à sua cama se eu disser sim?
Ele acena com a cabeça como se fosse um acéfalo. Uma resposta
óbvia. Uma normal.
— Você sabe o quão fodido você é?
— Acredite em mim, eu sei exatamente o que sou.
Seu comentário me pega de surpresa.
— Responda-me, Isabelle. — diz ele.
Eu me sinto mais forte. É a sopa, o pão e provavelmente as vitaminas.
— Eu não sou como você, Jericho St. James. Eu não sou alguém que
pode prejudicar outro ser humano.
É a vez dele se encolher. Bom.
Ele concorda. Continua.
— Nós não vamos contar a Angelique até que você esteja mais longe,
apenas no caso.
— Não há nós. Existe você e existe eu.
Ele ignora isso. — Eu não quero deixar suas esperanças.
— Bem, isso é provavelmente a única coisa que você e eu
concordamos.
— Bom. Você vai dormir na minha cama daqui para frente. E sua
prioridade será sua saúde. A saúde do meu filho.
— Não estar agradando você? Essa já não é mais minha prioridade? —
Eu pergunto, meu tom de zombaria.
— Isabelle…
— É por isso que você fez isso. — Não sei por que esse conhecimento
dói. Não é realmente uma notícia de última hora. E em algum nível, eu tinha
que saber. Não é como se ele tivesse alguma afeição por mim. O diabo com
chifres que me salvou daqueles homens naquela capela provou ser mais
vilão do que herói. Muitas vezes. Duvido que ele alguma vez quis ser o herói,
no entanto. Naquela noite, por um momento, pensei nisso. Meu cavaleiro
de armadura brilhante. Um estranho veio para me varrer do chão e me levar
embora.
Longe de onde? Eu me pergunto agora. Longe de quê? Os últimos três
anos foram uma espécie de inferno. Perder meus pais foi ruim. Mas perder
Christian? E do jeito que eu o perdi? Isso me quebrou. Nos três anos em que
vivi na casa do Bishop com um homem de sangue, meu meio-irmão, só me
senti sozinha e com frio. Até com Julia. Só com Matty havia algum afeto.
Algum contato físico. E os seres humanos precisam disso. Precisamos de
toque. Precisamos de gentileza. Necessidade de se sentir desejada. Amada.
Eu balanço minha cabeça. Jesus. Eu sou patética.
Ele respira fundo e espera, olhando para baixo de sua grande altura.
Eu me pergunto como eu pareço para ele.
— Julia estava certa. — Ele sabe sobre o telefone. Não há sentido em
tentar esconder como eu sei dele. — Ela me contou como funciona a
herança do Bishop. Que Carlton precisa produzir um herdeiro para manter o
controle da fortuna da família.
— Seu irmão é incapaz de produzir herdeiros.
— Ele tem um ano. Tenho certeza…
— Suas esposas abortaram todas às vezes.
Eu sei disso.
— Eu não estou preocupado com Carlton Bishop magicamente
produzindo um herdeiro na última hora. Você, sendo sangue, é a próxima na
linha de sucessão. Uma vez que a criança nasce, seu lugar está selado. E o
dele também.
— E como chefe de família, o seu também está. Você assumirá o
controle da herança.
— Correto. Após o nascimento da criança, eu assumirei o controle.
Deve coincidir muito bem com o 50º aniversário de Carlton.
— Você é um ser humano terrível, sabia disso?
Seus olhos se estreitam e há uma inclinação ameaçadora em sua
cabeça. — Você não sabe as coisas que ele fez.
— Você quer dizer as coisas das quais você o acusa. São apenas coisas
que você faria, Jericho St. James. — Eu empurro o cobertor me sentindo
mais forte e fico de pé. Eu me aproximo, chegando a uma polegada dele. —
Coisas que só um monstro como você é capaz.
Uma escuridão desce sobre suas feições, um sorriso fazendo algo
perverso sair de sua boca. Ele me leva para trás até eu bater na parede. —
Devo te contar mais, Isabelle?
— Eu não acreditaria em uma palavra do que você diz, então
economize seu fôlego.
— Devo lhe dizer exatamente como ele decidiu seu destino antes
mesmo de você tomar conhecimento de sua existência?
Suas palavras me confundem, mas antes que eu possa responder, ele
pega meus braços, desliza-os para trás e agarra os dois pulsos com uma
mão.
— Não. Vou poupá-la disso. Vou lhe dizer outra coisa em vez disso. —
Seus olhos piscam para a minha boca, descendo para a parte exposta do
meu peito. — Você é minha esposa. Você carrega meu filho. Você me
pertence, Isabelle St. James.
Isabelle York. Isabelle Bishop. Isabelle St. James. Percorri um longo
caminho em três anos.
Eu abro minha boca para protestar, para amaldiçoá-lo para o inferno
porque ele não vai me machucar. Agora não. Não enquanto eu estiver
carregando seu filho. Mas antes que eu possa, ouço o desafivelar de seu
cinto, o som de seu zíper. Eu engulo, olhando para baixo, em seguida, de
volta para ele.
O conjunto perverso de sua boca é diferente agora. Sujo. Seu olhar
sombriamente erótico.
— E além disso, esposa, você quer me pertencer. — diz ele, soltando
meus pulsos e agarrando meus quadris para me levantar do chão. Eu não
tenho escolha a não ser envolver minhas pernas em sua cintura enquanto
ele me equilibra entre ele e a parede. Sinto seus dedos na lateral da minha
calcinha, empurrando-a para o lado. E por mais que eu odeie, estou
excitada.
— Eu não. — digo a ele mesmo quando o sinto na minha entrada,
mesmo quando meu corpo se prepara para recebê-lo. — Eu não. — Meus
braços estão em torno de seus ombros, mãos segurando punhados de
cabelo e puxando. Machucando.
— Você é uma mentirosa também, esposa. — diz ele enquanto
empurra dentro de mim.
Eu grunhi, tomando todo o comprimento dele, minha passagem muito
apertada, a intrusão muito rápida.
— Beije-me. — diz ele, empurrando novamente, as mãos em concha
na minha bunda.
— Você quer um beijo? — Eu pergunto, tomando outro impulso duro,
meu clitóris esfregando contra ele, meu corpo fazendo exatamente o que
ele disse. Querendo ele. Querendo pertencer a ele.
— Um beijo sangrento. Eu vou te dar isso. — ele diz. — Faça o seu
pior.
Eu afundo meus dentes em seu lábio inferior e saboreio o cobre do
sangue. Suas estocadas vêm mais rápidas e eu não tenho certeza se é o
gemido dele ou o meu enquanto eu chupo seu lábio e o sangro.
Quando gozo, me agarro a ele, braços em seus ombros, pernas
travadas em torno de seus quadris. Ele me quica em seu pau, me
penetrando de novo e de novo, ficando mais grosso. Eu ofego minha
liberação, seu nome em meus lábios, meu corpo pulsando, visão embaçada,
mamilos apertados e muito sensíveis contra minha camiseta, cada sensação
intensificada. Quando ele goza, ouço meu nome em sua respiração, sinto a
pressão de seu peito contra o meu enquanto ele me prende na parede e
para. Nossos olhos estão presos, lábios sangrando, cada um de nós odiando
o outro. Eu com um voto secreto de destruí-lo. Tirar dele tudo o que ele
planeja tirar de mim. Eu tenho algum poder sobre ele.
Sexo.
Ele me quer tanto quanto eu o quero. Vou usar isso para deixar Jericho
St. James de joelhos.
CAPÍTULO TRÊS
JERICHO
O jato para a Áustria sai em pouco mais de uma hora, mas dá-me
tempo suficiente para visitar os Bishops. Mesmo que nossas propriedades
fiquem uma atrás da outra, são quinze minutos de carro até a entrada da
frente. O portão se abre quando paramos. Carlton deve estar me esperando.
— Quer que eu entre com você, chefe? — Dex pergunta quando
chegamos às portas duplas da frente.
— Não. Vou demorar um minuto.
Ele concorda.
Eu observo o estado do lugar. A casa Bishop já foi grande. Tenho as
plantas da casa. Conheço os cantos e recantos. Eu me pergunto se Carlton
Bishop já se preocupou em estudá-los. Se ele conhece os pontos fracos do
muro entre nossas propriedades.
Os jardins estão descuidados. As folhas precisam ser varridas, os
arbustos aparados. As rosas que rastejaram sobre a parede precisam ser
cortadas, flores mortas limpas. Eu sei que financeiramente Bishop está
sofrendo. Ele pode ter a casa e as propriedades, mas não é líquido. Ele
precisa vender algumas de suas terras. O apartamento em Paris que ele
comprou para sua esposa. Ele precisa de dinheiro.
Saio do Rolls Royce assim que para, ajeito minha jaqueta e olho para a
fachada da mansão de pedra. É construído muito parecido com o nosso com
seu design de castelo francês, grandes janelas, persianas de madeira
ornamentadas. Se você não olhar muito de perto, não notará como a tinta
está descascando aqui ou ali, como uma veneziana está pendurada fora do
centro.
A porta se abre antes que eu a alcance, mas não é quem eu estou
esperando. Não um mordomo ou governanta. Nem mesmo Carlton Bishop.
Não. É a prima dele, Julia.
Ela para com a mão na maçaneta. Nenhum sorriso em seu rosto hoje.
Ela está vestindo um par de calças de corrida e sutiã esportivo que deixa sua
barriga exposta. Ela está tonificada e bronzeada como se trabalhasse nisso.
— Srta. Bishop. — eu digo enquanto subo as escadas de pedra em
direção à porta.
— Sr. St. James. — ela diz, seu olhar se movendo sobre meus ombros e
peito, então de volta para os meus olhos. — Eu estava prestes a sair para
correr quando vi você chegar. — diz ela.
Tenho a sensação de que ela não estava prestes a correr. Que ela estar
aqui, sendo a única a abrir a porta, é um movimento calculado.
Ela dá um passo para o lado, gesticulando para que eu entre. Eu faço.
Seus seios roçam meu braço. Eu quero dizer que é porque a entrada não é
grande o suficiente para acomodar nós dois, mas algo me diz que até isso é
calculado.
Ela fecha a porta e um silêncio desce sobre a casa grande. Daqui posso
ver as escadas curvando-se para o andar de cima, a sala de estar e a sala de
jantar. Está tão quieto que me pergunto se há mais alguém na casa.
Eu me viro para ela. Ela tem mais ou menos a mesma altura de Isabelle
e quando ela olha para mim com os olhos azuis pálidos da maioria dos
Bishops, noto que ela está usando maquiagem completa para ir correr.
Delineador pesado, batom, perfume e tudo mais.
Ela sorri, mas fica um pouco mais perto do que seria apropriado. Eu
não me movo quando ela levanta os braços, flexionando os músculos do
estômago. Ela puxa seu longo cabelo loiro em um rabo de cavalo no topo de
sua cabeça. Ela o transforma em um elástico com unhas compridas e polidas
penteando-o, depois arrasta a mão lentamente sobre o comprimento para
colocá-lo sobre o ombro.
— Carlton não está aqui. — diz ela e eu entendo alguma coisa. Acho
que sim, pelo menos.
— Não?
Ela balança a cabeça. — Tenho certeza que posso te ajudar com o que
você precisar. Venha ao meu escritório. Quer café?
— Não, obrigado.
Ela sorri, se vira e caminha na minha frente pelo corredor balançando
sua bunda curvilínea o tempo todo. É algo para se olhar em suas calças
apertadas. Tenho certeza que é por design. Eu me pergunto o quão perto ela
e Isabelle são. O quanto Isabelle sabe sobre Julia. E faço uma nota mental
para aprender mais.
Ela abre a porta de um escritório, mas eu não diria que é um escritório
de mulher. É madeira velha e escura em cada curva. Muito masculino. Mas
talvez seja eu atribuindo papéis de gênero.
— Você tem certeza que este não é o escritório do seu primo. Não
parece mobília para uma mulher escolher.
— Não? Não rosa o suficiente?
Eu olho para ela. Pegue seu batom vermelho demais. Julia Bishop
chegou à Nova Orleans como mãe solteira há cerca de quatro anos. Ela foi
morar com Carlton na época em que Monique se mudou. Isso é tudo que sei
sobre essa mulher que estou começando a pensar que subestimei.
Enfio a mão no bolso e tiro o telefone de Isabelle. Eu o coloco sobre a
mesa. O cartão SIM está no meu escritório em casa.
— Acho que você passou isso para minha esposa na noite em que
encontrei vocês duas na capela.
Ela olha para ele, vira um rosto surpreso para mim. — Achei que tinha
sido esquecido pelo homem que recolheu as coisas dela. Você sabe como é
ficar sem celular hoje em dia. Não pode sobreviver, realmente. — Ela sorri
casualmente.
— Tenho certeza que você tinha apenas as melhores intenções para
Isabelle.
— É claro. Como está minha prima?
— Eu acho que você sabe.
Ela pisca, não dá nada do que está pensando. — Devo ao casal feliz
meus parabéns?
Eu apenas sorrio, nem confirmando nem negando. A gravidez de
Isabelle não permanecerá em segredo por muito tempo, mas se eu pudesse
fazer do meu jeito, ninguém saberia até que o bebê estivesse seguro em
meus braços.
— Você pode perder um pouco se ela estiver grávida, não é?
Pela primeira vez, nas poucas ocasiões em que interagi ou vi Julia
Bishop, sua máscara cai, sua expressão denunciando seus pensamentos e
deixando seu rosto geralmente atraente feio. Pelo menos
momentaneamente. E eu me pergunto o quanto Carlton Bishop está no
controle da casa Bishop.
— A herança nunca foi minha. Meu pai era o irmão mais novo. É como
a monarquia. Um herdeiro e um sobressalente. Ele era o reserva e eu, bem,
mal sou isso, não sou?
— Isso te incomoda?
Suas sobrancelhas se unem.
— O fato de Isabelle existir. Que ela está acima de você.
Ela engole. — Claro que não. Eu amo minha prima.
— Hum. Onde está Carlton, afinal?
Ela encolhe um ombro. — Não voltou para casa ontem à noite.
Provavelmente na Cat House.
Não sei por que isso me surpreende, mas surpreende, pelo menos
momentaneamente. — Isso te incomoda? — Eu pergunto, testando.
— Desculpe?
— Incomoda você que ele esteja na Cat House. Fodendo outras
mulheres.
Seu rosto fica vermelho. — Nós não somos… Ele é… Nós somos
primos. Isso é tudo.
— Eu tive uma prima uma vez. — eu minto, deixando um lado da
minha boca curvar para cima.
— Não somos nós!
— Meu engano. — eu digo. Ando pelo escritório, sento no sofá e me
inclino para trás, dobrando o tornozelo sobre o joelho oposto. Ela
permanece onde está, ainda perturbada. — Você estava aqui quando o
irmão de Isabelle foi morto e ela quase morreu. Quando Carlton a acolheu.
Ela acena com a cabeça, cruza os braços sobre o peito
defensivamente.
— Há quanto tempo você sabia da existência de Isabelle? Que ela era
uma relação de sangue?
— Desculpe?
— Há quanto tempo você sabia sobre ela? Carlton teria aprendido
sobre sua meia-irmã na leitura do testamento de seu pai, onde o velho
reivindicou a paternidade. Um teste de DNA foi feito, a propósito, sem o
conhecimento de Isabelle, anos antes de ela vir morar nesta casa. Carlton
sabia sobre ela há muito tempo. Minha pergunta é quanto tempo você
sabia?
— Só quando ela se mudou.
— É assim mesmo?
— O que você quer dizer, Jericho?
Jericho.
Eu levanto. Caminho em direção a ela. — Nós não somos amigos, você
e eu. Sr. St. James irá servir.
Ela olha para cima, tirando o ridículo rabo de cavalo do ombro. Eu não
gosto dela. Na verdade, sinto uma aversão por ela que é quase física. Há
algo tão calculado sobre ela. Tão frio. Mas ela é uma Bishop e meu ódio por
todas as coisas Bishop é profundo.
Mas então penso na Bishop em minha casa e isso parece diferente.
Talvez seja o fato de ela estar carregando meu filho. Talvez seja porque ela
dorme na minha cama. Que eu a vi em seu estado mais vulnerável e que ela
depende de mim para tudo. Minha mão é a mão que a alimenta.
Não sei. Tudo o que sei é que ela não é como esta.
— Fique longe da minha esposa. Estou sendo claro?
— Ela é minha prima e minha amiga. Acho que ela precisa de um
desses esses dias.
Eu me inclino em direção a ela. — Fique. Longe.
Ela engole em seco e dá um passo para trás.
Satisfeito, vou até a porta. Estou com a mão na maçaneta quando ela
fala.
— O que você vai fazer com ela quando o bebê nascer?
Minha mandíbula fica tensa. Eu viro.
Ela deve ver alguma fraqueza em minha expressão, minha postura,
porque ela fica mais alta. Um sorriso feio aparece em seu rosto
perfeitamente maquiado.
— Enterrá-la como fez com sua noiva? Como seu antepassado
enterrou Nellie Bishop?
Eu bufo. Caminhando de volta para o escritório, fico feliz quando ela
se apressa para se afastar de mim. — Fique longe da minha esposa e da
minha família ou eu vou atrás da sua.
Golpe baixo. Eu sei disso. Para ameaçar seu filho.
Seu rosto empalidece. Sua boca se move, mas ela não diz nada. Ou se
ela fala, eu não ouço porque saio daquele escritório, daquela casa, sentindo
que quero esfregar minha pele para tirar o veneno que é Julia Bishop de
mim.
CAPÍTULO QUATRO
JERICHO
Eu voo sozinho para a Áustria. Eu teria levado Dex comigo, mas devido
às circunstâncias, quero que ele fique em casa para cuidar de Isabelle e
Angelique. Ele também entrevistará três homens que possivelmente
protegerão Isabelle. Eu sei que não posso mantê-la trancada em casa para
sempre. Não é bom para ela ou para o bebê. Mas ela não vai a lugar
nenhum sem um guarda pessoal, especialmente agora depois da minha
visita a Julia Bishop.
Meu pressentimento sobre as pessoas está sempre certo. Sempre foi.
A única vez que não escutei levou ao assassinato de Kimberly. Senti por Felix
Pérez o mesmo que sinto por Julia. Mas eu o empurrei de lado. Eu estava
fazendo negócios. Negócios necessários que haviam sido deixados
inacabados e precisavam ser concluídos. Isso foi tudo.
Mas isso não era tudo.
Ninguém além de Dex sabe da minha viagem à Áustria. E Zeke não
pode saber. Porque depois do meu encontro com Santiago estou mais
curioso do que nunca sobre o que ele e Zeke não estão me contando.
Meu pai estava de férias esquiando na Áustria quando morreu. Eu sei
que ele se encontrou com alguns homens naquela viagem a respeito de
negócios que não eram exatamente honestos. Mas pelo que pude aprender,
essas reuniões foram bem. Aqueles homens não teriam motivos para
prejudicá-lo. O oposto.
Ele também esteve com uma de suas amantes. Estou feliz agora que
ele levou aquela mulher e não minha mãe ou ela estaria morta também.
O acidente aconteceu no final da noite. Eles estavam voltando para o
chalé depois do jantar. Era tarde e escuro, uma neve fresca estava caindo.
Todas as coisas que poderiam levar um homem inexperiente dirigindo
nessas condições a sair da estrada.
Mas meu pai não era inexperiente. Ele morou em Nova Orleans
durante a segunda metade de sua vida, mas nasceu e foi criado no Colorado.
Um viciado em esqui que passou os invernos durante grande parte de sua
juventude e vinte e poucos anos nas montanhas. Ele era um bom motorista.
Sólido.
O SUV deles havia saído da estrada em uma curva fechada descendo a
montanha a apenas cinco minutos do chalé onde o guard rail já estava
danificado. Estava programado para ser consertado na semana seguinte.
Quando a polícia chegou lá, a neve estava caindo com força. Qualquer
evidência na estrada, como marcas de derrapagem ou pegadas de animais
ou qualquer coisa que pudesse explicar por que isso aconteceu,
desapareceu. Eles culparam as condições de gelo, mas não era gelo. Era
neve e meu pai podia lidar com neve.
O próprio carro explodiu com o impacto, uma vez que havia caído do
penhasco, causando uma pequena avalanche. Não havia mais nada do
motorista ou passageiro além de ossos carbonizados.
O pensamento revira meu estômago.
Meu pai não era um bom homem. Eu sei disso. Ele era abusivo com
nossa mãe. Para nós, às vezes, mais Zeke do que eu. Mas ele era meu pai.
Faço questão de passar pelo chalé que vendemos após o acidente.
Parece o mesmo, apenas mais velho. Estaciono do lado de fora e olho para
ele. O lugar não guarda lembranças para mim. Nós nunca viemos aqui.
Apenas nossos pais, principalmente nosso pai. Eu não acho que ele trouxe
mamãe mais do que um punhado de vezes.
Uma luz se acende lá dentro e alguém puxa a cortina para olhar a
estrada. É uma estrada tranquila. Não há razão para estar aqui, a menos que
você vá ao restaurante no topo da montanha e o restaurante esteja fechado
na baixa temporada.
Eu coloco o SUV em movimento e faço uma curva de três pontos para
voltar para o hotel. Não dirijo os cinco minutos que levaria para ver o lugar
onde o carro deles passou por cima do guard-rail. Talvez eu vá depois. Mas
tenho um encontro com o gerente do Hotel Petterhof.
O hotel é grande, com mais de quinhentos quartos. É apenas um passo
acima de um albergue. Um lugar para alguém se perder. Para ser esquecido.
Estaciono o SUV no estacionamento, sem manobrista aqui e entro. Está
cheio de acessórios e móveis que são imitações baratas que precisavam ser
atualizadas cerca de trinta anos atrás. É muito diferente do tipo habitual de
lugar que Zeke ficaria.
Há um buraco no meu estômago quando vou até a recepção, onde
uma jovem olha para cima e sorri quando me aproximo.
— Boa noite senhor. Como posso ajudá-lo?
— Estou aqui para ver o Sr. Spencer. Mitch Spencer.
Eu não dou meu nome a ela.
— Sim, ele disse que estava esperando alguém. Eu vou ligar pra ele.
Apenas sente-se.
— Obrigado.
Enviei um depósito considerável ao Sr. Spencer pelo trabalho que ele
fez. Espero discrição em troca. Discrição e informação. Porque encontrei
algo nos arquivos do Santiago. Algo que ele pode não ter pretendido que eu
visse.
A lista de hóspedes deste hotel continha um nome que reconheci. Jack
J. Z. Wilder. Ele era o melhor amigo do meu irmão quando estávamos no
ensino médio. É coincidência demais que o nome dele esteja na lista de
convidados da noite para o dia.
Santiago chegou a reunir os nomes de todos os hóspedes dos hotéis e
chalés próximos. Os inquilinos de fora da cidade. Os locais. Ele foi minucioso.
E o nome de Jack chamou minha atenção. Eram as iniciais do meio. Isso é o
que Jack passou na escola.
Quando entrei em contato com o Sr. Spencer, que trabalha aqui há
quinze anos, ele teve a gentileza de, após algum incentivo financeiro,
compartilhar comigo que há uma câmera gravando as idas e vindas do
saguão, a entrada frontal, as portas laterais, as entradas e saídas de
funcionários. Medidas normais de segurança. Mas o Hotel Petterhof nunca
se livrou de nenhuma das gravações antigas. Ele conseguiu encontrar a da
semana da morte do meu pai. A semana que Jack J. Z. Wilder supostamente
passou esquiando na Áustria.
Exceto que Jack havia morrido em um acidente de moto no verão após
a formatura. Assisti ao enterro dele.
A filmagem da câmera, embora granulada, mostra uma imagem
suficientemente clara do homem alto e de cabelos escuros posando como
Jack.
Meu irmão.
Meu irmão estava na Áustria na noite em que o carro do meu pai saiu
da estrada.
Meu irmão estava em um quarto de hotel a menos de meia hora de
distância.
E eu não tinha ideia de que ele tinha saído do país.
— Sr. St James. É bom conhecê-lo. Eu sou Mitch Spencer.
Eu pisco, limpo minha cabeça e me arrasto para fora do meu devaneio
para encontrar Mitch Spencer. Ele é um homem baixo, musculoso, com
quase cinquenta anos. Ele estende a mão e noto como seu terno é usado no
pulso.
— Sr. Spencer. — eu digo, apertando sua mão. — Obrigado por
arranjar tempo para mim em tão pouco tempo.
— Por aqui. — Caminhamos em silêncio por um corredor onde o
tapete está puído e o cheiro de comida, cigarros velhos e maconha
permeiam as paredes. Zeke odiaria este lugar.
Eu ando atrás de Spencer em um pequeno escritório superlotado por
grandes estantes e livros, pilhas de fitas de vídeo, uma mesa que já viu dias
melhores e uma cadeira atrás dela que se inclina para um lado.
A única coisa que tem a seu favor é a vista da janela atrás da mesa. É
espetacular.
— O escritório não é muito, mas ver o pôr do sol todas as noites é
outra coisa. — diz Spencer, como se estivesse lendo minha mente.
— Eu aposto.
Ele gesticula para um assento. Eu o pego enquanto ele desliza na
cadeira atrás da mesa. Ele vira o laptop, sem preâmbulos e aperta o play.
Assisto a filmagem. Eu vi a captura de tela dele apenas alguns dias atrás.
Observo Zeke entrar no saguão, um boné de beisebol puxado para baixo
sobre o rosto. Ele também usa um casaco pesado e volumoso com zíper até
o pescoço e caminha até o elevador. Eu verifico a data da filmagem. A noite
do acidente do meu pai.
Eu mordo qualquer emoção, qualquer pensamento.
Spencer aperta algumas teclas para tocar outra cena. Zeke novamente,
desta vez vestido com um terno e casaco de lã que não era para esquiar.
— Ele saiu cedo. Sua reserva era para duas noites, mas ele saiu depois
de uma.
Eu olho para o carimbo de data e hora. — Apenas uma hora depois
que ele entrou. Passe-as novamente.
Ele faz. E vejo Zeke entrar no saguão de boné e casaco enorme.
Spencer gentilmente faz uma pausa para expandir a imagem, embora
granulado, posso distinguir sua expressão. Pelo menos um pouco. Está
determinado. Apressado.
Mas quando verifico, seu cabelo está molhado. Ele deve ter tomado
banho e se trocado.
— Há mais um. — diz Spencer. — Um curioso.
Ele vira o laptop, aperta algumas teclas e então o inclina para que eu
possa ver a tela. Zeke, saindo do hotel, joga sua mochila cheia em uma lata
de lixo perto da entrada antes de entrar em um táxi e sair da propriedade.
— Você fez uma cópia? — Eu pergunto, querendo não revelar nada.
— É claro. — Ele abre a gaveta, tira um pen drive e me entrega.
— Obrigado. — Pego meu celular, entro no meu aplicativo bancário e
faço uma segunda transferência. Fico parado enquanto seu telefone toca
com uma mensagem. Ele olha para ele, depois para mim e sorri.
— Obrigado. Muito obrigado. — diz Spencer.
— Discrição, Sr. Spencer. Espero que essa filmagem desapareça.
Ele aperta um botão em seu laptop. — Está feito.
— Boa noite.
Saio do hotel barato com pernas de madeira. Subo no meu SUV
alugado e dirijo de volta ao pequeno aeroporto privado de onde voarei para
casa esta noite. Ninguém mais sabe sobre minha viagem pelo mundo.
CAPÍTULO CINCO
ISABELLE
— Papai! — Angelique chama. Eu me viro para encontrar Jericho
entrando em seu quarto parecendo que não dormiu nas vinte e quatro
horas desde que o vi. Por alguma razão eu esperava que ele estivesse ao
meu lado constantemente. Ficando de olho em mim. Assistindo para ter
certeza que eu como. Certificando-me de que eu não machuque o bebê
dele. Mas depois do dia em que ele me deu sopa, não o vi novamente.
Quando acordei, seu lado da cama não tinha sido dormido.
— Bom dia, querida. — diz ele, pegando Angelique em seus braços
quando ela corre para ele, levantando-a em um abraço de urso.
Ainda é chocante para mim vê-lo assim. Ele é tão completamente
diferente com sua filha do que é comigo. Com qualquer um. Como um
homem que não conheço. O que eu gostaria de ter feito.
Eu toco meu estômago. Será que ele vai ser assim com nosso bebê?
Ou ele vai odiá-lo por causa do sangue Bishop?
— Nana disse que você provavelmente teve muitas reuniões. — diz
ela. — Eu nem cheguei a ver você no jantar.
— Foi um longo dia. — ele responde, colocando-a de volta no chão,
ainda segurando sua mão, caminha em direção a sua mesa. Ele olha para o
livro de Angelique, aberto. É um livro infantil sobre música. Especificamente,
sobre um urso que tem um dom para o violino. Era um dos meus favoritos
quando eu era mais jovem. Quando perguntei a Leontine se poderíamos
comprá-lo para Angelique, ela e vários outros foram entregues em casa em
apenas algumas horas.
Isso tudo aconteceu antes, no entanto. Agora estou usando Antes e
Depois como demarcações de tempo. Da minha vida. Antes, quando eu
sabia que Jericho St. James era mau, mas eu não sabia o quanto. Agora, no
Depois, eu sei.
— Isabelle. — ele diz, colocando uma mão pesada no meu ombro. —
Como você está se sentindo?
— Ela está muito melhor. — diz Angelique. — Você não está, Belle?
— Estou, querida. — Eu sorrio para ela, então fixo meu rosto quando o
viro para ele. Quero ter certeza de que ele entenda a mensagem, mas não
cause nenhum dano a Angelique no processo.
— Você está comendo? — ele pergunta.
— Sim.
— Bom.
Eu me levanto. — Eu vou. — eu digo, assumindo que ele quer um
tempo com sua filha e passo em direção à porta.
— O que você está lendo? — ele pergunta, pegando o livro, olhando
para o título e algumas páginas do interior.
— É sobre um urso que pode tocar violino mesmo quando pequeno.
— diz Angelique. — Viu? — ela pega o livro e vira algumas páginas. — Belle
vai me ensinar a tocar também, mas ainda sou muito jovem.
Jericho olha para mim. — Isso é muito bom. Talvez ela toque para nós
mais tarde hoje. O que você acha, Angelique?
— Ah, ela é muito boa, papai. Você deveria ouvi-la.
Eu me sinto corar e me afasto de Jericho. — Eu adoraria ouvi-la. Mais
tarde hoje então. — ele diz para mim.
— Se eu não estiver muito cansada. — Eu tento mover meus lábios em
um sorriso.
Uma batida vem na porta e Leontine entra. — Hora do almoço. — diz
ela.
— Então podemos ir? — Angelique pergunta a ela.
— Ir? — Jericho pergunta, arqueando as sobrancelhas.
— Sua mãe e eu vamos levar Angelique a uma livraria local. — digo,
me sentindo rebelde. Como se eu quisesse desafiá-lo.
As sobrancelhas de Jericho agora desaparecem na linha do cabelo. —
Você está o que?
— Uma livraria. Você sabe, onde eles vendem livros? Eles organizam
uma hora da história depois do almoço para as crianças da idade de
Angelique. Vamos levá-la para a hora da história e depois vamos comer
bolo.
— É um lugar especial, papai. Cotton Candy. Belle me mostrou fotos.
Tudo é cor-de-rosa e parece Cotton Candy e eles têm até…
— Quem disse que você pode fazer isso? — Jericho pergunta,
cortando-a, olhando para mim.
Eu sorrio largo. — Fiquei com vontade de comer bolo.
Ele envolve a mão em volta do meu pescoço e aperta um aviso. —
Catherine pode fazer um bolo para você.
— Não. É um bolo muito particular que eles têm apenas na Cotton
Candy. Você não quer que eu ignore um desejo, quer?
— Por favor, papai? Você pode até vir com a gente. — Ele olha para
Angelique, abrindo a boca, mas ela continua. — Tio Zeke disse que ia comer
bolo no almoço! Eu gostaria de bolo para o almoço, mas Nana disse que eu
tenho que almoçar primeiro.
— Zeke está vindo? — ele pergunta.
— Ele está. — eu digo, meu sorriso se alargando. — Ele não é um doce
de tirar um tempo do seu dia ocupado para nós?
Algo se contorce no templo de Jericho. — Tudo bem. — diz ele com os
dentes cerrados.
— Você virá? — Angelique pergunta animadamente pulando para
cima e para baixo.
— Sim.
— Bem, fico feliz em ouvir isso. — diz Leontine, parecendo surpresa e
satisfeita. — Isso está resolvido então. Você acha que eu preciso mudar a
reserva, Isabelle? — Leontine me pergunta.
— Não, não há problema em adicionar mais uma cadeira. E se não,
Jericho sempre pode se sentar sozinho. — Essa última parte é dirigida a ele.
— Belle conhece a dona. — diz Angelique. — Ela é amiga dela. Ela é
uma confeiteira. Ela está preparando algo especial para nós.
— Eu aposto.
— Talvez eu até peça a ela para colocar algo extra especial no seu. —
digo a Jericho.
Ele desvia o olhar para mim. Ele se transforma em um clarão.
— Venha, Angelique. — diz Leontine. Eu me pergunto se ela sente a
tensão crescendo.
— Belle você não vai almoçar? — Angelique pergunta.
— É claro. — Dou um passo em direção a elas, mas Jericho segura meu
braço.
— Vamos descer em alguns minutos.
Angelique olha para nós, mas Leontine a conduz para fora da sala.
Assim que eles se vão, eu me liberto do aperto de Jericho e saio para o
corredor. Chego até o meu quarto, mas assim que coloco minha mão na
maçaneta, Jericho fecha a mão sobre a minha.
— Você estava desejando bolo? — ele pergunta, palavras cortadas.
Sua proximidade faz algo vibrar no meu estômago. Faz o cabelo na
parte de trás do meu pescoço ficar em pé. Eu mudo meu olhar de nossas
mãos unidas para seus olhos sem virar minha cabeça.
— Um dia atrás, você não conseguia manter a comida no estômago,
esposa minha.
— Acho que as vitaminas realmente funcionaram. — Tenho me
sentido melhor, mas honestamente tudo o que comi foi mais daquela sopa.
Não tenho certeza se vou aguentar bolo, mas eu estava morrendo de
vontade de sair de casa, essa era a maneira de fazer isso. Saber que estou
grávida me fez mais corajosa. Deu-me uma espinha dorsal.
— Hum.
Ele abre a porta e gesticula para que eu entre. Quando passo por ele,
noto um cheiro familiar nele. Eu não posso identificá-lo, mas não pertence a
ele. Não pertence aqui nesta casa.
— Onde você estava? — Eu pergunto quando ele fecha a porta.
— Você está com saudades de mim?
— Eu só estava me perguntando porque a náusea indo embora
coincidiu tão bem com a sua ausência, eu só me perguntei se seria melhor
se você ficasse longe pelos próximos nove meses. Ou para sempre. Qualquer
um funciona para mim. Ou melhor ainda, deixe-me ir para casa.
Casa. É quando percebo qual é o cheiro.
Eu me inclino em direção a ele e cheiro seu colarinho.
— O que você está fazendo? — ele pergunta.
Eu recuo. — Esse é o perfume de Julia. — É fraco e talvez seja a
gravidez que aumentou meu olfato, mas tenho certeza. E algo sobre isso me
deixa arrepiada.
Ele parece surpreso com meu comentário e leva um minuto para
responder. — A encontrei quando devolvi seu telefone. — Ele anda ao meu
redor até a porta que conecta nossos quartos, entra no dele.
Eu o sigo. — O que você quer dizer com você devolveu para ela?
Ele tira a jaqueta e desfaz a gravata, jogando-a de lado. Ele desabotoa
os botões superiores e os punhos de sua camisa antes de puxá-la para fora
de suas calças e sobre sua cabeça. Ele joga isso na cama também, tira os
sapatos e caminha em direção ao banheiro.
— Quero dizer, eu fui devolver seu telefone e dizer ao seu irmão que
não haveria mais contato entre você e eles. Mas ele não estava em casa. Ela
estava. — Ele liga o chuveiro e desfaz o cinto, virando-se para mim. — Você
não está com ciúmes, está? Tem batom no meu colarinho?
— Por que haveria batom em seu colarinho? — Eu pareço na defensiva
e com raiva. Ou talvez seja ciúme. Percebo que meus braços estão cruzados
sobre meu peito, então eu os solto.
Ele sorri, satisfeito.
Eu balanço minha cabeça. — Seu idiota. Eu não sou ciumenta. Só não
entendo por que o perfume dela estaria grudado em você.
Ele levanta as sobrancelhas e dá um passo em minha direção,
envolvendo um braço em volta da minha cintura. — Ela não é meu tipo.
Você não precisa se preocupar.
— Eu não estou, Jesus! O que há de errado com você? — Eu empurro
seu peito, mas ele aumenta seu aperto.
— Além disso, você é meu tipo. E você é minha esposa. Sem
mencionar que você está carregando meu filho. Você é a única mulher que
estou interessado em foder.
Eu empurro novamente. — Você é bem-vindo para foder todas as
mulheres na Cat House se é isso que você quer. Contanto que você me deixe
em paz!
— Eu não acho que você quer dizer isso.
— Ah, eu quero.
— Devo provar?
— Foda-se!
Ele sorri, mantendo o braço em volta da minha cintura, chega ao
chuveiro para desligar a água. Ele me levanta, me levando para o quarto
onde me deposita na beirada da cama. Com um empurrão de dois dedos no
meu peito, ele me coloca de costas. Ele levanta meu vestido e tira minha
calcinha.
— O que você está fazendo? — Sento-me enquanto ele se agacha, seu
rosto no meu sexo.
— Comendo sua boceta. — ele responde e antes que eu possa abrir
minha boca para protestar, ele me puxa para a beira da cama, sua boca
encontra meu centro e eu não consigo pensar. Tudo o que posso fazer é
sentir sua língua molhada e quente habilmente lambendo meu clitóris. Suas
mãos abrem minhas coxas mais largas enquanto ele desliza dois dedos para
dentro, então fecha a boca sobre a protuberância inchada e chupa.
— Oh. Deus.
Ele faz uma pausa para olhar para mim. — Jericho servirá. — Ele sorri,
então me cutuca de volta, então estou deitada novamente, levantando
minhas coxas sobre seus ombros. São apenas alguns momentos antes que
eu esteja ofegante. Antes que meus dedos se enrosquem em seu cabelo e
eu goze.
Estou mole quando acaba. Ele se levanta, olha para mim e limpa a
boca com as costas da mão. Ele tira o resto de suas roupas e eu posso ver o
quão duro ele está. Ele coloca um joelho na cama e pega seu pau na mão,
inclinando-se sobre mim, se masturbando.
— Vê o que quero dizer? — ele pergunta, me beijando, em seguida, se
afastando, os olhos se movendo sobre o meu corpo.
— Eu odeio você. — eu digo a ele.
— Se você apenas quis dizer isso.
Com a mão livre, ele empurra meu vestido para cima para expor meus
seios vestidos com um sutiã de renda. Ele é áspero quando tira primeiro
meu seio direito da taça e depois o esquerdo, deixando a renda se acumular
sob meus seios macios e inchados.
— Venha aqui. — diz ele, segurando a parte de trás da minha cabeça.
Ele me levanta para sentar, chegando perto o suficiente para que eu saiba o
que ele quer. Ou eu acho que sim, até que seus dedos apertam meu cabelo
e ele está puxando minha cabeça para trás. — Quem convidou Zeke?
— O quê?
— Quem convidou Zeke para comer bolo?
— Eu… Angelique.
— Não foi você?
Tento balançar a cabeça, mas não consigo por causa de seu aperto no
meu cabelo.
— Tem certeza?
— Sim. — Ele afrouxa seu aperto.
— Bom. Porque você não é dele. Você é minha. Quanto mais cedo
você entender isso, melhor.
Ele me solta e eu caio sobre os cotovelos. Ele recua, olha para minhas
pernas abertas. No meu sexo. Estou pingando porque quero mais do que
sua boca. Eu o quero dentro de mim.
— Você quer gozar de novo, não é? — ele pergunta.
Eu mordo meu lábio em resposta. Eu quero dizer a ele que eu o odeio,
mas eu não. Há tempo suficiente para isso. Agora mesmo, eu quero vir.
Ele sorri, agarra minhas coxas e quando ele empurra seu pau dentro
de mim, eu agarro seus ombros, unhas cravadas na carne. A maneira como
ele se move dentro de mim, a maneira como ele me faz sentir, não consigo
pensar quando ele está me olhando assim. Quando ele está me fodendo
assim.
— Venha, Isabelle. Goze meu pau para que eu possa gozar em cima de
você.
Eu faço. Odeio-me por isso, mas eu faço bem no comando. Ele observa
e ainda está duro, empurrando, então quando meu corpo fica mole, ele
puxa para fora, agarra seu pau e empurra mais duas vezes na palma de sua
mão antes de gozar. Eu vejo isso acontecer. Observo como todos os
músculos em seu rosto e corpo ficam tensos antes de eu mudar meu olhar
para o aperto em seu pau. Não consigo desviar os olhos enquanto ele me
marca, meu estômago, meu peito, meus seios. Ele coloca uma mão na cama
enquanto se inclina sobre mim, espremendo o último de seu orgasmo, sua
respiração irregular, olhos fechados. Quando ele termina, ele abre os olhos,
se endireita e olha para a bagunça que ele fez. Ele coloca a palma de uma
mão na minha barriga e esfrega seu gozo na minha pele, sobre meus seios,
até o V entre minhas pernas.
Eu o vejo fazer isso, vejo ele me cobrir com isso, seu cheiro, ele. Ele
está me marcando. Como se a tatuagem nas minhas costas não fosse
suficiente. Quando ele termina, ele olha para mim. No que ele fez. Ele acena
com a cabeça uma vez e se vira para voltar para o banheiro. Um momento
depois, ouço o chuveiro sendo ligado.
Levanto os cotovelos e olho para mim mesma. Eu sou dele. Dele em
todos os sentidos. Eu fico de pé, minhas pernas bambas. Tiro meu vestido e
o sigo até o banheiro. Ele não fica surpreso quando entro no chuveiro.
Quando eu me aproximo dele.
Ele inclina a cabeça para o lado, me estuda por um longo momento
antes de envolver uma mão na parte de trás do meu crânio e me beijar.
Não há nada de terno nesse beijo. É outra marcação. Dele. Eu sou sua.
E quero deixar minha marca também. Quando eu cravo minhas unhas em
suas costas e as arrasto para baixo, seu corpo fica tenso momentaneamente,
mas então ele me puxa para mais perto. Ele me beija mais forte. Quando
terminamos, quando ele termina de me beijar, quando terminei de arranhar
suas costas com as unhas, ele nos lava e desliga a água. Ele me envolve em
uma toalha, então ele mesmo e sem uma palavra nós saímos do banheiro e
nos vestimos. É como se esse momento estranho não tivesse acontecido
quando descemos para almoçar e nos preparamos para levar Angelique para
a hora do conto na livraria e depois para uma confeitaria.
Como se fôssemos uma família. Uma família em que meu marido
envolve a mão na minha nuca para me lembrar de que ele está no controle.
Para me manter ao alcance do braço. Como se eu pudesse esquecer que sou
dele.
CAPÍTULO SEIS
JERICHO
Pela primeira vez em sua vida, levamos Angelique para ouvir contar
histórias em uma livraria. Angelique está sentada no tapete com o Bebê
Urso no colo, formando um círculo com uma dúzia de outras crianças. Todas
têm mais ou menos a idade dela. Estamos na seção de livros infantis de uma
pequena livraria. Uma mesa Thomas The Tank Engine
1
empilhada com trens
de brinquedo em uma vila fica no canto. Estamos cercados pelas cores
vibrantes de bichos de pelúcia, brinquedos e livros, bem como um mural
elaborado de um mundo de conto de fadas ao longo da parede oposta. A
seção infantil fica no fundo da livraria. Eu pairo na entrada em arco entre ela
e o resto da loja. Minha mãe e Isabelle sentam perto de Angelique e ouvem
a mulher lendo a história.
Tudo o que posso fazer é observar o rosto da minha filha. Ela está
sorrindo, feliz, batendo palmas e cantando junto o máximo que pode. Ela
não sabe a letra das músicas que as outras crianças parecem saber de cor.
Quando ela vacila, ela observa os outros. Acho que ela está tentando imitálos, para se encaixar. Algo distorce dentro de mim. Eu não gosto que ela
tenha que fazer isso.
Dex vem ficar ao meu lado. — Ela está se divertindo. — Dex esteve
aqui a maior parte da vida de Angelique. Em algum momento, ela decidiu
chamá-lo de tio Dex. Eu nunca a corrigi.
— Sim. — Ela está.
— Como foi sua reunião? — ele pergunta depois de um longo minuto
enquanto uma música termina e Angelique chama minha atenção. Ela me dá
um pequeno aceno feliz.
Sorrio de volta e aceno, mas o sorriso é mecânico. — Encontrei o que
procurava. — Encontrei o que eu gostaria de não ter encontrado.
Ele não comenta. Ele sabe por que fui para a Áustria.
Eu respiro e expiro, me viro para ele. — Agora, para entender o por
quê.
Ele concorda.
As crianças começam a se levantar, mães empurrando carrinhos
carregados de irmãos mais novos vindo buscarem seus filhos. Angelique vai
direto para Isabelle, que pega sua mão e a leva até uma estante. Elas
passam os próximos dez minutos escolhendo livros. Minha mãe,
testemunhando isso, caminha em direção a Dex e eu.
— Ela é a coisa nova e brilhante. — digo a ela, não querendo que ela
se sinta magoada pela óbvia preferência de Angelique por Isabelle.
— Oh, eu não estou machucada, Jericho. — ela diz, dando um tapinha
na minha mão. — Isabelle é boa para ela.
Eu os assisto também. Ela é. Eu posso ver daqui.
— Mas ela não é o pai dela. — minha mãe acrescenta.
Eu sorrio. — Eu também não estou machucado. — digo a ela,
percebendo que não é bem verdade enquanto falo as palavras.
— Bem, se você estivesse, seria natural.
Eu cerro os dentes porque minha mãe me conhece bem.
— Podemos comprar isso, papai? — Angelique pergunta, carregando
uma pilha de livros. Isabelle segue atrás.
— Eles não são um pouco difíceis para ela? — minha mãe pergunta a
Isabelle depois de examiná-los.
— Eu não acho. Angelique já é uma boa leitora.
— E eu quero um caderno como o da Belle, por favor. — Angelique
diz.
Eu levanto minhas sobrancelhas e olho para minha esposa.
— Para música. — Isabelle diz e se vira para Angelique. — Eu costumo
fazer o meu próprio. Se você tiver um caderno vazio, podemos fazer…
— Compre o que você precisa. Para você também.
Isabelle olha para mim como se quisesse dizer alguma coisa, mas
então ela pega a mão de Angelique, levando-a para o que eu acho que é a
seção de música. Nós as seguimos e alguns minutos depois, Angelique tem
mais dois livros, um caderno e um novo bicho de pelúcia. Ela está animada.
Eu vejo isso no brilho de seus olhos. O rubor de suas bochechas. Ela está
olhando em todos os lugares, em tudo e radiante.
— Você pode cuidar disso? — Eu pergunto a Dex, entregando-lhe meu
cartão de crédito.
— Claro. Vamos, garota. — diz ele. — Carona?
— Estou ficando velha demais para pegar carona, tio Dex. — ela diz,
mas continua animada mesmo assim.
Minha mãe os segue e quando Isabelle tenta me passar, eu toco em
seu braço, parando-a. Ela olha para mim. — O quê? — Qualquer doçura que
ela tenha em sua voz para Angelique se foi.
— Por que você faz seus próprios cadernos?
— Por que você se importa?
— Não é mais fácil simplesmente comprá-los?
— Basta comprá-los. Isso é o que as pessoas com dinheiro fazem,
certo? Basta comprar coisas. Qualquer coisa que eles quiserem. Inclusive as
pessoas.
— É dinheiro? — Suas bochechas coram e seu olhar vacila. Eu sei que
é. Ela está envergonhada. — É também por isso que você não está na
faculdade?
Ela cruza os braços na frente dela. — Tenho um grupo de música com
quem estudo. Ou eu costumava.
— Não é uma escola de música?
— Mais uma vez, por que você se importa?
Eu dou de ombros. — Apenas curioso.
— Não, não é uma escola. Eu não tinha dinheiro para a faculdade,
então encontrei um grupo com o qual eu podia pagar para estudar. Usei a
escassa mesada que Carlton me deu. Satisfeito? Não serei humilhada por
não ter dinheiro. Por não ter permissão para ter um emprego ou ir à
faculdade.
— Não estou pedindo para envergonhá-la, Isabelle. Eu realmente
quero saber. Agora me mostre o que você precisa.
— Estou bem.
— Para minha filha então. Mostre-me o que você precisa para ensinála.
Ela range os dentes. Teimosa. Então sua expressão muda. Seus olhos
brilham. E juro que quase consigo ver uma lâmpada acendendo-se sobre a
cabeça dela.
— Eu perdi um monte de aulas de violino. Eu gostaria de ir
novamente. E eu gostaria de um emprego.
— Nós conversamos sobre um trabalho. Isso é um não.
— Mas as aulas? — ela pergunta. Percebo que, dada a velocidade de
sua resposta, ela sabia que o trabalho seria um não. Ela perguntou para que
ela pudesse ter algo para negociar.
Angelique vem correndo até nós, com a sacola na mão. — Compras
realizadas! Vamos comer bolo!
Nós dois sorrimos para ela, eu espero até que Isabelle olhe para mim
novamente. — Pegue o que você precisa para ensinar a minha filha e
discutiremos suas aulas mais tarde.
— Mais tarde quando?
— Veremos.
— Não está bom o suficiente. Hoje.
Eu suspiro. — Tudo bem, hoje.
Ela sorri e é um sorriso que eu não tinha visto antes. — Ok. Eu serei
rápida. — ela diz a Angelique e se apressa para escolher algumas coisas das
prateleiras. Ela então os entrega para mim e novamente, vejo um rubor em
suas bochechas.
Pego os livros e a levo até a caixa registradora.
— Eu odeio isso. — ela diz enquanto esperamos na fila.
— O quê?
— Que você está pagando. Eu quero um emprego, Jericho. Quero
ganhar meu próprio dinheiro.
— Eu vou te pagar para ensinar minha filha. — eu digo, a ideia
tomando forma ali mesmo.
Pelo olhar em seu rosto, ela está intrigada, mas cética.
— Vou deduzir isso do seu primeiro cheque. — digo a ela enquanto
coloco os livros no balcão e olho para ela. — Combinado?
— Sério?
Eu concordo.
Ela me estuda. Eu levanto minhas sobrancelhas.
— Ok. — ela diz. — Combinado.
— Bom. — Agradeço ao caixa, pego a sacola e me inclino em direção à
minha esposa. — Agora vamos pegar aquele bolo que você está desejando,
pequena mentirosa.
Ela sorri vitoriosa.
Eu posso dar isso a ela.
CAPÍTULO SETE
ISABELLE
A Cotton Candy está ocupada como sempre, mas como conheço Megs,
consegui a melhor mesa nos fundos. Zeke já está lá quando chegamos e
Angelique corre para mostrar a ele todos os seus novos livros. Aceno para
Megs e dou um passo em direção ao balcão. Jericho, sempre desconfiado,
agarra meu braço.
— Onde você está indo?
Eu olho de sua mão para seus olhos. — Vou cumprimentar minha
amiga. — Faço questão de parar, inclinando a cabeça para ele em falsa
preocupação. — Você precisa que eu defina o que é uma amiga?
Ele olha ao redor do café movimentado, olhando para Dex parado na
porta como um idiota. Ele então encontra seu irmão que eu noto que o está
observando por cima da cabeça de Angelique. — Eu vou com você.
— O que você acha que eu vou fazer exatamente? Eu estarei
literalmente a um metro e meio de você. Prometo não fazer uma pausa para
isso.
— Não é isso, Isabelle. Eu tenho inimigos.
— Bem, isso não me surpreende para ser honesta…
— Você também tem inimigos.
Isso me faz parar. Faz algo dentro de mim gelar. Eu penso na noite do
arrombamento. Sobre Christian surpreendendo o intruso, arrastando-o de
cima de mim. Sobre Christian morrer quando me disse para correr.
O aniversário está chegando. É ao virar da esquina. Eu odeio essa
época do ano.
Mas eu balanço minha cabeça. Limpo o pensamento. Esse homem está
na prisão. Ele foi pego, julgado e condenado. Ele não pode me machucar ou
qualquer outra pessoa.
Abro a boca para dizer que ele está errado, mas ele se inclina para
mim. — Agora que você está grávida, você é ainda mais uma ameaça para
seu irmão e prima do que era antes.
— Eu não sou uma ameaça para eles. Eles são minha família. Não é…
— Eu não quero que você se machuque, Isabelle.
Eu não quero que você se machuque.
Eu pisco, confusa com essas palavras. A ternura nelas.
Mas não, eu preciso manter a cabeça limpa. Jericho St. James tem um
objetivo em mente. Derrubar meu irmão, não importa o custo. Ele não se
importa comigo. Ele não quer que eu me machuque porque está crescendo
algo dele dentro de mim. É isso. Eu não deveria ser enganada. Não deveria
me permitir pensar em uma realidade falsa.
— Eu não sou uma ameaça. Um bebê não é uma ameaça.
— Não para alguém como você, talvez, mas…
— Alguém como eu? O que isso significa?
— Você não é desonesta, Isabelle. Mas você é a exceção.
Estou surpresa. Isso é algum tipo de elogio? Mas então eu olho para
sua mão em volta do meu braço, sinto seu aperto. Não é apertado, mas é
claro que não vou a lugar nenhum sem a permissão dele.
— Você não tem medo de algo acontecer comigo, apenas com o bebê.
— Como eu disse, eu não gostaria de ver você machucada.
— Não, porque isso comprometeria o bebê. Por favor, não finja se
importar comigo. Apenas diga como é, Jericho. — Um momento de silêncio
passa e há uma parte de mim que quer que ele me diga que estou errada.
Que ele também se importa comigo. Mas ele não. Ele apenas fica parado em
silêncio e duro como uma parede de tijolos. — Olha, eu só quero dizer oi
para minha amiga que eu não vejo desde que você me levou. Por favor,
deixe-me dizer olá. — Essa última parte é dita com os dentes cerrados.
— Eu não estou parando você. Eu só vou com você.
Ele não me dá a chance de discutir, mas nos leva até o balcão.
— Ei estranha. — Megs diz, vindo ao nosso encontro. Ela está sorrindo
para mim, lançando um olhar curioso para Jericho. Ela está assistindo aquela
pequena exibição se desenrolar. Eu me pergunto o que ela acha disso. — É
tão bom ver você. — Ela me envolve em um abraço gigante forçando Jericho
a me soltar. — Você está bem? — ela sussurra no meu ouvido.
— Sim. — eu digo a ela, abraçando-a de volta, amando o calor dela. A
última vez que a vi foi nas aulas de violino, há mais de dois meses. Megs é
uma mãe solteira de quarenta e poucos anos e uma das pessoas mais gentis
e calorosas que conheço. Ela rejeitou os homens para sempre. Ela brinca
sobre isso, dizendo que bolo é melhor que sexo, mas eu sei que por baixo
dessa fachada de luz há danos. Algo ruim aconteceu com ela.
— Julia esteve aqui na semana passada. — ela diz, recuando. —
Embebedou o lugar com o perfume dela, mas Matty foi tão doce quanto
pode ser. — Megs não gosta de Julia e não faz segredo disso. — Contou-me
a boa notícia. — Ela estuda Jericho, obviamente não intimidada pelo homem
corpulento olhando para ela. — Você deve ser o noivo sortudo. Como você
conseguiu essa aqui? — ela pergunta a ele, apontando o polegar para mim.
Ele leva um momento para responder, mas ele estende a mão. —
Jericho St. James. Bom conhecer uma das amigas de Isabelle.
— Ele está com você? — ela pergunta, apontando para Dex.
Jericho assente.
— Você acha que podemos pedir a ele para se sentar? Ele vai assustar
os clientes.
Jericho respira fundo. Olha para mim e acena com a cabeça, então me
deixa sozinha para falar com Dex. Estou chocada.
— Ele é intenso. — diz Megs.
— Conte-me sobre isso. — eu digo, surpresa que ele tenha me soltado.
Volto-me para Megs. — Como você tem estado? Como está Janie?
— Ela está bem. Você sabe. Ocupada com a escola e angústia préadolescente. — Ela revira os olhos. — Então. — Ela olha para a mesa. —
Você é mamãe agora? — Levo um momento para perceber que ela está
falando sobre Angelique. Ela não sabe da gravidez.
— Eu não sei o que eu sou, honestamente. Venha conhecer a
Angelique. Ela é uma querida.
Ela toca meu braço para me parar. — Julia estava estranha quando ela
entrou. Mais estranha que o normal.
— Por que você não gosta dela?
— Há algo sobre ela. Não sei o quê, mas sei de uma coisa. Eu sei
confiar em meus instintos e eles enviam bandeiras vermelhas sempre que
essa mulher está por perto.
— Talvez ela simplesmente não goste de bolo?
— Quem não gosta de bolo não pode ser confiável. — diz ela com uma
piscadela. — Essa cadela é muito magra para seu próprio bem. De qualquer
forma, ela não estava exatamente compartilhando boas notícias. Apareceu
com um cara mais velho e Matty. Matty estava falando muito alto enquanto
os dois estavam sentados pensando. — Ela revira os olhos. — Nem pediram
nada para eles. Como se minha comida não fosse boa o suficiente para eles.
— Com quem ela estava? Carlton?
— Não sei. — Lembro que ela nunca conheceu Carlton. — Meia idade.
Calvície. Irretocável.
Parece Carlton. — Esquisito.
Jericho se junta a nós assim que chegamos à mesa. Apresento Megs e
ela anota os pedidos de todos, fazendo um estardalhaço por Angelique.
Angelique adora isso e odeia ao mesmo tempo. Ela é uma garota tímida e
não gosta de chamar atenção para ela. Mas ela também está radiante e
cheia de energia hoje. É o passeio, a emoção de tudo. É assim que uma
criança de cinco anos deve ser sempre. Feliz. Animada. Aproveitando a vida.
Há uma vibração estranha entre Ezekiel e Jericho. Eu os estudo,
curiosa para saber o que é, mas Megs é rápida com bolo, chá e café. Ter
Angelique aqui alivia um pouco a tensão. Pelo menos tem todo mundo
fingindo que não há nenhuma. Dou algumas mordidas no bolo esperando
não vomitá-lo de volta, mas sinto a náusea antes de terminar um quarto da
minha fatia.
Megs chegam enquanto nos preparamos para partir. — Então, vejo
você na quarta à noite? — ela pergunta.
Eu coloco a mão no meu estômago na esperança de resolver isso.
Quarta à noite é a noite em que nos encontramos para as aulas de violino.
— Espero que sim. — eu digo.
— Me mande uma mensagem e me avise. Eu posso precisar de uma
carona. A batata está me dando dor de cabeça ultimamente. — A batata é o
carro dela. É do pai dela. A amada Mustang tem mais de vinte anos e está
sempre lhe dando dor de cabeça.
Olho para Jericho que está nos observando enquanto ajuda Angelique
a colocar os livros de volta em sua sacola.
— Você precisa conseguir um carro em que possa confiar. — digo a
ela, de pé.
— Sou apegada. O que posso dizer?
Nós nos abraçamos. — Foi muito bom ver você. — digo a ela, ciente
do meu estômago pressionando contra o dela. Sabendo que ela não pode
sentir nada. Nada amostra ainda. Mas será em breve.
— Você também. Não seja uma estranha. — Lágrimas ardem em meus
olhos. Ela não tem ideia da minha nova vida. Não sabe que é a primeira vez
que saio daquela casa, além de Jericho me levar a esses eventos da
Sociedade.
Uma onda de náusea me faz agarrar o encosto da cadeira.
— Ei, você está bem? — Megs pergunta, envolvendo um braço em
volta de mim.
— Sim, tudo bem. Eu só vou correr para o banheiro. — Eu vou antes
que ela possa dizer qualquer outra coisa. Posso sentir o bolo subindo de
volta quando empurro a porta do banheiro. Sou grata por ninguém estar nas
cabines e arrasto meu cabelo para trás quando chego a primeira. Eu apenas
chego ao banheiro antes que o bolo faça um reaparecimento indesejável.
Vomitar é nojento.
Vomitando em um banheiro público? Leva esse fator bruto até vários
níveis.
Eu levanto e sinto uma mão nas minhas costas. Sinto meu cabelo
levantado enquanto a próxima onda passa. Estou vazia, esgotada, meus
olhos lacrimejantes. Eu fico onde estou e alcanço a descarga do vaso
sanitário.
— Ok? — Jericho pergunta.
Eu fico de pé, passando por ele até a pia, lembrando-me da minha
esperança na livraria. Que ele me permitiria voltar às minhas aulas. Que ele
me pagaria para ensinar Angelique, que é a coisa mais próxima de um
emprego de verdade que vou conseguir. Lembro-me dessa esperança. Essa
esperança estúpida e idiota.
— Não, não realmente. — digo a ele enquanto lavo minha boca e lavo
meu rosto com água fria. Pego toalhas de papel, mas ele já as pegou. Ele
segura a parte de trás da minha cabeça para limpar meu rosto.
— Vai passar. — diz ele. — Fique na sopa por mais alguns dias.
— Você é médico agora? É por sua causa que estou doente. Saia de
perto de mim.
Ele cerra os dentes, mas me permite tirar as toalhas de papel dele,
enquanto eu acabo de limpar meu rosto. Eu tento ignorá-lo, jogando as
toalhas de papel fora e saindo do banheiro. Jericho fica no meu encalço.
— Isabelle. — ele diz enquanto eu ando pelo café. Todo mundo já foi
embora. Dou um aceno para Megs e espero que ela não veja as lágrimas que
estou tentando não derramar. Ela está ocupada, então estou feliz por não
ter que falar com ela, embora eu veja as perguntas em seus olhos. Chego à
porta e a abro, grata pelo ar mais frio lá fora. Sentindo-me melhor por isso.
— Belle! — Angelique chama do outro lado da rua. O carro esportivo
que Ezekiel está dirigindo está se afastando enquanto ela acena da janela.
Viemos em dois carros, já que não cabíamos todos em um. Eu esperava
voltar com ela, mas acho que isso não vai acontecer.
Eu forço um sorriso e aceno. Dou um passo, mas a mão de Jericho cai
pesadamente no meu ombro.
— Dex está puxando o carro ao redor.
— Não quero estar com você agora. — digo a ele, dando de ombros.
— Eu andarei. Preciso de um pouco de ar.
— Pelo amor de Deus. — ele começa, mas eu me afasto. O semáforo
muda e alguém buzina. Olho para a esquerda e sinto a presença de Jericho
às minhas costas como uma grande e pesada sombra. Eu não sei por que
importa que eu fique longe dele agora, mas importa. À medida que o
tráfego diminui, dou um passo em direção à rua. Assim que eu faço, meu
calcanhar fica preso em uma rachadura na calçada. Eu tropeço para frente,
ouvindo simultaneamente o guincho de pneus e alguém gritando meu nome
enquanto uma van faz a curva muito rápida e muito apertada, saltando
sobre o meio-fio. É a última coisa que vejo porque vem rápido demais para
eu gritar.
CAPÍTULO OITO
JERICHO
Eu chamo seu nome, agarrando seu braço. Estou puxando-a de volta
para o meu peito e fora do caminho da van metade na calçada, metade fora.
Ela passa na luz vermelha e acelera para longe. Não tenho certeza se é meu
coração ou o dela batendo entre nós enquanto a seguro para mim. Sinto o
cheiro de seu shampoo enquanto olho por cima de sua cabeça, procurando
o veículo batido com as janelas escurecidas por sacos de lixo colados neles.
