// LIVRO

O Ceo e a Princesa.823Z

O CEO e a Princesa

Nadine sonha em se tornar uma grande chef de cozinha, mas sabe que isso é quase impossível, tendo em vista que é herdeira do trono de Liechtenstein. Cansada de regras e de seguir uma hierarquia rígida, arcaica e totalmente controladora, Nadine foge em busca do seu próprio destino. Uma princesa nada convencional, um tanto desajeitada, que não se sente parte da família real, sonhando apenas em viver como uma pessoa normal. Esperta e cheia de ideias malucas, tentará enganar o homem mais poderoso da sua vida: O Rei! E em meio à sua jornada para concretizar seus objetivos, conhece Dominic, um CEO em puro declínio à falência que aceitará um casamento por contrato para salvar sua empresa. Será que Nadine conseguirá sua tão sonhada liberdade para realizar os seus sonhos? E Dominic? Conseguirá ele reerguer seu império se mantendo longe do coração da princesa? Dois mundos diferentes, dois corações ambiciosos e um contrato!

Capítulo 1
— Princesa Nadine, acorde, a senhorita está atrasada
novamente, seu pai vai se zangar — reclama minha dama de
companhia me chacoalhando aflita.
— Avise-o que hoje não estou disposta! — reclamo levando o
cobertor sobre a cabeça.
— Menina, a senhorita sabe que se não descer em
exatamente 15 minutos, ele virá pessoalmente — aconselha Nina, e
bufo por saber que ela tem
razão.

— My Lady Nadine, seu pai a espera na sala de reuniões —
reforça Nina impaciente.
— Já estou indo Nina, obrigada! — respondo desanimada já
sabendo qual seria o teor da conversa.
Consegui adiar por um tempo, agora não tem pra onde correr.
— Boa sorte, maninha — deseja James lançando-me uma
piscadela acolhedora ao me encontrar no corredor.
— Vou precisar! — resmungo balançando o vestido que
arrastava no chão.
Caminhei pelos corredores da mansão com o coração aflito,
daqui a três semanas é meu aniversário de 21 anos, e como
presente da maior idade, serei obrigada a aceitar a mão do meu
prometido.
Como odeio essas regras, quem as inventou?
Desço as escadas correndo, no final tropeço, caindo de cara
no chão, tem que ser você, né Nadine! Dou risada de mim mesma
me recompondo. Mikaela observa de longe, e balança a cabeça
inconformada, ela deve mesmo me odiar.
— Papai — o chamei batendo na porta duas vezes.
— Entre princesa.
Sempre gostei da sala de reuniões, é espaçosa, clara, e sua
mobília vintage faz toda a diferença. Mamãe quem escolheu as
cortinas vermelhas que vão do chão até o teto com seus detalhes
em creme e dourado. No meio da sala ampla, uma grande mesa
redonda com cadeiras almofadadas e encosto trabalhado a mão
pelo melhor madeireiro da cidade, e ao redor um tapete fofinho que
decora todo o espaço.
Sentei em uma das pontas, observando meu pai que olhava
pensativo pela janela.
— Nadine, sente-se direito! — repreende assim que se virou
para me encarar.
Confesso que detesto me comportar com essa tal de
etiqueta.
— Não acha que já está na hora de se comportar como uma
dama? Em breve começará o seu treinamento para rainha, precisa
amadurecer, Nadine! — completa olhando-me bem sério, deixandome demasiadamente desconfortável.
— O senhor sabe que não quero ser rainha. James está se
preparando, porque não o treina para ficar em seu lugar?
— Porque você é a primogênita e não ele! Sabe muito bem
como funcionam as leis, Nadine, enfim, lhe chamei para comunicar
que no próximo final de semana teremos um jantar para que
conheça o Príncipe Willians…
— Mas papai, não! — o interrompo com o coração quase
pulando pra fora do peito. Não pensei que esse dia chegaria, na
verdade eu sabia, mas achei que daria um jeito de me safar.
— Não me interrompa! — brada franzindo a testa em um V
irritado. — A família Donavan, tem muito reconhecimento e respeito
em nossa cidade, sem falar que a união das duas famílias, facilitará
muitas coisas em nosso governo.
— Então quer dizer que eu tenho que me casar com um
homem que eu não amo, porque é bom para os negócios? —
argumento cheia de ironia em meu tom de voz, na tentativa vã de
fazê-lo se sentir culpado.
— Não vamos discutir sobre esse assunto mais uma vez, se
prepare para o jantar e não me envergonhe Nadine, pelo menos
uma vez na vida, se comporte como tal!
— Posso ir? — pergunto enraivecida sabendo que não tenho
alternativa.
— Vá!
Engoli a raiva e sai batendo o pé com força. Que ódio! O que
eu faço agora? Se minha mãe estivesse aqui, com certeza não
permitiria esse disparate. A rainha Esther era uma romântica,
acreditava no amor, e que um casamento sem ele não era um
casamento e sim um negócio.
— Pela sua fisionomia, vejo que a conversa não foi nada
agradável! — comenta James sentado em minha cama enquanto
me esperava.
— Não mesmo! Papai enlouqueceu, sábado será oficializado
o meu cortejo com o Príncipe Willians. James, o que eu faço? —
choramingo com lágrimas nos olhos dando-me por vencida.
— Calma, vamos dar um jeito, por enquanto tenta não irritar o
papai, melhor deixá-lo acreditar que está no controle, vou pensar em
algo pra te ajudar.
Não sei o que eu faria sem ele, além de ser meu irmão, é
meu melhor amigo, meu confidente. Bato na tecla que ele deveria
ser o irmão mais velho por suas atitudes e conselhos tão maduros,
acredito que sempre vou me sentir a irmã caçula.
— Olha o que eu comprei pra você! — ele tira debaixo do
travesseiro um pacote embrulhado, e ao abrir me deparo com o livro
da Colleen Hoover que eu queria muito: O lado feio do amor.
— Adorei James, obrigada! — Pulo em seu pescoço
abraçando-o bem forte.
— Que bom que gostou, agora tenho treino, esconde esse
livro, hein!
— Pode deixar. — Sorri contente folheando as páginas perto
da narina, inalando o cheiro de livro novo.
Sento em meu cantinho especial dentro do closet, e começo
a ler, nem sei por quanto tempo fiquei ali, só sei que adoro entrar em
mundo onde posso imaginar ser quem eu quiser. E naquele
momento eu só queria ser uma mulher vivendo um amor
avassalador.
— My Lady, Nadine… — escuto Nina chamar.
— Oi Nina, o que foi agora?
— Que horas acordou?
Olho no relógio que marca 6h da manhã, arregalo os olhos na
tentativa de disfarçar minha noite não dormida.
— Posso até imaginar… — comenta — e prefiro não ter
certeza. O estilista chegou para fazer as medidas do seu vestido,
vamos! — reviro os olhos no mesmo instante e a acompanho após
me aprontar.
— Nadine, fique quieta, assim não consigo ajustar!
— Esse tecido é horrível, está pinicando, não podemos fazer
um vestido mais simples?
— Ordens do Rei, My Lady.
Olho meu reflexo no espelho sem conseguir me reconhecer,
eu não pedi para nascer em uma família real, não pedi para ser a
primogênita e ter que assumir um reinado que eu não quero. E não
é porque não tenha orgulho do meu país, ou do meu nome, mas sim
porque não é isso que sonhei para o meu futuro. Será que é uma
blasfêmia pensar assim?
— O que achou? — pergunta o estilista todo satisfeito.
— O que você acha?! — retruco irônica e ele dá de ombros,
já está acostumado a não agradar o meu gosto para roupas.
— Então está perfeito! — ele conclui e saí saltitante com a
sensação de dever cumprido e eu fico igual uma pateta olhando
meu reflexo no espelho.
— Senhorita, ele não tem culpa, só está fazendo o trabalho
dele — argumenta Nina, incomodada por minha falta de empatia.
— Eu sei! — lamento cabisbaixa. Não queria agir assim, mas
as vezes é mais forte que eu.
Só queria poder escolher o que vestir e calçar, é pedir muito?
O “grande dia” chegou, e como sempre a mansão está em
festa, os comentários dos que moravam ali, eram: A princesa irá se
casar, finalmente! Será que o príncipe Willians é bonito? Será que
dessa vez conseguirá se comportar como uma princesa?
É difícil manter um sorriso no rosto, quando recebe tantas
críticas assim, querem me comparar com a minha mãe, jamais serei
uma rainha como ela foi, jamais…
Maquiagem delicada, luvas até os cotovelos, vestido longo e
bem armado, cabelo preso em um coque alto, joias, muitas joias.
— O vermelho fica muito bem em você, My Lady.
— Obrigada Nina.
— Vai dar tudo certo menina, é o seu destino. Será uma
excelente rainha — incentiva Nina enquanto ajeita delicadamente
meu penteado.
— E porque não consigo aceitar o meu destino, Nina? Não
quero nada disso, queria ter uma vida normal, abrir meu restaurante,
cozinhar, me tornar uma grande chef de cozinha, ir ao cinema,
coisas normais… — falo com pensamento distante imaginando uma
vida que bem provável nunca poderei vivenciar.
— Mas a senhorita pode fazer tudo isso, aqui!
— Nina, você sabia que tem um mundo fora desses portões?
— Sorri discretamente. Ela é minha dama de companhia desde
quando eu tinha quatorze anos, nunca a vi sair dessa mansão.
— Claro que sei, — retribui o sorriso — mas sabe que é
perigoso, o rei só quer o melhor pra senhorita. Depois que a rainha
partiu, ele temeu por sua vida, por isso é tão protetor. — Seu
comentário óbvio me faz bufar.
— Vamos! — Levanto decidida, melhor acabar logo com isso,
só espero que o meu futuro noivo seja, no mínimo agradável!
Até ter uma ideia brilhante, terei que fingir ser a princesinha
do papai — murmuro a mim mesma dando uma última olhada no
espelho.
Desço as escadas devagar com medo de tropeçar na frente de
todos. Rei Arthur se posiciona para me receber na grande sala de
estar. Todos param o que estão fazendo pra prestarem atenção na
chegada triunfal da futura noiva e rainha de Liechtenstein.
— Aqui está a minha joia mais preciosa, futura Rainha
Nadine — anuncia papai, inclinando-se para fazer reverência.
— Estou lisonjeada em lhe conhecer princesa Nadine, és
muito bonita! — elogia minha futura sogra. Linda e triunfante em seu
vestido bufante e um coque bem preso no topo da cabeça, deixando
em evidência a coroa brilhante.
— Obrigada Rainha Elea, o prazer é todo meu.
— Princesa Nadine, finalmente! — a voz do Rei Petrick
Donavan soa em um tom elevado, fiz reverência com um sorriso
delicado nos lábios pra cumprimentá-lo.
Até que estou levando bem essa história de princesa
adorável, uma boa atriz, diga-se de passagem, por que por dentro
estou detestando toda essa palhaçada. Um verdadeiro circo para o
século XXI.
Olho atenta para todos os lados à procura do príncipe, estava
curiosa.
— Está linda maninha.
Aceno cordialmente aceitando o elogio sincero de James,
que me olha com pena, por saber que estou infeliz por toda essa
situação, tento segurar a língua e o desespero, mas não consigo.
— Me diz que tem um helicóptero lá fora, me esperando para
fugir? — James preenche um sorriso discreto, e depois deixa uma
gargalhada escapar. — Engraçadinho, é porque não é você que
está sendo o centro das atenções para um evento ridículo como
esse, sinto-me em um leilão, sabia!? — acrescento derrotada.
— Se te consola, o Príncipe Willians é bonitão — reviro os
olhos de imediato detestando seu comentário. — Adivinha só, você
já o conhece, só não associou os nomes.
Fico pensativa tentando puxar na memória quem seria. Papai
teria me contado se eu já o conhecesse.
— Está do meu lado ou não está, James? Não quero me
casar, não assim! — brado sentindo minhas bochechas queimarem.
— E fala logo, quem é ele?
— Você não vai casar hoje! Apenas irá conhecê-lo, se
acalma! — James ergue seu braço pra me levar de volta ao centro
da sala a pedido de papai.
Nesse momento o silêncio paira sobre o olhar curioso de
todos quando um rapaz muito bonito e elegante passa pela porta
após ser anunciado.
Alto, ombros largos, olhos azuis e pequenos, sorriso branco e
cativante… tudo bem, ele não me parece tão ruim assim. E mesmo
admirada com sua beleza exuberante não consigo me lembrar de
onde poderia conhecê-lo.
— Princesa, este é o Príncipe Willians — apresenta o rei. De
imediato ele se reverencia diante de mim, pega em uma das minhas
mãos e sem desviar os olhos dos meus, deixa lentamente um beijo
sobre ela.
Confesso que nesse momento senti algo inesperado dentro
de mim, ansiedade, talvez um alivio momentâneo por não ser um
velho estranho fedendo a naftalina.
O pior de tudo, é você ter sua vida toda, cada segundo, cada
atitude, cronometrada e pensada por outras pessoas. Desde os
meus 18 anos, estou prometida ao Príncipe, é estranho, sinto-me
uma mercadoria encomendada. Por dois anos tive que ouvir que as
duas famílias reais fariam grandes feitos com a nossa união, seria
um marco histórico.
Fico paralisada, totalmente embasbacada, apreciando o
silêncio cortante com a falta de assunto. Sentia-me envergonhada
com todos nos observando. Estavam esperando o quê? A gente
dizer sim?
— Quer dar uma volta no jardim? — convida Willians
observando meu desconforto. Assinto de imediato e saímos de
braços dados, morosamente para ninguém perceber, mas um dos
guardas nos seguiu. Claro!
Paramos na sacada e contemplando a paisagem do jardim,
nos calamos por um longo período, até que ele decide quebrar o
silêncio.
— Princesa…
— Pode me chamar somente de Nadine, por favor! — o
interrompo.
— Tudo bem, Nadine, gostaria que soubesse que também
não concordo com esse negócio de casamento arranjado, mas
estou muito feliz que seja, você!
— Por quê? — questiono sem encará-lo.
— Você não se lembra de mim, não é mesmo? — balanço a
cabeça em negativa, tentando puxar na memória. — Estudamos na
mesma escola no colegial. Fazíamos aula de química juntos. — O
olhei friamente e só então lembrei da época da escola.
— Nossa não acredito! Está muito diferente Will! —
Chamávamos ele assim, na escola não tinha essa de príncipe e
princesa.
Realmente não me lembrava dele, era magrinho, cheio de
espinhas, e muito tímido, quase não conversávamos, ele mudou
muito, pra melhor! Também, naquela época estava tão aérea com a
morte da minha mãe que não prestava atenção em nada e em
ninguém. Só sobrevivia com a dor da saudade.
— Você lembrou… — ele sorri sem graça — Coincidência não
é mesmo, depois de anos nos encontrarmos, assim.
— Muita Will, desculpa não me lembrar de você, é que tudo
isso é muito difícil pra mim.
— Entendo Princesa. Mas que bom que somos nós, vamos
nos casar em breve…
— Claro que não! — breco seu entusiasmo. — Não vou me
casar com você, só aceitei esse jantar, por que não tenho escolha.
Não sou uma mercadoria, que pode ser vendida dessa maneira, não
é assim que as coisas vão funcionar. Não pra mim!
O Príncipe fica visivelmente incomodado, não encontrou
argumentos para se defender, apenas continuou observando o
jardim com o pensamento longe.
— Desculpe, não queria ser desrespeitosa com você, mas é
que não foi assim que sonhei me casar, tenho meus objetivos
pessoais, ser rainha, não é uma delas.
— Tudo bem Nadine, entendo. Só quero que saiba que para
mim, será uma honra ser seu marido. Sempre te admirei, gostei de
você em silêncio durante dois anos…
Respiro fundo tentando achar alguma palavra que fizesse
sentido para aquela declaração superficial tirada do google, não
encontrei, não quero me casar e ponto final!
— Nadine, papai está chamando para o jantar — avisa
James me salvando mais uma vez.
Salvo pelo gongo.
— Vamos? — Will estende o braço para que eu o
acompanhe.
Antes de me sentar à mesa, papai sussurrou em meu ouvido
dizendo que estava muito orgulhoso por eu estar me comportando,
fiquei tentada a causar algum constrangimento, vai que assim a
rainha repense na escolha da noiva para o seu filho. E meu pai,
entenda de uma vez por todas que essa vida não é pra mim. Porém,
me contive, melhor não provocar sua ira, não até ter um bom plano
para sair dessa enrascada.
O resto do jantar foi tranquilo, as mesmas baboseiras de
sempre, conversas chatas, sorrisos falsos, um verdadeiro tédio.
Quando finalmente acabou, corri para o quarto e me livrei de
todas aquelas roupas que não faziam parte de mim. De pijama, corri
para o meu esconderijo secreto e ali, me tele transportei para o meu
mundo perfeito.
Um mundo só meu, longe de todas as regras, de todos os
olhares julgadores, de expectativas e comparações.
Um lugar onde posso ser apenas uma mulher sonhadora,
uma mulher com desejos que anseia conhecer o mundo lá fora.
Capítulo 2
Sem aceitar meu destino, tento argumentar outra vez com o
rei, mesmo sabendo que seria em vão, com ele não tem conversa,
mas precisava tentar mais uma vez.
Como sinto falta de você mamãe… ela sempre soube resolver
esse tipo de conflito, saberia chegar em um denominador comum
para todos. A rainha era o equilíbrio dessa família, fazia papai
compreender as coisas, ser sensato e justo, mas depois que ela se
foi, uma nuvem escura tomou essa mansão, e qualquer simples
conversa se transforma em discussão, nada importa a não ser as
leis, as regras, e as responsabilidades…
— Por favor, Alec, prometo que não vamos demorar —
imploro com os olhos pidões para o guarda que foi designado a ser
minha sombra.
— Não era para estar na biblioteca princesa? — argumenta
ele mantendo sua carranca séria e imparcial.
— Eu estou lá, — sorri — preciso dar uma voltinha, senão
vou enlouquecer, por favor — imploro novamente com as mãos em
súplica.
— Tudo bem, mas não vamos demorar!
Faz dois anos que Alec é meu segurança. Desde então nos
tornamos muito amigos. Alec é aquele famoso crush literário, alto,
forte, sorriso simpático com um ar libertino. Fico tentada ao seu lado
dele, sei que não devo olhá-lo dessa maneira, contudo é inevitável.
Percebi que ele também me olha diferente, disfarça bem, e
apesar de quebrar algumas regras por mim, sempre foi muito
respeitoso. Talvez ele pense que sou uma mulher inalcançável. Se
ele soubesse que morro de vontade de beijá-lo …
Às vezes pego-me pensando de como deve ser a sensação
de se sentir tocada, beijada, desejada… Sim, eu nunca fui tocada
nos lábios! Na escola tentei escapar, tinham alguns meninos que me
interessavam, mas os seguranças estavam sempre na cola e
espantavam todos eles. E depois do colegial, os inúmeros deveres
não me permitem um minuto sequer de paz, enfim, cá estou eu com
os hormônios à flor da pele.
Papai é muito rígido na teoria de casar virgem, só queria
saber em que século ele vive. Ele sempre diz que um beijo é o
suficiente pra abrir a porta da curiosidade, como se não beijasse
desse o resultado ao contrário.
A passos lentos andamos em silêncio à beira mar, sua farda
real chama muita atenção, então sempre vamos à mesma praia, é
pouco movimentada, e apesar de compor uma paisagem
esplêndida, não atrai a atenção dos moradores e poucos turistas
que se arriscam a conhecer nosso pedacinho de terra especial.
— Está pensativa, está tudo bem, My Lady? — Alec pergunta
mantendo seu olhar distante.
— Não Alec, não estou bem. Não foi o que planejei pra minha
vida, claro que quero me casar, ter filhos, mas quando eu decidir,
quando eu achar que estou preparada, quando houver sentimentos,
e …
— Entendo, contudo, estando em sua posição, isso se torna
demasiadamente difícil, digo que até impossível. As leis são
extremas pra esses assuntos.
— Vou dar um jeito! Casar eu não vou! Você vai ver!
— Com todo o respeito, a senhorita é incrível, aprecio sua
determinação em lutar pelo que almeja.
— Muito obrigada, Alec — agradeço parando em frente ao
mar. Aprecio as ondas tocando a areia branca, Alec atrás de mim
mantendo certa distância. Já era final da tarde e o sol começara a
se pôr, as cores ministradas em diversos tons de laranja e amarelo
deixa meu olhar contente, admirada pela natureza, é tão belíssima
que poderia ficar admirando por horas.
— My Lady, precisamos ir antes que deem falta da senhorita.
Não quero ir embora. É tão bom sentir a brisa do mar bater na
pele, sentir a leveza fora dos enormes portões da mansão real.
— Só mais um pouquinho, você não acha perfeito a
sonoridade que o mar faz em contraste com o som dos pássaros?
— choramingo.
— Sim, acho perfeito. Mas devo lhe apressar, se seu pai
descobre, estou perdido! — argumenta dando-se por vencido após
olhar bem no centro dos meus olhos.
— Prometo que não contarei nada! — Cruzo os dedos nos
lábios em promessa.
Nesse momento seus olhos brilharam ao prestar atenção em
minha boca, sua língua umedece os lábios lentamente de uma
maneira sensual, e não resisto, pulo em seu pescoço e o beijo, bom,
na verdade tento! Bati meus dentes nos dele e logo me arrependi.
— Desculpe, princesa eu…
— Não tem que pedir desculpas, eu que te beijei, tentei pelo
menos — declaro envergonhada colocando as mãos no rosto.
— A senhorita nunca…
Balanço a cabeça em negativa.
— Posso? — concordo com um movimento discreto, a
respiração foge de sua sincronia normal, e sinto meu coração bater
descompassadamente quando ele se aproxima.
Alec pousa uma de suas mãos no meu rosto e a outra em
minha cintura, e sinto sua aproximação cada vez mais perto do meu
corpo trêmulo.
— Fecha os olhos — pede sussurrante.
Fiz o que ele pediu e em seguida senti o toque delicado e
macio dos seus lábios nos meus. Abri minha boca quando sua
língua pediu passagem, e devagar deixo me levar pelo momento,
encontrando o ritmo envolvente para o nosso beijo. Na ponta do pé,
devorei seus lábios, saboreando o sabor de seu beijo. Tão gostoso
e molhado.
Sempre imaginei como seria a sensação de um beijo de
língua, e nenhum pensamento se compara com o que estou
sentindo nesse exato momento. Minhas mãos envolvem seu
pescoço, e acaricio suavemente sua pele morena, enroscando
delicadamente nos cabelos curtos em sua nuca. Perdemos a noção
do tempo, até que nos lembramos que tínhamos que voltar.
— Princesa, vamos!
Caminhamos apressados de volta para a mansão, entro
rapidamente quando um dos guardas se distrai. Corro para a
biblioteca e finjo estar lendo um livro sentada entre as prateleiras,
bem na hora Nina entra me procurando.
— Onde estava senhorita? — questiona com o olhar de que
“você não me engana”.
— Aqui! Sabia que esse livro de Dom Casmurro é muito bom?
Devia ler Nina — falo descaradamente na maior cara de pau. Claro
que ela não acreditou, mas não insistiu.
Nina prepara meu banho e observando as bolhas se
desfazendo, navego em pensamentos na tentativa de reviver a
sensação que senti com Alec. Meu Deus, foi incrível.
E agora? Estou praticamente noiva!
E se alguém souber que ele me beijou, pode ser preso ou
coisa pior…
— Nadine, está pronta?
— Quase, só um minuto — peço vestindo-me desajeitada. Ao
sair dou de cara com James sentado na poltrona no canto do meu
enorme quarto.
— Posso saber o que estava fazendo na praia? — indaga
curioso semicerrando os olhos, apoiando o cotovelo no braço da
poltrona.
— Fiz uma besteira!
— O que aprontou Nadine? Eu que sou o irmão mais novo,
sabia?
— Gracinha, quem mandou ser certinho! — sento em seus
joelhos deixando o peso do medo recair sobre meus ombros. —
Beijei o Alec, e ele me beijou — sussurro as últimas palavras,
tampando os olhos.
— O seu guarda? Você o beijou? — replica absorto fazendo
eu levantar.
— Sim! Não sei o que me deu, senti vontade, queria saber
como era, e aconteceu.
— E como foi? — James respira fundo puxando-me para
sentar na cama.
— Foi incrível, não sabia que beijar era tão bom! — Sorri
envergonhada, sentindo rubor em minhas bochechas.
— É muito bom mesmo, mas precisa ter cuidado, sabe que
pode prejudicá-lo com esse seu disparate, não sabe?!
— Sei! — baixo a cabeça pensativa. — Conversa com ele,
James, por favor, ele deve estar preocupado!
— Tudo bem! Não vou dizer que é pra você esquecer o que
aconteceu, por que sei que não vai, mas tome cuidado, você está
quase noiva.
Faço careta seguida de um revirar de olhos por ele me
lembrar.
Os dias se arrastaram, e a ansiedade de encontrar uma saída
pra me livrar desse casamento me consumia. Entretanto, confesso
que me encontrar as escondidas com Alec, era meu balsamo de
liberdade. Sempre que podia dava uma escapadinha com ele, na
biblioteca, no jardim de inverno, na praia, na dispensa, onde tinha
oportunidade, lá estava eu em seus braços, eram breves minutos de
prazer e paz. Ele fazia eu me sentir bem. E eu amava beijar seus
lábios.
James como um bom irmão, sempre acobertando minhas
loucuras, mas no fundo temia que eu me apaixonasse e sofresse,
seria impossível viver um amor como esse.
Se fosse boa na escrita, poderia escrever um romance, um
amor impossível, seria o título, mas não estou apaixonada, não
muito eu acho.
No dia do meu aniversário, quase fomos pegos, enquanto
todos se alegravam e se divertiam no salão, dei aquela escapadinha
marota.
— Nadine, o que está fazendo na dispensa? — Papai indaga
desconfiado, Alec escondeu-se entre as prateleiras, enquanto fingi
pegar um pote de biscoitos.
— Nada papai, apenas pegando isso — Mostro o pote em
minhas mãos.
— Não poderia pedir para Nina, com tanta comida lá fora,
quer biscoitos? — questiona ainda mais desconfiado.
— Sim, mas sabe que amo biscoitos, podemos ir agora! —
Enlaço seus braços, guiando-o de volta para o salão.
— Nadine, marquei seu noivado com o Príncipe Willians para
daqui um mês, será uma grande festa, minha filha!
— Mais já? Meu aniversário é hoje, e não vai me dar mais
tempo… Não acha que devemos nos conhecer um pouco mais
papai, eu…
— Já tiveram muito tempo Nadine, já tem semanas que estão
conversando, e antes que façam algo que … Não fizeram nada
que… — ele analisa minha feição desesperada.
— Não Sua Alteza! — resmungo derrotada.
— Ótimo, então está tudo certo!
O rei saiu me deixando desolada. Como vou fugir disso
agora?
Duas vezes por semana o Príncipe vem até Liechtenstein
para o cortejo. Conversamos, jogamos xadrez, passeamos no
jardim, é estranho, Alec tem que me acompanhar e fico pensando
em como deve ser ruim para ele ter que presenciar tudo isso. Como
ele deve se sentir em ter que acompanhar eu e o meu futuro noivo,
sendo que depois entrego-me aos seus beijos…
Willians se tornou um verdadeiro narcisista, fala de si, como
se fosse o homem mais perfeito do mundo, tenho vontade de
vomitar quando ele passa mais de cinco minutos falando dele
mesmo.