Está indo rápido demais para eu conseguir mais do que alguns dígitos da
placa do carro. Quando sinto Isabelle começar a tremer em meus braços,
volto minha atenção para ela.
Ela olha para mim, olhos profundos de safira arregalados de pânico, os
brancos, rosa, a pele ao redor deles molhada.
— Você está bem? — Eu pergunto a ela.
Ela olha para mim.
— Isabelle. — Eu aperto seus braços.
Ela pisca, seus olhos entrando em foco. E um momento depois, seus
joelhos cedem. Eu envolvo meus braços ao redor dela enquanto ela me
agarra.
— Está tudo bem. Você está segura. — digo a ela, puxando-a para mim
novamente e procurando por Dex. Ele chega a uma parada brusca no meiofio segundos depois.
— Porra! — ele diz, pulando para fora do carro. — Ela está bem?
Eu balanço minha cabeça, não tenho certeza se ela está bem.
— Porra.
— Você conseguiu a placa? — Eu pergunto.
— Apenas os primeiros dígitos. — Ele olha para Isabelle, depois para
mim.
— Eu também. Deixe-me colocá-la no carro. — digo a ele, feliz por ela
não brigar comigo quando a coloco no banco de trás. Ela se inclina para
frente, o rosto nas mãos. Eu me pergunto se ela não vai ficar doente de
novo.
— Ele estava esperando. — diz Dex, a voz baixa. — Ele chegou alguns
minutos depois que todos entraram no café. Eu notei a van. Estava muito
fora de lugar aqui.
Olho para a esquerda, mas não há vestígios da van. Não que eu
esperasse que houvesse.
— Tudo bem. Vamos levá-la para casa.
Ele acena com a cabeça e eu subo ao lado de Isabelle. Eu esfrego suas
costas e ela se endireita, olha pela janela.
— Você está segura, Isabelle. — digo a ela, minha voz grossa. Se eu
não a tivesse agarrado a tempo… não. Não me deixo ir por esse caminho. —
Isabelle?
Ela se vira para mim, enxuga os olhos, mas as lágrimas continuam
caindo. — Eu não o vi.
Eu aceno, passo um braço sobre seus ombros e a puxo para o meu
lado. Ela não resiste e eu não digo a ela que não importa se ela o viu ou não.
Porque ele a viu.
— Meu calcanhar ficou preso. — diz ela. Ela tira uma sandália. Com
certeza, o calcanhar está danificado onde ela deve tê-lo enroscado na
calçada. Ela se vira para mim. — Obrigada por me salvar.
Eu a estudo. Percebo que ela não sabe que não foi um acidente. Não
foi ela tropeçando ou o motorista indo rápido demais e perdendo o controle
do veículo. Ele não perdeu o controle.
— Você nunca vai me deixar sair de casa novamente, não é? Eu vejo
isso em seu rosto.
— Eu só quero você segura, Isabelle.
— Foi um acidente. Eu estou segura.
— Vamos para casa.
— Por favor. Eu preciso… não posso viver trancada naquela casa.
Preciso ver meus amigos. Eu preciso de espaço. Liberdade. Você tem que me
dar alguma coisa.
— Você quase foi morta agora. Você acha que pode me dar um minuto
para pensar?
— Eu não…
Eu levanto minhas sobrancelhas e isso a impede. — Você teria
sobrevivido sendo atropelada por uma van? Porque se eu não tivesse tirado
você do caminho… — Eu paro. Não precisa dizer mais nada.
Ela abre a boca, fecha. — Por favor, Jericho. Por favor. — ela pede.
Implora. A voz dela é séria. Sem zombaria, sem ódio. Apenas desespero.
E não posso ignorá-la. Não posso negá-la.
Respiro fundo e expiro enquanto nos aproximamos da casa. Os
portões ainda estão abertos, então Dex passa.
— Por favor. — ela diz novamente, os olhos se enchendo de lágrimas.
Eu tomo outra respiração profunda, exalando lentamente. — Você
terá sua aula de violino em casa esta semana.
Ela olha para mim.
— Isso é o melhor que posso fazer. É pegar ou largar.
— Eu vou pegar.
— Bom. Quarta à noite, isso?
— Sim.
— Tudo bem. Quarta à noite. Vou precisar dos nomes de todos que
estarão na casa.
— Você quer números de seguro social também?
Eu sorrio, feliz por ouvir seu comentário rápido. — Se você os tiver,
isso me poupará tempo.
Ela balança a cabeça, mas está satisfeita por enquanto, embora ainda
esteja enxugando as lágrimas desonestas. — Obrigada.
Eu aceno em reconhecimento.
Quando entramos, ela me dá os nomes dos alunos que frequentam a
aula com ela, assim como seu professor. Quando digo a ela para subir e tirar
uma soneca, estranhamente, ela não discute comigo. Ela assente e sobe
para seu quarto para se deitar.
É uma prova do preço que o passeio do dia teve sobre ela. Ou um
testemunho do que quase ser morta faz com você. Eu me pergunto se
inconscientemente ela percebe que o que aconteceu não foi um acidente.
Naquela tarde coloco pessoas procurando a van que quase atropelou
minha esposa. Estou tentado a confrontar os Bishops, mas não o faço. Estou
feliz por Angelique não ter testemunhado o que aconteceu. Zeke havia
virado a esquina pouco antes.
O que me traz de volta a Zeke.
Ele deixou todo mundo e saiu imediatamente e é tarde quando ele
chega em casa. Eu me pergunto se ele está tentando me evitar.
— Irmão. — Eu chamo das sombras da sala de estar. Acendi uma
lareira e estou tomando um pouco de uísque enquanto observo as chamas,
ouço o estalar da madeira úmida.
Zeke se vira, enfia o telefone no bolso.
— Não consegui conversar muito durante o passeio da tarde. — eu
digo. — Uísque?
Ele leva um momento para assentir, caminhar até o fogo e sentar na
cadeira ao lado da minha. Ele se serve de um copo de uísque da garrafa na
mesa entre nossas cadeiras.
— Isabelle está bem? — ele pergunta. Dex o informou sobre o que
aconteceu depois que ele saiu.
Eu concordo. — Ela acha que foi um acidente.
— Mas você tem certeza que não foi. — Não é uma pergunta.
— Dex viu o homem chegar enquanto estávamos no café. Ele estava
esperando por ela.
— Você tem certeza que ela era o alvo?
Eu cerro os dentes. Eu sei de onde isso vem.
— Talvez tenha sido você. Não é mais provável? — ele pergunta.
Bebo meu uísque e observo o fogo. — Não dessa vez.
Fica em silêncio por um longo minuto.
— Você já se perguntou por que Zoë não deixou um bilhete? — Eu
pergunto a ele, não pronto para falar sobre papai. Sobre o que descobri na
Áustria.
Ele limpa a garganta, olha para o fogo quando eu mudo meu olhar
para ele. — Sim. É claro.
— Se ela tivesse dito por quê…
Uma sombra cruza seu rosto, ele olha para seu colo e gira o uísque ao
redor. Eles eram gêmeos, então não tenho certeza de quão diferente isso é
para meu irmão. Ele sente sua perda de forma mais aguda? Ele ainda sente
isso? Já faz mais de uma década.
— Ela ainda estaria morta. — ele finalmente diz.
— Mas se soubéssemos por que…
— Não importa. — ele estala, os olhos duros em mim. — Ela ainda
estaria morta.
— Eu ouvi você pela primeira vez.
— Você fez?
— O que você estava fazendo na Áustria no dia em que nosso pai foi
morto?
Está escuro demais para eu ler suas feições, mas juro que vejo um
lampejo de surpresa na maneira como sua boca abre e depois fecha. Ele ri,
levando o copo aos lábios e engole o resto do uísque. Ele se serve de outro.
Engole isso também. Seus movimentos são imprudentes de repente.
— É onde você estava?
Eu aceno, nunca tirando meus olhos dele.
— O que você fez, Zeke?
Ele balança a cabeça. — Você não a viu assim, não é? Só eu e minha
mãe.
Eu me afasto, culpado. Eu sei que ele está se referindo a Zoë. Para
quando ele a encontrou. Eu não estava em casa naquela noite. Eu não soube
o que aconteceu até dois dias depois, quando liguei meu telefone
novamente. Eu tinha o hábito de desaparecer. Fazendo viagens e
desaparecendo. Sempre fui bom nisso. Quando as coisas ficavam uma
merda em casa, eu saí. Quando papai bebia, eu saía. Zeke e Zoë estavam
presos, no entanto. Dezesseis. Muito jovem para fugir. Eles aguentaram os
humores sombrios de nosso pai. Seus castigos. Eles e nossa mãe.
— Você sabe como é uma pessoa que está pendurada por algumas
horas?
Eu engulo o conteúdo do meu copo sobre o nó na minha garganta.
— Não vou descrevê-la. Eu não quero que você veja isso em seus
pesadelos.
Eu me viro para ele. — Eu deveria estar aqui. — eu digo, a voz grossa.
— Eu deveria ter sido o único a encontrá-la. Ou o pai deveria ter.
— Não. Não pai. — Uma escuridão mais completa do que qualquer
outra coisa transforma seu rosto em algo diferente. Algo monstruoso. Ou
talvez seja o fogo pregando uma peça em mim.
— Então eu.
Ele balança a cabeça. — Tinha que ser eu. Há uma razão para isso.
Talvez ela tenha planejado isso. Não sei. — Ele olha para o fogo novamente.
— Ela tentou me dizer você sabe. Se eu pensar nisso, ela tentou.
— Tentou te dizer o quê?
— Eu encontrá-la foi minha punição.
— Do que diabos você está falando?
Ele inclina a parte de trás de sua cabeça contra a cadeira e olha para o
teto. — Papai mereceu o que aconteceu com ele. Zoë não. — Ele se levanta,
se vira para mim. — No que diz respeito à Áustria, cuidei do que precisava
ser cuidado. Assim como eu não posso questionar seus motivos com
Isabelle, você não pode questionar os meus no que diz respeito à Zoë. Você
não estava aqui. Você não a viu. Você não a cortou. Você não sabia o que ela
suportou. Então, se você quer bancar o detetive na Áustria, seja meu
convidado. Mas saiba que eu não sou diferente de você, irmão.
CAPÍTULO NOVE
ISABELLE
Jericho tropeça no quarto muito depois de eu ter adormecido, me
acordando quando ele bate em alguma coisa. Abro os olhos e vejo a sombra
dele no quarto escuro. Eu não me movo, mas observo enquanto ele tira suas
roupas, murmurando algo baixinho. Ele está bêbado. Eu posso ver isso na
maneira como ele se move. Quando ele sobe na cama um momento depois,
eu sinto o cheiro.
— Eu sei que você está acordada. — diz ele.
Eu rolo para o meu lado para encará-lo. — Você se foi durante a noite.
— eu digo.
Ele olha para o teto, pisca sem comentários. Não tenho certeza se ele
está me ouvindo. Ele parece distraído.
— Você estava com Julia? — Não sei por que pergunto. Eu realmente
não acredito que ele estava. Mas o perfume dela grudado nele, não sei, não
gostei. Lembro-me de como ela agiu quando ele nos encontrou conversando
na capela. Lembre-se dela perguntando sobre o sexo. E eu simplesmente
não gosto.
Ele se vira para mim. — Você acha que eu dormiria com Julia Bishop?
Eu não gosto de como isso soa. As palavras lá fora assim. — Você fez?
— Não seja ridícula, Isabelle. Vá dormir.
Sento-me em um cotovelo quando ele rola de lado para longe de mim.
— Não é tão ridículo. Ela é uma mulher bonita. Mais perto da sua idade.
Mais sofisticada que eu. Mais experiente. Mais…
Eu não consigo terminar porque ele rola para trás, agarra meus braços
e me tem nas costas, montando em mim.
— Essa mulher é uma pária. A única parte do que você disse que é
verdade é que ela é mais próxima da minha idade e não precisaria de muito
para ser mais experiente do que você, não é?
— Por que você sempre tem que ser um idiota?
— O resto é besteira. Você? Você é honesta. Você traz luz. Você é luz.
É o que esta casa precisa. O que eu… o que Angelique precisa.
Eu pisco, vejo sua expressão mudar como se ele tivesse processado o
que disse. Não sei quem está mais surpreso, ele ou eu. Mas então ele
estraga tudo.
— Você disse que não estava com ciúmes. — ele provoca soando
como seu pau habitual. — Você estava mentindo?
— Eu acabei de…
— Não me diga que você me quer só para você, Isabelle.
— Se você está fodendo outra pessoa eu preciso saber. É para me
proteger. Isso é tudo.
Ele se abaixa até os cotovelos em cada lado do meu rosto e descansa
uma mão em cima da minha cabeça.
— Você é minha esposa. Eu só estou fodendo você. Não tenho
interesse em foder ninguém além de você. E falando em… — ele para,
abaixa a cabeça mais perto e roça a sua mandíbula na minha bochecha.
Cutucando minha cabeça um pouco para que sua boca esteja no meu
ouvido.
— Você está bêbado. — eu digo fracamente. Eu já estou excitada.
— Não tão bêbado. — diz ele e lambe a concha da minha orelha
enquanto desliza uma mão sobre minha barriga, em minha calcinha e segura
meu sexo. — Não tão bêbado que não posso fazer você gozar. Porque você
sabe o que eu amo?
— O quê? — Eu pergunto em uma respiração. Ele está fazendo aquela
coisa com os dedos que me deixa louca.
— Adoro ver seu rosto quando você goza. Adoro ouvir você sussurrar
meu nome e morder o lábio quando goza.
Fecho os olhos e mordo o lábio. Eu sempre faço isso?
— Sim. Assim. — ele diz e empurra minha blusa de lado para levar um
mamilo em sua boca.
Eu grito assim que ele faz isso, dentes, lábios e língua molhados e
duros e macios ao mesmo tempo. Quando ele puxa meu mamilo e enrola os
dedos dentro de mim. Encontro-me ofegante, agarrada a ele, envolvendo
um braço em volta do seu pescoço para puxá-lo para mais perto. Eu o
seguro quando a onda de orgasmo começa a me levar para baixo.
Minha âncora.
— Mais um, querida. — ele diz quando eu posso respirar novamente.
— Vire-se. — Ele não espera que eu faça isso. Ele se levanta apenas o
suficiente para me rolar de bruços. Suas mãos estão em meus quadris e ele
está de joelhos, puxando-me para o meu.
Eu arqueio minhas costas enquanto ele se acomoda entre minhas
pernas abertas e me abre.
— Você é linda pra caralho, sabia disso? — ele diz. Olho por cima do
ombro para encontrá-lo olhando para mim, uma fome crua em seus olhos.
— Perfeita. — ele acrescenta e abaixa a cabeça para passar a língua sobre
meu sexo e depois minha bunda, antes de se endireitar para me atrair para
ele, entrando em mim em um passo longo e profundo.
Eu puxo uma respiração audível. É tão bom tê-lo dentro de mim. Para
ser esticada por ele. Para ele.
— Você vai me ver foder você? — ele pergunta, respirando
irregularmente enquanto ele se move dentro de mim.
Eu aceno, descansando minha bochecha na cama, com a boca aberta.
— Bom. Não olhe para longe. Eu preciso ver seu rosto. Seus olhos. —
diz ele. Um momento depois, quando ele empurra em mim, eu o sinto no
meu buraco traseiro, empurrando um dedo dentro de mim.
Eu gemo.
Ele engancha seu dedo, me puxando um pouco para cima, sua outra
mão apertada no meu quadril enquanto ele empurra mais forte, mais
rápido. O suor escorre pelo seu rosto nas minhas costas e eu me apoio nos
cotovelos para me preparar para suas estocadas.
Eu gosto disso. Ele me levando assim. Eu não deveria. Deveria odiá-lo.
Mas quando ele desliza uma mão entre minhas pernas eu paro de pensar
nisso. Paro de pensar completamente. Eu preciso disso. Preciso dele assim. E
eu me deixo ter esse momento, esse alívio da realidade.
Eu sou sua. E há momentos em que quero ser dele. Mesmo depois de
tudo. Para deixá-lo ser minha âncora. Para deixar ir e me entregar a ele.
CAPÍTULO DEZ
ISABELLE
Quando acordo várias horas depois, estou sozinha na cama.
— Jericho? — Eu pergunto, mas ele não está no quarto ou no
banheiro. Empurro os cobertores, puxo a camisa que ele descartou mais
cedo e abro a porta. O corredor está escuro. É o meio da noite. Eu rastejo
escada abaixo descalça, abotoando dois dos botões de sua camisa e
envolvendo meus braços em volta de mim para me aquecer. A casa sempre
parece fria por dentro. Deve ser o mármore.
Dentro da grande lareira na sala de estar estão os restos de um fogo
moribundo. Sinto o cheiro e posso ver o brilho vermelho profundo enquanto
passo. Se ele estava aqui, não está mais.
— Jericho? — Eu tento novamente em silêncio. Nada.
Ando pelos quartos do primeiro andar, mas ainda não o encontro até
chegar à pesada porta de aço que leva ao porão. Ela está aberta e posso ver
a luz fraca de uma única lâmpada nua no andar de baixo. Ele deixou a chave
na fechadura. Não é como ele. Muito descuidado. Ele não arriscaria que
Angelique viesse aqui. Especialmente à noite.
Embora ele estivesse bêbado antes. Talvez ele se levantou e bebeu um
pouco mais. O que eu sei?
Dou o primeiro passo me abraçando mais apertado enquanto desço
para o porão, a memória da noite que passei aqui me fazendo estremecer.
Eu deveria ligar para ele. Avisar que estou chegando. Mas eu não faço um
som, meus passos são cuidadosos.
Lembro-me da outra vez em que estive aqui. Como ele ameaçou me
deixar naquele quarto ou me trazer de volta para me punir. Lembro-me do
homem que conheci naquela primeira noite. Meu diabo com chifres.
Lembro-me dele me despindo, mas me dando sua camisa para vestir. Mas
também me lembro dele trancando a porta e indo embora quando sabia
que eu ficaria apavorada.
Esse era o ponto. Eu não deveria esquecê-lo.
— O que você está escondendo? — Eu o ouço dizer assim que me
aproximo da base da escada. A maneira como as escadas são muradas, você
não pode ver em nenhuma direção do corredor até que esteja devidamente
no porão. A luz no teto pisca, mas o corredor à direita está escuro. Esse é o
lado em que eu estava. Lembro-me do outro lado. Como estava escuro.
Eu gostaria de colocar sapatos ou pelo menos meias, enquanto dou
um passo em direção ao outro corredor. Estão vários graus mais frio aqui
embaixo e a única luz fraca vem da porta aberta de um quarto bem no
fundo.
— Jericho? — Eu digo, minha voz baixa demais para ser ouvida.
Nada.
Nada além de um barulho atrás de mim que me faz pular. Faz meu
coração cair no estômago.
Apenas a casa se acomodando. É uma casa velha. Isso é tudo o que é.
Eu continuo. Sei que ele está na sala no final. Eu ouço seus murmúrios.
Veja sua sombra cair pelo corredor enquanto ele caminha de um lado da
sala para o outro. E me vejo correndo, longe demais da escada para voltar
correndo, apavorada demais para ficar onde estou. Porque não estamos
sozinhos aqui. Eu sinto. Sinta a presença gelada conosco.
Mas quando chego à porta do quarto, paro. Eu o vejo lá dentro, de
costas para mim. Ele está vestindo nada além de um par de moletom, então
eu tenho uma visão completa da tatuagem do dragão gêmeo. É enorme e
espetacular, mas não foi isso que me chamou a atenção. Pela primeira vez
desde que conheço Jericho St. James, vejo-o perdido.
Ele ainda não me notou. Ele está sentado em uma cama de ferro
forjado que deve ter cem anos. Mais velho. Isso faz com que o quarto em
que eu estava trancado pareça novo. O colchão é moderno e não combina
muito com ele. Ele paira sobre o lado alguns centímetros. Uma garrafa de
uísque quase vazia está na mesa de cabeceira. Já o vi bêbado antes. Não é
bonito. Mas esta noite é diferente. Há uma escuridão nele. Uma sombra.
Uma tristeza.
Eu percebo o que é diferente. Ausência de sua raiva. Algo sobre isso,
como ele está sentado sozinho e um pouco perdido, faz meu coração
apertar. Faz doer.
Ele está olhando através de uma caixa, uma velha caixa de madeira
que deve ter sido pintada de rosa uma vez. De dentro, ele está tirando folha
de papel dobrada após folha de papel dobrada.
— Cadê? — ele pergunta. — Onde você deixou?
Olho ao redor da sala e sinto o cheiro rançoso e velho de fumaça de
cigarro de anos atrás. Eu vejo a casa de bonecas. Barbie. Eu tive uma
semelhante crescendo, mas essa é um pouco mais velha. Não muito
embora. Há uma pequena mesa no canto, o desenho de mosaico colorido
em cima agora apenas velho e quebrado. Parece algo que pertence a um
jardim. Ao lado, uma simples cadeira de madeira.
— Onde? — ele diz novamente.
Eu entro no quarto. — Jericho?
Ele olha para mim e fica de pé em um instante. Percebo que ele leva
um minuto para perceber que sou eu porque sua expressão está diferente
naquele momento.
— Você não deveria estar aqui embaixo. Volte para cima. — ele diz, a
voz como cascalho.
Olho ao redor da sala, vejo um crucifixo pendurado torto em um
prego. Também noto uma foto na parede oposta. O que quer que estivesse
emoldurado lá dentro, agora amarelado e desbotado.
— De quem é este quarto? — Eu pergunto.
— Ninguém. Vá para cima. — Ele se senta novamente, toma um gole
da garrafa e abre a gaveta do criado-mudo, começando a vasculhá-la.
— O que você está procurando? — Eu pergunto, dando alguns passos
em direção a ele. Não tenho certeza do que fazer com ele assim.
— Nada. — diz ele.
Ele fecha a gaveta e olha para a caixa novamente. Está aberta, os
pedaços de papel espalhados na cama. Ele começa a colocá-los de volta na
caixa, mas quando termina, em vez de fechá-la e guardá-la, ele a pega e
como se de repente ficasse furioso, a arremessa pela sala.
Solto um grito, pulando para trás.
Ele colide com o único quadro na parede. A caixa cai no chão, a
moldura balançando em um único prego.
— Foi aqui que elas fizeram isso. Ambas. — Ele balança a cabeça, olha
para cima e aponta. — A viga suspensa.
Eu também olho para cima e estremeço quando vejo a antiga viga de
madeira que se estende de parede a parede.
— Viga suspensa? — Eu pergunto.
— Essa é a cadeira em que Zoë estava. Não sei por que ainda está
aqui. Por que não queimamos. Eu não sei o que diabos Mary usou. Não sei
por que Zoë trouxe essas coisas aqui. Eu não sei nada disso.
— Jericho? — Eu o sigo quando ele se senta e pega a garrafa.
— Por que diabos alguém iria querer estar aqui?
Eu engulo, sento ao lado dele e pego a garrafa. Eu o coloco de lado,
mas mantenho a mão dele.
— Venha para cima comigo. — eu digo.
Ele pisca como se estivesse tendo dificuldade em manter os olhos
abertos. Eu me pergunto a quão cheia aquela garrafa estava antes. — É
melhor eu nunca te encontrar aqui embaixo, Isabelle.
Minha boca se abre. Ele acha que eu me enforcaria? É isso que ele está
dizendo? — Suba as escadas.
— Zeke sabe. — diz ele. — Ele sabe por quê. Eu sei que ele sabe.
Deito minha cabeça em seu ombro e aperto sua mão.
— É por isso que ele matou o papai.
Isso me assusta e eu me afasto. — O quê?
Ele coloca a cabeça nas mãos. — Por quê? — ele ruge.
— Você está bêbado, Jericho. Você não está pensando direito.
Ele se levanta, caminha até onde a caixa está quebrada no chão, as
notas espalhadas. Ele fica no meio da bagunça e balança a cabeça.
Eu me levanto, vou até ele. Pego uma de suas mãos e a pressiono na
minha barriga.
— Leve-me para cima. Estou cansada, com fome e está frio aqui
embaixo. O bebê…
Ele olha para mim, boca aberta, testa franzida. Ele pressiona minha
barriga suavemente e coloca sua testa no meu ombro.
— Eu não entendo por quê. — ele diz, eu não sei se são suas palavras
ou o tom delas que parte meu coração em dois.
— Está bem. Vamos lá para cima.
Ele se endireita em toda a sua altura, olha para mim, me estuda por
um longo momento. — Seu nome significa promessa. Você conhece isso?
Estou surpresa que ele saiba disso. — Promessa de Deus. — eu digo.
— Minha mãe escolheu.
— Foda-se Deus. Não existe a porra de um deus e se existe, ele não
merece sua afeição. — Ele balança a cabeça, fecha os olhos, em seguida,
passa a mão em seu cabelo e abre os olhos. — O bebê. Espero que não seja
uma menina. As meninas St. James… tem história, sabe? Não quero que se
repita.
— Não vai.
— Angelique. — Ele suspira.
— Não vai repetir…
— É isso que a história faz. — ele interrompe. — Isso se repete. Está
em uma porra de um loop sem fim.
Eu fico na frente dele, pego seu rosto em minhas mãos. — Olhe para
mim.
— Sem fim.
— Olhe para mim. — Ele faz. — Leve-me para cima. Eu não quero
estar aqui embaixo. Não é bom para o bebê.
Seus olhos se estreitam pensativamente, ele finalmente assente. Ele
segura meu rosto com uma mão, o polegar gentilmente na minha bochecha.
Ele beija minha testa, minha bochecha, minha boca.
— Prometo. — diz ele e pega minha mão. Ele me vira e assim que
estamos prestes a sair da sala, sinto uma corrente de ar fazer cócegas no
meu pescoço. Olhando para trás, vejo algo por trás da foto que ele torceu.
Um cubículo. Um lugar para esconder algo. E a borda do que parece ser um
colar de contas pendurado atrás da foto. Deve ter se soltado quando a caixa
bateu no quadro.
— Seus pés estão descalços. — diz ele, arrastando minha atenção para
longe. Ele me levanta antes de desligar a luz. Ele não fecha a porta, mas me
carrega para subir as escadas. — Eu não quero que você venha aqui
novamente. Entendeu? Não é seguro. É amaldiçoado, aquele porão. Eu não
quero você nele.
Eu aceno quando ele me coloca no chão na parte principal da casa. Eu
não quero estar lá embaixo.
Ele fecha a porta e eu o observo. Assisto a este gigante de homem que
está de volta a ser ele mesmo agora, alto e poderoso. A tatuagem de dragão
se movendo em suas costas enquanto ele tranca a porta e desliza a chave
única e grande no bolso de sua calça. Quando ele se vira para mim, o
homem que vislumbrei lá embaixo, o quebrado, ele se foi. Não, não foi.
Escondido da vista. Ele está lá. Eu o vi agora. Eu sei.
— Estou falando sério, Isabelle. Eu nunca quero você lá embaixo.
Estou sendo claro?
Eu aceno e meu estômago ronca alto. Só comi uma tigela da sopa
caldo de Catherine.
Jericho sorri. — Vou fazer um sanduíche para você. — Entramos na
cozinha e eu não solto minha mão da dele.
CAPÍTULO ONZE
JERICHO
Isabelle está grávida de cinco semanas. Eu me pergunto se o bebê foi
concebido na nossa noite de núpcias. Eu a observo quando voltamos da
visita do médico. Ela está distraída, sentada com Angelique repassando sua
aula de música. Mas é como ela disse quando descobriu. Ela tem dezenove
anos. Tenho certeza de que estar casada com um homem como eu, um
homem que era um estranho para ela e ter seu bebê não estava em sua lista
de coisas a fazer quando eu fizesse vinte anos.
Eu quis dizer o que eu disse embora. Eu vou cuidar dela.
Mesmo enquanto penso nisso, percebo o quão estranho isso soa.
Quão diferente de quando eu concebi este plano pela primeira vez.
Zeke está em viagem de negócios em Calgary desde a última noite em
que conversamos. Temos escritórios lá em cima, mas sei que é besteira. Ele
está me evitando depois da nossa conversa. Eu não o culpo.
Às nove horas em ponto a campainha toca. A excitação de Isabelle é
palpável quando chegamos à porta e encontramos Catherine convidando
seu pequeno grupo para o saguão. Eles estão claramente impressionados, se
não intimidados, pela casa. Eu vejo isso em seus rostos enquanto eles
colocam suas malas para tirar as jaquetas. Eles os entregam para Catherine,
que os entrega para a garota cujo nome eu sempre deixo de lembrar.
Isabelle saberia. Ela conhece bem a equipe. Ela passa o tempo conversando
com eles ao longo do dia e eles parecem gostar dela.
Ela encanta a todos com quem entra em contato. Sua natureza é doce.
Inocente. Eu entendo. Mas algo sobre seus relacionamentos me incomoda
também. É inveja talvez. Não que eu queira ser amigo do pessoal. Eu só
quero Isabelle para mim.
— Puta merda, garota. Se eu soubesse que você morava aqui, insistiria
que para sempre termos aulas na sua casa! — diz Megs do café enquanto
ela e Isabelle se abraçam. Megs está segurando duas caixas de padaria,
então é mais Isabelle abraçando ela. Eu me afasto e as observo.
Há uma outra garota. Ela é mais nova, talvez dezesseis, dezessete.
Maria. Em seguida, o irmão mais velho de Maria, John. Eles também
abraçam Isabelle.
Eu limpo minha garganta e Isabelle se vira para mim. Sorrio para o
grupo e coloco a mão nas costas da minha esposa. O sorriso parece forçado.
— Hum, este é Jericho. — diz ela.
Eu espero. Mas quando não vem mais nada, acrescento. — O marido
de Isabelle.
Há uma clara confusão de Maria e John, mas depois de um olhar
quieto e estranho trocado entre eles, eles sorriem e apertam minha mão.
Megs se aproxima de mim. Ela está mais solta, mais confiante. Menos
intimidada.
— Bom te ver de novo, Jericho. Como sua filhinha gostou da
confeitaria?
— Amou. Não consigo açúcar suficiente.
— Bem, isso é bom. — diz ela e estende uma das caixas para mim. —
Porque isso é para ela. Ela ainda está acordada?
Eu pego a caixa. — Infelizmente não. A hora de dormir foi meia hora
atrás. Vou me certificar de que ela receba de manhã.
— Excelente. — Ela se vira para Isabelle. — E estes são para nós. —
Isabelle espia dentro da caixa. — Ah, bolinhos de limão. Meu favorito.
Obrigada, Megs.
— Sem problemas. Estou feliz em vê-la de volta com o grupo.
— Falando em… onde está Paul? — Isabelle pergunta.
Paul Hayes é o professor deles. Vinte e oito anos, durante o dia ele é
professor em uma escola particular de música chique da cidade. Ele é um
violinista que deveria ser muito bom. Não que eu saiba muito sobre isso,
isso é apenas baseado em sua biografia que ele provavelmente escreveu. Fiz
verificações de antecedentes em todos eles.
— Ele estava bem atrás de nós, mas foi pego em um semáforo. —
Assim que Megs diz, a campainha toca novamente. — Falando no diabo.
John, que está mais próximo da porta, abre, revelando Paul Hayes.
Só que este não é o Paul Hayes que vi nas fotos.
— Paul! — Isabelle corre para abraçá-lo e imediatamente meus pelos
se arrepiam. Nenhum dos outros teve esse tipo de recepção dela. Mas não é
só isso.
— Desculpe o atraso. — Paul diz, mantendo um braço ao redor dela
enquanto eles se separam. — Fui pego em um semáforo e tive que parar
para abastecer o carro.
Ele é mais ou menos da minha altura. Talvez uns dois ou três
centímetros mais baixo. Ele está mais magro do que costumava ser,
também. Muito mais magro. As fotos de Paul Hayes que encontrei o tinham
cerca de trezentos quilos mais pesado.
— E, quase esqueci. — diz ele.
Ele não.
Ele enfia a mão no bolso para tirar uma barra de chocolate triangular.
O sorriso de Isabelle cresce enorme.
— Vi que eles os tinham na estação, então peguei um para você. Eu sei
o quanto você ama isso.
— Eles são meus favoritos! Obrigada! — Ela pega a barra. Toblerone.
Faço uma nota mental. E então eles se abraçam novamente.
Dou um passo em direção à minha esposa e vejo minha própria
sombra cair sobre ela. Eu limpo minha garganta, fecho minha mão em volta
de seu pescoço.
— Eu sou o marido de Isabelle. Jericho St. James.
— Jericho. — Isabelle começa, mas para quando eu a afasto de Paul e
a aproximo de mim.
Paul limpa a garganta, cola um sorriso no rosto. — Acabei de saber
que você se casou. — diz ele, metade para ela, metade para mim. —
Parabéns. Você é um homem de sorte. — Ele estende a mão e eu olho para
ela, para os dedos longos, a pele macia de um violinista. A borda puída de
um suéter de cashmere. Tenho certeza que ele nunca deu um soco em outro
homem.
— Você é o professor dela. — eu digo, apertando sua mão com mais
força do que eu preciso.
— O primeiro e único. — Ele se vira para ela. — Até onde sei. — Ele
pisca. E eu quero quebrar a cara dele.
— Você perdeu peso recentemente, Paul? — Eu pergunto.
Ele limpa a garganta novamente, aquele sorriso caloroso que ele
parece reservar para minha esposa vacilante.
— Oh meu Deus. Sinto muito, Paul. — Isabelle diz, se desculpando por
mim. Inacreditável.
— O quê? É uma pergunta justa. — eu defendo.
— Não, está bem. Eu fiz, na verdade. — diz Paul. — Com a cirurgia e o
apoio da minha família e de alguns dos melhores médicos e enfermeiros da
cidade, perdi mais de duzentos quilos.
— Ele tem uma vontade de ferro porque é capaz até de resistir às
minhas guloseimas. — Megs diz e vem entre nós para abraçar Paul. Percebo
que o sorriso que ele dá a ela é diferente do que ele tinha para minha
esposa. Seu abraço mais curto.
— Por aqui. — diz Catherine, o grupo a segue até a biblioteca.
Isabelle se vira para mim, escorregando do meu alcance. — Que
diabos? Isso foi tão rude.
Eu arrasto meu olhar da parte de trás da cabeça de Paul Hayes com
seu cabelo loiro elegantemente bagunçado para Isabelle. — Ele quer foder
você.
— O quê?
— Ele. — eu digo, apontando na direção que eles foram. — Quer-te
foder. — Eu aponto para ela.
— E você pode avaliar tudo isso pelos trinta segundos que passou com
ele?
— Conheço homens, Isabelle. Você deveria ter me contado.
— Te dizer o que exatamente?
Meu olho se contrai. — Que ele não pesa trezentos e cinquenta quilos.
— O que há de errado com você? — ela pergunta e balança a cabeça.
— Estou indo. — Ela se afasta. Tenta. Mas eu agarro seu braço e a puxo de
volta. Ela olha para mim. — O quê? — ela estala.
— Existe algo entre vocês dois?
— Eu e Paul? Ele é meu professor. Isso é tudo. Seriamente. O que há
de errado com você?
— Isso não é tudo. Há algo que eu deveria saber? Porque você é
minha esposa agora. Isso significa alguma coisa.
— Você me forçou a ser sua esposa, lembra?
Eu aumento meu aperto quando ela tenta se soltar. — Você é minha
esposa. Você está carregando meu filho, mas grávida ou não, eu não
compartilho.
— Não é verdade quando se trata de Kimberly. — ela retruca, ela sabe
que está errada em dizer isso no momento em que as palavras saem de sua
boca. Eu vejo isso no rosto dela. — Merda. Desculpe. Eu não quis dizer isso.
Eu pisco, respiro fundo. A verdade é que não penso em Kimberly há
dias. Não como eu costumava fazer de qualquer maneira.
— Sinto muito. — ela diz novamente, pensando que é o comentário
dela que me chateou.
— Está bem. Você tem razão. — Eu a arrasto para trás, prendendo-a
entre a parede e eu. Eu deixo meu olhar vagar por seu rosto. Ela não está
usando um ponto de maquiagem e ela é tão bonita. Mais agora que ela está
grávida mesmo com as sombras sob os olhos depois da nossa longa noite. —
Você é minha. Você sabe disso, não sabe?
Ela pisca, sobrancelhas se juntando como se estivesse confusa. Algo
terno passa por seus olhos, mas desaparece no instante seguinte,
substituído por uma dureza. — Eu sou sua porque você quer alguma coisa.
— Você é minha porque eu quero você.
— E você está acostumado a pegar o que quiser. Conseguindo tudo o
que você quer, não é?
Deslizo minhas mãos por seus braços até seus pulsos e os arrasto
sobre sua cabeça, prendendo-os na parede. Seus olhos escurecem enquanto
ela lambe os lábios, seu corpo se preparando como se estivesse em
antecipação.
— Eu sou. — eu digo sombriamente. — E grávida ou não, Bishop ou
não, vingança ou não, você é o que eu quero. Lembre-se do que eu lhe disse.
Qualquer homem que tocar em você, eu cortarei suas mãos. Isso inclui meu
irmão. Isso inclui Paul Hayes. Qualquer. Cara.
Sua garganta trabalha para engolir e o pulso em seu pescoço lateja.
— Você é minha. Diga.
Sua boca abre, fecha.
— Diga, Isabelle.
— Sou sua.
— Só minha.
— Apenas sua.
Eu a beijo com força, liberando um de seus pulsos para segurar a parte
de trás de sua cabeça e puxá-la para mim. Os dedos da minha outra mão se
entrelaçam com os dedos dela. E eu percebo o quanto o que eu disse é
verdade. Ela é minha. Grávida ou não. Bishop ou não. Vingança ou não.
Isabelle é minha.
Só minha.
Ela só será minha.
CAPÍTULO DOZE
ISABELLE
Estou corada quando entro na aula. Peço desculpas a Paul novamente
por Jericho, mas estou distraída durante as duas horas de aula. Estou
envergonhada de como Jericho se comportou com Paul, mas não é isso que
me distrai. É a nossa conversa. O que ele disse. O que eu disse.
Ele me quer.
Grávida ou não. Bishop ou não. Vingança ou não. Eu sou dele.
Quando a aula acaba e todos se preparam para sair, eu meio que
espero que Jericho esteja de pé no corredor esperando por mim com o
ouvido na porta. Não tenho certeza se não estou um pouco desapontada
quando ele não está.
Todos vão embora, mas Paul fica para trás.
— Sei que ainda te devo algumas aulas, mas devo enviar-lhe um
cheque em uma semana ou mais. Eu tenho um emprego agora, mas as
coisas estão… estranhas.
— Você não me deve. Estamos quites.
— Não, acho que estou três lições atrasada. Sei quem eu sou. Eu
acompanho. E eu quero pagar por aquelas que eu perdi também. Eu sei que
você tem outros alunos que querem minha vaga…
— Eu não vou te expulsar, Isabelle. Além disso, você nos deixando
usar sua casa é ótimo. Economizo no aluguel de uma sala na faculdade.
— Não. Eu te pagarei. Assim que eu puder.
— Sem problemas.
— Você é doce. Ei, me desculpe novamente pelo que aconteceu.
— Está bem. Minha perda de peso não é segredo. — Ele olha por cima
do meu ombro e se aproxima. — É só que toda essa coisa de casamento
surgiu do nada. E ele parece bastante possessivo com você. Você está bem?
— Sim. Estou bem.
— Você tem certeza?
— M-hum.
Ele me estuda como se estivesse tentando avaliar se estou mentindo.
Eu não estou. Na verdade, não.
— Ok. — ele finalmente diz. — Contanto que você esteja bem. Fiquei
surpreso quando Megs me disse que você era casada. Quer dizer, eu nem
sabia que você estava namorando alguém.
— Foi… repentino.
Ele acena com a cabeça, me estuda. — Vou te mandar ingressos para o
show. Ainda estamos combinados? Você estará lá?
— Show?
— Você esqueceu?
Eu penso, então balanço a cabeça. — Merda. Não, eu não esqueci. O
tempo tem passado tão rápido. — Paul está tocando em um quarteto em
um pequeno teatro. É uma de suas primeiras aparições públicas.
— Bom. Um bilhete ou dois?
— Hum… — Eu sei que ele tem que comprar os ingressos e não quero
que ele desperdice seu dinheiro caso eu não consiga chegar lá. — Posso
comprar os ingressos.
— Não, você é minha convidada. Vou enviar apenas dois. Para que
seu marido não fique irritado. — Ele pisca como fez antes.
Eu rio mais por nervosismo do que por qualquer outra coisa e olho
para trás.
Ele abre a porta, nós olhamos para a chuva. Ele se vira para mim e me
puxa para ele para um abraço. Eu o abraço de volta. Eu nunca pensei em
Paul como outra coisa além de meu professor. Não estou atraída por ele.
Nunca estive. E o sentimento é mútuo. Eu penso.
— Vejo você na próxima semana. — eu digo, recuando quando o
abraço dura mais do que o normal. Ele sempre me segurou assim? Ou é
Jericho que me deixa paranoica?
— Vejo você então.
Fecho a porta quando ele sai e volto para o vestíbulo. É tranquilo, os
quartos do primeiro andar, escuros. Eu ainda espero que Jericho saia de
algum canto e me surpreenda, mas ele não o faz. Então, eu vou para a
biblioteca. Vou limpar antes de ir para a cama. Mas eu pulo no instante em
que entro, porque falo do diabo e lá está ele.
Meu marido.
Ele está sentado na grande cadeira de couro onde Paul estava sentado
e as outras cadeiras menores ainda estão dispostas em um círculo ao redor
dela. Ele está com meu violino nas mãos.
— Você me assustou. — eu finalmente digo, esperando parecer um
pouco normal. — Por que você está sentado aqui no escuro? — Ele está sem
a jaqueta, as mangas da camisa enroladas até os antebraços, os dois
primeiros botões desabotoados.
— Não está escuro. Está como você deixou. Ambiente, eu acho?
— O quê? — a sala está fracamente iluminada por três luzes suaves.
Desativamos as mais brilhantes. — É melhor para o humor quando estamos
tocando.
— Paul gosta mais assim?
— Você está sendo uma criança. — eu digo e pego uma bandeja.
— Sente.
Eu olho para ele. — Vou limpar e depois vou para a cama.
— Sente-se, Isabelle.
Coloco a bandeja na mesa e me sento em frente a ele, sentindo a
submissão da minha posição na cadeira menor, ele na posição dominante na
grande cadeira de couro. Não parecia assim antes, quando Paul estava
sentado lá.
Ele estende o violino para mim. — Toque.
— Eu não posso apenas tocar sob demanda. — Eu começo a me
levantar. — Preciso limpar. Estou cansada depois das aventuras de ontem à
noite. — É um golpe baixo. Eu sei isso. Ele estava chateado ontem à noite,
não apenas bêbado, mas ferido. Eu não me desculpo, porém, evito meu
olhar enquanto pego a bandeja novamente.
Um momento depois, ele está de pé, mão em volta do meu braço,
meu violino e arco pendurados frouxamente na do outro.
— Você vai tocar para ele, mas não para mim?
— Você é ciumento?
Ele bufa, colocando minhas coisas no chão. Ele me gira, então estou
olhando para longe dele e me inclina sobre o braço alto do sofá de couro.
Meu rosto está no banco, minha bunda no ar.
— O que você está fazendo? — Eu tento me levantar, mas ele me
mantém presa.
— O que eu disse-lhe? — ele pergunta, levantando minha saia,
empurrando minha calcinha para baixo. Não há nenhuma cerimônia nele.
Ele está desnudando minha carne para seu uso. E é estranhamente excitante
quando deveria ser apenas degradante.
Eu alcanço para trás para empurrar minha saia sobre minha bunda. —
Jericho…
— Isabelle. — diz ele, capturando meus pulsos e segurando-os em
uma mão. Ele vira a saia para cima e se inclina para que seu calor esteja nas
minhas costas, sua respiração no meu ouvido. — O que eu disse-lhe?
Eu posso senti-lo. Ele está duro.
E estou excitada.
Com a mão livre, ele segura minha bunda, dedos cavando na carne. —
O que. Eu. Disse. Para. Você?
— Eu sou sua. — eu digo, virando minha cabeça para que eu possa vêlo.
Ele balança a cabeça, satisfeito e se endireita. Mantendo-me de
bruços, ele olha ao redor. Eu não sei o que ele está procurando, mas um
momento depois, ele se inclina em direção à mesa lateral onde o bolinho
meio comido de alguém está em um prato. Ele pega a manteiga com dois
dedos.
— O que você está fazendo? — Eu pergunto, tentando me livrar
quando ele o esfrega na fenda da minha bunda.
— Lubrificando você. Você vai me agradecer em um minuto. — ele diz
e então ele está esfregando a manteiga em mim.
Cada músculo fica tenso. Instinto.
— Relaxe, Isabelle.
— Não aí.
— Aqui. Eu me lembro de que você gozou duro na última vez que fodi
sua bunda. — Ele mantém seus dedos em mim e libera meus pulsos. —
Coloque as mãos no sofá.
— Não.
— Não? Deixe-me colocar de forma diferente então. Mantenha suas
mãos no sofá e eu deixo você gozar. Não e eu não vou. De qualquer forma,
estou fodendo este pequeno buraco apertado. Qual você escolhe?
— Eu não…
— Escolhas, Isabelle. Lembra? O que é a sua? Gozar ou não. Não
importa muito para mim de qualquer maneira.
Eu estico meu pescoço para olhar para ele e lentamente deslizo
minhas mãos para o assento do sofá.
— Inteligente. Agora. — Ele volta sua atenção para minha bunda. —
Relaxe. — Ele desliza os dedos de sua mão agora livre entre minhas pernas
para encontrar meu clitóris e no instante em que ele faz, eu faço o que ele
quer. Relaxo.
Ele leva seu tempo esfregando meu clitóris enquanto desliza os dedos
na minha bunda, esticando-a, espalhando lubrificante dentro dela. Por mais
que eu queira odiá-lo, odiá-lo me tocando assim, eu vou gozar. Eu vou gozar
duro quando ele estiver dentro de mim. Lembro-me da última vez. Como
doeu no começo. Quão duro eu gozei depois.
Eu sei que ele me considera pronta quando ele puxa os dedos e eu o
ouço abrindo o zíper da calça. Eu me preparo. Ele desliza seu pau na minha
boceta uma, duas vezes estou aberta para ele. Excitada o suficiente para que
eu me estique facilmente. Espero que a outra passagem se estenda com a
mesma facilidade. Ele puxa para fora e traz seu pau para aquela entrada. Eu
fico tensa e ele esfrega a parte inferior das minhas costas.
— Relaxa.
Eu concordo. Esta é a parte mais difícil. É a parte mais grossa que
tenho que pegar. Então eu fecho meus olhos e tento não lutar contra a
intrusão antinatural. Dói no início, um momento de queimadura, mas depois
ele entra, a manteiga lubrificando seu caminho. Ele não vai devagar, não me
pega centímetro por centímetro. Ele desliza todo o caminho, eu me ouço
gemer enquanto seus dedos brincam com meu clitóris.
— Tão apertada. — Sua voz é áspera, crua.
Eu arqueio minhas costas enquanto ele bombeia lentamente, em
seguida, tira os dedos do meu clitóris para agarrar meus quadris, puxando
minhas nádegas.
— Para eu não ficar irritado? — ele pergunta quando eu olho para
trás. Ele encontra meus olhos e empurra com força.
Eu suspiro, meu corpo ficando rígido.
— Foi isso que ele disse? — ele pergunta, desenhando e repetindo.
— Isso machuca.
— E o que você disse a ele?
Eu fecho meus olhos, tentando me preparar para dar outro golpe
punitivo, não pronta quando vier.
— Por favor!
— Olhe para mim.
Eu balanço minha cabeça.
Ele empurra novamente.
Eu grito, sinto as lágrimas queimarem meus olhos quando me viro
para olhar para ele. Ele ouviu tudo. E eu sei que estava errado.
— O que você disse quando ele disse isso? — ele pergunta, puxando
para que apenas a ponta fique dentro de mim. Eu sei que vou levar pelo
menos mais uma. E talvez eu mereça.
Eu engulo, não posso responder.
— Você riu. — diz ele e entrega seu impulso mais punitivo ainda.
— Eu sinto muito. Eu não sabia o que dizer. Como reagir.
— Eu posso te dizer como não reagir. Não ria quando algum idiota está
dando em cima de você e tentando menosprezar seu marido.
Eu concordo. Ele tem razão.
— Eu sinto muito. Eu estou. Por favor.
— Você vai levar meu pau na sua bunda, mas você não vai gozar. Esse
é o seu castigo. Abra suas pernas. Eu não quero que você acidentalmente se
desfaça.
Eu faço. É um preço pequeno a pagar. E quando ele está satisfeito, ele
me leva e eu quero gozar. Eu quero gozar tão forte. Eu quase. Tudo o que
seria necessário seria o toque mais leve dos meus dedos no meu clitóris.
— Por favor. — eu digo em voz baixa enquanto seus impulsos ficam
mais fortes, mais profundos, eu me encontro com eles. — Por favor, deixeme gozar.
Eu deslizo uma mão entre as minhas pernas e ele a agarra, depois a
outra e as segura na parte inferior das minhas costas.
— Não. — diz ele, inclinando-se sobre mim enquanto me fode.
— Por favor. Eu sinto muito. Por favor.
Ele sorri, os olhos escuros. — Você está me implorando, Isabelle?
Eu concordo. Eu nem me importo.
— Tudo bem. Depois.
Depois?
Ele se endireita, segura meus pulsos e olha para nós, observa. Quando
ele engrossa dentro de mim, ele coloca seu peito nas minhas costas. Eu sinto
o estrondo dele, a pele escorregadia de suor enquanto ele pega o que quer
de mim, me usa e me enche enquanto seu pau pulsa em sua liberação.
— Foda-se. — ele consegue com a voz rouca enquanto lentamente se
endireita, puxa para fora. — Não se mova.
Eu observo enquanto ele pega um guardanapo usado e limpa seu pau
antes de se enfiar de volta em suas calças. Ele se vira para mim, olha para
mim espalhada para ele. Seu gozo vazando de mim. Eu quero me cobrir.
Para me levantar e correr para fora da sala.
Mas então ele acena.
— Sua vez. — diz ele.
— O quê?
— Faça isso. É o que você queria, não é? O que você pediu?
— O quê?
— Faça-se gozar.
Eu pisco, sentindo meu rosto esquentar.
— Você me ouviu. — diz ele. Ele retoma seu assento na poltrona e
pega seu copo de uísque. Eu nem tinha notado antes. Ele bebe. — Goze
enquanto eu assisto. Agora. E não olhe para longe de mim quando fizer isso.
— Ele diz essa última parte quando estou prestes a enterrar meu rosto no
assento do sofá.
Eu mantenho meus olhos nos dele enquanto deslizo minha mão entre
minhas pernas. Ele nunca desvia o olhar do meu quando começo a esfregar
meu clitóris, me ouvindo ofegar quando minha respiração vem em rajadas
curtas. Estou excitada. Estou tão ligada. E sentindo sua semente deslizar
sobre a fenda da minha bunda e descer pela minha coxa, eu gozo. Não é tão
difícil como quando ele me fode, mas eu gozo. Quando acaba, ele termina o
último uísque, coloca o copo na mesa e bate palmas.
— Esse é um show que vale a pena assistir. — diz ele e se levanta. Ele
se move atrás de mim, curvando-se para pegar minha calcinha. Ele me ajuda
a entrar nela antes de puxá-la para cima. — Você vai dormir com meu gozo
dentro de você só para se lembrar desse castigo. — Ele abaixa minha saia e
me ajuda a ficar de pé, então pega meu rosto entre as mãos e me beija com
força na boca, não deixando dúvidas de que eu pertenço a ele.
CAPÍTULO TREZE
ISABELLE
Não vejo Jericho até a noite seguinte. É uma semana estranha, mas
esta época do ano é sempre difícil. É quase o aniversário da morte de
Christian e este pode ser o primeiro ano em que não vou ao túmulo no dia.
Eu poderia pedir a Jericho para me levar. Eu não sei por que eu não faço.
Sábado é o show, embora eu tenha perguntado sobre o correio, me
disseram que não havia nada para mim. Eu me pergunto se Paul mudou de
ideia sobre eu vir por causa de Jericho. Não que eu ache que Jericho vai me
deixar ir ou querer ir ele mesmo.
Leontine, Angelique e eu estamos sentadas à mesa quando ele entra,
tirando o paletó. Ele entrega a jaqueta e a gravata para Catherine, que
aparece na esquina ao mesmo tempo.
— Noite. — diz ele. Seus olhos em mim, me fazendo corar, lembrandome da noite passada.
— Papai, adivinhe o que fizemos hoje. — Angelique começa enquanto
ele arregaça as mangas da camisa, algo que eu não consigo desviar o olhar.
Algo que me deixa com água na boca em antecipação dessas mãos em mim,
esses olhos em mim. Ele dentro de mim.
Eu balanço minha cabeça. Deve ser os hormônios da gravidez. Isso ou
há algo seriamente errado comigo.
— Conte-me tudo. — diz ele, beijando-a em cima de sua cabeça e
abraçando-a antes de beijar sua mãe em cima de sua cabeça, em seguida,
chegar até mim. — Estou faminto. — ele diz quando o faz. Ele inclina minha
cabeça e me beija na boca. Não é um beijo profundo, mas é com fome.
Erótico em vez de sensual. Sujo. — Dormiu bem ontem à noite? — ele
pergunta.
— Tudo bem. — eu digo, envergonhada. Sentindo-me corar.
— Bom. — diz ele e traz sua boca ao meu ouvido. — Eu ainda posso
ver isso, você sabe. Vejo que você se curvou…
Eu limpo minha garganta, me livro dele e me ocupo em colocar o
guardanapo no meu colo.
Ele sorri, senta-se na cabeceira da mesa. — Zeke ainda está em
Calgary? — ele pergunta a Leontine.
Ela acena. — Ele estará de volta em alguns dias.
— Bom.
Catherine entra seguida por um de seus ajudantes para servir o jantar.
Um assado para eles e massa caseira simples para mim. Eu estive menos
enjoada e não vomitei hoje. É alguma coisa. Mas também estou comendo
uma dieta bem branda.
— Isso é suficiente? — Jericho pergunta quando vê meu prato de
macarrão com azeite, sal e pimenta. Polvilho uma porção generosa de flocos
de pimenta picante e pego meu garfo e faca. — Você precisa de proteína. —
Ele pega o queijo parmesão ralado e levanta as sobrancelhas.
— Um pouco. — eu digo, não tendo tentado ainda.
Ele borrifa então nós comemos. Angelique e eu bebemos água em
copos elegantes enquanto ele e sua mãe bebem vinho tinto. Angelique
passa a contar a ele tudo sobre o nosso dia. Sobre o que ela aprendeu em
suas aulas. Sobre as flores que ela coletou lá fora com as quais fez uma
espécie de buquê para a mesa. Ela também pergunta sobre a próxima hora
da história que ela poderá ir.
Jericho sorri. — Talvez possamos ter hora da história aqui. — diz ele.
— Mas esta noite, eu esperava que Isabelle tocasse algo para nós depois do
jantar. O que você acha disso Angelique? — ele pergunta a ela, não a mim.
— Oh! Sim! Essa é uma ótima ideia. Belle, talvez você possa tocar o
que você fez esta tarde. — ela diz para mim, então se vira para seu pai. — É
de uma história chamada Romeu e Julieta, papai. Romeu e Julieta se amam,
mas não podem ficar juntos porque suas famílias se odeiam. É tão triste.
— Talvez possamos ficar com os contos de fadas mais felizes, Isabelle.
— Leontine me diz.
— Romeu e Julieta estão mais próximos da realidade, você não acha?
— Eu pergunto.
— Ela está certa. São amantes desafortunados. — Jericho diz
enquanto dá uma mordida em sua comida. — Como estão suas aulas com a
Sra. Strand? — ele pergunta a Angelique.
Seu rosto escurece e ela dá de ombros. Passei pelo quarto dela hoje
cedo quando a Sra. Strand estava lá. Através da porta eu podia ouvir sua voz
elevada. Quase entrei para ver o que estava acontecendo, mas Leontine me
parou, dizendo que Angelique não tinha feito o trabalho que deveria fazer.
Eu não achei que fosse motivo suficiente para levantar a voz para a
garotinha, mas me afastei fazendo uma nota mental para ver como elas
estavam na aula seguinte.
— Ela não é legal. — diz Angelique.
— Bem, nem todo mundo é legal na vida. — Leontine diz a ela. — Por
que ela estava com raiva de você?
Angelique aperta sua mandíbula. Ela se parece com o pai quando ela
faz isso, exceto que ela é fofa e eu tenho que rir.
— Essas risadas te colocam em apuros. — Jericho me diz, mas ele está
sorrindo para ela também. Eu me pergunto se ele vê a semelhança.
Assim que terminamos, ele se vira para mim, tira um envelope do
bolso e o coloca sobre a mesa. Ele mantém os dedos sobre ele, mas garante
que eu possa ler que está endereçado a mim.
— O que é isso? — Eu pergunto. Ele a empurra para mim. Eu a pego e
abro a aba que já foi aberta.
— Dois. Então eu não vou ficar irritado. — Jericho diz.
— Você abriu minha correspondência? Quando eles vieram?
— Sim e não faço ideia. Eles estavam na minha mesa.
— É crime abrir a correspondência de outra pessoa.
— Você vai chamar a polícia?
Eu encaro.
Ele sorri.
— Podemos ir? — Pergunto-lhe.
— É por isso que estou dando a você. — Abro a boca, mas ele levanta
um dedo. — Uma condição. Você toca para mim esta noite. Para a minha
família.
— Isso é chantagem.
— É uma escolha. Escolha.
Não sei por que não quero tocar para ele. É que eu quero manter esse
pedaço de mim em segredo dele? Talvez manter o controle de uma parte da
minha vida? Ou talvez seja o quão vulnerável eu me sinto quando toco.
Como isso me abre. E ele testemunhar isso me assusta.
— Belle? — Angelique pergunta quando demoro muito para
responder.
Eu olho para Jericho que se inclina em minha direção. — Do que você
tem medo?
— Eu não estou.
— Então toque para nós e eu vou te levar ao seu show.
— Ok.
Ele acena com a cabeça e nós comemos. Quando terminamos, ele
limpa a boca com o guardanapo e se levanta. — Devemos? — ele pergunta,
estendendo a mão para mim, palma para cima. Eu deslizo a minha na dele.
CAPÍTULO QUATORZE
JERICHO
A biblioteca está iluminada com velas. Deve haver mais de uma
centena delas. Mandei Catherine montá-la desta forma e colocar uma
cadeira para Isabelle sob as janelas em arco, revestidas de ferro, onde a lua
lança uma luz sobrenatural ao seu redor.
— Oh. Uau. — Angelique diz e eu coloco minha mão em sua cabeça.
Meus olhos estão em Isabelle, que soltou a mão assim que chegamos aqui,
entrando na nossa frente. Ela está usando um vestido branco simples e acho
que deveria tê-la colocado em um vestido. Algo suave e fluido e bonito.
Como ela.
Ela se vira para mim e morde o interior do lábio.
Eu inclino minha cabeça um pouco. É quase imperceptível. Eu quero
que ela goste. É importante que ela goste.
Ela sorri um pequeno sorriso e seus olhos brilham. Lágrimas. Não
tristes, eu acho. Ela se vira e noto que sua mão vai para o rosto antes de
abrir o estojo do violino em cima da mesa de centro.
Nós nos sentamos e eu não consigo tirar meus olhos dela. Angelique
segura uma das minhas mãos com as suas e deita a cabeça no meu ombro.
Minha mãe está sentada na nossa frente. Ela não está olhando para Isabelle.
Ela está me observando.
Isabelle limpa a garganta. Ela não olha para nenhum de nós enquanto
se senta na cadeira preparada para ela.
— Eu provavelmente estou enferrujada. — ela diz com um rápido
olhar para mim. — Não sou muito boa. Eu acabei de…
— Ela é muito boa. — Angelique diz sobre ela.
— Tenho certeza que ela é. — eu digo e aceno para Isabelle.
E ela começa.
E foda-se.
Foda-me.
Conheço a peça que Angelique mencionou anteriormente. Eu ouvi isso
como pano de fundo.
Romeu e Julieta.
Mil vezes boa noite.
Porra.
Eu aperto a mão da minha filha. Meu olhar está fixo em minha esposa
e a respiração parece ficar mais difícil. Como se o oxigênio estivesse sendo
retirado da sala e tudo o que restasse em seu lugar fosse essa emoção. Essa
incrível sensação de tristeza. Não, não é tristeza. Do amor. De um amor que
terminará em total tragédia.
Romeu e Julieta eram jovens. Idealistas e ingênuos. Eles ainda
acreditavam no amor. Eles ainda esperavam.
Eu não sou tão jovem. Nem tão ingênuo.
Minha garganta fecha e é difícil engolir. Olhar para ela é difícil, mas
desviar o olhar é impossível.
Ela suportará a tragédia de minhas ações?
Isabelle não olha para nenhum de nós diretamente. Ela mantém o
olhar fixo à frente, olhos desfocados. Ela não está olhando para nada em
particular. Eu me pergunto se ela está seguindo a música em sua cabeça. Se
ela está vendo as notas enquanto seu arco se move sobre as cordas do
violino.
Algo muda, algo não palpável. Algo dentro dela. Eu vejo isso no rosto
dela. Os outros? É suave e sutil, mas completo. E trágico. Tão trágico.
Ela toca de memória. Quando ela fecha os olhos, ela fica embaçada
nos meus. Porra. A música é muito foda.
Minha respiração é uma sucção irregular de ar muito fino.
Meu corpo está tenso. E estou apertando a mão de Angelique com
muita força.
Entre a luz das velas e a visão de Isabelle ao luar em branco, quase
tenho que desviar o olhar. Quase. Mas a visão de seu rosto, seus olhos, esta
coisa que veio sobre ela. Essa suavidade. Este outro mundo. Eu tenho que
manter meus olhos nela. Porque ela não está aqui agora. Ela está em outro
lugar. Ela é emoção, som e sentimento. Apenas sentimento. E eu a sinto.
Deus. Eu a sinto dentro do meu peito, meu estômago. Eu a sinto como se ela
estivesse dentro de mim.
Quando termina, eu pisco e ela pisca. Então ela está limpando o rosto
com as costas da mão. Seu violino e arco ainda em suas mãos. Eu olho para
ela. Eu apenas olho para ela. Não posso desviar o olhar.
Mil vezes boa noite.
E foda-me. Estou fodido.
Porque eu sei de uma coisa agora. Algo que tenho ignorado. Algo que
tentei anular.
Eu sou dela. Todas as vezes que eu disse a ela que ela era minha,
deixei de fora a outra parte dessa equação. Neguei. Mas aqui está. Claro
como o dia.
Assim como ela é minha, eu também sou dela.
Pertencemos um ao outro.
Até que a morte nos separe.
CAPÍTULO QUINZE
ISABELLE
Dex nos leva para o show esgotado. É um local pequeno, mas ainda
assim, é algo. Todos estão vestidos com vestidos de noite, os homens de
smoking. Jericho também. Preto no preto para ele. Ele é o diabo, afinal.
Tomamos nossos lugares na primeira fila.
— Ele foi com tudo, não foi? — Jericho diz.
— Não seja mau.
Ele pega um folheto, folheia-o, bufa na foto e na biografia de Paul. —
Você vai começar as aulas em duas semanas. — diz ele, fechando-o e
colocando-o no assento ainda vazio ao lado dele.
— O quê? — Eu pergunto, colocando o panfleto na minha bolsa.
Ele se vira para mim e minha respiração fica presa. Ele é lindo, meu
marido. Rugosamente assim com aquela sombra de cinco horas ao longo de
sua mandíbula, seus olhos estranhos que sempre parecem transmitir poder
e possessividade.
Eu penso sobre o que Paul disse. Como Jericho é possessivo. Não é
nenhum segredo. E uma parte de mim parece se inclinar para isso. Sinto-me
segura dentro dos limites de seus braços. É ridículo, eu sei.
— Consegui um professor aposentado do Conservatório de Oberlin
para ensiná-la. Ele se mudou para Nova Orleans cerca de um ano atrás,
então é o momento perfeito.
— Espere, você pode dizer tudo isso de novo?
— Professor Larder. Costumava ensinar no Conservatório de Oberlin.
Ouvi dizer que é uma boa escola.
— Oberlin? É uma das melhores.
— Você terá aulas semanais. Mais se você quiser.
— Eu tenho um professor. Um grupo.
— Agora você tem um melhor.
— Quão caro ele é?
— Não se preocupe com isso, Isabelle.
— Diga-me. Quero dizer, Conservatório de Oberlin?
Ele se inclina para mim. — Eu tenho muito dinheiro, caso você não
tenha notado. — diz ele com uma piscadela.
As luzes piscam duas vezes sinalizando que o show começará em
breve. As pessoas que estão circulando por aí tomam seus assentos para
que não possamos falar tão abertamente.
— E o meu grupo?
Ele olha para mim diretamente. — Seu grupo não é da minha conta.
Você é talentosa, Isabelle. É um desperdício do seu dom não persegui-lo.
Estou surpresa com isso, mas então me lembro de como ele era com
Paul. Pergunto-me se ele está apenas dizendo essas coisas, organizando as
aulas para me afastar de Paul e do meu grupo. Para me isolar ainda mais do
que já estou.
— Jericho. — eu começo, mas antes que eu possa continuar uma
mulher vem em nossa direção, parecendo apressada.
— Você é Isabelle St. James?
Nós dois olhamos para ela. Ela é jovem, vestida com calça preta e uma
blusa preta, usando um crachá. Amanda.
— Sim. — eu digo.
— Nós temos um problema. Tipo um grande problema. Uma das
violinistas que deve seguir em frente está presa no trânsito. Sua peça
começa em vinte minutos, mas ela não vai conseguir. Paul disse que talvez
você pudesse tomar o lugar dela?
— O quê? Eu não posso simplesmente…
— Por favor. Não é uma grande parte, mas é importante. Apenas dez
minutos no palco, então você pode assistir o resto do show.
Eu olho para Jericho cujos olhos estão apertados como se ele não
confiasse nisso. Ele muda seu olhar para mim, mas a garota começa de
novo.
— Por favor. Estamos desesperados.
Eu aceno, fico de pé. — Eu vou estar de volta logo, eu acho. — eu digo
e antes que ele possa dizer qualquer coisa, estou andando nos bastidores
com a garota. — Onde está Paul? — Eu pergunto.
— Por aqui. — diz ela, andando rapidamente à minha frente e longe
do palco. Três ajudantes de palco passam por mim. Ouço o som do início do
show, um momento depois, aplausos. Olho para trás para ver se consigo ver
Paul. Acabei de vê-lo em seu assento no palco e não posso deixar de sorrir.
Estou tão orgulhosa dele. Vejo os outros três lugares no palco ocupados e
me pergunto sobre a mulher que está atrasada. Eu me viro para seguir os
passos rápidos de Amanda e minha mente não processa o que acontece a
seguir. Não pode fazer sentido. Amanda se foi e em seu lugar está um
homem que eu nunca vi antes.
Eu vacilo, parando logo antes de andar direto para ele. Ele está
olhando para mim e algo sobre ele me faz recuar um passo. Direto no peito
de outro homem.
Olho de um para o outro, dois gigantes vestidos com ternos apertados
demais, errados demais.
O que está na minha frente caminha em direção a uma porta fechada
e a abre. — Entre. — diz ele.
Eu me viro para o que está atrás de mim, mas ele me empurra para
frente. Eu grito, mas a música do show abafa qualquer som. Então, quando
ele coloca a mão nas minhas costas novamente, eu sigo em frente. Paro
quando chego à porta e vejo quem está lá dentro. Estou confusa.
— Julia?
O camarim não é bem iluminado e há fantasias em todos os lugares. A
mesa em que ela está sentada está cheia de maquiagem e uma vela
perfumada queima no canto. Canela. Eu costumava gostar do cheiro, mas
agora faz meu estômago revirar. No colo dela está um Matty muito
sonolento.
Julia se levanta, abraçando o filho contra o corpo. Ele está de pijama,
um polegar na boca, o outro segurando um pequeno cobertor azul com um
coelho em um canto. Sua cabeça está no ombro de Julia e ele está tão
cansado que mal consegue sorrir.
— Obrigada. — Julia diz para o homem atrás de mim. — Espere lá fora.
— Sim, senhora.
Observo os dois homens corpulentos saírem e fecharem a porta.
Quando me viro, Julia sorri para mim. Ela parece cansada também.
— O que está acontecendo? — Eu pergunto, abraçando os dois com
força.
— Belle. — Matty diz em torno de seu polegar.
Eu beijo sua bochecha e o pego de Julia. — O que você está fazendo
aqui, amigo? É tarde para você.
— Ele queria ver você e essa era a única maneira. Ele sente sua falta. E
eu pensei que com o aniversário chegando… — Julia para.
O aniversário. Na noite em que Christian foi morto.
Nós nos sentamos, ela na mesma cadeira que acabou de desocupar,
eu em um sofá onde há espaço suficiente para eu me sentar com todas as
fantasias empilhadas em cima.
Eu coloco minha mão na parte de trás da cabeça de Matty, sentindo-o
ficar mais pesado enquanto ele adormece.
— Eu não posso acreditar que já se passaram três anos. — eu digo,
falando do aniversário da morte de Christian.
— Não. Passou rápido. — ela reconhece. — De qualquer forma, não
temos muito tempo. Tenho certeza de que seu marido idiota terá um
exército procurando por você em alguns minutos. — Estou surpresa com
essa mudança brusca na conversa, mas não tenho certeza se quero falar
sobre a noite do arrombamento ou o assassinato do meu irmão, com Julia.
Ou com qualquer outra pessoa.
— Aqueles homens… Quem são esses homens? — Eu pergunto. — Um
deles me empurrou.
— Merda. Desculpe-me por isso. Eu disse a eles que você estava
grávida. Para não tocar em você.
— Quem são eles?
— Seguranças. — diz ela. — Carlton os contratou para Matty e para
mim depois que seu marido nos ameaçou.
— Ele fez o quê?
— Ele veio ver Carlton outro dia. Ele não te contou?
Não menciono que senti o cheiro do perfume dela grudado no terno
do meu marido. — Sim. Bem não. Ele disse que você estava lá, não Carlton.
— Eu não acho que ele goste de lidar com mulheres fortes. — Eu não
tenho certeza de como aceitar isso, mas ela continua, então eu empurro isso
de lado. — De qualquer forma, ele estava esperando Carlton, mas você
conhece seu irmão. Ele estava na Cat House, como sempre.
— Carlton? Na Cat House?— Sinto minhas sobrancelhas se juntarem
em confusão.
— Ok, talvez você não conheça Carlton dessa forma, mas isso não
importa. Ele não é o motivo de eu estar aqui e tenho certeza que se ele
soubesse que cheguei tão perto de Jericho St. James, ele perderia a cabeça.
— Ok, o que aconteceu exatamente?
Ela olha para Matty. — Ele veio para se gabar da gravidez. Sobre como
ele ia usar o bebê para tirar tudo de nós. A casa. A terra. As várias
propriedades. Qualquer dinheiro que sobrou.
— O quê?
Ela acena. — Eu não sei como ele é com você. Acho que ele lida com
você com luvas de pelica, considerando. —Ela gesticula em direção a minha
barriga e eu juro que há um momento de algo escuro que passa por seus
olhos. — Ele vai usar aquele bebê para roubar tudo, Isabelle. Eu já te disse
isso. Agora você acabou de dar a ele o que ele quer.
— Eu não dei exatamente a ele.
— Não? Ele te forçou? Não que isso importe. Tenho certeza que ele
tem a polícia e os tribunais no bolso. Isso sem falar no Tribunal. Não sei
onde está sua cabeça nisso. Não consigo imaginar que você tenha pensado
em uma família.
— Uma família, não…
— Não que seria uma família. — ela continua rapidamente. Tenho
certeza que ela não está me ouvindo. Ela está presa em sua cabeça. Não é
como ela. — Uma vez que ele tenha o bebê, ele não precisará de você. Você
seguirá o caminho de Nellie Bishop e de qualquer outro Bishop que teve a
infelicidade de cruzar seu caminho. Você deve ler sua história. Seu futuro
está escrito nela.
— O que isso significa?
— Ele vai torcer sua mente. Você acredita exatamente no que ele quer
que você acredite. Você é maleável, Isabelle. Vai ser fácil para ele.
— O quê?
— Deixa para lá. Não temos tempo. Deixe-me terminar. Ele ameaçou
Matty, Isabelle. Matty. — Seus olhos ficam úmidos.
— O que você quer dizer? — Eu pergunto, olhando para a cabecinha
no meu ombro com seus cachos loiros. Ele parece um anjinho com seu rosto
de querubim e aquele cabelo.
— Ele me disse para ficar longe de você ou ele viria atrás da minha
família. — Ela enxuga uma lágrima perdida de seu olho.
— Ele fez o quê? — Eu me sinto estremecer e abraço o garotinho em
meus braços mais perto.
— Olha, eu tenho certeza que ele está preocupado que você aborte e
ele vai ter que começar tudo de novo.
A maneira como ela diz isso me faz pensar em como Jericho está com
Angelique. Faz-me pensar sobre o nosso filho. Como ele vai estar com ele ou
ela. Se ele vai amá-lo como ele ama Angelique. Do jeito que Julia diz, a
criança não é um ser humano. É uma ameaça ou uma arma, dependendo de
qual lado você está.
— É um bebê. — eu digo.
— Eu sei, querida. — diz ela. Eu me pergunto o uso da palavra querida.
Não é típico de Julia usar carinhos, mas isso também não é um carinho. É
dito como ela diria para aqueles que ela encontra abaixo dela. Eu vi esse
lado de Julia com garçons e outros funcionários. É feio. — Para você e para
mim, é um bebê. Mas para ele, é uma arma. E uma vez que você entregue
esse bebê, você nunca mais o verá. Se você viver para ver qualquer coisa.
Estremeço e Matty se mexe. Eu acaricio sua cabeça e sussurro shh em
seu ouvido.
Ela verifica o relógio e se levanta. — Você deveria voltar, mas eu
queria te contar sobre o que aconteceu. Eu não acho que ele teria sido
honesto sobre isso. Sobre ameaçar uma criança de quatro anos.
— Julia, ele mesmo tem uma filha. Ele não iria…
— Não seja ingênua. — ela retruca. Ela parece chateada, muito
chateada. Ela enfia a mão na bolsa e tira algo.
Olho para o que ela tem na mão.
— Você pode não precisar de todos, mas é melhor prevenir do que
remediar.
— O que elas são? — Eu pergunto, gelada quando me levanto.
— Mifepristona e misoprostol. — Ela gesticula para que eu pegue os
pacotes dela. Há seis deles, cada um contendo quatro pílulas pequenas de
um lado e uma pílula maior do outro.
— Pílulas abortivas? — Merda.
— Elas vão se livrar do seu problema.
Seu problema.
Sinto frio enquanto arrasto meu olhar dos pacotes de pílulas para ela.
— É um bebê, Julia. — repito.
Ela acena. — Não pense assim. Esta é a única maneira, Isabelle. Você
precisa fazer isso por si mesma. Por nós. Por Matty. — Ela enfia as pílulas na
palma da minha mão e pega seu filho de mim. Ele murmura, mas adormece
facilmente. — Você precisa voltar. Se ele vir Matty e eu aqui, não sei o que
ele fará.
— Ele não machucaria você ou Matty. Ele não é assim.
— Você acha que o conhece? Você não, Isabelle. Você não sabe do
que ele é capaz. E não vou arriscar a vida do meu filho. Volte para o seu
marido antes que ele venha te procurar. Se tem uma coisa que eu tenho
certeza é que ele virá procurar. Enquanto você estiver carregando essa coisa
dentro de você, ele virá.
Chocada com o veneno em suas palavras, fico muda. Ela exala como se
estivesse irritada quando vê minha expressão.
— Apenas faça isso, Isabelle. Livre-se disso.
— Tem que haver outra maneira.
Ela balança a cabeça e sai pela porta, deixando-a aberta. Eu a vejo
correr para uma saída, os dois homens corpulentos flanqueando-a. A cabeça
de Matty salta em seu ombro. Eu vejo seu pequeno cobertor cair de sua
mão muito cansada e instintivamente quero correr para pegá-lo. Eu ouço
Jericho então. Ouço-o ameaçar alguém para sair do seu caminho.
Observo Julia sair pela porta e me pergunto se ela está certa. Se estou
sendo ingênua. Se ele realmente é capaz de ferir uma mulher ou uma
criança para conseguir o que quer.
E me pergunto se sou capaz do que Julia quer que eu faça. Porque as
pequenas pílulas na minha mão fariam mais do que machucar a criança que
estou carregando. Isso a mataria.
CAPÍTULO DEZESSEIS
JERICHO
Algo está errado.
Eu me levanto para o aborrecimento dos idiotas atrás de mim. Eu
poderia dar a mínima. Eu me movo rapidamente na direção que Isabelle
tinha ido. Um homem me para na porta.
— Posso ajudar? — ele pergunta em voz baixa.
— Minha esposa está lá atrás. Amanda veio buscá-la. Eu preciso vê-la.
— Desculpe, não há convidados nos bastidores, senhor. Se você puder
se sentar, tenho certeza…
— Saia do meu caminho.
— Senhor?
— Amanda. Ela é uma de suas colegas. — As pessoas começam a me
calar. — Ela levou minha esposa…
Ela levou minha esposa.
Porra.
— Senhor, não há ninguém chamado Amanda que trabalha conosco.
Sinto muito, talvez você esteja enganado. Se você vai…
Eu o empurro para o lado e tiro meu telefone do bolso enquanto forço
minha passagem pela porta dos bastidores. Eu mando uma mensagem para
Dex. Diga a ele para olhar ao redor do perímetro procurando por Isabelle
enquanto eu corro pelos bastidores.
— Senhor? — alguém me para. Ele está carregando um walkie-talkie.
— Você deveria estar aqui?
Olho além dele, mas o corredor está vazio.
— Minha esposa. — digo a ele. — Ela vai substituir um dos violinistas.
Ele parece confuso e eu devo parecer insano.
— Substituta? Senhor, acho que está enganado. Os músicos estão no
palco agora. — diz ele, apontando para o palco.
— Porra. — Eu empurro minhas mãos no meu cabelo. — Amanda?
— Desculpe, senhor, vou ter que pedir para voltar ao seu lugar. — Ele
fala em seu walkie-talkie pedindo segurança.
Eu me afasto, examinando o grande espaço com todas as suas cortinas
e corredores e cantos escuros. Vejo algo perto de uma das portas marcadas
Saída na extremidade. Eu ando em direção a ela enquanto dois homens
correm atrás de mim. Eu pego. É um cobertor pequeno e gasto com um
coelho em uma extremidade. Angelique teve um parecido uma vez.
— Senhor! — Um dos homens grita quando eles me alcançam. Assim
como ele, eu a vejo. Isabelle. Ela sai de um dos provadores parecendo
corada. Culpada.
— Isabelle. — eu digo, ouvindo o suspiro de alívio na minha voz. Enfio
o pequeno cobertor no bolso.
Ela sorri, mas esse sorriso vacila quando ela caminha até mim. O
homem com o walkie-talkie se afasta enquanto vou até minha esposa.
— Ela conseguiu. — diz Isabelle.
Eu a olho. — O quê?
— A mulher. Eles não precisavam de mim no final.
Eu a estudo. Algo está desligado. Ela pega minha mão e se vira na
direção de onde viemos. — Vamos voltar.
Meu telefone vibra e eu o tiro do meu bolso. É Dex.
Julia Bishop acabou de entrar em um carro com dois capangas e uma
criança. Diga-me o que fazer.
Eu paro, leio de novo. Meu cérebro chacoalha dentro do meu crânio.
Viro-me para minha esposa mentirosa.
Ela está trabalhando muito duro para manter contato visual. Ela é uma
péssima mentirosa.
— Você parece corada, Isabelle. Você se sente bem?
— M-hm. — diz ela muito rapidamente.
— Nós podemos ir.
— Não. Estou bem. Eu quero estar aqui. Por favor.
Eu sorrio com força enquanto meu telefone vibra. Eu olho para ele.
Chefe?
— Claro. — digo a ela e digito minha resposta. Siga-os, mas fique fora
de vista.
Retomamos nossos assentos e observo minha esposa enquanto ela
finge observar o palco. Eu posso ver que ela está mergulhada em
pensamentos. A mente dela não está aqui. É sobre o veneno que Julia
Bishop acabou de vomitar em seu ouvido. E dada a minha recente visita à
casa do Bishop, posso adivinhar o que foi.
CAPÍTULO DEZESSETE
ISABELLE
Ele não me faz mais perguntas naquela noite. Acho estranho, não é
como ele. Eu esperava vinte perguntas. Mas pegamos um táxi para casa
depois do show. Ele disse que Dex não se sentiu bem, então o dispensou
mais cedo. Nada disso realmente se encaixa, mas quando chegamos em
casa, ele recebe uma ligação e é rápido em me mandar para a cama
enquanto desaparece em seu escritório.
Subo as escadas aliviada por ter um pouco de tempo sozinha. No meu
quarto vou direto para o banheiro. A fechadura não funciona mais. Ele
quebrou no dia em que descobri que estava grávida. Eu não acho que seja
um descuido que ele não tenha consertado. Eu tiro os comprimidos da
minha bolsa. Eu os estudo, observo a estranha forma de seis lados dos
quatro. Comprimidos para aborto.
Julia me deu os meios para interromper esta gravidez. Ela chamou o
bebê de uma coisa. Uma arma. E não combina comigo. Este bebê é um ser
humano. Uma vida. Ela já odeia ele ou ela?
Não. Isso não pode ser. Ela só está com medo. E eu entendo. Meu
marido é um homem terrível. Um diabo. É o que eu pensei dele quando
coloquei os olhos nele pela primeira vez. Um diabo com chifres. E se ele
ameaçou Matty, bem, eu entendo o desespero dela. E esta noite, ela estava
desesperada.
Mas há outro lado de Jericho St. James. Eu vi na noite em que toquei
para ele. Estava em seus olhos quando eles brilhavam enquanto ele ouvia.
Está lá toda vez que ele olha para sua filha. Ele é humano também. Ele
também sente. E há algo vulnerável dentro dele. Eu vi isso naquele quarto
no porão.
Ouço a porta do quarto se abrir.
— Isabelle? — É Jericho. Corro para deixar os pacotes de pílulas no
fundo de uma gaveta, vou escondê-los direito mais tarde e me ocupo
escovando os dentes. Ele bate na porta do banheiro, abrindo-a.
Eu me pergunto se ele pode ver a culpa no meu rosto, então eu inclino
minha cabeça para enxaguar. Pego a toalha que ele estende para mim e
limpo minha boca.
— Você vai consertar a fechadura? — Eu pergunto.
— Não.
— Você não confia em mim.
— Eu devo? — É uma pergunta retórica. — Você confia em mim,
Isabelle?
Não respondo.
— Eu não pensei assim. — diz ele depois de um momento. Ele enfia a
mão no bolso e tira o pequeno cobertor de Matty. Eu olho para ele, meu
coração batendo forte. Ele não pode saber que é de Matty. Como ele pode?
Eu lentamente viro meu olhar para o dele. Seus olhos se estreitam,
mas ele não fala.
— Venha. — diz ele, colocando o cobertor de volta no bolso.
Eu o deixo me levar para fora do meu banheiro e pela porta de seu
quarto, onde ele me despe com cuidado, me olhando enquanto o faz. Eu
vejo o sulco entre suas sobrancelhas, a intensidade em seu olhar.
— Eu posso fazer isso. — eu digo uma vez que estou de calcinha.
Seu olhar muda para meus seios que já estão mais cheios, mais
macios. Ele coloca sua mão gigante contra minha barriga. Ela abrange toda
ela.
Penso no que ele fez com aquelas mãos. Quem ele está ferindo. Como
ele ameaçou cortar as mãos de qualquer homem que me tocasse. Ele
machucaria Julia se soubesse o que ela me deu? Ele a machucaria se
soubesse que um dos homens que Carlton contratou para protegê-la me
empurrou como ele fez? Ele cortaria suas mãos?
Quando eu olho de volta para ele, ele está me estudando
atentamente.
Que par formamos.
Inimigos. Amantes. Guardiões de segredos.
Ele pega a camiseta de Christian e a puxa pela minha cabeça. Girandome, minhas costas são puxadas para frente dele, sua mão se move
possessivamente sobre minha barriga mais uma vez.
Ele empurra meu cabelo para trás da minha orelha, beija minha
bochecha, meu pescoço. Ele traz sua boca ao meu ouvido. — Você mentiu
para mim. — ele sussurra.
Eu estremeço. Quando tento me afastar, me virar para encará-lo, ele
não me deixa.
— Você e eu temos muitos inimigos, Isabelle. E eles são implacáveis.
Você lhes dá uma vantagem quando mente para mim.
Viro a cabeça o suficiente para olhar para o rosto dele. — Você vai me
machucar quando o bebê nascer?
Ele balança a cabeça.
— Você vai tirar ele ou ela de mim?
— Não seja a tola dela.
— Ela disse que você ameaçou Matty. — Seu rosto é ilegível. — É
verdade?
— Eu não vou machucar uma criança. Você tem que me perguntar
isso? — Ele me solta e eu me sento. Minhas pernas parecem bambas. — O
que ela disse para você?
— Nada. Apenas isso. — eu minto novamente. Segunda vez esta noite.
Está ficando mais fácil.
— Certo. Talvez eu mesmo pergunte a ela. — ele diz.
— Você a assustou.
— Eu? Se ela estava com medo de mim, como ela fez o truque esta
noite?
Abro a boca, fecho. Ele está certo sobre isso. Por que ela iria ao
teatro? Trazer Matty? Como ela sabia que eu estaria lá? Talvez eu tenha
mencionado isso há muito tempo? Talvez Paul tenha dito a ela. Não sei.
— Ela está fodendo com você, Isabelle. Com a gente. — diz.
— Nós?
— E está funcionando. — Ele tira o cobertor de Matty do bolso. —
Talvez eu devolva isso. Lembre-a de ficar longe da minha família.
Ele dá um passo em direção à porta, eu me levanto. Meu cérebro mal
registrando seu uso da palavra família. Agarro seu braço com as duas mãos.
— Você não pode machucá-los. Eles são minha família. Por favor!
Ele olha para onde eu estou segurando ele, minhas mãos enroladas
como garras em torno de seu bíceps. Ele me encara, puxando minhas duas
mãos atrás de mim, forçando meu peito a se projetar para cima e contra o
dele.
— Eu não machuco crianças.
— E as mulheres? — Eu pergunto.
Ele para nisso. — Eu machuquei você?
Eu vacilo.
— Eu poderia ter. Talvez eu devesse. — Ele me leva de volta para a
cama. — Mas eu já machuquei você, Isabelle?
Eu balanço minha cabeça.
Ele balança a cabeça como se minha resposta significasse alguma
coisa. Ele me puxa para o seu lado, puxa os cobertores de volta. — Vá para a
cama.
Seu telefone vibra e ele me libera para ler a mensagem. Eu sento
novamente. Puxo meus joelhos até meu peito. Quando ele olha por cima do
telefone, sua expressão mudou, uma ruga de preocupação entre as
sobrancelhas.
— O que é isso? — Eu pergunto.
— Foi uma longa noite. — diz ele e coloca os cobertores sobre mim.
— O que você vai fazer? — Eu pergunto quando ele se afasta.
Ele se vira, me estuda. — Não visitarei sua prima se isso a ajudar a
dormir.
Eu expiro em alívio.
Ele vê isso e eu posso dizer que isso o irrita. Ele volta para mim, toca
minha bochecha com os nós dos dedos de uma mão, então segura a parte
de trás da minha cabeça. Seus dedos se entrelaçam com o meu cabelo e ele
esfrega meu crânio. Ele poderia fazer isso para machucar, mas ele não é. Ele
está se cuidando.
Luvas de pelica. Foi o que Julia disse.
— Você só se preocupa com uma coisa, Isabelle. Só uma coisa. —
Engulo em seco e ele leva a boca ao meu rosto, beija-o e sussurra. — Faça o
que fizer, não me traia.
Eu não consigo dormir. Não tenho certeza se são minhas conversas
com Jericho e Julia ou o fato de que, com o aniversário chegando, estou
ansiosa com o sonho. Eu não tenho muitas vezes, apenas algumas vezes por
ano. A última vez foi na cama com Jericho e não quero repetir. Mas eu
conheço o padrão. Minha mente parece aumentar a frequência nas semanas
que antecederam aquela noite.
Jericho saiu há mais de uma hora. Ele pegou seu pequeno carro
esporte. Eu gostaria de poder falar com Julia, embora eu acredite nele
quando ele diz que não vai vê-la. Eu não sei por que, mas eu faço. Ainda
assim, devo avisá-la que ele sabe que ela estava lá. Entro no banheiro, abro
a gaveta onde deixei cair as pílulas. Se ele soubesse o que ela me deu, o que
ele faria com ela? Ele a machucaria. Estou certa disso.
Eu deveria lavá-las agora. Livrar-se delas. Mantenha-a segura. Não
tenho intenção de usá-las. Mas por algum motivo eu não faço. Em vez disso,
coloco-as em um bolso com zíper no estojo do violino e volto para o quarto.
Eu visto um par de jeans, um suéter de lã quente e tênis. Desço as escadas
até a cozinha, onde abro a gaveta onde vi uma lanterna. Tiro-a, verifico as
baterias e saio pela porta da cozinha.
Se eu não estivesse grávida, Jericho se sentiria tão possessivo quando
se trata de mim? Ele seria tão cuidadoso?
Eu penso em sua não resposta quando lhe perguntei se ele pegaria o
bebê de mim. Ou talvez esse silêncio seja a resposta.
Depois de limpar o pátio e a área da piscina e estou quase na floresta,
ligo a lanterna. Um vento frio sopra esta noite, o céu está claro para variar.
Eu puxo as mangas do meu suéter até minhas mãos e corro em direção à
capela. Sou grata pelos tênis nos meus pés. Eu sei o que esperar nestes
bosques.
Não são as ações de Jericho que me trazem aqui neste passeio da
meia-noite. São as palavras de Julia. Você deve ler sua história. Seu futuro
está escrito nela.
Vou lê-los esta noite. Não sei por que ainda não fiz. Eu tinha esquecido
o livro no altar da pequena capela.
O ar está parado e frio quando chego ao cemitério. Eu olho ao redor.
Parte de mim quer voltar para casa. Voltar para a cama dele. Sentir-me
segura mesmo que essa segurança seja falsa na pior das hipóteses,
temporária na melhor das hipóteses.
Abro o portão rangente e entro, meu olhar se movendo em direção ao
túmulo de Nellie Bishop. Vejo a garrafa de uísque descartada ainda no chão,
cavada na terra lamacenta das chuvas das últimas semanas. Acho que é o
que Jericho deixou aqui na noite em que o acusei de ser um péssimo pai
para Angelique. A noite em que ele perdeu a cabeça quando viu como eu
limpei e decorei o túmulo de Nellie.
Eu ando em direção ao túmulo. Está crescido novamente. Eu deveria
cuidar disso. Eu vou amanhã. Esta noite, tenho outro trabalho a fazer.
Dou alguns passos antes de notar as pontas de cigarro no chão. Três
deles. Eu me agacho para olhar mais de perto. Eles não estão aqui há muito
tempo ou teriam se deteriorado ainda mais com a chuva. Eu me pergunto
quem fuma. Talvez um jardineiro.
Limpando minhas mãos, eu me levanto e vou para a capela. Subo as
escadas, abrindo a pesada porta, lembrando-me da última vez que estive
aqui. Bem, não aqui, mas na sala atrás da capela. Onde está o pelourinho.
Borboletas batem as asas com a memória, eu balanço minha cabeça. A
sensação, o desejo em desacordo com o que eu deveria estar sentindo. Eu
me pergunto se são os hormônios da gravidez distorcendo as coisas.
Fazendo-me pensar que sinto coisas pelo meu marido que não sinto. Que eu
não deveria.
Jericho St. James é uma contradição ambulante. E ele me confunde.
Sua possessividade. Sua proteção. A maneira como o predador se esconde
logo abaixo do protetor.
Minha mente vagueia para o que Julia disse novamente. Como Jericho
não respondeu minha pergunta. Mas talvez eu não tenha perguntado a
pessoa certa.
Entro na capela onde apenas a lâmpada do tabernáculo está acesa.
Como da última vez, sinto um leve cheiro de incenso. É um conforto e uma
preocupação. Eu me pergunto quem eles são e quando eles estão vindo aqui
para queimá-lo.
Usando a lanterna, ando pelo corredor central fazendo questão de
olhar para as lápides. Eu leio o nome de Draca. As datas de seu nascimento.
Sua morte. Eu não demoro no de Mary. Dezenove é muito jovem para
morrer. Para se matar.
Minha mente vagueia para Nellie Bishop. Ela realmente se matou?
Jogou-se naquele poço? Ou Draca a assassinou?
Você deve ler sua história. Seu futuro está escrito nela.
Estremeço com o pensamento, embora conscientemente não consiga
entender o por quê. O que Júlia sabe? Não tenho dúvidas de que ela tem
algum conhecimento da história feia entre as famílias. Quanto ela pode
saber? O que o IVI sabe? Deve ser de onde ela tiraria as informações. Ou de
Carlton ou da biblioteca Bishop. Não vejo como poderia haver muito dos St.
James lá. A menos que tenham roubado algo em algum momento dos
últimos séculos. O que não é uma ideia tão ultrajante. Eles se odeiam há
centenas de anos.
Quando chego ao altar, coloco a lanterna no chão e acendo todas as
velas. Há cerca de meia dúzia. O livro de Draca permanece imóvel desde a
última vez. Colocado no altar como uma espécie de bíblia. Como a palavra
de Draca St. James é o que é cultuado aqui.
Draca. Significa dragão. É de onde os dragões vêm, eu acho. A
tatuagem nas minhas costas formiga e eu estremeço. A ideia da marca de
Jericho em mim me dá algum conforto, alguma proteção contra esse
homem horrível que me odeia até do além-túmulo. Por nenhuma outra
razão que o sangue que corre em minhas veias.
Eu levanto o tomo pesado do suporte e o coloco na minha frente. Não
posso deixar de olhar para a porta como uma espécie de ladrão enquanto
abro a capa. Culpa.
Meu primeiro pensamento é, é lindo. Isso pertence a um museu. Eu
provavelmente não deveria lidar com isso sem luvas, mas está aqui, outros
parecem estar lidando com isso e preciso de informações. Preciso saber se
Julia está certa.
Não. Eu preciso provar que ela está errada.
Errada sobre o meu futuro.
Errada sobre Jericho.
Porque eu sei uma coisa sobre mim. Eu sou muito clara sobre isso, na
verdade. Não quero que ele seja meu demônio. Eu quero que ele seja meu
anjo.
Então começo a ler a história de Draca. Li sobre como a família St.
James está ligada ao IVI. Quão humildes foram seus começos. Eu li sobre o
trabalho que Draca fez dentro da Sociedade. Vejo como ele construiu uma
fortuna para si mesmo. Para sua eventual família. Eu vejo o quão difícil era a
vida dele.
O script é difícil de decifrar em alguns lugares. Está desbotado em
alguns pontos e a caligrafia é antiquada. Mas quando vejo a primeira
referência a um Bishop em poucas páginas, volto vários parágrafos para ter
certeza de que não perdi nada.
Draca St. James e Reginald Bishop se odiavam desde o início. De
quando Draca trabalhava para a família Bishop. À medida que ele ficava
mais rico e se tornava mais valioso para a Sociedade, Reginald se ressentiu
dele. Pelo menos foi assim que Draca escreveu.
Eu li como ele comprou a terra do Bishop. Esta parte Jericho deixou de
fora de sua história. Ele enganou Reginald Bishop. Bem, não muito
enganado. Tudo foi feito legalmente. Ele apenas se certificou de que Bishop
estava encurralado quando apresentou a oferta. Porque Reginald teve
problemas com a Sociedade. Segundo Draca, ele era um jogador, um
bêbado e pior.
Ele continua e eu pulo várias páginas de Draca vomitando ódio. É
estranhamente visceral ler as palavras e estremeço, olhando para a pedra
que cobre seu túmulo mais de uma vez, como se esperasse que ele se
levantasse debaixo dela, odeio trazê-lo de volta à vida.
Pego o livro e o levo para um dos bancos. Sento-me, coloco-o no colo
e viro as próximas páginas até ver o nome de Mary. A história dela é como
Jericho contou. Draca se apaixonou por ela à primeira vista e se casou com
ela em poucas semanas. O muro ainda não havia sido erguido para dividir as
propriedades, mas me pergunto se o que aconteceu com ela foi o que fez
com que fosse construído.
A história de Mary é triste. Eu li cada palavra dele. Mesmo no
momento em que encontrou sua amada esposa pendurada no suporte de
madeira no porão da casa que ele estava construindo para ela. Era o quarto
deles de acordo com esse relato. Eu me pego sentindo por Draca St. James.
Eu sinto a dor dele. Sua perda. Eu sinto seu desgosto. E, de alguma forma,
entendo a raiz de seu ódio, embora ainda não consiga reconciliá-lo com o
ódio por todos os Bishops.
Olho para seu túmulo novamente e estremeço. Viro a página. Esta está
tão gasto que não consigo distinguir muitas palavras, então continuo
virando até ver o nome de Nellie escrito em um rabisco enorme e furioso no
topo de uma folha. Isso é diferente da narrativa das páginas anteriores.
Aqui, Draca não se preocupou em tecer nenhum conto romântico. Nellie
não era uma pessoa. Ela era uma coisa. Um peão.
Como eu.
Eu conheço esse pensamento… essas palavras são verdadeiras. Eu sou
o peão de Jericho. O peão do diabo. A noiva do diabo. A questão é que eu
vou sobreviver ao jogo dele? Sua vingança? Posso me tornar sua redenção?
Draca usou marcadores nas páginas dedicadas a Nellie Bishop. E eu me
sinto um pouco doente para lê-las.
A primeira entrada é a noite em que ele a levou. Sua iniciação do Rito.
O Conselheiro, um homem chamado David Bonaventure, autorizou a
entrega de Nellie Bishop a Draca St. James.
O segundo ponto descreve Nellie. Descreve como ele a despiu e a
examinou. Como ele a fez trabalhar como a mais baixa da equipe,
mantendo-a nua enquanto ela esfregava o chão e limpava comadres. Como
ele a acordaria para mandá-la buscar água no meio da noite. Como ele
abusou dela até deixá-la exausta a ponto de ela ficar pele e osso.
Eu penso na noite em que Jericho me levou. Como ele me despiu. Há
uma semelhança, mas onde Draca era implacável, Jericho me deu a camisa
de seu corpo, seu calor ainda agarrado a ela.
Ele fala sobre como ele a usou sexualmente. Como ele se certificou de
nunca depositar sua semente onde ela pudesse criar raízes.
A próxima página descreve o primeiro jogo que ele jogou com ela. A
perseguição, como ele chamava. Ele a vendava, no meio da noite, a levava
para um local aleatório da propriedade, obrigando-a a retornar ao poço, no
que ele mesmo escreve, é um espaço de tempo inatingível. Ele a puniu
quando ela chegou tarde demais. Como ele era cruel em seus castigos.
Nós jogamos esse jogo também. Um semelhante, pelo menos. Se eu
não tivesse caído e batido minha cabeça, se eu não tivesse desmaiado,
Jericho teria me punido como Draca fez com Nellie? Ainda me lembro de
suas palavras naquela noite. Como ele pretendia tirar as primeiras gotas de
sangue de mim.
Penso em fechar o livro, querendo voltar para casa. De volta para sua
cama. Para o calor e conforto dele. Quero esquecer o que li. Mas as palavras
de Julia me assombram.
Você deve ler sua história. Seu futuro está escrito nela.
Estou com tempo emprestado. Eu toco minha barriga. Eu tenho nove
meses. Menos.
Eu me obrigo a ler outra passagem. Outro ponto de bala. Um relato
detalhado de como ele a trouxe para esta capela. Como ele a acorrentou ao
altar. Chicoteou-a até sangrar para que seu sangue penetrasse no chão de
pedra. Olho para o altar. As correntes ainda estão lá? De volta às sombras?
Viro a página. Jericho disse que não vai me machucar, mas, enquanto
pulo a próxima página e meia dúzia de pontos, me pergunto novamente se
não fiz a pergunta certa. Se eu deveria ter perguntado se ele me mataria
uma vez que eu lhe desse um filho.
Draca St. James fez Nellie cavar sua própria cova na noite anterior à
sua execução. Sua morte era para ser uma execução. Mas na manhã
seguinte, eles encontraram o corpo dela no poço. Estou enjoada quando leio
as palavras de Draca St. James. Sua total decepção por não poder matar a
garota inocente ele mesmo. Como ele não podia enforcá-la em uma árvore
onde seu pai iria ver seu cadáver apodrecer antes de finalmente enterrá-la
quando o fedor ficasse muito ruim e as moscas se tornassem insuportáveis.
Sinto-me fisicamente doente com suas palavras.
Fecho o livro querendo ficar longe dele. Querendo esfregar qualquer
parte de mim que o tocou. Querendo ficar longe deste lugar. Eu me levanto,
esquecendo a lanterna que cai com um barulho alto no chão de pedra. Ele
reverbera nas paredes. Eu me curvo e tenho que esticar meu braço sob o
banco para alcançá-la.
É quando ouço a porta da capela se abrir. Eu juro que meu coração
para então. Juro que cai direto no meu estômago quando os passos se
aproximam. Estou agachada escondida pelo banco, a luz da minha lanterna
me denunciando.
Quando olho para cima, lembro de algo que Jericho perguntou. Se eu
fosse capaz de distinguir ele e seu irmão se eles estivessem mascarados. Eles
são construídos da mesma forma, a maneira como andam e ficam de pé é a
mesma. Mas antes de ver seu rosto, só sei que é Ezekiel pela sua colônia.
Uma diferença sutil, mas distinta, do perfume de assinatura de Jericho.
Enquanto arrasto meu olhar para encarar o homem de pé diante de mim,
acho que deveria sentir alívio por não ser Jericho. Eu deveria. Mas eu não
faço.
CAPÍTULO DEZOITO
JERICHO
Encontro Dex na rua da casa decadente na Seventh Ward. Nossos
carros se destacam entre os veículos em ruínas.
Ele me chamou para encontrá-lo aqui logo depois que eu levei Isabelle
de volta para casa. Quando ele explicou por que eu sabia que tinha que vir
ver por mim mesmo.
Dex sai do Rolls Royce enquanto estaciono. Eu o vejo enfiar uma
pistola na parte de trás de suas calças.
— Qual é? — Eu pergunto.
— Fim da rua. A porta da garagem emperrada.
— Você tem certeza sobre isso?
— Positivo. Eles entraram na garagem. Ela deve ter deixado o garoto
no carro porque eles não fizeram nenhuma parada. Ela e dois homens
entraram pela porta da frente. E você vai achar isso interessante. — ele diz
enquanto descemos a rua em direção à casa. — Fiz uma pequena pesquisa
enquanto esperava você chegar aqui. Adivinha quem é o dono da casa.
Eu me viro para ele, curioso. — Não me diga os Bishops.
— Não, melhor ainda. A escritura está em nome de Marjorie Gibson.
— Gibson? — Lembro-me, mas é um nome bastante comum.
— Mãe de Danny e Gerald Gibson, o primeiro está cumprindo pena de
prisão perpétua pelo assassinato de Christian York.
Eu paro. Tente entender o que Dex está me dizendo.
— Marjorie está morta se você quiser saber. Teve um ataque cardíaco
há cerca de seis anos. Seus filhos caloteiros moravam na casa
separadamente e juntos de vez em quando. A propósito, isso é
principalmente um registro público.
— Você está brincando comigo? Julia Bishop contratou o irmão de
Danny Gibson para executar Isabelle?
Ele dá de ombros quando chegamos a casa. Uma televisão está ligada.
Posso ver os flashes de cores através das cortinas e ouvir o tinir de um
comercial pela janela fechada.
— Ele não se mexeu desde que eles foram embora. — Dex diz.
Olho para a garagem com a porta parcialmente aberta. Parece presa
em um ângulo. Eu me inclino e posso ver a van branca com a placa suja.
Subo a calçada enquanto um grupo de três homens atravessa ruidosamente
a rua. Eles param para olhar para nós. Dex dá dois passos em direção a eles
e eles saem correndo. Eles são jovens e Dex é intimidador. É uma das razões
pelas quais o contratei.
Posso ouvir a TV na casa quando chego à garagem. Dex fica do lado de
fora quando eu abaixo minha cabeça para entrar. Pego meu telefone para
usar a lanterna e tenho certeza de que era a van. Reconheço os primeiros
dígitos da placa.
A janela do lado do motorista está abaixada. Quando olho para dentro,
tenho que prender a respiração por causa do fedor. Eu posso ver recipientes
vazios de fast food. Um maço de cigarros meio cheio. Isqueiros. Mais lixo. E
pendurado em um pequeno laço no espelho retrovisor está um ursinho de
pelúcia.
Porra doente.
Desligo a lanterna e volto para fora. Paramos na calçada escura.
— Entramos? — Dex pergunta.
Eu quero. Porra eu quero. Mas eu balanço minha cabeça. — Traga
alguns caras aqui para vigiá-lo.
Dex acena com a cabeça. — Envolver IVI?
— Não. Pegue nossos próprios caras. Não quero que ninguém perceba
que ainda sabemos de alguma coisa.
— Entendi. — Ele já está com o celular no bolso mandando uma
mensagem.
Olho de volta para a casa enquanto abro a porta do carro. Se havia
alguma dúvida sobre o envolvimento de Julia Bishop no esquema de Carlton,
acabou. Essa revelação complica as coisas porque Isabelle confia em Julia.
Ela tem um relacionamento com ela que é muito diferente daquele com seu
irmão. Há também a questão do filho de Julia a considerar.
Entro no carro e ligo o motor.
Se houve um momento que eu esperava que as coisas fossem
diferentes no que dizia respeito a Julia, pelo amor de Isabelle, ele se foi. As
coisas simplesmente correram para o lado de uma maneira muito ruim.
CAPÍTULO DEZENOVE
ISABELLE
— O que você está fazendo aqui, Isabelle? — Ezekiel me pergunta. Ele
estende a mão para me ajudar a levantar.
Eu pego a lanterna e pego sua mão. Ele me ajuda a levantar e eu tiro a
poeira do meu jeans para ganhar algum tempo.
— Eu estava… eu não conseguia dormir.
Ele me solta e se abaixa para pegar o livro. — O que aconteceu com
fazer uma xícara de leite morno se você não consegue dormir? — ele
pergunta casualmente, seu foco em endireitar a página dobrada. Lendo-o. É
aquele sobre Nellie. — Há uma biblioteca na casa se você quiser algo para
ler. — Ele a fecha, colocando-a de volta no altar.
— Eu não sabia que você estava em casa.
— Não, eu acho que você não fez. Eu acabei de voltar. — Ele me olha,
os olhos caindo na poeira ainda agarrada aos joelhos do meu jeans. — O que
você estava fazendo? E não me diga que estava orando.
— Eu briguei com seu irmão. Bem, não uma briga… apenas, as coisas
estão estranhas. — Eu respiro fundo. Ele não é estúpido. Não vou tentar
inventar alguma história de por que estou aqui. Qual seria o ponto? — Eu
queria saber o que Draca fez com Nellie. — digo, apontando para o túmulo
de Draca.
— Para se preparar para o que Jericho pode fazer?
Eu não respondo.
— Hum. — Sua testa está enrugada, olhos escuros e atentos. Assim
como Jericho olha para mim, como se ele visse através de mim. — E saber
ajuda você?
Esfrego meus braços com um calafrio repentino e olho ao redor. Eu
balanço minha cabeça.
— Ele era um pedaço de trabalho, não era? — ele pergunta, traçando
a capa de madeira esculpida do livro.
— Ele odiava Nellie, embora ela não tivesse nada a ver com o que
aconteceu com Mary. Foi o pai dela que foi culpado.
— Pecados do pai. Você sabe como isso vai.
— Ou o meio-irmão no meu caso. — Sento-me no banco novamente e
ele se junta a mim.
— Você não tem medo de ficar aqui sozinha no meio da noite?
Eu dou de ombros. — Um pouco. Mas às vezes tenho mais medo de
estar dentro de casa.
O canto de sua boca se curva para cima e ele exala. — Meu irmão
pode ser um idiota intimidador, mas ele não vai te machucar, Isabelle.
Eu sorrio. — Concordo totalmente com essa primeira parte.
Ele sorri.
— Mas por que você acha que ele não vai me machucar? É por causa
do bebê? — Percebo quando digo que não tenho certeza se Ezekiel sabe
sobre a gravidez. Mas dada a sua expressão, não é novidade.
— Não, não tem nada a ver com o bebê. Ele simplesmente não vai. —
Ele olha para o altar. — Ele pode ter planejado, mas não vai. Ele não pode.
— Não pode?
Ele se vira para mim e vejo sombras sob seus olhos. Um pouco de
cabelo grisalho na têmpora. — Vamos, eu acompanho você de volta para a
casa. — diz ele, de pé.
— O que você está fazendo aqui no meio da noite, afinal? Apenas
dando um passeio na floresta? — Eu pergunto, de pé.
— Visitando os mortos. — diz ele. — Vamos lá. — Ele fecha a mão
sobre o meu braço.
— Só um minuto. — eu digo, lembrando das velas que acendi no altar.
— Não tenho certeza se você tem um minuto. Meu irmão chegou em
casa há pouco.
Meu coração cai no estômago pela segunda vez naquela noite. — O
quê?
— Ele estava de plantão em seu escritório. Se você tiver sorte, pode
subir as escadas antes que ele perceba que você se foi.
— Eu nunca tenho sorte. — eu digo assim que a porta da capela se
abre como se para confirmar a verdade da minha declaração.
Eu suspiro. Uma rajada de vento apaga duas das velas e meu marido
está na soleira da capela. O pouco de luz brilhando ao redor dele o lança em
uma sombra tão escura, tão ameaçadora, eu me vejo encolhendo de seu
olhar.
Mas não sou eu que ele está olhando.
É o irmão dele.
Sinto a mão de Ezekiel em mim, envolvendo meu braço. Então me
lembro do que Jericho disse sobre qualquer homem me tocar.
— Irmão. — Jericho diz.
Jericho permanece onde está, sem piscar. Seus olhos se movem da
mão de Ezekiel no meu braço para mim. Ele entra na capela deixando a
porta bater atrás dele. Juro que sacode até as paredes de pedra deste
edifício antigo.
— Irmão. — responde Ezekiel.
Eu engulo, meu coração acelera enquanto Jericho come o espaço
entre eles, movendo-se tão rápido quanto uma sombra. Ele agarra o pulso
de Ezekiel. Eu me pergunto se Ezekiel esqueceu que estava me segurando
ou se ele mantém a mão no meu braço para provocar seu irmão.
— Nós discutimos isso. — Jericho diz, o rosto a centímetros de seu
irmão. Dois gigantes se preparando para a batalha. — Você não toca no que
é meu.
Olho do rosto duro de Jericho para o de Ezekiel e vejo um canto de sua
boca se curvar para cima. — Vê o que quero dizer, Isabelle? — ele pergunta.
Presumo que ele esteja se referindo ao comentário intimidador, mas por
mais casual que pareça, ele não desviou os olhos de seu irmão.
— Ele não me tocou. — me apresso em dizer.
Ezekiel me solta. Sorrisos. — Eu não tenho medo do meu irmão,
querida.
— Querida? — Jericho fica na cara de Ezekiel, seu corpo grande me
cutucando de lado. — Talvez você devesse ter. — Jericho diz a ele.
— Relaxe. — diz Ezekiel, sua expressão e linguagem corporal
confirmando que ele não está com medo. Mas ele está pronto para a
batalha. Eu me pergunto se isso é sobre Kimberly. Se esta é uma batalha de
anos que acontecerá, seja esta noite ou outra noite. Ou se é realmente
sobre mim. Se ele se sente tão possessivo sobre mim. Mas por que ele iria?
Eu sou um meio para um fim. É Kimberly que ele amava.
Kimberly ele amava.
Sinto minha testa enrugar quando olho para o chão de pedra, meu
olhar pousando na gravação do nome de Draca em seu túmulo. Para Mary.
Eu penso sobre o quanto ele a amava. O que ele fez para vingá-la.
Eu balanço minha cabeça na direção que meus pensamentos tomam.
Jericho St. James não me ama. Isso nem é sobre amor. Não para nenhum de
nós. Então, por que eu sinto esse aperto no meu peito?
— É apenas uma expressão. — diz Ezekiel, chamando minha atenção
de volta para o momento. Ele remove a mão de Jericho de seu pulso. —
Você e eu precisamos conversar.
— Sim. Nós faremos. Mas primeiro preciso lidar com minha esposa.
Eu me pego dando um passo para longe em seu olhar de soslaio.
Ezekiel olha para mim também, mas apenas brevemente, depois se
vira para o irmão. — Não a castigue. Nós não estávamos aqui juntos. Eu a
surpreendi.
— Se vou ou não punir minha esposa não é da sua conta.
Eu coloco minha mão contra meu estômago para parar a vibração de
antecipação do que está por vir.
— Tire isso de mim. Ela não. — diz Ezekiel.
— Saia.
Ezekiel abre a boca, mas eu alcanço minha mão em seu braço para
detê-lo. — Vai. Está tudo bem. — eu digo.
Um chocalho como o de uma cobra alertando sobre um ataque
iminente vem do peito de Jericho. É preciso tudo o que tenho para me
fortalecer. Para ficar de pé mesmo se eu ainda chegar no meio de seus
peitos.
— Eu também não tenho medo dele. — eu digo para Ezekiel mesmo
que meus olhos estejam travados com os de Jericho.
— Isso foi um erro. — diz Jericho e pega meu braço. — Saia, Zeke. —
ele sussurra as palavras, nunca desviando o olhar de mim.
Ezekiel não se mexe e não responde imediatamente. Mas então ele
olha para o livro de Draca no altar e é como se ele entendesse alguma coisa
porque sua postura muda. Ele balança a cabeça, agarra Jericho pela gola e o
força a sair de mim. — Não seja um idiota do caralho. — ele diz a ele.
— Saia daqui. — Jericho diz a ele.
— Se você está planejando fazer o que eu acho que você está
planejando fazer, então não. Eu não vou permitir.
— Você não vai permitir isso?
— Não. Eu não vou.
— Ela não é sua.
— Não, ela não é. Mas se você vai jogar aquele jogo idiota que nosso
ancestral jogou…
— Não vai tão longe. — Jericho o corta.
Há um longo momento de silêncio, a tensão tão espessa que é quase
difícil respirar em torno dele.
— Se isso acontecer, eu vou te matar. — diz Ezekiel.
— Uma Bishop entre nós. — Jericho diz, suas palavras me ferindo de
uma forma que não deveriam.
— Não seja estúpido, Jericho. Não estrague tudo. — diz Ezekiel.
— Eu disse que não iria tão longe. — Jericho repete firmemente.
Ezekiel o estuda, então olha para mim, hesitação clara em seus olhos.
Eu quero dizer a ele para ficar. Para não me deixar aqui com meu marido.
Meu próprio marido. Mas ele faz. E ele deveria. Porque Jericho está certo. O
que quer que Ezekiel o esteja alertando não é para ele lidar. É nosso. Meu e
de Jericho. E eu sei nesse momento que o que acontecer a seguir, o que ele
faz ou deixa de fazer, mudará as coisas para nós. Vai mudar tudo.
CAPÍTULO VINTE
ISABELLE
— Dispa-se.
Ele me solta, andando ao redor do altar. Está escuro como breu, então
não tenho certeza do que ele está fazendo. Mas então ouço o barulho das
correntes e me lembro da passagem do diário de Draca.
— Nada aconteceu. Ele não fez nada. Eu não fiz. — eu me apresso em
dizer enquanto Jericho caminha de volta para a luz das velas.
Ele dá um passo à minha frente. — Dispa-se. — ele repete, em
seguida, caminha ao redor do outro lado. Eu sei o que ele está fazendo
quando ouço o mesmo som. Outro jogo.
Não, não é um jogo. Uma punição.
Ele pretende me punir como Draca St. James puniu Nellie Bishop.
Eu começo a suar, incapaz de me mover ou respirar quando ele vem
ao virar da esquina. Respiro fundo quando vejo o cabo trançado do chicote
em sua mão, as caudas longas e finas que minha ancestral suportou. Ele o
coloca no altar como se aquela coisa cruel fosse uma oferenda a Draca.
Preciso correr. Eu preciso correr agora. Mas eu apenas fico lá e o
observo enquanto ele tira a jaqueta, dobra-a sobre as costas de um banco e
depois enrola as mangas de sua camisa.
— Estou começando a me perguntar se preciso verificar sua audição.
Eu engulo, pisco com força enquanto olho para a porta, então para
ele.
— Não se preocupe, Isabelle. Eu sou mais rápido que você. Mais forte
que você.
— Nada aconteceu.
— Eu acredito em você.
— Então por que você vai me punir?
Ele dá um passo em minha direção, me forçando a dar um passo para
trás. Minhas costas tocam o altar. — Para te ensinar de uma vez por todas
que você é minha. — Ele agarra meu suéter e o rasga no meio.
— Não! — Eu tento passar por ele, mas seu braço está em volta da
minha cintura. Ele me puxa para ele, minhas costas em seu peito, enquanto
ele abre o botão e o zíper do meu jeans.
— Vai ser mais fácil se você se submeter.
— Eu não quero isso! — Eu tento empurrar seu braço, mas ele é como
uma porra de uma parede de tijolos.
— Acho que Nellie também não. Submeta-se ou não. Escolha.
Eu empurro as palmas das minhas mãos em meus olhos. — Por favor!
— Submeta-se ou não. Escolha. — ele repete.
Eu concordo. Tento controlar minha respiração. Ele não vai me
machucar. Ezekiel disse isso. Jericho mostrou que se machucaria antes de
me machucar. Eu tenho que acreditar nisso. Mas talvez o que ele viu esta
noite, eu com seu irmão, eu desobedecendo a sua lei depois que menti para
ele sobre Julia, talvez ele tenha mudado de ideia. Talvez seja demais, muitas
traições.
— Não é então. — diz ele e começa a empurrar meu jeans.
— Eu vou fazer isso! — Eu grito, empurrando seu braço, para ele. Enfio
as mãos no cós da calça jeans e a empurro, meio de dentro para fora, meus
sapatos descartados ao mesmo tempo, meus pés descalços na pedra fria.
Ele solta meu sutiã e ele escorrega dos meus braços. Antes de me
endireitar, ele me leva de volta para o altar. Nós nos afastamos disso em
nossa luta.
Eu resisto. Não posso não. Mas ele é muito mais forte do que eu e
segura meus pulsos, esticando um braço para o lado do altar, onde ele o
prende em um punho de ferro gelado. Eu grito quando ele faz isso, tentando
me soltar quando ele pega meu outro braço e o estica tão largo quanto o
altar, me prendendo no lugar com a segunda restrição. Ele se move para trás
do altar e puxa as amarras, forçando-me a me curvar quase no chão com as
correntes encurtadas.
Quando ele se afasta de mim, olho para Jesus na cruz.
— Não me diga que você está rezando. — Jericho diz enquanto
envolve sua mão ao redor do cabo trançado do chicote e faz questão de
arrastá-lo debaixo de mim. — Não existe deus, Isabelle. Ou se houver, ele se
esqueceu de nós séculos atrás. Pense nisso. — diz ele, deslizando o cabo
tenso do chicote entre minhas pernas. — Se ele fosse real, se ele se
importasse com qualquer um de nós, você estaria aqui agora? Você estaria
acorrentada no mesmo lugar em que sua ancestral esteve séculos atrás?
Onde meu antepassado a sangrou para pagar pelos pecados de seu pai?
— Por favor, Jericho. Você não está pensando. Deus. Por favor.
— Quantas vezes eu tenho que te dizer que Deus não existe!
— Eu…
— Se houvesse, Mary teria sido estuprada por aquele monstro? Ela
teria se enforcado? Será que Zoe teria? Minha filha ficaria sem mãe?
Ele para então e eu viro minha cabeça. Meus ombros doem, meus
braços muito largos.
— Jericho?
Eu o sinto em meus dedos de trás no cós da minha calcinha. Ele os
empurra para baixo sem cerimônia.
— Seu irmão estaria morto? — ele pergunta mais calmamente.
Eu deixo cair minha testa no altar. Ele tem razão. Duvidei da existência
de Deus por anos, mas nunca conscientemente. Nunca se atrevendo a ir tão
longe.
— Mas não é disso que se trata, é? Não é por isso que estamos aqui,
você e eu. — Ele segura minha bunda com força, dedos cavando na carne,
me forçando a ficar na ponta dos pés. Estou olhando para frente, corpo
tenso. Ele está nas minhas costas novamente, respiração no meu ouvido. Eu
sinto o chicote na mão que serpenteia ao redor do meu estômago.
Eu viro meu rosto um pouco para que eu possa vê-lo e ele pode me
ver.
— A quem você pertence? — ele pergunta e antes que eu possa
responder, ele dá um tapa na minha bunda me fazendo pular. — Quem?
— Você!
Ele bate novamente. — Diga. Tudo isso.
— Você! — Outro tapa. — Eu pertenço a você!
— O que eu te disse antes de sair hoje à noite?
Eu penso. Ele bate. Mas ele ainda tem o chicote na outra mão. E ele
não está me machucando. Na verdade, não.
— Isabelle.
— Para não trair você.
— E por que você estava na capela com meu irmão?
— Eu não estava. Juro. Vim aqui para ler esse livro. Eu queria lê-lo.
Precisava saber o que ele fez com ela.
— Porque você tem medo que eu faça isso com você. Mesmo que eu
tenha dito que não vou te machucar.
— Você está me machucando agora.
— Eu estou? Uma pequena surra não é o que ela suportou.
— Não. Ele a sangrou. Ele a chicoteou até ela sangrar.
— Certo. Tenho certeza de que ele a rasgou de volta.
— E você está segurando o mesmo chicote.
— Estou usando? — ele esfrega o espaço que acabou de espancar, seu
toque quase terno.
Balanço a cabeça, deixo cair no altar porque não posso mais fazer isso.
Não posso.
— Eu não sei de cima para baixo com você. — eu digo, minha voz um
sussurro. — Eu não entendo o que está acontecendo. O que acreditar. Em
quem confiar.
— Eu vou te dizer, Isabelle. Você me escolhe. Você confia em mim.
— Você me acorrentou, Jericho. Literalmente acorrentada. Como
posso confiar em você?
Ele agarra meu cabelo, levanta minha cabeça e a vira, me forçando a
olhar para ele. — Minhas correntes vão mantê-la segura. Minhas correntes
manterão nosso bebê seguro.
Nosso bebê.
Meu Deus. Que confusão fizemos.
Eu expiro, lágrimas escorrendo dos meus olhos, meus lábios salgados
com elas. Ele me beija e acho que ele deve sentir o gosto delas também,
essas lágrimas. É o que ele queria quando me levou. Para me ver chorar.
Para me sangrar.
Eu ouço o chicote cair no chão e ele está atrás de mim, empurrando o
cabelo do meu pescoço, beijando ao longo do meu ombro, minha
mandíbula. Ele empurra minhas pernas mais largas e um momento depois,
ele está dentro de mim.
— Confie em mim, Isabelle. Você precisa confiar em mim. Para me
escolher.
Escolher ele.
Ele empurra em mim, envolvendo um braço em volta da minha cintura
para colocar a palma da mão sobre a minha barriga, sobre o nosso bebê. A
outra ele desliza entre minhas pernas, dedos experientes encontrando meu
clitóris, sabendo exatamente como manipulá-lo.
— Eu quero. — eu digo a ele. É verdade. Eu quero.
— Então faça. Eu não vou te machucar. Eu já não te disse isso? Eu
escolho você.
Eu escolho você.
Ele puxa seus braços para cada lado dos meus e um momento depois,
estou livre das correntes. Ele está me virando, me segurando. Eu me agarro
a ele, de costas para o altar, minhas pernas em volta dele, nossas bocas
travadas, olhos abertos.
— Eu não vou te machucar. — diz ele novamente.
— Você promete?
— Eu prometo. Você só tem que me escolher. Ser minha. Só minha.
Eu quero acreditar nele. Preciso. Porque isso é muito difícil. E então eu
aceno, fechando meus olhos e segurando firme nele quando a primeira
onda de orgasmo vem. Eu deixo cair minha cabeça na curva de seu pescoço,
sua pele salgada contra minha língua. Eu gemo, gozando e sinto-o gozar,
sinto-o estremecer. Penso neste ato nesta capela, neste lugar sagrado.
Penso em Draca e Nellie. O que ele fez com ela neste mesmo lugar. E acho
que talvez um anule o outro. O amor anula o ódio.
Amor.
Amor sobrescrevendo ódio.
Escolha-me… Eu escolho você.
Sinto lágrimas frescas escorregarem dos meus olhos. Quente, úmida e
triste. Porque acho que o amo. Eu sei que eu faço. E também sei que quando
ele diz que não vai me machucar, não tem nada a ver com meu coração.
Estou acorrentada a ele. Eu sou sua prisioneira. Dele. Mas há muita história
entre nós para algo próximo ao amor. Vale séculos. E mesmo que ele queira
me escolher, não acho que Jericho St. James possa deixar sua vingança de
lado para me amar.
CAPÍTULO VINTE E UM
JERICHO
Não me incomodo em bater antes de entrar no escritório de Zeke
depois de levar Isabelle para a cama. Não consigo pensar no que aconteceu
entre nós esta noite. Não é possível processá-lo. Eu quis dizer o que eu
disse. Eu não vou machucá-la. Eu não vou deixar ninguém machucá-la
também. Eu a escolho. Mas essa escolha é forjada com muita história. Muita
tragédia.
Na noite em que a levei, era minha intenção usá-la para minha
vingança. Mas tudo é diferente. Cada coisa. E eu não olho para ela como
deveria. Como eu pretendia. Eu me importo com ela, isso não tem nada a
ver com ela carregando meu bebê. É ela.
Zeke se afasta de sua mesa e me olha como se estivesse esperando
por isso.
— O que você estava fazendo lá fora com minha esposa?
— O que você acha que eu estaria fazendo?
— Eu não sei, Zeke. Você me diz. Porque você guarda muitos segredos.
Ele bufa, fica de pé. — Não é essa a marca registrada da nossa família?
— ele diz, movendo-se ao redor da mesa para ficar a centímetros de mim.
Ele nunca foi intimidado por mim. Às vezes me pergunto se ele não gostaria
de uma briga. Tirar um pouco dessa velha raiva. Meu irmão sempre foi meu
igual em tamanho e força. Pelo menos desde que éramos adultos. Ele era
mais magro do que eu quando era criança. Como se ele e Zoë parecessem
dividir o peso entre eles até os catorze anos. Foi quando ele começou a
crescer em si mesmo. Zoë permaneceu pequena, desenvolvendo-se
lentamente. Ela ainda era uma menina quando morreu.
Zoë. Merda. Sinto falta da minha irmã magricela e pateta. Não que ela
fosse assim no final. No meio ano que antecedeu seu suicídio, ela ficou tão
quieta e reservada. Sombria. As poucas vezes que tentei alcançá-la, não
consegui. Pergunto-me se eu não tivesse desistido, ela estaria aqui hoje.