É sério que vou ter que casar com um homem vazio e
superficial como ele? Esse é o meu destino? Ter um rostinho bonito
com um sobrenome real ao meu lado, só porque é bom para a
política?
— Princesa, não podemos mais nos ver, a senhorita vai firmar
noivado semana que vem, e não é certo, estamos correndo o risco
de…
— Alec, por favor… — sussurro sentindo um terrível nó na
garganta.
— Foi incrível enquanto durou, mas sempre soubemos que
seria passageiro — abriu um sorriso emocionado. — Eu te amei em
segredo princesa, e sempre vou amar, mas acabou, nunca estarei a
sua altura, e está tudo bem! — Alec segura em meu queixo certo de
suas palavras. — Sinto-me lisonjeado por ter feito parte da sua vida,
de ter sido o primeiro a tocar em seus lábios. — Passa os dedos
sobre minha boca delicadamente causando um suspiro
desesperado de minha parte.
— Alec, eu…
— Não precisa dizer nada! Eu sabia que esse dia chegaria.
Pedi transferência para outra cidade, ganhei uma bolsa de estudos,
vai ser bom pra mim. Espero minha Princesa, de coração, que
consiga mudar o mundo que te rodeia, pois você é espetacular
demais para ficar presa dentro desses muros — declara e suas
palavras me causam uma comoção fora do normal, não penso e
envolvo meus braços com toda a minha força deixando claro, que o
seu sentimento era correspondido.
O carinho que sinto por ele é intenso, minha primeira paixão.
E sabíamos desde o início que esse romance seria tão veloz quanto
a fúria de um furacão. Fui ingênua ao achar que ele não se
apaixonaria, que teria controle o suficiente do seu coração. Isso não
aconteceu, e eu o magoei.
— Obrigada por fazer parte da minha vida, por ter feito os
meus dias mais felizes nesse lugar. Jamais me esquecerei de você
Alec.
— Também não vou esquecer você, Princesa. Escrevi este
poema para você, é de um autor desconhecido, e fala exatamente o
que sinto nesse momento. Guarde com carinho, My Lady.
— Guardarei. Te vejo em breve, Alec — brinco não querendo
dizer adeus.
— Até breve, Princesa Nadine! — Alec se despede selando
um beijo em minha testa com todo seu respeito, e seu beijo
dilacerou meu coração arrancando a parte mais feliz.
E por um momento a tristeza me assolou por saber que a
única coisa que me fazia sorrir, e me sentir uma mulher livre, foi
embora…
Capítulo 3
Tranco-me no quarto sentindo um aperto enorme no peito,
como é difícil dizer adeus para quem se gosta.
Estar com ele era o meu momento de paz, meu momento de
alegria. Sentia-me naquelas histórias clichês de amor impossível,
proibido. Só me esqueci de um detalhe importante, estávamos na
vida real, e a realidade nem sempre permite que o final seja feliz
como a gente quer.
Abro o pequeno envelope depois de me acomodar na poltrona,
e me surpreendo ao ver uma foto de nós dois na praia, atrás dizia:
“Meus olhos lhe procuram no espaço sem fim, lágrimas
nascem refletindo sua imagem na lembrança contida em mim.
Nosso primeiro olhar, nosso primeiro encontro no pôr do sol, o
primeiro beijo, sua doce voz em som de ternura, que declamou
poesias e fez juras, afinal foram só juras de um amor não
correspondido. Só juras da boca pra fora e não com o coração. De ti
princesa carregarei as lembranças dos teus beijos e as lindas
palavras que saíram da sua boca. Mas, também serão tristes
lembranças que nem o tempo irá apagar, porque eu sim te amei e te
amarei para todo o sempre, mesmo sabendo que nunca irá me amar
da mesma forma…”
Lágrimas caem dos meus olhos, a culpa de ter me envolvido
me assolou, devia ter percebido que as coisas estavam passando
dos limites. Porque enquanto eu brincava de princesa rebelde, ele
me amava verdadeiramente em segredo…
Guardo a foto dentro de um dos meus livros, jamais
esquecerei o quão importante Alec, o meu guarda real foi em minha
vida.
Acordo mau humorada, Nina sabe que hoje não é um bom
dia, e não diz nada ao entrar no quarto, ela passa por mim e vai
direto para o banheiro. Hoje é o dia que gostaria de ter o poder de
sumir, simplesmente desaparecer.
A mansão está em festa outra vez, parece até que as fadas
derramaram pó de felicidade por aqui. Quem vê, pensa que sou
uma Princesa velha e encalhada.
Só de olhar para o Will, sinto raiva, raiva de mim mesma, por
não poder escolher com quem ficar, por não poder escolher o rumo
que minha vida vai tomar.
Porra, é o meu futuro!
O rei conseguiu fazer uma festa ainda maior que a do meu
aniversário, afinal, era o noivado de sua única filha, a qual seria a
primeira Rainha depois da mudança no patriarcado. Ótimo momento
para que não seja lei somente os homens assumirem o trono.
Olho pela janela da sala e observo as pessoas entrando e
saindo da mansão, parecia um grande desfile de moda. As mulheres
desfilavam seus vestidos de grife e penteados estonteantes, e os
homens seus ternos importados, tanta futilidade que não saberia
nem listar.
No gramado verde e recém aparado, um grande buffet, papai
não economizou ideias para o banquete, a mesa está regada de
delicias. Se fez isso para um noivado, imagina no casamento.
Os garçons se movimentam de forma frenética e eficiente de
um lado para o outro entre os convidados, servindo champanhe e
canapés.
— Está feliz princesa? — pergunta Will assustando-me, seu
sorriso largo e sarcástico era patético. — Porque eu estou, não vejo
a hora de sentir seus beijos… — Aproximou-se tentando tocar em
meus lábios.
Recuo. Não queria que ele substituísse o gosto de Alec. Não
queria que a maravilhosa lembrança de seu beijo, fosse substituída
por um beijo mortal. Um beijo que eu não desejava.
— Pare já com isso, está louco? — o repreendi me afastando.
— Falta apenas a troca das alianças para oficializar nosso
noivado, Nadine, não acha que podemos dar mais um passo?
— Não, não acho! Com licença, vou procurar meu irmão. —
Saio apressada procurando James, e o achei conversando com uma
moça muito bonita no jardim, assim que me viu, soube que eu
precisava de seu consolo.
— Está tudo bem?
— Não, claro que não James, o que eu estou fazendo? Will
pode ser um homem incrível, mas não pra mim, não quero me casar
com ele — reclamo segurando as lágrimas nos olhos.
— Calma, daqui a pouco os convidados vão embora, e vamos
poder conversar melhor, te encontro em seu quarto, está bem? —
Assinto aflita. — Agora limpe essas lágrimas, vai ficar parecendo um
panda — ele brinca ajudando-me com o lenço tirado de seu bolso.
Fico envergonhada por meu irmão sempre me salvar, seja
com seu ombro amigo, ou pra me tirar das enrascadas que me
envolvo. O que eu posso fazer se ele amadureceu antes de mim!?
Volto para a festa e a raiva é evidente em meu rosto.
— Querida, hoje é um grande dia, coloque um sorriso nesse
rosto, as pessoas podem falar — papai sussurra em meu ouvido
disfarçando com um falso sorriso.
— Grande dia para o senhor, não para mim.
— Recomponha-se Nadine. Chegou o momento da troca das
alianças, vamos!
Papai cruza meu braço no dele, e me guia pelo gramado até
a parte coberta onde todos já estavam a nossa espera.
O Príncipe sorria feito bobo enquanto eu caminhava ao lado
de papai. E nesse momento as lágrimas escaparam do fundo de
minha alma e molharam meu rosto.
Para a maioria eu só estava emocionada. Pra outros, para
aqueles que me conheciam de verdade, sabiam que aquele
momento estava sendo a tortura mais doida…
— Sua Alteza — ele reverência papai sem desviar o olhar do
meu.
— Estou muito feliz que seja você o meu futuro genro. Seja
bem-vindo a nossa família. Receba a minha benção e a mão de
minha filha como sua futura esposa e rainha de Liechtenstein.
Willians faz um movimento respeitoso aceitando sua benção
e seu lugar ao trono ao meu lado. Papai solta minha mão e a
entrega para ele, e nesse momento senti como se ele tivesse me
jogado de um penhasco. Meu corpo ficou leve, e perdi o chão de
meus pés. E a determinação que ruge todos os dias em meu peito,
se enfraqueceu ao ser trocada por uma aliança de ouro e rubi.
Os aplausos me entristecem, porque estão felizes? Porque
compactuam com um casamento arranjado? Forçado? Eu não o
amo, não conseguem ver?
A vontade de ir para o meu quarto o quanto antes me deixa
ansiosa, contudo, não conseguia uma brecha, então,
propositalmente finjo um mal-estar, derramando vinho em cima do
Príncipe bonitão.
E como imaginava, sua preocupação era se ia sair a mancha
de vinho de camisa e não se eu estava bem. É esse tipo de marido
que eu mereço? Um homem mais preocupado com uma roupa do
que com sua noiva? Ele poderia comprar quantas blusas quisesse,
agora eu…
Willians não estava preocupado em me conquistar. Não
estava preocupado se eu iria ou não me apaixonar por ele… Só
consigo pensar que ele quer a única coisa que eu lhe daria se
pudesse: O trono.
Papai preocupado pediu imediatamente para que James me
acompanhasse até o quarto, enquanto ele tentava aclamar a euforia
do príncipe Willians e sua roupa.
— Você não tem jeito Nadine, precisava derramar vinho em
seu noivo! — James repreendo segurando o riso.
— Você viu, ele nem se preocupou comigo, você acha que
mereço um marido assim tão egoísta, James?
— Não mesmo! Vou conversar com papai amanhã, ele
precisa rever essa situação.
— Ele não irá te ouvir, ainda mais agora, olhe para o meu
dedo. — Mostro o anel com uma pedra enorme que não me deixa
esquecer que agora estou noiva. — Não perca seu tempo, eu vou
embora! — Decido tendo a ideia de fugir naquele exato momento,
acreditando ser a única solução.
— Como assim vai embora?
— Fugir! Vou pra outro lugar, longe daqui! Vou construir
minha vida, James, estudar, abrir meu restaurante, viver como uma
garota normal.
— Deve ter bebido vinho demais, amanhã conversaremos
sobre isso, — James beija minha têmpora ajeitando o cobertor
sobre o meu corpo. — Boa noite Nadine.
— Boa noite.
O abajur se apaga e no escuro reflito sobre minha ideia
genial. Está decidido, irei fugir ainda essa semana. E enquanto o
sono não me faz esquecer da realidade, decido meu destino. O
lugar onde vou construir o meu futuro.
Acordo antes do sol nascer, sentia-me revigorada por ter
encontrado uma saída, mesmo que descabida. E para o meu
descontentamento logo pela manhã, Príncipe Willians tinha dormido
no quarto de hóspedes. Papai o defende dizendo que ele estava
muito “preocupado comigo”, para ir embora.
— Está melhor princesa? — pergunta tentando me beijar
novamente, viro o rosto de imediato deixando um clima
desconfortável.
— Estou melhor sim, obrigada!
Tomei meu desjejum em silêncio notando o olhar apreensivo
do Príncipe sobre mim.
— Com licença tenho muitos afazeres esta manhã, depois
nós falamos, Will.
— Disponha! — Ele assente absorto por minha indiferença,
mas não insiste e eu agradeço mentalmente por isso.
Sozinha com James em meu quarto, aproveito pra separar
algumas roupas, livros favoritos, e alguns assessórios.
— Tem certeza que vai fazer isso, Nadine? — pondera James
aflito me ajudando com a mala.
— Tenho! E você não vai falar nada, vou deixar uma carta
para o papai, assim ele saberá que estou bem! Manterei contato
com você, fique tranquilo.
— Como vai fazer? Onde vai ficar? Se usar a conta bancária,
papai saberá onde está. É perigoso sair com uma alta quantia em
espécie.
— Deixa eu pensar… — apoio os dedos no queixo andando
de um lado para o outro, pensando em um plano.
— Vai com uma quantia menor, chegando lá abra uma conta
online que transfiro para você. — James dá a solução quase que
instantaneamente.
— Combinado! Obrigada irmão, obrigada por me apoiar em
tudo. Sempre soube que você era o irmão mais velho, só faltou
idade — o abracei. — Agora que não estarei aqui, mostre ao papai
que aquele trono lhe pertence.
— Vou sentir sua falta, Nadine.
— Eu também, muita!
Dois dias depois estava com tudo pronto, malas feitas,
dinheiro guardado, carta escrita e coragem batendo forte no peito,
confiante que essa é a melhor decisão a ser feita por mim.
— Está tudo pronto Nadine, Lorenzo vai te levar para o
aeroporto, lá você poderá comprar a passagem para onde quiser,
tome cuidado, por favor, ou não me perdoarei de ter concordado
com essa loucura, se algo acontecer com você…
— Fique tranquilo, ficarei bem! Obrigada, por ser esse irmão
maravilhoso. Espero que um dia consiga alcançar seus sonhos
assim como eu estou em busca dos meus.
— Farei o possível, quando retornar estarei sentado naquele
trono por honra e merecimento.
— Isso mesmo! Agora preciso ir, te amo irmão, cuida do
papai, e mostre a carta a ele.
Ele me abraça forte e não contem as lágrimas, somos muito
apegados e saber que vamos estar longe um do outro, machuca
demais.
Antes de sair, olho cada detalhe em meu quarto, sentirei falta
do meu lugar preferido, onde por tantas noites minha mãe me
acalentou, onde por tantas vezes viajei em meus livros no meu
cantinho secreto…
Deixo a cama arrumada com seu enorme acolchoado cor
salmão e as inúmeras almofadas e travesseiros. Isso me fez lembrar
que Nina sempre briga para deixá-la fazer a cama. Lamento não
poder me despedir…
James e eu nos abraçamos mais uma vez, e antes de ir,
lanço meu olhar esperançoso, na torcida para que ele consiga
mostrar o seu valor.
Saio de fininho para não ser notada, Lorenzo me aguarda no
portão dos fundos. Ele é discreto e não pergunta nada, mal me olha
pelo retrovisor. Durante o trajeto mergulho em pensamentos,
lembro-me de Alec, tenho certeza que estaria orgulhoso de mim
agora! Também lembro do Will, ele não é um homem ruim, só
precisa amadurecer.
Quem sabe daqui uns anos não arruma uma mulher que o
amará de verdade, e o fará a se transformar em um homem que
mereça estar a frente de um reino.
— Tchau Lorenzo, obrigada por tudo! — O olhei com gratidão
ao descer em frente ao aeroporto.
— Se cuida, My Lady.
Entro no saguão movimentado e sigo até o balcão, fico por
longos minutos olhando o painel que mostrava os nomes dos
próximos voos.
— Posso ajudar senhorita? — O rapaz ruivo e de sardas no
rosto pergunta simpático.
— Ah, desculpe, sim, gostaria de uma passagem para Paris.
— Aqui está! — pago rapidamente eufórica por finalmente me
sentir independente.
Com a passagem em mãos, olho para o pedaço de papel
vislumbrada, parecia o mais valioso tesouro.
Sento em dos bancos de espera, e ali fico por quase uma
hora, cochilo por alguns minutos. Quando ouço a chamada do voo
me assusto, peguei as malas do chão e saí correndo, claro que não
precisava correr, mas o medo de perder o avião era tão grande que
me vi em uma maratona.
E senão pagar um mico não sou eu, esbarro sem querer em
um homem, e fomos os dois ao chão!
— Ei, olhe por onde anda! — repreende ele enfurecido, todo
grosso. — A senhorita está bem? — Muda o tom assim que me
encara.
— Desculpe, eu não estava prestando atenção! — peço
desajeitada recolhendo sua bolsa do chão.
— Tudo bem! Está aqui sua mala.
— Obrigada! Sua pasta. — Entrego-a para o moço atraente
de cabelos claros e olhos esverdeados — Preciso ir, mais uma vez,
desculpe. — Dou as costas apressada sem dar chance de ele falar
mais nada.
Consegui embarcar sem derrubar mais ninguém. Por que eu
tenho que ser tão desajeitada desse jeito!?
Nem parece que a minha vida toda tive aulas de etiqueta! —
murmuro em voz baixa atraindo olhares curiosos.
Olhando pela pequena janela do avião, penso qual será a
primeira coisa que farei ao chegar em Paris. Sorri feito boba,
fazendo uma enorme lista na minha cabeça. Primeiro de tudo,
preciso arrumar um lugar para ficar, segundo comprar roupas,
roupas simples e da moda, terceiro, arrumar um emprego, assim
vou poder pagar por cursos que irão me ajudar em minha carreira.
Levanto com cuidado para ir até o banheiro, o silêncio era
simplesmente tedioso naquele avião, na volta, olho curiosa as
pessoas dormindo, passo por uma das portas e dou de cara com o
homem que derrubei no aeroporto, arregalo os olhos na mesma
hora, ele não me vê, está compenetrado em seu notebook, passo
devagar ao seu lado, mas como se nada mais pudesse dar errado,
uma turbulência balança bem naquele instante e caio em cima do
colo do rapaz.
— Desculpa — peço em um fio de voz, que nem eu mesma
fui capaz de ouvir, forço um sorriso e ele me observa sério.
— Senhores passageiros, iremos passar por um campo de
turbulência, permaneçam em seus assentos e apertem os cintos —
a voz do piloto soa no autofalante e uma crise de pânico me
consume.
— Aí meu Deus, o avião vai cair — me desespero ainda
esparramada no colo do rapaz que me lança um olhar inexpressível.
Eu podia ter levantado de imediato, mas não sei o que aconteceu,
só travei.
— Senhorita, precisa de ajuda para sentar em sua poltrona?
— a aeromoça pergunta, mas estou paralisada. Ele apenas faz um
aceno com a mão e imediatamente ela saiu.
— Fica calma, sente-se aqui!
Mesmo carregando uma carranca inexpressiva ele me ajuda
a sentar ao seu lado. Olhando-me nos olhos, prende o cinto bem
forte em minha cintura. Meu peito subia e descia por conta da
respiração ofegante. E quando o avião chacoalha novamente,
aperto os olhos com força sem perceber que segurava com toda a
minha força em sua mão, ele não se mexeu.
Continuo com os olhos fechados esperando ouvir o silêncio
total em minha cabeça, instantes depois os abri desconfiada,
envergonhada pelo desespero, seus olhos estavam atentos em
mim, e quando desviou para sua mão, eu simplesmente desejei
abrir um buraco ainda maior, segurei-o com tanta força que minhas
unhas cravaram em sua pele.
— Desculpa, mil perdões, por favor, o que eu posso fazer
para me desculpar — falo sem parar.
— Está tudo bem? — se preocupa não dando a mínima para
o meu pedido de desculpas. Concordo sentindo o rubor efervescido
em minhas bochechas. Levanto depressa e saio em disparada ao
meu assento.
Que ótimo Nadine, que ótimo!
Depois do voo longo e vergonhoso, finalmente chego ao meu
ponto de partida, sento em um quiosque na Starbucks, e peço um
café, um café! Não é maravilhoso? Não conseguia acreditar que
estava sozinha, tomando um café, em uma rua qualquer. Acho que
quem passava por mim, pensava: essa mulher é louca? Por que
está rindo feito à toa?
Fazer o quê?! isso é novidade pra mim.
Aceno para o táxi que prontamente para em minha frente,
peço indicação de algum hotel perto do centro, o motorista me olha
sério pelo retrovisor, não sei porque, mas tive sensação que a
qualquer momento aparecia seguranças do papai e me levariam de
volta para casa.
Capítulo 4
As pessoas são tão agitadas aqui, fica até difícil de saber se
estão bem ou não. Parecem sempre tão emburradas e estressadas.
— É aqui moça! — avisa o rapaz sério no volante.
Desço do táxi maravilhada com o lugar. O hotel parece ser
cinco estrelas. Olhando ao redor, peguei minha pequena mala e
caminhei até a grande entrada de vidro fumê. Alguns funcionários
iam e vinham de todos os lados, aparentemente não tinha muitos
hóspedes, que por um lado me deu certo alivio. Ainda estava com
medo de ter sido seguida.
— Bom dia, Vicenza — falo após olhar o crachá da linda
recepcionista.
— Bom dia, no que posso ajudar? — responde sorridente e
muito simpática.
— Gostaria de saber os valores dos quartos, pode ser o mais
simples.
— Desculpe senhorita…
— Nadine — respondi apressada.
Melhor evitar meu sobrenome.
— Senhorita Nadine, nosso menor preço é €200 euros a diária.
Minha cara de desespero estampou o rosto, com certeza
arregalei os olhos! Ontem eu não teria problema em pagar €200
euros por um quarto, mas agora eu sou apenas uma estudante
economizando.
— Tudo bem! Vou pesquisar em outro lugar, infelizmente esse
valor eu não consigo. — Cabisbaixa, sinto meu primeiro calafrio,
medo por estar sozinha em um país que não é o meu, onde não
faço parte das regras e leis impostas, apenas as obedeço como
todos.
Já ia saindo quando a morena de cabelos enrolados e
volumosos me chama.
— Espera! — viro para fitá-la. — Está vindo de onde? — soa
curiosa.
— É … eu… do interior da Suíça — gaguejo antes de
responder.
— Vai ficar muito tempo? Desculpa, não estou querendo me
intrometer na sua vida, é que onde eu moro, tem uma kitnet
alugando, posso indicar você pra dona do prédio.
— Seria excelente Vicenza, pretendo ficar por aqui, estudar,
arrumar um trabalho, um lugar fixo seria esplêndido. — Ela sorri
divertida achando engraçado meu modo de falar.
— Você fala engraçado — dá de ombros, — me encontra aqui
às quatro, hoje vou sair mais cedo, aí te levo lá.
— Tudo bem, eu espero! — Caminho de volta até a recepção,
e sento na poltrona acolchoada de tecido claro e macio e ali fico
observando as pessoas. Sentia-me em um sonho, era o que eu
queria, ser e agir como uma pessoa comum.
— Vamos? — alertou toda espevitada, pontualmente as 4h.
Assusto-me. Quase cochilei quando o tédio e o cansaço me
venceram.
— Claro!
Caminhamos alguns quarteirões até chegar na estação do
metrô. Meu Deus, eu nunca entrei em um desses, a curiosidade
com certeza estava estampada em meu rosto. Uma mistura de
euforia e receio.
— O que foi? Vai me dizer que nunca andou em um desses?
— indaga divertida em zombaria.
Claro que se não ficar em saia justa, não seria eu.
Simplesmente travei antes de entrar arregalando os olhos de medo.
— Na verdade não! Eu venho de uma cidade do interior e…
— Tudo bem, desculpa, mas você não tem nada de
interiorana, vamos, isso não vai te morder — Vicenza pondera
puxando-me para dentro apontando para aquele maquinário enorme
onde as pessoas entram e saem apressadas, quase que esbarrando
umas nas outras.
Entrei. Senti meu estômago voar, não sei explicar direito, só
sei que foi divertido quando o metrô começou a se mover. Eu já
tinha visto na televisão, já tinha ouvido falar em alguns livros, mas
ao vivo e a cores é totalmente diferente.
Hum… gostei!
Algumas estações depois, descemos e andamos mais uns
dez minutos. Vicenza parou em frente a um prédio simples
procurando as chaves na bolsa, olho para cima, analisando o
imóvel. Depois de cumprimentar o porteiro ranzinza, subimos até o
décimo segundo andar onde mora a síndica.
— Oi dona Laura, está é Nadine, minha amiga, ela está
precisando de um lugar para morar. A kitnet do vigésimo andar
ainda está disponível? — pergunta depois da dona aparecer cheia
de bobs na cabeça.
— Oi Vicenza, uma pena, aluguei essa manhã!
A insegurança percorre meu corpo. Talvez eu tenha me
precipitado que já estava certo.
Estava fácil demais.
— Se não se importar Nadine, pode ficar comigo, assim
dividimos o aluguel, não costumo fazer isso com estranhos, mas
gostei de você, e do jeito que fala, não deve ser uma má pessoa. —
Ela sorriu me dando um tapinha nas costas.
— Já sabe as regras, dona Vicenza! — orienta a senhora
fechando a porta sem educação alguma.
— Pode deixar dona Laura, vamos Nadine! — Ela me puxa
pelo braço. — Moro no vigésimo quarto! — empolga-se ao pegar
uma de minhas malas.
Minha primeira amiga, isso é incrível. Emocionante!
Vicenza abriu a porta toda desajeitada, ainda bem, assim não
me sinto a esquisita desengonçada. O apartamento é pequeno,
porém está tudo em seu devido lugar, claro, muito diferente do que
eu estou acostumada, mas é… Como posso dizer… aconchegante.
O sofá de dois lugares cor-de-rosa deixa a decoração
moderna e jovial. As cortinas brancas combinam com o tapete
felpudo no chão. A cozinha é pequena, planejada com um fogão e
um pequeno armário. O dormitório tem as paredes brancas e vários
pôsteres colados, sinceramente não faço ideia de quem são aquelas
pessoas.
— Quem são eles? — Passo a mão por cima do papel grosso
e brilhante.
— Zé Neto e Cristiano. Nossa você vai amar as músicas
deles — observo os cantores com atenção, eles compõem uma
beleza diferente.
— De onde você é, Vicenza!? — indago curiosa ainda
observando as fotos.
— Brasil. Minha mãe veio trabalhar aqui há dez anos atrás,
faz cinco que estou aqui. — Ela é levada para uma lembrança
entristecida, e com um sorriso forçado nos lábios hesita.
— Não pensa em voltar?
— Não, minha única família era minha mãe, quando veio
pra Paris, fiquei com uma prima, aguardando-a se estabilizar,
infelizmente não tive muito tempo, quando conseguimos nos
reencontrar, ela ficou doente e…
— Sinto muito por sua perda, Vicenza — me solidarizo
sincera tocando em seu ombro.
— Obrigada! Eu gosto de morar aqui! — E como mágica,
seus olhos brilham e sua voz volta com todo aquele entusiasmo que
faz parte de sua personalidade. — Mas dos meus ídolos eu não
abro mão, espero que não se importe! — exclama olhando para a
parede forrada de homens e violões.
— Não, claro que não!
— Este aqui é o Gustavo Mioto, você precisa ouvir as
músicas dele, — pega o celular para colocar a playlist, — apesar
que você não vai entender, né!? — Logo desiste deixando o celular
sobre a penteadeira.
— Sei um pouco de português, podemos tentar, o que eu não
entender você pode traduzir — ela me olha satisfeita quando me
disponho a tentar.
— Combinado! Por enquanto a gente se vira com a cama e o
sofá, depois arrumamos outra cama — define pegando no armário
lençóis e travesseiro.
— Sem problemas, eu me viro no sofá.
Vicenza esvazia duas gavetas e uma parte do pequeno
guarda-roupa para eu colocar minhas coisas. E nesse momento me
lembro que preciso urgentemente de roupas novas e um celular,
preciso falar com James.
— Vi, posso te chamar assim? — pergunto tomando uma
intimidade idealizada.
— Claro que pode!
— Preciso de umas roupas e um celular.