Eu balanço minha cabeça. Pensar nisso é como se afogar. Não posso
morar naquele lugar. No desperdício disso. A perda dela. Eu não pude salvála. Não consegui salvar Kimberly. Agora há Isabelle que precisa ser salva.
Vou falhar com ela também? Meu histórico sugeriria isso.
Empurro minha mão no meu cabelo e me afasto de Zeke. — Por que
você estava lá fora?
— É para onde sempre vou quando chego em casa.
— A capela?
Ele balança a cabeça. — O cemitério.
Ele é um homem melhor do que eu. Nunca fui de visitar Zoë ou
Kimberly na minha prioridade. Eu percebo o quão ruim isso me faz. —
Deixando flores em seus túmulos.
Ele concorda.
— Papai também? — Eu pergunto, precisando desviar minha própria
falta.
Ele bate a mão no meu peito e me empurra. — Foda-se, irmão.
Eu agarro seu pulso. — O que você estava fazendo com minha esposa?
Ele se solta. — Sua esposa já estava lá. Na capela. Eu vi que as velas
estavam acesas e entrei para investigar apenas para encontrar Isabelle lá.
Ele não está mentindo. Eu posso ver isso. Ele nunca mentiu para mim.
Isso vale para os dois lados. Mas nós guardamos segredos e segredos são
tão ruins quanto às mentiras.
— Ela foi à capela sozinha?
Ele concorda. — Acompanhando a leitura dela.
Sinto minha respiração apertar.
— Ela está bem? — ele pergunta.
Eu o estudo entendendo seu significado. Ele sabia o que eu faria esta
noite. Ele leu o diário de Draca. Nós todos fizemos. — Eu disse que não iria
tão longe. Eu não menti.
— Mas você queria assustá-la.
Eu não respondo porque que tipo de diabo admitir isso me faria? Já sei
o monstro que sou. Não há necessidade de admitir isso para o meu irmão.
— Sabe, Draca St. James também não era de idolatrar, irmão. — ele
diz. — Mas você tem um histórico ruim quando se trata de escolher seus
deuses, não é?
Pai. Ele quer dizer pai. E eu me lembro da nossa última conversa no
meu escritório. Lembro-me de como essa conversa passou do pai para Zoë.
Para a morte dela. Para ele encontrá-la pendurada no porão. E, novamente,
esse sentimento irritante retorna. Deveria ter sido eu. Eu era o irmão mais
velho. Eu deveria tê-la encontrado e poupado ele disso.
— O que ele fez com ela? — Eu pergunto e juro que ele sabe
exatamente do que estou falando. Eu vejo isso nas linhas que marcam seu
rosto, na escuridão que lança sombras de dentro dele. É quando vejo as
semelhanças entre ele e Zoë. A única vez. Por um momento, apenas observo
meu irmão quebrar. Só por uma fração de segundo eu vejo isso. Eu vejo a
fissura que está lá há anos. Profunda. Aprofundamento. Aquele que ele é
tão bom em esconder sob um exterior casual e legal.
— Deixe-o. — diz ele em uma voz quase irreconhecível. Ele limpa a
garganta. Fica mais reto. — Temos um problema mais urgente. — Ele enfia a
mão no bolso para pegar alguma coisa. Ele abre a palma da mão e vejo uma
ponta de cigarro.
Confuso, eu olho para ele.
— Eu não acho que sua esposa fume. Eu não peguei o hábito e sei
como você se sente sobre isso. — Zeke diz.
Eu odeio o cheiro de fumaça de cigarro. Sempre fiz. Papai fumava. Era
uma das coisas que eu não suportava nele. Ele fedia quando fumava. E ele
fumava ininterruptamente quando estava de mau humor. Geralmente era
um sinal de que coisas ruins estavam por vir.
Os funcionários assinam um contrato concordando em não fumar
dentro ou ao redor da propriedade. Se o fizerem, é rescisão imediata.
— Onde você encontrou isso?
— Cemitério. Há mais deles.
— Temos um novo jardineiro ou algo assim?
Ele balança a cabeça. — A menos que você contratou alguém. A
propósito, onde você estava esta noite?
— Vamos tomar uma bebida. — eu digo. Ele acena com a cabeça e eu
me movo para o sofá enquanto ele serve um copo de uísque para cada um
de nós. — Traga a garrafa. — digo a ele. Ele faz e se junta a mim.
— Eu não sou seu inimigo. Você sabe disso, certo? — Zeke me
pergunta.
Eu o estudo, aceno. — Você deveria me dizer, no entanto. A coisa com
o pai. É história. Muito passado.
— Você não quer saber disso, Jericho. Eu carrego este.
— Divida o peso.
— Não. — Ele bebe. — Conte-me sobre esta noite.
Respiro fundo e depois expiro. — Você sabia que Danny Gibson tem
um irmão?
— Por que eu me importaria? — ele pergunta. Ele reconhece o nome.
— Eu levei Isabelle para um show que o professor dela a convidou e
ela desapareceu por um tempo. Quando a encontrei, ela mentiu sobre com
quem estava.
— Com quem ela estava?
— Julia Bishop.
Suas sobrancelhas se unem.
— Dex viu Julia entrar em um carro com dois homens e seu filho. Ele
os seguiu até uma casa na Seventh Ward, onde Gerald Gibson mora. Aquela
van que quase matou Isabelle outro dia estava estacionada na garagem.
— Espere um minuto. Julia Bishop? Não Carlton?
Termino minha bebida, pego a garrafa e sirvo outra. — Esta era Julia.
Não tenho certeza se ela está trabalhando com Carlton ou sozinha. Eu não
quero questionar Gibson ainda. Acho que o seguirei por um tempo. Mas de
qualquer forma, um deles contratou Gerald Gibson para terminar o trabalho
que seu irmão começou.
Ele fica quieto por um longo minuto. — Onde Carlton entra nisso?
— Essa é uma ótima pergunta. Acabei de falar ao telefone com
Santiago. Ele está investigando a instituição de caridade da qual Danny foi
pago. Julia está administrando isso há anos.
— Isabelle tem alguma ideia?
Eu balanço minha cabeça. — E ela não vai acreditar em mim se eu
contar a ela. Eu preciso de provas. Mas mesmo que eu tenha, a gravidez é
muito recente. Ela tem estado tão doente. Não quero correr o risco de
perturbá-la.
— Essa não era sua preocupação esta noite.
— Golpe baixo, irmão.
— Mas merecido. — Ele termina sua bebida e serve outra. — Como
posso ajudá-lo?
— Eu deveria manter Isabelle trancada a sete chaves, mas é mais fácil
falar do que fazer. E eu não gosto das pontas de cigarro na propriedade de
qualquer maneira. Se alguém conseguisse entrar…
— Farei uma verificação de perímetro amanhã. Certifique-se de que a
parede não foi comprometida.
— Obrigado. Dex está vigiando a casa dos Bishop esta noite, mas eu o
quero aqui com Angelique e Isabelle. Precisamos de mais homens. E não do
IVI.
— Não é um problema. — Ele pega o telefone e percorre seus
contatos. Ele coloca o telefone no ouvido. — Precisamos nos encontrar. —
diz ele, depois de uma pausa. — Estarei aí em vinte. — Ele enfia o telefone
de volta no bolso e se levanta, termina seu uísque. — Vou me encontrar
com meu contato agora. Teremos homens aqui pela manhã.
— Eu vou com você. — eu digo, de pé.
— Sua esposa e filha precisam mais de você.
Eu me levanto e vou até ele. Dou um tapinha no braço dele. —
Obrigado por cuidar dela esta noite.
Ele acena com a cabeça e nós saímos, seguindo nossos caminhos
separados. Estou no pé da escada e ele está na porta da frente quando paro.
— Zeke?
Ele olha de volta para mim.
— Você vai me contar sobre o papai. Você tem que fazer.
Ele balança a cabeça.
— De uma forma ou de outra, vou descobrir a verdade.
Ele sai pela porta da frente e eu subo as escadas, parando para olhar
minha filha. Ela sorri em seu sono quando eu beijo sua testa. Sigo para o
meu quarto onde encontro minha esposa exatamente onde a deixei para
variar. Adormecida na minha cama, enrolada em volta do meu travesseiro.
Eu sorrio, afasto o cabelo do rosto dela. Ela sorri em seu sono, mas se
acomoda novamente. E eu me pergunto quando ela fez isso comigo.
Quando ela passou a me importar.
CAPÍTULO VINTE E DOIS
ISABELLE
As próximas duas semanas passam silenciosamente, embora eu
perceba que mais homens estão estacionados ao redor da casa. Quando
pergunto a Jericho sobre eles, ele casualmente me distrai, me dizendo que
não é nada, apenas segurança adicional para a família. Quando ele diz
família, ele cuida para que eu saiba que sou parte dessa equação. Ele está
diferente comigo desde aquela noite na capela. Mais suave. Nosso ato de
fazer amor também mudou. Transformado em algo erótico e sensual,
profundamente satisfatório em um nível que é muito mais do que sexual.
Jericho St. James sabe como manipular o corpo de uma mulher e dobrá-lo à
sua vontade. Eu sabia disso desde o primeiro dia. Mas o que está
acontecendo entre nós agora é muito mais.
E me sinto estranhamente feliz.
Jericho até abriu uma conta bancária para mim – bem, uma conta
conjunta – onde ele deposita muito dinheiro para as aulas semanais que
estou dando a Angelique. Estou ciente de que ele a configurou como uma
conta conjunta para poder controlar os fundos ou pelo menos saber o que
faço com eles. Ele até me deu um cartão de caixa eletrônico e um cartão de
crédito que são ótimos, exceto que eu nunca saio de casa, então também
inútil. Acho que é um gesto, no entanto. E consegui enviar a Paul um cheque
pelas aulas perdidas, com o que me sinto bem.
Ele e Zeke estão passando mais tempo juntos em seus escritórios. Eu
percebo a mudança quando eles se encontram. Veja os olhares trocados
entre eles.
Passo meus dias principalmente com Angelique e comecei minhas
aulas com o professor Larder. Ele é um bom homem, eu acho, mas ele é um
professor rigoroso. Embora eu saiba que vou aprender muito com ele, sinto
falta do meu pequeno grupo. Sinto falta de Paul, Megs e dos outros. Jericho
não está convencido de que Paul não estava envolvido no incidente na noite
do show. Ele me disse em termos inequívocos que, se Paul for autorizado a
voltar para casa, ele primeiro precisará se submeter a um interrogatório
completo. Essa é a condição dele. E é a minha escolha a fazer. Como sempre,
Jericho está me dando escolhas impossíveis. Mas agora, é mais fácil dizer
que vou lidar com isso outro dia.
Pelo menos ele permite que Megs nos visite, mesmo que não
tenhamos permissão para sair.
Estou cochilando quando o eco da porta de aço abrindo e fechando
me acorda. Alguém estava no porão?
— A reunião está marcada. — Zeke diz para Jericho quando eles
chegam a sala de estar. Estou sentada em uma confortável cadeira de couro
com encosto alto, o livro que estava lendo virado para baixo no meu colo.
Estou enrolada em uma bola, então tenho certeza que eles não me veem. —
Todas as mãos que precisam ser lubrificadas foram lubrificadas.
— Idiotas corruptos. — diz Jericho, prendo a respiração.
— Tem certeza que não quer que eu vá?
— Não, eu quero vê-lo com meus próprios olhos. Ouvi-lo contar a
história com meus próprios ouvidos.
— Os voos levam você até lá e de volta no mesmo dia, então você não
fará falta.
Jericho caminha até o manto onde pega um dos brinquedos
descartados de Angelique. Faço o menor movimento e o livro no meu colo
cai no chão, chamando sua atenção.
Nossos olhos se encontram.
Calor flui através de mim instantaneamente. Estou presa. Ele fica
parado me observando. Um momento depois Zeke aparece. Os dois juntos
assim, do mesmo lado, me olhando como estão, é enervante.
Eu bocejo e desenrolo minhas pernas para pegar o livro do chão.
— Você estava lendo? — Jericho pergunta, pegando o livro antes de
mim. Ele estende para mim e eu olho para ele.
— Eu estava. — eu digo, pegando-o dele. — Mas eu devo ter
cochilado.
— Você deveria subir e tirar uma soneca apropriadamente quando
estiver cansada.
— Eu estou bem. — eu digo. — Catherine fez um grande almoço. — Eu
tenho comido mais, meu apetite é furioso em alguns dias. E a náusea
passou. — E eu acho que este não foi o livro mais emocionante. — Eu
seguro o livro para ele ver, falando rápido demais. Tenho certeza que ele
pode ouvir. Tenho certeza de que ele sabe que eu estava escutando, mesmo
que não fosse intencional, então me levanto.
Ele sorri. — Fico feliz em ouvir isso.
— Vejo você mais tarde. — Zeke diz. — Eu preciso ir para o escritório
por algumas horas.
Jericho se vira para ele e assente.
— Adeus, Isabelle. — ele diz.
— Tchau. — Espero até que ele vá embora antes de me voltar para o
meu marido. — Você está indo a algum lugar?
— Achei que você estivesse cochilando.
Eu dou de ombros.
— Pensei isso. — Ele sorri. — Venha comigo. Tenho mais vitaminas do
Dr. Barnes. Elas foram entregues esta manhã.
— Você está? — Eu pergunto enquanto nos dirigimos para seu
escritório.
— Uma viagem de um dia. — diz ele enquanto abre a porta e gesticula
para eu entrar na frente dele. Eu faço e observo enquanto ele fecha a porta,
andando ao redor da mesa. Ele tira a chave do porão do bolso e a joga em
uma gaveta, depois me entrega dois frascos. — Aqui. O mesmo que você
tem lá em cima. Dois por dia.
Eu os pego. — Obrigada. Onde você está indo?
Ele verifica seu celular, digita uma resposta a uma mensagem, então o
enfia no bolso e se vira para mim. — Atlanta. Negócios. — Ele coloca meu
cabelo atrás da minha orelha e segura minha bochecha. — Estou feliz que
você esteja se sentindo melhor. — Ele me beija, apenas um selinho. — Você
está linda, Isabelle. Atrevo-me a dizer feliz?
Eu sorrio e dou de ombros tentando ser casual. Eu deixo cair meu
olhar enquanto a emoção levanta arrepios para cima e para baixo em meus
braços. Lembro-me daquela noite na capela. O que ele disse. O que ele me
pediu. O que eu escolhi.
Alguém bate na porta e ele limpa a garganta para responder. — Sim?
— Ele não se afasta ou tira a mão do meu rosto.
— Desculpe interromper. — diz Catherine, olhando sua cabeça para
dentro. — Mas você tem uma visita. — ela me diz.
— Eu? — Eu pergunto.
— Que visitante? — Jericho pergunta.
Ela se vira para Jericho. — Sra. De La Rosa e seus filhos. Eles estão
esperando na biblioteca.
— Ivy? — Eu sorrio.
— Eu pensei que estaria tudo bem, senhor? — Catherine pergunta,
insegura de repente.
— É claro. Eu vou dizer olá também.
O sorriso de Catherine é de alívio quando ela segura a porta aberta
para eu e Jericho passarmos. Sua mão está na parte inferior das minhas
costas enquanto ele me leva para o escritório. Já posso ouvir o som da voz
de uma garotinha e isso instantaneamente me faz sorrir.
Jericho abre a porta, onde encontramos Ivy e seus filhos em uma
estante de livros. A garotinha na ponta dos pés está tentando pegar um
livro, enquanto Ivy está tentando segurar seu bebê se contorcendo e pegar
o livro ao mesmo tempo.
— Deixe-me. — diz Jericho e corre para eles.
Todos eles se voltam para nós, Ivy sorrindo, um pouco corada. A
garotinha tem um olhar em seu rosto que pertence a uma pessoa mais velha
e cínica. E o bebê mais doce com os maiores olhos verdes que eu já vi, tem a
boca aberta em um minúsculo O mostrando um pequeno dente.
— Oh meu Deus! — Eu digo, correndo para eles. Eu abraço Ivy e o
bebê de uma vez e ela sorri quando eu me afasto. — Você veio!
— Eu pensei que poderia ser mais fácil do que levar você para minha
casa e eu realmente precisava tirar isso. — diz ela, gesticulando para a
garotinha.
— Sua família é linda. — eu digo, absorvendo todos eles.
— Obrigada. Elena, diga olá. — ela diz, colocando a mão na cabeça da
garotinha.
Elena olha para mim, abre um sorriso mostrando uma fileira perfeita
de dentes minúsculos e retos. Ela se volta para Jericho que está agachado ao
lado dela equilibrando cerca de cinco livros para ela escolher.
É tão engraçado vê-lo assim. Ele é tão diferente com crianças. Como se
a pressão estivesse baixa porque elas não estão com tanto medo dele.
Mesmo que eu achasse que elas receberiam seu tamanho e maneiras rudes.
— Esse costumava ser o favorito da minha garotinha. — ele diz
quando Elena escolhe seu livro.
— Eu gosto dos cavalos. — diz Elena, em seguida, segura o livro de
volta para ele quando ele se endireita para colocar os outros de volta. —
Leia para mim.
— Elena. — diz Ivy, colocando a mão no ombro da menina. — Tenho
certeza que o Sr. St. James está ocupado.
— Não, está tudo bem. — Jericho diz, claramente surpreso. — Tenho
alguns minutos.
Elena sorri para sua mãe e se vira para Jericho. Ela desliza a mão na
dele e lidera o caminho para o assento sob a grande janela.
— Bem, ela sempre foi uma garotinha muito confiante. — diz Ivy com
um sorriso orgulhoso.
— Eu acho que é ótimo. — eu digo enquanto vejo Jericho se acomodar
no banco com a garotinha quase debaixo do braço dele enquanto ele abre o
livro. — É tão estranho ver esse lado dele. — digo a Ivy alto o suficiente para
seus ouvidos.
— Santiago é o mesmo. É incrível ver homens assim com crianças. Eles
se tornam grandes ursinhos de pelúcia.
Eu rio e me viro para ela. — E quem é você? — Eu pergunto ao
pequeno em seus braços.
Ele faz um som gorgolejante e cutuca o rosto contra o pescoço de sua
mãe.
— Este é Santi, aquém de Santiago.
— É maravilhoso conhecê-lo, Santi. — eu digo quando Ivy o entrega
para mim. Eu pego o pacote quente em meus braços e cheiro o cheiro de
bebê de sua cabeça quando eu o abraço. — Ele é tão doce.
— Santi é um sedutor. — diz Ivy quando o menino pega um punhado
do meu cabelo, aquele sorriso irresistível.
— Ele é.
A porta do escritório se abre então e Catherine entra com uma
bandeja de refrescos.
— Biscoitos! — Elena salta de seu assento e corre em direção a
Catherine, que sorri amorosamente.
— Acabei de assar isso esta manhã. Eles são os favoritos de Angelique.
— Quem é Angelique? — Elena pergunta enquanto mastiga um
biscoito.
— Por favor, espere até que seja oferecido, Elena. — Ivy diz a ela.
Jericho vem até nós e entrega o livro a Ivy. — Ela pode ter isso se ela
quiser. Angelique superou isso.
— Obrigada, isso é muito gentil. E eu sinto muito por isso. — Ivy diz a
ele. — Obrigada por ler para ela, mas os cookies sempre têm prioridade.
— Eu entendo e foi um prazer. Ela é uma menina doce.
— Eu vou buscar Angelique. — eu digo, checando meu relógio. —
Tenho certeza que a Sra. Strand não se importará de encerrar suas aulas
alguns minutos mais cedo.
— Tenho certeza que ela não vai. Ivy, prazer em te ver. Diga olá ao seu
marido por mim.
— Eu vou. Foi bom ver você também. — ela faz uma pausa.
— Jericho. — ele completa.
— Jericho. Prazer em vê-lo novamente.
Jericho sai e Elena se serve de um segundo biscoito enquanto
Catherine lhe serve um copo de leite.
— Quer vir comigo para buscar Angelique? — Eu pergunto a Ivy. — Ela
ficará tão surpresa ao ver o bebê, mas temo que se você estiver fora de
vista, ele ficará chateado.
— Claro. Eu adoraria.
— Catherine, vamos demorar apenas alguns minutos. Você se importa
de ficar com Elena?
— Nem um pouco. — diz Catherine e se acomoda no sofá.
Ivy e eu saímos para o corredor e subimos as escadas com o pequeno
Santi ainda em meus braços.
— Você parece mais à vontade. — diz Ivy.
— Eu estou. As coisas estão melhores, eu acho.
— Bom. Fico feliz em ouvir isso.
Eu paro no topo da escada e me viro para ela. — Estou grávida de sete
semanas. — digo a ela, meu coração disparado. Uma gravidez é uma boa
notícia, mas não contei a ninguém. Nem Megs, nem ninguém. E Julia, bem,
como Julia tem estado sobre a gravidez, acho que não percebi o quão
pesado foi o fardo de tudo isso. Não até este momento, este momento
normal quando digo a uma amiga a que deveria ser e é uma boa notícia. De
certa forma, parece que essa alegria que eu deveria estar sentindo foi
sufocada, roubada.
— Ah, Isabelle! — lágrimas brotam de seus olhos. — Essa é uma
notícia tão maravilhosa.
Percebo que estou com lágrimas também quando ela me abraça. Eu
tenho que limpar meus olhos. — Nós não contamos a ninguém e foi…
inesperado.
— Um dia vou contar minha história com Santiago. — diz ela,
enxugando algumas das minhas lágrimas. — Não era bonito quando nos
casamos. Eu não queria estar lá. Ele e eu… bem, vamos apenas dizer que ele
não se casou comigo porque me amava. Não, então. Mas tudo mudou
muito, não consigo mais imaginar a vida sem ele. Você e Jericho, vocês me
lembram muito de nós e estou feliz em vê-los se adaptando e felizes. Você
está feliz?
Respiro fundo e me forço a parar as lágrimas. — Não sei. As coisas
estão estranhas, mas Jericho e eu estamos em um lugar melhor. Eu só não
esperava estar casada e grávida aos dezenove anos.
— Eu entendo. — Ela abre a boca para dizer mais, mas então nós duas
ouvimos o som de alguém chorando no quarto de Angelique.
Entrego o bebê de volta para Ivy e corro pelo corredor. Ivy me segue e
eu desacelero meus passos enquanto me aproximo da porta. Eu ouço
fungadas silenciosas do outro lado da porta, fazendo meu coração doer. Mas
o que ouço em seguida me deixa furiosa.
— Pare com isso. Ninguém vai te dar atenção quando você está
choramingando. Você é uma garotinha mimada.
— Eu não sou.
Coloco minha mão na maçaneta, a raiva fazendo-a tremer.
— Você tem sorte de seu pai não deixar você ir para uma escola
normal para crianças normais. Com seus olhos estranhos você
provavelmente se…
Ela não pode dizer mais porque eu empurro a porta com tanta força
que bate contra a parede. A mulher mais velha é claramente pega. Ela se
endireita e eu vejo como ela está apertando a orelha de Angelique com
força, a cabeça da menina inclinada em um ângulo. Ela está na ponta dos
pés para aliviar a dor.
Ivy suspira atrás de mim.
— Tire suas mãos dela! — Eu digo, minha voz tremendo de raiva. Eu
nunca senti tanta raiva antes, tão protetora. É como se eu estivesse no
piloto automático, minhas pernas se movendo rapidamente pela sala. Tenho
certeza de que vou atacar a mulher, mas ela deve sentir isso e se afasta. Eu
puxo Angelique fisicamente para mais longe da bruxa, sangue em brasa
bombeando com força em minhas veias. Eu caio de joelhos e abraço
Angelique em mim, segurando-a com força.
— Não é o que você pensa. — a Sra. Strand começa, seu rosto sem
cor.
— Saia. Saia desta sala. Saia desta casa. E nunca mais volte. — eu
assobio, minha voz estranha para mim, meu peito apertado.
Angelique enterra o rosto no meu pescoço e se agarra a mim, seu
corpo atormentado por soluços.
— Sinto muito, querida. — digo a ela, abraçando-a, esfregando suas
costas. — Eu sinto muito. — Eu olho para a mulher mais velha por cima da
cabeça de Angelique. Ela ainda está lá. — Saia. Fora.
Ivy corre pela sala até onde a maleta da mulher está em cima da mesa.
Santi se agita em seus braços e ela o balança enquanto a fecha e a entrega
para a Sra. Strand.
— Eu vou levá-la para fora. — diz Ivy.
— Eu sei o caminho. — diz a Sra. Strand e se vira para a porta.
Volto minha atenção para Angelique, que está segurando com tanta
força que, quando me endireito, a levanto comigo.
Ivy sai do quarto atrás da mulher, eu sento na cama com Angelique em
meus braços.
— Não diga ao papai o que ela disse. — ela sussurra em meu ouvido,
sua voz engasgada com as palavras enquanto seu corpo é atormentado pelo
efeito de soluços violentos.
— Ah, querida. Não era verdade. Você não é mimada. Você é a
garotinha mais doce.
Ela suga em respirações trêmulas e balança a cabeça. — Quero dizer
sobre meus… meus olhos. Papai vai achar os dele estranhos também. — Ela
começa a soluçar tudo de novo.
— Oh querida. — Estou chorando com ela agora. Eu fecho minha mão
sobre a parte de trás de sua cabeça. — Não há nada de estranho sobre eles.
Eles são lindos. Você é linda por dentro e por fora. Essa mulher é
simplesmente má.
— Ela é uma bruxa. É por isso que ela sempre usa preto. — ela
sussurra contra minha orelha, meu pescoço e rosto molhados de suas
lágrimas.
Ivy volta para dentro e vai ao banheiro para voltar um momento
depois com uma caixa de lenços de papel. Ela o carrega até nós.
— Ela se foi? — Eu pergunto a ela, pegando a caixa.
— Jericho ouviu a comoção. Ele está… lidando com ela.
— Oh.
Angelique recua e eu limpo seus olhos e nariz. Ela olha para Ivy e o
bebê, então rapidamente volta para baixo. Algo me ocorre. Eu me pergunto
se pelo menos uma parte de sua timidez é sobre seus olhos. A diferença de
cor entre eles. Eu me pergunto se todo esse tempo ela está tentando
escondê-los.
— Olá, querida. — diz Ivy, agachando-se. Ela toca a cabeça de
Angelique. — Eu sou Ivy e este é meu bebê, Santi. Você gostaria de conhecer
Santi?
Santi sorri como se na deixa. Namorador com certeza.
Angelique olha por baixo dos cílios longos e grossos para o bebê. Eu a
vejo sorrir porque ele está sorrindo para ela, estendendo a mão para ela. Ele
captura dois punhados de seus cachos e ela ri. Um momento depois, seu
corpo arfa com uma respiração.
— Aposto que aquela mulher horrível também acharia meus olhos
estranhos. — Ivy diz a ela.
Angelique olha para ela mais de perto e eu também.
Ivy arregala os olhos e vejo o estranho sangramento da pupila no lindo
verde de um olho. Faz com que pareça um olho de gato.
— Não é estranho. — Angelique diz a ela. — É bonito. Você é bonita.
— Assim como seus olhos e você também, querida. Diferente não
significa estranho.
Angelique sorri assim que Jericho entra na porta. Ele parece
apressado, enfurecido, chateado e indefeso, todas essas coisas ao mesmo
tempo. Quando seus olhos caem em sua garotinha, eu vejo algo dentro dele
quebrar. Eu juro que vejo. Angelique escorrega dos meus braços e corre
para o pai. Ele se agacha para pegá-la. Ele a abraça com tanta força que
aperta meu coração e o faz inchar ao mesmo tempo.
Posso ver um demônio quando vejo Jericho St. James. Mas até o diabo
já foi um anjo. Eu conheço esse diabo agora. Ele é sombrio, sem dúvida. E
ele é feroz. Ele é assombrado pelo passado e quebrado de uma maneira que
pode nunca mais ser inteiro novamente. Mas ele é meu diabo. O meu e o da
Angelique e do nosso bebê. Um demônio para cuidar de nós.
CAPÍTULO VINTE E TRÊS
JERICHO
Quando Angelique nasceu no dia em que deveria ter morrido, eu
mudei. Aconteceu naquele mesmo momento que dois paramédicos me
seguraram enquanto outro cortava a barriga de Kimberly. No mesmo
momento em que ouvi o primeiro choro da minha filha. Eu me lembro disso
enquanto estou observando-a dormir agora.
Angelique nasceu violentamente. Puxada para o mundo momentos
após a morte de Kimberly. Ela chutou. Foi o que um dos paramédicos me
disse mais tarde. Que ele tinha visto o chute como se ela estivesse tentando
pedir ajuda. Como se ela soubesse que sua mãe estava morrendo ou morta.
Se eles tivessem esperado mais, ela teria morrido também.
Naquele momento, ouvi seu grito estrangulado, qualquer inocência,
qualquer ideal estúpido, jovem e cego, aspirações, esperanças, eles
desapareceram. E em seu lugar uma escuridão se instalou. Uma escuridão
vasta e vazia. A única razão pela qual eu vivia era porque ela vivia. Nossa
filha sobreviveu ao ataque que matou sua mãe.
No início, ela era o último pedaço de Kimberly. Agarrei-me a essa
ideia, a qualquer coisa que pudesse me amarrar, não importa o quão
esquivo fosse, à mãe da minha filha. E então ela se tornou Angelique, sua
personalidade se formando, sua natureza doce muito parecida com a de sua
mãe. Fiquei feliz por isso.
Achei que nunca mais amaria alguém depois de segurar minha noiva
enquanto ela morria em meus braços, mas eu amava nosso bebê. Eu a
amava ferozmente, desesperadamente. Violentamente. Exatamente como
ela veio ao mundo.
E quando ouvi o que aconteceu aqui hoje sob meu próprio teto, o que
aquela mulher disse, bem, eu a teria matado se Ivy não tivesse descido as
escadas atrás dela. Se Dex não tivesse vindo para tirar minhas mãos do
pescoço dela e levar a mulher para fora da casa. Eu teria cometido
assassinato com minha filha dentro de casa.
Eu matei. Nos últimos cinco anos, lidei com muitos homens maus. Não
me arrependo de uma única morte. Não perco o sono por nenhum deles. Os
primeiros foram os dois responsáveis por puxar o gatilho. Os próprios
assassinos. Cada um deles sofreu mortes muito lentas e dolorosas, cada um
assistindo o outro morrer.
Depois deles, subi a escada. Até que cheguei a Felix Pérez e sua
gravação da reunião que confirmou de onde veio o pedido. Eu queria ser o
único a acabar com Pérez também, mas sua morte pertencia a outro. E ela o
matou com a adaga com cabo de pérola que eu forneci, então isso é algo
pelo menos.
No centro de tudo isso está Carlton Bishop. Ele foi o homem que
começou. Quem deu o golpe em mim. Embora agora eu esteja me
perguntando se é Julia Bishop quem estava segurando as rédeas o tempo
todo. Durante séculos, nossas famílias estiveram em desacordo. Batalhando.
Bishops lutando para recuperar o que consideram seu. St. James está
segurando ferozmente. Crescendo lentamente mais rico e mais e mais
poderoso à medida que os Bishops declinavam lentamente.
Carlton foi longe demais. Ele é tão ruim quanto Reginald. O homem
que começou tudo. Tão podre.
Mas eu discordo.
Tomo um gole de uísque e vejo minha garotinha dormir. O que eu
sinto culpa não é o sangue em minhas mãos, mas o conhecimento de que
essa mulher, uma mulher que eu contratei, paguei e convidei para minha
casa vomitou mentiras e ódio no ouvido da minha filha e a fez se sentir
inferior.
Isabelle me contou o que Angelique disse a ela. Que ela não queria me
contar o comentário sobre os olhos porque nós compartilhamos aqueles
olhos estranhos e eu poderia ter meus sentimentos feridos.
Essa é a parte que parte meu coração em dois.
Engulo o resto do uísque, uma raiva fresca queimando por dentro. Saio
do quarto e entro no corredor escuro. Eu preciso bater em alguma coisa.
Mas quase no mesmo momento a porta do meu quarto se abre no final do
corredor e Isabelle sai correndo. Ela vai imediatamente para o corrimão
como se estivesse fugindo de algo. Eu corro para ela.
— Isabelle? — Eu digo, ouvindo sua respiração pesada. Não tenho
certeza se ela me ouve. — Isabelle. — repito quando chego a ela, segurando
seus braços. — O que é isso? O que aconteceu?
Ela pisca. Olha para mim, depois para si mesma. Ela parece um
fantasma neste corredor sombrio com a longa camisola branca que está
usando. Eu vejo seus dedinhos do pé com o esmalte rosa aparecendo por
baixo da bainha. Presumo que a camiseta do irmão dela esteja sendo lavada
ou ela estaria vestindo isso.
Ela respira fundo, se acalmando um pouco.
— Você está bem? — Eu pergunto.
Ela acena. Quando eu a solto, ela enxuga a testa e vejo as gotas de
suor na linha do cabelo.
— O sonho?
— Sim. — Ela toma outra respiração profunda e depois expira. Eu me
pergunto se ela aprendeu a fazer isso para se acalmar. Para se controlar. Ela
olha para mim.
— Você quer me contar sobre isso? — Eu pergunto com cuidado.
Ela balança a cabeça. — O que você está fazendo aqui? — ela
pergunta, mudando de assunto.
Olho pelo corredor para o quarto de Angelique. — Mudei de ideia. —
digo a Isabelle.
— O que você quer dizer com você mudou de ideia? — ela pergunta,
seguindo meu olhar. Ela toca meu rosto, afasta meu cabelo da testa.
— Vou matar aquela mulher.
— Não, você não vai. Você está cansado. Estou cansada. Venha para a
cama.
— Eu não sei que dano ela fez. Bem debaixo do meu nariz.
— Jericho, pare.
Eu olho para ela, seu rosto macio, cabelos longos soltos pelas costas.
Ela parece um anjo. Um anjo para um demônio.
— Estou feliz que Angelique tenha você. — digo a ela, escovando o
cabelo por cima do ombro. — Você é boa para ela.
— Você também é.
— Eu deixei acontecer, Isabelle.
— Eu também estive aqui, lembre-se. Deixei acontecer também. Mas
acabou agora e só temos que mostrar a ela que menina maravilhosa ela é.
Como ela é amada. Que gentil e boa. Isso é tudo o que podemos fazer.
Concordo com a cabeça, embora ainda esteja pensando em como vou
matar a velha bruxa. — Vou levá-la para a cama. — digo a ela, pegando sua
mão para levá-la de volta ao quarto. Eu puxo os cobertores de volta para ela.
Ela se senta na beirada da cama e alisa o travesseiro.
— Fique comigo. — diz ela, pegando minha mão e entrelaçando
nossos dedos.
— Eu não vou dormir esta noite. — digo a ela.
— Por favor. — Há uma expressão estranha em seu rosto. Ela olha
para nossas mãos juntas em seu colo, depois para mim. — Os sonhos pioram
agora.
Eu a estudo. — O aniversário está chegando. — A noite do
arrombamento. O aniversário do assassinato de seu irmão.
Quando olho para ela o que vejo é uma menina que precisa de alguém
para cuidar dela. Uma garota que precisa de um anjo da guarda. Eu não sou
nenhum anjo, mas eu vou ter que servir.
— É um padrão que parece não mudar.
— Deite-se. — digo a ela e me levanto para tirar minhas roupas. Ela faz
o que eu digo e um momento depois, eu deslizo na cama para abraçá-la. Ela
deita a cabeça no meu peito.
— Obrigada. — diz ela.
— Você quer falar sobre isso?
— Não. Na verdade, não. Quero dizer, o homem que fez isso está atrás
das grades. Ele foi pego. A justiça está sendo feita. Mas Christian ainda está
morto, sabe?
Eu a abraço mais perto quando a ouço fungar. — Eu sei, querida. Eu
gostaria de poder trazê-lo de volta para você. Nós iremos ao cemitério no
dia, se você quiser.
Ela levanta a cabeça para olhar para mim. — Sim. Gostaria disso. Eu
costumo ir e passar um pouco de tempo lá com ele. Achei que você não me
deixaria.
— Eu não sou um ogro, Isabelle.
— Eu sei disso. — Ela descansa a cabeça novamente. — Obrigada.
— Você não precisa me agradecer por isso.
— Eu vou de qualquer maneira. — Fica quieta por um longo minuto
antes que ela fale. — Você tem sonhos? Perto do aniversário da morte de
Kimberly?
— O dia em que Kimberly foi morta foi o dia em que Angelique nasceu.
Eu sempre tentei manter essas duas coisas separadas. Tentei dar a
Angelique nesse dia. Fazê-lo feliz por ela.
— Você é um bom pai, Jericho St. James.
— Isso é discutível.
— Você sabe como Ivy te chamou quando você deixou Elena levá-lo
até aquele assento na janela para ler?
Eu olho para ela. Ela está com a cabeça inclinada para cima para me
ver. — O quê?
— Um grande ursinho de pelúcia.
Eu sorrio com isso. — Um urso, sim.
Ela sorri também e sobe de joelhos para me montar.
Olho para ela, vejo-a tirar a camisola pela cabeça, o cabelo caindo em
cascata pelos ombros nus como uma cachoeira. Ela está completamente nua
por baixo. Eu estendo a mão para correr minha mão sobre os fios macios e
deixo meu olhar vagar sobre seus seios, embalando um, roçando meu
polegar sobre seu mamilo antes de segurar a parte de trás de sua cabeça e
trazer seu rosto para o meu para beijá-la.
— Você está tentando me distrair ou a si mesma? — Eu pergunto
enquanto ela serpenteia seu caminho para baixo, tirando minha cueca e
olhando para mim por baixo dos cílios escuros enquanto ela lambe o
comprimento do meu pau.
— Os dois. — Ela se levanta em seus cotovelos para me levar em sua
boca e eu acho que isso é o mais sexy que ela já olhou. Nua, cabelos longos
selvagens ao redor dela, seus olhos com pálpebras pesadas, lábios em volta
do meu pau.
— Porra, Isabelle. — Eu entrelaço meus dedos em seus longos cabelos
e a guio pelo meu pau. — Porra.
CAPÍTULO VINTE E QUATRO
JERICHO
O jato sai cedo para a prisão de alta segurança no Colorado, onde
Danny Gibson está atualmente alojado. O sol está apenas no horizonte
quando decolamos.
Isabelle estava dormindo quando eu saí da cama. Ela se agarrou a mim
a noite inteira. Tê-la na minha cama tornou-se tão natural que acho que
sentiria falta dela se ela não estivesse lá, o que é algo que estou tendo
dificuldade em entender. Não é assim que deveria ser. E ela segurando em
mim como ela fez, agarrando-se a mim para manter seus pesadelos
afastados, isso faz algo comigo.
Ela precisa de mim.
Ela está me escolhendo.
E isso me faz muito mais protetor com ela.
Esfrego a nuca com as duas mãos. Isso é tão fodido.
— Senhor, posso lhe trazer um café ou chá? — pergunta a comissária
de bordo.
Eu me viro da janela para olhar para ela. Porra, estou cansado. Eu não
dormi. — Sim, por favor. Café. Preto.
Ela sorri, vai embora e alguns momentos depois está de volta com
uma caneca de café e uma variedade de croissants. Bebo o café, mas deixo a
comida e alcanço a pasta no banco ao lado do meu para abrir o arquivo que
Santiago me deu sobre Danny Gibson.
Eu sei o que ele fez. Memorizei o arquivo. Mas eu quero ouvir isso
dele. E o que eu preciso dessa reunião é saber concretamente se Julia
Bishop estava envolvida antes mesmo de eu conhecer Isabelle. Quando ela
era Isabelle York e não tinha ideia de sua relação com a família Bishop.
Passo o voo lendo esse arquivo, verificando qualquer coisa que perdi,
me concentrando na tarefa em mãos. Quando pousamos duas horas e meia
depois em Pueblo, Colorado, o céu está nublado e escuro. Entro no SUV que
me espera, o ar mais frio aqui do que em Nova Orleans. O motorista me
cumprimenta e começa a viagem de quase uma hora até Florença.
Assim que chegamos, sou recebido pelo Sr. Holzman, o diretor da
instalação. Ele aperta minha mão e me leva para dentro enquanto tento
lembrar o que pagamos a ele.
— Como foi seu voo, Sr. St. James?
— Foi bom. Sem intercorrências.
— Parece que teremos uma tempestade mais tarde. Espero que isso
não afete seu retorno.
— Estarei fora muito antes disso. Obrigado por fazer esta reunião
acontecer tão rapidamente. — eu digo enquanto ele me conduz por várias
áreas seguras onde ninguém faz perguntas. Nesse ritmo, eu poderia estar
carregando um fuzil de assalto no local e tenho certeza que esses guardas
fariam vista grossa. É incrível o que o dinheiro pode comprar.
— Coloquei o Sr. Gibson em nosso quarto mais privado e seguro. Você
não será incomodado. Eu coloquei um guarda do lado de fora da porta se
você precisar de ajuda. — ele faz uma pausa. — Ou se o Sr. Gibson precisa
de incentivo para falar.
Nenhuma dúvida sobre seu significado. — Tenho certeza que consigo.
Ele teve outros visitantes desde que chegou a esta instalação? — Ele foi
transferido para cá há um ano.
— Alguns homens alguns meses atrás.
— Nomes?
— Não me lembro.
Certo.
— Por aqui, Sr. St. James. — Estamos zumbindo por um corredor
estreito, o sigo por outro labirinto antes de finalmente chegarmos à porta
vigiada.
Holzman para. — Você não tem nenhuma arma com você? Alguma
coisa afiada? — ele me pergunta.
Eu balanço minha cabeça. — Eu não estou aqui para libertá-lo.
— Claro que não. Pergunto por sua segurança.
— Eu posso cuidar de mim mesmo, Sr. Holzman.
— Bem, por precaução, ele está algemado à mesa que está pregada.
— Na verdade, eu prefiro ele solto.
Holzman faz uma pausa, depois assente.
Eu gesticulo para a porta, mas ele diz ao guarda para nos dar um
momento. Uma vez que o guarda se foi, ele se inclina contra a parede e abre
um sorriso que me faz querer quebrar seus dentes. Este homem é nojento.
— Eu tive que fazer acomodações extremas para sua visita. — ele
começa. — Foi muito trabalho, para ser honesto com você.
— E eu acredito que você foi recompensado por seus esforços.
— Sim, seu irmão foi generoso. Eu só queria ter certeza de que você
sabia…
Eu dou um passo em direção a ele. De pé na minha altura total, tenho
cerca de quinze centímetros sobre ele. — Vamos direto ao ponto. Quer mais
dinheiro, Sr. Holzman? É isso que é isso?
Ele limpa a garganta, se endireita. — Não, como eu disse. Seu irmão
foi generoso. Apenas se você planeja maltratá-lo… A saúde e a segurança de
nossos detentos são, obviamente, uma prioridade para nós.
— Hum. Claro que é. — Ele vai me deixar bater no Danny Gibson pelo
preço certo. Estou indeciso se vou ou não. Pego minha carteira, esperando
por isso e faço questão de contar dez notas de cem dólares. Eu as enfio no
bolso de sua jaqueta. — Estou com a agenda apertada.
— É claro. Guarda!
O guarda volta e destranca a porta.
— Solte o Sr. Gibson. — ele diz ao homem que hesita, mas faz o que
ele manda.
Holzman dá um passo para o lado e entro na sala onde Danny Gibson
está sentado do outro lado da mesa. Um sorriso feio em seu rosto quando
ele me mede.
Ele parece diferente do que tinha nas fotos que vi. Mais volumoso com
músculo. E mais malvado. Sua cabeça está raspada mostrando uma
tatuagem do ano de 1999. Acho que foi significativo para ele. Seu rosto está
marcado e ele é um cara grande. O pensamento dele tocando Isabelle faz
meu sangue ferver. Transforma minhas mãos em punhos.
A porta se fecha atrás de mim e eu puxo a cadeira. Gibson ainda está
me avaliando. Ele não sabe quem eu sou.
— Aquela vadia te mandou? Eu já disse a ela que ia calar a boca. Eu
tenho, não tenho?
— Que vadia seria essa?
Ele fica quieto, provavelmente preocupado por já ter falado demais.
— Ninguém me enviou, Danny. Estou aqui para ouvir o seu lado da
história. — digo, puxando a cadeira e sentando. Pelo menos ele não fede.
Acho que esperava que ele cheirasse mal.
— O que, você é do estado? De jeito nenhum. Não vestido como você
está.
— Apenas um cidadão comum.
— E o que eu ganho com isso?
— Diga-me o que aconteceu na noite em que você assassinou
Christian York.
— Como eu perguntei, o que eu ganho com isso?
— Isso vai depender de quão honesto eu ache que você está sendo.
Ele bufa, mas se inclina para trás e me estuda um pouco mais. — Eu
estava vasculhando a casa. Apenas planejando pegar algumas coisas e sair
antes que alguém percebesse. É isso.
— Então, se você estivesse investigando o lugar, saberia que a garota
estaria em casa.
Ele engole e eu observo sua garganta, penso que a vida é uma coisa
delicada. Com que facilidade pode ser apagada. Uma fenda e acabou.
— O que você queria roubar exatamente? Não é como se eles
tivessem algo de valor.
— Todo mundo tem alguma coisa.
— Sim, mas você não estava lá para tirar nada deles. — eu digo,
inclinando-me para mais perto. — Esse corte tem algo a ver com sua história
atualizada?
Ele parece momentaneamente desconfortável e desvia o olhar.
— Porque pelo que eu li, você jurou que foi contratado para fazer um
trabalho maior do que roubar algumas bugigangas.
Ele inspira profundamente e exala. — Quem é Você?
— Eu sou o marido da mulher que você tentou estuprar naquela
noite. Ela tinha dezesseis anos na época. Você sabia disso?
Seu rosto perde toda a cor e o suor brota em sua testa.
— Acho que isso não importa muito. — acrescento, sabendo que é
verdade. Verme. — Qual foi o valor que você recebeu?
Ele range os dentes, os dedos entrelaçados com tanta força que as
veias nas costas de suas mãos estão estourando.
— De que vale o estupro hoje em dia, afinal? — Eu pergunto.
— Que porra é essa? — ele me pergunta. — Guarda! — ele grita para a
porta fechada.
— Ou você não foi contratado para estuprá-la primeiro? Estou muito
curioso sobre essa parte.
— Eu terminei aqui. Guarda!
— Ele não virá.
— Guarda!
Nada.
— Quem te pagou?
Ele balança a cabeça.
Eu me inclino sobre a mesa estreita, meio que me levantando, envolvo
minha mão ao redor de sua garganta. — Diga-me quem diabos te pagou e o
que exatamente eles te contrataram para fazer.
Eu aperto.
Seus olhos se arregalam.
Eu preciso colocar o pensamento de Isabelle tentando lutar com ele
fora da minha mente antes que eu mate o filho da puta. Eu alivio meu
aperto, sento de volta.
— Foda-se. — diz Gibson com um aceno de cabeça. — Ele não deveria
aparecer.
Eu espero.
— Eu estava fodido então. Em um lugar ruim, porra.
Se ele quer minha pena, vai esperar muito tempo. Até que o inferno
congele.
Ele engole em seco. — A menina era o alvo. É isso que você quer
ouvir?
— O que eu quero ouvir é a verdade.
— Bem, então você acabou de ouvir. — Seus olhos se estreitam e eu
me pergunto se ele é menos estúpido do que eu pensava. — O cara disse
que não se importava com o que eu fizesse ou demorasse, desde que a
garota estivesse morta no final. Eu tive que fazer parecer que um
arrombamento deu errado.
— Cara?
Ele concorda.
— Nome?
— Eu não sei, porra. Nós não trocamos exatamente cartões de visita.
— Como ele encontrou você?
— Minha reputação me precede. — diz ele com algo parecido com
orgulho. Idiota.
— Eu aposto. Prossiga.
— Deu-me algum dinheiro para pensar sobre isso. Mostrou-me que
ele estava falando sério. Um adiantamento, disse ele. A julgar pela
quantidade que ele estava falando sério. — ele faz uma pausa. — Disse-me
que eu poderia ir embora com isso. Eu deveria ter. Mas ele me prometeu
mais dois pagamentos iguais. Um quando eu concordei, o outro quando o
trabalho fosse feito. Eu deveria saber que algo estava acontecendo quando
aquele segundo pagamento apareceu em alguma maldita conta bancária
que eu não podia tocar. — Ele balança a cabeça.
Os fundos foram transferidos de uma instituição de caridade. Meu
palpite é que o dinheiro estava empatado. Os Bishops são pobres em
dinheiro, eu sei disso, mas me surpreende que eles se arrisquem na
descoberta do rastro do dinheiro.
— Idiotas. — diz ele, em seguida, se inclina para mim. — Ele tinha um
pedido específico sobre sua esposa, no entanto.
Minha esposa.
Ele deve ver como ele dizendo as palavras ficam sob minha pele
porque um canto de sua boca se curva para cima.
— E o que foi isso? — Eu pergunto friamente.
— Torne-o sangrento.
Eu o estudo. Minhas mãos se fecham e se abrem ao meu lado. Estou
quase terminando aqui.
— Mais uma pergunta.
— Mande. — diz ele casualmente, equilibrando-se nas pernas traseiras
da cadeira. Você pensaria que ele saberia o quão perigoso isso é.
— Você colocou seu pau dentro dela?
Esse sorriso se espalha em seu rosto. — Apenas a ponta.
É nesse momento que decido que valerei meus mil dólares.
CAPÍTULO VINTE E CINCO
ISABELLE
A casa está praticamente vazia. Jericho tinha ido embora quando
acordei. Acho que é a viagem de negócios dele para Atlanta. Zeke levou
Leontine e Angelique ao cinema depois do almoço. Eles me convidaram, mas
eu recusei. Há algo que eu quero fazer enquanto tenho a oportunidade e os
novos guardas estacionados ao redor da casa não são tão observadores
quanto Dex, que mencionou a necessidade de levar um recado e que ele
estaria de volta dentro de uma hora. Qualquer que fosse a missão que ele
estava executando parecia urgente.
Assim que todos vão embora, digo a Catherine que vou tirar uma
soneca antes que o professor Larder chegue para minha aula e saio da
cozinha, mas antes de me virar para subir as escadas, vou até o escritório de
Jericho como se estivesse perfeitamente normal eu ir para lá. Quanto menos
suspeito eu pareço melhor.
Quando chego à porta, percebo que pode estar trancada, mas fico
aliviada ao descobrir que não está. Eu me pergunto se ele simplesmente
esqueceu de trancá-la ou não se deu ao trabalho de fazê-lo.
Entro no espaço de Jericho, fecho a porta e me inclino para trás,
minhas mãos ainda na maçaneta atrás de mim. Tem o cheiro dele aqui.
Sinto uma pontada momentânea de culpa quando, depois de respirar
fundo sua loção pós-barba persistente, vou até sua mesa. A superfície está
livre da maioria das coisas, um laptop está fechado em um canto, há
algumas folhas de papel e várias fotos de Angelique. Estou aliviada por não
haver um de Kimberly. Eu sei que não deveria sentir ciúmes dela. Ela era a
mãe de Angelique. Mas estou feliz que ele não tenha uma foto dela em sua
mesa.
Tomando um assento em sua cadeira, abro a gaveta superior direita.
Foi onde o vi deixar cair a chave da porta do porão. Ainda está lá. Eu
reconheço. Meu coração dispara quando eu alcanço e a tiro. Eu serei rápida.
Trarei de volta antes que ele esteja em casa. Eu só quero ver o que ele
estava procurando. Ver o que havia por trás daquela foto que ele torceu.
Eu fecho a gaveta e me levanto, correndo para fora do escritório em
direção ao porão antes que eu possa me acovardar.
É bom que não haja ninguém por perto, porque na minha pressa
culpada me atrapalho com a chave, deixando-a cair uma vez antes de
finalmente colocá-la na fechadura e destrancá-la. Uma vez aberta, respiro
fundo, desço a escada, fecho a porta atrás de mim e acendo a luz.
É instantaneamente vários graus mais frio e até mesmo o cheiro dele,
o espaço subterrâneo fechado, é assustador. Eu me seguro no corrimão e
me movo rapidamente. Não quero me dar tempo para pensar. Ao pé da
escada, olho para a direita, mas viro à esquerda em direção ao quarto em
que encontrei Jericho na outra noite. Eu me movo mais devagar aqui, tendo
que sentir meu caminho enquanto a luz das escadas desaparece. Quando
consigo ligar o interruptor de luz, nada acontece. Lembro-me de como a
lâmpada acendeu e apagou naquela primeira noite também.
Não me permito olhar para as portas fechadas de cada lado de mim.
Em vez disso, corro para a última porta, que ainda está aberta. Aquela em
que encontrei Jericho naquela noite. Quando chego à porta, está quase
escuro demais para ver, então estico meu braço ao redor do canto para
sentir o interruptor de luz. Fico aliviada quando não demorou muito. Um
momento depois, a lâmpada acende e estou de pé neste quarto que quase
parece o quarto de uma menininha, completo com uma casa de bonecas, só
que não é. Nenhum pai colocaria uma criança aqui. É muito assustador.
Algo frio roça minha nuca e estremeço. Dou dois passos rápidos para
dentro do quarto, virando-me para olhar para trás, meio que esperando que
alguém esteja lá. Meu coração dispara quando encontro o espaço vazio,
então abraço meus braços. É quase como se o ar aqui estivesse instável.
Sem descanso.
Eu só tenho uma coisa a fazer e então eu posso sair. O fantasma que
vive aqui, ela não quer me machucar. Ela não tem nada contra mim.
Ela.
Mary ou Zoë.
A cadeira em que Zoë subiu para se enforcar ainda está no canto. Olho
para a antiga viga de madeira. História. A história que ele teme repetir com
sua própria filha. Comigo.
Respiro fundo o ar mofado e corro para a parede onde o quadro ainda
está torto, a caixa quebrada aos meus pés, cartas espalhadas. Vejo a ponta
da corrente de contas e tiro a foto do prego. É apenas um 8×10, mas está
empoeirada. O vidro se quebra e um caco cai no chão, quebrando-se em
dois pedaços com um leve tilintar. Coloco a foto de lado e olho para trás,
onde alguém esculpiu um pequeno cubículo na pedra. Naquele esconderijo
está o que pensei ser um colar de contas, mas agora vejo que é um rosário.
E está enrolado em várias folhas de papel.
É por isso que Jericho estava aqui? Será que encontrei o que ele estava
procurando?
Minha mão treme quando o alcanço e percebo que o ar ao meu redor
se acalmou. Eu levanto os papéis. Eles foram arrancados de um caderno
espiral, as bordas irregulares.
Desenrolo o rosário e desdobro o lençol. É datado de 20 de março de
dez anos atrás. Acho que a princípio pode ser algum tipo de carta de amor,
mas logo percebo que não é. E eu gostaria que fosse. Porque o que eu leio é
arrepiante.
Não é dirigido a ninguém em particular. Apenas começa.
Não está certo. Não é normal.
Ele vem quando todos estão dormindo. Ele cheira como aquele uísque
que bebe e está áspero de raiva e estou com muito medo de me mexer. Para
fazer um som.
Ele me diz que é a regra. Que as meninas se tornem mulheres e as
mulheres sejam sujas e precisem orar por perdão para salvar suas almas. Eu
não acredito nele, no entanto. Não acredito que meninas ou mulheres sejam
sujas. Pelo menos eu não fiz antes. Mas ainda rezo. Agora rezo pedindo
forças para fazer o que decidi que faria porque, embora esteja aliviada por
ter decidido, ainda estou com medo. Eu quase mudei de ideia também,
quando ele esteve fora por algumas semanas e quando ele voltou para casa,
ele não veio ao meu quarto. Achei que tinha acabado, que não teria que
fazer de novo, mas estava errada. Isso nunca vai acabar e eu tenho que
manter minha decisão.
Quando tentei contar ao Zeke, ele me disse para parar de ser esquisita.
Ele não entendeu e é muito estranho dizer as palavras em voz alta. Para
dizer o que aconteceu naquelas noites. Eu me sinto suja ao pensar nisso. Eu
me sinto nojenta.
Eu não posso dizer a mamãe. Ele só vai machucá-la se eu fizer isso. Ele
me disse que sim e gosta de machucá-la porque ela também é uma mulher
imunda. Ele nos odeia por sermos mulheres.
Mas tudo vai ficar bem agora. Estará acabado. Eu decidi.
Eu trouxe a corda para baixo há alguns dias. Trouxe meu bicho de
pelúcia favorito. Eu sei que estou velha demais para um urso de pelúcia, mas
não me importo.
Começou há quase um ano. Eu estava atrasada para desenvolver e
quando Zeke começou a ficar mais alto, mais forte e mais como um homem
do que um menino, parecia que eu era sua irmã mais nova. Não sua gêmea.
Eu nunca seria tão alta quanto qualquer um dos meus irmãos, mas tudo
bem. Minha mãe disse que ela se desenvolveu tarde também. Lembro-me do
quanto queria apressar as coisas. Inveja das meninas da minha turma que já
tinham seios e raspavam as pernas e outras coisas. Troquei de roupa no
banheiro para academia porque tinha vergonha do meu peito liso e corpo
reto e não ter cabelo ali.
Agora eu gostaria de ter continuado assim porque quando comecei a
me desenvolver, ele notou. Acho que é a primeira vez que ele me notou
desde que nasci. Ele nunca foi afetuoso com nenhum de nós, mas pelo
menos meus irmãos serviram a algum propósito, especialmente Jericho. Ele é
o mais velho. Seu sucessor. Ele é o mais parecido com nosso pai e às vezes
esse lado dele me assusta, mas tenho que lembrar que Jericho não é nosso
pai. Ele é gentil, doce e mesmo quando tenta agir como papai, assim que vê
que estou com medo, ele é ele mesmo novamente.
Ele é maior que Zeke, mas Zeke está chegando lá. E ambos disseram
que sempre me protegeriam porque sendo tão pequena eu provavelmente
preciso de muita proteção. Eu faço. Eles não sabem quanto. Como eles estão
certos. Mas a coisa é, nenhum deles pode me proteger contra ele. Ele é
muito mau. Muito inteligente. Muito odioso.
Ele me odeia. É por isso que ele faz isso.
Respiro fundo e viro a página, sentando na cama para ler. O quadro
range, mas estou muito envolvida para me importar.
Começou na noite em que tive minha primeira menstruação. Ele sabia
de alguma forma e quando todos estavam dormindo, ele veio ao meu
quarto. Eu estava dormindo também quando o senti puxar o cobertor. Ele
disse que eu estava suja agora. Como minha mãe. Ele disse que eu precisava
orar. Para implorar perdão pelos meus pecados. Ele nunca disse quais eram
esses pecados. Ele me deu um rosário especial e me fez ajoelhar para rezar.
Isso aconteceu durante uma semana inteira. Eu tive que me ajoelhar e orar
enquanto ele observava até ficar satisfeito.
Eu estava tão cansada que todos notaram, mas eu não disse uma
palavra e escondi o rosário entre meu colchão e a caixa de molas.
Aí quando minha menstruação acabou, ele parou de rezar e eu pensei
que era isso. Mas então meu ciclo se repetiu e a punição mudou. Ele me fez
tirar a roupa antes de me ajoelhar. Estava frio, lembro-me disso, ele abriu a
janela, deixou entrar mais ar frio e me disse para orar. Durante toda a
semana enquanto eu sangrava, ele me fazia tirar a roupa, me ajoelhar, orar
e implorar por perdão.
A próxima vez que eu tive meu período novamente, ele disse que não
estava funcionando. Disse que eu estava suja demais para rezar, em vez
disso, ele precisaria me punir enquanto eu sangrasse. Era a regra que ele
disse. E todas as noites daquela semana ele me puniu. Seu castigo foi
perverso e ferido dentro de mim. Ele me machucou tanto que eu tive
dificuldade em sair da minha cama naqueles dias.
Eu paro de ler.
Oh, meu Deus.
Jesus.
Não.
Viro para a última página e percebo que estou chorando quando uma
lágrima cai na folha borrando a tinta. Eu o espalho e me obrigo a ler.
Durou um ano inteiro assim. Um ano inteiro em que durante uma
semana a cada mês eu era obrigada a me despir, ajoelhar, orar e ser punida.
Ele mudava as punições às vezes, mas todas eram ruins. Todas elas
machucaram e me fizeram sentir mal, especialmente quando algo aconteceu
enquanto ele estava dentro de mim. Quando por alguns momentos me senti
bem.
Eu me sinto mais doente com o pensamento disso. Mais doente do que
quando ele me tocou. Orei por conta própria depois daquelas noites.
Ajoelhei-me e rezei, meus dedos correndo conta após conta daquele rosário.
Eu rezei para que parasse. Rezei por perdão. Porque ele estava certo. Eu era
uma garota suja e ele sempre soube disso.
A corda está pronta. Estou pronta. E antes que eu tenha mais um
período, eu tenho que terminar isso. Antes que ele possa entrar no meu
quarto mais uma vez, vou acabar com isso.
Vou sentir mais falta de Zeke. Eu gostaria de poder contar a ele. Eu
gostaria que ele pudesse me proteger como ele prometeu que faria. Vou
sentir falta de Jericho também. E mamãe. Vou deixar a carta onde Zeke a
encontrará em nosso esconderijo. Espero que ele entenda. Espero que todos
entendam que eu não tive escolha.
É isso, me desculpe. Lamento não ter sido forte como eles.
Lágrimas escorrem pelo meu rosto quando termino de ler. Viro a
página, mas está vazia. E eu olho para o rosário na minha mão. Está
quebrado. Eu me pergunto se ela fez isso.
A carta não está assinada, mas não tenho dúvidas de que foi Zoë quem
a escreveu. É o bilhete de suicídio dela. Isso é o que ele estava procurando.
Ele estava tentando entender. Zeke sabe? Leontine? E o que vou fazer com
isso agora que sei?
Eu fico de pé sentindo aquela estranha calma no ar novamente. Como
se o fantasma aqui fosse de Zoë. Talvez ela estivesse esperando que alguém
encontrasse sua carta. Para sua mãe e irmãos entendessem.
Enrolo o rosário de volta nas páginas e coloco-as no bolso, depois faço
meu caminho de volta pelo corredor até as escadas. Não tenho medo e não
tenho pressa. E quando volto para o andar de cima, tranco a porta de aço
atrás de mim, devolvo a chave do escritório de Jericho e fecho a gaveta da
escrivaninha.
As páginas estão queimando um buraco no meu bolso e estou prestes
a me levantar quando algo em sua mesa chama minha atenção. Sinto frio ao
vê-lo. É a caligrafia de Jericho em uma folha de papel. Eu a reconheço desde
o momento em que ele me deixou o bilhete na manhã depois que ele me
tatuou. Isso parece séculos atrás. Mas isso não é um rabisco aleatório. É o
nome de uma prisão. A prisão que Danny Gibson foi transferido a meio
caminho para cumprir sua sentença.
Eu puxo o papel para perto para ver se há mais alguma coisa, mas não
há.
A prisão fica perto de Pueblo, Colorado. Chegar a Pueblo, porém, não
pode ser fácil daqui. Tem que ser um voo de conexão que levaria horas, sem
contar a segurança e todo o tempo adicional. Estou errada. Não é onde ele
está. Não pode ser.
Mas eu paro. Meu olhar pousa em uma das fotos dele e Angelique.
Atrás deles está um jato particular.
Jericho St. James não voaria comercialmente. Ele teria pegado um jato
particular que o levaria até lá em cerca de duas horas e meia, três horas, eu
acho. Sem esperar por verificações de segurança. Não há voos de conexão.
Lembro-me de seu comentário sobre dinheiro quando me disse que
havia contratado um professor de um prestigioso conservatório para ser
meu professor particular de violino. Claro, ele fretaria um jato se não possuir
um.