— Não tem celular? — se espanta virando bruscamente para
me encarar.
— É… — Penso antes de falar — o meu quebrou antes de
viajar — concluo satisfeita por ter arrumado uma desculpa plausível.
— Então amanhã vamos ao centro, tem umas lojas que
abrem bem cedo e os preços são ótimos!
Na manhã seguinte saímos do apartamento em direção ao
centro, andamos bastante visitando loja por loja.
E finalmente comprei minha tão sonhada calça jeans e meu
tênis all star, não vejo a hora de usá-los. Vicenza riu quando eu
disse que era meu sonho. Achou estranha uma jovem da minha
idade nunca ter usado essas coisas. Tentei desconversar dizendo
que meu pai é um homem bem rígido e formal, por enquanto ela
acreditou.
Voltamos pra casa no fim da tarde, estava ansiosa pra falar
com James. Um dia longe de casa parecia uma eternidade. Sei que
estou me divertindo com as novidades, mas sei que ele não está se
divertindo com essa situação, tendo em vista que ficou com papai.
— James, sou eu, Nadine.
— Nadine, está tudo bem? Já chegou? Estava tão preocupado
com você! — desata a falar, feliz por saber que estou bem e em
segurança.
— Calma, estou bem! Esse é meu novo número, pode me
ligar, mas por favor, não passe pra ninguém! Como está o papai? —
pergunto preocupada.
— Está desesperado, o que esperava?
— O que você disse?
— Nada, falei que não sabia de absolutamente nada! Tome
cuidado Nadine, ele está movendo céus e terra pra te encontrar.
— Você precisa me ajudar, não posso voltar, James. Arrumei
um lugar pra ficar, amanhã mesmo saio em busca de emprego.
— Vou pensar em algo e voltamos a nos falar em breve! Não
esqueça de abrir a conta, pra eu te mandar mais dinheiro.
— Amanhã faço isso. Se cuida James, te amo.
— Também te amo.
Desligo o telefone sentindo um grande aperto no peito, não
era desse jeito que pensava em viver minha vida, fugindo, e longe
daqueles que amo…
— Será que minha nova amiga de quarto tem um irmão gato,
pra me apresentar? — arrisca Vicenza encostada na porta
entreaberta.
— Estava ouvindo minha conversa? — me assusto com a
possibilidade de ter sido descoberta.
— Só o finalzinho, fica tranquila. Mas ouvi que está procurando
um emprego, posso ver com um conhecido se ainda está disponível
a vaga de hostess, tem experiência?
— Não, mas aprendo rápido, prometo!
— Tá bom, com uma condição! — propõe animada sentando
ao meu lado no sofá.
— Qual?
— Sexta à noite vai comigo em uma balada, vou te apresentar
a noite incrível de Paris. — Lanço um sorriso convidativo. Louca pra
conhecer uma balada, ver pessoas, ser tratada apenas como
Nadine, uma jovem mulher em busca de aventuras…
Vicenza saiu cedo para o trabalho. Fico ansiosa por sua
ligação, torcendo para que a vaga ainda esteja disponível. Da janela
do apartamento, observava o movimento rotineiro de Paris, e apesar
de ser tudo muito diferente por aqui, sinto-me feliz e paz. Livre, e
essa é a melhor parte, sentir a liberdade dos pés à cabeça.
Sem ter muito o que fazer, decido preparar o jantar para minha
nova amiga, quero agradecer a ajuda. Abro a geladeira e me deparo
apenas com cervejas e algumas guloseimas. Caminho até o
mercado que fica na mesma rua do condomínio. Massa de
espaguete ao molho branco e um bom vinho tinto, combinação
perfeita.
Enquanto cozinho, lembro da carta deixada para meu pai:
“Papai, perdoe-me por fugir, não quero lhe deixar zangado,
ou ir contra a sua autoridade, mas preciso trilhar meu próprio
destino, não posso me casar com o Príncipe Willians, não o amo.
Essa vida de monarquia não é pra mim. Espero que um dia me
perdoe por essa decepção, e entenda. Prometo que ainda lhe darei
muito orgulho. Não subestime James, ele está pronto para assumir
o reinado de Liechtenstein, tenho certeza que será um Rei
magnífico, confie! Não se preocupe, ficarei bem. Te amo.”
Por alguns instantes me perco em pensamentos, e nem
percebi a hora passar. Vicenza tem o péssimo habito de me pegar
desprevenida, chegou fazendo aquela bagunça, e ali tive a certeza
que me encontrei, em uma vida tranquila, com uma amiga de quarto
um tanto excêntrica. Em um lugar onde posso começar minha vida,
e ser responsável por minhas próprias escolhas. Um lugar pra
chamar de meu. Meu lar.
— Que cheiro é esse, Nadine, está maravilhoso! —
— Estou preparando nosso jantar. Está quase pronto — digo
terminando de colocar os pratos sobre a bancada de mármore.
— Um tá bom mesmo, — constata depois de lamber a colher
recém tirada da panela quente. Vou tomar banho rápido e já volto!
Improviso na decoração da mesa com o que consigo encontrar
na casa de uma brasileira básica e moderna ao quadrado. Sem
muitos utensílios e nem requinte, ainda assim ficou uma graça.
— Que coisa mais linda amiga, adorei!
— Obrigada! Vamos, sente-se, vamos comer — convido
ansiosa para que ela prove meu prato favorito.
— Caramba Nadine, isso aqui está muito top! — Sorri, gosto
do jeito que ela se expressa, é tão… espontâneo.
— Meu sonho é virar uma grande chef de cozinha, abrir meu
próprio restaurante… — Viajo nos sonhos com a cabeça apoiada
nas mãos e logo a cabeça pesa me fazendo derrubar o copo de
vinho na mesa.
— Não se preocupe, vou pegar um pano — Vicenza se
prontifica tranquila ao ver a minha feição desesperada.
— Desculpe, nossa, sou muito desastrada — expliquei sem
jeito, envergonhada esperando uma bronca, que não escuto, só
uma risada e um olhar compreensivo.
— Relaxa, quem nunca fez isso?!
E naquele mesmo minuto enquanto ríamos da situação,
penso que se estivesse na mansão, seria repreendida de maneira
cruel por esse deslize.
— Nadine, consegui uma entrevista pra você amanhã, a vaga
ainda não foi ocupada, — sorri contente, quase eufórica. — Calma,
antes deixa eu te inteirar, o dono do Hotel é o Diogo em sociedade
com o solteirão mais cobiçado da área, — encaro com um olhar de
interrogação. — Dominic Levy é o dono do restaurante Levi’s
Gourmet, lindo, educado, gostoso, — se abanou maliciosamente ao
lembrar. — Porém, depois que sua noiva terminou com ele, o hotel e
o restaurante deram uma boa caída no movimento e ele virou um
tremendo babaca.
— Porquê? — questiono.
— Ela era quase sócia dele, e chef do restaurante. Uma
cozinheira de mão cheia, muito habilidosa na cozinha, dona de
vários títulos e premiações na gastronomia parisiense, o que deixou
o hotel e o restaurante famoso na época. Quando Bella saiu, levou
com ela toda a equipe e a clientela fixa para o hotel onde se
associou. Desde então, Dominic deixou as coisas desandarem um
pouco e não conseguiu um chef a altura pra substituí-la.
“Pode ser a minha grande oportunidade, quem sabe depois
que estiver lá dentro, possa mostrar meu talento”. — Penso
esperançosa.
— Você vai conversar com Diogo, ele é o presidente do hotel,
e responsável por tudo, mas não se preocupe, ele é muito gente
boa, e vive me chamando pra sair — se gaba mexendo os ombros
espevitada como se aquele comentário fosse primordial eu saber.
— E porque nunca aceitou?
— Sou piriguete, não gosto de misturar vida pessoal e
trabalho, nunca dá certo! Não que eu não sinta vontade, porque ele
é um gato, mas prefiro evitar.
— O que seria piriguete? — indago curiosa e ela ri.
— Uma mulher ousada, que gosta de provocar e não curte
relacionamentos sérios.
— Entendido e anotado! — brinco, talvez eu queira ser
piriguete também.
Vicenza fala muito bem o francês e o inglês, mas quando fala
seu idioma, sinto tanto orgulho saindo de suas palavras, que deu até
vontade de aprender mais afundo sua língua, principalmente as
músicas, ela se diverte ouvindo o tal do Zé Neto e Cristiano.
Capítulo 5
Sinceramente não sei como uma pessoa pode mudar tanto da
noite para o dia, Bella sempre se mostrou uma mulher
surpreendente, parceira e muito profissional, bom, pelo menos até
ter certeza que não haveria casamento.
Nosso relacionamento não estava dando certo há um bom
tempo, brigas, cobranças e muito ciúmes. Detesto esse tipo de
situação.
Sou pragmático e objetivo, a vida me ensinou a ser assim,
nada de perder tempo com bobeiras.
Queria casar… Eu casar? Fala sério!
Nunca pensei em me casar, do jeito que estávamos era
perfeito, cada um na sua casa. Eu administrava o restaurante, ela a
cozinha, sem perca de tempo. E então ela surtou quando eu disse
que não a pediria em casamento.
— Estamos juntos há cinco anos, e nada Dominic? — indaga
apreensiva, esperando que sua pressão psicológica fizesse efeito.
— Estamos bem assim, pra que estragar, Bella!
— Pra quê!? Eu não tenho mais tempo pra esperar você
crescer Dom, não tenho mais tempo pra esperar você querer ter um
filho. Desde que começamos a namorar eu sabia que esse
relacionamento seria uma perda de tempo; a diferença de idade
seria um peso, e eu quis teimar, olha no que deu! — brada em tom
de desabafo, desesperada.
Entendo seu relógio biológico e seus sonhos, só não posso
fazer algo que não quero só porque ela quer.
Meu pai me deixou um grande ensinamento antes de morrer:
casamento é capricho, sexo por sexo a gente arruma na rua sem
compromisso e sem dor de cabeça.
Casar só pra passar um tempo e ter que se separar? Ter
filhos pra vê-los sofrer igual eu sofri sendo jogado todo feriado e
férias de um lado para o outro!? Não mesmo!
Para falar bem a verdade nunca me apaixonei de verdade,
nunca deixei o tal do amor entrar em minha vida e no meu coração.
Já vi muitos amigos sofrerem por esse sentimento, e não, nunca
mesmo quero passar por isso!
O pior de toda essa situação é que quando terminamos ela
acabou com a reputação do meu restaurante, levou toda a equipe e
simplesmente me deixou na mão. O hotel e o restaurante estavam
passando por um momento delicado antes do nome dela estampar a
fachada. E sem hipocrisia, foi por conta dela que o Levi’s entrou no
ranking dos restaurantes mais recomendados da França.
Durante cinco anos nos mantivemos intactos na categoria
três estrelas e agora, agora está tudo indo por água abaixo. Diogo
também está sendo prejudicado com essa vingança, querendo ou
não, o hotel e o restaurante se mantinham muito bem juntos por
causa da Bella. Além de linda é uma cozinheira incrível, isso não
posso negar. Seu nome e sobrenome tem grande peso na
gastronomia francesa e isso fez e faz toda a diferença.
Contratei inúmeros chefs e nenhum deles conseguiu cativar
nossos clientes como ela. E o que aconteceu? Dívidas e mais
dívidas, o fundo de caixa foi quase todo pra lata do lixo na tentativa
de manter o restaurante aberto, e consequentemente o hotel, e
senão achar uma solução imediata, não vai ter jeito a não ser
fechar.
Esse pensamento me corrói por dentro, meu pai lutou tanto
para construir esse lugar e eu não soube conduzir, acabei com tudo!
Não totalmente, papai também deixou muitas dívidas ativas,
hipotecas, empréstimos, tive que me virar pra conseguir resolver
tudo.
Porém não soube administrar, achei que ser empresário de
uma grande empresa era fácil, afinal, eu tinha feito anos de
administração e finanças, entretanto minha imaturidade e ego não
deixaram isso acontecer, e estou aprendendo da pior forma
possível.
— Dom, posso entrar? — Diogo bate à porta e entra.
— Oi!
— A Vicenza…
— Que Vicenza? — interrompo ríspido sem paciência
alguma.
— Nossa recepcionista, ela indicou uma amiga para o cargo
de hostess, ela virá amanhã fazer a entrevista, quer acompanhar?
— Não. Você pode cuidar disso pra mim? — olho pela janela
com pensamento distante. — Amanhã preciso ir ao banco, ver
aquela questão do empréstimo. Senão acharmos uma solução pra
voltar o giro de caixa como antes, terei que fechar essa unidade.
Depois da morte do meu pai e aposentadoria do seu Martin,
Diogo e eu fizemos uma sociedade pra nos ajudarmos com o legado
de nossas famílias. Eu queria que meu pai ficasse orgulhoso de
mim, de onde quer que ele estivesse.
— Vamos pensar com calma, não é bom ficar sofrendo por
antecipação. Vou continuar pesquisando chefs habilidosos. Vai dar
certo! — ele fala otimista na tentativa de me animar. — Sexta à noite
vamos sair, vou te levar pra curtir. Quem sabe não leva pra casa
uma gatinha francesa.
— Não estou a fim Diogo.
— Te pego às 22h na sua casa — informa sem me dar chance
de recusar. E mesmo sabendo que não conseguirei driblá-lo, não
acredito que uma balada regada de mulheres vá resolver.
No fim da tarde recebo uma visita inesperada, e lá vamos nós
outra vez!
— Oi querido, tudo bem?
— O que faz aqui, Bella? — indago não querendo discutir.
— Vim tratar de algumas coisas com o RH!
— Tem certeza que é isso o que quer fazer? Você tinha uma
boa clientela aqui, não é porque não estamos mais juntos que não
possa trabalhar…
— É sério Dominic? Você acha mesmo que sou tão idiota ao
ponto de facilitar para você? Ficamos juntos durante cinco anos,
cinco anos perdidos! Pensa que eu sou qualquer uma pra você
passar tempo, não sou! — vocifera elevando o tom de voz.
— Nunca pensei que seria capaz de me prejudicar por não
acontecer o que queria… — lamento tocando na ferida encarando-a
com decepção. — Só não estou preparado para casar, a gente se
dava bem do jeito que era, porque não continuar? — argumento na
tentativa de convencê-la a ficar comigo e consequentemente no
restaurante.
Egoísta? Talvez!
— Estava bom pra você Dominic. Pra mim não! Sabe, eu te
amei, planejei um futuro ao seu lado, achei que me amasse
também, que faríamos conforme manda o figurino, namoro, noivado,
casamento… Burra, me enganei, fui burra demais em achar que o
solteirão mais cobiçado de Paris, cederia ao compromisso. Enfim,
não tem problema, quem saiu perdendo foi você! Agora tenho que ir,
ah, antes que eu esqueça, vai se foder.
Fico abismado por sua fúria, uma mulher rejeitada é mesmo
vingativa.
Chego em casa exausto com uma vontade surreal de jogar
tudo pra o alto e começar de novo em outro lugar. Nunca pensei que
seria tão difícil… Confesso que não tinha esse tipo de problema em
New York, lá a maioria das mulheres seguem conforme a banda
toca, qualquer uma delas estaria satisfeita, só de passar uma noite
na minha cama. Não que eu seja libertino, ou algo do tipo, mas sei
que tenho um charme que chama atenção.
Sirvo uma dose de Bourbon com gelo e viro todo o líquido na
mesma hora, e assim faço com as outras três doses seguintes.
Depois de me sentir um bosta, entro para o banho meio tonto
deixando a água fria cair sobre meu corpo. De toalha caio na cama
e adormeço.
Acordo assustado com a campainha tocando sem parar.
Quem será a essa hora! — resmungo de mal humor.
— Mãe, o que faz aqui tão cedo?
— Eu te liguei ontem a noite toda Dominic, porque não me
atendeu? — reclama entrando no apartamento reparando em tudo.
— Não vi!
— Bebeu de novo, Dominic? Está sozinho? — indaga, já
sabendo a resposta.
— Só foi umas doses…
— Umas doses? O que você quer? Acabar como seu pai,
Dominic!?
Seu argumento me pareceu convincente e me fez encarar
meus pés descalços lembrando do fim que meu pai teve.
Depois de sua aposentadoria precoce devido a um AVC, se
rendeu a bebida e acabou em cima de uma cama, apodrecendo aos
poucos.
— Desculpa mãe, só queria relaxar um pouco, não exagerei,
bebi …
— Só vou falar mais uma vez Dominic, não quero te perder,
então seja homem e enfrente os seus problemas de cabeça erguida.
Esqueça esse negócio de beber para esquecê-los, isso não resolve,
porque quando acordar, meu filho, eles ainda estarão aqui! —
aconselha entristecida envolvendo-me em seus braços.
Minha mãe é a única que não se intimida por minhas
grosserias e me coloca no chão se quiser. Ela costumava me
conhecer por dentro e por fora, contudo, depois da morte de meu
pai, me fechei na tentativa vã de esconder a dor que sentia, acabei
camuflando o cara que eu gostava de ser.
— Agora vá se arrumar, vou preparar um café pra você e
depois me dê uma carona até em casa.
— Está bem, dona Louise.
Tomamos café tranquilamente, conversamos sobre a visita da
Bella, e sobre os problemas que estou enfrentando no restaurante, e
apesar de ter uma relação fria com ela, sempre me conforta estar ao
seu lado, mesmo que não escute o que ela tenha a dizer.
Depois de deixá-la em casa, sigo para o hotel.
— Bom dia Sr. Levy.
— Bom dia! — respondo seco para a recepcionista alegre
demais.
Subo para minha sala e lá fico por horas. Ligações.
Papeladas. Reuniões on-line, mais ligações e nada! Nada de
resolver absolutamente nada.
Desço até o restaurante para tomar um café, e quase caio
pra trás ao ver uma bela morena de olhar familiar, a mesma mulher
que me atropelou no aeroporto e caiu em meu colo no avião. Sem
contar o arranhão. Olho imediatamente para as marcas deixadas
por ela em minha mão.
O que será que ela está fazendo aqui?
A recepcionista fala alguma coisa e elas seguem até a sala do
Diogo. Será que é ela a candidata para trabalhar aqui? Não é
possível! Subo logo atrás e observo de longe Diogo conversar com
a moça, ela é diferente, delicada, olhar ingênuo, um tanto desatenta
e desajeitada, mas até aí normal.
— Seja muito bem vinda Nadine, te aguardo amanhã pra te
apresentar tudo! — ele diz sorridente apertando sua mão.
— Muito obrigada Sr. Diogo, até mais.
— Ouvindo atrás da porta? — Diogo ironiza ao perceber
minha presença, fico tão absorto que não vejo quando ele dá a volta
e me pega no flagra.
— Você me assustou!
— Se queria conhecê-la porque não foi até a sala? —
questiona curioso erguendo uma de suas sobrancelhas.
— Lembra que te falei da mulher linda e desajeitada que me
atropelou no aeroporto dias atrás? — Balança a cabeça
confirmando — Então, é ela!
— A mesma que caiu no seu colo te fazendo perder toda
aquela planilha?
— Sim!
— A mesma que deixou esses arranhões aí na sua mão?
— Sim, Diogo, ela mesma! — confirmo irritado por tantas
perguntas.
—Tem certeza?
— Absoluta! Não iria esquecer aqueles olhos.
— Está doente? O que fez com meu amigo? — zomba Diogo
soltando uma gargalhada de leve colocando a mão em minha testa.
— Cala a boca, só estou dizendo que ela é uma mulher muito
bonita, só isso!
— Então tá! Bom, a contratei, ela é educada, inteligente, e
pareceu precisar muito do trabalho. Sem falar que mora com a
Vicenza.
— Para de babar, só de falar o nome dela aparece até
estrelinhas em volta da sua cabeça — caçoo rindo da cara dele.
Deus me livre ficar apaixonado desse jeito.
— Pode rir, gosto dela mesmo, mas pensa numa mulher difícil.
— Com tanta mulher por aí, foi se interessar logo pela
recepcionista! — dou de ombros sem entender.
— Fazer o quê, aquele jeito brasileiro dela me deixa louco.
— Doido pra ver ela dançando, né!? — comento deixando
batidinhas em seu ombro em sinal de apoio.
— Sonho idealizado — rimos.
Ao chegar em casa me surpreendo, na verdade me assusto.
— O que está fazendo aqui? — pergunto ao ver Bella sentada
em meu sofá.
— Sua chave — gira o arco do chaveiro em seu dedo.
— Está entregue, pode ir!
— Queria pedir desculpas Dom, estava muito chateada e
acabei falando coisas que não devia.
— Tudo bem Bella, está tudo certo.
— Você não sente nada por mim, não é mesmo? Te amei tanto
Dominic, tanto que não sou capaz de mensurar. Como você pôde
fazer isso comigo, o que eu deixei faltar pra você!
— Nada! Só não sou um homem pra casar, você merece coisa
melhor Bella, gosto de você, talvez não com a mesma intensidade,
infelizmente a gente não manda no coração — desabafo olhando
para o outro lado torcendo para aquela conversa acabar o quanto
antes.
Sou um cafajeste, eu sei, sobretudo sou sincero quanto ao
que podem esperar de mim.
— Por que você é assim, tão frio!? Não sei como eu fui me
apaixonar por um idiota como você! — vocifera e mais uma vez saiu
batendo a porta com força, qualquer hora dessas uma delas vai cair.
Tomo um banho demorado pra relaxar. Ainda com cabelo
úmido pego uma cerveja na geladeira, encaro a garrafa na minha
mão e controlo a vontade de beber a colocando em cima da pia.
Sento no sofá pra assistir televisão e me distraio, as palavras da
minha mãe não saiam da minha cabeça, não posso perder o
controle, não posso!
Não posso causar essa decepção, ela já sofreu demais! E
apesar de não entender e não aceitar o que ela fez, não consigo
simplesmente ignorá-la.
Cochilei. Acordo assustado ao percebo que sonhei com a
bela morena de olhar ingênuo e feroz, a mesma moça desajeitada
do aeroporto.
Agora fodeu mesmo, só o que me faltava!
Tento não pensar muito sobre isso. Não estou com cabeça
para me envolver com uma garota como ela, dá pra ver que não é
nada parecida com as mulheres bem resolvidas com quem estou
acostumado a sair.
Demoro um tempo até pegar no sono outra vez, e em meio
aos pensamentos adormeço.
Capítulo 6
A entrevista foi um sucesso. Consegui o trabalho. Fiquei tão
nervosa, mas no fim Vicenza tinha razão, o senhor Diogo é muito
legal.
Ele me fez perguntas básicas como: minhas experiências,
últimos trabalhos, qualificações, e etc…
No começo me senti desconfortável, e com medo de falar
besteira, porém a conversa foi fluindo e ele conseguiu me deixar a
vontade, principalmente quando disse que o emprego é meu.
Sem contar na bolsa de estudos. Estou tão feliz que parece
até um sonho: tenho uma casa, uma amiga, trabalho e uma bolsa de
estudos em uma das melhores faculdades de gastronomia de Paris.
Entro no elevador com um sorriso de ponta a ponta, contente
por tudo o que planejei estar dando certo. Analiso meu reflexo no
espelho e fico orgulhosa de mim. Gosto dessa versão. Corajosa!
Vicenza me ajudou a escolher a roupa, um tubinho preto
social, um salto não muito alto, cabelos soltos e maquiagem
delicada, nada parecido como eu me vestiria se estivesse na
mansão.
Encaro o visor pelo espelho e ainda falta alguns andares para
o térreo, e nesse momento lembro da pergunta que me deixou em
uma saia justa.
— Com o que trabalhava antes, Nadine?
E agora, o que eu respondo? — Pensei.
— Buffet! — respondi apressada — Organização de festas
também — menti e não me senti orgulhosa por isso.
Depois me senti mais à vontade em contar até mais do que
devia, como se ele estivesse me entrevistando para eu ser sua
amiga. Ele é mesmo muito cordial e simpático.
— Eu consegui, consegui o emprego! E o curso que eu
queria… — grito para Vicenza e ela corre em minha direção e me
abraça.
— Sabia que ia conseguir. Parabéns, amiga!
— Amiga…
— O que foi? Não gosta que eu te chame assim? — questiona
um pouco contrariada enrolando um de seus cachinhos.
— Não, não é isso, é que eu nunca tive uma amiga antes,
estou muito feliz por ter te conhecido. — Lanço um sorriso de
gratidão. — Obrigada por tudo o que está fazendo por mim, Vi.
— Não tem que agradecer, gostei de você desde a hora que te
vi. E tenho certeza que também gostou de mim, por que eu sou
demais! — se gaba afofando os cabelos encaracolados novamente.
— Gostei mesmo! Agora vou pra casa preparar o jantar, te vejo
mais tarde.
— Nada de jantar, vamos sair hoje, esqueceu? Comemos algo
no caminho, se arruma e fica linda.
— Posso usar meu tênis? — Pergunto sem graça, sem saber
que tipo de roupa tenho que usar para esse evento.
— Claro que pode! Vai do jeito que se sentir confortável,
vamos dançar até o chão!
— Como assim?
Ela ri.
— Vou levar você em uma balada que toca algumas músicas
brasileiras, vou te mandar um vídeo no celular pra ir se
familiarizando com a batida. — Sua voz soa alegre e ansiosa pra eu
fazer parte de seus gostos, acho que ela também não tem muitas
amigas.
— Está bem!
Quero aprender tudo. Tudo o que eu puder pra ser uma
garota normal e antenada nas novidades. Graças aos meus livros e
a internet, não sou tão leiga assim, mas na prática é zero
experiência.
Caminho em direção a nossa casa bem devagar, curtindo a
liberdade. O vento balança meus cabelos, e o barulho dos carros e
das pessoas que passam por mim chamam minha atenção.
Sorrio sozinha, não consigo acreditar que estava caminhando
em uma calçada com outras pessoas, sem seguranças, sem vestido
longo e luvas pinicando. E tudo parecia mesmo um sonho, um
sonho bom demais para uma princesa do interior, em uma aventura
na cidade grande, totalmente abismada com o mundo fora dos
contos de fada.
Olhando para cima, encaro os prédios e sua arquitetura
magnífica, e sem aviso bato a testa em um poste caindo no chão
com tudo. Só pude sentir o galo subir na testa instantaneamente.
— A senhorita está bem?
Abro os olhos lentamente depois de perceber que acabei de
passar mais uma vergonha daquelas, e ao ouvir uma voz que
esperava minha resposta, fico muda por alguns instantes, apenas
contemplando a beleza coreana do rapaz.
— A senhorita está bem? — repete estendendo a mão para
me ajudar a levantar.
— Acho que sim — respondo segurando em sua mão, ao
levantar levo a mão de imediato em cima da dor latente.
— Vem, vou pegar gelo para colocar aí. — Segue para dentro
do café bem de frente.
— Não precisa se incomodar, eu não estava prestando
atenção…
— Não mesmo! — Brinca abrindo um sorriso meigo. —
Coloque isso, vai melhorar logo. Qual o seu nome? — ele me
entrega uma bolsa de gelo, obrigando-me a sentar em uma das
mesas.
— Nadine e o seu?
— Lorenzo, muito prazer! — Ele sorri simpático e me forço a
retribuir.
— Trabalha aqui?
— Sim, esse café é do meu irmão, como ele teve que viajar,
estou tomando conta.
— Muito gentil de sua parte.