O que ele está fazendo para ver Danny Gibson? Ele é mesmo
permitido visitantes? O que ele quer saber daquele homem?
Sinto-me úmida e minhas mãos estão tremendo quando finalmente
me levanto.
O que ele quer saber? E o que Danny Gibson vai dizer a ele sobre o
que ele fez? Lembro-me de ontem à noite. O pesadelo que se repete nesta
época do ano. Ele perguntou se eu queria falar sobre isso. Falar sobre a
morte de Christian, eu acho. Se ele soubesse o que eu sonhei, porém, ele
pensaria menos de mim? Porque não importa o que aconteceu comigo, o
que aquele homem fez comigo, eu estou viva. Cristiano está morto. Ele é o
único com quem eu deveria sonhar. Sua morte é a coisa que me acorda no
meio da noite. Não o que quase aconteceu comigo.
CAPÍTULO VINTE E SEIS
JERICHO
A casa está silenciosa quando entro bem depois de uma da manhã.
Acabou que eu estava errado sobre sair muito antes da tempestade. No
momento em que terminei com Gibson e voltei para o aeroporto, aquela
tempestade havia começado e estávamos de castigo noite adentro.
Dex vai para a cama e eu tiro minha jaqueta a caminho do escritório.
Estou cansado depois de não dormir na noite passada, mas preciso de uma
bebida antes de ir para a cama. Eu flexiono minha mão direita. Está dura, os
nós dos dedos crus e machucados. O rosto de Gibson estava mais duro do
que eu esperava.
Apenas a ponta.
Filho da Puta
Fico surpreso quando abro a porta do escritório e encontro o abajur ao
lado do sofá e o lugar ocupado. Isabelle parece estar esperando por mim a
noite toda. Eu não posso avaliar onde sua cabeça está pelo olhar em seu
rosto.
— Por que você não está na cama? — Eu pergunto, fechando a porta e
caminhando até o armário de bebidas. Eu me sirvo de um copo de uísque.
— Eu estava esperando por você. Como foi em Atlanta?
Coloco a tampa na garrafa e me viro para ela, encostando-me no
armário enquanto bebo e a estudo. Ela sabe que eu não estava em Atlanta.
— Você gostaria de alguma coisa?
Ela balança a cabeça. — Por que você está tão atrasado? Seu irmão
pensou que você estaria em casa antes do jantar.
— Tempestade. Atrasamos.
— Sério? Porque era um dia claro e ensolarado em Atlanta.
Eu sorrio, bebo novamente e me sento atrás da minha mesa. — O que
é isso, Isabelle? — Eu pergunto, percebendo que já sei. Sou bastante
meticuloso com a forma como deixo as coisas na minha mesa e me lembro
de tudo. Embora eu não tenha certeza de que ela estava tentando esconder
isso.
— Bisbilhotando enquanto eu estava fora? — Eu pergunto,
esmigalhando o pedaço de papel com o nome da prisão. — Deixe-me ser
muito claro, Isabelle. Você não deve entrar aqui sem o meu convite.
Ela se levanta e caminha em minha direção, segurando a borda da
mesa, seu rosto duro. — Por quê?
Eu me inclino contra o assento e a estudo. Ela está lívida e ansiosa ao
mesmo tempo.
— Por que você iria vê-lo?
Eu vejo o vinco entre suas sobrancelhas, a delicada pele rosa ao redor
de seus olhos. Seu olhar cai para a minha mão então, a que segura o copo de
uísque. Aquela que derrotou Danny Gibson a um centímetro de sua vida.
— O que você fez? — ela pergunta, abaixando-se para uma das
cadeiras na frente da minha mesa.
Eu considero o que dizer a ela. Se ela está pronta para ouvir a verdade
sobre seu meio-irmão e prima. Mas as palavras de Danny Gibson me
provocam. Eu sei que Christian chegou a tempo de salvá-la de ser estuprada.
Eu sei porque fui eu quem reivindicou sua virgindade na noite em que a levei
para minha cama. Mas quão perto ela chegou de ser estuprada? E esses
pesadelos, são sobre seu irmão morto ou sobre quase ter sido estuprada?
Sendo atacada por aquele pedaço de merda?
— Conte-me sobre aquela noite. — eu digo, sentindo uma ternura por
ela. Eu quero segurá-la. Lembra-la de que ela está segura.
— Não há nada para dizer que você não saiba, eu estou supondo.
— Diga-me de qualquer maneira.
— Por quê? O que ele disse?
— Não importa o que ele disse. Eu quero ouvir isso de você.
Seus olhos ficam enevoados e ela fica quieta por um longo momento
enquanto estuda a parede logo atrás do meu ombro. Quando ela finalmente
olha para mim, sua expressão é cautelosa, fechada. — Um homem invadiu
nossa casa para nos roubar. Ele me encontrou em casa e pensou em se
divertir. Mas antes que ele pudesse terminar o que começou, meu irmão o
surpreendeu e se matou salvando minha vida. Isso é bom o suficiente para
você?
Eu a vejo abraçar seus braços ao redor de si mesma. Ela está
tremendo. — E os pesadelos, me fale sobre eles.
— Não são eles no plural. É apenas um. Um pesadelo. — Ela projeta
sua mandíbula teimosamente. — Você quer saber o que é? Quer saber o
quão egoísta eu sou?
Eu não respondo. Apenas observo.
— Não é o que você pensa. O que as pessoas normais sonhariam. Não
é meu irmão. — Ela se levanta, dá meia volta na cadeira e se vira para mim.
— Quero dizer, ele perdeu a vida naquela noite. Eu o perdi, mas ainda estou
viva e se não fosse por mim, ele estaria aqui agora. Se não fosse por ele
tentando tirar aquele homem de cima de mim. — Ela engole, enxuga as
lágrimas dos olhos com as palmas das mãos. — Depois do que ele fez para
me salvar, não é nem ele que vejo em meus sonhos. É aquele homem
horrível. A cara dele. A maneira como ele se sentia. A maneira como ele
cheirava. Seu hálito quente no meu pescoço. — Ela parece que vai vomitar,
mas ela puxa uma respiração profunda e trêmula e se concentra em mim. —
Não consigo parar de ver o rosto daquele homem, mas estou esquecendo
como era Christian. Você entende isso?
— Isso é normal, Isabelle. Você não precisa se sentir culpada por isso.
— Sim eu quero. Esse pesadelo é tudo sobre mim. Tudo sobre o que
aconteceu comigo. Não ele. — Ela balança a cabeça. — Eu chego na parte
onde… onde ele está tirando meu jeans. Eu posso sentir suas mãos como se
estivessem em mim…
— Eu quebrei as mãos dele. Seus dedos.
Ela olha para mim e imagino que esteja processando enquanto fala. —
É quando eu acordo. Quando Christian entrou na sala.
— Isabelle…
— Eu sonho quando senti aquele homem entre minhas pernas. — Ela
está olhando diretamente para mim, olhos enormes e selvagens. — Eu
sonho com ele quase me estuprando. Mesmo que eu tenha que ir embora.
— Você não foi exatamente embora. — Eu fico de pé, andando ao
redor da mesa em direção a ela. Ela balança a cabeça, se afasta.
— Não importa, Jericho. Estou aqui, não estou? Eu estou viva.
Christian está no chão quando ele nunca deveria ter estado lá para começar.
Se eu não tivesse ligado para ele, ele estaria seguro. É por isso que ele veio,
você sabe disso? — Ela enxuga mais lágrimas. — Eu liguei para pedir a ele
que me trouxesse minha sopa favorita da delicatessen ali perto. Eu estava
doente e ele foi trabalhar. Pedi a ele que me trouxesse sopa como se já não
estivesse ocupado o suficiente. Se eu não tivesse sido tão egoísta…
— Você não é egoísta.
— Ele trouxe a sopa durante o intervalo do turno e se matou.
Ela se encurralou em um canto. Eu pego seus braços, aperto-os e não a
solto quando ela tenta passar por mim.
— Se ele não tivesse voltado para casa, algo muito pior teria
acontecido com você. — digo a ela, decidindo que é hora. Porque ela
carrega a culpa da morte de seu irmão em seus ombros há anos, quando
não era culpa dela. Quando era culpa de quem fingia se importar com ela.
Ela luta contra mim e eu a puxo em meu peito, coloco minha mão em
volta de sua cabeça.
— Eu teria sobrevivido. — diz ela, falando contra o meu peito. —
Mesmo se ele tivesse conseguido e feito o que queria, eu teria sobrevivido.
— Um soluço quebra seu corpo e ela envolve seus braços em volta da minha
cintura.
— Não, você não faria, querida. — Eu mantenho sua bochecha contra
o meu peito e a abraço forte.
— Ele não precisava morrer. — ela diz como se não tivesse me ouvido.
— Teria sido você que morreria se Christian não tivesse voltado para
casa.
Ela balança a cabeça. — Você não sabe disso. — diz ela, recuando para
olhar para mim.
Eu vacilo novamente. Ela está pronta para ouvir isso? Mesmo com a
prova que tenho? Ela ainda é frágil. Assim é a gravidez. Mas não posso mais
esconder isso dela. Não está certo.
— Eu sei, Isabelle. Eu sei tudo.
Suas sobrancelhas franzem enquanto ela tenta entender.
— Danny Gibson foi contratado para matar você naquela noite. Foilhe dito para fazer parecer um arrombamento.
Ela balança a cabeça. — O quê? Não. Isso não faz sentido. Por quê?
Você está errado.
— Carlton Bishop soube de sua existência anos antes de reivindicar
publicamente você como sua meia-irmã. Ele só o fez porque estava preso à
forma como a herança estava escrita.
— Herança? O que o assassinato do meu irmão tem a ver com uma
herança estúpida? — ela me empurra, vai embora. — Eu não me importo
com nenhuma herança!
— Eu sei que não. — digo a ela, fechando o espaço entre nós para
esfregar seus braços, para segurá-la enquanto digo a verdade.
— Solte.
— Não. Você precisa saber.
— Ele mentiu para você. Aquele homem mentiu para você. — ela diz.
— Eu tenho provas. Eu tenho provas desde quase o começo.
Ela apenas balança a cabeça.
— Carlton queria você fora do caminho. Você precisava estar morta. A
linha precisava terminar para ele manter a herança. Ele não tem herdeiros.
— Ele não sabia quem eu era.
— Ele fez. E ele contratou Danny Gibson para fazer parecer um assalto
que deu errado.
Ela coloca uma mão contra sua barriga como se protegendo a pequena
vida dentro dela. A outra está enrolada no meu bíceps.
— Gibson foi pago de uma das instituições de caridade Bishop. Foi
desviado através de várias contas e depois retirado. É um esquema
intrincado, mas é factível se você souber o que está fazendo.
— O julgamento… eles nunca encontraram nenhuma pista. Não havia
rastro de dinheiro, Jericho.
— O bastardo merece apodrecer na prisão, mas Carlton Bishop
também.
Ela se move para se sentar, eu a sigo para sentar ao lado dela. — Você
está errado. Você tem que estar.
— Quem me dera estar.
Ela pressiona as mãos no rosto, esfrega, balança a cabeça. — Ele veio
ao hospital. Ele me acolheu. Cuidou de mim.
— Porque ele precisava. IVI sabia da sua existência e também os
testamenteiros do espólio do Bishop. Ele não podia mais escondê-la, então
ele a levou para controlá-la. Talvez para esperar por sua próxima
oportunidade.
Com isso, ela empurra minhas mãos para longe e salta para seus pés.
— Não! Não. Eu não acredito nisso.
Estou de pé também enquanto ela caminha em direção à porta. — Ele
deu apenas uma instrução a Danny Gibson. Quer saber o que foi?
Ela balança a cabeça, abre a porta do escritório.
— Torne-o sangrento. É isso.
Ela para. Abaixa a cabeça.
— Esse era seu único requisito. — Eu chego a ela, envolvo meu braço
em volta dela por trás. — Sinto muito, Isabelle. Eu não quero te machucar,
mas é a verdade. Eu vou te mostrar a prova. Vou te mostrar.
Ela se vira em meus braços para me encarar, me estuda por um longo,
longo tempo, como se tentasse avaliar se estou dizendo a verdade.
— Então, Carlton está tentando me matar e ele tentou matar você?
Meu olhar se estreita.
— Faz muito sentido. Por que ele tentaria matar você ou eu? Qual é o
ponto? Por quê? E por que ir tão longe?
— Nossas famílias se odeiam. Se você olhar para trás ao longo da
nossa história…
— Eu olhei para trás e você está certo. — diz ela, afastando minhas
mãos. — Nós nos odiamos.
Eu espero. Observo.
Ela fica mais alta e dá um passo para longe, colocando espaço entre
nós. — Você e eu somos inimigos. Sempre serei uma Bishop. Você sempre
será um St. James. O bebê que estou carregando, aquele que tem sangue de
Bishop, vai te dar tudo o que você quer para se vingar. Carlton, Julia e Matty
estarão na rua. Eu com eles, provavelmente.
— Não, Isabelle. — Dou um passo em direção a ela, mas quando ela
recua, paro. Eu não sei como eu esperava que isso fosse. Eu sabia que essa
conversa estava chegando, mas ainda estou despreparado. — Você não. Eu
te disse…
— Sei o que você me disse e eu entendo o porquê. Mas acho que
cuidar do meu bem-estar tem prazo de validade. São cerca de nove meses.
— Porra, Isabelle. — Eu paro porque pensei que tínhamos passado
dessa parte. — Você ainda acha isso? Depois de tudo?
Ela empurra as mãos em seu cabelo. — Para acreditar em você, tenho
que acreditar que Carlton quer me machucar. Para não acreditar em você,
tenho que acreditar que você quer me machucar.
— Eu não.
Ela olha para mim. — De qualquer forma eu perco.
— Você me escolheu na outra noite. Você não se lembra?
Ela balança a cabeça, caminha em direção às escadas, para quando
chega nelas e dá meia volta para me encarar. — É muito. Eu não posso fazer
isso.
— Querida. — Eu vou até ela, mas ela levanta as mãos para me
impedir.
— Eu quero ver Julia. Eu quero falar com ela.
— Não. Isso não será possível.
— Ela me disse que você faria isso. Torcer minha mente. Meus
pensamentos.
Sinto a raiva crescendo. — Você se lembra da van que quase atropelou
você?
Ela balança a cabeça. — Não quero ouvir mais nada. — Ela se apressa
escada acima, tropeçando em sua pressa para se afastar de mim.
Eu a alcanço no patamar, agarro seu braço e a acompanho até o meu
quarto. Fecho a porta atrás de nós. — Você sabe onde sua prima foi na noite
depois que ela veio te ver no teatro?
— Me deixe ir!
— Ela foi ver o homem que é dono daquela van.
Ela para, balança a cabeça. — Não. Eu não acredito em você. Ela não
iria.
Eu pego os dois braços dela e dou-lhe uma sacudida. Eu preciso que
ela me ouça. Para ver a razão. Para acreditar em mim. — Ele é irmão de
Danny Gibson. Ela foi se encontrar com o irmão de Danny Gibson.
— Não. Não. — Ela escapa do meu alcance e caminha para o outro
lado da sala. — Por que você está fazendo isso? Você já tirou tudo de mim!
Eu sou sua prisioneira. E você tem o que quer. Julia sabia. Ela sabia o tempo
todo. Eu disse a ela que ela estava errada, que não podia estar. Mas você
estava trocando minhas pílulas. Então, como posso acreditar em você sobre
isso? Como posso acreditar em você sobre qualquer coisa? Você me quer
isolada. Você me tem a sete chaves. Por que você está fazendo isso agora?
Por que você tentaria me fazer pensar… me fazer acreditar na única pessoa
que tem sido minha amiga…
— Ela não é sua amiga. Ela nunca foi sua amiga! — Vou até a cômoda
e abro uma gaveta para tirar uma das seringas que o Dr. Barnes deixou. Ela a
vê antes que eu possa colocá-la no bolso.
— Para que isso? — Ela pergunta enquanto eu como o espaço entre
nós e a pego pelos braços. Ela não vai ver a razão esta noite. — Me deixe ir!
— Conversaremos amanhã. Eu vou te mostrar a prova. Agora, você
precisa se acalmar antes de se machucar ou machucar o bebê.
— Você não se importa comigo. Você se preocupa com o bebê. Pelo
menos seja honesto sobre isso! Você quer me machucar um pouco mais me
contando sobre esse homem… esse homem que é irmão do assassino de
Christian? Você quer que eu acredite que ele está tentando me matar. Que
Julia iria…
— Isabelle. Último aviso.
— Que ela faria algo assim? Algo que só monstros e demônios são
capazes, Jericho St. James. E você é um demônio. Foi o que pensei naquele
primeiro dia. Você sabia disso? E quando você terminar comigo…
— Eu não vou terminar com você. — Eu a giro para ficar de costas para
mim, destampo a seringa com os dentes e cuspo a tampa. — Você não
entende?
— Me deixe ir! — Ela luta, mas não é forte o suficiente. Nem mesmo
perto. Eu empurro sua legging para baixo um pouco e empurro a agulha em
seu quadril.
— Não!
Mas é muito tarde. Já está funcionando. Quando puxo o barril vazio,
seus joelhos cedem e eu a levanto em meus braços para carregá-la para a
cama.
— Sinto muito. — digo a ela. — Eu não queria fazer isso. Não queria te
contar dessa maneira.
— Quando você terminar comigo, você vai me enterrar ao lado de
Nellie? Deixar as ervas daninhas crescerem sobre o meu túmulo para que
ninguém se lembre de mim? — ela pergunta, palavras arrastadas.
— Isso novamente? — Eu a puxo para um assento, abraço-a para
mim. — Não. Nunca. Nunca.
Sento-me na cama com ela no colo. — Por que você me odeia tanto?
— ela pergunta, sua voz quase baixa demais para ser ouvida.
— Eu não odeio você. O oposto. Deus sabe que eu nunca quis, mas é
verdade.
Eu sinto o peso de sua cabeça cair no meu ombro. Eu fecho meus
olhos, segurando-a com força. Tão apertada.
É verdade. O que eu sinto por ela é o oposto do ódio. É amor. E
machucá-la esta noite me machuca como se alguém tivesse agarrado o
músculo dentro do meu peito e estivesse apertando com força.
— Sinto muito. — eu sussurro enquanto a deito, levanto suas pernas
para a cama. Eu a olho tão pequena, vulnerável e inocente em um mundo de
demônios. — Sinto muito, querida.
Eu afasto o cabelo de seu rosto e me levanto, tiro seus sapatos, suas
leggings. Quando o faço, algo cai do bolso dela e cai no chão. Eu a coloco na
cama, me curvando para pegá-lo e meu coração para. Porque eu já vi esse
rosário antes. Reconheço a caligrafia na folha de papel em que está
enrolada. E juro que sinto o fedor do porão nos papéis.
Eu me abaixo para sentar na beirada da cama e olho para os papéis na
minha mão. Olho para a Isabelle adormecida. E desembrulho o rosário para
abrir a carta.
CAPÍTULO VINTE E SETE
JERICHO
Li essa carta uma dúzia de vezes e ainda não entendi. Ainda não
consigo entender.
Nota de suicídio de Zoë. Ela deixou uma. Ela a deixou para Zeke e ele
deve ter lido e escondido, apenas para Isabelle encontrá-la.
Porra.
Engulo um gole profundo de uísque e olho para a parede do mausoléu.
Olhe para o nome dela. A data de seu nascimento e de sua morte. Pelo
menos o uísque não é a marca do meu pai. Eu odeio as coisas que ele
costumava beber. Sempre fiz.
Eu leio a carta de novo, o rosário enrolado em meu punho, mordendo
as costas da minha mão enquanto ela se fecha em um punho.
Zoë se matou porque nosso pai a estava machucando. Tocando-a.
Uma onda de náusea me faz pensar que vou vomitar, mas não. Como
poderíamos não saber? Como isso poderia continuar por um ano inteiro e
nós não sabíamos?
Eu chego à parte sobre nós. Sobre mim.
Ele é o mais parecido com nosso pai e às vezes esse lado dele me
assusta.
A provocação de Carlton Bishop volta para mim. Algo sobre a história
se repetir. Ele quis dizer os suicídios? Ou ele quis dizer outra coisa? Penso na
minha própria filha.
Jesus.
Estou enjoado.
Como um pai pode fazer isso com sua própria filha? Quão pervertido
você deve ser para fazer isso com sua própria carne e sangue?
Com um rugido, esmago a garrafa contra seu marcador na parede do
mausoléu. Estou muito perto, porém, sinto um corte na testa de uma lasca
de vidro que ricocheteia. Eu não me importo. Congratulo-me com a dor.
Mas não é suficiente. Então eu puxo meu punho para trás e o esmago contra
a pedra que protege o espaço onde seus ossos descansam. Onde as peças
recuperadas após o acidente que Zeke arranjou estão muito perto da minha
irmãzinha, mesmo na morte. Eu bato meu punho contra ele de novo e de
novo e penso em como vou remover seu cadáver. Queimar o que resta dele.
Que as cinzas se espalhem onde puderem. Vou afastá-lo dela. Longe da
minha irmãzinha. Mesmo que seja tarde demais para mudar alguma coisa.
— Irmão.
Eu me viro para encontrar Zeke parado a poucos metros de mim.
Minha mão lateja ao meu lado. Eu olho de volta para a pedra manchada de
sangue e uísque e bato meu punho contra ela novamente. Eu ouço meu
próprio grito. É alto o suficiente para acordar os mortos.
— Jericho! — A mão de Zeke se fecha sobre meu punho quando eu o
puxo de volta. Ficamos olhando um para o outro por um longo minuto.
— Você sabia?
Ele me estuda, os olhos se estreitando quando seu olhar muda para
minha outra mão segurando a carta amassada de Zoë.
— Você sabia, porra? — Eu pergunto, chamando sua atenção de volta
para o meu rosto. O dele perdeu um pouco da cor.
Ele acena com a cabeça um único aceno solene. — Encontrei a carta
exatamente como ela queria que eu encontrasse. — Ele deixa cair o braço.
Eu puxo o meu de volta e dou um soco nele.
— Seu idiota! Você sabia o tempo todo. Você sabia, porra, o que ele
fez. Por que ela fez isso. Por que ela morreu, porra.
Ele toca sua mandíbula. Ele vai ter uma contusão, mas ele mal
tropeçou.
— Você sabia antes de ela morrer?
— Foda-se não.
— Ela tentou te contar. — Eu aceno a carta na frente de seu rosto. —
Onde diabos você estava quando ela tentou te dizer porra?
— Onde diabos você estava? — ele grita de volta, o passo que ele dá
em minha direção com raiva. — Huh? Onde diabos você estava, irmão? Oh
sim. Sumiu a maior parte do tempo nos deixando aqui com aquele monstro.
Eu tropeço em sua acusação. Embora ele esteja certo. Cada palavra se
encaixa. Eu tinha ido. Quando as coisas pioraram, eu fui embora.
— O quê? Nenhuma resposta para isso, irmão mais velho?
Olho para o meu punho sangrando. É cru e latejante pra caralho. Mas
eu preciso de mais. Eu mereço mais. E assim, volto para o nome daquele
bastardo e bato na parede de pedra até não poder mais. Até que Zeke
finalmente consegue me tirar disso. Para me levar ao chão. Na sujeira e na
lama, a carta da minha irmãzinha, suas últimas e terríveis palavras
arruinadas na sujeira.
— Como eu poderia não saber? — Eu pergunto, minha voz falhando.
— Como eu poderia não saber, porra? Não ver. — Eu me inclino contra a
lápide mais próxima.
— Eu era seu gêmeo. Se alguém deveria saber, era eu. Inferno. Ela
tentou me dizer. Lembro-me de quando ela tentou. Ela ficou tão magra,
lembra? Não dormia mais. Não comia. Não fiz muito além de seguir os
movimentos.
Enfio a mão no cabelo e olho para o nome de Zoë, noto as flores que
estão morrendo. Tempo para novas. Eu me viro para o meu irmão.
— Mamãe?
Ele acena com a cabeça uma vez.
— Quanto tempo?
— Eu disse a ela antes de partir para a Áustria. Disse a ela por que eu
estava indo. O que eu ia fazer.
Não quero saber como ela aceitou. — Por que você não me contou?
— Não importa, Jericho. Não mais. — Ele parece cansado de repente.
Exausto. E aquela escuridão que eu vislumbrei um punhado de vezes, aquela
sombra, ela se instala sobre suas feições. Envelhecê-lo diante dos meus
olhos.
— Sinto muito. — digo a ele. — Me desculpe, eu não estava lá para
ela. Para você. Desculpe-me, eu não estava lá para matar aquele bastardo
eu mesmo. Não deixá-lo para você.
— Eu mergulharia minhas mãos em seu sangue uma e outra vez se
pudesse. Você não tem nada para se desculpar.
Ficamos sentados em silêncio por um longo tempo. Eu estudo minha
mão.
— Quando você encontrou a carta? — Zeke pergunta.
Eu me viro para ele. — Eu não fiz. Isabelle fez.
— Isabelle?
Eu aceno uma vez, pensando nela na minha cama. Deus. Esta noite
poderia ficar pior? Poderia ir mais longe dos trilhos?
— Vamos voltar para a casa. Durma um pouco.
— Eu estarei lá em breve. Vá em frente.
— Jericho, não há nada que você possa fazer aqui. Quebrar a mão não
vai mudar nada.
— Eu só preciso de um pouco de tempo. — Abro a carta novamente,
limpo a lama e leio. Depois de um tempo, Zeke me deixa em paz. Não
terminei de me punir. Ainda não.
CAPÍTULO VINTE E OITO
ISABELLE
Quando acordo, é meio da manhã e alguém está puxando as cortinas.
Eu meio que espero Leontine ou Catherine, mas é um homem. Por um
momento, acho que é Jericho. Ele está vestido com um suéter escuro e jeans
pretos, o que é incomum para ele. Então ele se vira, eu percebo que não é
ele. É Ezekiel.
Sento-me, sentindo minha boca seca. Ainda estou usando o suéter que
usei ontem, mas posso ver minhas leggings no chão, onde Jericho deve tê-la
deixado cair depois de me despir.
— Bom dia. — diz Zeke. — Desculpe entrar aqui e acordá-la.
Eu olho para ele tentando trabalhar na memória da noite passada, do
que Jericho me disse. O que ele fez comigo.
Empurro o cobertor e atravesso o quarto para a cômoda, não me
importando que eu esteja apenas vestindo calcinha e suéter. É
superdimensionado, então espero que cubra o suficiente de mim, mas eu
simplesmente não me importo. Eu abro a gaveta onde ele pegou aquela
maldita seringa e vasculho, encontrando mais duas. Eu as agarro, entro no
banheiro e esvazio os barris no vaso sanitário antes de jogá-los fora. Quando
me viro, vejo meu reflexo no espelho. Veja como eu pareço abatida. Lavo o
rosto, lavo a boca e vou até a porta para perguntar a Ezekiel o que ele quer.
Que mensagem Jericho lhe enviou para entregar. Cruzo os braços sobre o
peito.
— O que você quer?
— Você não deveria ter dado a ele. — diz ele. Seus braços estão
cruzados sobre o peito também.
Estou confusa. — O que você está falando?
— A carta, Isabelle. Não é como ele deveria ter descoberto.
Eu olho no chão para minhas leggings. A carta de Zoë. Deve ter caído
do meu bolso quando ele a tirou para me colocar na cama. Como se meu
conforto importasse para ele.
Mas minha testa franze quando penso no que estava naquela carta. Eu
olho para Zeke.
— Era o bilhete de suicídio de Zoë.
Ele acena com a cabeça, embora não seja uma pergunta. — Como
você achou isso?
— Jericho estava naquele quarto no porão algumas noites atrás. Ele
estava procurando algo e quando não encontrou, jogou uma caixa na
parede. Ela torceu a imagem. Vi as contas do rosário e desci para investigar
mais tarde, quando estava sozinha.
— Não era o seu lugar. Essa carta não era para você.
Eu mordo meu lábio. — Eu não sabia o que encontraria e você está
certo que não era para mim, mas era para Jericho. — Estou surpresa ao me
ouvir dizer isso. Ouça-me defendendo meu marido.
Ele aperta os lábios em uma linha fina. — Eu estava protegendo meu
irmão.
Eu aceno, volto para o quarto. — Eu sei. Sinto muito pelo que
aconteceu com ela. — Sinto meus olhos se encherem de lágrimas.
— Obrigado. Mas não é por isso que estou aqui.
— Por que você está aqui então?
— Jericho está em péssimo estado Isabelle. Muito ruim.
Eu sinto minha testa enrugar, mas antes que eu possa perguntar
qualquer coisa, ele continua.
— Eu o encontrei no cemitério ontem à noite. Ouvi o que pensei ser
um animal lá fora, mas era meu irmão batendo o punho contra a pedra do
mausoléu.
— Merda. Ele foi lá depois de ler?
Ezekiel assente. — Ele se sente culpado.
— Eu sinto muito. — eu digo, me perguntando se eu deveria ter
deixado em seu esconderijo.
— Ele está lá embaixo agora. Trancado em seu escritório.
Provavelmente bebendo outra garrafa de uísque. Você vai até ele?
— Eu?
— Eu tentei. Leontine tentou. Acho que você pode ser a única que
pode alcançá-lo.
— Eu? — Eu pergunto novamente, surpresa.
— Você. Leontine tirou Angelique. Dex está com elas. Não quero que
ela volte para casa e veja o pai desse jeito.
— Ok. — eu digo, balançando a cabeça. — Deixe-me me vestir.
— Não há tempo. — Ele enfia a mão no bolso e tira uma chave. Ele a
segura para mim. — Chave do escritório dele. — ele diz, eu vejo o
hematoma em sua mandíbula. Eu me pergunto se foi Jericho.
— Ok.
Ezekiel abre a porta e eu pego a chave quando passo por ele. Antes
mesmo de chegar ao último degrau, ouço música vinda do escritório. Ele
tem o volume bem alto. Eu reconheço a peça. Réquiem de Mozart.
Catherine está por perto parecendo preocupada. Ela encontra meu
olhar e eu tento dar-lhe um olhar tranquilizador, em seguida, ando até a
porta. Não me incomodo em bater, apenas enfio a chave na fechadura e
empurro a porta. A música está tão alta aqui que não consigo me ouvir
pensar. As cortinas estão fechadas, a única luz é a que deixei na noite
passada. Lá, sentado no meu lugar vago está meu marido. Meu marido
parecendo um homem quebrado. Uma garrafa de uísque quase vazia na
mesa ao lado dele. Ele está curvado para frente, cotovelos nos joelhos, mãos
entrelaçadas, cabeça pendurada, cabelo bagunçado. Suas roupas estão
sujas. Seus sapatos fora. E o cheiro de uísque e dor permeia a sala.
Eu não acho que ele me ouve entrar porque ele não olha para cima. Eu
silenciosamente tranco a porta atrás de mim e olho para ele novamente.
Para o meu marido sentado neste escritório escuro cheirando a álcool e
arrependimento. Parecendo derrotado. Sem esperança. Não o diabo que eu
conheço.
Ele levanta a cabeça. Quando seu olhar encontra o meu, meu coração
se contorce ao vê-lo. Meus olhos embaçam e a noite passada é de alguma
forma esquecida. Perdoada.
Eu vou até ele, que se senta contra o sofá. Vejo seu rosto mais
claramente quando me aproximo, vejo o sangue nele, a sujeira. A barba com
sombra das cinco horas. Sua camisa já foi branca, mas está arruinada.
Rasgada em alguns lugares. Manchada de lama e sangue. Por um momento
me pergunto de quem, mas então vejo suas mãos. A direita é pior que a
esquerda. Está inchada, sangrando, possivelmente um dedo ou dois
quebrados.
Eu caio de joelhos entre suas pernas e toco suas mãos, ouço seu silvo
de dor. Elas não estavam tão ruins na noite passada. Isso não é do que ele
fez com Danny Gibson. Não. É pelo que ele fez consigo mesmo depois que
encontrou aquela carta no meu bolso. Eu olho em seus olhos e toco seu
rosto, o corte em sua testa. Ele olha desesperadamente para mim. Ele está
longe. Muito longe. Eu preciso trazê-lo de volta.
— O que você fez com você mesmo? — Pergunto-lhe.
Ele não fala, mas ele roça os nós dos dedos de sua melhor mão na
minha bochecha. Alcançando além de mim, ele segura o gargalo da garrafa
de uísque.
— Não. — eu digo, fechando minha mão ao redor da garrafa.
Ele pisca, os olhos focando em mim. Ele tenta novamente.
— Não, Jericho. É o suficiente.
Não sei o que esperar, mas fico feliz quando ele não luta comigo. Eu a
coloco de volta na mesa e me levanto. Conheço uma maneira de atrair
Jericho St. James.
Eu alcanço debaixo do meu suéter e tiro minha calcinha. Ele observa
enquanto eu monto nele, sem me preocupar em me despir completamente.
— Seu homem estúpido. — digo a ele enquanto desfaço seu cinto e
calça, deslizando minha mão dentro de sua cueca para agarrar seu pau ainda
macio. — Você está tentando se matar? — Eu pergunto, beijando sua boca.
Ele não me beija de volta no começo. Ele não responde. Mas eu movo minha
mão sobre o pau dele. Enquanto ele endurece em meu aperto, suas pupilas
começam a se concentrar nas minhas e ele fecha uma mão em volta da
minha cabeça.
Eu me levanto e ajusto minha posição para montá-lo, levando-o para
dentro de mim, beijando-o enquanto o faço. Nossos olhos estão abertos,
bocas se tocando, línguas molhadas. Ele está duro dentro de mim enquanto
eu o monto lenta e profundamente.
Ele geme. — Isabelle.
— Shh. — Eu o beijo novamente enquanto agarro a bainha do meu
suéter. Eu o tiro, então rasgo sua camisa, o tecido rasgando facilmente,
então estamos pele com pele. Eu preciso me aproximar. O mais perto que
podemos estar.
Ele chega ao meu redor, segurando-me com um braço enquanto pega
o uísque com o outro e o leva à boca.
— Não. — eu digo a ele. Desta vez ele resiste, mas eu balanço minha
cabeça. Ele me permite tirar isso dele. Deixo a garrafa cair no tapete. — Eu
preciso de você, Jericho. — digo a ele, movendo meus quadris e apertando
meus músculos daquele jeito que eu sei que ele gosta. Eu posso senti-lo ficar
mais duro dentro de mim enquanto suas mãos vêm para meus quadris. —
Eu preciso de você aqui comigo, você entende?
Ele não fala, mas começa a me mover, me apertando contra ele.
— Nosso bebê precisa de você. Sua filha precisa de você. Você me
ouve?
— É tudo muito pior do que eu jamais imaginei. — ele diz mais para si
mesmo do que para mim. — Todos fodidos foram para o inferno. — Seu
aperto endurece ao redor dos meus quadris.
— Fique aqui comigo. — eu digo, segurando seu rosto e fazendo-o
olhar para mim. — Esteja aqui comigo agora. Eu preciso de você. Você me
ouve? Eu preciso de você, Jericho.
Ele olha para mim, olhos cansados e cheios de tanta dor.
— Por favor. — eu digo.
— Eu sou como ele. Zoë também sabia. Eu idolatrava aquele homem.
— Não. Você não é como ele. Eu sei.
— Eu sou um demônio. Você mesmo disse.
— Você poderia ter me machucado. Realmente me machucado.
Tantas vezes. Mas você não o fez. Nem uma vez.
Ele balança a cabeça. — Isabelle…
— E você é meu demônio. Eu preciso do meu demônio agora, você
entende?
— Eu sabia que você não iria querer uma gravidez. Troquei suas
pílulas. É pior do que mentir. Você sabe disso. Eu sei disso.
— Cale-se.
— E eventualmente, eu vou te machucar. Você não vê?
— Cale-se. Apenas cale a boca. Cale a boca e me faça gozar. Eu preciso
que você me faça gozar.
Ele engole em seco, os olhos escurecendo. Ele agarra meus quadris e
me puxa para baixo com força, moendo contra si mesmo. Então ele me
levanta e me coloca no sofá, abrindo minhas pernas e ajoelhando no chão
entre elas. Ele me puxa para a beirada do assento e enterra o rosto. Tudo o
que posso fazer é agarrar um punhado de cabelo e morder as costas da
minha mão para não gritar. A barba em sua mandíbula é áspera contra
minhas coxas, sua boca macia enquanto ele mergulha sua língua dentro de
mim antes de fechar a boca sobre meu clitóris.
Eu gozo, meu corpo estremecendo com o orgasmo. Quando acaba, ele
se levanta novamente, joelhos na beirada do sofá, cara a cara enquanto ele
me leva. Algo está diferente entre nós, nossos olhos bem abertos, nunca
vacilando no rosto do outro. Quando gozamos, nos agarramos um ao outro,
meus braços em volta do pescoço dele, ele segurando um punhado de
cabelo. Ele força minha cabeça para trás e me beija no momento em que o
sinto vazio dentro de mim. Eu engulo seu gemido, sabendo que
pertencemos um ao outro. Eu para ele e ele para mim. Isso está certo. Do
jeito que sempre foi para ser. Eu e ele. Bishop e St. James.
E o bebê dentro do meu estômago tem seu destino traçado para ele.
Seu propósito. Ele vai curar velhas feridas. Ele fechará o livro de história e
escreverá um novo futuro. Porque mesmo que as palavras não sejam ditas,
eu amo Jericho St. James. E eu preciso dele. Eu sei que é o mesmo para ele.
No entanto, isso começou, como ele pretendia que fosse, é outra coisa
agora. Algo inteiro, perfeito e certo. Forte o suficiente para enfrentar toda a
feiura do nosso mundo.
CAPÍTULO VINTE E NOVE
JERICHO
Ela limpa minhas mãos. Meu rosto. O antisséptico arde, mas tento não
me mexer enquanto a observo. Ela é linda. Tão bonita. Mesmo quando ela
me diz o quão estúpido eu sou por lutar contra a pedra. Ela está certa. Ela
tagarela sobre o que Angelique vai pensar quando me ver assim. Como é
melhor me enfaixar e não cheirar a destilaria antes que ela chegue em casa.
É bom. Distração.
Já são duas vezes que Dex tirou minha mãe e Angelique. Preciso falar
com ele sobre isso. É como se minha casa estivesse se revoltando
silenciosamente pelas minhas costas.
Isabelle coloca uma mecha de cabelo molhado atrás da orelha e olha
para mim. Depois do nosso banho, ela se vestiu com um suéter leve. Suas
pernas e pés estão descalços, o vestido abraçando sua bunda redonda.
Quando ela se vira para jogar fora o pano ensanguentado que usou para
limpar minhas feridas, estou tentado a dobrá-la sobre o pé da cama,
empurrar seu vestido até a cintura e tomá-la novamente.
— O quê? — ela pergunta quando ela se vira para mim.
Percebo que tenho um sorriso no rosto. Para ser honesto, sinto que
estou em um estado de sonho. Provavelmente pelo menos em parte devido
à quantidade de álcool que consumi e ao fato de não ter dormido em
quarenta e oito horas.
— Sua bunda fica bem nesse vestido.
Ela revira os olhos, mas sorri e puxa os lençóis de volta para a cama. —
Você precisa comer isso e dormir. — Ela aponta para o sanduíche na mesa
de cabeceira. — Você precisa de algo para absorver todo esse uísque.
— Sente-se. — eu digo a ela.
— Coma. — ela responde, cruzando os braços sobre o peito.
— Eu vou comer se você se sentar. — Ela não se move. — Precisamos
conversar, Isabelle. — Assim que as palavras saem, é como se aquela euforia
começasse a evaporar para nós dois.
Ela se senta ao meu lado, dobrando as pernas para cima. — Coma
primeiro.
Concordo com a cabeça e como o sanduíche em cerca de três
mordidas. Estou com fome.
— Talvez mastigar?
Eu sorrio, limpo minha boca e me viro para ela. — O que eu te disse
ontem à noite. Você se lembra?
Seu rosto escurece e ela assente. — Joguei fora as outras seringas. Se
você fizer isso comigo de novo…
— Eu não vou.
— Se você fizer isso, eu vou te matar Jericho St. James.
Eu sorrio com isso. — Ok. Eu vou te segurar nisso. — Ela empurra meu
cabelo para trás, seu rosto suavizando. — Mas o que eu disse. — continuo.
— O que eu te contei sobre a noite em que seu irmão foi morto. Você
lembra?
Ela desvia o olhar para o vestido, tirando fiapos imaginários. — Eu
preciso pensar.
— Eu gostaria de estar errado, Isabelle. Mas eu tenho provas.
— Eu só preciso pensar. Preciso passar pelas próximas semanas
primeiro. Ok?
O aniversário de sua morte.
— Ok.
Eu envolvo um braço em volta dela enquanto ela sorri fracamente
para mim. — Eu não vou te machucar, Isabelle. Eu prometo. Agora não. Não
quando você tem o bebê. Nunca. Você acredita em mim?
Ela enxuga os olhos.
— Você nunca precisa se preocupar com isso. Eu me importo com
você. Eu vou cuidar de você. Você se lembra do que eu disse uma vez?
Grávida ou não, Bishop ou não, vingança ou não, você é o que eu quero. Isso
não mudou. Não vai mudar. — Eu toco sua bochecha, puxo-a para o meu
peito enquanto mais lágrimas vêm.
Ela funga, seu corpo destruído por um soluço repentino, então eu a
seguro para mim. Gostaria de poder vê-la sorrir mais. Gostaria de poder
ouvi-la rir. Eu já a ouvi rir? Ri de vez em quando com Angelique quando ela
não sabe que estou ouvindo. Mas acho que nunca a ouvi rir.
— E eu não vou trair você. Você só precisa confiar em mim e continuar
me escolhendo.
CAPÍTULO TRINTA
ISABELLE
Jericho dorme muito e pesadamente. Naquela tarde, caminho até a
capela no terreno. É um dia frio e nublado enquanto caminho pelo caminho,
sentindo que as semanas que antecederam o assassinato de Christian são
sempre frias e nubladas. Pelo menos foram nos últimos três anos.
Colho flores silvestres no caminho, encontrando cachos em azuis e
amarelos. Quando chego ao cemitério, tenho o suficiente para quatro
pequenos buquês. Coloco um no túmulo de Kimberly, outro no de Nellie e
levo um terceiro para o de Zoë. Depois de arrumar as flores no vasinho
antes do nome dela, passo alguns minutos pensando nela. Sua vida curta e
triste. Sua terrível morte. Eu penso em seus dois irmãos e como eles não
puderam salvá-la. Eu vejo o rosto sem esperança de Jericho. A dor em seus
olhos.
— Sinto muito pelo que aconteceu com você. — digo a ela, lembrando
a sensação de alguém estar lá comigo no porão quando encontrei a carta. A
presença legal de algo que não é mais deste mundo. Enquanto penso nisso,
arrepios sobem ao longo do meu corpo e um arrepio me faz abraçar meus
braços. Não é assustador embora. É ela. Talvez ela tenha saído do porão
agora que o segredo foi revelado. Talvez ela possa descansar.
Um nó se forma na minha garganta e lágrimas aquecem meus olhos.
Eu escovo a sujeira do Z de seu nome e mudo meu olhar para o nome na
pedra ao lado dela. Aquele com o resíduo do que eu sei é o sangue de
Jericho. O pai dela.
Como ela pode descansar com ele tão perto?
Mas Jericho cuidará disso. Até amanhã de manhã. Alguém está vindo
para apagar seu nome da pedra assim que seus restos forem removidos da
cripta para que Zoë possa finalmente descansar.
Respiro fundo e sigo em direção à capela. Eu tenho meus próprios
mortos para lembrar agora. E nos últimos três anos eu criei minha própria
cerimônia memorial. Carlton nunca se importou com isso, embora quando
estimulado por Julia ele fingisse. Não posso culpá-lo. Ele não conhecia
Christian. Julia, porém, acho que ela se importava. Ela até se juntou a mim
no cemitério algumas vezes, me dizendo que ela entendeu quando eu contei
a ela sobre minha cerimônia. Como eu me lembrava dele.
Como na outra noite, vejo algumas pontas de cigarro velhas no chão
em frente à capela. Não sei por que elas se destacam para mim. Não é tão
incomum alguém fumar se estiver trabalhando aqui.
Ignorando, entro na capela e caminho até o altar. A lâmpada do
tabernáculo está acesa, mas as outras não, então coloco meu último buquê
de flores, pego a caixa de fósforos e começo a acendê-las. Abro a bolsa de
ombro que trouxe comigo e tiro minha pequena foto emoldurada de
Christian e eu. Eu estudo seu rosto, vejo como o sorriso ilumina seus olhos.
Foi tirada alguns anos antes do acidente dos meus pais. Eu tinha apenas
doze anos.
Tínhamos feito uma viagem para Miami. Foi uma das nossas poucas
férias em família e sei quanto tempo meus pais tiveram que economizar
para isso. Ficamos em motéis de beira de estrada enquanto íamos e ainda
me lembro dos vidrinhos de shampoo que eu só usava um pouco para poder
trazê-los para casa. Nós nos divertimos muito, no entanto. Todos nós rindo e
felizes. Tão felizes.
Meus olhos se enchem com a memória. Todos eles se foram agora.
Cada um deles. Como a vida gira em um centavo.
Coloco a foto no altar e coloco o buquê de flores diante dela. Pego
uma pequena vela de chá da minha bolsa e acendo também, colocando-a
bem na frente da foto antes de me sentar no banco da frente. Eu ignoro o
livro de Draca, ignoro seu nome gravado na grande pedra no corredor
central e em vez disso, me concentro em Christian. Dizendo as orações que
eu sei por ele. Pedindo a Deus que lhe dê paz. Para dar a todos paz.
Eu nunca senti a presença deles depois que eles morreram. Nem
minha mãe ou meu pai. Não Christian. Eu pensei que sim. Eu acho que você
deve ser capaz de sentir seus entes queridos depois que eles partirem deste
mundo. Seria uma bondade para aqueles de nós que ficaram para trás.
Mas não me detenho no pensamento. Em vez disso, pego meu próprio
tipo de diário. Um caderno que guardei depois que Christian morreu. Eu já
tinha começado a esquecer tantas coisas depois que mamãe e papai
faleceram, só percebi isso quando eu folheava velhos álbuns de família,
tentando lembrar onde ou quando uma foto foi tirada. Depois que Christian
foi morto, escrevi tudo o que conseguia lembrar sobre ele. Do jeito que ele
bagunçava meu cabelo e me chamava de franga quando se tratava de filmes
de terror, até o jeito que ele monopolizava o banheiro nas raras noites em
que tinha um encontro. Como eu zombava dele por passar tanto tempo em
seu cabelo.
Eu sorrio para aquele. Ele sempre exagerava na colônia também. No
Natal eu ia às lojas de departamento, pedia amostras de várias colônias
masculinas e dava para ele um presente. Eu faria o mesmo pela minha mãe
com perfume. Meu pai tirava uma foto nossa emoldurada todos os anos.
Nós não tínhamos dinheiro crescendo, mas eu nunca notei ou senti falta de
nada. Nós nos amávamos e não precisávamos de mais. Embora eu ache que
meus pais possam ter visto isso de forma diferente, trabalhando em vários
empregos para nos manter alimentados, vestidos e abrigados.
Eu tomo um minuto para agradecer a Deus por esses dias. Mesmo que
minha família tenha sido levada muito cedo, estávamos felizes. Nós nos
amávamos. Nós nunca machucamos um ao outro. Nós éramos mais ricos
que a família de Jericho, se eu pensar nas tragédias que eles sofreram.
Eu verifico meu relógio. Está quase na hora da minha aula da tarde
com Angelique. Desde que a Sra. Strand foi demitida, Leontine e eu
passamos tempo com ela, lendo para ela, dando lições simples. E Leontine
tem conversado com Jericho sobre matriculá-la cada vez mais na escola.
Assim que o aniversário da morte de Christian passar, falarei com ele
também. Eu só preciso passar as próximas semanas primeiro.
E então a próxima parte. A parte em que tento entender por que Julia
faria o que Jericho diz que fez. Onde eu tento chegar a um acordo com algo
que não consigo entender.
De acordo com Jericho, Carlton contratou Danny Gibson para me
matar. Tudo porque ele sabia que eu era sua meia-irmã e uma ameaça à sua
herança.
Eu acredito em Jericho? Eu acredito que ele acredita. E ele tem algum
tipo de prova para apoiar sua crença. Eu preciso ver isso por mim mesma. Se
for verdade, ele sempre soube que Carlton foi o responsável pela morte de
Christian. É isso que ele estava segurando sobre Carlton? Foi assim que ele
conseguiu que Carlton concordasse com nosso casamento, sabendo que a
ameaça de eu ter um bebê seria exponencialmente maior? Faz sentido que
era o plano de Jericho. É a única coisa que faz sentido.
Mas Carlton é capaz de matar? Porque mesmo que ele não cometesse
o ato, ele o encomendou.
E depois há Julia.
É verdade que na noite em que ela veio ao teatro para me dizer que
Jericho havia ameaçado Matty e me dar aquelas pílulas, ela foi na casa
daquele homem? O homem que dirigiu a van que quase me atropelou? Não
foi um acidente? Mau momento? Ou eu sou ingênua?
Carlton é uma coisa, embora eu não tenha certeza se ele é capaz das
coisas de que Jericho o está acusando. Mas Julia? Ela tem sido uma amiga
para mim. Ela é a mãe de Matty. Eu vejo como ela é com ele. Ela o ama. Ela
faria qualquer coisa por ele.
Naquela noite no teatro, ela disse que Jericho tentaria distorcer minha
mente. Fazer-me acreditar no que ele queria que eu acreditasse. Que ele me
trataria com luvas de pelica porque eu estava carregando seu bebê, a
ferramenta para sua vingança. Ela disse que sou maleável.
Não é verdade. Ele jurou de cima a baixo que me quer. Que ele vai
cuidar de mim e não apenas do bebê. Eu acredito nele. Mais que isso. Eu
tenho sentimentos por ele.
E isso tudo pode ser exatamente o que Julia disse. Pode ser ele me
interpretando como uma marionete.
Levanto-me porque não quero mais pensar nisso. Além disso, é hora
de voltar para casa. Deixo a vela acesa, mas apago as outras velas do altar,
pego minha bolsa e saio da capela. O céu está mais escuro, as nuvens mais
densas. Teremos uma tempestade hoje à noite, mas ainda não está
chovendo, então desço correndo as escadas da capela e atravesso o
cemitério. Algo chama minha atenção me fazendo olhar para o túmulo de
Nellie. Eu suspiro e paro com uma mão no portão do cemitério.
Ali, encostada no marcador, está uma pá que eu juro que não estava lá
apenas meia hora atrás, quando coloquei as flores em cima de seu túmulo.
Um calafrio me percorre, olho ao redor. Estou imaginando o cheiro de
fumaça de cigarro?
— Tem alguém aí? — Eu chamo. Talvez seja um jardineiro que veio
fazer algum trabalho. É a única coisa que faz sentido.
Ninguém responde, mas um pequeno flash de vermelho ilumina um
denso corte de árvores à distância.
— Olá? — pergunto novamente. Alguém aí está fumando? É isso que o
vermelho é?
Mas escurece novamente e ainda não há resposta. Olho mais uma vez
para a pá colocada no túmulo e empurro o portão para me apressar de volta
para a casa. Sentindo os olhos em mim durante todo o caminho, sentindo-se
observada. Sentindo medo de repente.
CAPÍTULO TRINTA E UM
JERICHO
Apagar o nome e a data da pedra que marca a vida do meu pai é mais
fácil do que exumar os restos que estão por trás dela. Depois do acidente,
apenas alguns ossos foram enterrados, mas quero qualquer vestígio dele.
Que desapareça. Quero minha irmã livre para descansar.
Lembro-me da primeira noite em que Isabelle esteve em casa. Como
ela mencionou uma presença no porão. Eu me pergunto se aquela presença
era Zoë. Desci lá desde que Isabelle encontrou a carta. Foi-se. O ar está vazio
como o resto da casa. Talvez ela estivesse esperando que descobríssemos a
carta. Eu me pergunto o que ela esperava que Zeke fizesse com a
informação. Como ela pensou que ele poderia compartilhar conosco, algo
tão terrível e impossível.
Quando contei à minha mãe o que pretendia fazer com os restos
mortais de meu pai, ela assentiu apenas uma vez. Não falamos do por quê.
Não mencionou o bilhete de suicídio de Zoë. Não mencionou o abuso que
ela sofreu. Honestamente, não tenho certeza se minha mãe aguentaria ouvir
isso de novo. Tenho certeza que ela passou por seu próprio inferno muitas
vezes com a morte de sua filha. E então aprender as razões por trás disso.
Observo de longe enquanto dois homens trabalham para remover as
pedras atrás das quais estão seus ossos. Não sinto nada enquanto olho.
Nada além de desgosto pelo homem. A morte que Zeke lhe deu foi boa
demais.
— Jericho.
Eu me viro para encontrar meu irmão se aproximando. Eu não o tinha
ouvido por causa do barulho dos trabalhadores. Ele olha para o mausoléu,
em seguida, de volta para mim, uma linha reveladora de preocupação entre
as sobrancelhas.
— O que aconteceu? — Eu pergunto, em alerta.
— Não sei. Fomos convocados ao quartel-general do IVI.
— Convocados?
— Acabei de falar ao telefone com a secretária de Hildebrand. Eles
estão chamando Os Filhos Soberanos. A reunião começa em meia hora.
— Isso é incomum. Você tem ideia do que seja isso?
Ele balança a cabeça. — O complexo está em confinamento. Isso é
tudo que eu sei.
— Confinamento? — A última vez que isso aconteceu foi durante uma
execução há mais de dois anos.
— Nós devemos ir.
Eu concordo. — Vou trazer Dex aqui para gerenciar isso. — Digo aos
homens que estou saindo e pego meu telefone para mandar uma
mensagem para Dex no caminho. Eu quero dizer a Isabelle para onde estou
indo, mas a escuto do outro lado da porta da biblioteca. Ela está tendo sua
aula e eu paro um momento para apreciar a música, mas decido não
interromper. Vou vê-la quando voltar.
Zeke nos leva ao complexo. Chegamos com uma série de outros
veículos e entregamos o carro aos manobristas que nos aguardavam. Os
homens trocam cumprimentos e é óbvio que ninguém sabe do que se trata.
Juiz e Santiago se aproximam enquanto somos conduzidos ao prédio
principal.
— Alguma ideia do que está acontecendo? — Eu pergunto depois que
apertamos as mãos.
— Não tenho certeza. — diz o juiz. — Tudo o que sei é que algo
aconteceu na Cat House ontem à noite.
A Cat House é essencialmente uma casa de prostitutas de alta
qualidade. As mais belas cortesãs são mantidas pela Sociedade para uso dos
Filhos Soberanos. Eu percebo o quão fodido isso soa, mas eles
supostamente são bem pagos e trabalham por vontade própria. Acho que é
um pouco do que nossas taxas compram. Outra vantagem.
— Não acho que seja uma simples repreensão se eles nos chamaram.
— diz Santiago, porque houve um ou dois casos em que as coisas saíram do
controle e alguém precisava ser repreendido.
— Não. — o juiz concorda, expressão séria. Eu me pergunto se ele
sabe mais do que está deixando transparecer, mas nossa conversa termina
quando entramos em uma das salas mais sombrias do complexo onde são
realizadas grandes reuniões. É um dos poucos, fora dos salões de baile, que
pode conter todos nós.
Zeke e eu tomamos nossos assentos lado a lado na antiga mesa de
carvalho. Santiago e Juiz estão à nossa frente. Há um zumbido de barulho
enquanto as pessoas especulam o que está acontecendo. Por que a
urgência. Eles só se calam quando o último dos homens entra, a porta é
fechada e o gongo soa.
Olho ao redor da mesa. Todos os assentos estão ocupados e alguns
homens ficam ao longo das paredes. Nenhum refresco além da água é
oferecido, o que é raro em qualquer reunião no complexo.
Isso é sério. E eu sei quando olho para meu irmão que ele e eu
estamos percebendo a mesma coisa. Carlton Bishop está ausente.
A porta se abre e o silêncio se torna absoluto quando o Conselheiro
Hildebrand entra vestindo seu manto oficial. Um dos guardas o guia até seu
assento na cabeceira da mesa e coloca a pasta na frente do conselheiro.
Todos nós observamos e esperamos enquanto, uma vez que ele se
acomoda, ele olha para o outro guarda e acena com a cabeça.
A porta pela qual ele acabou de passar é aberta mais uma vez, para
minha surpresa, entra Julia Bishop segurando a mão do filho. O garotinho
tem cerca de quatro anos, cabelos loiros encaracolados e grandes olhos
azuis assustados. Ele está vestindo um terno escuro e tem o polegar na
boca. Ela anda rapidamente, mas seus passos são lentos enquanto ele entra
nesta sala cheia de estranhos. Eu a vejo puxar sua mão para apressá-lo.
Isto não é lugar para uma criança. O menino está claramente
assustado. Por que ela o trouxe aqui? E o que diabos ela está fazendo aqui?
Percebo então que ela está vestida de forma mais sombria do que o
habitual. Quase mais modestamente. Quase. Ela está usando um vestido
preto de mangas compridas com gola alta que fica logo abaixo dos joelhos,
emparelhado com saltos de couro preto de cinco centímetros. Seu cabelo
está preso em um coque simples, mas elegante, na nuca, ela prendeu uma
bolinha de renda preta nele. Seus olhos são delineados com delineador
escuro e seus lábios são pintados de vermelho-palhaço.
Ela vem para ficar à direita de Hildebrand e deve perceber que seu
filho está chupando o dedo porque ela afasta a mão da boca. Ele olha para
ela e coloca sua pequena mão ao seu lado, mas eu vejo o esforço que ele faz
para mantê-la ali. É quando ela levanta seu olhar abatido para os homens
reunidos ao redor da mesa e eles pousam em mim, que eu tenho a sensação
de que eu sei o que está por vir.
— Senhores. — começa Hildebrand.
— É Bishop. — Zeke sussurra.
Concordo com a cabeça, mas não respondo enquanto Hildebrand
continua. — Como você sabe, o complexo está trancado. Isso é algo que os
outros Conselheiros e eu levamos muito a sério. Dadas às circunstâncias e a
delicadeza da situação, consideramos apropriado.
– O que está acontecendo, Hildebrand? — Alguém chama. — Não
vamos fazer cerimônia.
Hildebrand parece irritado com a interrupção, mas se recompõe. —
Convidei vocês aqui hoje com notícias tristes e felizes. Primeiro, a triste.
Gostaria de aconselhá-los sobre um incidente que ocorreu na Cat House
essa manhã. Aproximadamente às quatro horas, alguns de nossos
convidados estavam se entregando a… — ele faz uma pausa e tenho certeza
de que é uma pausa praticada. — Uma atividade em grupo. — diz ele. Ele
olha para o garotinho com um olhar que deixa claro que ele não tem ideia
de como se comportar perto de uma criança pequena. — Foi durante este
evento que nosso próprio Carlton Bishop se deparou com a tragédia. Ele
sucumbiu a um ataque cardíaco e faleceu no local.
Há um barulho imediato e coletivo quando os homens reunidos
começam a murmurar sua surpresa e choque. As perguntas começam, mas
o Conselheiro levanta a mão para silenciar a mesa. Levo um minuto inteiro
para processar esta notícia.
Meu olhar muda de Hildebrand para Julia Bishop. Porque o que diabos
ela está fazendo aqui? As mulheres nunca ou muito raramente podem
participar de tal reunião, mesmo que Carlton Bishop seja seu primo.
— E enquanto investigamos os detalhes desse evento infeliz, fiquei
sabendo de boas notícias. — diz ele, novamente olhando para o menino.
Ele força sua boca em um sorriso e estende a mão para o menino que
recua. Entendo. Sua mãe, porém, pega sua mão, a que não estava em sua
boca e a coloca na de Hildebrand. Hildebrand puxa o menino para frente e a
criança começa a chupar vigorosamente o polegar livre novamente.
Meu batimento cardíaco é de alguma forma controlado. Meu rosto
uma máscara. Estou calmo enquanto observo o que está acontecendo. Eu
sinto os olhos dos homens ao redor da mesa caindo lentamente sobre mim
enquanto todos começamos a entender a única coisa que isso pode ser. Por
que uma mulher e seu filho de quatro anos estão nesta sala?
— Acontece que nosso querido Carlton Bishop, cujas esposas não
conseguiram produzir um único herdeiro, era pai, afinal.
Os olhos de Hildebrand pousam em mim. Eu os encontro, então os
coloco para Julia que está atrás dele. Seu olhar trava no meu no momento
em que encontro o dela. Ela mal consegue evitar que um canto da boca se
curve para cima.
— Mathew Bishop é o produto de um caso de amor entre Carlton e
sua prima, Julia Bishop.
Alguém faz um barulho de engasgo. Eles são primos de primeiro grau.
Isso é legal mesmo? Pelo menos isso tira aquele sorriso satisfeito do rosto
de Julia. Enquanto ela desvia o olhar para o homem que fez o som, posso ver
sua mente trabalhando. Catalogando o nome.
— Como os tempos são modernos, é claro, esse emparelhamento não
seria aprovado pela Sociedade e portanto, os dois mantiveram seu amor em
segredo. — De que amor ele está falando? O homem morreu em uma casa
de prostitutas. Provavelmente com as bolas no fundo de uma das cortesãs.
— Mas agora que o Sr. Bishop faleceu, bem, o importante é recebermos seu
descendente no rebanho com todo o respeito que lhe é devido. —
Hildebrand se levanta e se vira para a criança olhando para o velho que se
eleva acima dele. Matty imediatamente começa a soluçar.
Hildebrand não se incomoda.
— Bem-vindo, rapaz. Bem-vindo à classe de Filhos Soberanos.
Enquanto os homens batem palmas e se levantam, ouço sons de “pelo
menos ele morreu feliz” E “fodendo sua prima? Que porra é essa?” E “Bem,
prima ou não, eu transaria com ela também. Olhe para ela”.
Mas é preciso tudo o que tenho para me arrastar até ficar de pé. Sinto
a mão de Zeke no meu ombro enquanto tento processar o que acabei de
ouvir. Enquanto eu tento entender como aquela mulher conseguiu isso.
Todo o tempo ela olha apenas para mim, um sorriso de vitória largo em seu
rosto. Porque se isso for verdade, então ela certamente é a vencedora.
Mas eu serei amaldiçoado se eu aceitar isso pelo valor nominal.
Eu mesmo vou investigar a paternidade do menino. E nas
circunstâncias da morte de Carlton Bishop. Isso é tudo muito perfeitamente
combinado. Muito perfeitamente cronometrado. E eu não compro. Nem
uma palavra disso.
CAPÍTULO TRINTA E DOIS
JERICHO
— Onde está o relatório de DNA? — pergunto a Hildebrand. Zeke, o
conselheiro, Julia e eu estamos em seu escritório particular menos de vinte
minutos após o anúncio.
— Tudo está em ordem, Sr. St. James. — diz Hildebrand. Aposto que
ele está secretamente satisfeito com este desenvolvimento. Os St. James
não são Filhos Soberanos natos. Este desenvolvimento assegura a herança
do Bishop e efetivamente anula qualquer direito que o meu e o filho de
Isabelle possam ter sobre ele.
Se for verdade.
E isso é uma grande merda.
— Com todo o respeito, Conselheiro, eu gostaria de estudá-lo eu
mesmo. — Olho para Julia, que está me observando a alguns metros de
distância. Ela tem os braços cruzados sobre o peito e parece o gato que
engoliu a porra do canário.
Hildebrand se acomoda em seu assento. — Eu entendo sua
preocupação, mas posso garantir a você…
Eu bato meu punho em sua mesa. — Eu não dou a mínima para o que
você garante. Eu não compro. Carlton Bishop foi incapaz de produzir um
herdeiro com quatro esposas. Quatro! Você está me dizendo que ele fodeu
sua prima e a engravidou magicamente?
— Irmão. — Zeke coloca a mão no meu ombro. Eu dou de ombros.
Hildebrand se recosta na cadeira, mas não é por medo de mim. —
Acalme-se, Sr. St. James ou vou levá-lo para uma cela para se refrescar.
— Jericho. — Zeke diz perto do meu ouvido. — Acalme-se.
Respiro fundo e olho para Julia, que está observando daquele jeito
calculado, suas feições completamente sob controle, o rosto não revelando
nada.
— Gostaria de ver o relatório. — digo a Hildebrand. — E executar
meus próprios testes para corroborar esta notícia feliz. — Não há nada de
feliz no meu tom.
— Você acha que não fizemos isso? — ele pergunta. — Investigar a
alegação da Sra. Bishop?
— Não custa ter uma segunda opinião, não é? Se apenas para
confirmar que não houve manipulação. — Essa última parte eu digo com um
olhar para Julia.
Hildebrand me estuda, olha para Julia e depois se vira para mim. —
Sra. Bishop veio a mim com a mais estrita confidencialidade com o que me
parecia a princípio uma história impossível. — ele começa. Eu me pergunto
se ela chupou seu velho pau enrugado para levá-lo a ouvi-la. — Isso foi há
várias semanas e sem o conhecimento de Carlton Bishop. O caso deles,
como você pode imaginar, seria… desaprovado. Primo ou não, ele era um
homem casado, afinal.
— No meio de se divorciar de sua esposa. — acrescenta Julia.
— Casado mesmo assim e ainda estaremos discutindo esse pecado,
Sra. Bishop. Eu aconselho você a ficar quieta. — Ele se vira para mim. —
Claro, por uma questão de transparência, mandarei os relatórios e amostras
enviados para um laboratório que você nomeia, Sr. St. James. Eu não
prevejo que você vai encontrar nada além do que fizemos. Quando não o
fizer, é claro que espero que você peça desculpas a Sra. Bishop por seu
comportamento neste momento infeliz para a família dela.
Julia bufa.
— A propósito, ouvi dizer que sua esposa está grávida. Parabéns.
É preciso tudo o que tenho e a mão do meu irmão no meu ombro para
não mandá-lo se foder.
— Claro, espero que você mostre graça ao aceitar que o menino
Bishop desloque seu filho ainda não nascido na linha para herdar a
propriedade do Bishop por completo.
— Se for verdade. — eu acrescento, minha mente trabalhando em
como vou levar amostras frescas para o laboratório.
— Eu preciso voltar para o meu filho. — diz Julia, dando um passo à
frente. — Tenho certeza de que ele tem dúvidas sobre a súbita ausência de
seu pai de sua vida.
— Compreensível. Entrarei em contato assim que os arranjos forem
feitos para o serviço. — Hildebrand diz a ela.
— Obrigado por sua ajuda, Conselheiro e sua discrição. Foram alguns
anos tumultuados, mas estou feliz, com Carlton morto, por ter vindo até
você quando o fiz.
— Tempo conveniente. — murmuro.
— St. James. — adverte Hildebrand.
— Não, está tudo bem. — Julia Bishop diz e se vira para mim. — Eu
entendo o quão decepcionante tal anúncio deve ser para alguém que
comprou seu lugar no escalão superior da Sociedade. Tenho certeza de que
ele esperava subir a escada usando minha família como degraus para ser
pisado. — Seus lábios se curvam em um sorriso de escárnio no final.
— Talvez você possa aprender com a Sra. Bishop e reunir alguma
graça. — diz Hildebrand, de pé. — Julia, meu motorista vai levar você e o
menino para casa.
— Obrigada, Conselheiro. — diz ela e agora tenho certeza que houve
algum chupar pau envolvido aqui.
Ela muda seu olhar para mim. — Sr. St. James. Espero que você
permita que minha prima vá ao funeral de seu meio-irmão.
— Não se atreva. — eu começo, mas ela me corta.
— Certamente você não iria negar isso a ela em seu próprio momento
de necessidade.
Eu dou um passo em direção a ela. — Isso não acabou.
— Não está?
CAPÍTULO TRINTA E TRÊS
ISABELLE
Eu não vejo Jericho até tarde naquela noite. Ele e Zeke entram na casa
depois das dez horas e ambos parecem uma merda. Como se tivessem
passado por uma provação.
— Onde você esteve? — Eu pergunto. Estive esperando por eles.
Zeke serve um uísque para cada um e eles ficam na manta junto à
grande lareira.
— O que aconteceu?
Zeke olha para mim, depois se vira para o irmão. — Vejo você pela
manhã.
Jericho acena para ele, engole metade de seu copo de uísque e muda
seu olhar para mim. Ele apoia um braço na manta.
— O que é isso? — Eu pergunto, indo até ele, quase esquecendo o que
pensei ter visto na floresta.
Ele respira fundo, exala e esvazia o copo. Depois de colocá-lo na
manta, ele dá um passo em minha direção. — Carlton Bishop está morto.
Leva-me um minuto. Eu ouço as palavras quase lentamente, dou um
aceno de cabeça e desloco meu olhar para o fogo, então de volta para ele.
— O que você disse?
— O Bishop está morto. Teve um ataque cardíaco enquanto transava
com uma das cortesãs da Cat House. Alegadamente.
— Eu sinto muito. Você pode voltar um minuto?
— Porra. — Ele empurra a mão em seu cabelo, desviando o olhar por
um longo momento antes de voltar sua atenção para mim. — O IVI entrou
em confinamento esta tarde. Ficará assim até de manhã. Presumo que a Cat
House permanecerá fechada por enquanto.
— A Cat House, essa é a…
— Casa das putas.
— Ele teve um ataque cardíaco enquanto estava lá?
— Alegadamente.
— O que você quer dizer?
— Vou conduzir minha própria investigação.
Eu caio em uma das poltronas e tento processar. — Carlton está
morto?
— Hildebrand nos ligou essa tarde para nos contar. Você estava em
sua aula e eu não queria interromper. Estávamos todos lá, todos os Filhos
Soberanos. Assim como Julia Bishop e seu filho.
Meu olhar se encaixa no dele. — Julia? Por quê?
— Sua prima engenhosa estava se encontrando com Hildebrand há
algum tempo.
— O que você está falando?
— Ela afirma que Mathew é filho de Carlton Bishop.
Minha boca se abre.
— Eles supostamente estavam tendo um caso há anos. Sendo primos
em primeiro grau, um casamento não seria sancionado e assim eles
mantiveram tudo em segredo. Isso tudo de acordo com Julia Bishop, é claro.
Ninguém para corroborar a história dela.
— Matty é filho de Carlton?
— Não verificado no que me diz respeito.
— Mas há alguma prova? Certamente o Conselheiro Hildebrand iria
querer alguma prova.
Jericho se acalma com isso.
— Jericho?
— Testes de DNA. Eu estarei conduzindo o meu próprio. Essa cadela é
uma mentirosa e possivelmente uma assassina.
— Não, Jericho, ela é…
— Pare de ser ingênua, Isabelle!
Estou surpresa com seu tom, mas vejo que ele também se arrepende.
— Carlton está morto. — eu digo. — Ele está morto. E se eles
estiveram juntos todos esses anos, ela provavelmente está fora de si com a
dor. Especialmente dadas às circunstâncias de sua morte. Quero dizer, ele
estava com outra mulher?
— Múltiplas. E um homem. Algum tipo de orgia, suponho e esses
outros o testemunharam literalmente cair morto.
— Oh, meu Deus. Como está Matty?
— Ela o trouxe lá como se ele fosse uma porra de uma marionete. O
garoto estava com medo.
— Ela o trouxe para onde?
— Na reunião em que Hildebrand anunciou a morte de Bishop e deu
as boas-vindas ao menino no rebanho dos Filhos Soberanos. Porra. Eu
preciso de outra bebida. — Ele se serve de outro uísque.
— Carlton está morto. — Eu esfrego meu rosto. Não é que eu me sinta
triste. Ainda não. Estou chocada. Eu me levanto. — Julia precisa de mim,
Jericho. Eu preciso ir até ela. Ela está sozinha além de Matty.
Suas sobrancelhas se erguem na testa e ele me olha como se eu fosse
louca. — Acho que não, querida. Vá para cima. Eu preciso pensar.
— O quê? — Eu ando em direção a ele. — Não. Não serei mandada
para o meu quarto como uma criança. Meu meio-irmão está morto.
Ele dá um passo para mim, levantando-se em toda a sua altura. Eu
tenho que esticar o pescoço para olhar para ele, a menos que eu me afaste,
o que não faço.
— Seu meio-irmão que é responsável pela morte de seu irmão. Pelo
ataque a você. Sem falar em outros. E essa cadela está nisso até os olhos. Eu
te prometo isso.
— Você está sendo irracional. Ele está morto. E se Matty é filho dele,
não importa mais. A herança não importa.
— Não se trata apenas de uma herança, Isabelle.
Eu dou esse passo para trás. — Eu sei que é. É sobre vingança. Ele está
morto. Você vai deixá-lo ir?
— Deixa para lá? Ele é a razão pela qual Angelique não tem mãe.
Não tenho nada a dizer sobre isso e odeio a pequena cutucada de
egoísmo à menção de Kimberly. Mas eu balanço minha cabeça. Não
podemos ter essa discussão. Não essa noite. Possivelmente nunca. —
Quando é o enterro?
— Não importa. Você não vai comparecer.
— Sim, eu vou!
— Não, Isabelle, você não vai.
— Jericho, por favor! Meu meio-irmão está morto. Minha prima está
sozinha. Sem mencionar seu filho de quatro anos que me ama. A quem eu
amo. Ele me vê como uma tia, Jericho. Eu preciso estar lá para eles.
— Ela tentou te matar.
— Eu não acredito nisso. Não posso. Você não vê?
— Pelo amor de Deus, Isabelle. Abra seus malditos olhos.
— Vou ao enterro. E eu vou ver Julia. Isso pode acabar, Jericho. Você
não quer que acabe? Não é hora de todos nós deixarmos isso para trás?
Estamos tendo um bebê. Você e eu estamos trazendo uma criança a este
mundo. Se pudermos escolher entre criar a criança com amor ou ódio, por
que escolheríamos o ódio?
Ele não responde de imediato, apenas bebe e olha para mim. Penso no
que Julia disse. Tratando-me com luvas de pelica. Virando minha cabeça, me
fazendo acreditar em qualquer coisa que ele queira. As luvas de pelica estão
pela metade, eu acho. Esta reviravolta vai forçar a mão de Jericho.
— Se Matty for o herdeiro, isso vai mudar as coisas. — eu digo.
— Isso é um grande se.
— Isso vai mudar tudo, Jericho. — Tudo entre nós. Vai desnudar a
verdade. Não tenho certeza se estou pronta.
— Não muda nada. — Seu telefone toca e ele o tira do bolso, olha para
a tela. — Vá para a cama, Isabelle. Eu preciso atender isso.
Eu coloco minha mão na minha barriga. Eu sei que é cedo e
provavelmente está na minha mente, mas eu juro que sinto o começo de
uma barriga inchada. Eu olho para ele enquanto ele atende sua ligação, os
olhos em mim enquanto ele ouve o que a pessoa tem a dizer. Ele sinaliza
para eu subir e vira as costas para mim, caminhando em direção ao seu
escritório, fora do alcance da voz, deixando-me ali sozinha.
CAPÍTULO TRINTA E QUATRO
ISABELLE
Jericho não vem para a cama naquela noite e na manhã seguinte,
quando desço, me dizem que ele está em seu escritório e não deve ser
incomodado.
Sento-me com Leontine enquanto Angelique brinca com suas bonecas
em um canto da biblioteca.
— Sabe o que aconteceu? — Eu pergunto a ela.
Ela acena. — Zeke me contou mais cedo esta manhã.
— Ele diz que não vai me deixar ir ao funeral.
— Por que você iria querer? Ele não era um bom homem e você sabe
disso. Meu filho tem seus melhores interesses no coração, Isabelle. — ela
diz, os olhos em Angelique. — Jericho protegerá sua família. Ele aprendeu da
maneira mais difícil como deve ser essa proteção. — Ela se vira para mim. —
E você é a família dele. Você está carregando o filho dele.
— Ele ainda quer esse bebê agora que sabe que Matty é o herdeiro?
— Que tipo de pergunta é essa? Uma criança é uma criança. — Eu me
sinto culpad assim que ela diz isso. — Você terá esse filho. Um irmãozinho
ou irmã para Angelique. Não há dúvida sobre isso, Isabelle. A criança vai
nascer.
— Isso não é o que eu quis dizer. — eu corro para corrigir.
— Sério? O que você quis dizer então? — ela pergunta diretamente,
tom mais áspero.
— Eu só… eu não quis dizer que não queria tê-lo.
Jericho entra na sala nesse momento e meu batimento cardíaco
acelera quando seu olhar cai em mim. Ele ainda está vestindo o mesmo
terno de ontem e parece que não dormiu. — Mãe, por favor, leve Angelique
para o quarto dela. — diz ele, os olhos fixos em mim.
Leontine olha do filho para mim, depois se levanta e vai até Angelique.
— Venha, Angelique, vamos brincar no seu quarto. — Ela a leva pela mão e
eu me levanto enquanto Jericho fecha e tranca a porta atrás delas.
— Você não veio para a cama…
— O que você estava dizendo para minha mãe? — ele pergunta, me
cortando.
— Você estava ouvindo na porta?
— O que você disse sobre o bebê?
— Nada. Ela entendeu errado.
Ele dá um passo em minha direção, estreitando os olhos. — O que ela
entendeu errado?
— Nada. Por que você está sendo assim comigo? — Sento-me e puxo
meus joelhos até meu peito. — Nunca serei aceita nesta casa? Estarei
sempre sob suspeita?
— Isabelle. — ele diz meu nome como um suspiro. Ele se senta ao
meu lado e segura meu rosto em suas mãos. Tenho certeza que pareço a
morte. — Você dormiu noite passada?
— Eu estava esperando por você. Eu precisava falar com você.
— Há muitas coisas que eu preciso cuidar. Você não deveria ter
esperado por mim. Você precisa cuidar de você e do bebê agora.
Eu o estudo, procurando seus olhos. Eles estão cheios de segredos. Eu
toco seu rosto. — Você me disse para confiar em você. Para escolher você.
Eu fiz. Mas isso tem que ser uma via de mão dupla. Você não está me
escolhendo, Jericho.
Seus olhos suavizam com isso e ele me puxa para seu colo. — Eu
escolho você. Quero você. Isso não mudou. Mas o que aconteceu, o
momento, é muito conveniente. E não é em você que eu não confio. É nela.
— O que você acha que ela fez? Causou o ataque cardíaco dele?
Ele não responde.
— Oh meu Deus, você acha. Você está falando sério? — Eu empurro
seu colo e me levanto.
— Existem maneiras. Você é muito inocente para compreender essas
maneiras, Isabelle.
— Você quer dizer muito estúpida?
— Quero dizer o que eu disse. Inocente. Você é boa. Ela não é. — Ele
para, balança a cabeça. — Eu sempre digo a coisa errada, não é?
Eu não digo nada.
Ele se levanta. — Eu não quero que você se machuque. É nisso que se
resume.
— Eu não vou me machucar. Você vai me proteger. Só não faça isso
me trancando e jogando a chave fora.
— Estou tentando. — Ele inspira profundamente e exala. — Recebi
uma ligação da secretária de Hildebrand alguns minutos atrás.
— O Conselheiro?
Ele concorda. — Parece que sua prima tem algumas informações que
ela encontrou enquanto limpava a mesa de Carlton. Ela é apenas uma fonte
de informações hoje em dia, não é?
— Que informação? — Eu pergunto, ignorando a provocação.
— Precisaremos ir ao complexo para ouvi-la.
— Nós?
— Você e eu. Ele nos quer os dois lá.
— Ou você não me contaria.
— Sua segurança é minha prioridade.
— Como exatamente você acha que eu estaria desprotegida?
— Como eu disse, Isabelle, eu não confio nela. Ela quer alguma coisa.
— O que ela poderia querer?
— Neste caso, posso dar um palpite.
— Importa-se de me esclarecer?
— Solicitei uma segunda autópsia.
Estou confusa.
— Ela vai querer bloqueá-la. Essa é a razão para esse momento
coincidente da revelação que ela está prestes a lançar sobre nós.
— Por que você quer uma segunda autópsia? O que a primeira
provou?
— Ataque cardíaco.
Eu jogo minhas mãos no ar. — O que você acha que uma segunda irá
revelar exatamente? Ele teve um ataque cardíaco. Houve testemunhas. Um
legista disse isso.
Ele se levanta, verifica seu relógio. — Nós somos esperados dentro de
uma hora.
— Acho que a conversa acabou então. Porque você decide quando
nossas conversas terminam. Isso não é uma parceria. Isso é uma ditadura.
Ele inclina a cabeça. — Quem te disse que era uma parceria?
— Você é inacreditável, você sabe disso? — Eu me viro para ir embora,
mas ele agarra meu braço.
— Estou tentando, Isabelle.
— Tente mais!
Sua mão aperta e eu vejo o esforço que ele leva para relaxar. Mas ele
faz. E força uma respiração apertada. — Ela vai pedir que meu pedido de
autópsia seja negado. Marque minhas palavras.
— E então você vai ganhar?
— Não, Isabelle. Perdi há muito tempo. Não há vitória quando você
está jogando esse tipo de jogo. Há a lembrança dos mortos. Estou vingandoos.
— E os vivos? O que acontece com os vivos? — Meus olhos se enchem
de lágrimas.
Ele me solta, se vira e envolve a mão em volta do pescoço. Ele está sob
pressão. E ele está perdendo o controle.
— Jericho. — eu digo, tocando uma mão em seu ombro. Mas antes
que eu possa continuar, ele se vira para mim.
— Você tomou café-da-manhã?
Mais uma vez, a conversa acabou. — Ainda não.
— Você vai comer enquanto eu tomo banho e me troco. — Ele
caminha até a porta, abre e espera por mim.
Eu sigo, paro na frente dele. — O que você está pensando que
aconteceu com Carlton, Jericho? Por que uma segunda autópsia realmente?
Diga-me. Confie em mim o suficiente para me dizer.
— Ataques cardíacos podem ser induzidos. A menos que você saiba
procurar os sinais, você sentirá falta deles. A Sociedade tem uma história
sombria com venenos e sua prima está cheia de surpresas nos dias de hoje.
CAPÍTULO TRINTA E CINCO
JERICHO
Isabelle está quieta, mas ansiosa no caminho para o complexo. Prefiro
não levá-la. Honestamente, eu não gostaria de nada melhor do que fazer o
que ela disse. Trancá-la em casa até que essa ameaça passe. Porque Julia
Bishop é uma ameaça. Talvez uma maior do que eu imaginava a princípio.
Mas Isabelle não vai acreditar em mim e com a morte de Carlton Bishop, ela
tem muito mais simpatia pela prima.
Chegamos ao complexo e somos escoltados até o escritório de
Hildebrand, onde Julia Bishop já está sentada, vestida de preto da cabeça
aos pés. Desta vez, um terninho que deve ter sido feito sob medida para seu
corpo. Quando ela vê Isabelle, ela corre para ela. A forma como as duas se
abraçam me pergunto se Isabelle ouviu uma palavra do que eu disse.
Hildebrand está atrás de sua mesa e um de seus homens fecha a porta
do escritório.
— Você está bem? — Isabelle pergunta a Julia quem parece a amante
de luto quando vejo seu rosto. Menos maquiagem. Olhos inchados. — Como
está Matty?
— Nós ficaremos bem. Foi um choque e eu gostaria que não tivesse
acontecido do jeito que aconteceu, mas… — ela para, encolhendo os
ombros.
— Vocês dois estavam juntos?
— Ele não queria contar a ninguém. Nem mesmo você. Desculpe-me,
eu guardei isso de você. Foi apenas, bem, você sabe como as pessoas
seriam.
— Eu sei, mas eu não faria.
— Porque você é boa. — Julia diz, se afastando, olhando para mim
além do ombro de Isabelle. — Como você está? — ela inclina a cabeça, toca
uma mão sutil na barriga de Isabelle.
— Estou bem. — Isabelle diz, desconfortável enquanto olha para mim.
Meus olhos se estreitam na mão de Julia. — O bebê está bem. — acrescenta
ela. O comentário parece fora do lugar. Uma coisa estranha de se dizer.
Julia a estuda por muito tempo. — Você tem certeza que é o que você
quer? — ela pergunta, do jeito que ela pergunta, é estranho. Vago.
— Tenho certeza. — Isabelle pega a mão dela e a aperta.
Hildebrand limpa a garganta e as duas se afastam. Isabelle vem ficar
ao meu lado. Eu envolvo uma mão em volta de seu pescoço.
— Café? Chá? — Hildebrand pergunta quando sua secretária entra
carregando uma grande bandeja de prata.
— Vamos logo ao que interessa, certo? — Faço um gesto para Isabelle
se sentar em uma das cadeiras vazias e sentar ao lado dela. Cruzo um
tornozelo sobre o joelho oposto e me inclino para trás. — Estou morrendo
de vontade de ouvir sobre esta próxima revelação devastadora.
Julia se move para o lado da mesa e olha para Hildebrand com olhos
inseguros. Eu a observo.
— Vá em frente. — diz Hildebrand, acariciando sua mão. Eu tenho um
visual dela de joelhos aos pés dele chupando seu pau velho. Eu vomito um
pouco na minha boca com a imagem.
Ela se vira para nós, olha primeiro para mim, depois para Isabelle, suas
feições perfeitamente treinadas para mostrar preocupação. Incerteza.
Vulnerabilidade mesmo.
— Eu estava vasculhando alguns arquivos na mesa de Carlton e me
deparei com algo que parecia estranho. — Ela para e se concentra em
Isabelle. — Eu não quero te machucar, querida.
— O que é isso? Você está me assustando. — Isabelle diz.
— Me sinto mal por dizer isso. — diz ela, virando-se para Hildebrand.
— Tenho certeza. — Olho para Hildebrand. — Isso é uma perda do
meu tempo.
Ele levanta a mão para que eu tenha paciência. Julia limpa a garganta,
suspira profundamente.
— O nome de Danny Gibson estava em um arquivo em uma de suas
gavetas.
— Danny Gibson? — Isabelle pergunta e eu sei o que Julia Bishop está
prestes a fazer. Sei exatamente. E eu tenho que admitir. Ela é inteligente.
Mais inteligente do que eu supunha.
Ela acena. — Eu estava surpresa. Quer dizer, no começo eu pensei que
ele tinha apenas rastreado o julgamento ou algo assim, mas — ela faz uma
pausa, balança a cabeça, enxuga uma lágrima imaginária. — Era um
cronograma de pagamento.
Não preciso olhar para Isabelle para saber sua reação. Eu sinto. Tentei
dizer-lhe a mesma coisa há poucos dias. Está apenas sendo confirmado. Mas
Julia vai dar seu próprio toque nas coisas.
— Ele tentou… Danny Gibson estar em sua casa não foi um acidente,
Isabelle. Carlton queria você fora de cena. Ele contratou aquele homem para
fazer isso.
Eu me viro para Isabelle agora, que está parada como uma pedra e tão
pálida.
— Eu sinto muito. Eu sinto muito. — Julia começa a chorar e eu tenho
que admitir, ela é boa. Isabelle está de pé em um instante abraçando-a.
Confortando-a.
Eu assisto do meu assento, envolvendo minha mão esquerda ao redor
da junta machucada do meu punho direito. Eu tenho que me impedir de
atacar. Porque eu quero atacar.
— Ele usou minha conta na instituição de caridade para fazer o
segundo pagamento. Usou meu nome, Isabelle. Eu não sabia. Não fazia
ideia. Eu sinto muito. Desculpe-me.
— Não é sua culpa. Como você poderia saber? — Isabelle também
está chorando e acariciando as costas de Julia.
Quando me viro para Hildebrand, ele está me observando. — Bem,
acontece que o Sr. Bishop não foi muito esperto se deixou um rastro de
papel. Considerando suas outras ofensas, não tenho certeza se este serviço
fúnebre deveria ser realizado na catedral. Se ele estivesse vivo e a Sra.
Bishop viesse a mim com isso, o Tribunal não teria escolha a não ser agir. —
É besteira porque ele poderia ter feito isso com as informações que eu tinha
sobre Bishop. Mas ele também está desempenhando um papel. Cobrindo
sua bunda.
— Ele está morto agora. — diz Julia. — E isso só traria vergonha para
nós. Ao filho dele e em mim. Então, estou pedindo clemência, Conselheiro.
Estou pedindo que esta informação seja mantida entre nós. Não há nada a
ganhar tornando-se pública dentro da Sociedade ou fora dela. Christian está
morto. Carlton está morto. Há apenas você e eu, Isabelle. E Matty. — Ela
coloca o nome do filho como se fosse uma reflexão tardia.
Eu poderia mencionar sua visita ao irmão de Danny Gibson, mas
decido guardá-la sob meu chapéu. Deixe-a pensar que eu não sei. Estou
curioso se Isabelle vai dá-lo. Ela não quer que seja verdade. Eu observo
minha esposa.
— Você tem razão. Não queremos mais ninguém ferido pelo que ele
fez. — Isabelle diz.
— Obrigada. — Julia aperta a mão de Isabelle. — Eu o amava. Apesar
de tudo, eu o amava.
Isabelle sorri calorosamente. Minha doce esposa. Ela não é páreo para
este pária.
Eu me levanto e puxo Isabelle para o meu lado, mantendo-a perto.
— Você disse que tinha um pedido para apresentar esta informação.
Certamente mantê-la quieta não é tudo o que você quer.
O olhar de Julia é mais frio quando cai em mim. Eu me pergunto se
Isabelle vê isso. Ela olha para Hildebrand e depois de volta para mim. Ela
lambe os lábios antes de falar.
— Peço que retire seu pedido de uma segunda autópsia. — diz ela.
Eu quero olhar para Isabelle. Ver o rosto dela. Mas eu não faço. E eu
quero sorrir o sorriso do vencedor. Mas eu não vou. Porque eu quis dizer o
que disse a Isabelle mais cedo. Não se trata de ganhar. Não pode haver
vencedor.
— Porque eu faria isso? — Eu pergunto.
Isabelle permanece visivelmente quieta. Eu me pergunto se Julia está
esperando que ela salte em sua defesa.
— Bem. — Julia diz, vacilando enquanto ela olha de mim para Isabelle
e Hildebrand. Tenho a sensação de que ela estava contando com Isabelle
para ficar do lado dela. — Não há sentido em nos arrastar por tudo isso, não
é? Atrasando o enterro. Fazendo as pessoas se perguntarem por quê.
Fazendo perguntas.
Eu dou de ombros. — Eu poderia dar a mínima.
— E o meu filho. Você dá a mínima para ele? — ela estala.
— Você? — Eu pergunto. Ela parece apropriadamente ofendida.
— Sr. St. James. — Hildebrand começa, se levantando. — Talvez
devêssemos deixar a pouca dignidade que o Sr. Bishop deixou intacta.
— Que dignidade seria essa? — Pergunto-lhe. — Ele morreu fodendo
uma puta enquanto sua suposta amada, a mãe de seu filho, estava em casa
aquecendo sua cama. Ou pelo menos é o que me dizem que devo acreditar.
— eu me dirijo a ela com esta última parte.
Hildebrand limpa a garganta. — Não há necessidade de crueldade, St.
James.
— Eu não precisava compartilhar essa informação. — Julia diz,
apelando para Isabelle. — Mas eu queria fazer um esforço. Pelo bem de
nossas famílias. Por Matty. — Ela se vira para mim. — Por Angelique.
Minha mandíbula aperta com a menção da minha filha. Eu
rapidamente considero algo. Acho que talvez seja uma boa ideia mandar
Angelique embora por um tempo. Até que isso termine. Até que Julia Bishop
não seja mais uma ameaça.
— Do que você tem medo? — Eu pergunto. — O que você acha que
será descoberto?
— Nada. É claro. É apenas uma perda de tempo. Eu gostaria de deixar
isso para trás de mim e do meu filho e começar de novo. Deus sabe que
Matty merece isso. Não é, Isabelle?
— Ele tem. — Isabelle diz e pega a mão de Julia. — Mas para que haja
paz entre nossas famílias e deve haver porque estamos unidos para melhor
ou para pior, todos nós, é melhor que Jericho faça sua segunda autópsia. E
quando nada for descoberto, então tudo ficará para trás. Todas as suspeitas
apagadas.
Julia olha para ela com um momento do que eu juro que é ódio em
seu rosto. Isabelle vê isso? Está lá e se foi em uma fração de segundo. Então
Julia sorri, acena com a cabeça.
— Você está certa, prima. Você tem razão.
Ela encontra meus olhos momentaneamente e me pergunto se ela vê
a pequena curva para cima do meu lábio. Isso é apenas para os olhos dela. A
autópsia está marcada para amanhã. E minha esposa está do meu lado.
Agora são vitórias. Especialmente esta última.
Aperto a mão de Isabelle.
CAPÍTULO TRINTA E SEIS
ISABELLE
Estou absorta em meus próprios pensamentos a caminho de casa e
quando voltamos, Jericho entra em seu escritório. Coloco um caderno e um
lápis na mochila, visto um suéter enorme e caminho até a capela.
Eu preciso ficar sozinha. Pensar.
Só tem uma coisa que não bate.
Uma vez que estou no cemitério, não posso evitar olhar para a lápide
de Nellie. A pá se foi e o solo não parece perturbado. Olho na direção de
onde vi o que pensei ser a ponta de um cigarro, mas o sol está brilhando e
não há ninguém aqui.
Entro na capela e recoloco a vela de chá na frente da foto de Christian.
Eu então me sento no banco da frente, descansando o caderno nos joelhos,
meus pés no assento. Eu puxo o suéter para mais perto. Há sempre um frio
aqui. Toda aquela pedra nunca aquecendo. Abro meu caderno e seguro meu
lápis, mas só consigo olhar para a página em branco enquanto penso.
Enquanto revejo o que aconteceu no escritório do Conselheiro Hildebrand
novamente.
O que Julia disse faz sentido. Talvez fosse tudo Carlton. Cabe.
Funcionaria. Ele contratou Danny Gibson para me machucar.
Não.
Não apenas me machucar, mas para me matar. Para garantir que a
herança não fosse para mim ou para qualquer filho que eu tivesse no futuro.
Christian pagou o preço mais alto por sua ganância. Não me sinto
triste pela perda de Carlton. Não sinto isso como uma perda. E eu não sei o
que isso diz sobre mim, mas é a verdade.
A forma como Carlton pagou Gibson. Usando a conta de Julia. O nome
dela. Ele poderia facilmente fazer isso. É absolutamente possível e mesmo
sem questionar, ainda estou aqui. Ainda tentando alinhar as coisas.
Há duas coisas sobre hoje que me fazem pensar.
Jericho alegou que Julia tinha ido ver Gerald Gibson, irmão de Danny,
na noite em que ela me deixou no teatro. Ele alegou que a van que quase
me atropelou estava em sua garagem.
Ele não trouxe isso hoje. Ele poderia ter confrontado Julia, mas não o
fez.
Então, isso significa que ele está mentindo? Que ele mentiu sobre
Gerald Gibson? Existe mesmo um Gerald Gibson?
Mas se Gerald Gibson existe e se Julia foi até ele depois de me ver no
teatro, então o que ele está dizendo é verdade. Porque ela alegou ter
descoberto a verdade sobre a conexão de Carlton com Danny Gibson no
último dia ou dois.
Se ela está mentindo sobre isso, então ela estava envolvida na morte
de Christian. No atentado contra minha vida. Porque não foi um acidente.
Acho que uma parte de mim sempre soube disso.
Eu balanço minha cabeça e rabisco em um canto da página. Ela e
Jericho têm uma coisa em comum. Ambos pensam que sou uma boa pessoa.
Mas eu tenho a sensação quando eles dizem que o que eles querem dizer é
que eu não sou muito inteligente. Porque eu sei o nível em que Jericho está
jogando. E se Julia está jogando no mesmo campo, bem, eu não sou nada
mais do que um peão para os dois. E o conhecimento dói.
A porta se abre então, me assustando, eu me viro para encontrar
Jericho exalando quando ele me vê. Ele sorri como se estivesse aliviado e eu
me sento, fecho o caderno.
— Aí está você. — diz ele.
— O que você acha? Que eu fugi?
Ele levanta o queixo apenas um fio de cabelo com o meu comentário e
entra, fechando a porta atrás dele.
— Com todos os guardas na propriedade, duvido que chegue ao
portão da frente.
Ele caminha até meu banco, levanta minhas pernas e se senta ao meu
lado. Ele está enganchando minhas pernas sobre seu colo e olhando para a
foto de Christian e a vela acesa no altar.
— Você quer fugir? — ele pergunta, me surpreendendo com a
pergunta.
Eu estudo seu perfil, a linha dura e intransigente de sua mandíbula. O
nariz reto. O pouco de cabelo grisalho em sua têmpora. Ele se vira para mim
e meu coração pula uma batida. Ele é tão bonito, especialmente quando ele
me deixa vê-lo. Quando ele me deixa ver em sua alma.
Meus olhos embaçam e eu balanço minha cabeça.
Eu quero que essa coisa entre nós seja verdade. Para ser real. Eu
quero que ele queira dizer o que ele disse. Que ele me quer. Não importa o
que. Eu quero que ele me escolha porque eu o escolhi. Ele é uma parte de
mim. Dentro de mim. Dentro do meu coração.
E ele pode quebrar o meu. Ele sabe o quão facilmente ele pode
quebrar o meu?
— Por que você não confrontou Julia sobre sua visita a Gerald Gibson?
— Eu pergunto.
— Por que você não fez isso? Essa é uma pergunta mais interessante,
você não acha?
Eu suspiro, girando para colocar meus pés no chão, para encarar a
pequena chama bruxuleante. — Não sei.
— Sim, você sabe. Eu subestimei você.
Eu me viro para ele. Ele sorri um sorriso cansado.
— A história dela era boa. — diz ele. — Acreditável. Ela é inteligente.
— Como você. — eu digo. — Eu não acho que sou tão inteligente
quanto qualquer um de vocês.
— Você é. E você é gentil, Isabelle. Isso é algo que nenhum de nós é.
— Mas eu não sou inteligente.
— Você é.
Eu dou de ombros. Não estou dizendo isso para ele sentir pena de
mim. Estou dizendo isso porque é a verdade.
— Isso significa que você acredita em mim sobre ela? — ele pergunta.
Olho para o caderno fechado no meu colo. Eu tive isso sempre. Eu
mantenho todos os meus cadernos com meus rabiscos aleatórios, notas,
poemas e qualquer outra coisa que me faça sentir.
Eu me viro para encará-lo. — O que acontece se sua autópsia não
revelar mais nada?
— Irá.
— E se isso não acontecer? E então?
Ele cerra a mandíbula, desvia o olhar.
— E se seu teste de DNA provar o que Julia afirma. Que Matty é filho
de Carlton e o legítimo herdeiro do trono do Bishop.
— Trono. — Ele bufa.
— O que você vai fazer, Jericho? O que acontece depois?
Ele suspira, vira-se para mim. — Vou mandar Angelique embora com
minha mãe e Dex. Você deveria entrar e dizer adeus. — Ele fala.
— Por quê? — Eu pergunto, de pé também. Surpresa com esta
reviravolta.
— Porque confio nos meus instintos.
— Por quanto tempo?
— Não sei. Até que isso aconteça. Até que Julia Bishop faça sua jogada.
— E se não houver nenhum movimento a ser feito?
— Existe, Isabelle. Você pode confiar em mim nisso. Há.
A porta se abre então, nós dois nos viramos para encontrar Leontine
na porta, uma expressão em seu rosto que eu não tinha visto antes. Ela está
corada e sem fôlego.
— O que é isso? — Jericho pergunta, instantaneamente em alerta
enquanto corre para ela.
Ela me olha por cima do ombro de uma forma que não entendo muito
bem. Não imediatamente. Embora eu nunca tenha lido muito bem sobre
Leontine, sei que ela quer o melhor para Jericho e Angelique. Achei que no
que dizia respeito a Angelique, ela sabia do meu amor por ela. Ela sabe que
queremos a mesma coisa. Jericho e eu, bem, somos mais complicados.
— Mãe? — Jericho pergunta, dando-lhe uma pequena sacudida.
Ela arrasta o olhar de mim e não diz nada. Percebo que ela deve estar
mostrando algo a ele porque Jericho olha para baixo. Há um momento de
silêncio pesado antes que ela finalmente fale enquanto eles se separam.
Jericho se vira para mim estudando o que quer que ele tenha tirado de suas
mãos.
— Angelique os encontrou. Ela queria surpreender Isabelle com um
desenho que ela havia feito. Ela estava escondendo os desenhos no quarto
de Isabelle. Eu não percebi ou não a teria permitido entrar lá, é claro. Mas
eles estavam em seu estojo de violino. Escondidos no bolso.
Sinto o chão sob meus pés tremer ou talvez sejam meus joelhos
balançando quando uma onda de frio me faz estremecer e suar ao mesmo
tempo.
Eu sei o que ela encontrou.
E eu posso adivinhar o que eles estão pensando.
Quando Jericho arrasta seu olhar dos pacotes em sua mão para mim,
sinto-me dar um passo para trás. Minha boca se abre. Eu quero explicar.
Dizer a ele que nunca tive a intenção de usá-los. Dizer a ele que tinha me
esquecido deles. Mas nenhum som vem. Apenas minha boca abrindo e
fechando como um peixe fora d’água.
— Vai. — Sua voz é baixa e sombria. É como ele soa quando está mais
bravo.
— Eu… — eu começo, mas nada mais vem.
— Eu disse vá. — O comando é para Leontine, mas ele está olhando
para mim.
— Devo fazer Angelique esperar? Ela vai querer dizer adeus…
— Invente uma desculpa. Eu não vou deixá-la perto da minha filha.
Minhas mãos estão úmidas quando o caderno e o lápis caem no chão.
Uma respiração audível vem de mim. O som do pavor.
— Jericho. — Leontine começa. — Talvez…
— Saia!
Ela olha uma vez para mim, em seguida, sai correndo. Deixando-me
sozinha com ele. Meu marido. Meu diabo.
— Eu não estava… eu esqueci. — Eu balanço minha cabeça, empurro
uma mão trêmula no meu cabelo. Eu engulo em seco para ganhar algum
controle sobre minhas cordas vocais. — Jericho…
Ele está em cima de mim em um instante, a mão em volta da minha
garganta, me empurrando para trás, me dobrando em um ângulo doloroso
sobre o altar. Eu gritaria se pudesse, mas não consigo inalar ar. Agarro seu
antebraço, mas ele é muito forte e muito zangado.
— Sua maldita mentirosa! — Ele traz o punho com as pílulas na frente
do meu rosto, esmagando-as, a embalagem dobrando, pílulas saindo de suas
embalagens. — Sua maldita mentirosa!
Eu dou um tapa em seu rosto, arranhando-o. Ele afrouxa seu aperto na
minha garganta o suficiente para eu engolir o ar. Ele captura meu pulso para
parar meu ataque e se inclina sobre mim, o rosto tão perto do meu que
sinto sua respiração. Sinto a raiva em seus olhos, o abismo atrás deles.
— Você teria matado meu bebê?
— Não. — eu resmungo, ofegante. — Não! — Se ele me deixasse
explicar. Se ele me deixasse contar o que aconteceu. Eu me esqueci delas. É
verdade. Eu até esqueci que elas estavam lá.
— Você tomou alguma?
— Não posso…
— Você tomou alguma! — ele ruge.
Tento balançar a cabeça, mas não consigo. Eu também não posso falar
para respondê-lo. Eu acho que é isso. Acho que ele vai me matar. Ele
percebe isso? Será que ele percebe o quão forte ele é? Com que força ele
está apertando?
Mas assim que minha visão começa a desaparecer, ele está longe de
mim, sua atenção desviada. Eu caio de joelhos e ofego para respirar,
segurando minha garganta enquanto tento respirar. Tento falar. Para dizer a
ele.
— Você vai matá-la!
Eu olho para cima para ver por que ele me soltou. Para ver quem
salvou minha vida. Ezekiel. Os irmãos estão presos em um turbilhão de
punhos e fúria enquanto eu assisto, impotente, indefesa.
— Ela tentou matar meu bebê! — Jericho ruge.
— Não! — Eu grito. Ou tento gritar, mas minha garganta está muito
ferida e sai um sussurro. Este é o meu bebê também. Nosso bebê. Eu não
faria. Eu simplesmente as esqueci. Esqueci tudo sobre essas pílulas.
Em um instante Jericho está de pé sobre mim novamente e eu me
arrasto para trás na minha bunda. Ele se agacha, agarra um punhado de
cabelo e puxa minha cabeça para trás.
— Onde você as conseguiu?
— Jericho! — Zeke tenta desalojá-lo, mas Jericho segura firme.
— Onde?
— Você vai machucá-la, seu idiota do caralho! — Ele grita, mas Jericho
só tem olhos para mim. Só tem raiva de mim. — O bebê, Jericho. O bebê.
Pense.
Isso o faz parar. Faz com que sua mão afrouxe um pouco. Estou
soluçando. Apavorada e soluçando.
— Eu não faria. — eu começo, mas não consigo respirar o suficiente
para dizer as palavras. — Eu… — Um soluço me faz soluçar.
— Deixe-a ir, Jericho. Deixe-a ir e fique sob controle.
— Eu não… eu não machucaria…
Ele me solta, se endireita para ficar de pé. Ambos olham para mim,
Ezekiel com preocupação, Jericho com ódio.
— Você tem que acreditar em mim. — eu tento. — Eu não as peguei.
— Levante! — Comandos de Jericho.
— Juro.
— Levante! — ele ruge, agarrando meu cabelo e me arrastando para
os meus pés. Eu grito desta vez. Encontro fôlego e voz suficiente para gritar
enquanto ele me arrasta para fora da capela, pela floresta e para dentro da
casa. Tudo é um borrão enquanto tento acompanhar, enquanto tento
implorar para que ele pare. Para me ouvir. Para me soltar. Mas ele não vai
ouvir. Ele não pode.
Quando ele destrava aquela porta de aço, acho que vai me jogar
escada abaixo. Em vez disso, ele agarra meu braço e me pega enquanto eu
tropeço uma, duas vezes, me arrastando pelo corredor para longe da sala de
suicídio. Para aquela em que passei minha primeira noite nesta casa. Ele me
empurra para a cama com suas molas rangentes e se afasta, a raiva mal
controlada enquanto suas mãos abrem e fecham. Eu sei que se eu não
estivesse grávida, ele me mataria. Eu sei disso. Volto para o canto mais
distante que posso e agarro os degraus da cabeceira, soluçando.
— Você vai ficar aqui. Você passará o resto de seus dias miseráveis
aqui. Sua maldita mentirosa. Sua maldita mentirosa Bishop! E uma vez que
você me der meu bebê, você seguirá Nellie Bishop. Eu vou enterrá-la depois
que eu espremer sua respiração, sua puta enganadora!
Meus lábios tremem enquanto as lágrimas escorrem pelo meu rosto.
Minha cabeça dói e meu coração dói com suas palavras.
Ele se aproxima novamente e eu grito mais uma vez.
— Pare com isso. Pare com a porra das lágrimas. Você é uma
mentirosa. Você é uma Bishop. Sei a verdade. Eu conheço você. E não serei
enganado novamente. Não tão inteligente quanto nós? — ele bufa. — Você
com seu ato doce e inocente. Você é a pior deles!
Ele me alcança, mas Ezekiel o agarra por trás e o arrasta para longe.
Eles estão fora da sala e no corredor e tudo o que ouço são as palavras
pense e bebê. É Ezekiel quem fecha a porta com um olhar para mim. Acho
que é Ezekiel quem a tranca. Mas nesse ponto, não importa. Porque acabou.
Estou trancada e o quarto está tão escuro, mas não consigo nem me mexer
para acender a luz. Não consigo parar de tremer e não consigo fazer minhas
pernas funcionarem. Enquanto todo o som desaparece e o ar se acalma e eu
gostaria que o fantasma de Zoë estivesse aqui para me fazer companhia. Eu
gostaria que o fantasma de Zoë estivesse aqui para que eu não ficasse tão
sozinha. Tanto medo.
CAPÍTULO TRINTA E SETE
JERICHO
— Você não pode deixá-la lá embaixo.
Desligo a ligação e olho para meu irmão. — Já ouviu falar em bater? —
Ele tem uma contusão ao longo de sua têmpora. Eu tenho uma igual e um
corte na ponte do meu nariz para rivalizar com o que ele tem na bochecha.
— Estou falando sério, Jericho. — Ele se senta. — Ela está grávida.
Você não quer colocar o bebê em perigo.
— Ela vai ficar bem. Ela tem abrigo. Vou pegar um cobertor para ela.
Ela vai ter comida. O que mais ela precisa?
— Luz solar? Ar fresco? Não se sentir aterrorizada?
Coloco meus antebraços na mesa e me inclino em direção a ele. — Ela
teria matado meu bebê. Como eu sei que ela não tentou? Talvez conseguiu?
Barnes fará um exame de sangue para que tenhamos certeza.
— Você viu o rosto dela quando a estava atacando?
Sento-me, levanto o queixo e mantenho a boca fechada. Porque sim,
eu vi o rosto dela. Na verdade, não consigo tirar isso da cabeça. Isso ou o
jeito que minha mão enrolou em sua garganta. O pânico em seus olhos
quando eu apertei.
Quão perto cheguei de matá-la.
— Ela está mais segura lá embaixo. — digo ao meu irmão, girando na
cadeira para me levantar e me servir um uísque do aparador.
— Segura de você?
Eu bebo, enfio a mão no meu cabelo, considero outro.
— Você não teve o suficiente? — ele pergunta.
Eu bufo, sirvo outro e olho para ele enquanto engulo.
Ele balança a cabeça. — Pelo menos me dê um.
— Esse é o espírito. — eu digo, servindo-lhe um, em seguida,
retomando o meu lugar atrás da mesa.
— Pelo menos fale com ela. Ouça o lado dela e decida no que você
acredita.
— Ela me traiu.
— Você não sabe disso.
— Sim. Tenho certeza que ela pegou as pílulas de sua prima. O que é
em si uma traição. Acho que isso aconteceu na noite em que se
encontraram no show. Inferno, o que eu sei? Talvez tenha sido planejado o
tempo todo.
— Você conhece Isabelle, não é? Pelo menos um pouco?
Eu sorrio, bebo um gole de uísque. — Ela me enganou. Como qualquer
Bishop, ela é uma boa mentirosa.
— Você não acredita nisso. Eu vejo isso em seu rosto.
— Então você precisa pegar alguns óculos.
Zeke suspira. — Olha, ou você fala com ela ou eu vou lá e vou tirá-la eu
mesmo.
— Você não vai chegar perto da minha esposa.
— Fale com ela. Você a deixou suar o suficiente.
— Vai tirar você das minhas costas?
Ele considera, acena.
— Muito bem. — Ela me traiu. Depois de tudo o que conversamos,
tudo o que ela pediu, ela me traiu. Fez-me de idiota. E o pensamento disso
aperta algo dentro do meu intestino. Dentro do meu peito. Torna difícil
respirar.
— Falei com algumas pessoas da The Cat House. — diz Zeke.
— E?
— Carlton Bishop estava bem. Um pouco indisposto nos dias
anteriores, mas ele disse que estava se sentindo melhor. Bebia muito. E
quando a atividade começou, ele caiu morto.
— Ele estava almoçando com Joseph Sawyer ontem. Sawyer disse que
ele parecia cinza. Achou que ele estava lidando com um resfriado forte.
— Você instruiu seu homem fazendo a autópsia, o que procurar? A
menos que ele conheça os sinais, ele não encontrará nada.
— Contei a ele o que descobri. Contei a ele sobre a propensão que as
pessoas da Sociedade têm com venenos. Ele é bom. Veio altamente
recomendado pelo médico que salvou a vida de Santiago De La Rosa depois
que ele foi envenenado.
Zeke acena com a cabeça.
— Deve ter resultados preliminares amanhã.
— Angelique ficou muito chateada por não poder se despedir de
Isabelle.
Merda. Eu empurro a mão no meu cabelo novamente. Que bagunça
isso é. Que merda de desastre. — Ela vai ter que superar isso.
— Ela a ama, você sabe. Angelique ama Isabelle. Ela é a coisa mais
próxima de uma mãe que ela já teve.
Eu fecho meus olhos. O pensamento dói porque uma parte de mim
pensou que Isabelle seria algo assim para ela. Eu nunca quis que ela
substituísse Kimberly, mas ela estava rapidamente se tornando alguém em
quem eu podia confiar com Angelique. Alguém que a amava tanto quanto
eu. Tanto quanto Kimberly teria. Isso também era mentira? Ela estava
atuando então também?
Zeke termina sua bebida e se levanta. — Desça as escadas. Fale com
ela. Tire-a do porão, irmão. Estou lhe dizendo, você está errado sobre ela. E
você não quer descobrir isso tarde demais.
Eu aceno, coloco um cotovelo na mesa e coloco minha testa na minha
mão. Que show de merda.
Alguns minutos depois que ele se foi, alguém bate na minha porta.
— Sim?
— É Catherine senhor. — diz Catherine e abre uma fresta na porta. —
O quarto está pronto.
Eu fico de pé.
Ela hesita.
— O que é isso? — Eu pergunto.
— Tem certeza de que quer as coisas assim? Ela é sua esposa. Ela vai
ser a mãe do seu filho.
Eu fecho meus olhos.
— Me desculpe senhor. Apenas… Não me sentiria bem se eu não
falasse sobre isso. Eu odeio ver algo terrível acontecer. Isabelle é uma boa
menina.
— Eu não pago para você falar, pago?
— Não senhor. — Suas bochechas ficam vermelhas e ela abaixa a
cabeça, sai do escritório.
Porra.
Eu me levanto, vou até a porta. — Catherine. Espere.
Ela enxuga o rosto com o avental antes de se virar, mas vejo como
seus olhos estão vermelhos. Deus. Eu sou um idiota.
— Eu sinto muito. Eu não quis dizer isso.
Ela acena. Tenta sorrir. O que minha própria equipe deve pensar que
eu sou? Eu sei a resposta para isso. Isabelle já disse isso com bastante
frequência. Eu sou um demônio. Satanás encarnado.
— Você pode trazer um pouco de comida para ela, por favor.
— É claro. Vou aquecer uma sopa para ela. Ela gosta desses bolinhos.
Fica pedindo por eles.
Por que eu não sabia disso? — Obrigado.
Catherine desaparece em direção à cozinha, ando pelo corredor em
direção ao porão. Enfio a chave na fechadura, abro a porta pesada e começo
a descer, ainda sem saber o que vou fazer.
CAPÍTULO TRINTA E OITO
JERICHO
Ela esteve aqui a tarde inteira. Destranco a porta do quarto e a abro
para encontrá-la deitada na cama, dormindo. Eu tomo um momento para
observá-la. Ela é pequena, enrolada em si mesma sob o suéter enorme que
ela usa. Seu cabelo está emaranhado em seu rosto. Ela deve ter chorado até
dormir.
É preciso tudo o que tenho para me fortalecer contra ela. Ela parece
tão inocente. Tão incapaz de fazer o que ela fez.
Ela faz um som enquanto eu assisto. Sua testa enruga. Empurro o
cabelo que está grudado em seu rosto para longe. Ela está suando.
Digo o nome dela baixinho, mas ela não acorda. Ela apenas faz aquele
som novamente. Como se ela estivesse lutando contra algo. Alguém.
Danny Gibson vem à mente. Danny Gibson em cima dela. E eu me
lembro do que ela me disse. Como seu pesadelo não é Christian sendo
assassinado, mas o quase estupro de Gibson. Lembro-me de como ela
descreveu o que sentiu em seu pesadelo anos depois.
— Isabelle. — eu digo mais alto, ela rola de costas. Ela está gemendo
agora, é como um som de lamento ininterrupto.
— Acorda Isabelle. — Eu coloco minhas mãos em seus ombros, aperto.
— Acorde.
Ela pisca rapidamente, mas então suas mãos vêm para meus braços e
ela está tentando me empurrar. Ela acha que eu sou ele? Ela está vendo o
rosto dele?
— Isabelle, acorde. Você está tendo um pesadelo. Isabelle! — Dou-lhe
uma sacudida forte e a solto quando ela se levanta, sugando uma respiração
ofegante, as mãos na frente dela como se para afastar algo ou alguém.
Eu pego seus braços, paro o impulso. Ela leva um longo minuto para
processar onde ela está. Para lembrar o que aconteceu. Quando ela olha
para mim, a mesma expressão de antes escurece suas feições. Lembro-me
de seu rosto quando eu tinha minhas mãos em volta do seu pescoço.
Quando eu estava sufocando ela. Mas eu empurro a culpa para longe. Ela
tinha essas pílulas. Ela pode ter levado algumas delas. Pelo que sei, ela já
abortou.
Mas então seu rosto suaviza, sua testa franze e ela me abraça.
E isso me tira completamente do momento. Fora da minha cabeça.
— Você voltou para mim. — diz ela contra o meu pescoço, lágrimas
frescas molhadas na minha pele.
Eu não sei o que fazer quando sinto seu corpo se render contra o meu,
moldando-se ao meu. Ela me abraça mais forte, puxando-se para mais
perto, repetindo as mesmas palavras. Meus braços se movem por vontade
própria e a envolvem. Instinto? Não. Mais do que isso.
Querer.
Precisar.
Eu a seguro e tento processar o que diabos está acontecendo. O que
eu acredito. O que é verdade versus o que eu quero que seja verdade.
— Eu não tomei nenhuma. Eu nunca pretendi. Eu deveria tê-las jogado
no vaso sanitário na noite em que ela as deu para mim. Eu simplesmente
esqueci delas. Tanta coisa aconteceu e eu esqueci.
Ela recua e olha para mim com aqueles grandes e tristes olhos azuis.
Como vidro quebrado.
Cacos de vidro cortante e afiado.
Ela me sente endurecer. Eu vejo isso nos olhos dela. Veja na forma
como sua testa franze, a maneira como ela se enrola em si mesma.
— Mas não foi por isso que você voltou, foi? — Ela abraça seus braços
em torno de si mesma protetoramente.
— Não.
— O que você quer então? — Ela estremece, procura o suéter que
escorregou dela.
Eu me levanto, empurro minhas mãos no meu cabelo.
— Eu não as peguei. — ela começa como se ainda estivéssemos tendo
essa conversa. — Eu nunca iria. Você tem que acreditar em mim. Eu não
machucaria nosso bebê. Eu nunca faria isso.
Leva tudo que eu tenho para engolir o nó na minha garganta. Para
endurecer meu coração. Porque quando vejo o olhar em seus olhos, fode
comigo. Isso me faz querer tomá-la em meus braços, abraçá-la e acreditar
nela.
Ela é uma Bishop. Lembre-se disso.
— Pare de falar e levante-se.
— Por favor, Jericho, você tem que acreditar em mim. Por favor.
— Eu disse para parar de falar e se levantar. Eu vou amordaçar você se
você não calar a boca.
— Por que você está sendo assim?
— Eu não vou cair nas suas lágrimas. Levanta. Última chance.
Ela desliza pela cama e se levanta, empurrando os braços em seu
suéter.
— Anda.
Ela caminha na minha frente até o quarto dela, onde uma vez que ela
está dentro, ela para. Fecho a porta atrás de nós e a observo enquanto ela
olha ao redor. Toma o estado das coisas. Ela se vira para mim.
— Onde estão minhas coisas?
— Você não vai precisar delas. Mas pensei que este quarto seria mais
confortável do que o porão, considerando a criança.
O quarto está despojado. Apenas sua cama permanece. Um
travesseiro. Sem livros. Nenhuma roupa além do essencial. Seu violino. Essa
é a única coisa que permitirei para seu conforto.
Ela testa a porta entre nossos quartos. Está trancada. Ela não é mais
bem-vinda na minha cama.
Sobre a mesa está o estojo do violino. Ela abre, exala em alívio. Ela o
toca, então se vira para mim e vejo uma pequena faísca de esperança em
seus olhos.
— Você pediu isso? — ela pergunta, gesticulando ao redor do quarto.
Eu concordo.
— E isso também? — ela pergunta sobre o violino.
— Sim.
Ela caminha em minha direção. Eu fico imóvel como uma pedra sem
saber o que ela vai fazer. Quando ela estende a mão para tocar minha
bochecha, nós dois vacilamos com a faísca da eletricidade.
— Então há esperança. — ela diz e eu estou mais confuso do que eu já
estive na minha vida.
Ela fica na ponta dos pés e toca seus lábios nos meus. Eu não
respondo. Eu não a beijo de volta. Mas também não a afasto. Acho que isso
a encoraja porque ela me beija de novo. Mais tempo desta vez, segurando
meu rosto com as duas mãos.
Eu tomo seu lábio inferior entre meus dentes, serpenteando minha
mão por suas costas e em seu cabelo para mantê-la imóvel enquanto eu
mordo, arrancando um grito dela. Eu gosto de cobre do sangue.
Ela tenta recuar, mas eu a mantenho perto e olho para ela. — Você
quer ser fodida? É disso que se trata?
Sua boca se abre, mas antes que ela possa falar, eu fecho a minha
sobre ela, levando-a para a cama. Eu a giro e a seguro de volta no meu peito
enquanto deslizo uma mão para baixo para desabotoar o botão e o zíper de
sua calça jeans. Dobrando-a sobre o pé da cama, empurro seu jeans e
calcinha para baixo.
— Jericho…
— Fique. — Eu coloco meu joelho em suas costas para prendê-la e
desfaço meu cinto, minha calça.
Ela vira a cabeça para assistir e não luta comigo. Eu agarro sua bunda e
levanto seus quadris um pouco, abrindo-a para vê-la. Toda ela.
Não sou gentil quando a tomo. Pego o que é meu.
Isabelle engasga, agarra o cobertor, seu corpo enrijece.
— Você quer ser fodida? — Eu repito, empurrando dentro dela. —
Você acha que pode virar minha cabeça? Eu não sou tão simples assim, mas
vou obrigá-la apenas a tirar o que eu quero de você.
Eu afasto seus joelhos e a fodo com força, forçando a respiração dela
com cada impulso, deitando-me sobre ela enquanto o suor se acumula ao
longo da minha testa.
Ela tenta virar a cabeça, mas eu agarro um punhado de cabelo para
impedi-la. Eu não quero os olhos dela em mim. Não serei capaz de fazer isso
se eu vir os olhos dela.
— Não assim. — ela diz. — Por favor.
Eu mordo a curva de seu pescoço e coloco minha bochecha na dela
enquanto me aproximo do final. Ela está encontrando meus impulsos, os
braços dobrados para trás para que ela possa me segurar.
— Por favor, Jericho. Beije-me. Por favor, me beije.
— Porra. — Eu inclino a cabeça para trás, beijando o canto de sua
boca. Quando eu afrouxo meu aperto em seu cabelo, ela se vira para me
beijar como ela quer e isso me leva ao limite. Essa é a coisa que me faz
gemer quando me libero, dando a ela todo o meu peso. Eu gasto minha
semente antes de deslizarmos de joelhos no chão, eu apertando suas costas,
ofegante. Ela se virando para que ela esteja enrolada em mim.
— Eu te amo. — ela sussurra em meu peito, meu pescoço. Suas mãos
no meu rosto. — Você sabe que eu te amo? Diabo ou não, St. James ou não,
bebê ou não, eu te amo.
Eu olho para seu rosto sério, seus olhos enormes, pequenas mãos
segurando em mim como se estivesse com medo de me perder.
— E eu nunca machucaria nosso bebê. Como posso machucar um
pedaço de você?
Ela sorri um sorriso pequeno e triste. Eu tento processar suas palavras,
uma parte de mim querendo ver as mentiras. A mentirosa. Mas eu não. Eu
vejo Isabelle. Vejo a Isabelle pela qual meu próprio coração está ficando
cada vez mais terno. E eu quero acreditar nela como nunca quis acreditar
em nada antes.
— Mas você sabe disso. — ela diz. — Eu sei que você faz. Você não vai
me trancar aqui. Você não vai.
Eu fecho meus olhos. Forço o rosto dela da minha mente. Lembro-me
das pílulas. Lembro-me da minha raiva. Mas está cada vez mais difícil. Eu me
liberto dela e fico de pé, fechando minha calça, deixando-a no chão com seu
jeans enrolado em torno de seus tornozelos.
— Jericho?
Merda. Eu preciso pensar. Eu dou um passo para a porta. Paro. Volto
para ela.
— Era o mesmo? — Eu pergunto, sem saber por que me importo.
— O mesmo? — Ela está confusa.
— O pesadelo. Andar de baixo. Foi Gibson?
Ela pisca, sua expressão mudando, a preocupação marcando uma linha
fina no espaço entre suas sobrancelhas. Ela puxa os joelhos para cima,
envolve os braços ao redor deles e balança a cabeça, desviando o olhar para
baixo.
— O que foi então?
Ela leva um minuto antes que ela responda, posso ver o que quer que
a tenha aterrorizado.
— Diga-me. — eu empurro.
Ela olha de volta para mim. — A sepultura. O lugar ao lado de Nellie.
Foi desenterrado. Estava pronto para mim.
Porra.
Jesus.
Eu empurro minhas mãos no meu cabelo. Aperto meus olhos
fechados.
Porra!
— É apenas um sonho, não é? — ela pergunta, a voz baixa. — Você
não vai fazer isso comigo, vai?
Eu olho para ela. Não posso evitar. É um erro embora. Eu sei o quão
fodido estou quando meu peito aperta e não consigo respirar. Quando
preciso de tudo, tenho que me afastar dela. Para sair desse quarto. Porque
depois de tudo isso, tudo o que aconteceu, não posso fazer isso com ela.
Nem mesmo perto. Eu mataria qualquer um que tentasse. Porque eu a amo
também. Eu a amo pra caralho.
CAPÍTULO TRINTA E NOVE
ISABELLE
Eu vejo o espaço vazio onde ele estava. Ouço a fechadura girar na
porta. Estremeço, olhando para mim mesma. Meu jeans e calcinha ao redor
dos meus tornozelos, minha parte interna das coxas e entre as minhas
pernas molhadas com ele.
Meu peito dói e mesmo que meu estômago ronque de fome, acho que
não conseguiria comer agora.
Eu me forço a ficar de pé, tiro o jeans e a calcinha e entro no banheiro.
Meu olhar pousa no violino e me lembro de que há esperança no fato de
que ele deixou meu violino. Se ele me odiasse, ele teria tirado isso de mim.
Se ele me odiasse, ele teria quebrado em pedaços e deixado os pedaços
para eu encontrar.
Entro no banheiro e fecho a porta atrás de mim, tiro o resto das
minhas coisas e ligo o chuveiro. Eu preciso me aquecer. Estou com frio por
dentro. Passo abaixo do fluxo e fico lá por uma eternidade.
Minha mente está trabalhando duro para processar o que acabou de
acontecer. Eu disse a ele que o amo e estou dolorosamente ciente de que
ele não disse as palavras de volta. Que ele parecia perdido. Confuso. Nem
um pouco o diabo que eu aprendi a amar.
Eu me movo através dos movimentos de lavar meu cabelo, meu corpo.
Olho para a minha barriga. Ainda está plana. Eu coloco as duas mãos sobre
ela. Eu quis dizer o que eu disse. Eu nunca machucaria esse bebê. E o fato de
ser dele, de ser um pedaço dele, só me faz sentir ainda mais ternura por ele
ou ela. Acho que vai ficar tudo bem. Tem que ser. Vai levar tempo para ele
confiar em mim, eu entendo isso. Eu tenho. Mas vamos ficar bem. Ele e eu.
E seremos uma família, todos nós.
Estranho que não consigo imaginar uma vida sem Jericho ou Angelique
nela. Tudo o que sinto com o pensamento é vazio.