— Trabalho é trabalho! Agora preciso cuidar de umas coisas,
está tudo bem mesmo? Se quiser posso te levar em casa, saio
daqui a pouco. — Me olha atento, penetrando seus olhos puxados
nos meus.
— Não se preocupe, estou bem, moro aqui perto! Obrigada
mesmo Lorenzo, você foi um cavalheiro.
— Disponha princesa.
Ao ouvir a palavra “princesa”, meus olhos se arregalam, por
um instante penso ter sido descoberta.
— O que disse? — acentuo assustada.
— Desculpa, fui invasivo? Foi só um modo de falar, sinto muito
— explicou aflito e envergonhado sem saber onde enfiar a cara.
— Tudo bem! — Respiro aliviada deixando totalmente visível
que escondia alguma coisa.
— Vem tomar um café qualquer dia desses, por conta da casa
— convida me acompanhando até a saída, e antes de sair olho para
trás e assinto com um sorriso amarelo nos lábios.
Chego em casa com uma dor de cabeça terrível, sorte que
trouxe minha caixinha de remédios. Tomo um comprimido e deito
com o coração apertado, porque apesar de me sentir muito bem
aqui, sinto falta de casa, do meu pai e de todo o seu jeito autoritário,
e do meu irmão, meu melhor amigo.
— Nadine, eu não acredito que ainda está assim? — brada
Vicenza ao entrar no quarto.
— Que horas são? — pergunto ainda de olhos fechados.
— Quase 20h, acabei me atrasando para sair do hotel, vamos
já para o banho que vou escolher uma roupa bafônica pra você. —
A olhei sem entender sua referência — Linda — bufa ao explicar
dando aquela revirada de olhos que é a sua marca registrada.
Tão espontâneo vindo dela.
— Eu caí na rua e bati com a cabeça, mas está tudo bem,
falando nisso, o que significa piriguete, mesmo? — lembro assim do
nada de uma conversa de outro dia. — Vicenza gargalha alto
fazendo-me rir também.
— Você é doidinha mesmo, né!? Bom, tem dois tipos de
piriguete, uma delas é quando a mulher com relacionamento firmado
ou não, se relaciona com outras pessoas, casadas ou solteiras, —
me espanto — calma, não é o meu caso. O outro tipo são mulheres
que tem seu modo único de se vestir, não se importa com o tempo
ou aonde vai, ela veste o que quer, quando quer e pronto.
— Entendi, quero ser piriguete então, igual a você!
— Tá bom, vamos trabalhar nisso, agora anda logo — diz sem
dar crédito ao meu desejo. Será que não sirvo pra ser piriguete?
Tomo um banho rápido e ao sair me deparo com a roupa
escolhida por ela, o all star branco, calça jeans rasgada, e uma
regata branca com um belo decote no colo, me vesti apressada sob
seu olhar atento, depois de me ver no espelho, fico me admirando,
pensando em como é bom se sentir bem e confortável, sem aqueles
vestidos que pinicam, luvas que soam as mãos e aqueles saltos que
apertam o pé.
— Gostou?
— Amei, — meus olhos brilham com meu reflexo no espelho.
— Obrigada, Vi!
— Isso é pra você, não é joia nem nada, mas… — dei risada
ao ouvi-la falar, é muito gostoso ser tratada bem, não porquê sou
uma princesa, mas só pelo simples fato de ser querida.
— É lindo — agradeço enquanto Vicenza coloca o colar bem
grande no meu pescoço, ele tinha várias correntes que faziam um
contraste bonito, e para completar, brincos de argola dourados.
— Agora vou te maquiar, fica quieta. Prontinho! — Conclui
minutos depois e ao me olhar no espelho, fico ainda mais perplexa
com meu reflexo totalmente mudado, o contorno preto em volta dos
olhos realçaram o tom amendoado deles, e o batom nude, deu um
contraste incrível nos lábios.
— Ficou maravilhoso Vicenza, adorei! Nunca me vi tão linda e
sensual. — Abracei seu corpo miúdo.
— Eu sei, arraso né! Tudo bem que você já é linda, não
precisa de muita coisa. Bom, agora vou me arrumar rapidinho.
Aguardo Vicenza no quarto rindo com sua melodia sertaneja.
Vicenza é uma mulher linda, sua pele morena e seu cabelo
volumoso e enrolados combinam com o seu estilo único de ser.
Assim que sai do banheiro, dá uma voltinha em minha frente.
— O que achou?
— Piriguete — brinco.
— Isso aí amiga, aprendeu rápido. Gosto de saltos, mas vou
te fazer companhia no tênis hoje. — Sorrimos.
Pegamos o táxi em frente ao condomínio e partimos pra tal
balada abrasileirada.
— Posso te contar um segredo? — Ela me olha concordando
— Eu nunca fui a uma balada.
— Menina, você morava aonde mesmo hein, no fim do
mundo?
— Quase! — respondo divertida e ansiosa para minha
primeira noite de farra.
Capítulo 7
Depois de esperar um bom tempo em uma fila enorme,
entramos. Meu coração bate acelerado, e tento assimilar o ambiente
agitado. As luzes piscantes me deu um nó na cabeça. Pessoas
bebendo e dançando de forma sensual, muito diferente do que
estou acostumada a ver, outras até fumam em um canto descoberto
do local.
— É abafado aqui! — comento me sentindo sufocada.
— Você se acostuma. É sério que nunca frequentou um lugar
como esse? — Vicenza replica inconformada.
— Sério! — dou de ombros e respondo fazendo uma feição
de dó, eu realmente estava abismada e maravilhada com o que
estava presenciando.
— Vem, vamos tomar alguma coisa.
Vicenza me arrasta para o meio da multidão até o balcão
do bar, pede duas doses de tequila, gelei, nunca tomei nada que
não fosse vinho ou champanhe.
— Toma logo! — incentiva eufórica.
— Eu não sei como se toma isso — assumo observando a
bandeja com pedaços de limão e sal.
— Passa o limão no sal, chupa o máximo que conseguir e
vira tudo. Vai queimar um pouco, mas é normal, não se preocupa
assim que é bom.
Fiz como ela disse e quase morri engasgada. É engraçado
como é ruim e amargo no começo, e depois vai ficando agradável
ao paladar. Estranho!
— Quero outra! — peço entusiasmada.
— Vamos com calma, por que a noite é uma criança e amanhã
é seu primeiro dia no trabalho.
— Tinha até esquecido. — Sorri sentindo minhas bochechas
queimarem.
— Não vai querer ir trabalhar de ressaca, vai por mim, é uma
merda! —Vicenza aconselha com a voz da experiência, e me puxa
entre as pessoas até a pista de dança.
A casa está cheia e me sinto apertada e desconfortável entre
as pessoas. Vicenza dança de forma leve e descontraída, como se
estivesse flutuando no ritmo da música, e eu me sentindo um
peixinho fora d’água parada feito estátua. Não sei dançar como eles.
— Vou ao banheiro, já volto! — aviso em seu ouvido, enquanto
ela rebola pendurada no pescoço de um desconhecido bonitão.
Na verdade, arrumei uma desculpa para sair do tumulto, sento
no banco alto do bar e peço mais uma bebidinha daquela com
limão. Viro bem rápido e peço mais uma, sinto minhas bochechas
queimarem outra vez, e um calor toma conta de todo o meu corpo,
que me obrigada a ir até o banheiro molhar o rosto.
Encaro meu reflexo no espelho embaçado do banheiro, e
vejo tudo rodar. Sabia que não devia ter bebido essas coisas. Agora
entendo como as pessoas se sentem quando bebem demais.
Tudo bem que eu não sou referência, bebi apenas três doses,
mas pra quem não está acostumada com esse tipo de bebida forte,
é uma tremenda furada! — resmungo encarando-me com
arrependimento.
Lavo o rosto esperando o equilíbrio voltar o mais próximo
possível do normal, e saio apressada para encontrar com Vicenza, e
como sempre, se não causar algum dano a alguém ou a mim
mesma, não sou eu… Esbarro bruscamente em um rapaz
derramando toda a bebida de seu copo em sua camisa branca.
— Ai meu Deus, me desculpe, eu não tinha te visto, me
perdoe. Vou te pagar outra bebida — disparo a falar olhando para o
estrago que fiz.
— Nadine?
Olho para o homem e tomo um susto ao ver quem era.
— Sr. Diogo, que vergonha, me desculpe mesmo…
— Calma, está tudo bem, e não precisa me chamar de
senhor, só Diogo.
Continuo encarando a mancha em sua roupa.
— Nada que um pouco de água não resolva, você está bem?
— acrescenta descontraído, sem se importar com a roupa.
— Acho que preciso ir embora, esse negócio de tequila não
me fez muito bem! — constato ao sentir meu estômago embrulhar e
tudo girar novamente.
— Está com a Vicenza? — pergunta segurando em meu
braço, quando faço menção de cair. Confirmo envergonhada. —
Sente- se aqui. Por favor, uma água pra moça — pede ao barman.
— Fica aqui, vou avisar meu amigo que vou te levar pra casa e
procurar sua amiga. Bebe a água! — ordena e assinto sentindo
minha cabeça pesar e meu estômago avisar que não está nada
bem.
— Amiga estava te procurando, o que aconteceu?
— Eu bebi mais uns daqueles, e não sei o que aconteceu,
derramei bebida no seu Diogo, e agora acho que ele vai me mandar
embora. Estraguei tudo! Não estou acostumada a beber essas
coisas… — desabafo quase chorando sentindo minha língua
embolar.
— Oi Vicenza.
— Oi Sr. Diogo, tudo bem?
— Melhor agora!
Não sei se eu estava muito bêbada, ou se realmente estava
rolando um clima entre esses dois, comigo ali, passando mal,
chorando igual uma boba no meio da balada.
— Vamos Nadine, vou te levar pra casa — fala um rapaz loiro
e de olhos verdes intensos. Ele não me é estranho…
— Não te conheço, minha amiga vai me levar, obrigada! —
rebato fulminando seu olhar autoritário.
— Amiga, desculpa, não te apresentei, esse é o seu Dominic,
dono do restaurante que você vai trabalhar.
Engasguei jogando água pra todo lado, eu não dou uma
dentro mesmo. Vicenza começa a rir, e me pega pelo braço
puxando-me disfarçadamente para longe.
— Vicenza, espera! Dominic irá levar sua amiga, toma um
drink comigo!
— Não sei se é uma boa ideia, ela não está legal, é a
primeira vez que tomou tequila, e …
— Não se preocupe, vou levá-la para casa — ouço Dominic
confirmar autoritário. Porque ele é tão bonito? Parece até um
personagem de um dos meus livros favoritos.
O homem sério e com o olhar frio me segura pelo braço
apoiando meu corpo no seu, juro que não tive forças pra questionar.
Apenas balanço a cabeça em negativo, não quero ir embora sozinha
com ele. Vicenza percebe meu desconforto e decide ir com a gente.
Ainda bem!
— Vou com ela, mas podemos beber algo lá em casa, poder
ser? — ela convida Diogo que abre um sorriso contente.
Tomo mais um gole de água olhando para o homem lindo e
cheiroso que me carrega. Seu olhar sobre mim é estranho, será que
perdi meu emprego?
Nem comecei e já fui demitida! Trágico!
Do lado de fora nos apoiamos na parede esperando Diogo
que buscar o carro com Vicenza, tive que esperar sozinha com o
todo poderoso. Não sei o que deu em mim, me soltei de seus braços
bruscamente, seu olhar intimidador está me incomodando, quem ele
pensa que é!
— Por que está me olhando dessa maneira? — pergunto
petulante.
— De que maneira? — retruca na defensiva desvencilhando
sua atenção de mim.
— Desse aí! Vai me mandar embora por que me viu desse
jeito, tudo bem, eu mereço, mas o meu primeiro dia é amanhã,
então você não pode me mandar embora, por que eu não fiz nada
de errado, eu sei dos meus direitos.
— Fica acalma, não vou te mandar embora. Você precisa de
um banho e uma boa noite de sono, amanhã estará melhor para o
seu primeiro dia de trabalho — ironiza seriamente tentando não me
olhar nos olhos.
— Não estou me sentindo muito bem … — sussurro sentindo
meu estômago revirar outra vez.
— Vem cá, o carro já está chegando!
Juro que tentei segurar, contudo, quando seu perfume
amadeirado entrou por minhas narinas, não aguentei, vomitei em
seus pés. Juro que se pudesse abriria um buraco e me enterraria
para sempre.
Por que tenho que ser assim?
— Tudo bem! Não tem problema — lamenta com sua
carranca séria.
— Desculpa, que vergonha — peço desesperada sem
conseguir olhar em seus olhos.
— O que aconteceu? — Diogo pergunta, mas ao perceber
começa a rir sem parar em zombaria.
— Amiga, você está bem?
— Quero ir pra casa.
— Tudo bem, vamos!
Acordo as 5h da manhã com uma baita dor de cabeça,
caminho morosamente até o banheiro desmoronando o peso do
corpo em cima do vaso sanitário, quase caí, meu corpo parecia
pesar toneladas. Com as mãos na cabeça, a única coisa que me
lembrava, é que vomitei nos pés do meu chefe, derrubei bebida no
outro e apaguei no carro.
Que ótimo, Nadine, que maravilha!
Tomo um banho demorado na tentativa de escoar a vergonha
pelo ralo, em vão claro!
Coloco o uniforme feliz, apesar da dor maçante e latente em
minha cabeça. É meu primeiro dia no trabalho, melhor começo?
Impossível!
Paraliso ao me deparar com um CEO loiro e lindo deitado em
meu sofá com a camisa um pouco aberta deixando à mostra seu
peitoral lisinho e definido.
Ele dormiu aqui? O que eu faço?
Encaro desesperada, as bochechas esquentando de
vergonha. Olho para todos os lados sem saber o que fazer.
— Vai ficar aí me olhando por quanto tempo? — resmunga
fechando a camisa sem desviar os olhos do meu.
— Desculpa, e que… O que está fazendo aqui? Onde está
Vicenza?
— Saiu com o Diogo, achei melhor ficar aqui, caso precisasse
de alguma coisa. Posso usar seu banheiro?
— Claro! Fica ali. — Aponto para a porta no fim do corredor.
Instantes depois, ele sai com o cabelo molhado, revigorado.
— Obrigado! Quer uma carona, vou passar em casa pra
trocar de roupa e depois vou para o hotel.
— Não precisa se incomodar, não quero atrapalhar.
— Incomodo algum, vamos! — Mais uma vez ele é autoritário
e obedeço seguindo-o apressadamente.
Dentro do carro o silêncio é constrangedor, e seu olhar
intimidador em minha direção me deixa completamente
desconfortável. Tempo depois ele entra em um condomínio muito
bonito. Fico maravilhada com a fachada do local, é lindo. Dominic
sai do carro e dá a volta para abrir a porta pra mim como um
verdadeiro cavalheiro.
— Obrigada! — agradeço envergonhada.
Subimos até a cobertura. Seu apartamento é sofisticado.
Para um homem solteiro, ele tem um excelente gosto para
decoração.
— Fique à vontade, já volto!
Assinto encarando as belas obras de arte penduradas na
parede da sala.
Caminho pelo corredor espaçoso reparando em tudo, e sem
querer meu olhar fixa em uma das portas entreabertas. Dominic está
com a toalha em volta da cintura, as gotas de água caindo por seu
abdômen trincado. Engulo em seco ao encarar seu corpo seminu,
quando ele percebe que estou olhando, me encara intensamente
através da brecha, tento disfarçar voltando o olhar para o quadro,
que com certeza não me encantou como antes.
— Vamos! — diz ele recolhendo as chaves e a carteira de
cima da mesa.
Está perfeito em seu terno que emoldura seu corpo
esculpido.
No caminho para o hotel, não conseguia olhar pra ele, a
vergonha estampada em meu rosto e o rubor queimando minhas
bochechas.
— De onde você é? — pergunta quebrando a quietude que
nos rondava.
— De uma cidade do interior da Suécia.
— Interessante, o que faz aqui? Tem família?
— Tenho, mas não moram aqui! Vim para estudar, quero ser
chef de cozinha.
— Surpreendente — comenta em tom de zombaria não
levando a sério o que falei toda empolgada.
— O que foi? Julga que não sou capaz? Pra sua informação
cozinho muito bem! — retruco na defensiva, irritada pelo seu tom
irônico.
— Não disse isso! Mas, será que a cozinha fica inteira aos
seus comandos? — zomba da minha falta de jeito tentando parecer
engraçado, não acho graça, e ele percebe que não fez uma boa
piada.
Capítulo 8
— Obrigada pela carona — agradeço assim que ele estaciona
em frente ao hotel, desço apressada sem nem ao menos olhar para
trás.
— Amiga, ainda bem que você chegou! — Vicenza me
encurrala desesperada. — O que aconteceu? — pergunta curiosa.
— Se você não tivesse me deixado sozinha com um estranho,
que no caso também é o meu chefe, talvez eu tivesse tido uma
manhã menos conturbada. Presenciei uma visão, um tanto…
gostosa — suspiro ao lembrar da cena da toalha.
Vicenza arregala os olhos, e não entendo porque ela está
fazendo isso, então continuo a falar.
— Nunca vi um corpo perfeito igual aquele, admirável…
— Que bom que minhas idas a academia estão fazendo efeito
— sua voz soa atrás de mim, e mais uma vez desejo que um buraco
se abra a minha frente pra me enterrar e nunca mais sair de lá.
Viro devagar sentindo não somente meu rosto, mas todo o
meu corpo pegar fogo pela vergonha de cometer mais uma gafe,
com o meu chefe.
— Desculpa, eu …
— Esqueceu o celular no carro! Te espero no restaurante, vou
te apresentar o lugar — informa com um sorrisinho de canto de
boca, que me fez sentir um friozinho horripilante na barriga.
— Amiga, porque não me avisou?
— Tentei amiga, você tem que aprender a interpretar olhares
— ela ri caminhando de volta para trás do balcão da recepção.
— Agora já foi. — Bufo constrangida. — Conta rápido o que
aconteceu, onde você passou a noite?
— Na casa do Diogo, mas depois te conto, agora vai!
— Tudo bem, até mais tarde.
Apresso meus passos pra guardar minhas coisas no vestiário e
vou ao encontro de Dominic na recepção do restaurante.
— Está pronta? — sua entonação formal me deixa apreensiva,
analiso suas mãos nos bolsos, sem conseguir esquecer a cena em
seu apartamento.
Concentra Nadine, concentra!
— Sim senhor.
— Você vai fazer a recepção dos clientes, ficará sempre
posicionada aqui — ele para em frente à uma pequena mesa na
entrada. — Você fala muito bem, tem um vocabulário formal, é
educada, e carismática, não terá dificuldade…
— Obrigada!
— Geralmente trabalhamos com reserva, mas se caso os
clientes vierem aleatoriamente não tem problema, é só ir de acordo
com a disponibilidade das mesas. Está entendendo?
— Sim!
— Perfeito!
Dominic me apresenta ao chef Antonie, sua equipe de
auxiliares, e aos garçons. Fico mais tranquila quando todos me
receberam com cordialidade e empatia. São todos muito simpáticos.
— Vamos, vou te apresentar as dependências do hotel e te
levar ao RH para assinar as documentações.
Assinto caminhando ao seu lado. Ainda sinto minhas
bochechas pegando fogo, e minha barriga parece ter um buraco
enorme se contorcendo. No elevador não resisto e acabo me
desculpando mais uma vez.
— Sinto muito por mais cedo, eu …
— Está tudo bem!
Depois de conhecer o hotel e assinar as documentações
necessárias no RH, volto para o restaurante para me habituar ao
meu novo local de trabalho.
No horário do almoço, Vicenza me encontra e pra me livrar
dos meus pensamentos depreciativos referente as últimas horas,
puxo conversa:
— Agora me conta tudo o que aconteceu ontem à noite! E
aproveita e me ajuda com essa conta, estou perdida — peço
entregando o aparelho de celular em sua mão.
— Depois que te deixamos em casa, tomamos um drink, o
clima esquentou e a casa é pequena não tinha onde fazer nada.
Dominic estava no sofá e insistiu em ficar para garantir que você
ficaria bem, então saímos e fomos pra casa dele. Nadine, eu dormi
com o meu chefe, onde isso tem chance de dar certo?
— Calma! — acaricio seu antebraço demonstrando apoio.
— Eu resisti a ele esse tempo todo, mas fui fraca dessa vez, e
agora estou com medo. Não posso perder esse emprego!
— Amiga, pelo que pude ver, ele gosta mesmo de você, te olha
com carinho e não com cobiça, acalme-se, conversa com ele, acho
que é a melhor alternativa.
— Aí que tudo, você me chamou de amiga — ela sorri e eu
dou de ombros, falei sem nem ao menos perceber. — Tá, vou tentar,
mas só quando eu conseguir olhar na cara dele — acrescenta.
— Tenho que voltar para o trabalho, nos vemos mais tarde?
— Consegui, sua conta digital está oficialmente aberta —
Vicenza me devolve o celular e agradeço deixando um beijo em sua
bochecha. — Até mais tarde! — Ela vai embora.
Enquanto Vicenza toma banho, ligo para James:
— Nadine?
— James, que saudades, irmão.
— Você está bem?
— Estou ótima! Consegui um trabalho, de Hostes, não é
cozinheira, mas já é um começo. E como estão as coisas por aí?
— Tirando que o papai está surtando porque não te acha,
bem, sem falar no seu noivo que não sai daqui e está compilado
com papai na busca pela princesa perdida.
— Desculpa te fazer passar por isso.
— O importante é que você está feliz! Abriu a conta?
— Sim, acabei de mandar a foto pra você. Como a Nina
está?
— Arrasada, sabe que ela te tem como uma filha, não sabe?!
— Porque as coisas tem que ser assim, James? Porque não
podemos escolher? — Suspiro derrotada ao telefone. — Conseguiu
achar alguma coisa que me ajude nessa loucura descabida?
— Falei com Hernandes da biblioteca central, e achei um livro
com todas as leis. Vou dar uma pesquisada e ver o que consigo, te
ligo assim que descobrir algo.
— Está bem James, se cuida!
— Você também, te amo.
— Amo você!
Desligo apressada assim que ouço o chuveiro desligar,
Vicenza aparece desconfiada na porta enrolada na toalha.
— Falando com meu futuro marido? — brinca com um sorriso
malicioso nos lábios.
— Estava vendo como as coisas estão lá em casa.
— E está tudo bem?
— Na medida do possível, sim! — respondo sem muita
certeza.
Depois do jantar deitamos juntas para assistir televisão, eu
queria contar a verdade pra Vicenza, contudo, ainda é cedo, tenho
medo de colocar tudo a perder, melhor esperar ter uma solução.
— Seu irmão é bonito? — pergunta aleatória quando entra o
comercial do programa, e sua pergunta me faz rir.
— Sim, muito bonito e galanteador.
— Você fala toda bonitinha, o que fazia antes de vir pra cá?
— Estudava.
— Faculdade? — questiona.
— Em casa, como disse, meu pai é muito protetor.
— Tinha namorado? — ela me olha curiosa erguendo uma de
suas sobrancelhas grossas.
— Vamos dizer que sim, nada sério — minto ao lembrar que
não só tenho um namorado, como ele é meu noivo e um príncipe.
— Aí Nadine, assim não vale, você só fala as coisas por
cima, quero saber mais sobre você.
— Estou te contando — minto novamente sentindo um
friozinho na barriga por pensar em falar demais. Eu tenho esse
defeito.
— Superficialmente — dá de ombros. — Vai, me conta como
é seu irmão?
— Loiro, olhos azuis, forte, corajoso, amigo… puxou nossa
mãe, ela era incrível. — Lembro deixando o olhar distante e
entristecido.
— Era? — Vicenza indaga prevendo minha resposta.
— Ela morreu há cinco anos.
— Sinto muito.
— Tudo bem!
Domingo é o dia da nossa folga, sobretudo não achei viável
ficar em casa sem fazer nada. Assim que passo pela porta do
restaurante Antonie me repreende.
— O que faz aqui? Hoje é sua folga, senhorita Nadine.
— Eu não tinha nada pra fazer em casa, achei que pudesse
ajudar em algo, posso ficar só te olhando cozinhar? — peço
juntando as mãos em súplica.
— Tudo bem, mas não vá me arrumar problemas.
— Mercí bocú [2]— agradeço seguindo-o até a cozinha.
A manhã toda ajudei o chef Antonie com os afazeres da
cozinha, como domingo o movimento é mais fraco, pude sentir o
gostinho de estar em uma cozinha equiparada com os mais diversos
utensílios de última geração para a realização de pratos divinos.
— A senhorita tem muito jeito na cozinha, já fez algum curso?
— Tudo o que sei aprendi com Nana a cozinheira da mansão,
e um curso on-line que fiz — ele me olha surpreso — da mansão
onde eu trabalhava antes — remendo repreendendo minha língua
solta.
— Oui[3]
, muito bom! — elogia ao provar minha especialidade,
fatias de salmão fumado, com batata cozida, molho branco e endro.
— Muito bom mesmo! — me olha satisfeito com expressão de
grande surpresa.
No final do dia estava realizada, e depois de ajudar Antonie a
limpar a cozinha e a fechar o restaurante, despeço-me, ao sair,
deparo-me com uma chuva torrencial.
“Jävla”[4] — xingo por não ter um guarda-chuva na bolsa e por
não ver nenhum táxi por perto.
— Nadine? O que faz aqui?
— Oi seu Dominic, já estava indo embora — expliquei
encarando o lado de fora.
— Não foi essa a pergunta que fiz! — replica impaciente.
— Queria me inteirar melhor da rotina do restaurante,
Vicenza saiu, e eu não queria ficar sozinha em casa, então… —
acabo falando mais do que devia, como sempre!
— Tudo bem, precisa de carona?
— Não! — elevo o tom de voz sem perceber que fui grosseira.
— Estou esperando um táxi, obrigada — amenizo e ele inclina um
pouco a cabeça constatando que a rua está totalmente vazia.
— A chuva está forte, vamos esperar um pouco e assim que a
chuva suavizar te levo pra casa — decide por mim sem aumentar o
tom da voz, assinto sem nem perceber. Dominic bate os
calcanhares de volta para dentro do hotel, e quando percebe que eu
não o sigo, ele vira fazendo um gesto para que eu o acompanhe.
Em seu escritório sento tímida na poltrona acolchoada de
couro marrom, sem encará-lo e de cabeça baixa mexo no celular
para evitar qualquer contato visual ou um novo desastre. Dominic
também não puxa assunto, ele é um tanto rude as vezes, mas
aparentemente é só uma armadura pra parecer mais formal e
responsável.
Os minutos pareciam uma eternidade, olho no relógio
impaciente, e os ponteiros pareciam estar em câmera lenta.
— A chuva está parando, vou ver se consigo um táxi agora,
obrigada seu Dominic! — falo apressada saindo de sua sala quando
o clima fica ainda mais estranho, quando seu olhar me encarou sem
consideração alguma.
Capítulo 9
Depois de um dia de merda, ter a presença de Nadine mesmo
que em silêncio me trouxe paz. Ela é tão delicada e desajeitada ao
mesmo tempo que me intriga, me instiga a querer conhecê-la
melhor. Hrum, — limpo a garganta sorrindo feito bobo, recordando
seus embaraços.
Não pode ser só coincidência: o esbarrão no aeroporto; o
encontro inusitado no avião; aparecer aqui no hotel; se candidatar a
vaga; encontrá-la na balada. Deus ela vomitou nos meus sapatos, e
a levei sem intenção alguma até o meu apartamento… essa foi a
parte mais surpreendente. Nadine é linda, com certeza chama
minha atenção, mas não a olhei com malicia. Talvez um pouco, mas
é diferente de qualquer outro olhar.
— Bonsuá[5] Dom — cumprimenta Diogo ao entrar todo
contente em minha sala.
— Até que enfim apareceu, estava com a recepcionista?
— O nome dela é Vicenza, e sim, estava! Chamei ela pra sair
hoje, pra gente conversar, percebi que ficou aflita com o que
aconteceu.
— Cuidado, — oriento e sua feição se contrai. — Sabe do que
estou falando, não sabe? — alerto, não é recomendável esse tipo
de relacionamento entre funcionários.
— Sei! Gosto dela, Dom. Não é só sexo!
— Tomara que não! — rebato sem acreditar em suas palavras,
voltando minha atenção para o celular.
— E porque está com esse sorrisinho bobo no rosto? — Diogo
pergunta depois de me ver sorrindo ao lembrar de Nadine saindo
praticamente correndo da minha sala mais cedo.
— Nada. Vai ficar por aqui hoje?
— Não, só passei pra ver como você estava, te liguei e você
não atendeu.
— Precisava adiantar umas coisas. Essa semana vou tentar
outra reunião com o banco.
— Vai dar certo! — afirma Diogo com o seu jeito positivo que
me irrita as vezes, sou prático e realista, estou vendo que não temos
muitas opções.
Aos gritos com o banco ao telefone, brado com o gerente que
não faz o mínimo pra nos ajudar, tendo em vista que até um ano
atrás, lucrávamos e rendíamos muito pra eles, e mais uma vez a
resposta é não. Não sei mais o que fazer, não consigo pensar em
mais nada, a não ser esperar até onde der.
— Com licença, seu Dominic — Nadine bate na porta
entreaberta. Lanço um olhar enfurecido em sua direção, foi
involuntário, ela não tem culpa. Sem jeito deixa a bandeja com o
meu almoço em cima da mesa e sai rapidamente.
Apoio a cabeça entre as mãos tentando pensar em alguma
coisa, qualquer coisa, mas não consigo, parece que já tentei de
tudo. Se não conseguir restabelecer o movimento e o caixa do
restaurante, vou ter que fechar e voltar pra New York. Por sorte a
filial de lá está indo bem aos cuidados de Jerry.
Olho para a garrafa de bebida em cima da bancada no canto
sala, e tento resistir a vontade de tomar apenas um gole. As
palavras de minha mãe martelam em minha cabeça, porém a
frustração martela mais forte. Levanto afoito e encho o copo com
whisky e viro sem gelo nem nada, faço isso quadro vezes seguidas.
Sento na poltrona do escritório e observo a bandeja intacta em
cima da mesa. Olho pela janela e a noite preenche meus olhos, não
vi a hora passar. De repente batidas na porta chamam minha
atenção.
— Seu Dominic, posso entrar? — pergunta a bela moça
receosa outra vez.
— Entra!
— Vim pegar a bandeja a pedido do chef Antonie. O senhor
nem comeu, não está do seu agrado? — questiona sincera ao ver
que nem mexi na comida. Sua feição de espanto é a mais linda que
já vi.
— Estou sem fome! Pode levar!
— Quer que eu traga outra coisa? — insiste solicita e respiro
fundo pra não desmerecer sua preocupação.
Estou tão irritado que fico em silêncio e ela com todo o seu
jeito meigo me observa esperando uma resposta. E num ato
impensado jogo o copo quase vazio na parede fazendo voar
estilhaços de vidro por toda a parte, ela se assusta e solta um grito
agudo, só então percebo que fui um idiota.
— Você está bem? — me preocupo e tento levantar
tropeçando nas próprias pernas.
— Fique aí, vou pegar uma vassoura para limpar isso! —
Nadine orienta aflita e sai praticamente correndo.
— NÃO! — grito para que ela não saia. E então ela se
aproxima e me ajuda a sentar direito na cadeira.
— Eu não sei o que fazer, quer que eu chame o seu Diogo pra
te levar pra casa? — nego com um gesto desengonçado. — O que
quer que eu faça? — completa sentindo-se impotente me vendo
humilhado, jogado como um bêbado.
— Tem um cartão na primeira gaveta, é do quarto presidencial,
pode me ajudar a chegar lá?
— Claro!
Ao abrir a porta do quarto com a ajuda dela, sento na cama
apoiando a cabeça nas mãos, sinto-me tão cansado e esgotado de
tudo, que só queria um momento de paz.
— O senhor precisa de mais alguma coisa? Acho que deveria
tomar um banho, isso vai ajudar — sua voz doce se aproxima, e
sinto o cheiro suave do seu perfume adocicado quando se ajoelha a
minha frente.
— Pode ir estou bem — declaro encarando-a intensamente
sentindo um arrepio passar por todo o meu corpo.
— Não, não está! O senhor me ajudou… — deu de ombros ao
lembrar de sua bebedeira — Então, vou te ajudar também!
— O que eu preciso, ninguém pode… — resmungo deitando de
barriga pra cima vendo tudo girar.
— Quer conversar?
E nesse momento, como um desabrochar de uma flor, sinto
que posso falar com ela. Desabafei toda minha angústia para uma
mulher que eu conheço a apenas alguns dias, como se a
conhecesse a vida toda, como se ela não fosse minha funcionária.
Uma estranha.
— Vem, vou te ajudar — Nadine decide e tira meus sapatos e
minha camisa depois de escutar toda a minha choradeira. Nunca
ninguém cuidou de mim assim, sem me julgar. Estava tão bêbado
que não consegui reagir. E enquanto ela desabotoava minha camisa
devagar e cautelosa, tentava disfarçar o incomodo por estar a sós
comigo. Percebo sua respiração acelerar lentamente, seus lábios
angustiantes implorando por um gesto úmido, e então sua língua os
toca de forma delicada, eu estava hipnotizado…
— Não vai tirar a calça — brinco ao perceber sua inocência.
Que babaca!
— Não! Isso você pode fazer sozinho — rebate quase que
engolindo as palavras ao fitar meu abdômen. E em uma fração de
segundos, tiro o cinto, e em seguida a calça, ficando apenas de
cueca, imediatamente ela se vira envergonhada.
— Vou esperar o senhor aqui fora, qualquer coisa pode me
chamar.
Foi inevitável não abrir um sorriso. Não era um cafajeste,
mas contemplar seu desconforto, estando sob domínio do álcool,
me fez parecer um idiota.
Desconcertada, Nadine se apressa em direção a saleta e
tropeça no pé da poltrona. Ela fica ainda mais vermelha.
Entro para o banho e não sei por quanto tempo fico no
chuveiro, ao voltar para o quarto, ela tinha trazido outra refeição.
— Antonie já foi embora, então preparei uma coisa leve para o
senhor, assim vai melhorar mais rápido.
— Porque não pediu serviço de quarto? — Encaro seu feito
surpreso querendo ser prático. — Não queria te dar trabalho.
— Não sabia se podia, e não foi nada, preparei rapidinho.
Sento na mesa admirando o prato que ela disse que preparou
rapidamente, está muito bem feito, bonito. Enquanto saboreio, ela
me olha apreensiva, talvez esperando uma opinião.
— Está bom? — questiona ao perceber que da minha boca
não sairia nada, eu não ia falar nada mesmo, sentia-me
envergonhado demais pra tocar em qualquer assunto. Ela
simplesmente presenciou meu lado mais deplorável.
— Oui, muito bom! — respondo sincero, sentindo as incríveis
sensações no paladar que seu tempero me causou.
— Disse que Antonie foi embora, que horas são?
— Quase meia noite. Eu já pedi para limparem sua sala. Agora
que está melhor eu já vou indo.
Quando suas palavras soaram em despedida meu coração se
contraiu, eu não queria ficar sozinho, não queria que ela fosse…
— Fica! — falo sem pensar e ela arregala os olhos — Eu
durmo no sofá, não quero que saia sozinha a essa hora. Não
imaginei que fosse tão tarde — completo inventando uma desculpa
qualquer, explicando, sentindo-me nervoso como um adolescente
inexperiente.
— Tudo bem, não precisa se preocupar, eu pego um táxi, não
é tão longe de casa.
— Faço questão, por favor! Tem algumas roupas minhas que
vão te servir, não vou fazer nada, prometo! — peço em tom de
súplica, eu realmente não queria ficar sozinho.
— Tudo bem! — ela aceita sem jeito. E respiro aliviado por têla convencido.
Pego uma toalha, uma camiseta e uma calça de linho e a
entrego. Pouco tempo depois ela sai envergonhada do banheiro, o
perfume do sabonete embriagando minhas narinas, forço-me a não
pensar besteiras.
— Ficou bom em você! — elogio sem jeito e ela sorri tímida. —
Pode ficar tranquila, só não quero ficar sozinho! — afirmo outra vez
ao perceber que ela está totalmente inquieta.
— Tudo bem, não estou com medo de você, só que de onde
eu venho, se me pegassem em um quarto sozinha com um homem
desse jeito — me olhou de cima abaixo sem pudor algum —
estaríamos muito encrencados! — completa espontânea, abrindo
um lindo sorriso.
— Porquê? Você vem de algum reino? — brinco e no mesmo
instante sua fisionomia muda.
— Com licença preciso atender — ela se afasta assim que o
telefone toca, quem estaria ligando pra ela a essa hora? Será que
tem namorado?
Meus pensamentos me traem e sem perceber estou morrendo
de ciúmes. Pensei que ela tinha ficado aqui porque sentiu o mesmo
arrepio que eu, com certeza sentiu apenas pena de um empresário
falido, frustrado e bêbado pra quem decidiu trabalhar.
— Nadine, mais uma vez me desculpe por tudo, acabei me
descontrolando e … — declaro quando volta da sacada. Sua feição
parecia preocupada.
— Tudo bem, acontece, fico feliz que esteja melhor.
Ela senta na cama e cruza as pernas, sento ao seu lado e
como em um passe de mágica começamos a conversar
tranquilamente, assuntos aleatórios. Nadine me contou sua lista de
desejos, seus sonhos, e eu só consigo admirá-la. Seu jeito
entusiasmado de ver a vida sem o peso das dificuldades que o dia a
dia traz, é incentivador. Ela só sonha, como se tudo fosse fácil, e
talvez seja, alguns de nós que gostam de complicar as coisas.
E de repente parecíamos dois amigos conversando sobre a
vida e ambições. Foi incrível como ela conseguiu despertar um lado
bom em mim. Um lado que a muito tempo não se mostrava
presente, achei até que eu tivesse perdido um pouco da minha
sensibilidade quando meu pai morreu, e ela com sua doçura
conseguiu despertar com apenas algumas horas de conversa.
Puxo na memória a última vez que conversei com alguém
assim, tão espontâneo e sincero. Apenas uma conversa tranquila,
sem segundas intenções.
Nadine com seu jeito meigo e descontaminado está
despertando um novo Dominic. Sua ânsia em viver é tão
contagiante, que seus sonhos grandes são palpáveis, ela não vê
dificuldade em sua jornada, e sua garra faz a esperança em
conseguir o que deseja se tornar cada vez mais real.
Ela está me forçando a ter mais esperança na vida, nas as
pessoas, e em mim mesmo…
Capítulo 10
Ver Dominic naquele estado me deixou em alerta, ele está
desesperado, dá pra ver em seus olhos que suas atitudes
egocêntricas e estupidas, são apenas reflexo de suas frustrações e
solidão. Ele pode não assumir, mas se sente sozinho mesmo tendo
muitas pessoas a sua volta. Quando jogou aquele copo de bebida
na parede, me assustei, claro! Mas entendi, foi como um pedido de
socorro, ele estava implorando por ajuda, mesmo em silêncio.
O mínimo que eu podia fazer por ele, era ajudar, da mesma
forma que ficou do meu lado quando me descontrolei, entretanto
estar em um quarto sozinha com ele, e naquela situação, me deixou
desconfortável. Nunca tinha estado com um homem seminu assim
tão perto.
Meu corpo formigou inteirinho e senti muitas coisas que
prefiro não lembrar.
Depois que ele comeu, melhorou, preparei um risoto rápido de
frutos do mar, ele pareceu gostar do meu tempero.
Depois de tomar banho e me olhar no espelho com as roupas
dele, não pude evitar a vontade de cheirá-las. Seu cheiro é gostoso.
Saí do banheiro sem jeito, Dominic tentou ser agradável e simpático,
porém seu olhar intenso me intimida. Sua voz me causa arrepios em
lugares que não deveria.
O pior de tudo foi quando tentou fazer uma piada sobre de
onde vim, não consegui evitar o receio, sinto-me uma fugitiva que a
qualquer momento pode ser desmascarada. E essa sensação é
horrível!
Meu telefone tocou e ao ver na tela que era James corro para
a sacada para atender.
— James, tudo bem?
— Tudo e você?
— Bem, conseguiu alguma coisa? Como está o papai?
— Sim, consegui, mas tem um pequeno problema!
— Qual? — indago curiosa.
— Papai está empenhado em te encontrar, contratou equipes
especializadas em rastrear pessoas, me pediu até para coordenar
uma busca, então você precisa ser rápida, vou tentar atrasar o
máximo que conseguir.
— Como ele…
— Ele é o rei, e nosso pai, então não me pergunte como ele
fez.
— James… — choramingo
— Nas escrituras das leis que encontrei, tem uma que ainda é
vigente… — ele hesita — Se o herdeiro do trono casar fora de seu
país de origem, ele pode abdicar do trono e passar para o próximo
sucessor.
— Casar? — questiono.
— Sim, casar!
— Mas eu fugi para não ter que me casar, James! — exclamo
em desespero.
— É, eu sei, mas esse é o único jeito do papai não te obrigar a
casar com o príncipe Willians e sentar no trono, Nadine — respirei
exasperada ao telefone. — E se você se casasse por contrato, só
por um tempo até eu assumir o trono, depois você pode se separar
e viver sua vida, papai não terá como intervir — James dá uma ideia
que pode dar certo.
— Tenho que pensar.
— Só não demore Nadine, sabe que é questão de tempo até
papai te encontrar.
— Eu sei, obrigada irmão.
Desligo o telefone preocupada, com quem eu vou me casar,
ainda mais nessas circunstâncias!? começo a pensar que não foi
uma boa ideia fugir de casa, estou manchando o nome da minha
família e decepcionando meu pai, e pra quê? Pra viver um sonho
impossível? Talvez seja melhor voltar e aceitar meu destino. Aceitar
que nasci para viver uma vida imposta pelos outros…
Volto para o quarto e ao ver o sorriso de Dominic tentando se
desculpar, decidi não pensar nisso por hora, sentamos na cama e
conversamos como dois amigos íntimos. Ele não me parece ser tão
ruim assim, só me fez ter certeza que é muito mais que um homem
amargurado e ranzinza que aparenta ser.
Acordo sobressalto quando o alarme toca pontualmente as 6h
da manhã, estava simplesmente dormindo entre os braços do meu
chefe.
Isso está totalmente fora dos limites — repreendo-me.
Levanto com cuidado para não o acordar, mas antes, fito com
atenção seu rosto ao dormir tão solene. Sua barba rala aloirada,
maxilar quadrado, cerrado com traços masculinos. Seus lábios
fechados em uma linha delicada… me perco em pensamentos ao
lembrar dos meus crushs literários e agradeço mentalmente a
internet.
Digito uma mensagem para Vicenza, preciso de roupas
limpas, e assim que ela bate na porta começa a rir, achando que
tinha acontecido alguma coisa a mais entre eu e Dominic.
— Não aconteceu nada! — nego em tom sério na esperança
dela acreditar.
— Tá bom, amiga, vou fingir que acredito.
— É sério, ele estava bêbado e eu o ajudei, só isso! —
confirmo minhas palavras, e ela insiste nas gracinhas, então dou
meia volta para me trocar enquanto Vicenza me espera na saleta da
suíte.
Ao passar pelo quarto, dou mais uma olhada no primeiro
homem que dormiu ao meu lado, e não consigo evitar um sorrisinho
bobo, ele é tão bonito… Balanço a cabeça e rapidamente me livro
dos pensamentos libidinosos com meu chefe.
Seguimos para o trabalho, e apesar de estar preocupada com
o que James disse, tento focar nos meus afazeres e não em toda
essa loucura, por enquanto.
No final do dia voltamos para casa exaustas, nada melhor do
que o nosso lar, aqui sim me sinto segura, tranquila e sem neuras.
Pensei em contar para Vicenza sobre quem eu sou, preciso
desabafar e compartilhar esse segredo com alguém, mas não sei se
é o momento certo.
E em um estalo de dedos, tenho uma ideia brilhante, como
não pensei nisso antes!?
Adormeço programando em minha mente as palavras para
dar início a um verdadeiro disparate. Um ainda maior. Estou louca,
certeza!
No dia seguinte ao chegar ao trabalho, deparo-me com
Dominic incrivelmente lindo à minha espera.
— Bonjour, senhorita Nadine — cumprimenta-me sério e com
as mãos no bolso. Se ele soubesse como fica sexy desse jeito,
evitaria tirar a concentração de suas funcionárias.
— Bonjour, posso te ajudar seu Dominic?
— Podemos conversar um instante?
— Claro!
— Pode ser na minha sala? — Ele olha em volta, talvez
queira manter a discrição. As pessoas adoram falar da vida alheia
em qualquer parte do mundo.
Entro em sua sala quando me dá a passagem, assim que
fecha a porta atrás de si, aponta para a cadeira almofadada para
que eu me sente.
— Gostaria de agradecer por ter me ajudado e me feito
companhia noite passada.
— Não foi nada! — respondo sincera.
— Pra mim foi, e muito — retruca contemplativo. — Queria
pedir desculpas por tudo, as vezes é involuntário ser um idiota.
— Jamais pensaria isso do senhor — minto concordando
mentalmente com ele, mas ele percebe.
— Tudo bem, vou fingir que acredito! E para agradecer sua
gentileza, gostaria de convidá-la para um jantar.
Arregalo os olhos surpresa.
— É … eu … e …
— Você tem namorado, é isso, droga, desculpa, eu… — ele
se arrepende instantaneamente dando a volta na mesa.
— Não, não é isso, não tenho namorado, é que, não acho
que seja uma boa ideia.
— De onde você vem, também não pode jantar com um
amigo? — ironiza e em um segundo de orgulho aceito o convite.
— Tudo bem, aceito! — Seu sorriso satisfeito estampa o rosto
e ali vi minha oportunidade em colocar meu plano em prática.
— Te pego as 21h na sua casa.
Assinto e volto ao trabalho e involuntariamente desejei que
aquele dia acabasse o mais depressa possível.
Encaro a gaveta por um bom tempo indecisa de qual roupa
usar, não sei onde ele irá me levar e … respiro frustrada. Querendo
ou não, é o meu primeiro encontro, mesmo que seja com um amigo.
— O que essa cabecinha está pensando pra estar com essa
cara feia? — Vicenza semicerra os olhos em minha direção.
— Não sei com que roupa ir — choramingo.
— Deixa eu ver o que você tem aí — Vicenza se aproxima
tirando tudo da gaveta. Olhou e olhou, até que gritou.
— Esse aqui amiga, você vai ficar deslumbrante nesse
vestido. — Ela estica a peça em sua frente confiante. É um dos
vestidos que minha mãe me deu, sem babado, sem brilho, sem
mangas, sem saiotes, só um lindo vestido comum de cetim
vermelho.
Sorri satisfeita e corri para o banho.
Vestida de forma apropriada, me admiro satisfeita no espelho,
maquiagem leve e simples como eu gosto, um vestido comum e
elegante, nada de exageros.
Assim que o interfone toca, o nervosismo me assola. Vicenza
me deseja sorte selando um beijo em minha bochecha, e avisa que
Diogo irá passar a noite com ela, entendo o recado.
— Ei — ela me chama antes de sair. — Você está linda, se
divirta. Relaxa e goza — brinca e eu coro.
Lanço um sorriso travesso em agradecimento e ela sorri de
volta fechando a porta a sua frente.
Passo pela portaria a passos lentos para não correr o risco de
cair ou tropeçar, coisas corriqueiras que acontecem comigo.
Dominic está bonito vestindo uma camisa polo branca, e
calça jeans escura, bem diferente de como se veste no trabalho. A
camisa justa modela perfeitamente seus braços fortes, dando
aquele toque viril. Ao me ver, fica estático, paralisado encostado em
seu carro,
— Bomsuá, seu Dominic — digo docemente.
— Bonsuá, você está linda, Nadine — elogia abrindo a porta
para eu entrar.
— Obrigada!
O silêncio dentro do carro predomina, estávamos sem jeito de
puxar qualquer tipo de assunto. Aproveito e me distraio vendo o
movimento da rua passar pela janela escura do carro.
— Não vamos jantar? Não pense que sou dessas… — ralho
assim que ele entra em seu condomínio.
— Vamos, eu sei que não é. Vou cozinhar pra você!
— Você vai cozinhar? Pra mim? — me surpreendo. Vindo dele
é de se estranhar.
— Vou, fique tranquila, não cozinho tão bem quanto você, mas
sei me virar bem! — brinca e a tensão desaparece.
Descemos e seguimos para o último andar.
— Fique à vontade, vou pegar vinho pra gente.
Dominic está sendo um verdadeiro cavalheiro. Gosto desse
seu lado. Ele aparece com uma garrafa e duas taças.
— Alter Ego Château Palmer Margaux, Safra de 2017, da
melhor vinícola de Bordeaux, boa escolha seu Dominic — me gabo
contente ao usar um de meus conhecimentos aleatoriamente. De
vinhos eu conhecia bem.
Dom me entrega uma taça, brindamos em silêncio. Tomo um
gole e fecho os olhos para sentir o líquido explorar meu paladar.
— Conhece de vinhos? — questiona surpreso enquanto
separa os ingredientes na bancada de mármore.
— Quer ajuda? — ofereço.
— Não respondeu minha pergunta — ele insiste.
— Você também não — replico bem humorada e ele sorri.
— Não, hoje você só vai olhar — ele força um sorriso sem
certeza.
Ele fica tão bonito quando sorri.
Sento em uma das banquetas e fico observando seu jeito
atrapalhado na cozinha.
— Tem certeza que já fez isso antes? — debocho tendo plena
convicção que ele não tem o costume de mexer em sua própria
cozinha.
— Tudo bem, eu assumo! Eu já cozinhei antes, faz um tempo,
mas …
— Não tem problema, o que vale é a intenção, deixa eu te
ajudar.
Levanto e começo a organizar a bancada com os
ingredientes que vou usar. O ajudo a cortar alguns temperos e
legumes, rimos com a sua falta de habilidade na cozinha. Quando o
Ratatouille[6] começa a cheirar ele se aproxima espontaneamente,
levo a colher até sua boca. Essa proximidade certamente
intensificou um clima nada amigável.
— Está delicioso — elogia sussurrante tentando disfarçar o
clima constrangedor.
— Obrigada! Vamos colocar a mesa? — disfarço o olhar e ele
assente.
Arrumo tudo com riqueza de detalhes colocando em prática
todo o meu conhecimento em bons modos, ele observa pasmo.
— Onde aprendeu a fazer tudo isso?
— Tem muitas coisas que sei fazer que você nem imagina —
comento sem intenção.
— Como? — argumenta e penso por alguns instantes.
— Esgrima por exemplo!
Capítulo 11
— Esgrima? — retruca surpreso dando a volta na mesa para
se aproximar de mim.
— Sim! Vamos comer, está pronto! — disfarço mantendo uma
distância segura.
Dominic percebe meu desconforto estampado em um sorriso
discreto. Estou com medo de mim, do que meu corpo pede. Sou
inexperiente, mas não sou cega e muito menos controlo meus
hormônios a flor da pele.
Dominic não para de me olhar, tento disfarçar olhando para
um ponto fixo na mesa, não quero que ele saiba que tem esse poder
sobre mim, consegue me deixar desconfortável apenas com seu
olhar sombrio e distante.
Não estou acostumada, de onde venho sempre me tratam
bem por causa da minha posição e não por mim…
— Já te falaram que cozinha divinamente? — comenta em tom
de elogio depois de saborear mais uma garfada.
— Tenho planos de abrir meu restaurante, fazer um curso
profissional de gastronomia… — desato a falar na intenção de
disfarçar meu nervosismo sob seu olhar intenso e especulativo.
— Te dou o maior apoio, o hotel fornece bolsas de estudo para
os funcionários, você tem talento, Nadine, ouso dizer que suas
mãos são bem melhores que as de Antonie. Que ele não me escute.
— Sorri brincalhão e me sinto lisonjeada com a comparação.
E nessa fração de segundos me perdi em seu lindo sorriso,
ainda não o tinha visto tão desinibido. Finalmente um sorriso sincero
e espontâneo.
— Acha mesmo!?
— Eu não minto! — Dominic me encara sisudo.
— Não sei se o Sr. Diogo lhe avisou, mas ele já me ofereceu
a bolsa de estudos, começo na segunda-feira.
— Isso é ótimo Nadine. Fico feliz por isso.
E antes que as coisas saiam do contexto, decido contar a ele
o meu plano para nos ajudar.
— Dominic, o que vou te contar agora, pode parecer loucura,
mas quero lhe propor uma coisa.
— Uma coisa? — ele ergue a sobrancelha confuso.
— Sim! Tendo em vista o que me contou na outra noite sobre
os problemas financeiros do restaurante e do hotel… — ele
semicerra os olhos, apoiando o queixo nas mãos sobre a mesa,
observando-me introspectivo. — Bom, eu não contei exatamente de
onde vim, e antes que fique irritado, tive meus motivos — argumento
na defensiva.
— Nadine, onde está querendo chegar? Quer ser cozinheira
do restaurante, é isso? — frisa levemente intrigado e sem paciência,
seu comentário arrogante me faz revirar os olhos.
— Sim, mas não desse jeito que está pensando, — ele levanta
bruscamente e sua antecipação me irrita — Sente-se, por favor,
Dominic, não terminei. — Não quero que pense que desejo tomar o
lugar do Chef Antonie, eu não quero! Ele recebeu uma proposta
irrecusável pra trabalhar em outra cidade, ele estava esperando o
melhor momento para te contar, mas acabei me intrometendo. Faz
algumas semanas que ele está me treinando, e …
— Que merda é essa que está me dizendo, Nadine — Dominic
eleva o tom de voz, bebendo todo o líquido da taça de uma vez.
Dessa vez levanta e segue até a sacada da sala.
— Eu sou uma princesa, Dominic! — falo sem rodeios, e ele
permanece encarando a vista esplendorosa de Paris sem esboçar
reação alguma. — Não vai dizer nada? — insisto aproximando-me
dele.
— E eu sou o Rei! — debocha sem senso de humor.
— Meu nome é Nadine Callahan, Princesa de Liechtenstein
um pequeno principado entre Áustria e Suíça com um pouco mais
de 38.250 habitantes. Fugi de casa para não ter que me casar com
um Príncipe que eu não amo e ter que assumir um reino que eu não
quero.
Dominic me olha discretamente prestando atenção em
minhas palavras, pelo menos consegui chamar sua atenção.
— Está falando sério? — questiona virando-se de frente pra
mim.