Minha mente vagueia para Julia. De como ela me deu as pílulas para
que eu abortasse essa criança. Vaga para o que ela nos contou no escritório
de Hildebrand sobre Carlton e seu papel na morte de Christian. Ela parecia
tão séria. Muito chateada.
Mas ela nunca mencionou Gerald Gibson. E nem Jericho. É a única
peça que me dá uma pausa.
Quando desligo a água, ouço um zumbido no outro quarto. Eu enrolo
uma toalha em volta de mim. É Catherine. Eu sorrio e entro no quarto para
encontrá-la colocando uma mesa para mim. Bem, é uma mesa de apoio que
ela colocou na janela. Ela está arrumando uma única margarida Gérbera
vermelha brilhante em um pequeno vaso de vidro.
— Aí está você, querida. — diz ela quando me vê. — Espero que você
não se importe por eu ter entrado enquanto você estava tomando banho. A
sopa está quente e pensei que você estaria com fome. — Ela está tentando
sorrir, mas sua expressão vacila. Ela sabe o que ele fez. Onde eu estive.
Tenho certeza que toda a casa sabe.
Eu me sinto corar, envergonhada com isso. Do tratamento dele
comigo. Da minha impotência.
— Obrigada. — eu digo, empurrando as emoções. — Estou sempre
com fome de sua sopa e bolinhos.
— Eu trouxe extra. — diz ela. — Você precisa comer por dois agora. E
há um pouco de suco e uma pequena sobremesa. — Ela levanta a tampa de
um prato com um pedaço de bolo de chocolate.
— Pequena? — Eu pergunto, movendo-me em direção à mesa.
— Bem, como eu disse, é para dois e precisamos colocar um pouco de
carne em seus ossos. Você é muito magra, se assim posso dizer.
— Eu simplesmente não me sinto bem. — eu digo enquanto ela abre
uma gaveta da cômoda e tira algumas roupas para mim. Ela é quase como
uma avó para mim. Sempre gentil e cuidando de mim como se ela se
importasse comigo.
— Agora você se veste e senta para comer. Se quiser mais alguma
coisa, é só me avisar, tudo bem?
— Isso é perfeito, muito obrigada, Catherine.
Ela sorri, parece que quer dizer mais, mas então acena com a cabeça e
sai. Eu ouço a fechadura girar. Suspirando, me visto e me sento para comer.
Observo as luzes se apagarem no pátio, a piscina iluminada, as folhas
vermelhas se espalhando na brisa fresca. O outono chegou corretamente.
Evito olhar para a floresta. Estou nervosa de ver aquela luz de cigarro
de novo, embora eu saiba que seria um trecho daqui de cima. Eu deveria
contar a Jericho. Eu vou na próxima vez que eu vê-lo.
Mas não o vejo pelos próximos três dias. Catherine entrega minhas
refeições, três por dia, mas além dela não vejo ninguém. Eu nem sei se
Jericho dorme no quarto dele, é tão quieto, mas lembro de que é à prova de
som. Mesmo quando pressiono o ouvido na porta, não ouço nada.
E eu sinto falta dele. Quando pergunto a Catherine se ele está em
casa, ela me dá respostas vagas e vejo que está desconfortável, então parei
de perguntar. Eu me pergunto quando será o funeral de Carlton ou se já foi
e já passou. Pergunto-me sobre a autópsia e o teste de DNA para Matty. Ele
é mesmo filho de Carlton?
Enquanto me sento à janela e toco meu violino, penso em Christian.
Talvez eu não possa ir ao túmulo dele no aniversário de sua morte este ano.
Será a primeira vez desde que ele morreu se isso acontecer.
É quando estou pensando nisso, que ouço a fechadura da minha porta
seguida por uma batida. Eu me viro, surpresa. Acabei de almoçar, então não
é Catherine.
— Isabelle? — Ezekiel pergunta, batendo novamente.
— Entre. — eu digo, de pé.
Ele entra no quarto, observa os arredores. Parece tão nu. Nada nas
paredes, nas estantes. Como uma prisão. Afinal, é uma prisão.
Eu me movo para colocar o violino em seu estojo. É bom que ele veja.
Porque isso não está certo. Não mereço ficar presa aqui e fico feliz que
Ezekiel seja testemunha.
Ele limpa a garganta. — Como você está indo?
Fecho a mala e me viro para ele, encolhendo os ombros. — Por quanto
tempo mais ele vai me manter aqui?
Sua mandíbula fica tensa. Eles têm essas pequenas falas, os irmãos. Se
você observá-los de perto o suficiente, você os conhecerá. Eles são tão
semelhantes em alguns de seus traços.
— Eu não falo com ele há alguns dias. — diz ele. — Ele tem muita coisa
na cabeça.
— A autópsia ou o teste de DNA?
— Ambos.
— O que está acontecendo? Carlton foi enterrado?
— O serviço é esta noite.
— Então a autópsia acabou?
Ele concorda.
— O resultado?
— Ainda não sei disso.
— Você me diria se o fizesse?
— Eu não tenho certeza, honestamente. — ele responde depois de um
momento, eu aprecio a honestidade. — Você tem uma visita, Isabelle.
— Uma visita?
— Megs. Do café, acredito.
— Megs está aqui?
Ele concorda. — Ela estava preocupada com você. Diz que vocês
costumam se virem com mais frequência nesta época do ano.
— É quase o aniversário da morte de Christian.
— Eu sei. Venha. — ele diz, apontando para a porta aberta.
— Jericho sabe?
— Não se preocupe com meu irmão. Eu vou cuidar dele.
Lembro-me de como ele lutou com ele na capela. Ele provavelmente
salvou minha vida. — Obrigada pelo que você fez na capela. — eu digo.
Ele abre a boca, depois fecha e apenas assente. — Venha, Isabelle. Sua
amiga está esperando.
— Obrigada. — eu digo novamente e saio para o corredor, olhando ao
redor da casa como se fosse estranha para mim. Eu me pergunto se é assim
que os prisioneiros se sentem quando são libertados. Mas então eu me
lembro de que foram apenas alguns dias. Jericho virá ao redor. Ele tem que.
— Ela está na biblioteca. — diz ele quando chegamos ao patamar. Já
posso ouvir Catherine e Megs conversando pela porta aberta. Quando chego
lá, sorrio largamente ao ver minha amiga.
— Megs! — Eu corro para ela, a abraço.
Catherine se endireita de onde ela está arrumando tudo para o chá e
sorri também, então silenciosamente se retira da sala e fecha a porta.
— Ei. — Megs diz, recuando. Percebo que estou chorando quando ela
enxuga meu rosto. — O que está acontecendo? Porque você está chorando?
Eu me endireito, limpo as costas das minhas mãos sobre os olhos. — É
bom ver você de novo. Estou tão feliz que você veio.
— Por que você não entrou em contato? Você não atende o telefone.
Vai direto para o correio de voz. Você está desaparecida, Isabelle.
Suspiro e nos sentamos no sofá. Percebo a caixa de doces e a abro,
mas mesmo o lindo bolo dentro não provoca muita reação. — Eu não tenho
mais meu telefone. — eu digo, sem olhar para ela, porque como eu explico
isso?
— Você o perdeu ou algo assim? Ou obteve um novo número que
você não está compartilhando comigo? — ela provoca.
Decido que não vou mentir para ela. Não vou encobrir esta situação
estranha. — Ele pegou. Ele não me deu um novo.
Suas sobrancelhas se juntam enquanto ela processa isso. — O que
você quer dizer? — ela pergunta lentamente.
Eu corto dois pedaços de bolo e os coloco nos pratos que Catherine
deixou, mas nenhum de nós os pega.
— Minha situação agora é… estranha. Jericho é… — Eu respiro fundo e
considero como dizer a ela. Mas não preciso porque ela fala em seguida e
estou surpresa.
— Julia não estava mentindo, estava?
— Julia?
Ela olha para a porta fechada e se aproxima. — Ela veio me ver a
alguns dias. Ela disse que estava preocupada com você. Disse que seu
marido não deixava você falar com ela. Que você é uma prisioneira nesta
casa. Isso é verdade, Isabelle?
Meu rosto fica vermelho de calor e mais lágrimas ameaçam, mas de
alguma forma, eu as seguro. Meu coração dispara. Estou envergonhada e
quero que ela entenda. É demais.
— Querida, o que diabos está acontecendo? — Ela pega o telefone. —
Eu posso chamar a porra da polícia aqui agora.
Balanço a cabeça, sentindo o nó na garganta que preciso engolir antes
de poder formar palavras.
— Há muita história entre nossas famílias, Megs. E Jericho… A polícia
não poderá fazer nada.
— O que você quer dizer com eles não serão capazes de fazer nada?
— Nada. É… — Eu respiro fundo. O que eu faço, conto a ela sobre a
Sociedade? Sobre o poder que eles exercem. Sobre as estranhas tradições e
rituais. Ela vai pensar que eu enlouqueci.
— Não é nada se ele te trancou aqui. Que diabos, Isabelle? Eu não
gosto de Julia. — ela diz, de pé, andando. — Mas foda-se. Ela estava dizendo
a verdade, não estava?
— Eu não sei o que ela disse a você, mas tenho certeza que pelo
menos uma parte é verdade.
— Merda. — Ela se senta e eu tenho uma ideia. Porque há uma coisa
em que Megs pode ajudar.
— Ouça, você pode fazer algo por mim?
— Tudo. O que eu posso fazer?
— Você pode descobrir se há um homem chamado Gerald Gibson que
mora em algum lugar perto daqui, eu acho? Não tenho certeza exatamente
onde. Mas Nova Orleans. Ou perto dela. Ele teria um irmão chamado Danny
Gibson. — Dizer o nome dele tira algo de mim e é um momento antes que
eu possa continuar. — Não vá para a casa dele nem nada. Eu só quero saber
se ele existe e onde ele mora. E se você puder descobrir se ele é dono de
uma van branca. — Eu adiciono essa última parte inquieta.
Megas me estuda. — Quem é ele?
— Apenas descubra para mim, sim? Talvez você possa vir me ver
novamente e me contar. Mas não diga a Julia que eu perguntei.
— Que diabos está acontecendo, Isabelle?
— Estou grávida. — digo a ela. Ela parece surpresa. — Julia não te
contou essa parte, eu acho?
— Não, ela não fez. Quanto tempo?
— Cerca de dois meses.
— Merda. Foi por isso que você se casou? — ela está fazendo contas
rápidas.
Eu balanço minha cabeça. — Não, isso é muito mais complicado. Mas
a razão pela qual estou trancada aqui é que Jericho encontrou algo que
esqueci que tinha. E ele pensou que eu machucaria nosso bebê. — Deus.
Parece terrível dizer isso a ela. Para me ouvir dizer isso em voz alta para ela.
— Jesus.
— Vai ficar tudo bem, eu sei que vai, mas há muita coisa que estou
tentando descobrir. Se você puder falar sobre esse Gerald Gibson, ajudaria.
Se ele não existe, então Jericho estava mentindo e eu tenho que estar
pronta para isso. Se ele o fizer e ele possuir uma van branca, então eu tenho
que estar pronta para isso. Especialmente se Julia estiver de alguma forma
envolvida. De qualquer forma, eu perco, mas tenho que saber a verdade.
— Olha, se esse cara existe, você precisa ficar longe dele. Apenas me
diga se ele é real ou não e onde ele mora.
— E se ele possui uma van branca.
Eu concordo.
— Tudo bem. Vou ver o que consigo desenterrar. Eu estou supondo
que você não vai visitar o café tão cedo.
— Eu duvido.
— Está bem. Eu vou voltar e ver você. O irmão dele me deixou entrar,
mas você acha que Jericho iria?
— Não sei.
— Quer saber, não se preocupe com isso. Eu vou descobrir. — ela diz e
fica de pé. Eu me levanto também. — O que mais posso fazer por você?
— Só isso. Isso é o suficiente por enquanto. Obrigada, Megs.
Ela balança a cabeça, vem me abraçar. — Gostaria de poder ficar mais
tempo, mas tenho que ir buscá-la na escola.
— Sem problemas. Estou tão feliz que você veio.
Ela se afasta, olha para mim. — Pelo menos coma o bolo. Você precisa
ganhar peso se tiver um bebê aí. — Ela hesita por um momento. — Isabelle?
— Sim?
— Você quer o bebê?
— Eu quero. Eu não quis no começo, quando descobri, mas eu faço.
— Ok. E mais uma coisa. — ela diz, pouco antes de me liberar. — Eu
quase esqueci porque Julia é tão enigmática. Ela me disse para lhe dizer que
você tem um amigo na floresta. Eu não sei o que diabos isso significa, mas aí
está. Foi estranho o suficiente para que eu me lembrasse, eu tinha que dizer
exatamente dessa maneira. — Ela me estuda, os olhos se movendo entre os
meus. — E se você entende claramente o que ela quis dizer. Acho que isso é
bom.
Eu aceno, porque sim, eu entendo. O fumante que pensei estar lá fora.
Aquele que não respondeu quando eu chamei. Ele é real.
— Não diga a ela que eu perguntei a você sobre Gerald Gibson, ok?
— Eu não vou dizer nada a ela. Ela pode estar preocupada com você,
mas isso não muda a forma como meus pelos ficam arrepiados sempre que
ela está por perto. Há algo de errado com ela.
Eu não respondo isso, mas quando ela sai, eu vou para o pátio e sento
no ar frio do outono. Vou esperar que alguém venha e me escolte de volta à
minha cela enquanto procuro na floresta pela luz vermelha de um cigarro,
sem ter certeza se ele é amigo ou inimigo.
CAPÍTULO QUARENTA
JERICHO
— Tem certeza? Não pode haver dúvida. — repito.
Dr. Rosseau suspira. — Não há duvidas. Essa evidência será válida em
qualquer tribunal, incluindo o Tribunal.
Acho que não consigo sorrir com esta notícia, embora seja uma boa
notícia. Exatamente o que eu esperava encontrar. Mas também há más
notícias.
— E no DNA?
— Essa não é minha área de especialização, como você sabe, mas
confio na minha equipe e a usei várias vezes. O menino é filho de Carlton
Bishop. E o herdeiro legítimo.
Concordo com a cabeça, os olhos no relatório da autópsia. — O legista
anterior foi rápido em decretar como parada cardíaca. Por quê?
— A menos que ele soubesse procurar por traços específicos de
qualquer número de venenos, ele não o encontraria. E essa é uma das
belezas de Oleander
2
. É tão indetectável quanto mortal. Os ingredientes
para um crime perfeito.
Eu olho para ele. Santiago me encaminhou para o Dr. Rosseau. Ele é
especialista em venenos e membro da Sociedade. Ele salvou a vida de
Santiago alguns anos atrás. E esta evidência destruirá Julia Bishop.
— Embora considerando que Carlton Bishop estivesse com excelente
saúde, isso deveria ter levantado algumas bandeiras.
— Você está sugerindo que ele foi incentivado a traçar a causa da
morte tão rapidamente quanto ele fez?
— Não estou sugerindo nada do tipo. Eu não faria, é claro. Mas saber
o que sabemos, é uma questão.
— E os abortos que as esposas de Bishop sofreram, há alguma maneira
de saber se não foram ocorrências puramente naturais? — Eu pergunto. Eu
sei que estou empurrando.
— Isso eu não posso te dizer. — Ele se senta, me estuda. — Mas você
deve ter provas suficientes para atrair a Sra. Bishop para a mesa de
negociações, pelo menos.
— Eu não vou negociar. — eu digo, de pé. Eu verifico meu relógio. —
Os arquivos?
— Tudo na sua caixa de entrada, mas você pode levar isso também.
Eles são seus. — Dr. Rosseau diz, de pé. Ele puxa a manga de sua camisa. Ele
está vestido elegantemente com abotoaduras de diamante, um relógio
Rolex, um terno feito sob medida. Seu escritório é opulento, luxuoso, assim
como o resto de sua casa.
— Obrigado, Dr. Rosseau. — eu digo, pegando as pastas e estendendo
minha mão.
Ele o sacode. — De nada, Sr. St. James. E é claro que estarei disponível
caso Hildebrand ou qualquer um dos Conselheiros precisem do meu
testemunho.
— Aposto que não chegará a isso. — Pelo bem de Isabelle, mas
também pelo garotinho. Mathew Bishop. Matty. Nenhuma criança de
quatro anos precisa ver sua mãe arrastada para a prisão, ou pior, por
assassinato.
Não vejo Isabelle desde a noite em que a deixei trancada em seu
quarto. Desde que ela me contou sobre seu pesadelo. Desde que ela me
disse que me amava. Eu me pergunto se ela teve o sonho desde então, mas
eu paro minha mente de vagar por aí. Eu não posso pensar sobre isso. Sobre
ela.
— Casa, senhor? — o motorista pergunta quando entramos na
estrada. Ele é novo. Um cara jovem.
— Qual o seu nome?
— Anthony, senhor.
— Anthony. — Lembro-me vagamente do nome que Dex mencionou.
Seu substituto por enquanto. — Não, não em casa. — Verifico meu relógio,
reli o texto que Zeke enviou há menos de meia hora. Aquele sobre a
desolada Julia Bishop. — Leve-me para a catedral. — Ele sabe qual.
— Sim, senhor.
Eu mando uma mensagem para Dex para checar Angelique e minha
mãe. Ele manda de volta uma foto me mostrando que elas estão mais do
que bem. Curtindo a piscina coberta da casa que aluguei nas Adirondacks.
Angelique aparentemente adora. Adora as cores do outono e as aventuras
que está tendo com Dex em suas caminhadas diárias. Ela deveria tê-las
comigo. Mas em vez disso, estou em Nova Orleans lidando com uma pária
que assassinou seu amante e quem sabe quantos outros. Que tentou
atropelar minha esposa e lhe deu os meios para acabar com a gravidez.
As palavras de Isabelle voltam para mim. Ela me ama. Como ela pode
machucar uma parte de mim? O rosto dela é o próximo. Os olhos dela.
Muitas vezes arregalados e assustados. Muitas vezes de mim. E mesmo
assim ela me ama. E o que eu fiz além de tornar a vida dela um inferno?
— Senhor, estamos a cerca de cinco minutos.
— Obrigado. — Começo a guardar meu telefone, mas mudo de ideia e
digito uma mensagem para meu irmão.
Eu: Como está minha esposa?
Os pontos aparecem quando Zeke digita sua resposta: Ela é uma
prisioneira. Como você acha que ela está?
Merda.
Eu: Estou quase na catedral. O menino está aí?
Zeke: Ela o mandou para casa um tempo atrás. Será ela e o padre.
Estou indo visitar o legista. Eu vou deixar você saber o que eu descubro assim
que eu puder.
Eu: Obrigado.
O motorista me leva para a entrada da frente da catedral, onde a
missa acabou de ser rezada para que a alma de Carlton Bishop seja recebida
no céu. O melhor que posso esperar dele é que ele esteja queimando no
inferno, mas pelo menos ela deu a ele o que ele merecia. Ele teria sofrido
nos dias que antecederam seu ataque cardíaco. Não é o suficiente pelo que
ele fez à minha família, mas é tudo o que tenho. Enquanto eu saio para a
noite fria de outono, eu sei que tem que ser o suficiente porque há mais
vidas em jogo agora. E não posso enterrar outra mulher que amo.
Dois guardas IVI ficam de sentinela nas portas da catedral. Eles as
abrem quando eu me aproximo e fico feliz em ver que Zeke estava certo. O
lugar está vazio, exceto Julia Bishop e o padre, com quem ela está falando
enquanto ajusta os lírios que decoram o caixão de Carlton Bishop.
A porta se fecha ruidosamente e meus passos ecoam fazendo os dois
se virarem, o rosto do padre uma máscara de equilíbrio. Os flashes de Julia
com surpresa, então raiva.
Ela me encara totalmente, cruzando os braços sobre o peito, de pé
entre mim e o caixão como se quisesse mantê-lo a salvo de mim. O Bishop
está morto. Eu não tenho que profanar seu cadáver. É a cabeça dela que eu
quero agora.
— Estou atrasado? — Eu pergunto, parando a poucos metros deles.
O padre limpa a garganta. — A cerimônia terminou, mas o corpo
permanecerá até amanhã para o enterro.
— Então eu posso prestar meus respeitos. — eu digo, apenas olhando
para o padre. — Uma palavra, Sra. Bishop.
— Não tenho nada para te dizer.
— Mas eu tenho algo a dizer a você. E eu acredito que você vai querer
ouvir. — Olho para o padre. — Sozinho.
Ela me estuda. Eu sorrio fracamente, embora nada sobre isso esteja
me deixando feliz. Porque não importa o que aconteça, Isabelle vai se
machucar. Assim como uma criança inocente. E ela não merece isso mesmo
sendo um Bishop.
O padre olha nervosamente entre nós. — Sra. Bishop, posso ficar…
— Não, obrigada. — diz ela, virando-se para sorrir para ele. — Eu vou
ficar bem.
Ele olha para mim mais uma vez antes de assentir e caminhar em
direção a uma pequena porta na parte de trás da catedral. Seus passos
ecoam no espaço cavernoso e espero para falar até que a porta se feche.
— Você está satisfeito consigo mesmo? Atrasando seu serviço? Seu
enterro?
— Eu poderia dar à mínima. — eu digo, andando ao redor dela para
olhar para o rosto estúpido de Carlton Bishop na fotografia emoldurada. Eu
pego, estudo. — Ele era seu fantoche o tempo todo? — Eu pergunto,
lentamente voltando para ela.
Ela é fria como gelo, seca. Não molha a camisa. — Eu não sei o que
você quer dizer. O que eu descobri no outro dia… — ela baixa o olhar, sua
testa enrugando, os olhos suficientemente úmidos quando ela os vira de
volta para mim. — Parte meu coração saber que ele teve algo a ver com a
morte do irmão de Isabelle. Despedaçou-me ao ver o rosto dela quando eu
disse a verdade.
— M-hum. — Eu coloco a foto para baixo. — O menino é dele.
Parabéns. Isso foi bem jogado.
Ela levanta a cabeça, inclinando-a um pouco, qualquer falsa tristeza se
foi. Substituída por uma beleza fria e ilegível.
— Eu não estava jogando com nada. Eu o amava. Matty é um produto
do nosso amor.
— Ah, eu quase acredito em você.
— Que diabos está errado com você?
— Eu acho que você é uma mentirosa, Sra. Bishop.
— Vá para o inferno, Sr. St. James. — Ela se vira para caminhar em
direção ao banco da frente onde estão seu casaco e bolsa. — Vou para casa
com meu filho.
— Oleander. — eu digo. Ela para de se mover. Eu vejo seus ombros
estreitos endurecerem. — Inteligente, novamente. Indetectável. A menos
que você saiba o que está procurando, é isso.
Ela retoma a caminhada, embora rigidamente, em direção ao banco.
— E claro, ele sofreria primeiro. É o que você queria, não é? Para ele
sofrer pelo menos um pouco? — Ela se inclina para pegar sua bolsa e casaco,
em seguida, se endireita para me encarar. — Todas aquelas visitas à Cat
House devem ter doído.
— Eu não sei do que você está falando.
Dou dois passos em direção a ela. — Eu não sou estúpido, Sra. Bishop.
— Não? Não tenho certeza se concordo. — Ela sorri. Cadela. — Quero
dizer, tirar a herança debaixo do seu nariz não foi tão difícil. E pobre Isabelle.
Grávida de sua prole. — Seus lábios se curvam deixando-a feia enquanto ela
me olha. — Eu tentei consertar isso para ela, mas ela também não é muito
esperta. Nunca foi.
O sangue corre em meus ouvidos e cada músculo do meu corpo fica
tenso.
— Ou talvez tenha sido apenas o sexo que virou a cabeça dela. — ela
diz, me estudando, lambendo os lábios sedutoramente. Ela deixa seu olhar
se mover sobre meus ombros, meu peito, mais baixo. — Quero dizer, eu
entendo. — Seus olhos encontram os meus. — Tenho certeza que você é
uma boa foda e se era a fortuna Bishop que você queria, bem, Isabelle era
sua única opção. Mas as coisas podem mudar, Jericho. — ela diz,
estendendo a mão para ajustar a lapela do meu terno, deixando-a no meu
peito. — Na verdade, elas têm.
— Você me faz querer vomitar, Sra. Bishop. Isabelle é cem vezes a
mulher que você nunca poderia ser.
Seu rosto se contorce, sua guarda baixa por um momento. — Bem,
isso não é romântico. — Ela deixa cair o braço e estreita os olhos. — Eu o
cremei, você sabe. O corpo se foi.
Cremado? Olho para o caixão.
— Apenas cinzas ali. Quero dizer, o que importa, enterrar cinzas ou
enterrar um corpo que se transformará em cinzas com o tempo? — Ela anda
ao meu redor em direção ao caixão, pega um lírio, derrubando vários no
chão no processo. — E oleander — ela começa, virando-se para mim depois
de colocar a flor no bolso de seu vestido de luto. — Bem, isso é um pouco
exagerado, você não acha? Quero dizer, que ano é esse?
— Diga-me uma coisa. — eu começo, de pé no meio do corredor para
bloquear seu caminho. — Você matou os bebês?
Ela pisca, surpresa e embora eu não tenha provas, acho que sim. Acho
que ela deve ter. Aborto após aborto, esposa após esposa.
— Aqueles abortos, terrivelmente convenientes. E eu aqui pensei que
era o esperma defeituoso de Bishop.
— Saia do meu caminho.
— O Tribunal vai enforcar você. — eu digo, vejo seu rosto perder um
pouco de cor. — Ele era um Filho Soberano. E pelo menos duas dessas
crianças eram do sexo masculino. Você sabe como um herdeiro homem é
importante para a Sociedade. Sangue puro e tudo, por mais antiquada que
seja a ideia. Tão antiquado quanto o veneno que nossos membros parecem
amar.
— Não há provas. Sua palavra contra a minha. Eu tenho um relatório
de autópsia.
— Eu também. E um legista que foi subornado. — Não tenho certeza
disso, mas estou disposto a apostar nisso. Zeke confirmará em breve. Pela
maneira como seus olhos se movem entre os meus, eu sei que estou certo.
— Você vai ser enforcada, Julia.
— Você destruiria Isabelle.
— Diga-me uma coisa, você pagou Gerald Gibson para atropelá-la? E
quando ele fodeu tudo, você apareceu para arrancá-lo de novo na noite em
que deu à minha esposa aquelas pílulas de aborto? Ou foi para planejar
outro ataque?
Ela pisca com força. — Eu não sei do que você está falando.
— Não? Bem, vou te fazer uma pergunta mais fácil então. As pílulas.
Quantas você deu a Isabelle?
Ela não responde de imediato e há aquela máscara de novo, aquela
arrogância. Aquela cobra fria e calculada erguendo sua cabeça feia. — Ela
não te contou? Achei que vocês dois pombinhos não teriam segredos um
para o outro. — Ela dá um passo em minha direção para que eu possa sentir
o cheiro de seu perfume. — Embora um homem como você sempre guarde
segredos, não é? Como por que você estava no México naquela viagem
malfadada para se encontrar com o líder de um cartel. Sua pobre noiva. Ela
tinha alguma ideia?
Minhas mãos se fecham ao meu lado e é preciso tudo o que tenho
para lutar contra o desejo de envolvê-las em seu pescoço e cometer um
assassinato aqui neste solo sagrado. O sangue bombeia tão forte que é uma
maravilha que eu possa ouvi-la com toda a pressão.
— Encerrando o trabalho para o papai morto, não é mesmo? Quero
dizer, não é o cartel onde você fez pelo menos um pedaço de sua fortuna?
Foi quando ele estava vivo. — Ela sorri largamente, muda seu peso para
colocar a mão no quadril. — Tenho toda a papelada. Eu poderia
compartilhar com você se você não tivesse certeza. Inferno, eu poderia
compartilhar com todo o mundo, o trabalho que você estava fazendo lá
embaixo enquanto brincava de marido amoroso, futuro papai. E pobre,
pobre Kimberly. Esse era o nome dela, certo? Tão crédula quanto a Isabelle.
Você tem um tipo. Mas…
Eu puxo meu braço para fora, agarro sua garganta e ando de volta tão
rápido que um de seus sapatos cai de seu pé. O caixão quase tomba do
pedestal quando a inclino para trás. Eu me inclino em seu rosto.
— Pelo bem de Isabelle, pelo bem do seu filho, eu vou te dar uma
chance. Uma chance, Sra. Bishop. Fique. Longe. Desapareça. Pegue o
menino e vá. E nada disso vem à tona. E você não morre. Porque o que quer
que você pense que pode fazer comigo, você é quem vai balançar na ponta
de uma corda. E quando você fizer isso, eu vou pegar aquele seu menino e
criá-lo como se fosse meu. Vou me certificar de apagar qualquer memória
de você. Para seu próprio bem, é claro. Você tem três dias para decidir. Três
dias. Fui claro?
Suas mãos estão em volta do meu antebraço tentando me puxar.
Tenho certeza de que poderia matá-la aqui mesmo. Agora mesmo. Lembrome de como segurei Isabelle de uma forma muito semelhante dias atrás,
quando pensei que ela tentou matar nosso bebê. Algo pesado e sombrio se
instala ao meu redor, dentro de mim. Como pude fazer isso com ela? Como
pude machucá-la como posso machucar essa pária. Porque Julia Bishop não
está mentindo sobre minha visita ao México. Eu estava lá fazendo negócios.
Eu sabia quem era Felix Pérez. E completei um acordo final em nome do
meu pai com ele.
Posso dizer a mim mesmo que era meu dever para com meu pai
enquanto eu quisesse, mas eu escolhi. Eu escolhi ir. Mesmo antes de saber o
que ele tinha feito com Zoë. Antes que eu soubesse que ser humano vil ele
era. Ainda sou eu quem voou para o México para se encontrar com Pérez
em seu nome. Para garantir uma última transação com os homens, meu pai
nunca teve nada a ver com fechar aquele capítulo da história de St. James.
Eu ainda sou aquele que levou Kimberly. Eu ainda sou a razão pela
qual Angelique nunca conheceu sua mãe. Nunca nem vi o rosto dela.
— Seis. — Julia ofega, seus olhos vermelhos e enormes, saltando de
sua cabeça.
Eu pisco, volto ao presente.
— Seis. Pílulas. — ela administra.
Eu afrouxo meu aperto em volta do pescoço dela. Seis pílulas. É
quantas contei quando confrontei Isabelle. Ela não estava mentindo. Ela
nunca as tomou. E ainda… o que eu fiz com ela. Porra. Como continuo
magoando as pessoas que amo.
O rosto doce de Angelique flutua na memória. Ela cresceu com um
guarda-costas em vez de seu próprio pai. Minha menina inocente. O que vou
fazer com ela? O quanto eu vou machucá-la?
Julia cai de joelhos no instante em que a solto. Não me incomodo em
parar e olhar. Eu não me incomodo em fazer nada além de caminhar até a
porta, meus passos ecoando, altos, abafando sua respiração ofegante. Mas
não alto o suficiente para abafar minha culpa. Meu conhecimento muito real
de quem eu sou. O que eu sou.
Um diabo.
CAPÍTULO QUARENTA E UM
ISABELLE
Sou acordada no meio da noite por algo caindo no chão perto de mim.
Assustada, eu me endireito, meus olhos demorando um minuto para se
ajustarem à escuridão. Uma sombra se curva para pegar o estojo do violino.
Coloca-o contra a parede. Então se endireita.
— Jericho?
Ele se vira para mim e do pouco de luz filtrada entre as cortinas, vejo
seu rosto e sei que algo aconteceu.
— O que é isso? — Eu pergunto, empurrando o cobertor para me
levantar e ir até ele. Sinto o cheiro do uísque antes de estar perto. Quando o
alcanço, ele olha para mim e coloca uma mão na parte inferior das minhas
costas.
Ele diz meu nome e balança um pouco.
— Você está bêbado, Jericho.
— Não.
— Sim. — Pego sua mão e o levo para a cama, acendo a lâmpada na
mesa de cabeceira e o sento. Eu empurro o paletó de seus ombros. Está
enrugado e parece que passou por um dia muito longo e uma noite mais
longa. Eu o jogo de lado e olho para ele. Ele fica sentado olhando para mim.
Seu cabelo está bagunçado como se ele tivesse passado as mãos nele mil
vezes. Não tenho certeza de quando ele se barbeou pela última vez. A
sombra das cinco horas está rapidamente se tornando uma barba.
— Isabelle. — Ele estende a mão para tocar meu rosto, acaricia minha
bochecha, em seguida, o comprimento do meu cabelo antes de deixar sua
mão descansar ao seu lado novamente.
— O que aconteceu? — Pergunto novamente enquanto me ajoelho
para desamarrar seus sapatos e tirá-los um por um, depois suas meias. Eu
me endireito, começo a desabotoar sua camisa. Ele apenas senta lá e me
observa. Toda vez que olho em seus olhos, vejo uma tristeza que parece
eterna.
— Por que você é boa para mim? — ele pergunta, parecendo
cansado. Esgotado. — Depois de tudo que eu fiz com você.
Eu puxo sua camisa para fora de sua calça e a abro, toco a pele de seu
peito, então seguro sua bochecha. — Eu já te disse isso. Você não se
lembra?
Seus olhos se fecham e depois se abrem novamente. Eu balanço
minha cabeça e puxo a camisa de seus braços.
— Diga-me o que aconteceu. — eu digo, então paro, alarmada. —
Angelique e sua mãe estão bem?
Ele parece confuso, então assente. — Tudo bem. Ela está se divertindo
com Dex. Ele é mais um pai para ela do que eu, você sabe disso?
— Isso não é verdade. Deite-se.
Ele faz sem uma palavra, eu olho para ele com a cabeça no meu
travesseiro, corpo grande na minha cama de casal. O dele é um rei. Ele
parece um gigante aqui. E, ao mesmo tempo, ele parece vulnerável. Porque
eu vejo sua exaustão.
— Por que você está se matando? — Eu me pergunto mais do que a
ele enquanto desfaço seu cinto. Eu tiro suas calças, em seguida, puxo o
cobertor debaixo de suas pernas e me deito ao lado dele. Eu puxo as
cobertas sobre nós dois e uso seu braço como travesseiro. Ele me segura e
quando ouço sua respiração nivelar, eu fecho meus olhos. Eu não tenho
certeza se eu adormeço ou se nós dois dormimos por um tempo antes que
ele fale, o profundo silêncio de sua voz me acordando.
— Foi minha culpa ela ter morrido.
Levo um minuto, mas percebo que ele está falando sobre Kimberly.
— Eu sabia o que estava fazendo, com quem estava lidando quando
fui para lá. Eu nunca deveria tê-la levado. Nunca.
Eu me inclino para ver seu rosto na luz sombria. Ele está olhando para
o teto.
— Meu encontro com Pérez foi um negócio. O negócio do meu pai.
— O que você quer dizer com negócios?
— Meu pai lidou com aquele bastardo. Foi ele que colocou Pérez em
contato com fornecedores desse lado. Acertou os negócios. Deu muito
dinheiro à família.
— Seu pai fez negócios com um cartel?
Ele concorda. — Zeke não sabe. Merda. Somos tão bons em guardar
segredos e veja onde isso nos levou.
— O que você fez? Qual foi a sua parte?
Ele suspira profundamente e eu sei que ele está se responsabilizando
agora. Esta é a sua confissão. — Eu terminei o negócio dele com o acordo de
que seria o último. Tenho certeza de que foi por isso que Pérez concordou
com o golpe que Bishop arranjou com ele. Tinha concordado com isso
mesmo enquanto ele estava sentado conosco em sua sala de estar, aquele
sorriso presunçoso que eu odiei à primeira vista. É por isso que ele não
recuou quando eu disse a ele que era isso. Eu estava cortando laços.
— Ah, Jericho.
— E então ela levou a bala destinada a mim.
Eu não quero parecer magoada ou ciumenta. Este é o passado dele.
Ela é o passado dele. Eu sei isso. E ela sempre fará parte da vida dele e por
sua vez, da minha vida, é assim que deve ser. Ela era a mãe de Angelique. E
ele a amava.
Ele vira a cabeça para mim, toca minha bochecha. — Quantas pessoas
vou machucar? Estou amaldiçoado, Isabelle. Eu machuquei todos que eu
amo. Ou pior.
Eu pisco e ele enxuga uma lágrima com a ponta do polegar.
— Vê? — ele pergunta.
— Não. O que aconteceu com ela não foi culpa sua. Essa culpa não é
sua para carregar.
— É, querida.
— Jericho…
Ele segura minha cabeça e me puxa em seu peito, me acalmando. Sua
grande mão repousa na minha bochecha, meu cabelo, seu outro braço em
volta da minha cintura.
— E eu amo você, Isabelle. Eu faço. Se eu fosse um homem melhor,
deixaria você ir antes que eu te machucasse mais do que já machuquei, mas
não sou. E eu não posso. — Ele vira a cabeça e pressiona os lábios contra a
minha testa. Ele apenas me abraça assim, apertado a ele, tão apertado, me
beijando assim. Eu penso na vida dele, nos fardos que ele carregou, que ele
ainda carrega. A culpa. E eu o abraço mais perto, o abraço apertado em mim
também.
CAPÍTULO QUARENTA E DOIS
ISABELLE
Quando acordo, estou sozinha. É como se a noite anterior não tivesse
acontecido. E talvez ele estivesse tão bêbado que não se lembra. Embora
minha porta esteja destrancada, depois de me vestir rapidamente, desço as
escadas para encontrar Jericho tomando café e conversando com seu irmão
na sala de jantar.
Ambos ficam quietos quando paro dentro da entrada em arco. Jericho
me examina. Ele está limpo. Barbeado. Fresco de um banho. Ele não se
parece nem um pouco com o homem quebrado da noite passada. Isso me
faz pensar se ele se lembra do que disse. As coisas que ele me disse. Como
ele disse que me amava.
— Bom dia. — Zeke me diz, sorrindo. — É bom ver você por aqui.
— Bom estar fora de lá. — digo a ele.
Ele sai da sala de jantar e eu me viro para encontrar Jericho ainda me
observando.
— Eu não ouvi você sair. — eu digo.
— Você estava dormindo tão pacificamente que eu não queria te
acordar. Sente. Vamos tomar café da manhã.
É estranho ou pelo menos é para mim, enquanto o silêncio se instala
ao nosso redor. Ele me faz um prato de comida, lembrando-se de pular o
bacon. Ele o coloca na minha frente, depois se senta com um prato de
tamanho semelhante.
— Você dormiu bem depois que eu te acordei? — ele pergunta.
— Você estava muito bêbado. — eu digo em vez de responder a sua
pergunta.
— E você cuidou de mim. Está se tornando um hábito. — Ele come
outro bocado.
— Você disse algumas coisas.
Ele sorri. — Eu fiz.
— Sobre o cartel. — digo depois de olhar para o corredor.
Ele acena com a cabeça, sem sorriso desta vez.
— Sobre você e eu. — acrescento depois de limpar a garganta e voltar
minha atenção totalmente para o meu prato.
— Eu me lembro, Isabelle. — Eu olho em sua direção rapidamente. —
Eu quis dizer isso, caso você esteja se perguntando.
Eu coloco meu garfo para baixo e o estudo. Lá, enterrado nas
profundezas da superfície, acho que vislumbro aquele homem da noite
passada. Apenas uma visão rápida daquela outra criatura vulnerável. — Eu
quis dizer isso também quando eu disse isso.
— Sinto muito pelo que fiz com você na capela. Desculpe-me, eu
assustei você. Eu sei que você não tomou aquelas pílulas.
— Você acredita em mim?
— Sua prima confirmou o número que ela deu a você.
— Ah. — Eu limpo minha boca com meu guardanapo, de repente sem
apetite. — Você acreditou em Julia sobre mim. Muito legal. Não dói,
considerando que você a odeia.
Sua expressão escurece. — Não, eu não acredito nela sobre você. Eu
só tinha provas corroborantes.
— Você ouve a si mesmo?
Ele limpa a boca, limpa a garganta. — Você sabe o que, eu sei.
Seu telefone vibra no bolso, ele lê alguma coisa na tela, depois o
guarda e se levanta. Ele caminha atrás da minha cadeira, envolve a mão em
volta do meu rosto e se inclina para que sua boca fique no meu ouvido. Meu
batimento cardíaco acelera por tê-lo tão perto. Sua mão é quente, seu
grande corpo nas minhas costas me faz estremecer com emoções
conflitantes. Eu quero esse homem como nunca quis ninguém antes, mas
ele é vingativo e quebrado. E por mais que ele esteja falando sério quando
diz que me ama, ele também me avisou ontem à noite, não foi? Ele é
amaldiçoado. Todo mundo que ele ama se machuca. Eu preciso ter cuidado.
— Não posso mudar da noite para o dia, mas estou tentando. — diz
ele. Ele está tão perto que sua respiração faz cócegas na minha orelha me
fazendo estremecer. Ele beija o canto da minha boca, então me vira e me
beija profundamente. — Nós dois temos que aprender a confiar um no
outro. Ok?
Eu aceno porque eu realmente não posso falar. Meu coração está
martelando contra meu peito. Não sei se são hormônios da gravidez ou o
quê, mas acho que não consigo formar palavras agora.
Ele sorri, recua. Ele deve ver todas essas coisas no meu rosto.
— Coma seu café da manhã. Tenho uma surpresa para você esta
manhã.
— Que surpresa? — Eu pergunto enquanto ele tira o telefone do bolso
e sai da sala de jantar.
— Depois do café da manhã, iremos ao consultório do Dr. Barnes para
seu primeiro ultrassom.
— Ultrassom?
— Vamos ver o bebê hoje, Isabelle. Você quer isso, não é?
Eu sorrio e aceno. Porque sim, eu quero isso. Eu adoraria isso, na
verdade.
Chegamos ao consultório do Dr. Barnes um pouco antes do meio-dia e
somos imediatamente conduzidos através da luxuosa área de espera até seu
consultório. É grande e tão confortável quanto pode ser eu acho, dadas às
luzes brilhantes e o ambiente estéril. Os homens apertam as mãos e
conversam enquanto a enfermeira me mostra uma pequena sala onde eu
coloco uma bata. Quando estou pronta, ela me leva de volta para onde o
médico está explicando algo sobre a máquina de ultrassom para Jericho.
— Suba aqui, Sra. St. James e vamos ter um primeiro vislumbre de seu
bebê. — diz o Dr. Barnes, sorrindo, parecendo um homem totalmente
diferente daquele que estava na casa quando descobri que estava grávida. O
momento que eu soube o que Jericho tinha feito. Como tudo mudou em tão
pouco tempo.
Jericho fica na cabeceira da mesa enquanto me sento, o vestido me
cobrindo enquanto coloco meus pés com meias nos estribos.
— Este será um ultrassom transvaginal. — explica o Dr. Barnes,
rolando em direção à metade inferior da mesa. Jericho pega minha mão, me
surpreendendo, eu olho para ele. Eu estou nervosa. Não faço ideia do por
quê, mas estou nervosa. E ele se parece um pouco com o que eu sinto
também.
Ele encontra meus olhos e aperta meus dedos. Lembro-me do que ele
disse esta manhã. Sobre como ele está tentando, mas vai levar tempo. Sobre
aprender a confiar um no outro. Eu aperto de volta assim que sinto a
varinha entrar, o gel tão frio que me faz estremecer.
Mas eu não tenho a chance de considerar o desconforto ou qualquer
outra coisa, porque eu ouço. Os primeiros sons do nosso bebê. Antes de
virar a cabeça para olhar para o monitor, a mão de Jericho aperta a minha e
meus olhos se enchem de lágrimas quentes. Meu peito incha enquanto ouço
o eco rápido e estranho do batimento cardíaco do meu bebê.
— Lá está ele ou ela. — diz o Dr. Barnes. — Nós não saberemos o sexo
ainda, se você quiser saber.
— Não. — eu digo rapidamente, olhando para Jericho para encontrar
seus olhos fixos naquele monitor. — Não queremos saber o sexo.
Jericho olha para mim. Aceno. — Como quiser. — Ele desvia o olhar de
volta para o monitor como eu também, observamos essa pequena bolha
que não se parece exatamente com um bebê. O Dr. Barnes mede isso e
aquilo, explicando coisas que não ouço porque estou muito ocupada
ouvindo aquele pequeno batimento cardíaco. Observando a pequena vida
na tela. Totalmente encantada.
Saímos uma hora depois, na minha mão estou segurando cerca de
duas dúzias de fotos do bebê.
— Angelique vai adorar ver isso. — digo a ele distraidamente
enquanto subimos no banco de trás do carro. Não conheço este motorista.
Ele é novo desde que Dex se foi. Olho para Jericho enquanto ele fecha a
porta atrás de si. — Quando ela vai voltar?
— Eu ainda não tenho certeza.
Sua expressão escurece e eu me lembro da outra parte de nossas
vidas. Aquela em que não somos um casal normal que acabou de ter o
primeiro vislumbre de seu bebê.
Somos um casal lidando com pessoas que nos fazem mal. Onde a
ameaça é real o suficiente para Jericho que ele mandou sua filhinha embora
para mantê-la fora de perigo.
— O que você descobriu na autópsia? — Eu pergunto, o clima feliz
desapareceu quase como se nem estivesse lá.
Ele olha para mim. — Eu vou lidar com isso. Você não precisa se
preocupar com isso.
Eu o estudo e acho que ele tem boas intenções. Eu faço. Mas isso é
sobre mim também.
— Tem alguma coisa então? — Há. Não sei como sei, mas sei. — Ele
não morreu de ataque cardíaco, morreu?
Ele suspira, mas não confirma nem nega, pelo menos não
verbalmente. Ele apenas mantém o olhar fixo à frente enquanto chegamos
ao próximo lugar. A próxima surpresa, eu acho. O carro para na frente do
Cotton Candy e posso ver pelas janelas que está completamente vazio por
dentro. As luzes estão acesas e vejo Megs no balcão digitando em seu
laptop, uma caneca ao seu lado.
— Segunda surpresa. — Jericho diz enquanto abre a porta, sai e
estende a mão para mim.
Ainda estou segurando as fotos, então abro o zíper da minha bolsa,
coloco-as dentro, então pego a mão dele e vou para a calçada. Eu não posso
evitar olhar para a rua de onde aquela van veio e ele deve vê-la, porque ele
me puxa para mais perto.
— Está tudo bem. Eu não traria você aqui se você não estivesse
segura.
Eu sorrio para ele, mas minha pergunta de momentos atrás
permanece, uma sombra sobre o que deveria ser um dia brilhante. Ele
encontrou algo na autópsia do Carlton. Algo que faz com que sua morte não
seja natural.
Julia.
Não. Eu não me deixo ir por esse caminho. Ainda não.
— Por que o café está vazio? — Eu pergunto enquanto entramos, o
motorista parado na porta.
— A chave está na fechadura. — diz Megs para Jericho, em seguida,
revira os olhos para mim quando ele vira as costas para trancá-la.
— O que está acontecendo? — Peço a quem me responder.
Megs dá a volta no balcão até a mesa única posta com balões rosa e
azuis e dois talheres. Sobre a mesa está uma jarra de prata de café, um bule
de chá fumegante e um lindo bolo, também rosa e azul, repousa entre eles.
— Seu marido alugou o lugar para o dia. — diz ela, olhando para
Jericho enquanto ele sorri, envolvendo um braço em volta de mim. —
Porque ele é louco. — ela acrescenta antes de apontar para a mesa. — O
assento com o presente é para você. — ela acrescenta enquanto Jericho
puxa a cadeira.
— Você alugou o lugar todo? — Eu pergunto a ele enquanto me
acomodo.
— Sim. — ele responde como se fosse a coisa mais normal do mundo a
se fazer. — Os balões estão um pouco exagerados, você não acha? — ele
pergunta a Megs.
Ela projeta um quadril para fora, coloca a mão sobre ele e tira a
medida dele. É um olhar que faria a maioria dos homens se encolher, mas
meu marido não é a maioria dos homens.
— Não, eu não acho que seja exagerado. E se você gosta tanto disso,
vai adorar o interior do bolo.
Ele desvia o olhar para o bolo rosa e azul de cores vivas. — Cristo. —
ele murmura e se senta.
— Veja agora, isso só fez meu dia muito mais feliz. Ah e claro,
ganhando cerca de cinco vezes mais do que o café aberto teria trazido.
Obrigada por isso, a propósito. — ela diz para ele, então se vira para mim,
sorrindo. — Você. Abra seu presente.
Seu rosto não revela nada sobre o que eu disse a ela em sua visita a
casa. E eu não tenho certeza de como ela se sente sobre Jericho, essa
brincadeira entre eles não é hostil, mas também não é muito amigável.
— Eu amo presentes. — eu digo, ela observa enquanto eu abro o
pacote. É um livro sobre gravidez, o que posso esperar, um guia semana a
semana. — É perfeito! Eu não tenho um.
— Estou feliz que você goste. Mas é apenas o começo. Se vou ser tia e
madrinha…
— Madrinha? — Jericho a interrompe, sobrancelhas se erguendo na
testa.
Megs apenas continua. — Você sabe que estou mimando ele ou ela. Já
comecei uma coleção. Faz muito tempo desde que eu segurei um bebê. —
Megs se inclina para me abraçar. — Você está bem? — ela sussurra.
Eu a abraço mais forte. — Sim. Obrigada.
— Página 286. — ela sussurra e se afasta, vira-se para Jericho. — Você
vai ficar aí sentado ou vai se fazer útil e servir uma xícara de chá para a
senhora?
Eu olho para o livro no meu colo tentado a virar para a página 286
agora. Na verdade, é preciso tudo o que eu não tenho para deixar de lado e
ouvir o vai-e-vem deles. Jericho faz um comentário de — …não é esse o seu
trabalho? Achei que pelo que paguei receberia pelo menos metade de um
serviço decente.
Mas mesmo em seu tom, tenho a sensação de que ele pode gostar de
Megs. Pelo menos não odiá-la ou desconfiar completamente dela. É quando
estamos cortando o bolo que o telefone dele toca. Faço uma pausa com a
faca apenas tocando a cobertura e observo enquanto ele atende a ligação,
levantando-se para falar em voz baixa.
— Ele acha que é algum tipo de espião? — Megs pergunta,
observando suas costas por um momento antes de se virar para mim.
Percebo o olhar que ela dá a Anthony na porta. — Ele foi gentil em alugar o
lugar para você. Você deveria tê-lo ouvido quando ele me ligou. — Ela
balança a cabeça. — Se eu não conhecesse o outro lado dele, pensaria que
ele era apenas um grande ursinho de pelúcia.
Um urso de pelúcia. Jericho. Isso é a segunda vez que alguém o
chamou assim.
— Eu tenho fotos de ultrassom. — eu digo, mudando de assunto
enquanto ela puxa uma cadeira. Largo a faca e tiro as fotos para mostrar a
Megs. Um olhar para Jericho me diz que o que quer que esteja acontecendo
o deixou nervoso.
— Ó meu Deus! Parece com o papai. — ela diz assim que Jericho
desconecta a ligação e volta para a mesa, seu humor visivelmente mais
sombrio.
Ele olha para Megs. — Você não deveria servir e sair?
Ela revira os olhos e me devolve as fotos. — Bem, vamos apenas
esperar que ela herde a personalidade da mãe ou essa criança está
condenada.
— Pelo amor de Deus. — Jericho começa.
Megs ri e vai embora. Eu corto uma fatia do bolo apenas para ter cerca
de um milhão de granulado rosa e azul derramado sobre o prato e sobre a
mesa, a visão tão linda que tudo que posso fazer é rir. Eu acho que
Angelique adoraria muito isso. O quanto eu amo isso.
Mas antes que eu possa pedir a Jericho para tirar uma foto, antes que
ele possa apreciar o espetáculo ou ficar irritado com isso, seu telefone toca
novamente. Desta vez, quando ele responde, seu tom é afiado. Há um longo
silêncio enquanto a pessoa do outro lado responde. Olho para Megs, que
está assistindo do balcão. Quando olho de volta para Jericho, ouço sua
maldição murmurada antes que ele enfie o telefone de volta no bolso e
volte para mim, corpo tenso, pernas rígidas.
— Precisamos ir. — diz ele.
— O quê? Por quê?
— Eu preciso cuidar de algo. É urgente. — Ele pega o livro e minha
bolsa e gesticula para eu me levantar.
— O que está acontecendo? — Eu pergunto sem me levantar.
— Nada para incomodá-la. Só precisamos sair.
— Lembra o que você disse esta manhã? Sobre confiança?
— Sim, que estou trabalhando nisso e vai levar tempo para nós dois
confiarmos. Vamos, Isabelle.
— Você vai. Quero comer meu bolo.
— Eu não vou deixar você aqui.
— Por que não? A porta está trancada. Anthony pode me levar para
casa quando eu terminar. Você está ocupado de qualquer maneira.
— Isabelle…
— Diga-me o que é então. Diga-me por que está com raiva de novo. E
me diga o que você encontrou na autópsia.
Ele cerra a mandíbula, apertando os punhos. Ele fecha os olhos, dez
segundos depois, os abre e respira fundo. — Ok. Você vai ficar aqui. Anthony
vai ficar com você. A porta permanecerá trancada. Anthony. — ele chama e
Anthony está na mesa em um instante. — Preciso pegar o carro. Chame
outro para ser trazido. Quando chegar e minha esposa tiver comido o bolo,
leve-a para casa. Ninguém entra. Ninguém sai. Está claro?
Reviro os olhos e pego meu garfo, não mais interessada neles. Irritada
com essa reviravolta. Decepcionada com isso, com suas palavras sobre
confiança porque são vazias.
— Sim, senhor. — diz Anthony como um bom fantoche.
— Bom. — Jericho coloca sua grande mão no meu ombro. — Eu sinto
muito.
Eu dou de ombros e coloco um pedaço de bolo na boca, mas por mais
delicioso que seja, não consigo engolir.
Um momento depois, Jericho se foi e Anthony está de volta à porta.
Megs se junta a mim na mesa.
— Merda. — ela diz. — Desperdício de bom bolo. — Ela corta uma
fatia enquanto olha para Anthony. — Mas pelo menos podemos conversar.
— Página 286?
Ela assente e dá uma mordida. — Porra, eu sou boa. — Ela diz mais
alto do que o necessário, então abaixa a voz. — Encontrei uma casa na
Seventh Ward que pertencia a uma Marjorie Gibson que já faleceu.
— O quê?
— O endereço está na página 286. Ela tem um filho chamado Gerald
que tem uma ficha criminal do tamanho do meu braço e outro chamado
Danny que está atualmente cumprindo pena pelo assassinato de um
Christian York. Isso é graças ao meu amigo detetive. Que porra está
acontecendo, Isabelle?
— Merda. Ele é real.
— E ele não é um homem legal.
— Não, o irmão dele também não era legal. Ele mora na casa?
— O último endereço foi em Vegas.
— Vegas?
Ela acena. — Mas isso não significa que ele não está aqui e
simplesmente não mudou de endereço.
— A van? — Eu pergunto, não tenho certeza se quero saber. De jeito
nenhum.
— Ele é dono de uma van branca. O que isto significa?
— Não tenho certeza. Se ele está em Vegas, nada. Mas se ele não
está… — Isso significa que Jericho está dizendo a verdade. Pelo menos parte
disso. E possivelmente que Julia não esteja. — Você tem seu carro aqui? —
Eu pergunto, odiando a ideia mesmo quando pergunto, mas sem saber o
que mais fazer.
— Meu carro?
Eu concordo.
— Nos fundos. — Seus olhos se estreitam. — E não, você não vai leválo para visitar aquele idiota.
— Eu não estou planejando visitá-lo mesmo que ele esteja na cidade.
Eu só quero ver a casa. Ver se a van está lá. Ver se é a mesma.
— Isabelle, não.
— Não terei outra chance como essa. Não posso sair de casa sem
Jericho. Não posso ligar para você ou qualquer outra pessoa. Não posso
fazer nada sem a permissão dele.
Megs engole e olha para Anthony. — E ele?
— Bolo?
Ela enfia a mão no bolso e tira as chaves. — Este vai destrancar a porta
no final do corredor depois do banheiro feminino. Você verá o carro lá atrás.
— Eu fecho minha mão sobre ela, olho para Anthony que está sorrindo para
algo em seu telefone. Eu deslizo as chaves na minha bolsa e Megs
rapidamente enfia seu telefone lá também. — Você conhece o código. Você
está apenas passando de carro, certo?
Eu concordo.
— Você deve levar vinte minutos para chegar lá. Se eu não tiver
notícias suas em vinte, vou mandar policiais para o endereço de Gibson.
— Não. Eu preciso de mais tempo.
— Tudo bem. Vinte e cinco. Então você está de volta. Concorda?
Eu aceno, fico de pé. Ela fecha a mão sobre a minha. — Não faça nada
estúpido, Isabelle. Você me escuta?
Eu aceno, sorrio e me viro para Anthony. — Você pode embalar o
bolo? Eu preciso usar o banheiro de senhoras.
— Claro, Sra. St. James.
— Você pode muito bem comer uma fatia primeiro. — diz Megs e
pega uma fatia para Anthony, fazendo-o sentar enquanto eu entro pela
porta e vou em direção à saída.
CAPÍTULO QUARENTA E TRÊS
ISABELLE
Eu entendo por que ela chamou seu carro de Batata. É um Mustang
velho e desajeitado e ganha vida, soluçando o tempo todo, me fazendo
pensar se ele vai funcionar. Mas então o estrondo se acalma e eu mudo para
dirigir, a marcha emperrando momentaneamente.
O carro em si é impecável, embora o cheiro de gasolina permeie o
interior. Megs adora a coisa antiga. Era do pai dela. É por isso que ela o
guarda. Ele também adorava.
O Seventh Ward não é o melhor bairro. Eu sei disso. Mas durante esta
hora do dia, eu deveria estar bem. Penso no que vou fazer quando chegar a
casa onde Gerald Gibson poderia estar morando. Este é o irmão de Danny. O
homem que tentou me estuprar. O homem que matou Christian. Posso
mesmo fazer isso?
Eu tenho que fazer.
Porque eu tenho que saber a verdade sobre Julia. E se a van que
tentou me atropelar está na casa, não pode ser coincidência.
A causa da morte de Carlton não foi natural, eu sei disso. E Jericho
acredita que Julia está na raiz de tudo isso. Sua morte. O ataque a mim.
Possivelmente o ataque que matou Christian.
A luz a poucos quarteirões da casa de Gerald Gibson fica vermelha. Eu
paro, esfrego meu rosto. Estou pronta para saber disso? Estou pronta para
saber que Julia, minha prima em quem confio, com quem tenho um
relacionamento, cujo filho amo, poderia ter tentado me machucar? Poderia
ter algo a ver com a morte de Christian? Ela explicou tudo tão facilmente no
outro dia e faz sentido que Carlton pudesse ter usado seu nome e endereço
de e-mail para o pagamento. Mas por que ele deixaria um rastro de papel?
Isso não faz sentido. Por que manter um registro de seu crime?
Mas também pode ser verdade e Jericho está muito bravo para ver
isso. Com Matty sendo filho de Carlton, a herança está resolvida. Jericho
deve ver vermelho com isso e Julia se tornaria seu alvo natural.
Alguém buzina, me assustando. A luz ficou verde. Tiro o pé do freio e
dirijo, olhando os nomes das ruas. Estou a alguns quarteirões de distância e
minha ansiedade cresce à medida que dirijo mais devagar do que o limite de
velocidade, o carro se arrastando quando viro na rua de Marjorie Gibson.
Vejo a casa do outro lado. É indefinida, confunde-se com as outras desta
rua, as casas desgastadas, um bairro esquecido. São todas casas térreas com
cortinas fechadas sobre as janelas. Os carros estacionados ao longo da rua e
nas calçadas são modelos antigos e mal cuidados.
A calçada está vazia. A casa escura. Também parece vazia. Como se
ninguém morasse ai. Há uma garagem no final da entrada e a porta parece
estar emperrada. Eu dirijo devagar, olhando na direção dela, embora esteja
muito longe para ter certeza, vejo que há um veículo dentro. Uma
caminhonete ou uma van. E eu posso ver que é branca.
No final da rua, faço uma volta na direção e rastejo em direção a casa.
Estaciono o carro de Megs e desligo o motor. Sento-me lá dentro por um
longo minuto, minhas mãos suadas ao redor das teclas.
Eu só preciso olhar para a van. Eu vou reconhecê-la. O dia é um
borrão, mas havia uma coisa que eu me lembro. E é distinta.
Verifico meu relógio. Tenho dez minutos antes de Megs chamar a
polícia, então tiro o telefone da bolsa, digito o código e ligo para o café. Ela
atende no primeiro toque. Tenho certeza que ela está esperando.
— Ei. — ela diz.
— Acabei de chegar a casa.
— E você está apenas fazendo um passeio, lembra?
— Eu só preciso ver dentro da garagem.
— Isabelle…
— Anthony descobriu que eu fui embora?
— Ele acha que você está com dor de estômago, mas honestamente,
ele não vai comprá-lo por muito tempo.
— Vou me apressar. Eu só preciso ver, a casa parece vazia. Não há
ninguém aqui.
— Por favor, não me faça me arrepender disso.
Não tenho nada a dizer sobre isso, então desligo a chamada. Com as
mãos úmidas, abro a porta do carro e saio. Eu coloco as chaves na minha
bolsa, andando pela calçada em direção a casa. Cortinas de renda que
podem ter sido bonitas estão penduradas nas janelas e através delas os
quartos estão escuros. Ninguém está aqui. Está bem.
Mas meu coração ainda dispara. Eu estou assustada. Medo do que eu
possa encontrar.
Olho ao redor da rua, vejo os poucos bolsões de pessoas, ouço os sons
de dentro de outras casas. Televisores, uma secadora batendo em alguma
coisa enquanto gira, uma mulher gritando para seu filho entrar. Sem hesitar,
eu me viro para caminhar até a calçada como se eu pertencesse aqui.
A porta da garagem está aberta até o meio da coxa. Fica mais para trás
do que a casa. Eu ando direto pela calçada, quando chego mais perto, me
inclino para espiar dentro. Minha frequência cardíaca triplica, suor
escorrendo pela minha nuca.
É uma van branca. Mas pode não ser a van que quase me atropelou.
Exceto que há muitas coincidências aqui.
Eu deslizo sob a porta aberta para a garagem. O cheiro de gasolina e
fumaça de cigarro é forte aqui. Eu ando ao redor do lado do motorista do
carro. A janela está aberta, eu espio dentro para ver a bagunça de
recipientes de comida velha, um maço de cigarros no painel, as pontas e
cinzas de cigarros velhos no cinzeiro.
Mas não é nenhuma dessas coisas que me faz abraçar meus braços em
volta de mim. É o que está pendurado no espelho retrovisor. Isso me dá um
flashback daquele dia. Aquele momento em que acenei para Angelique e me
virei para encontrar a van vindo em minha direção, os pneus saltando na
calçada como se o motorista tivesse perdido o controle, só que não. Eu tinha
visto seu rosto. Os olhos dele. Eu tinha acabado de bloquear tudo.
Ele não tinha perdido o controle.
Ele estava vindo para mim.
E o ursinho de pelúcia esfarrapado pendurado por um laço no pescoço
no espelho retrovisor tinha sido a visão mais horrível. Brinquedo de criança,
algo para dar conforto, tratado dessa forma. Lembro-me dele quicando,
batendo no para-brisa.
Eu preciso sair daqui. Agarrando minha bolsa para mim quando a alça
desliza do meu ombro, eu cavo as chaves enquanto saio da garagem.
Eu nem me endireitei quando bati em algo duro. Mãos ásperas se
fecham sobre meus braços para me acalmar. E quando olho para cima, é
como se estivesse olhando diretamente nos olhos de Danny Gibson. Mesmo
que isso seja impossível.
Vejo o vazio de que ainda me lembro. Esse abismo vazio.