— Eu não minto! — falo sem pensar, ele me encara duvidoso
e sua carranca sisuda me faz lembrar que tenho mentido desde que
cheguei. — Eu não menti, apenas omiti — defendo-me.
— O que tenho que fazer? Me dobrar de joelhos? fazer
revência?
— Nada disso, não seja … — Respiro fundo para não
estragar tudo.
— O que quer de mim, Princesa Nadine — Com as mãos no
bolso, ele deixa no ar ironia e decepção.
Agora eu que o deixei desconfortável.
— Quero que se case comigo! — anuncio e seus olhos se
arregalam de espanto.
— Quê?! Está ficando maluca!
— É apenas um contrato que vai beneficiar nós dois. Preciso
disso até meu irmão assumir o trono, não precisa de festa, só um
casamento no cartório, te ajudo financeiramente com o restaurante
e você me ajuda a me livrar do reino e do meu noivo.
— Noivo? Você está mesmo louca, não vou me casar com
você!
— Porque não? Você precisa de dinheiro e isso eu tenho, em
troca, só precisa fingir ser meu marido por alguns meses.
— Você acha que seu pai, um Rei, vai aceitar isso? Se é que
eu estou tendo mesmo essa conversa com você!
— Ele não tem o que aceitar, vivemos de leis, e ela é clara,
se o herdeiro do trono se casar fora de seu país de origem ele pode
abdicar de seu cargo passando para o próximo sucessor, no caso
meu irmão.
— Pra ser bem sincero estou meio absorto, aliais, totalmente
absorto com essa história, pensei que estava brincando, mas pelo
andar da conversa, não é brincadeira — declara sentando-se no
sofá, sirvo mais uma taça de vinho e entrego em sua mão.
— Olha, eu já percebi que você não é o tipo de homem que
quer compromisso sério com ninguém, muito menos se casar, e eu
também não! Só quero viver em paz, e ser uma grande chef, só
isso. Não vou te pressionar, mas preciso de uma resposta o quanto
antes, meu pai está coordenando equipes de busca para me
procurar e não vai demorar para que isso aconteça.
— E se eu aceitar, o que a gente faz? Tem que morar junto,
andar de mãos dadas…
— O que for necessário para que pareça real, pelo menos na
frente das pessoas.
Ele balança a cabeça perplexo. Eu sei que é difícil assimilar,
as pessoas costumam ter esse tipo reação quando descobrem que
estão de frente pra um sobrenome real.
— O que pensa que sou? — ralha ofendido.
— Não quero te ofender, Dominic! — exclamo assertiva. —
Estou sendo egoísta e pensando em mim, e pra isso preciso da sua
ajuda, então não seja orgulhoso e aceite minha proposta.
— Amanhã te darei uma resposta, esteja em minha sala as
15h. — ordena, mas logo volta atrás. — Desculpa, acho que ainda
não assimilei a ideia de você ser uma Princesa.
— Tudo bem, não se preocupe, você ainda é meu chefe, aqui
eu não sou Princesa, sou apenas Nadine, a aprendiz de cozinheira.
— Ele força um sorriso falso. — Até amanhã Dominic! — declaro e
saio confiante que o convenci a me ajudar.
Dominic ficou surpreso, seu olhar se dispersou, e ele se
afundou em dúvidas e vergonha. Eu sei que é difícil acreditar, e
principalmente tomar uma decisão que querendo ou não, mudará a
vida dele também.
— Amiga, conta tudo! O que aconteceu? — pergunta Vicenza
encurralando-me logo na entrada.
— Foi bom, — ela me olha na dúvida incentivando o resto da
história. — Cozinhamos juntos, jantamos, conversamos e só!
— Só isso? Nem um beijinho?
— Não! — respondo apressada por ter cogitado beijar seus
lábios por breves segundos quando me senti perdida em seu
sorriso. Contudo, nossa conversa agora é diferente, e não posso
nem pensar em deixar nada interferir, então, seja lá o que passou
pela minha cabeça, acabou.
Se conseguir manter a distância daqueles olhos verdes e
perturbados, evitarei problemas.
— Vou fingir que acredito que não passou por essa sua
cabecinha linda, beijar aquele deus grego, porque amiga, ele é um
gostoso — sorri concordando e ela gargalha.
— Falando nisso, onde está o Diogo? Pensei que ia ter que
passar a noite vendo vocês se pegarem.
— Teve que ir embora mais cedo hoje… — ela revira os olhos
derrotada.
— Vicenza, preciso contar uma coisa — anuncio cabisbaixa,
sentando no sofá cor-de-rosa.
— O que foi? O que aconteceu, ele não…
— Não, ele não fez nada, ele é sempre muito cavalheiro
comigo. O que tenho pra falar é sobre mim, não contei a você toda a
verdade sobre mim…
— Como assim?
— Vi, eu sou uma Princesa, venho de Liechtenstein um
pequeno principado entre Áustria e Suíça, fugi de casa pra não ter
que me casar e assumir o reino, e agora tenho que me casar de
qualquer jeito para conseguir me livrar disso de uma vez por todas
— desabafo sentindo-me aliviada por contar isso em voz alta a ela,
que me acolheu de tão bom coração.
— Uma Princesa?
— Sim!
— Seu pai é o Rei e seu irmão um Príncipe? — afirmo com
um gesto delicado esperando-a surtar. — Você mora em um
palácio?
— É uma casa bem grande… — lembro da mansão com mais
de 25 quartos.
— Eu tenho uma amiga Princesa! Isso me torna uma amiga
real? — contra-ataca eufórica com o pensamento distante.
— Não está brava?
— Não! Sabia que tinha algo estranho em você, muito
certinha, educada, fala toda bonitinha, sabe de coisas que não é
qualquer pessoa que sabe, e … — Não resisto e abraço Vicenza
com força, deixando a emoção tomar conta de mim.
— Que sorte eu tenho de ter conhecido você — sussurro
afagando meu rosto em seus cabelos ondulados deixando-a sem ar.
— Que isso amiga, eu gostei de você desde quando te vi
toda perdida no saguão do hotel.
— Obrigada, de verdade!
— Agora me conta tudo, você fugiu e aí? Seu noivo é bonito?
Expliquei tudo com riqueza de detalhes, principalmente meu
plano maluco, com certeza vou precisar de ajuda, e tenho que
confiar em alguém.
— Você pediu ao Dominic Levy, um dos solteiros mais
cobiçados de Paris, em casamento?
— Sim!
— Não estou acreditando nisso, você é muito doida mesmo,
sou sua fã Princesa Nadine.
— Não me chame assim, Vi, não quero nada disso. Você não
tem ideia como me senti realizada por andar nas ruas livremente,
por colocar um tênis e uma calça jeans, de ir trabalhar no
restaurante, pegar metrô… Eu sei que pra muitas pessoas isso é
uma coisa comum, até ruim, mas eu amo essa simplicidade e é isso
que eu quero viver.
—Te entendo Nadine, vamos esperar até amanhã, tenho
certeza que ele vai aceitar, o que ele tem a perder?
— Tomara que esteja certa.
No dia seguinte espero o horário marcado com ansiedade. O
relógio virou meu pior inimigo, Chef Antonie percebendo minha
desatenção, repreendeu-me, ainda mais depois que contei seu
segredo ao Dominic.
— Desculpe mesmo Antonie, foi sem querer.
— Tudo bem, eu já tinha que ter contado mesmo. E ele vai te
deixar assumir o restaurante com tão pouca experiencia?
— Ainda não sei. Tomara que sim. As aulas na faculdade e a
sua ajuda estão sendo de grande valia. Espero que ele leve em
consideração.
— Tenho certeza que ele levará. Você é muito talentosa e
esforçada, tem sede de aprender, vai se sair muito bem, e tem o
Chef Bastien que estará aqui para o que precisar.
— Obrigada Antonie, eu sou muito grata por tudo o que fez por
mim.
— Não fiz nada, só ajudei uma grande cozinheira aflorar.
Quando finalmente o ponteiro bateu as 15h, corri para a sala
de Dominic, torcendo que ele me desse uma ótima notícia.
Parada em frente à porta de seu escritório, levanto a mão
hesitante pra bater, e quase que no mesmo momento ela se abre e
me assusto.
— Pontual — comenta sério.
— Que susto! — resmungo com a mão no peito.
— Entre!
— Você está bem? — pergunto na tentativa de dispersar um
pouco o clima ruim que se instalou entre nós desde a noite passada,
ele assente com um movimento suave.
— Sente-se! — aponta para a cadeira. O Dominic chato e sério
estava de volta. Sua fisionomia demonstra preocupação, e seu olhar
distante me deixa aflita. Meu coração acelera enquanto ele caminha
de um lado a outro na sala, ansioso com as mãos dentro do bolso.
— Dominic, eu …
— Aceito sua proposta!
— Sério?! — arregalo os olhos pasma.
— Sim! Pesquisei seu reino, sua família, a tal lei que você
mencionou… Demora somente alguns meses para que a burocracia
da corte real seja acionada. Nosso acordo durará apenas alguns
meses, depois disso cada um segue seu rumo, concorda?
— Sim, de acordo!
— Certo! Não quero que pense que estou fazendo isso
somente por dinheiro, eu…
— Não estou pensando nada, eu te fiz uma proposta, e vou
cumprir minha palavra. Meu irmão vai providenciar o pagamento das
dívidas e deixará o fluxo de caixa ativo. Quando o Chef Antonie
sair, peço que me dê a chance de assumir o restaurante e te
garanto que farei o meu melhor para que ele volte a ser o mais
procurado — declaro assumindo a responsabilidade de levantar
aquele lugar, tendo fé em meu potencial.
— Você é bem convencida quando quer, não acha!?
— Não diria convencida, talvez sonhadora e determinada! Vou
providenciar nosso contrato de casamento e te aviso quando tiver os
detalhes.
— Tudo bem, se precisar de alguma ajuda, é só me falar.
— Obrigada!
Saio de sua sala saltitante, e muito ansiosa pra contar as boas
novas para James, ele já pode se preparar, porque em breve será o
Rei de Liechtenstein.
Capítulo 12
Alguns dias depois
Deitado em minha cama, encaro o teto angustiado, não
consigo conter uma pontinha de felicidade por saber que de alguma
forma manterei o legado de meu pai vivo. Por outro me sinto um
gigolô.
Nunca pensei que um dia faria uma coisa dessas, tudo bem
que não fui eu que dei a ideia, e não vou me sentir culpado por isso,
mas…
Só quero ver como vou contar pra minha mãe:
— Mãe, essa é a Nadine, ela é minha noiva e uma Princesa
de um reino distante.
Sem falar na Bella, quando descobrir vai virar uma fera.
— E aí cara, o que é de tão urgente que não podia esperar até
amanhã? — reclama Diogo ao entrar em meu apartamento.
Levanto sério sabendo que o que vou falar, não vai agradá-lo.
— Seria bom deixar a menina respirar um pouco, não seja
pegajoso, — ele me olha como se não soubesse do que estou
falando.
— Nada a ver, Dom! — argumenta olhando para um ponto
fixo no chão.
— Já sabe onde isso vai dá se continuar assim!
Seu último relacionamento o deixou no chão, e desde então
não se relacionou sério com mais ninguém. Porém estou vendo que
essa paixão pela brasileira está além do que ele pode controlar.
— Vai se ferrar Dom, está falando de mim, mas chamou a
princesinha para jantar, então nem vem! — afronta na defensiva
colocando um pouco de whisky no copo.
— Chamei somente para agradecer a ajuda, não aconteceu
nada demais.
— Nada demais? — indaga erguendo uma de suas
sobrancelhas grossas, ele me conhece bem, sabe que tem alguma
coisa.
— A gente vai se casar! — desabafo e fujo de seu olhar
especulativo. Ele se aproxima e tenta me olhar nos olhos.
— Quê! Está falando sério? — Diogo se surpreende sabendo
que tem algo de muito errado, eu não queria contar, mas ele é meu
melhor amigo e preciso compartilhar isso com alguém. — E depois
diz que não aconteceu nada demais!? — ele fica pensativo por
alguns instantes, coça a cabeça, olha pra mim, e o silêncio me
tortura.
— Fala alguma coisa! — peço angustiado analisando sua
feição embasbacada.
— Meu amigo vai casar? Não estou acreditando! Tem quanto
tempo? Um pouco mais de um mês? — ele ri. — Qual a pegadinha?
— Diogo, por favor! — censuro querendo um pouco de
compreensão e não virar motivo de piada.
— Eu estou rindo, mas é com respeito! Se apaixonou mesmo
pela garota. Nadine é linda, me parece uma boa moça, um pouco
ingênua, nada parecido com as mulheres que você se relaciona,
mas é educada, e esforçada, e pelo jeito gostou dessa sua cara
azeda — gargalha outra vez e com raiva bato em seu ombro,
encarando-o com fúria, não devia ter contado nada. — Quando será
o casório?
— Ainda não sei, ela ficou de organizar tudo!
— Faça-me o favor Dominic, você tem que ajudar ela,
querendo ou não, você é o futuro marido, seja prestativo e um
pouco romântico.
Diogo está certo, preciso melhorar essa farsa, melhor fazer
parecer verdade, não posso perder essa oportunidade, sem falar
que casar com uma Princesa, nem que seja por apenas alguns
meses vai ajudar no marketing do hotel.
Fiquei tentado em contar a verdade, que tudo não passa de
um acordo, um contrato uma mentira, uma loucura descabida que
pode me levar pra um calabouço, ou sei lá! Mas preferi continuar
com esse segredo. Já basta virar piada por querer me casar com
uma mulher que mal conheço, não vou virar chacota por casar por
dinheiro. Longe de mim a palavra interesseiro ser agregado em meu
curriculum.
O grande Dom, o solteiro convicto que foi enlaçado por uma
garota que é totalmente o oposto de mim. Trágico!
Diogo não acreditou em uma palavra que eu disse, mas me
fez acreditar que sim, no fundo ele sabe que tem algo muito errado
por trás de toda essa história, contudo, preferiu levar mais uma vez
esse absurdo como um capricho meu.
Talvez ele pense que é uma fase. Que logo vai acabar, assim
como acabou com Bella.
E para aproveitar meus últimos dias de solteiro, saímos pra
uma das boates onde somos clientes vip. Tento me concentrar na
diversão. Minha cabeça está agitada, e não consigo esquecer o
olhar empoderado de Nadine, simplesmente não sai da minha
cabeça, suas palavras tão cheias de certeza e esperança de que
todo esse plano vai dá certo!
— Não vai levar a loira pra casa hoje? — pergunta Diogo
estranhando meu comportamento.
— Não, não estou afim, já vou indo nessa. Boa diversão —
desejo o deixando para trás.
E sentindo meu corpo todo pegar fogo, só percebo onde estou
quando estaciono o carro em frente ao prédio dela. Que merda que
estou fazendo aqui?
Minha razão está em constante briga com a minha falta de
noção, só pode! Com certeza aparecer bêbado na porta de uma
Princesa, não é nada apropriado. Foda-se, preciso falar com ela, e

— O que está fazendo aqui? — questiona surpresa a me ver
apoiado na soleira da porta. — Está bêbado de novo, Dominic? —
censura sabendo a resposta. — Você não pode ficar dirigindo assim,
é perigoso. — Seus lindos olhos grandes me olham com compaixão,
acho que ela sente pena de mim.
— Está sozinha?
— Sim, a Vicenza saiu pra encontrar Diogo.
— Posso ficar aqui com você? — peço em súplica, passando
pela porta, despencando no sofá brega cor-de-rosa.
— Pode! — dá de ombros. — Quer tomar um banho? — sua
voz soa delicada, e nesse momento me perco em pensamentos, e
os repreendo na mesma velocidade, se vamos fazer isso, não
podemos envolver sexo.
Eu não posso!
E então meu lado cafajeste se atreve a colocar pensamentos
nada amigáveis na minha cabeça: amigos com benefícios seria uma
boa!
Não Dominic! Ela é uma princesa, não é o tipo de mulher com
quem está acostumado a sair.
Pelo menos acho que não…
— Só fica aqui, — bato a mão no assento vazio do sofá. —
Não quero ficar sozinho! — Ela senta ao meu lado e coloca uma
almofada sobre seu colo e sem pestanejar deito minha cabeça
sobre ela, torcendo para que não me expulse pela audácia.
Gosto da companhia dela, sinto verdade, sinceridade, algo que
nunca encontrei em mulher alguma. Nem na Bella com quem fiquei
por cinco anos.
Bella sempre foi ambiciosa na medida errada, tudo era
movido por interesse, vingativa, pesada, ciumenta ao ponto de se
tornar uma pessoa tóxica, talvez esse seja um dos motivos do
porque nunca cogitei me casar com ela.
O único lugar que nos dávamos bem era na cama, fora isso,
eram brigas e discussões, e na maioria das vezes sem motivo
algum. Por isso me afastava, preferia ficar no escritório, ou no meu
quarto no hotel. Sentia-me um homem fútil por estar com uma
mulher por quem eu só tinha desejo. Levamos isso longe demais,
até que não deu mais pra empurrar com a barriga. E por um lado foi
bom.
Mesmo sem conhecer Nadine direito, sinto que com ela posso
ser eu mesmo, sem máscaras, sem fingimentos, apenas um cara
sensível, frustrado, e com problemas de autocontrole, um homem
em puro declínio ao alcoolismo. Uma alma perturbada em busca de
algo pra preencher verdadeiramente seu ser.
Suas mãos acariciam delicadamente meus cabelos, não me
perguntou o porquê de estar daquela maneira, só me acolheu,
mostrou que eu estava seguro ao seu lado, sem julgamentos.
Queria tanto que minha mãe ficasse do meu lado assim …
A maioria das vezes ela me olha com o mesmo olhar julgador
que lançava ao meu pai. Como se pudéssemos controlar, como se
fosse uma escolha. Eu não sou ele, e não quero ser. Não quero
acabar como ele, mas… É difícil.
E quanto mais nos sentimos julgados, e somos tratados com
indiferença, é como se uma força estranha e invisível nos
empurrasse em um abismo sem fim. Eu não sou um alcoólatra,
talvez ainda não, mas sei que preciso de ajuda para não acabar
como ele.
— Desculpa por presenciar isso mais uma vez, prometo que
não vai se repetir — desculpo-me envergonhado, os olhos
marejados, decepcionado comigo mesmo.
— Dominic, não precisa se desculpar, vamos nos casar, — ela
fala brincalhona e me faz rir, — na alegria e na tristeza — dá de
ombros ainda em tom de humor.
— Obrigado!
— Dom? — sua voz soa baixa e determinada. — Não sei o
que se passa na sua vida, porque se sente tão pressionado e
aprisionado nessa escuridão, mas nada vale a nossa paz de
espírito. Se tem alguma coisa que está te fazendo mal, abre mão.
Sobrecarregar seu coração e seu corpo com algo que não deseja e
não te faz bem, vai te consumir aos poucos, você não merece isso.
Seu conselho entra como flecha em meu coração, como se
precisasse ouvir aquilo de alguém que não sabe na íntegra sobre
meus problemas.
— Na verdade nem eu sei porque fico assim, é tanta coisa
acontecendo ao mesmo tempo que não consigo achar a raiz do
problema.
— Conversar sobre, pode ajudar, estou à sua disposição. —
Ela sorri docemente. — Assim nos conhecemos um pouquinho, o
que acha? — dou de ombros e me ajeito no sofá pra ficar ao seu
lado.
— Quando meu pai ficou doente, ele se entregou a bebida, e
em vez de focar em se tratar, se afundou cada vez mais no
alcoolismo que o levou à morte …
— Sinto muito, Dom! — se solidarizou segurando em minha
mão, ela me olhou dentro dos olhos, foi tão intenso que me tirou do
eixo.
— Não sinta, ele tinha condições financeiras pra se tratar, e
escolheu desistir de tudo. — Respiro profundamente. — O que me
deixa com raiva é não entender porque minha mãe não ficou do lado
dele, não quis ajudar… ela se afastou e deixou ele sozinho. Não
consigo aceitar e entender que o homem com quem ela conviveu
por mais de vinte anos, não valia mais a pena só porque estava
doente. Não acredito que amor seja isso…
— Talvez ela também precisasse de ajuda, é difícil julgar a
decisão dos outros quando estamos do lado de fora, entende!?
— Eu só tinha quinze anos, o que eu podia fazer? Acompanhei
ele nas consultas, levei ao psicólogo, mas ele não queria mais, se
entregou desistindo de tudo… ele não se importou comigo. Desistiu
de mim…
— Ei, anjo — ela chama minha atenção, e gosto do seu jeito
carinhoso — você não pode se culpar assim, para pra pensar um
pouco, quer acabar como ele? Eu acho que não. Beber desse jeito
não vai fazer a culpa ou o vazio que sente sumir, apenas vai
prolongar o que te incomoda — sua voz solene e tranquila me força
a abrir um sorriso.
— Você tem razão, prometo que vou maneirar na bebida, não
quero fazer a Princesa passar vergonha — brinco lançando uma
piscadela provocativa.
— Não faça por mim, faça por você! Converse com sua mãe,
aposto que mesmo depois de todos esses anos, você não disse a
ela como se sente — concordo. — Minha mãe morreu e depois que
ela se foi, meu pai se isolou, se fechou e esqueceu que tinha dois
filhos que também estavam sofrendo… Sua frustração e dor se
transformaram em uma missão maluca de me transformar na cópia
perfeita dela, e isso não vai ser possível, nem se eu quisesse.
— Sinto muito!
— Tudo bem! Meu irmão James é maravilhoso, você vai ter a
chance de conhecê-lo um dia, ele sim quer se tornar rei, assumir o
trono, e tenho certeza que reinará com maestria, mas eu não. Quero
ser uma chef, é isso que quero! — Nadine exclama sonhando
acordada.
— Se ele for tão maravilhoso quanto você, tenho certeza que
sim! — Sem perceber, me aproximo de Nadine segurando suas
mãos com força, nossas bocas ficaram apenas a alguns centímetros
de se tocarem, nossos olhares se fundiram num clima eletrizante de
carinho e sedução, mas ela recua a tempo, antes de acontecer
qualquer coisa que coloque tudo a perder.
— Vou fazer um chá pra você, assim você dorme mais
tranquilo. — Levanta apressada disfarçando seu incomodo por estar
sozinha comigo outra vez.
— Obrigado! — agradeço.
Minutos depois ela volta e entrega a xícara em minha mão, seu
olhar aflito não me engana, ela também ficou nervosa com a nossa
aproximação.
Será que por um minuto ela pensou como esse acordo pode
ser complicado para nós dois?
— Dominic…
— Nadine… — falamos em uníssono, — pode falar — cedo
minha vez educadamente.
— Olha, eu quero ser sua amiga, quero te ajudar em tudo o
que for preciso e no que eu puder, mas não quero misturar as
coisas, temos um acordo que deve ser mantido formalmente.
— Concordo Princesa!
Suas palavras fizeram eu me sentir um canalha por ter
cogitado algo a mais. É só olhar pra ela, ingênua, e apesar de sua
força em querer conquistar o mundo, aposto que nunca esteve com
um homem antes.
— Vou pegar o lençol. Pode ficar no sofá, eu durmo no quarto.
— Tudo bem!
Observo seus passos até o guarda-roupa, sua respiração
ofegante, seu olhar apressado e temoroso, ela tem medo de não
resistir a curiosidade, e eu sinto que não sou imune a ela.
— Nadine… — suplico seu nome e ela me olha nervosa. —
Sabe que sou um homem experiente, que já saí com muitas
mulheres, e estar com você durante esse tempo, será muito difícil…
— Difícil porquê? — questiona.
— Como porquê? Olha pra você Nadine, você é linda, esperta,
gostosa, então… — miro seu corpo com desejo e ela se ofende.
— Então nada Dominic, temos um acordo, controle seus
hormônios, você tem cinco dedos, use-os! — retruca afoita jogando
os lençóis com brusquidão em meu peito, fechando a porta do
quarto praticamente na minha cara.
Que canalha eu fui!
Capítulo 13
É muito abuso mesmo, como ele ousa me propor uma coisa
dessas! Isso é um absurdo. Senão precisasse tanto dele, essa
loucura acabaria agora mesmo! E eu achando que ele era diferente,
tola.
— James? — Ligo para meu irmão antes de deitar.
— Nadine, está tudo bem? —pergunta ao perceber minha voz
trêmula.
— Sim, já consegui um marido, vamos oficializar nosso
noivado essa semana…
— Calma, é muita informação, como assim? Onde arrumou…
— Meu chefe está com problemas financeiros, propus um
contrato, ótima ideia você teve, irmão. Agora preciso que você… —
ele interrompe outra vez:
— Isso está indo longe demais Nadine, estou arrependido de
ter lhe dado uma ideia tão absurda, como pude ter coragem de…
Não achei que iria tão longe. Minha vontade em ser Rei fez com que
eu não pensasse direito nas consequências disso tudo…
— Ei, pode parar James, nada disso! Eu pedi sua ajuda e você
me ajudou, quem decide se vai em frente ou não, sou eu! E eu vou,
pode apostar! — exclamo decidida sem nem pensar em desistir. —
Preciso que deposite o dinheiro em minha conta — acrescento
deixando-o absorto quanto ao valor ao mandar por mensagem.
— Nadine, ficou louca?
— Por favor, James!
— É um absurdo! Ele está abusando de você, não pode ceder
a isso!
— Ele não está! Nem falamos em valores, creio que a dívida
do restaurante nem seja tudo isso, mas quero que faça. Quero que
ele fique tranquilo, longe de suas preocupações e foque em me
ajudar, não posso voltar para o reino, não posso! — suplico
apelativa.
— Tudo bem, vou fazer por você. Mas fique ciente que não
estou gostando nada dessa história, se arrependimento matasse…
— resmunga em um fio de voz.
— Você faria de novo, porque você me ama, e eu te amo, e
você quer me ver feliz e eu também, então todos ganham — sorrio
divertida fazendo-o gargalhar também.
— Você não tem jeito Nadine.
— Agora voltando ao foco, sabe dizer se preciso mesmo casar
no papel, ou se eu for só morar junto resolve?
— Nadine? — censura James assustado, ao pensar que
estava disposta a me perder.
— Calma, não fiz e não vou fazer nada que manche minha
honra, mas quero saber as alternativas.
— Que alivio. — Suspira aliviado, foi impossível não ouvir. —
Bom, pelo que eu li, precisa constar em um documento oficial que
realmente se casou em outro país.
— Certo, vou marcar com Dominic pra irmos até o cartório.
Quanto tempo eu tenho?
— Papai está esperando o último investigador voltar com
informações, torce pra ele não ter achado nada.
— Dedos cruzados! — brinco rezando pra estar tão bem
escondida quando penso que estou. — E o príncipe?
— Focado em encontrar sua bela donzela perdida pra
finalmente consumar a união real mais aguardada de todos os
tempos.
— Só de ouvir, tenho náuseas…
— Não. Não, por favor, não vai pai, por favor… Não desiste de
mim… — ouço Dominic gritar da sala.
— Preciso desligar, espero a transferência amanhã, e me
mantenha informada sobre tudo, está bem?
— Cuidado Nadine, até mais, te amo.
— Amo você.
Abro a porta devagar, Dom está dormindo, revirando-se
agoniado no sofá, murmurando gemidos e palavras difíceis de
entender, parece estar tendo um pesadelo.
— Dominic — sussurro pertinho de seu ouvido para não o
assustar. — Dom, acorda, está tendo um pesadelo. — Ele continua
gemendo, aflito. — Dom, acorda! — elevo a voz sentindo o seu
desespero e dor.
Seus olhos abrem de repente, sua feição se tranquila ao olhar
pra mim, está suado, respiração ofegosa.
— Está tudo bem agora, foi só um pesadelo — acalmo em um
fio de voz passando a mão sobre sua testa molhada. Ajoelhada a
sua frente encaro seus olhos, os mesmos que me encaram com
uma escuridão sem fim, olhar vazio, triste como um abismo ecoando
um pedindo socorro. Ele pedia socorro. Desesperado sem saber o
que fazer pra tirar aqueles sonhos ruins de suas noites.
Senti a necessidade de tocá-lo, de colocá-lo entre meus
braços como minha mãe fazia para me acalmar nas noites de
tempestade. Sento-me ao seu lado apoiando sua cabeça em meus
braços, ele se aconchega sem dizer nada, não era preciso.
É estranho o que acontece entre a gente, é como se o destino
estivesse traçando nossos caminhos para que juntos curássemos as
feridas um do outro, como se tivéssemos uma lição valiosa a
aprender.
Dominic é um menino crescido, um homem cheio de traumas
que busca incessantemente alguma coisa que lhe dê um norte, uma
bússola que lhe mostre o caminho.
Por um tempo nossos olhares se comunicam, talvez
esperando a boca formular palavras que fizessem sentido, contudo,
não foi preciso, o silêncio entre eles era o suficiente pra dizer o que
a alma precisava ouvir.
Dom sabia que estava em um lugar seguro, e eu apesar das
circunstâncias, também me sentia segura, porque sinto que ele vai
estar comigo até o fim nessa aventura descabida.
Por um breve instante me perdi em pensamentos, desejei
beijar sua boca, desejei sentir seus lábios nos meus. Mergulhei no
verde de seus olhos e almejei estar entre seus braços, eu queria,
queria muito fazê-lo esquecer de todos os seus medos e aflições,
queria dividir com ele minha força e minha coragem…
— Nadine… — ele quebra o silêncio sussurrante. — Se não
parar de me olhar desse jeito, vou ser obrigado a beijar você, e
sinceramente não quero comprometer o que a gente tem, seja lá o
que for, então…
Suspiro dando razão a ele, não quero e não posso misturar as
coisas, precisamos manter esse acordo intacto até o fim, até eu
estar livre do trono.
— Acho que você já está mais calmo, então eu já vou deitar,
se precisar de algo é só chamar.
Dom se levanta me dando espaço para sair, caminho até o
quarto sentindo meu coração bater tão forte que parecia que saltaria
pra fora do peito.
Deito na cama e um sorriso bobo estampa meus lábios, a
imagem de seus olhos brilhantes, e de seus lábios rosados me vem
à mente fazendo-me imaginar coisas. Meu corpo reage, e começo a
sentir um calor prazeroso entre as pernas, meu ponto mais sensível
lateja, sinto-me excitada, envolvida, desejando coisas com quem
não deveria.
Minha mão escorrega pressionando minha intimidade, a
respiração acelerada me deixa ansiosa, e a adrenalina percorre meu
corpo me consumindo de uma maneira eloquente. Mesmo com a
mente fértil por conta dos diversos livros eróticos que já li, nunca
cheguei a me tocar, nenhum livro, nem mesmo as libertinagens com
Alec, despertaram o desejo de me tocar, como desejo fazer agora.
Suas mãos escorregam pelo meu corpo, subindo suavemente
pelas minhas pernas. Seu hálito quente faz meus pelos se
arrepiarem, e sua barba rala pinica minha pele ouriçada, e
sedenta… Seu olhar intenso me fita com luxúria, e suas mãos fortes
me pegam com firmeza. Sua língua faz um caminho ousado,
pousando nos meus seios, chupando-os com lasciva, mordiscando
os bicos obrigando-me a gemer baixinho entre os dentes. Seu corpo
pesa sobre o meu, e sinto sua ereção roçar entre minhas pernas,
isso me faz latejar desejosa. Minhas mãos exploram suas costas
largas acariciando cada centímetro de seu corpo venerável sobre o
meu. Sua voz rouca me hipnotiza e seu jeito cafajeste em rendição
me instiga, faz-me esquecer quem eu sou, deixando-me
enlouquecida apenas como uma mulher que anseia por suas
caricias…
— Nadine…
— Isso… assim … — sussurro em sôfrego.
— Nadine, amiga, acorda. — Ouço de fundo uma risada que
não faz parte dos meus sonhos.
Helvete![7]
— Desculpa amiga, acho que eu estava sonhando. — Sinto o
rubor queimar meu rosto.
— Percebi. Posso saber o que o nosso chefe, e aspirante a
rei, está fazendo no nosso sofá daquele jeito?
— Que jeito?
— Vai lá ver — aconselha maliciosa seguindo para o
banheiro.
Caminho envergonhada até a sala, Dominic está apenas de
cueca, o cobertor cobrindo apenas parte de suas pernas brancas,
peludas e torneadas, deixando a mostra aquele monte de músculos.
— Vai ficar aí me encarando por muito tempo, Princesa? —
resmunga abrindo um sorrisinho sem vergonha.
— Sabia que não moro sozinha? Não pode ficar desse jeito,
você estava vestido ontem quando te deixei aqui — reclamo
cobrindo-o.
— Está com ciúmes?
— Não! — arregalo os olhos, será que estou? — Se a dona
do apartamento te pega aqui, vamos ser expulsas!
— Não podem trazer rapazes? — indaga levantando sem
pudor algum, expondo seu 1 metro e 80 praticamente nu, deixandome de boca seca logo cedo, fazendo-me lembrar do sonho devasso
que tive com ele.
— Dá pra você colocar uma roupa, grekisk gud[8] — murmuro
as últimas palavras que o deixam confuso.
— O que você disse?
— Nada! Coloca a roupa logo, hoje temos que cuidar do nosso
noivado.
— Hum, tinha até esquecido.
Seu comentário me faz revirar os olhos antes de voltar para o
quarto.
— É impressão minha, ou tá rolando alguma coisa entre
vocês dois? — Vicenza insinua após sair do banheiro.
— Somos amigos, não está acontecendo nada!
— Você pode se enganar, mas dá pra ver que tem alguma
coisa, os olhares não negam — provoca ela, e jogo uma almofada
em sua direção pensando com clareza no que ela acabara de dizer.
E chego à conclusão que só estamos nos conhecendo, como
amigos, Dominic é carente, e eu tenho muito amor pra dar, como
amiga, claro!
— Nadine, estou pronto, vamos? — Dom bate à porta
despertando-me dos meus pensamentos “amigáveis.”
— Só um instante — peço correndo em direção ao banheiro
para me trocar de pressa.
Tempo depois saio pronta, ele me olha de cima a baixo e de
novo desperta algo estranho dentro de mim com aquele maldito
sorrisinho de canto de boca.
— Podemos ir agora! — Caminho em direção a porta, mais
nervosa que de costume.
— Onde vamos primeiro? — ele pergunta enquanto
esperávamos o elevador.
— Primeiro no cartório marcar o casamento no civil, depois
podemos nos programar para um jantar de noivado, preciso de
algumas fotos que pareçam verdadeiras — dou de ombros
levemente empolgada.
— É impressão minha, ou está gostando de toda essa farsa?
— comenta ele percebendo.
— Não sou uma pedra de gelo seu Levy, quero me casar um
dia, quero noivar, fazer tudo como manda o figurino, mas quando eu
amar alguém, quando me sentir pronta pra dar esse passo. Não ser
tratada como uma moeda de troca para a política de um reino
arcaico.
— Posso me sentir lisonjeado então, — entramos no elevador
— você me pediu em casamento, isso mostra que gosta de mim,
pelo menos um pouquinho — pondera encurralando-me na parede
fria daquele cubículo em movimento.
— Não sinta, não mesmo! O que temos é um contrato que
beneficia os dois. Nada mais! — repito convencendo a mim mesma
de minhas próprias palavras.
— Diga o que quiser, eu acho que gosta — provoca deixando
escapar seu hálito mentolado de pasta de dente.
Capítulo 14
As palavras de Vicenza não saiam da minha cabeça. Não acho
que gosto dele, não desse jeito. Apenas me identifico, gosto de ficar
ao seu lado mesmo que em silêncio. Talvez seja pelo fato de termos
nos aproximado em um momento difícil, constrangedor até!
— Está fedendo a bebida — minto querendo manter uma
distância segura, torcendo para chegarmos no térreo o quanto
antes.
Dominic fica sem jeito pelo meu comentário, puxa a blusa até
o nariz e tenta sentir o cheiro de bebida, ele não está fedendo, mas
precisava me livrar daqueles poucos centímetros que podiam
colocar tudo a perder.
— Você parecia não se importar quando me abraçou ontem à
noite — contesta ele um tempo depois com a mesma arrogância de
sempre.
— Não fica se achando, você estava tendo um pesadelo, e
eu fui gentil. — Saio do elevador assim que a porta se abre
deixando-o para trás mastigando sua falta de argumentos.
No carro Dominic evita puxar qualquer tipo de assunto,
aumenta o som justamente pra não dar brecha, melhor assim. Dou
de ombros ao concordar com meus pensamentos.
Paramos em frente ao seu apartamento, fiz menção em
esperar dentro do carro, mas com uma cordialidade escondida, Dom
abre a porta do carro sem nem ao menos me olhar.
— Desce, vou trocar de roupa — ordena todo ofendido,
ameaço um sorriso que o deixa ainda mais incomodado.
Se nesse pouco tempo eu o conhecei um pouco, Dominic
está com o ego ferido, quem ousaria dizer quer o empresário
bonitão mais cobiçado de Paris estaria fedendo a bebida,
justamente algo no qual ele sabe que tem um problema. Talvez eu
tenha sido insensível.
Helvete!
Sentada no sofá, mexia no celular deslizando o dedo sem
atenção no feed do Instagram que não me chama atenção em nada.
Vicenza insistiu para que eu fizesse um perfil. Na mansão papai não
permitia ter redes sociais, justamente para evitar aflorar minha
curiosidade no mundo fora daqueles malditos portões. Como se eu
já não tivesse curiosidade o suficiente. — Sorri sem acreditar que eu
realmente estava fora dos portões, em outro país, sentada no sofá
de um homem lindo, esperando-o se trocar pra marcar nosso
casamento.
“O que me diz papai, muito curiosa?” — Desdenho em
pensamentos.
— Vamos! — Dominic sai do quarto deixando um enorme
rastro de perfume amadeirado e loção pós barba pelo caminho. Foi
inevitável não fechar os olhos quando seu cheiro invadiu minhas
narinas.
Grekisk Ged!
Respiro fundo e me recomponho. Levanto e o sigo sentindome uma menina boba. Meus olhos estão em alerta analisando seu
figurino milimetricamente desenhado em seu corpo, o mesmo corpo
que vi totalmente despido mais cedo.
De volta ao elevador, Dom se aproxima disfarçadamente,
seus olhos encaram o visor eletrônico que passam os andares
rapidamente, seguro uma risada sarcástica, ele queria que eu
sentisse seu perfume, queria que eu o elogiasse.
Seguro a vontade de falar qualquer coisa. Gosto de provocálo, assim como ele faz comigo.
— Não vamos para o cartório? — questiono quando ele para
em frente a padaria.
— Vamos tomar café primeiro.
— Porque você tem que ser tão mandão. Você perguntou se
eu queria? — reclamo sabendo que isso vai pilhá-lo.
Dominic fecha os olhos lentamente e respira fundo, com as
mãos ainda sobre o volante, ele me encara e pergunta:
— Vossa majestade deseja tomar café antes de darmos início
a farsa real? — sua voz sai por seus lábios solenemente com uma
pitada de ironia.
— Não me provoque Dominic! Não me provoque! — Desço
do carro e bato a porta com força, ele balança a cabeça
inconformado.
Cruzo os braços em frente ao corpo esperando sua boa
vontade de sair de dentro do carro e me acompanhar.
— O que está fazendo? Espero que saiba que eu tenho um
trabalho a zelar — resmungo batendo a mão no vidro do carro
mirando no seu relógio de pulso.
Dominic sai bem devagar ajeitando sua roupa junto ao corpo,
achando que estava em algum tipo filme de romance ou sei lá.
Óculos de sol estilo aviador, justamente aquele modelo que deixa
ele com uma pegada de “boy literário”, aqueles bem cafajestes e
impróprios, aqueles que vem com uma plaquinha na testa escrito:
“perigo”.
— Agora você está praticamente noiva do seu chefe, isso te
dá alguns direitos, principalmente de chegar atrasada quando
estiver comigo.
— Claro, muito apropriado…
— Vamos tomar café, resolver o que tiver que resolver e
depois vamos para o hotel, está bem? — sua voz agora está
carregada de educação e ternura. Ele é mesmo bipolar.
— Está bem! — dou-me por vencida após o clima pesado se
esvair. Antes de entrar na padaria Dominic me assusta puxando-me
pelo braço.
— Cheire aqui — pede estendo seu pescoço longo em minha
frente, suas palavras pareciam brigar com a razão por estar fazendo
aquilo.
— Quê? — finjo não entender o que ele quer.
— Cheire aqui! — aponta para o pescoço sem muita
paciência. Aproximo-me receosa e inalo seu perfume inebriante, tão
gostoso que ficaria o cheirando por horas.
— Perfume gostoso, é novo? — pergunto sob seu olhar
especulativo.
— Estou cheiroso o suficiente pra você agora?
— Não entendi? — finjo mais uma vez não saber do que ele
está falando.
— Mais cedo você disse que eu estava cheirando a bebida,
estou cheiroso agora? — replica a pergunta olhando para os lados,
menos pra mim.
— Ah, agora está bem melhor. Vamos, estou com fome. —
Entro deixando-o com aquele sorrisinho meia boca que me tira do
sério.
Peço suco de laranja acompanhado de um croissant. Dom
pede café e um croissant igual ao meu.
— Vamos sentar ali perto da janela — peço.
— Sempre sento nos fundos, tem menos gente, é mais
reservado — argumenta coçando a cabeça.
— Se quer privacidade toma café na sua casa. Vem, vamos
sentar na janela, quero ver o movimento lá fora. — Sem contestar
ele me acompanha contrariado.
Da grande janela pude contemplar o movimento e a liberdade
das pessoas indo e vindo de todos os lados.
— Qual a graça? — quebra o silêncio encarando-me com
atenção.
— Fui criada praticamente dentro de uma mansão, sem
liberdade de ir a um simples café como esse. Não podia interagir
com outras pessoas, a não ser nas reuniões ou festas de gala que
meu pai promovia…
— Tudo é igual Nadine, as coisas nunca mudam, as pessoas
sempre estão apressadas e intolerantes, os prédios continuam os
mesmos, os carros não param de passar…
— Errado! Tudo muda, todos os dias, Dominic, toda a hora.
Amanhã mesmo não serão mais as mesmas pessoas a caminhar
por essa calçada. Outros carros passarão por essa avenida. O sol
não estará mais naquela posição, e com toda a certeza as nuvens
estarão em formatos diferentes. O céu mudará de cor, as árvores
balançaram com o vento totalmente diferente de agora — declaro
admirando minunciosamente cada item que listei a ele. Ao encará-lo
percebo que está vidrado em minhas palavras, fico feliz por saber
que ele me escuta, pelo menos na maioria das vezes.
— Como era viver na mansão? — Ele muda de assunto.
— Casa grande, muito espaço pra solidão fazer companhia,
— travo nas últimas palavras lembrando de como me sentia
solitária. — Muitos afazeres, regras, doutrinas, eventos…
— E quando você fazia algo pra você?
Solto uma risada irônica.
— Isso depende. Meus melhores momentos era quando me
escondia pra ler — sua feição faz uma grande interrogação. — Meu
pai não gostava que eu lesse livros de romance, e eu adoro um bom
romance, — soo maliciosa sem perceber e ele deduz o tipo de livro
que gosto. — Os da biblioteca não eram muito emocionantes, fora
que já tinha lido praticamente todos. Meu irmão James tinha
permissão pra sair da mansão, ele sempre comprava livros pra mim.
— Então a sua única diversão era ler livros escondida? —
replica curioso.
— Ah, eu fugia pra praia com meu guarda as vezes…
— Você tinha um guarda? — interrompe bebericando o resto
do café na xícara.
— Tinha, ele foi o primeiro garoto que beijei — falo e logo me
arrependo. Eu sempre falo demais.
— Quantos garotos já beijou, Nadine? — Dominic tenta
parecer desinteressado, mas falha, é claro.
— Só ele. Eu já terminei, podemos ir? — Levanto para me
livrar daquele assunto, me sentia muito desconfortável. Dominic
levanta e me acompanha até o carro.
Percebo que vai perguntar algo quando abaixa o som que eu
havia aumentado pra evitar outra conversa.
— O que aconteceu?
— O que aconteceu o quê? — rebato em fuga.
— Com ele, o guarda real.
— Ele se mudou.
— Porquê? — insiste, e nota que esse é um assunto que não
me deixa à vontade.
— Não quero falar sobre isso — peço séria.
Dom assente mesmo contrariado e volta a atenção para
direção.
— Que casal bonito — a atendente do cartório elogia com um
sorriso simpático nos lábios.
— Não somos um… — respondemos em uníssono, e a
atendente ergue uma sobrancelha em dúvida, e então lembramos
que na verdade somos um casal.
— Estamos nos acostumando ainda com a ideia. É recente,
não é mesmo amor — fingi Dominic puxando-me pela cintura para
perto de seu corpo.
— É amor, ainda nem acredito que vou me casar — forço um
sorriso convincente.
— Que maravilha, e pra quando querem agendar?
Olho para a tela do computador atenta nas datas disponíveis.
— Pode ser dia 17, tudo bem pra você querido? — melo a voz
com muito doce para olhá-lo nos olhos.
— Aí que lindo, um dia ainda quero conhecer alguém que me
olhe assim como ele te olha, parabéns, viu! — o comentário da
atendente nos pega desprevenidos, talvez fosse só encenação, mas
isso com certeza vai nos ajudar a enganar o meu pai.
— Pode ser dia 17 — assente Dom pegando em minha mão.
Sua mão está suando. Ele está nervoso, muito mais do que eu.
— Claro, agendado! — confirma ela com um sorriso
embasbacado olhando pra gente.
— Ótimo! Vamos querida, temos poucos dias pra preparar tudo
— orienta Dom guiando-me pela saída.
— Obrigada, até mais — aceno cordialmente para a moça.
— O prazer foi meu, agarra ele, um olhar desses, — suspira —
ele te ama muito — completa sorrindo, forçando-me a sorrir de volta
enquanto Dom não desvia o olhar da saída.
Está feito. Daqui a exatamente quinze dias vou me casar,
simples assim. Só mais alguns dias e terei meu alvará de liberdade,
estarei livre do trono e de um casamento por conveniência. Ops.
Tudo bem, que esse casamento também é por conveniência, mas é
diferente, vai durar somente por alguns meses e pronto, depois
estou livre pra fazer o que quiser. — Brigo com minha razão por
conta das minhas escolhas controversas.
Dom se mantém em silêncio durante todo o caminho, respeito
seu espaço. Chegamos no hotel, e já ia entrando quando ele toca
sua mão na minha entrelaçando nossos dedos.
— O que está fazendo? — recuo assustada.
— Se quer que acreditem nesse relacionamento, precisa
parecer de verdade — explica voltando a segurar minha mão. Os
olhares foram inevitáveis, e os comentários também, me senti a
protagonista de um grande espetáculo.
Capítulo 15
Contemplar a empolgação de Nadine com coisas tão simples
me leva para outra dimensão. É como se eu me perdesse no doce
de seus olhos amendoados, totalmente entregue aos seus
encantos, concordando com seus planos mirabolantes.
Ainda não acredito que aceitei me casar. Sei que envolve
dinheiro e a solução dos meus problemas atuais, mas casar? É uma
coisa que nunca me imaginei fazendo.
E porquê?
Porque cedi ao seu pedido? Porque me sinto hipnotizado por
ela? Porque a sigo pra onde quer que vá?
Enquanto ela vislumbra a rotina entediante de Paris com
entusiasmo através de seus olhos esperançosos, percebo que perco
coisas simples, simplesmente pelo fato de deixar a rotina e a
mesmice se instalar em minha vida.
As coisas não precisam ser tão, preto no branco.
Nadine apareceu em minha vida pra trazer cor aos meus dias
cinzentos. Sorrisos sem motivos. Momentos de distração e graça
com seu jeito desengonçado de ser. Palavras de apoio e uma
segurança que jamais senti com nenhuma outra pessoa.
Ao tocar em sua mão na entrada do hotel, ela recua, talvez
tenha me precipitado com esse toque, mas…
Lanço um olhar acolhedor. Tinha muita plateia para esse
momento. Momento perfeito para começarmos a encenar.
Seus dedos entrelaçam nos meus, e juntos caminhamos pelo
saguão atraindo olhares curiosos e comentários dispensáveis.
— Você está bem? — pergunto ao perceber seu incomodo
diante de tanta atenção.
— Sim, estou bem — força um sorriso amarelo — Porque
estão me olhando assim? — não resiste e pergunta sem jeito.
— Nunca entrei no hotel segurando a mão de nenhuma
mulher — anuncio evitando seu olhar especulativo.
— Nunca? Nem com a sua ex.?
— Não! Agora preciso subir, tenho uma reunião. Nos vemos
na hora do almoço?
— Vamos almoçar juntos? — sua pergunta me deixa irritado.
Puxo-a pelo braço delicadamente, arrastando-a para um canto
isolado. — Parece que só eu estou querendo convencer a todos que
estamos apaixonados o suficiente para nos casarmos tão rápido. —
Respiro fundo controlando minha falta de jeito.
— Desculpe, eu nunca namorei antes, não sei como fazer
isso… — Sua testa se franze e sua voz estremece.
— Você disse que lê muito, certo?! — ela concorda — É só
fazer basicamente o que os casais dos livros fazem quando estão
apaixonados. Almoços, jantares, sorrisos, olhares, essas coisas.
— Tá bom, entendi! — Sorriu tímida olhando por cima de
meu ombro.
— O que foi?
— Estão olhando… — diz em um fio de voz sem saber o que
fazer a seguir, e sem pensar selo um beijo rápido em seus lábios e
saio. Ela fica visivelmente desconcertada, toca em seus lábios e os
acaricia.
Entro no elevador e faço o mesmo, toco meus lábios sentindo
o sabor doce de batom de cereja. Fecho os olhos na tentativa de
definir a sensação que senti com a fração de segundos que nossos
lábios se tocaram.
Não sei se estava com tanta sede de senti-la que não saciou,
quero mais, preciso de mais, muito mais…
— Como vai o noivo do ano? — zomba Diogo ao me
encontrar na saída do elevador. Limito-me apenas em lhe entregar
um sorriso falso como resposta. — Já vi que não muito bem. Está
de mal humor hoje? — insiste com a mesma ironia de sempre.
— Não, não estou de mal humor.
— Não mesmo, até me respondeu. Como vai os preparativos
da loucura de vocês? Ou vai me dizer que o encanto já passou? —
Ele me segue pelo corredor até chegar em minha sala.
— Preciso de uma testemunha para o dia 17, esteja
preparado.
— Como assim? Dia 17 agora? — replica na dúvida pela
rapidez. — Está me convidando pra ser o seu padrinho?
— Não, do mês passado! Claro que é de agora. Quem mais
seria?
— Por que tão rápido? Não vai me dizer que ela está
gravida… — fala baixinho para que ninguém escute e me abraça.
— Cala a boca, ela não está gravida, só queremos nos casar
o quanto antes, fim de assunto!
— Se não te conhecesse bem Dominic, até acreditaria nessa
história descabida de paixão repentina, mas tem alguma coisa por
trás desse casamento e mais cedo ou mais tarde você vai me contar
ou eu mesmo vou descobrir. — Dá de ombros e sai resmungando.
Só o que me faltava!
Tento me concentrar no trabalho, mas o olhar e o gosto do
beijo de Nadine não saem da minha mente, é estranho me sentir
assim. Lembro das atitudes que tomei nos últimos dias e percebo
que em todas elas eu estava pensando na bela princesa de cabelos
castanhos, e olhar determinado.
O que ela fez na noite anterior por mim foi levado em
consideração de tal forma que não consigo explicar. Cheguei
bêbado em sua porta, ela não precisava me receber. Não tinha
obrigação nenhuma. Não precisava ficar comigo, mas ficou, cuidou
de mim, coisa que nem a minha mãe faz.
Suas palavras de apoio e incentivo plantaram uma semente
dentro do meu peito, uma semente que precisa ser regada aos
poucos, e tenho certeza que se ela ficar do meu lado vai crescer e
florir. Não quero acabar como meu pai, não quero ser um bêbado,
um alcoólatra e acabar em cima de uma cama, sozinho…
Nadine com tão pouco tempo me fez querer ser melhor,
melhor que meus problemas, fez-me sentir envergonhado por beber
até não aguentar ficar em pé. Fez-me ter vergonha de estar diante
de uma mulher tão linda e não ter nada a oferecer como homem,
nada que possa ser levado em consideração.
Como impressionar uma princesa? Ela tem tudo. Tem
dinheiro, carros, casas… Porra! Ela é uma princesa. O que um
aspirante a alcoólatra e falido tem a oferecer, além de traumas e um
passado conturbado?!
Um homem que precisa aceitar um acordo de casamento pra
não ver seu único bem afundar em um mar de dívidas. É isso, nada
a oferecer. A única coisa que posso fazer por aquela menina mulher
é lhe ajudar a se livrar do que não quer, ajudar a conquistar seus
sonhos e vê-la feliz…
Depois de passar horas pensando em como não sou o
suficiente pra ela, olho no relógio e desço para almoçar. Passo pela
porta do restaurante e logo a vejo, seus olhos brilham ao cruzar com
os meus. Ela com certeza aprendeu rápido a arte de enganar, quero
dizer, encenar.
— Chegou bem na hora — anuncia ao se aproximar pegando
em minha mão. — Vem, deixei uma mesa reservada pra gente. —
Guia-me para mesa mais reservada do restaurante.
— Como estão as coisas por aqui?
— Melhor impossível. Antonie está me ensinando muito, hoje
quem preparou os pratos foi eu. — Sua empolgação é venerável.
— Que boa notícia, e como se sentiu?
— Uma grande Chef. Queria te agradecer por me
proporcionar isso. É muito importante pra mim Dom.
— Me chamou de Dom?
Gostei de ouvir meu apelido saindo de sua boca.
— Seus amigos te chamam assim, não chamam? Somos
amigos, pelo menos acho que somos — brinca me deixando sem
jeito por parecer tão à vontade naquela situação.
— Claro que somos, afinal, vamos nos casar. — Lanço um
sorriso convidativo assim que Antonie aparece com os nossos
pratos.
— Bon après-midi[9]
, seu Levy. — Cumprimenta Antonie com
sua cordialidade francesa.
— Bom après-midi, como vai?
— Bem, obrigado por perguntar. Espero que goste. Entrada
especial feito pela senhorita Nadine. Ela tem muito potencial, vai ser
uma grande Chef na minha ausência — elogia forçando-me a fitá-la.