E assim como naquela noite, minha garganta fica seca e não consigo
emitir nenhum som. Nem mesmo um guincho para pedir ajuda. Estou
impotente. Assim como naquela noite.
CAPÍTULO QUARENTA E QUATRO
JERICHO
— Ele está dentro? — Eu pergunto a Zeke enquanto ando até a porta
da frente de Jones. Ele mora a pouco mais de uma hora fora da cidade. Zeke
está parado na porta aberta. Jones é o legista que realizou a autópsia
original em Carlton Bishop e assinou a cremação do corpo.
— Em seu escritório.
A porta se fecha atrás de nós e dois homens montam guarda enquanto
entro, Zeke caminhando ao meu lado.
— Eu acho que ele não está feliz com isso. — eu digo quando
chegamos ao escritório. Zeke tem um homem aqui também.
— Não. Aparentemente, interrompemos uma viagem às Bahamas. —
Zeke finalmente encontrou Jones ontem à noite, quando ele estava
embarcando em um voo particular. Ele praticamente desapareceu da face
da terra nos últimos dias e eu me perguntei se ele não teria encontrado um
fim terrível nas mãos de Julia Bishop.
— Ele estava sozinho?
Zeke acena com a cabeça e abre a porta do escritório. — Mas não é
muito tagarela, não é, doutor? — ele pergunta quando entramos.
Abe Jones está sentado em uma cadeira de encosto reto que parece
ter sido trazida da sala de jantar. Seus pulsos estão algemados nas pernas de
cada lado dele. Atrás dele está outro guarda. Ele mantém o olhar na parede
atrás de nós. Esses soldados que contratamos são bem pagos tanto por sua
proficiência quanto por sua discrição.
— As algemas eram necessárias? — Eu pergunto a Zeke. Ele está em
seus quarenta e poucos anos pela aparência dele, embora pareça em forma,
não tenho dúvidas de que Zeke poderia levá-lo. Ele provavelmente iria
gostar. Sem mencionar os homens armados se ele de alguma forma
passasse pelo meu irmão.
Zeke encolhe os ombros. — Risco de voo. Não estava arriscando.
Eu rio. — E o olho roxo?
Zeke sorri. — Isso é por desperdiçar meu tempo e me mandar por toda
a porra da cidade procurando por ele, não é mesmo, doutor? — ele
pergunta essa última parte com drama exagerado.
— Vou denunciá-lo ao Tribunal assim que estiver livre dessas
restrições. Exigirei toda a extensão da penalidade pelo que você fez.
Eu levanto minhas sobrancelhas e olho para Zeke. — Pensei que você
disse que ele não era tagarela.
— Talvez ele esteja vindo. — Zeke diz. Ele se move para se sentar atrás
da mesa do homem e começa a vasculhar as gavetas.
Sento-me na ponta da mesa de centro de frente para o Sr. Jones. Eu
observo sua aparência desgrenhada. Ele não é membro do IVI, mas está na
folha de pagamento deles. Ele vem de uma longa linhagem de médicos
legistas e com o tempo IVI fez uso dos serviços de sua família.
— Duvido que o Tribunal ouça seu argumento, mas você pode tentar.
— digo, ajustando a gola de sua camisa. — Tire isso. — digo ao guarda,
apontando para as algemas.
— Sim, senhor. — ele diz enquanto Zeke faz um tsk atrás de mim. Eu
ouço o rangido da cadeira enquanto ele balança para frente e para trás nela.
Assim que Jones é libertado, ele esfrega os pulsos e vejo o Rolex
brilhante em um. É possível que custe mais do que todos os móveis aqui
juntos.
— Novo? — Eu pergunto, gesticulando para ele.
Ele sorri, esfrega uma mancha de sujeira inexistente, então acena com
a cabeça.
— É muito bom. Um presente de Julia Bishop?
Seu rosto perde um pouco da cor. — Ela ficou muito grata por me ter
feito a autópsia no Sr. Bishop tão rapidamente.
— Eu aposto. E o que ela pagou para você assinar o certificado de
cremação?
Seus olhos se arregalam e saltam ao redor da sala, parando na porta.
— Por favor, não me faça ter que persegui-lo. — eu digo. — Tem sido
um longo par de dias. — Levanto-me, estico os braços, estalo os dedos.
— Tem filhos? — Zeke pergunta. Ele encontrou um laptop e está
digitando algo no teclado.
— Não. — Jones diz, então muda seu olhar para mim enquanto eu
passo atrás de Zeke para olhar para a tela.
— Namorada? Um animal de estimação?
Jones balança a cabeça.
— Um peixinho dourado, talvez?
— Não.
Zeke vira a cabeça, balançando-a. — Faça isso rápido e me dê a senha,
sim?
— Por que você precisa disso?
— Curioso quanto você foi pago por alegar que um homem morreu de
ataque cardíaco quando ele claramente não morreu. — diz Zeke.
A boca de Jones se abre, qualquer cor restante em seu rosto
desaparecendo. — O que você está falando? A causa da morte de Carlton
Bishop foi uma parada cardíaca. Eu não teria mentido sobre isso. Posso
perder minha licença. Ou pior.
— Senha. — diz Zeke. Quando ele não responde, Zeke gesticula para o
guarda que acabou de desamarrá-lo. Ele agarra um punhado do cabelo de
Jones e puxa a cabeça para trás em um ângulo tão estranho, a cadeira cai e
sua coluna está dobrada de uma forma que me faz estremecer.
— México2020. — ele se apressa a dizer.
— Alguma maiúscula?
— M. Apenas o M.
Zeke digita e pronto, estamos dentro. — Não foi tão difícil, foi? — Zeke
pergunta e encontra o aplicativo bancário.
Eu ando em direção a Jones, pego a cadeira e aceno para o guarda
sentá-lo nela. Ele o faz, mas mantém uma mão pesada em seu ombro.
— Você já realizou autópsias para a Sociedade antes. Sua família
presta o serviço há muito tempo.
— Isso mesmo.
— Conte-me sobre o oleander.
Ele olha para mim, testa franzida, eu me pergunto sobre ele. Perguntome se ele realmente achava que Bishop morreu de ataque cardíaco.
— É uma planta. — diz ele.
— E um… — eu paro, gesticulando para ele preencher o espaço em
branco.
— Veneno.
— Bom. Trabalhando para o IVI você saberia sobre essas coisas.
— Não havia evidência de qualquer jogo sujo. — diz ele. — Senhor. O
coração de Bishop cedeu em meio a um evento apaixonante. Houve
testemunhas. Múltiplas.
— Então eu ouvi, mas prefiro não visualizar se você não se importar.
Ele agarra os lados da cadeira e espera que eu continue.
— Só havia evidência de parada cardíaca. Nada fora do comum.
— Você se deu ao trabalho de olhar?
Ele não responde.
— Você se incomodou, doutor Jones?
— Disseram-me que seria melhor agir o mais rápido possível e
enterrar o Sr. Bishop, considerando como ele morreu e o impacto que isso
teria em seu filho.
— Por quem?
Ele desenha seus lábios em uma linha apertada e seu olhar se afasta
de mim.
— Por. Quem?
— Sra. Bishop. O conselheiro Hildebrand concordou. Não havia razão.
— E quem assinou a cremação?
Ele limpa a garganta. Para que o corpo de um Filho Soberano seja
cremado, um Conselheiro e o legista devem assinar. Neste caso, Hildebrand
foi dito Conselheiro. Exceto que eu vi a assinatura dele.
— Conselheiro Hildebrand. — ele tenta.
— Então, se eu perguntasse ao Conselheiro, ele se lembraria do
evento? Ele tem uma ótima memória que eu saiba.
Ele desvia o olhar, gotas de suor brotando em sua testa.
— Jericho. — Zeke chama.
Deixo o médico e caminho até ficar atrás da mesa. Ele aponta para um
depósito na conta bancária de Jones de US $ 25.000 feito por Carlton Bishop
dias após sua morte.
— Carlton Bishop ficou muito grato pelo serviço da autópsia que você
realizou em seu cadáver ou foi a cremação rápida? — Eu pergunto a Jones.
— Essa era a Sra. Bishop. Ela assumiu a conta com seu filho sendo o
herdeiro, mas obviamente tão jovem. — Anéis de suor estão se formando
sob seus braços.
— E pelo que ela ficou mais grata?
Ele limpa a garganta. — Disseram-me que seria melhor para o menino.
Volto para ele, sento na ponta da mesa de centro novamente e entro
em seu espaço. — Pelo que ela ficou mais grata, Dr. Jones? — Eu pergunto,
inclinando-me para perto dele, deixando-o ver até onde estou disposto a ir
para extrair sua confissão.
— Ela disse que cuidaria da assinatura de Hildebrand depois que eu
assinasse. Ela iria vê-lo de qualquer maneira. Eu queria fazer uma ligação,
mas já era tarde e ela insistiu que tinha que ser feito.
— E você achou que estava tudo bem depois que ela depositou o
dinheiro em sua conta?
Agora ele engole em seco e fica muito quieto enquanto o suor escorre
por sua têmpora.
Eu me levanto, me viro para encontrar Zeke observando, com a
postura relaxada. Ele tem um lado sombrio, meu irmão, que ele esconde
bem. E o olhar em seu rosto é o mesmo que eu tinha visto naquele vídeo
granulado na Áustria. Dou-lhe um aceno de cabeça e ele reconhece o gesto.
Eu então volto para Jones que muda seu olhar de Zeke para mim. Eu alcanço
seu colarinho, puxo-o de pé e o bato na parede.
— Você já desperdiçou o suficiente do nosso tempo. Correndo.
Escondendo-se como um maldito criminoso. Reservando um avião particular
para as Bahamas e nos fazendo vir atrás de você. Eu vou te dar uma escolha.
Primeiro, responda a porra da pergunta e estaremos a caminho ou dois,
desperdice mais meu tempo e farei com que Hildebrand negocie com você.
Posso dizer que um Conselheiro não aceitará ter sua assinatura falsificada na
tentativa de ocultar provas do Tribunal. Qual será?
— Essa era ela. Eu não!
— Prossiga.
— Ela veio à minha casa com dois de seus homens. Caras grandes.
Como vocês dois. Como este. Quero dizer muito. Ela queria que o corpo
fosse cremado. Disse que mudou de ideia sobre o enterro. E quando eu
expliquei sobre o Tribunal, que um Conselheiro tinha que assinar, ela perdeu
a cabeça. Foi preciso um desses homens para acalmá-la e foi aí que ela me
pagou o dinheiro. Eu não pedi. Juro. Eu estava apenas com medo. Eu assinei
o que ela queria e quando eles saíram, eu fiz as malas e saí também. Eu não
estava fugindo de você. Eu estava fugindo dela. Deles. Eu estava apavorado
pra caralho. Ela é louca.
— Conseguiu tudo isso? — Eu pergunto, sem desviar o olhar de Jones.
Zeke repete a última parte. — Sim.
— Bom. Ligue para Hildebrand. Vamos trazer alguns homens para cá.
Meu telefone toca e eu libero Jones, que tropeça de lado antes de se
segurar. Leio o nome no visor. É o homem vigiando a casa Bishop.
— Sim? — Eu respondo.
— A mulher está em movimento. Acabou de sair com dois homens.
Olho para Jones, pensando em sua descrição dos homens. — E o
menino?
— Negativo.
— Siga-os. Deixe-me saber aonde ela vai. — O único lugar que ela
deveria ir é fora da cidade, mas deixar seu filho para trás? Isso não combina
muito.
— Sim, senhor.
Desligo e estou prestes a colocar meu telefone no bolso quando ele
toca novamente. Este é um número desconhecido, mas reconheço o código
de área. Está na cidade. Eu respondo.
— Sim?
— Jericho? — a voz de uma mulher diz. É familiar e eu tento localizála, mas antes que eu possa, ela fala novamente. — É Megs. — E no
momento em que ouço o nome dela, meu coração cai no estômago porque
não há razão para ela estar me chamando. — Eu fiz algo estúpido.
CAPÍTULO QUARENTA E CINCO
ISABELLE
Gerald Gibson me colocou dentro de casa em segundos. Ele é grande.
Como seu irmão. Mau também.
— Você grita e eu vou te nocautear. — ele me diz enquanto fecha e
tranca a porta atrás de nós.
O interior da casa é uma bagunça de recipientes vazios de comida,
bebidas e garrafas de cerveja. Pontas de cigarro transbordam dos cinzeiros.
Uma poltrona reclinável grande e desgastada está a poucos metros da
televisão. Posso ver queimaduras de cigarro nos braços do estofamento
marrom rasgado. Ao lado, uma garrafa de cerveja meio bebida. Há um sofá
mais ou menos da mesma forma que a cadeira contra a parede oposta.
Ele me arrasta em direção ao aparelho de TV e o liga, aumentando o
volume. É uma comédia antiga. A plateia ri enquanto sou arrastada para
dentro da casa. Através de um arco vejo uma sala de jantar, com uma mesa
redonda superlotada de lixo.
É para onde ele me leva, segurando meu braço. Ele pega um celular no
balcão entre a sala de jantar e uma pequena cozinha.
— Deixe-me ir. — eu finalmente consigo, ainda de alguma forma
segurando minha bolsa.
— Eu disse cale a boca, não disse? — ele me diz, segurando meu braço
com tanta força que vou ter um círculo de hematomas.
O telefone é um daqueles telefones flip mais antigos. Ele o abre com
uma mão, aperta uma série de botões e depois o pressiona no ouvido.
— Ela está aqui. — diz ele. Eu não ouço a pessoa do outro lado, mas
ele sorri e olha para mim. — Sim, é ela. Sem dúvida. — Tranquilo. Então o
sorriso desaparece. — Dez minutos. E traga o dinheiro.
Ele fecha o telefone e volta toda a sua atenção para mim.
Eu tomo uma respiração trêmula de ar que cheira levemente a mijo de
gato. Eu vejo o lixo no canto. Cheio demais. Eu olho ao redor. Em qualquer
lugar, menos em seus olhos. Porque eles são iguais aos olhos de seu irmão.
Exatamente iguais.
— Sente-se. — diz ele, levantando uma cadeira de madeira e costas
retas da mesa, colocando-me sobre ela no arco entre as pequenas salas. Ele
se inclina para perto de mim, sua respiração fedendo, me forçando a fechar
os olhos e me virar. Ele me diz para não me mexer.
Agarro a borda da cadeira, sem me mover. Ele solta meu braço para
alcançar por cima da mesa uma pilha de braçadeiras. Ele se vira para mim
com um sorriso malicioso.
— Boa menina. — diz ele. Ele se move atrás de mim. Pegando meus
braços e juntando-os, prendendo meus pulsos com uma longa gravata
laranja. Ele puxa com força para que o plástico penetre na minha pele
dolorosamente. — Machucou? — ele pergunta vindo para ficar na frente da
cadeira, seu olhar se movendo sobre mim.
Há um som de vibração e seu sorriso desaparece. É o telefone de
Megs. Ela deve estar tentando me ligar, mas eu silenciei. Nossos olhares
caem no chão e ele se inclina para pegar minha bolsa, abri-la, cavar dentro.
Ele espalha as fotos do ultrassom por todo o carpete manchado e imundo.
Ele pega o telefone, olha para a tela e o joga contra a parede oposta com
tanta força que eu grito.
Ele verifica o relógio e se vira para mim, aproximando-se,
descuidadamente esmagando algumas das fotos sob suas botas.
— Temos alguns minutos. — diz ele. — Vamos nos divertir. Meu irmão
sentiu o gosto, não foi? Disse que você era doce, quente e tão molhada
entre as pernas. — Essa última parte ele diz tão perto de mim que tenho que
prender a respiração. Meu coração dispara quando a memória daquela noite
retorna. Achei que os pesadelos eram muito reais. Mas isso, agora, estar
aqui, vendo este homem, sentindo-o tão perto, não são nada.
— A polícia está a caminho. — eu digo quando ele se agacha e coloca
as mãos nos meus joelhos. A sensação dele me tocando faz meu estômago
revirar. Ele afasta minhas pernas e eu gostaria de ter usado jeans hoje. Mas
eu usei o vestido de malha que Jericho gosta.
— Eles podem muito bem estar, mas se há uma coisa que eu sei sobre
nossos meninos de azul é que nunca há muita pressa para chegar a esta
parte da cidade. Além disso — ele diz, o olhar se movendo entre as minhas
pernas, para os meus olhos, então de volta para baixo enquanto ele
empurra a saia do meu vestido para cima. — Eu só quero um gosto rápido
da boceta de primeira linha. — Ele faz um gesto obsceno com a língua que
me faz recuar.
Ele desliza as mãos sobre minhas coxas e é como naquela noite. Assim
como quando seu irmão abriu o zíper da minha calça jeans e deslizou as
mãos pelas minhas coxas enquanto tirava minha calça jeans e calcinha. Vou
ter um ataque de pânico. Estou tremendo tanto. Minha respiração apenas
ofega.
Mas então meu olhar pousa em uma das fotos do meu bebê e algo fica
imóvel dentro de mim, algo endurece. Sem pensar conscientemente, eu ajo.
Eu levanto meu joelho, pegando-o no queixo. Seus dentes batem, o golpe
força sua cabeça para trás, derrubando-o de bunda. Eu então o chuto com
tanta força na cara que ele grita, cai com força, a cabeça batendo na parede.
Minha cadeira cai na direção oposta, meus braços presos embaixo dela, meu
próprio peso me prendendo lá.
Eu grito. Torcendo meus pulsos. Meus ombros. Eu o ouço xingar
quando ele se levanta. Eu levanto minha cabeça, tentando ver o que ele vai
fazer, me preparando para o pior.
Mas antes que isso aconteça, a porta se abre e nós dois nos viramos
para encontrar dois homens enormes entrando na casa.
Dois homens conhecidos.
E atrás deles, Julia.
CAPÍTULO QUARENTA E SEIS
ISABELLE
Os olhos de Julia encontram os meus e por um segundo, sinto alívio.
Por um momento estúpido, eu realmente me sinto aliviada.
Ela segura meu olhar brevemente, em seguida, observa Gerald Gibson,
que está de pé agora. Ele está cobrindo o nariz com as duas mãos, sangue
escorrendo dele.
— Ela quebrou meu nariz. — ele diz a ela, movendo-se em direção a
Julia.
Um dos homens rapidamente fecha e tranca a porta da frente, o outro
fica entre Julia e Gerald. Julia coloca a mão no ombro dele para empurrá-lo
de lado.
— Tire minha prima do chão. — diz ela. Mesmo que minha mente
esteja animada, algo mais profundo dentro de mim me diz para não confiar
nisso. Diz-me que ela não está aqui para me ajudar.
O homem se move ao redor de Gerald, derrubando-o apenas com o
ombro. Ele se aproxima de mim e sem cerimônia me puxa para cima da
cadeira. Meus pulsos e ombros latejam de dor.
Observo Julia se aproximar de Gerald, totalmente sem medo. Ela está
vestindo um terninho preto. Seus saltos altos habituais. Seu cabelo não está
muito certo. Está em um coque, mas o coque está caindo aos pedaços e sua
maquiagem está desbotada como se fosse da noite passada. Ela também
não está usando seu batom vermelho de assinatura. Olhando mais de perto,
o terno parece amarrotado. Como se ela o tivesse usado por um tempo.
Ela toca o rosto de Gerald, segurando seu queixo com a mão, as unhas
cravadas nele enquanto ela o vira de um lado para o outro para avaliar o
dano.
— Não está quebrado, Gerald. Não seja um marica. — Ela o libera com
um puxão. Gerald limpa o sangue do rosto na manga.
— Você trouxe o resto do dinheiro?
Julia detesta esse homem. Eu vejo isso em seu escárnio. Ela muda seu
olhar novamente para mim, mas apenas momentaneamente antes de voltar
sua atenção para Gerald.
— O trabalho não está bem feito, está? — ela pergunta a ele, então dá
um passo ao redor dele, vindo até mim.
O homem que endireitou minha cadeira está às minhas costas, sua
presença como a de um animal enorme.
— Prima. — diz ela, olhando para mim. — Você está bem?
Algo amassa sob seu sapato antes que eu tenha a chance de
responder. Nós duas olhamos para baixo para ver as fotos do ultrassom. Ela
levanta o pé porque empalou um com o calcanhar. A visão disso, o salto dela
através daquela foto, é tão horrível quanto aquele ursinho de pelúcia
pendurado pelo pescoço na van de Gerald Gibson. Estupidamente, sinto o
ardor das lágrimas quando o conhecimento de sua traição se instala
completamente.
— Foi você o tempo todo? Christian morreu por sua causa?
Ela tira a foto do calcanhar e a estuda, inclinando a cabeça ao fazê-lo.
Esta é uma Julia diferente da que eu conheço. Do que aquela que ela teve o
cuidado de me mostrar. Ela nunca foi carinhosa, mas algumas pessoas são
assim. Ela é uma mãe boa o suficiente para Matty, embora, pensando bem,
houve momentos em que ela foi distante mesmo com ele.
Ela vira seu olhar para o meu e sorri, toda dentes. — Não é fofo. — Ela
olha para a variedade de fotos espalhadas aos nossos pés, desgosto
curvando seus lábios.
— Christian morreu por sua causa? — Eu pergunto novamente, minha
voz mais forte.
Ela parece surpresa com a pergunta ou talvez com meu tom, porque
ela deixa cair a foto no chão e me olha direto, estreitando os olhos.
— Isso realmente era Carlton. Embora eu tenha ajudado a limpar a
bagunça dele.
— Por quê? Por que você faria isso?
— Porque não havia como manter em segredo o fato de que você é
uma Bishop. Muitas pessoas sabiam, incluindo IVI e fomos encurralados.
Sendo que Carlton era casado e éramos primos, bem, o fato de Matty ser
filho dele e herdeiro legítimo poderia ter sido contestado. Monique sabia.
Ela sabia que o marido passava as noites na minha cama e fazia vista grossa.
Depois dos abortos ela estava um desastre de qualquer maneira.
Abortos. Monique teve vários. Lembro-me de Julia me contando sobre
eles.
— Ela era fácil de lidar. — continua Julia. — Estúpida. Como todas as
esposas de Carlton.
Estou enjoada. Sempre me perguntei sobre Monique. Mas ela estava
apenas quebrada. Julia a tinha quebrado.
— Os abortos… Você… — Eu não posso dizer isso. Mesmo sabendo o
que sei sobre ela, não posso dizer. Mal consigo pensar.
— Oh, não seja tão idiota. Matty é o herdeiro legítimo. Carlton deveria
tê-lo reconhecido, mas ele recusou. Ele ameaçou me cortar se eu fizesse ou
dissesse algo sobre nós. É por isso que ele deu a Monique a casa na França.
Para calá-la sobre isso. Não sei por que ele se importava. Não é como se
houvesse algo de errado com ele. — Ela se afasta alguns passos, enfia a mão
no bolso de trás e tira algo. — Gerald, venha aqui. — Ela está de costas para
mim, então não vejo o que é que ela entrega a ele. — Você quer o resto do
dinheiro? Eu tenho. Em dinheiro. Naquela bolsa ali.
Ela aponta para uma pequena mochila preta jogada ao lado da porta.
Eu não tinha percebido que ela tinha trazido alguma coisa para dentro.
Gerald olha para ela também. Eu os assisto. Ele olha para o que ela acabou
de entregar a ele, depois para mim, depois de volta para Julia.
— Termine o trabalho, Gerald.
Gerald dá um passo em minha direção e finalmente posso ver o que
ele está segurando. Um canivete. Pequeno mas afiado. Mortal.
— Termine o trabalho e todos nós podemos viver felizes para sempre.
Bem, não minha querida prima, mas o resto de nós.
CAPÍTULO QUARENTA E SETE
JERICHO
Eu piso no freio, o carro parando meio no gramado em frente à casa
de Marjorie Gibson. Nossa chegada não será uma surpresa para os que
estão lá dentro. Ao longe, ouço as sirenes dos carros de polícia que Megs
chamou. Dois dos guardas que estavam conosco na casa de Jones saem do
banco de trás, armas em punho enquanto corro em direção à porta da
frente, Zeke nos meus calcanhares.
Eu não tenho uma pistola. Não tenho nenhuma arma. Mas não me
importo. Eu preciso entrar. Preciso chegar a Isabelle. Mesmo que Julia tenha
conseguido perder o rastro que eu tinha nela, vejo o Rolls Royce de Carlton
na garagem. Quando chego perto da porta da frente, ouço uma TV e vem a
voz de Julia Bishop dando a ordem de matar minha esposa.
Quando encontro a porta trancada, bato meu ombro contra ela. Não
dá.
— Termine isso! Agora! — Julia grita. Ela sabe que foi pega. Ela está
sem opções. E isso a torna ainda mais perigosa.
— Senhor! — Um dos homens grita, apontando sua pistola para a
maçaneta da porta.
Eu me afasto e ele atira. A porta se abre e eu estou dentro em um
instante. Nesse mesmo momento, um tiro ressoa, uma bala rasgando meu
ombro me mandando para trás um passo, dois, antes que eu recupere o
equilíbrio.
O homem que abriu a porta entra, disparando sua arma. Isabelle grita.
Entro mais fundo na casa, absorvo a cena. Um homem no chão. Outro
apontando uma pistola para quem matou o cara. Outro dos meus homens
abre caminho pelos fundos da casa, Zeke em seus calcanhares. Ele está
armado. Eu não sabia que ele estava armado.
O soldado deles atira no meu, uma bala acerta bem no peito dele,
derrubando-o. Ele tem uma arma automática e enquanto eu corro em
direção a Isabelle e Julia, ele manda mais tiros pela sala onde Zeke e o
último dos meus homens atiram de volta.
Eu me agacho, meu ombro queimando. E tudo o que vejo através da
dor e da fumaça é Isabelle. Isabelle amarrada a uma cadeira, presa ali,
incapaz de correr, de se abrigar. Gerald Gibson está a poucos metros dela.
Na minha periférica, Julia Bishop salta em direção a ele enquanto eu corro
para proteger minha esposa do ataque de balas.
Eu derrubo sua cadeira de lado, grunhindo com a força dela,
conseguindo deslizar minha mão sob sua cabeça antes que ela atinja o chão.
Ela grita e eu ouço o esmagamento do osso. Vejo as fotos do nosso bebê
espalhadas neste chão imundo enquanto os tiros marcam as paredes.
Um grito de morte vem de Julia quando ela cai em cima de mim. Eu
me viro para ela, vejo o arco de seu braço e levanto o meu para detê-la. Ela
empunha o canivete em direção ao estômago de Isabelle. Eu torço meu
corpo entre ela e aquela lâmina curta e afiada para detê-la. Para parar a
repetição da história e sentir instantaneamente a dor ardente da faca
mergulhando no meu lado.
Meu corpo fica tenso, meus braços cedendo, incapazes de segurar
meu peso. Julia se afasta de mim e cai no chão sangrando ao meu lado.
Isabelle está presa embaixo de mim. As fotos do nosso bebê estão ficando
vermelhas enquanto o sangue penetra na pequena vida capturada naquela
foto, arruinada.
Quando levanto os olhos daquela foto, a última coisa que vejo são os
olhos de Isabelle. Aquele olhar azul demais. Cacos de vidro. Linda demais
para este mundo. Linda demais para um mundo tão feio.
E embora eu saiba que ela está gritando meu nome, não consigo mais
ouvi-la. Eu mal posso vê-la enquanto minha visão se desvanece e o mundo
acaba para mim como deveria ter acontecido há tantos anos.
CAPÍTULO QUARENTA E OITO
ISABELLE
Ele morre na ambulância. Eu ouço a parada cardíaca e grito para os
paramédicos me deixarem ir até ele, mas eles me seguram. A dor no meu
braço é insuportável quando eles fazem.
Seu rosto está pálido. Olhos fechados. Boca folgada. Sangue escorre
de seu lado, seu peito. E um dos paramédicos está contando, fazendo
compressões, outro está dando oxigênio.
— Volte para mim! Você volta para mim! — Eu grito e soluço. Tão
perto dele, mas incapaz de tocá-lo. De segurá-lo. Para fazê-lo voltar. — Por
favor. Deus. Por favor!
Chegamos ao hospital e as portas se abrem. Enfermeiras e médicos
nos encontram, carregando a maca de Jericho, as compressões nunca
cessando, que contam com um loop quando sou levantada. Eles correm com
ele para o hospital, eu consigo correr atrás deles, não me importando com
meu braço estúpido quando ele pode ter ido embora.
— Jericho! — Eu grito seu nome enquanto eles o empurram pelas
portas. Então eu ouço. A linha plana da máquina mudando, apitando em um
ritmo.
— Ele voltou! — alguém chama e eu quero abraçar essa pessoa. Eles o
empurram por outro conjunto de portas e assim que alguém me impede de
segui-lo, ele abre os olhos. Apenas por uma fração de segundo, Jericho abre
os olhos e eles travam nos meus. O tempo parado para nós. O tempo parado
e o único som é o de máquinas e ecos de pessoas próximas, mas não mais
aqui. Não neste espaço conosco. Esta bolha do tempo. Coloco a mão na
boca e um soluço me escapa. Quando ele sorri, estendendo a mão que
repousa sobre seu coração em minha direção, sei que ele me ouve. Eu sei
que ele me vê. E eu sei que ele vai voltar para mim.
Quando ele desaparece por aquelas portas, sou impedida de entrar.
Eu afundo no chão e soluço, me entregando aos médicos e enfermeiras.
Exausta demais para fazer qualquer outra coisa.
CAPÍTULO QUARENTA E NOVE
JERICHO
Ela está dormindo na cadeira em frente à minha cama. Eu a observo
enquanto as máquinas apitam ao meu redor. O que quer que eles estejam
bombeando em mim torna difícil manter meus olhos abertos, mas eu luto
contra isso. Eu quero vê-la. Eu preciso vê-la.
Seu braço esquerdo está enfaixado do pulso até o cotovelo. Há um
pequeno curativo em sua testa e arranhões em sua bochecha. Ela está
usando meias grossas e aquele vestido de malha, mas o braço foi cortado e
parece que passou pelo inferno.
Eu acho que passou. Nós todos temos.
Mudo meu olhar para o teto. Eu morri hoje. Fiquei paralisado por mais
de três minutos. A última coisa que me lembro antes de desmaiar foram os
olhos de Isabelle. O pânico dentro deles.
Eles falam sobre sua vida passando diante de seus olhos no momento
da morte, mas para mim, eu vi aquela manhã brilhante e ensolarada no
México que se transformou no dia mais sangrento da minha vida. Agora,
segundo o que aconteceu esta manhã. Senti Kimberly morrendo em meus
braços. E então eu vi o rosto dela. Não sangrenta e sem vida como tinha sido
então. Não cinza e folgado. Eu a vi como ela era. Jovem, brilhante e bonita
usando um de seus sorrisos felizes. Ela segurou minha bochecha, alheia ao
sangue, então colocou a mão sobre meu coração e nunca disse uma palavra.
Apenas sorriu.
Então ela pegou minha mão esquerda, seu olhar na aliança de
casamento lá. Ela girou ao redor e ao redor do meu dedo. Juro que ainda me
lembro da sensação. Antes que eu pudesse tentar explicar as coisas, explicar
o que fiz para vingar seu assassinato, explicar que me apaixonei por Isabelle,
ela colocou a mão sobre meu coração e se inclinou para beijar minha testa.
Eu sabia que ela me perdoou então. E mais. Ela me deu sua bênção.
Disse-me adeus.
Quando abri meus olhos novamente, estava de volta a este mundo,
dolorosamente trancado em meu corpo. Então eu vi o rosto de Isabelle.
Ouvi-a gritar meu nome. A vi parar quando nossos olhos se encontraram por
um breve momento antes de eu afundar novamente, apenas para acordar
horas depois nesta cama de hospital.
O movimento pela sala chama minha atenção. Eu mudo meu olhar
para minha esposa, que acorda do sono e abre os olhos. Ela endurece
momentaneamente e quando eu sorrio, ela está de pé e ao meu lado, com
as mãos em concha em uma das minhas mãos.
— Você está acordado.
— Só por um minuto, eu acho. — eu digo com voz rouca, as drogas
como mãos querendo me puxar para baixo.
— Eu entendo. — diz ela sorrindo, olhando para mim e afastando o
cabelo da minha testa. — Durma, Jericho. Estarei aqui quando você acordar.
Não sei quantos dias se passaram quando abro os olhos novamente.
Estou no mesmo quarto, mas os sons ao meu redor são diferentes. Não
tantas máquinas.
— Já estava na hora. — vem uma voz masculina.
Olho para ver Zeke se levantar e se aproximar da cama. Parece que
acabou de chegar do escritório.
— Você está fora há três dias. — ele me diz.
Minha garganta está tão seca que não consigo falar. Olho para o copo
na mesa de cabeceira. Ele pega, traz o canudo aos meus lábios e eu bebo. É
o céu. Eu posso beber.
Quando termino, ele o coloca de lado e puxa uma cadeira para perto.
— Como você está se sentindo?
— Já estive melhor. — digo, embora não sinta dor. Apenas rígido e
cansado. — Você está bem?
— Nem um arranhão em mim. Nossos homens estão bem. Robert
precisou de cirurgia, mas está fora e se recuperando em casa. Você levou o
peso do dano. Bala no ombro. Faca perfurando o seu rim direito. Você está
reduzido a um agora, então tente não ser esfaqueado do outro lado.
Eu tento um sorriso. — Isabelle?
— Eu a mandei para casa para tomar banho e comer alguma comida
decente. Além de algumas horas naquele primeiro dia, ela não foi embora.
Eu sorrio. — Bom. Ela está bem?
Ele concorda. — Ela está bem e o bebê está bem. — diz Zeke. — Braço
quebrado, alguns pontos, mas nada grave. Você salvou a vida dela.
História se repetindo? Não dessa vez. — Julia?
— Levou duas balas, mas sobreviveu. Ela está se recuperando algumas
portas abaixo. Os guardas do IVI estão à sua porta. Quando ela sair do
hospital, ela passará seus dias em uma cela do Tribunal.
Concordo com a cabeça, mas a notícia não me deixa feliz. Como
poderia? — Gibson?
— Morto. Bala na cabeça.
— Bom. Eu deveria ter feito isso quando soube de sua existência.
— Tudo correu para o lado, mas todos estão bem. Não se martirize.
Acho que você já fez o suficiente disso, não é?
Lembro-me do sonho. Não, não foi um sonho. Era Kimberly.
Então me lembro de outra coisa. Alguém. — Onde está o menino dela?
Matty?
Ele limpa a garganta, me estuda por um longo momento. — Bem,
Isabelle o trouxe para casa, na verdade. Ele estava sozinho na casa, Jericho.
Aquela cadela o deixou lá sozinho. Isabelle o encontrou na cozinha tentando
fazer uma tigela de cereal para o jantar quando a mamãe querida não voltou
para casa.
— Jesus.
— Angelique e mamãe estão olhando ele. E Catherine, claro. Ela está
enchendo o pobre garoto e eu juro que ela o pega para abraçá-lo sempre
que pode.
— Essa é Catherine. Angelique e mamãe estão em casa então?
— Sim. Liguei para o Dex depois da cirurgia. Angelique tem pedido
para ver você.
— O que você disse a ela?
— Que algumas pessoas más tentaram machucar Isabelle e que você a
salvou.
— Você não poderia dizer a ela que eu estava em uma viagem de
negócios?
— Ela é mais esperta que isso, irmão. Ela veria através dele. Além
disso, você viu um espelho?
— Porra. É ruim?
A porta se abre antes que ele possa responder e Isabelle espia sua
cabeça para dentro. Dex segura a porta aberta sobre a cabeça dela.
— Jericho! — Ela corre e apenas se segura antes de jogar seu corpo
em cima de mim. Ela sorri para mim, beija minha testa, minha boca, depois
se vira para Zeke. — Você disse que ligaria no instante em que ele abrisse os
olhos.
— Ele literalmente acabou de abri-los.
— E eu não recebi uma ligação.
Eu sorrio para a expressão do meu irmão e estendo a mão para tocar
seu cabelo. Ela o deixou solto nas costas. É macio e ainda um pouco úmido
do banho. Ela está vestida com jeans e uma das minhas camisas com o braço
aberto para seu gesso amarelo brilhante.
— Essa é a minha camisa? — Eu pergunto.
— Oh. — ela olha para ela. — Sim. Eu não achei que você se
importaria. Você tem tantas.
— Hum.
— E, além disso, cheira a você.
Eu aperto a mão dela.
— Chefe. — diz Dex. — Espero que você esteja se sentindo melhor do
que parece.
— Bom ver você também, Dex.
— Eu vou para casa. — Zeke diz. — Descansar um pouco eu mesmo.
Você vai ficar? — ele pergunta a Isabelle.
Ela puxa uma cadeira ao lado da minha cama. — Eu não estou indo a
lugar nenhum. — Ela se vira para acenar para Dex e Zeke, mas quando ela
olha para mim novamente, sua expressão é séria, os olhos embaçados. —
Você salvou minha vida. Você quase morreu fazendo isso. Eu não tenho
palavras.
Eu a estudo, vejo sua inocência, sua honestidade, o bem dentro dela.
— Que tal obrigado.
Ela sorri, enxuga uma lágrima perdida. — Obrigada.
Eu concordo. — Você não está fora do gancho embora. Você e eu
temos um acerto de contas vindo quando eu estiver fora daqui.
Ela cora, abaixa o olhar. Acena. — Eu sei. Sinto muito por não ter
confiado em você. Lamento que você tenha se machucado por minha causa.
Muitos outros se machucaram por minha causa.
— Você não estava segurando as armas ou a faca. Isso não é com
você. Julia ia atacar. Era apenas uma questão de tempo. Eu a encurralei em
um canto.
— Mesmo assim.
— Ela usou um veneno para matar Carlton. Ela possivelmente estava
por trás da morte de Christian.
— Eu sei.
— E quem sabe quem mais ela esteve machucando.
— Os abortos que você quer dizer?
Eu concordo. — Não posso provar isso, mas é coincidência demais.
Quatro esposas. Nunca um único filho, mas um dela. Meu palpite é que o
caso deles estava acontecendo a mais tempo do que sabemos. Eu me
pergunto se ela sempre teve seus olhos nessa herança.
— Vou falar com ela esta tarde.
— Como diabos você vai. Você vai fazer o que disse e ficar parada. Sua
bunda naquela cadeira. Estou sendo claro?
— Jericho, eu preciso perguntar a ela…
— Sua bunda naquela cadeira. Fui claro?
Ela considera, abre a boca, mas eu a interrompo.
— Aquele acerto de contas que mencionei? Você não quer acrescentar
ao que estou planejando.
Ela fica vermelha.
— Nós vamos fazer as coisas de forma diferente daqui para frente,
Isabelle. Vamos confiar um no outro. Não há mais segredos. Chega de meias
verdades. Não há mais espaço entre nós. Você entende?
Ela acena. — Eu gosto muito disso.
— Bom. Porque eu gosto muito de você. Não. Isso não é tudo. Eu te
amo.
CAPÍTULO CINQUENTA
ISABELLE
Jericho chega em casa alguns dias depois. É a primeira vez que
Angelique o vê desde que saiu de casa e posso ver a ansiedade em seu rosto
enquanto espera pelo pai. Matty está ao meu lado segurando minha mão e
chupando o outro polegar. Eu acho que ele ainda está um pouco em choque
com a mudança e de não ver sua mãe. Ele é muito jovem para entender o
que está acontecendo.
Mas quando a porta se abre e Jericho entra com os gritos de surpresa,
ele para. Ele leva um momento para observar os balões e decorações que
Angelique, Matty e eu fizemos.
— Papai! — Angelique corre para ele, parando de se jogar em seus
braços. Dissemos a ela que ele teria que ir com calma.
Mas Jericho se agacha e abre bem os braços. — O que você está
esperando? Estou cheirando mal? Eu tomei banho…
— Não bobo! — ela joga seu peso em seus braços, eu o vejo
estremecer. Mas ele fecha os olhos e a abraça com tanta força que acho que
o abraço vale o desconforto.
— Meu pequeno anjo.
— Estou tão feliz que você está em casa. Estou tão feliz que estamos
todos em casa. — diz Angelique.
Ele se endireita, levantando-a com ele. Quando Zeke entra para pegála, ele balança a cabeça. — Eu a peguei. — Ele caminha até mim, me beija e
nos abraçamos como uma família. Então ele recua, se agacha novamente,
colocando Angelique de pé.
Angelique se move ao redor dele para tirar a mão de Matty de sua
boca e segurá-la.
— Papai, este é Matty. Ele é meu novo amigo. E Matty, este é o meu
pai. Eu te falei sobre ele. Ele é como seu tio. Certo? — ela vira o rosto para
mim para perguntar.
— Um sim. Isso mesmo. — Ok, isso lida com isso.
— É muito bom conhecê-lo, Matty.
Angelique cutuca seu pai. — Aperte a mão dele. — ela sussurra em voz
alta.
— Oh. É claro. — Jericho estende a mão e Angelique coloca a pequena
de Matty dentro. Jericho sorri e Matty tenta. — Qual quarto você pegou,
amigo?
— Aquele ao lado de Angelique. — ele diz baixinho.
— Ah, esse é bom. — ele diz, então se aproxima. — Ela não está
fazendo você brincar com as bonecas princesa dela, está?
O sorriso de Matty se alarga. — Só um pouco. Eu disse a ela que não
estou me vestindo como uma.
— Essa é uma decisão inteligente. — Jericho diz e se levanta,
bagunçando seu cabelo.
Angelique pega as duas mãos de Matty. Ela é tão doce com ele e
embora ele seja apenas um ano mais novo que ela, ela o trata como se ele
fosse um bebê e quer cuidar dele. — Devemos ir comer bolo, Matty? Acho
que, como é uma ocasião especial, eles vão nos deixar comer bolo no
almoço. Vamos.
— Tudo bem. — Matty responde e se deixa levar.
Todos nós os vemos desaparecer na sala de jantar. Então ouço a voz
de Megs. Assim como Jericho e ele se vira para mim. Dex e Zeke se tornam
escassos.
— Eu tenho outra surpresa para você! — Eu me aproximo dele, coloco
minhas mãos em seus ombros e beijo sua bochecha. — Megs está aqui! E ela
trouxe bolo.
— Vou trocar algumas palavras com Megs do lado de fora da sala de
jantar. — Ele tenta dar um passo ao meu redor, mas eu me movo para
bloqueá-lo.
— Não foi culpa dela. Ela não queria que eu fosse. Eu fiz a cabeça dela
para mim. Foi tudo minha culpa.
Ele levanta as sobrancelhas, nesse momento, Megs entra no corredor
e limpa a garganta.
Nós dois nos viramos para vê-la se aproximar. Ela estende uma
pequena caixa de presente para Jericho. — Uma oferta de paz.
Ele resmunga.
Eu o cutuco. Ele pega a caixa e a abre. Dentro há um cartão-presente
de Cotton Candy. — O que diabos é isso?
— Bolo ilimitado. Fornecimento vitalício. Para você e para sua família.
— Megs sorri.
Ele lê o pequeno cartão, em seguida, olha para ela.
— Olha. — ela diz, a Megs que eu conheço de volta. — Nós dois
amamos Isabelle. Eu já amo Matty e aquela sua garotinha está nessa lista
agora também, então sinto muito pela minha parte nisso. Eu nunca deveria
ter deixado minha amiga teimosa — ela lança um olhar de repreensão para
mim — Correr com sua ideia estúpida. — Outro olhar.
Jericho sorri.
— Mas eu fiz e estou tão feliz que você está seguro. Se um pouco pior
para o desgaste. — ela diz a ele.
Ele resmunga.
— Mas nós vamos estar na vida um do outro e estranhamente,
Jericho, eu não gosto de você. Esquecer o passado?
Ele olha para o cartão novamente e depois volta para Megs. — Eu não
suponho que eu não goste de você também. Você é insistente e uma
tomadora de decisões ruim, mas acho que você tem boas intenções.
— Uau. — eu digo, mas ambos me calam.
— Bem-vinda à minha casa, Megs.
— Obrigada, Jericho. Ah e você tem que agradecer pelos balões. — ela
acrescenta enquanto a seguimos até a sala de jantar. Parece uma explosão
de cores pastel com tantos balões balançando pelo teto, as crianças pulando
para tentar pegar as fitas.
— Oh ótimo. — Jericho murmura.
— Estou feliz que você tenha gostado. — diz Megs. — E de nada.
Eles trocam um sorriso amigável e pela primeira vez desde que
conheço Jericho St. James, todos nos reunimos quase como uma família
normal e comemos bolo. Apenas bolo.
CAPÍTULO CINQUENTA E UM
JERICHO
Por insistência de Isabelle e com o jovem Matty em mente, entro no
escritório de Hildebrand e fecho a porta. O Conselheiro está sentado ao lado
do Juiz no sofá de couro em seu escritório, a papelada espalhada diante
deles na mesa de centro.
— Senhor. St. James. — ele diz e se levanta.
— Conselheiro. Obrigado por me ver. Juiz. Obrigado por ter vindo. —
Nas últimas semanas, tenho consultado Lawson Montgomery para lidar
legalmente com a questão Matty-Julia. Dado o seu conhecimento do sistema
jurídico e a sua posição no IVI, é um bom aliado.
— Sente-se. — Ele gesticula para o copo de uísque em sua mesa. —
Você gostaria de um? Acho que nós dois podemos precisar disso.
— Eu acho que você provavelmente está certo.
Ele me serve um copo, reabastecendo o dele e o do Juiz, então se
senta novamente. — Isso é muito fora do comum.
— Eu percebo isso.
— A discrição será de extrema importância, como sempre parece ser
quando se trata de meus negócios com você.
Foi assim que começamos nossas conversas sobre Isabelle. — Acho
que queremos a mesma coisa. Afinal, há uma criança envolvida.
— Como está o menino?
— Indo bem. Ele se acomodou bem.
— Bom. E sua esposa?
Eu sorrio com a menção dela. — Também indo bem. — A barriga está
arredondada com a gravidez e ela está ainda mais bonita do que já era.
Já se passaram quatro meses desde os eventos na casa de Gerald
Gibson. Matty se instalou e não é o garotinho assustado que era no primeiro
dia em que o conheci. Ele é doce, extrovertido e entre ele e Angelique, a
casa está sempre cheia de risadas e alegria. É mais maravilhoso do que eu
jamais poderia ter imaginado.
Ele ainda pergunta sobre sua mãe, mas não há nada que possamos
fazer sobre isso. Nós dissemos a ele que ela precisa ir embora por um
tempo, ele parece aceitar isso, embora eu possa ver que ele está confuso.
Graças a Hildebrand, pelo menos pudemos deixá-lo vê-la duas vezes.
E esse é um dos motivos de eu estar aqui.
— Vamos tirar o mais fácil do caminho primeiro. — começa
Hildebrand. — Sr. Jones foi repreendido por seu papel na destruição de
evidências no que diz respeito à cremação do corpo de Carlton Bishop. Ele
foi ameaçado e eu acredito nele. Eu lidei com a Sra. Bishop e sei como ela
opera.
— Isso é bom. Confio que a experiência e a reputação do Dr. Rosseau
se oporiam à de Jones, caso acontecesse.
— Não vai. Esse capítulo está fechado. Mas o assunto da Sra. Bishop.
Eu respiro fundo.
— Eu certamente não teria pensado que você, Jericho St. James,
estaria aqui em seu nome para implorar para que sua vida fosse poupada.
Implorar. Eu não gosto dessa palavra. — Nem eu, Conselheiro. E eu só
estou aqui pelo bem do garoto. — E Isabelle porque seu coração é muito
gentil para querer olho por olho. Ela perdoa demais. Mas Hildebrand não se
comove com a natureza gentil de Isabelle. Um Filho Soberano, no entanto?
Ele vai se virar para Matty Bishop.
— E essa é a única razão pela qual eu concordei. — ele diz, mas eu me
pergunto se isso é verdade. Julia também o usou. E ele sabe disso. Trazê-la
perante o Tribunal não o esclarecerá. Como Conselheiro, ele é imune a
punição, mas seu nome seria arrastado pela lama. Ele provavelmente teria
que renunciar a sua posição. A humilhação seria muito grande e nós dois
sabemos disso.
Juiz limpa a garganta. — Acho que chegamos a uma resolução que
serviria melhor para a criança. — Ele abre a pasta na mesa e coloca a
papelada. Eu já sei o que diz, então me sento e tomo meu uísque enquanto
o Juiz passa por ele.
— Sra. Bishop concordou em abrir mão de seus direitos sobre a
criança. Matthew Bishop será adotado por sua prima Isabelle e Jericho. Ele
será criado com seu próprio sobrenome e vendo como as casas agora estão
unidas, faz mais sentido para ambas as famílias.
— E quem controlará a herança até que ele atinja a maioridade.
Eu sorrio, seguro meu copo em um brinde. — Bem, como chefe da
família, é claro que sou eu.
— Ah. Claro. — diz Hildebrand.
— Não fique assim, Hildebrand. Não tenho intenção de desmantelar o
futuro do menino. A disputa entre os Bishops e os St. James acabou. Acho
que todos nós já pagamos um preço alto o suficiente. O muro entre nossas
propriedades será derrubado, as casas unidas. Você tem que concordar, será
bom para todos, incluindo a Sociedade.
Ele estuda a papelada, acena com a cabeça. — E a parte do Tribunal
nisso… — ele para.
Juiz fala. — Você poupará a vida de Julia Bishop. Ela viverá no exílio da
criança e da Sociedade sob prisão domiciliar perpétua em um local de sua
escolha, Conselheiro.
— Às custas do IVI? — ele pergunta, sobrancelhas levantadas.
— Às minhas custas. — eu digo.
— E a localização será secreta se eu estiver entendendo isso
corretamente? — Hildebrand pergunta.
— Você está. Ninguém pode ou vai saber. Ela simplesmente
desaparecerá de todas as nossas vidas enquanto vive isoladamente. Ela não
vai infectar mais ninguém com seu veneno.
Ele olha para mim, sorri. Aqui vem. Sua vingança sobre Julia Bishop. —
Conheço um lugar perfeito. Ela vai odiar.
— Excelente.
Passamos mais uma hora acertando os detalhes, depois de assinar os
formulários, me despeço para voltar para casa, para minha esposa e família.
EPÍLOGO UM
ISABELLE
Christian St. James chega duas semanas antes da data prevista para o
parto. Ele é lindo. Perfeito. E enquanto me sento na minha cama de hospital
vendo-o adormecer enquanto mama, penso em como estou feliz. Eu não
tinha percebido quanto tempo fazia desde que eu me sentia feliz. É estranho
como você esquece algo assim ou não percebe que está faltando até sentir
novamente.
Uma batida suave chama minha atenção. Jericho abre a porta e espia
para dentro, sorrindo quando nos vê.
— Eles estão acordados? — vem o sussurro alto de Angelique
enquanto ela passa por baixo do braço dele e entra no quarto. — Belle! —
ela grita animadamente quando me vê, assustando o bebê.
— Angelique. — Jericho começa. — Nós conversamos sobre ficar
quieta, lembra?
— Opa! — Ela corre em nossa direção, trazendo consigo cerca de uma
dúzia de balões que batem na porta. Ela abre caminho para dentro e atrás
dela, a mãozinha dele na dela, segue Matty, segurando um balão.
— Desculpe por isso. — Jericho diz enquanto fecha a porta e empurra
os balões de hélio para fora do caminho. — Maldita Megs e seus malditos
balões. — ele murmura. Eu vejo que ele também está carregando uma caixa
de Cotton Candy que ele coloca em uma mesa próxima.
— Não, está bem. O bebê precisa comer de qualquer maneira e ele
continua caindo no sono. — eu digo enquanto Angelique e Matty olham
para ele.
— O que ele está fazendo? — Matty pergunta.
— Bebendo leite. — diz Angelique. — É como os bebês comem.— ela
explica, virando-se para ele e soltando sua mão.
— Vamos dar a Isabelle e ao bebê algum espaço. — Jericho diz,
colocando as mãos em suas cabeças e empurrando-as para o lado enquanto
ele se aproxima de mim. Ele me beija, em seguida, beija a cabecinha de
Christian.
Eu olho para ele, olho para os dois pequeninos, Matty chupando o
dedo, Angelique sorrindo tanto enquanto observam Christian com
admiração. É apenas a segunda vez que o veem.
— Vocês dois gostariam de segurá-lo? — Eu pergunto uma vez que
Christian desmama. Eu o embalo para esfregar suas costas.
— Sim, por favor! — Angelique diz com um pulo assim que Christian
solta um pequeno arroto.
— Venham aqui então vocês dois. — Jericho diz, levantando Matty no
assento e ajudando os dois a se acomodarem na grande poltrona lado a
lado. Matty raramente sai do lado de Angelique. Ele a ama como uma irmã
mais velha e ela o adora.
— Preparada! — Angelique diz, braços estendidos.
Jericho se vira para mim. — Eu vou mantê-lo. — ele me diz.
Eu aceno com a cabeça, entrego o pequeno pacote e o observo, este
homem gigante, um grande ursinho de pelúcia enquanto ele embala seu
filho e cuidadosamente o coloca nos braços de sua filha. Ele se agacha perto
deles, falando com os dois em sussurros. Matty espia o rosto de Christian
enquanto Angelique ajusta seu chapeuzinho.
— Pronto, isso é melhor, baby. — ela sussurra.
Jericho olha para mim e sorri. Somos uma família agora. Uma
verdadeira família. Angelique começou a frequentar uma escola adequada e
Matty frequenta a creche na mesma escola três vezes por semana por
algumas horas. Isso fez um mundo de diferença para Angelique. Ela está
aprendendo muito, mas não só isso, ela saiu de sua concha. Ela é menos
tímida, mais confiante e menos medrosa. Mais curiosa. Como toda garotinha
de sua idade deveria ser.
Matty está indo bem também. Ele pergunta por sua mãe todas as
noites, mas parece aceitar que ela está fora. Vamos levá-lo para vê-la
novamente em algumas semanas. Faz parte do acordo. Ela vai vê-lo quatro
vezes por ano com supervisão e ela aceitou. Pelo menos ela parece, mas a
alternativa, o que ela enfrentaria com o Tribunal não deixou muita escolha.
Às vezes sinto pena dela, mas depois me lembro das coisas que ela fez.
Todas as pessoas que ela machucou e até pior. Eu sei que até certo ponto
ela estava protegendo seu filho e a si mesma. E eu entendo que ela pode ter
amado Carlton uma vez, mas no final, o que ela fez com ele, isso não é amor.
E também não desculpo Carlton. Não por nada disso. Talvez um dia eu vá,
mas hoje não é esse dia.
Cerca de vinte minutos depois, Leontine vem buscar as crianças.
Jericho passará a noite aqui com Christian e eu, amanhã de manhã, vamos
todos para casa.
Uma vez que estamos sozinhos e Christian está acomodado em seu
pequeno berço, ele puxa a cadeira para perto da minha cama, sua expressão
séria.
— Tudo certo? — Eu pergunto.
— Tudo está bem. Você estava certa, no entanto. Havia alguém em
nossa propriedade.
Contei a ele sobre a pá encostada no túmulo de Nellie e como me
senti como se houvesse alguém ali, como se estivesse sendo observada.
— Como você descobriu?
— Hildebrand tirou isso de Julia.
O Conselheiro Hildebrand ainda a está interrogando e compartilhando
informações relevantes para nós com Jericho. Ela enganou o homem mais
velho e ele não é um homem para cruzar.
— Ela contratou alguém, mas ainda afirma que ele estava lá para
ajudá-la. Para ser um aliado. — diz Jericho.
— E a pá contra o túmulo de Nellie?
— Ela não sabia nada sobre isso, supostamente.
— Eu não acredito nisso. — Era ela quem fazia as coisas que acusava
Jericho de fazer. Aterrorizando-me para nos dividir. — Quem era?
— Algum garoto da rua. Pagou a ele algumas centenas de dólares para
escalar o muro entre nossas propriedades e assustá-la. É isso. Eu realmente
não sei se ela tinha outros planos para ele, mas o garoto era apenas isso, um
garoto. Não tenho certeza se ele seria capaz de fazer outra coisa além de se
esconder honestamente.
— Você o encontrou?
— Zeke fez.
— Você não… o machucou?
— Não. Ela se aproveitou dele e que já parecia bastante assustado.
— O que acontece agora?
— Agora? — Como se fosse uma deixa, Christian começa a se mexer e
Jericho fica de pé, instantaneamente pegando-o e carregando-o para sentar
na cama ao meu lado. Nós dois sorrimos para nosso bebê, nosso doce
garotinho que se parece tanto com meu irmão que quando ele abre os olhos
e sorri um sorriso formoso, eu choro.
— Provavelmente é apenas gases, você sabe. — Jericho diz com uma
risada.
— Eu sei. — Eu enxugo meus olhos, não menos emocional. — Ainda.
Jericho me abraça, balançando a cabeça um pouco, mas sorrindo.
Christian volta a dormir contra o peito de Jericho.
— Quanto ao que acontece agora, agora vamos para casa e vivemos.
Criamos nossa família e aproveitamos cada momento dela. Eu te amo,
Isabelle. Não consigo imaginar a vida sem você.
— Eu também te amo, Jericho. E é uma coisa boa que você não possa
imaginar a vida sem mim porque eu preciso de você na minha. Agora e
sempre.
EPÍLOGO DOIS
JERICHO
UM ANO DEPOIS
A barriga de Isabelle está arredondada com nosso segundo filho. De
dentro da casa, eu a observo sentada na beira da piscina de biquíni, os seios
mais cheios, o cabelo comprido e grosso nas costas. Ela tira as boias de
Christian e o envolve em uma toalha. Ela é uma mãe maravilhosa e uma
mulher radiante. Mais ainda quando sua barriga está inchada com meu filho.
Eu quero uma ninhada de crianças. Já discutimos, mas ela acha que
estou brincando. Eu não estou. Seis é um bom número. Talvez sete.
Tiro o paletó, coloco-o nas costas de uma cadeira e saio, arregaçando
as mangas.
— Papai! — Angelique grita pulando para cima e para baixo e
espirrando água em todos os lugares.
— Olha o que eu posso fazer, tio Jericho! — Matty grita e desaparece
sob a superfície da piscina, o snorkel enorme em seu rostinho. Ele surge uma
fração de segundo depois, cerca de sete centímetros de onde estava. — Eu
sei nadar!
— Uau, você realmente pode. — eu digo, tentando parecer espantado.
— Mas você não pode entrar na água sozinho, Matty, ok? — Angelique
diz a ele muito a sério.
Ele acena para ela. — Eu sei.
Eu chego a Isabelle e a beijo antes de pegar Christian cujos braços
estão estendidos, seu rostinho sorrindo para mim. Ele tem quatro dentes
minúsculos agora e se parece com Isabelle com seus grandes olhos azuis.
— A Angelique está ensinando você a nadar também? — Eu pergunto
a Christian.
Angelique vem ao meu lado, seu corpinho encharcando minha camisa
quando me agacho para abraçá-la. — Ele é muito jovem, papai. Vou ensiná-
lo quando ele tiver a idade de Matty.
Eu sorrio. Ela se tornou a irmã mais velha. — Essa é uma boa ideia. —
digo a ela.
Catherine se aproxima com sorvete e as crianças correm para ela. Ela
pega Christian de nós para lhe dar um lanche e eu enrolo uma toalha nos
ombros de Isabelle.
— Você está incrível. — digo a ela, abraçando-a para mim. — A
gravidez torna você radiante.
— Eu vou te encharcar. — diz ela, mas não se afasta.
— Então é melhor tirar o seu traje. — digo a ela e a conduzo para
dentro da casa. — Nós voltaremos. — digo a Catherine enquanto
desaparecemos.
Levo minha esposa para o nosso quarto no andar de cima e tiro o
biquíni dela. Eu então me afasto e a recebo, minha linda esposa. Minha
linda, forte e incrível esposa. Eu a admiro todos os dias.
— O que você está fazendo? — ela pergunta, suas bochechas ficando
vermelhas quando ela pega minhas mãos.
— Olhando para você. — Eu viro seu rosto para beijar sua boca. Ela me
beija de volta. Entramos no banheiro onde ligo o chuveiro e me dispo.
Entramos no chuveiro juntos.
— Você é uma boa mãe e tia, sabia disso? Você é boa para eles. Todos
eles.
— Obrigada por dizer isso. E você é um bom pai e tio. Todos eles
amam você, seu grande ursinho de pelúcia. Até Matty.
Eu sorrio, beijando-a enquanto a ensaboo com sabão. O que eu quero
fazer é fazer amor com ela. O que eu quero fazer é carregá-la para nossa
cama, trancar nossa porta e fazer amor com minha esposa por dias. Mas
temos algo para fazer hoje. Então, alguns minutos depois, quando
terminamos o banho e nos vestimos, descemos e saímos pela porta dos
fundos. Passamos pelas crianças na biblioteca onde Leontine e Catherine
estão entretendo-as.
— Preparada? — Eu pergunto.
— Pronta. — diz ela. Eu pego sua mão e a guio pelo caminho para a
floresta. É mais largo agora e pavimentado com pedra até o ponto mais
distante da propriedade, onde as flores silvestres crescem mais densas entre
as terras de Bishop e St. James.
Ela aperta minha mão e quando chegamos à nova clareira, os olhos de
Isabelle se arregalam enquanto ela absorve tudo. É a primeira vez que ela a
vê desde que o trabalho começou.
— Oh, Jericho. — ela diz, olhando ao redor. — Isto é incrível.
— Você gosta disso? — Eu pergunto.
Seus olhos brilham e eu sigo sua linha de visão sobre o belo pórtico em
arco que já foi um muro entre nossas propriedades. Agora é um grande
portão, algo para conectar em vez de dividir, o caminho largo plantado com
belos arbustos e árvores floridas, iluminadas com luzes que brilharão
douradas a noite.
Ela se vira para mim, leva as mãos ao meu rosto. — É perfeito. Nossas
famílias unidas agora. Nada para nos dividir novamente. Obrigada por isso.
Por acolher Matty. Por fazer isso por nós.
— É para todos nós. Somos uma família.
— Obrigada.
— Tenho mais uma coisa que quero fazer. — Caminhamos de mãos
dadas até a capela onde sai fumaça da chaminé, cheiro forte de incenso,
quando abro a porta e entramos.
— O que está acontecendo? — ela pergunta. Ela nunca viu o fogo
aceso aqui e o lugar se transformou. Mais quente com o brilho e o calor.
Eu a levo até a lareira ao longo da parede mais distante de nós e ela se
enrijece quando vê o livro ali sobre a lareira.
Eu o pego, o diário de Draca e o seguro entre nós.
Ela arrasta seu olhar para mim e vejo a sombra que este livro lança
sobre ela. Eu nunca quero ver nada roubar a felicidade da minha esposa
novamente.
— Deveria ter sido queimado séculos atrás, mas estou fazendo isso
agora. E eu juro a você que nenhum St. James jamais prejudicará um Bishop
novamente.
Ela sorri, coloca a mão no meu antebraço. — Tem certeza de que quer
queimá-lo?
— Sim. — eu digo, virando-me para jogar o livro no fogo furioso e ver
como ele é absorvido. As chamas sobem momentaneamente, como se não
aceitassem a comida que lhes é dada, jogando-a de volta por sua sujeira.
Mas então, enquanto assistimos, ela queima, torna-se cinza como o homem
que a escreveu. Que escreveu seu ódio em palavras e deu a esse ódio uma
vida própria. Uma que sobreviveu por muito tempo a ele. — Descanse em
paz, Draca St. James.
Eu me viro para encontrar os olhos de Isabelle em mim. Ela pega
minhas mãos, fica na ponta dos pés e me beija. Sinto o afrouxamento de
uma corrente. Um desapego de algo sombrio. E eu a beijo de volta. Beijo
minha esposa, a mulher que amo, a mulher que viu o diabo que sou e me
amou apesar disso.
FIM.

Rolar para cima