— Não exagere Chef Antonie, isso tudo graças ao senhor
que tem sido um bom professor.
— O prazer é todo meu. Bom appétit[10]
. — Antonie deixa os
pratos sobre a mesa e sai cantarolando. Em seguida o garçom para
ao nosso lado segurando minha garrafa de vinho predileta, e
imediatamente nego com um aceno.
— Não vai beber? — ela questiona receosa.
— Não. Pode me trazer um suco de laranja, por favor — peço
ao garçom e Nadine se surpreende.
— Também quero, s’il te plaît[11] — ela pede o mesmo.
— Posso saber quantas línguas minha futura noiva fala?
Porque o seu francês é divino, devia usar mais — comento tentando
mudar o rumo dos meus pensamentos.
— Falo francês, inglês, um pouco de português do Brasil, e
norueguês.
— Impressionante.
— Come, quero saber se gosta da comida — ela incentiva com
o queixo apoiado nas costas das mãos.
— Você não vai comer?
— Depois que você me disser o que achou. Quero saber se
tenho mesmo potencial para ser a chef do Levy’s, digna para
conquistar a terceira estrela Michelin.
Sorrio com seus planos futuros.
Abro o cloche admirando a fisionomia do prato, faço uma
feição agradável que a deixa ansiosa por minha opinião.
— E então? Primeira impressão? — Mexe as sobrancelhas
de um jeito engraçado e isso me faz rir.
— Descreva a entrada, por favor — peço antes de provar.
— A entrada é simples, e não menos importante, fois gras,
fígado de ganso acompanhado com pão.
Parto uma pequena parte e levo a boca mastigando devagar,
deliciando-me com o gosto peculiar de sua receita. Nessa mesma
hora Chef Antonie retorna a mesa com o prato principal. Deixa sobre
a mesa com um sorriso orgulhoso lançando uma piscadela cúmplice
para Nadine.
— Porque ele não pede para o garçom trazer? — Contesto.
— Porque você é o chefe, e foi eu que fiz os pratos. Ele está
animado pra eu assumir o seu lugar na cozinha. Pronto! — ela puxa
o prato da minha frente o colocando para o lado. — Agora prove o
prato principal. Magret de Canard, meu preferido, peito de pato frito,
servido com salada e batatas — completa colocando o outro prato
em minha frente.
— Não estou vendo você comer.
— Você ainda não falou nada — retruca sorridente.
Faço o mesmo, analiso a delicadeza do prato e depois levo a
boca uma garfada generosa. Nadine não desvia o olhar, ansiosa
demais por minha opinião.
— Já comi este prato em diversos restaurantes de chefs
muito famosos, mas nenhum chega aos pés do seu — elogio
limpando a boca com o guardanapo macio.
— Fala sério Dom? Quero que seja sincero.
— Estou sendo. Você tem um jeito diferente de fazer as
receitas, tem um toque que não consigo distinguir o que é, e esse
toque faz toda a diferença. Deixa o paladar agradável, leve, sem
tirar o requinte que o prato exige.
Nadine sorri contente, e como uma criança espoleta começa
a comer depois de ter ouvido o que queria.
— Se continuar a estudar, vai ser uma chef digna de muitas
Michelin.
— Obrigada!
Meus olhos não conseguem se desviar dos seus, ela
disfarça, olha para os lados com frequência. Se eu disser que não
estou louco de vontade de beijá-la outra vez, estarei sendo o pior
dos mentirosos, eu quero. Quero muito. Ela não comenta nada
sobre o beijo de mais cedo, está agindo como se nada tivesse
acontecido. Talvez estivesse seguindo minhas dicas de levar nosso
relacionamento de mentira como nas ficções literárias.
Sem conseguir conter a curiosidade, quebrei o silêncio
cortante chamando sua atenção.
— Nadine, sobre o beijo, eu…
Capítulo 16
Sentir o toque dos lábios de Dominic nos meus me causou
estranheza. Meu segundo beijo. Foi rápido, mas… Não vou negar,
eu gostei, e depois de ficar longos minutos digerindo seu ato,
entendi que ele fez aquilo pra evitar a desconfiança dos curiosos, já
que eu estava praticamente em pânico.
Pra não ficar pensando a cada segundo naquele maldito beijo
de segundos, foco em várias receitas, preciso treinar, terei uma
prova importante na faculdade essa semana, e ter a opinião de
Dominic será muito importante. Se eu vou mesmo assumir seu
restaurante preciso estar à altura.
Tenho muito a aprender, sou apenas uma aspirante com sede
e determinação para aprender. Isso com certeza deve contar
alguma coisa.
Dominic passa pela porta, lindo, está sem o terno, exibindo
seus braços desenhados naquela camisa branca apertadinha. Oh
Deus.
Fico ansiosa por sua opinião, os pratos que fiz não são os
mais requintados, mas com certeza estão deliciosos e bem
apresentados, quero que ele se impressione por meu talento, não
por eu ser princesa ou porque vamos nos casar.
Depois de experimentar a entrada e o prato principal, Dom
fica pensativo por alguns instantes, e sei que ele quer falar
justamente sobre o assunto que eu estava tentando fugir.
— Nadine, sobre o beijo, eu…
— Tudo bem. Foi só um selinho. As pessoas estavam
olhando e eu entrei em pânico, não estou brava — falo sem parar
depois de ouvir a palavra beijo.
Seus olhos se tranquilizam, mas não o suficiente para que eu
ache que aquilo foi atípico. Ele está incomodado, não quis nem a
sobremesa. Aqui em Paris as refeições são completas, vinho,
aperitivo, entrada, prato principal, queijos, salada, sobremesa,
digestivo e por fim, chá ou café. Eu tinha preparado tudo, e antes
que Antonie pudesse servir, Dom saiu alegando uma reunião
importante.
— Ainda tem a sobremesa, fiz Crème Brûlée — argumento
na tentativa de evitar sua partida, e ele simplesmente ignora.
Fico decepcionada, estava gostado de ouvir que levo jeito pra
ser uma boa cozinheira. É bom saber que tenho capacidade de ser
aquilo que sonho, sem ser levado em consideração meu status na
sociedade. Sem créditos por ter um sobrenome real.
Depois de ajudar o Chef Antonie a organizar os
ingredientes, despeço-me. Estou exausta, e meu corpo implora por
um banho quente e meu sofá cama cor-de-rosa. Saio com o pote de
Crème Brûlée nas mãos, eu sei, sou uma idiota mesmo! Fiz pra
ele, e ele vai comer.
Caminho distraída até o elevador e me assusto com Dominic
sentado na recepção.
— Estava te esperando Nadine — diz baixo, quase inaudível.
— Desculpe, estou tão cansada, e pela hora, achei que já
tivesse ido
— Hum, então o que ia fazer em meu escritório? — rebate
sarcástico, obrigando-me a revirar os olhos.
— Fiz isso pra você, não que você mereça, — ele ergue uma
sobrancelha contrariado com aquele maldito meio sorriso. — Não
aceito sua desfeita — completo irritada pela saia justa.
— Então você ia lá em cima me dizer isso?
— Sim e te entregar o doce — coloco o pote em suas mãos.
— Mesmo que não queira, você vai comer, preciso da sua opinião
crítica — dou de ombros dirigindo-me para saída.
— Ei, — ele me chama. — Desculpe por mais cedo, não
queria parecer ingrato ou insatisfeito, eu tinha alguns compromissos.
— Ele puxa minha mão com ternura e me acompanha até saída. —
Seus pratos estavam divinos, tenho certeza que a sobremesa
também estará.
— Foi só isso mesmo? — insisto sem acreditar em sua
desculpa esfarrapada.
— Foi sim — responde olhando para o pote em suas mãos —
Vamos, vou te levar em casa.
No caminho para casa, ligo o som e uma música suave
invade nossos ouvidos. A letra profunda me fez prestar atenção em
cada nota. Sentindo dentro do peito a dor de um amor avassalador e
cortante, apreciando o sofrimento na melodia traumática de amar
alguém tanto quanto a si mesmo.
— Tudo bem? — Dom pergunta absorto com minha emoção.
— Quem canta essa música?
— Louane Emera.
— E o nome da música?
— É Je Vais T’aimer.
[12]— responde enigmático.
— É tão linda… — sussurro, ainda prestando atenção na letra
que inundava minha alma como uma avalanche de sentimentos,
sentimentos esses que não saberia explicar.
A última nota soou, respiro fundo com uma sensação
estranha no peito, uma euforia de prazer por ter escutado uma
canção tão intensa, uma letra que desafia o coração a amar tanto
quanto se é capaz.
— Boa noite Dom, obrigada pela carona. Ah, não esqueça de
provar o doce, me ligue se for possível, quero saber o que achou.
— Pode deixar Princesa. — Ele assente quando desço do
carro em frente ao meu condomínio.
Destranco a porta ainda tocada pela letra da música, é uma
música qualquer, eu sei, mas na mansão eu não podia ouvir nada
além de orquestra, é difícil sonhar com um amor tão grandioso como
cantado nas músicas românticas, quando não te deixavam sonhar.
— Oi amiga, como foi o seu dia? — Vicenza me assusta.
— Oi Vi, foi bom, já marcamos a data do casamento, vai ser
dia 17, então anote na sua agenda, pois será minha madrinha.
— Sério? Tá falando sério? — replica eufórica.
— Claro que sim! Não tenho outras amigas — zombo e ela
joga uma almofada em minha direção. — Agora preciso de um bom
banho.
— Fiz o jantar, vamos comer primeiro? — ela grita da sala.
— Deixa eu adivinhar, lasanha congelada? — coloco a cara
na porta afirmando. Vicenza sabe se virar bem com congelados e
comida enlatada.
— Hoje é de bolonhesa — responde ela segurando uma
gargalhada.
Volto para a cozinha e juntas comemos sua lasanha à
bolonhesa, acompanhado de um vinho barato.
— E como estão as coisas com Diogo? — puxo assunto
estranhando seu jeito inquieto.
— Hoje tivemos uma pequena discussão.
— Porquê?
— Amiga eu sou piriguete — ela ri — Diogo quer namorar, ele
mal me conhece, só estamos juntos a alguns dias, eu hein! — dá de
ombros irritada pelo pedido de namoro.
— Gosta dele, não gosta? — instigo sabendo exatamente o
que se passa na cabeça dela. — Negação é o primeiro passo —
provoco atraindo um olhar furioso.
— Então dona Nadine, a senhorita está na mesma, não
pense que consegue enganar a mim e a si mesma, está tão
apaixonada pelo seu chefe, quanto eu pelo outro.
— Engano seu, meu acordo com ele é basicamente
profissional de todas formas possíveis, zero sentimentos, nada,
nadinha mesmo! — afirmo sem ter certeza do que estou dizendo.
— Pelo sonho que estava tendo, não posso acreditar nem um
pouquinho no que está me dizendo, amiga, vai, desabafa comigo,
me conta o que estava sonhando.
Coro imediatamente ao lembrar das cenas quentes que
protagonizei com Dominic, cenas essas que só de pensar em
reproduzir sinto um calor misturado com um formigamento no meio
das pernas. Viro todo o líquido da taça molhando minha boca seca.
— Conta logo, somos amigas — insiste empolgada.
— Sonhei que estávamos nos acariciando, foi um sonho
surreal, Vi, eu estava enlouquecida … — falo baixo e ela percebe a
vergonha em minha feição.
— Nadine, você é virgem? — deduz ao perceber meu
incomodo e falta de experiência.
— Sim, eu sou, mas não quero que conte isso a ninguém —
peço impactada pela coragem que tive de ter falado em voz alta.
— Tudo bem, é óbvio que não vou contar. Agora me diz,
como você consegue? Como conseguiu se controlar por todo esse
tempo?
— Fui criada com uma doutrina rígida, sexo somente após o
casamento, namoro somente como meu prometido e com
supervisão. Não tinha muito como fugir disso.
— Só beijou o seu prometido na vida?
— Não, — nego e lembro de Alec e meus pensamentos
divagam pra um momento feliz de minha vida. — Tive um romance
proibido com meu guarda real. Saíamos todas as tardes e
caminhávamos na praia — sorrio.
— Seu pai deixava….
— Claro que não! Escondida. Foi com ele o meu primeiro e
único beijo. Ah, até essa tarde quando Dom me deu um selinho.
— Ele o quê?
— Ele me beijou no hotel. Quando chegamos atraímos muito
atenção, fiquei em pânico com tantos olhares, e pra disfarçar ele me
beijou.
— Disfarçar, sei! Ele está tão apaixonado quanto você, a
diferença que sendo ele, é surpreendente.
— Porquê?
— Amiga, Dominic não é o tipo de homem romântico. Não
anda de mãos dadas com nenhuma mulher, em nenhum lugar. Ele
ficou com a Bella por cinco anos, nunca, desde quando eu comecei
a trabalhar no hotel, vi eles tão juntos como vejo vocês. Dominic
nunca olhou para ela, como olha pra você amiga, é diferente. Eu vi o
clima entre vocês hoje lá no restaurante.
— Você está imaginando coisas.
— Eles não almoçavam juntos, não saiam e nem chegavam
juntos, era até estranho, tendo em vista que trabalhavam no mesmo
lugar — completa me dando uma lista de argumentos pra encher a
minha cabeça de pensamentos impróprios.
— É estranho. Talvez seja só simpatia, a gente se dá bem
quando não estamos brigando, e querendo ou não vou ajudar ele
com o restaurante, ele não tem escolha a não ser me tratar bem.
— Sabia que me sinto naqueles filmes adolescentes, onde
uma das amigas é princesa, a outra é normal, no caso eu! Tem um
príncipe gato, um Rei malvado, um noivo babaca, e um cara normal
que se intromete na vida perfeita da princesa colocando a vida dela
de ponta cabeça por causa de um amor proibido.
— Bem-vinda a minha história — rimos.
— O seu prometido é bonito?
— Sim, muito bonito, mas não é o homem certo pra mim.
— Saquei, você gosta mais dos CEO’s estilo bad boy,
passado sombrio, coração fechado, entendi — faz menção aos
personagens dos meus livros.
— Muita literatura erótica — brinco recolhendo os pratos da
bancada.
Antes de entrar no banho, verifico meu celular, James
mandou uma mensagem confirmando a transferência no valor que
pedi. Esse é meu irmãozinho.
Imediatamente transfiro o valor para Dominic, quero que ele
resolva logo as questões do restaurante, assim quem sabe ele fica
menos ranzinza e bipolar.
Coloco a música que escutei no carro de Dominic no
Youtube. Simplesmente viciada, confesso.
Distraio a mente enquanto cantarolo a canção. Lavo o cabelo
e minha mente volta ao beijo que fez meu coração bater acelerado.
— Apaixonadinha da estrela, tem visita pra você! — Vicenza
bate na porta interrompendo minha cantoria.
— Quem? — Pergunto arrastando a cortina para fitá-la.
Sua feição maliciosa diz tudo.
O que ele quer aqui?
Capítulo17
Chego em casa meia hora depois de deixar Nadine em seu
apartamento. Coloco o pote de doce sobre a mesa e sigo para o
banho. Ligo o chuveiro tentando me desligar dos problemas. O
cheiro afrodisíaco e relaxante do sabonete me causa um
relaxamento instantâneo.
Caminho de um lado a outro encarando a garrafa de whisky
em cima do bar, a vontade de beber nem que fosse apenas um gole
está maçante demais, me sufocando, impedindo o ar de entrar
livremente em meus pulmões.
Ligo a televisão depois de pegar o pote de doce, e sorrio ao
ler o que dizia na embalagem:
“Para o meu futuro noivo ranzinza”.
Só ela mesmo pra me fazer rir em uma situação como essa.
Afundo a colher dentro do pote e levo a boca ansioso. Saboreio
aquela pequena quantidade de creme, fechando os olhos ao deleite
e o prazer que a mistura de sabores me causa. Fico impressionado
com o toque diferenciado que ela dá em pratos tão simples e
tradicionais.
O alerta do telefone toca, hesito em pegá-lo por alguns
instantes, aquele doce estava mesmo muito gostoso. Não resisto a
curiosidade e deslizo a tela abrindo a notificação do banco. Quase
caio para trás ao ver a mensagem.
Apressado coloco uma camisa, agarro as chaves do carro e
saio em disparada em direção a casa de Nadine. Durante o trajeto
minha cabeça não me deu um segundo de trégua. Uma mistura de
orgulho e ego me tomaram de uma forma horrível.
Estou me sentindo deplorável. O que eu estava pensando
quando aceitei fazer parte disso!? Onde estava com a cabeça ao
achar que guardaria meus princípios na gaveta enquanto enganava
uma jovem mulher para benefício próprio?
Porque isso é enganar, eu estou sendo o maior beneficiado
dessa história, não posso aceitar!
— Não quero ficar de vela, então estou saindo. Cuida bem
dela — orienta Vicenza depois de chamar Nadine no quarto.
Minutos depois ela aparece ainda de cabelos molhados,
vestindo uma blusa fina com estampa de flores, e um shorts curto
que deixou em evidência suas pernas cumpridas e torneadas. O
jeito que chacoalhava a toalha nos cabelos me fez esquecer o que
tinha ido fazer ali.
— Dom, o que faz aqui, está tudo bem? — pergunta
arregalando os olhos com curiosidade como sempre faz.
— Recebi a notificação do banco — hesito ao perceber que
ela encara minhas roupas. — Sai apressado — esclareço dando
uma olhada rápida no pijama com estampa do Piu-Piu.
— Percebi. — Sorri travessa segurando uma gargalhada alta.
— Comeu o doce?
— Comi, estava uma delícia, mas não é sobre isso que vim
falar, Nadine. — Mantenho firmeza em minha decisão.
— Vicenza saiu? — ela prolonga a conversa fugindo
totalmente do assunto.
— Dá pra você parar, eu preciso falar com você agora! —
elevo o tom de voz impaciente. Nadine aperta os olhos assustada,
eu tentei não parecer agressivo, mas acabei sendo. — Desculpa, eu
não queria ser grosseiro…
— Sei o que vai falar, e não quero ouvir. Preciso de você
Dominic, então não seja orgulhoso e aceite o dinheiro, pague as
dívidas e mantenha o caixa ativo, simples assim — ela demostra
clareza ao se impor contra minha vontade.
— € 500 milhões, ficou maluca? Tem noção de quanto
dinheiro você depositou na minha conta? — ando de um lado a
outro. Nervoso. Aflito. — A dívida do hotel chega perto de € 500 mil,
não posso aceitar mais do que o necessário.
Nadine me observa com atenção, pega um copo d’água e me
entrega, bebo todo o líquido sem nem pestanejar.
— Que tipo de pessoa eu sou? Que tipo de homem aceita se
casar com uma mulher como você por dinheiro…
— Porque uma mulher como eu? Sou do tipo que não atrai a
atenção de ninguém ao ponto de quererem se casar comigo? —
resmunga ofendida.
— Não é nada disso. Olha pra você Princesa, você é
perfeita… Qual homem perderia a chance de se casar com você?
— Você pelo jeito! — zomba em tom de humor seco.
— Você não merece ter seu primeiro casamento assim,
Nadine, eu estaria sendo muito canalha se pensasse só em mim, —
me aproximo dela — Sou cheio de falhas, todo problemático, nunca
fui um canalha, e não quero começar a ser um, justo com você.
— Dom…
Seguro em seu rosto fazendo-a calar.
— Temos que parar com isso enquanto ainda é tempo,
Princesa.
— NÃO! — ela grita segurando em minhas mãos — Se não
quer se casar comigo, tudo bem Dominic, longe de mim obrigar você
a fazer isso. Mas saiba que se não for você, será outro. Por uma
boa quantia em dinheiro vai aparecer dezenas de pretendentes.
Será que sou tão ruim como companhia que fere tanto o seu ego?
— vocifera arrogante, e eu entendo sua contestação, mas…
— Você enlouqueceu, só pode! Sabe que eu não deixaria
você nas mãos de qualquer um, sabe disso! — Coço a cabeça
alucinado com toda essa discussão.
— Porquê? — brada me olhando de cima, como se estivesse
me desafiando a vomitar tudo o que está entalado.
Hesito, sem desviar os olhos dos seus.
— Diga, porque não deixaria? É tão ruim assim aceitar ajuda
de alguém que te quer bem? É tão difícil ficar casado comigo por
alguns meses, e fingir que gosta pelo menos um pouquinho de
mim?
Continuo em silêncio ouvindo apenas minha respiração
irregular, brigando com minha razão, indo contra o que achei que é
certo.
— E então Dominic, é difícil deixar seu orgulho de macho alfa
de lado e reconhecer que eu posso e quero te ajudar. Fizemos um
acordo! Será que posso ter ao menos a sua palavra?
— E se eu não precisar mentir? — sussurro subindo meu
olhar até seus lábios, que naquele mesmo instante se entreabrem
sem voz.
— Como assim?
— Se não precisar mentir? Se não precisar fingir que gosto
de você? E se esse plano idiota machucar a gente, e …
Nadine me envolve em seus braços, e me abraça forte, tão
forte que pude por alguns instantes me afagar no perfume doce de
seus cabelos ainda úmidos. Perdi-me na sensação de tocar em sua
pele desnuda na minha, sentindo uma avalanche de sentimentos
bombardear minha cabeça.
Eu podia negar. Negar e negar pra mim mesmo em frente ao
meu reflexo no espelho, mas não ia adiantar. Nadine é como um
vírus devastador, um vírus voraz e lindo. Uma doença totalmente
contagiosa que consumiu cada parte do meu corpo tão rápido que
não percebi. Bastou alguns dias. Um olhar, um toque, um esbarrão e
pronto, estamos praticamente noivos, brigando por dinheiro e a
mudança repetida do status civil.
Engraçado ou não, é real, ela uma princesa fugitiva e eu um
CEO em decadência, literalmente. Apaixonado por cada defeito
perfeito que ela tenta esconder.
Durante cinco anos não senti 1 por cento pela Bella do que
Nadine me faz sentir. Ela está sendo como um divisor de águas,
trazendo encanto e alegria pra coisas que eu não via graça, como
comer uma sobremesa com um bilhete escrito à mão.
Coisas simples que me tiram do chão, que me deixam nas
nuvens pensando a cada instante na garota desajeitada que se
esbarrou em mim em uma tarde nublada.
Seus olhos encontraram os meus, minha mão sobe apoiando
delicadamente em sua nuca, a outra envolvendo a lateral de seu
rosto juntando nossas testas, podia sentir o hálito quente saindo de
sua boca.
Eu precisava daquilo. Precisa saber que ela é minha, só
minha… Não quero me sentir egoísta em querer tanto uma coisa
como eu a quero. Assumir que preciso de sua companhia, e de suas
manhãs falantes e alegres, e das suas palavras que me servem de
ancora pra não afundar em um abismo sem fim…
Desejo Nadine como um louco, não só pela novidade, não só
por sua ingenuidade que me atrai loucamente, ou a paixão inicial
que muitas das vezes vem acompanhado do sexo de
reconhecimento, eu queria mais, queria tudo…
Não resisto ao desejo, a vontade de sentir seus lábios nos
meus, e me deixo levar pelo momento de angústia e egoísmo. Eu
sei que ela não é como as outras, sei que com ela as coisas não
vão acontecer como eu estou acostumado.
Mesmo assim deixei que nossos lábios se tocassem.
Devagar. Aclamatório, seduzindo e sugando todo o meu ser para um
mundo novo. Um mundo onde existe uma princesa durona chamada
Nadine.
Minha língua pede passagem explorando sua boca, seus
lábios macios tocam os meus com carinho e urgente. Suas mãos
seguram firme minha cintura, deixando as minhas livre para aninhar
seu rosto.
— Dom… — Sua voz se perde em um sussurro entre um
beijo e outro.
— Não fala nada, só me deixa sentir você, deixa eu te beijar
de novo — peço em sôfrego encurralando seu corpo contra a
parede.
Seu cheiro inebria meus sentidos, hipnotizando minha razão.
Seu corpo colado ao meu. Beijos molhados cheio de desejo.
Paixão. Deslizo por seu pescoço, ouço um gemido no pé do ouvido,
suas mãos acariciam minhas costas, exploram meus ombros e
braços em uma regata folgada.
— Nadine, eu te quero. Te quero muito… — murmuro
afagando o nariz em sua pele. Duro. Tão duro que doí.
— Dominic, para, por favor — suplica ofegosa sem me
afastar.
Seus olhos fechados indicam que está gostando da minha
aproximação. Continuo a beijar sua boca. Mordo seu lábio inferior, e
encaro seus olhos que se abrem lentamente, dilatados, atentos, e
então percebo que além de excitada, está nervosa.
— Quer que eu pare? — pergunto resistindo em me afastar,
ela concorda com a cabeça, fecho os olhos arrependido por ter ido
longe demais, e nesse momento a porta se abre e Vicenza aparece
com Diogo.
— Dom, o que faz aqui vestido assim? — zomba Diogo me
encarando de cima a abaixo.
— Vim conversar com a Nadine, e você? — retruco
enciumado por saber que ele ia ficar e eu não.
— Fizemos as pazes.
Vicenza olha pra Nadine e nota que alguma coisa aconteceu,
e então as duas vão para o quarto.
— Atrapalhamos? — pergunta Diogo cortando o silêncio
constrangedor.
— Não, estávamos só conversando.
— Vicenza insistiu pra gente vir pra cá…
— Tudo bem, não tem problema.
Nadine volta do quarto com outra roupa, ela não me olha nos
olhos, e ao ver sua bolsa na mão deduzo que vai comigo.
— Boa noite pessoal, bom divertimento pra vocês — desejo
forçando um sorriso simpático.
— Tem problema se eu ficar lá no hotel, no seu quarto?
— Não, não tem, mas vamos pra minha casa, não vou te
deixar lá sozinha — rebato sem dar a ela chance de recusar.
Nadine se manteve em silêncio durante todo o caminho, sua
atenção voltada para o movimento que distorcia com intensidade da
velocidade pela janela do carro. Queria conversar, saber se estava
tudo bem, mas eu não sabia o que dizer. As palavras simplesmente
se embolaram na minha boca.
— Vou arrumar o quarto de hóspedes pra você dormir —
informo assim que chegamos em casa.
Depois de deixar alguns lençóis e cobertores sobre a cama,
Nadine me assusta ao encostar na soleira da porta.
— Nadine, eu…
— Não quero conversar sobre isso agora, está bem! —
assinto — Nada mudou, nosso acordo continua do mesmo jeito.
Pague as dívidas e coloque o resto pra giro de caixa e eventuais
problemas. Quero que fique tranquilo para que possa me ajudar. O
Rei não é bobo, preciso de você focado.
— Tudo bem, como quiser — aceito por fim sem diminuir
minha vergonha. Não posso deixá-la na mão, e não sou hipócrita,
preciso desse dinheiro pra manter a qualidade e a fama que batalhei
pra conquistar.
Deixo-a à vontade e saio do quarto querendo ficar. Resisto a
vontade de sentir seu cheiro mais uma vez…
“Não. Não… não vai, pai não me deixa, por favor, não me
deixa sozinho…”
— Dom, acorda, você está tendo um pesadelo. Dom… — Sua
voz invade meu subconsciente trazendo calma para aquele
momento perturbador.
— Não, ah, ah, não vai…
— Dom, tá tudo bem, é só um pesadelo.
Abro os olhos devagar e a primeira coisa que vejo são seus
lindos olhos grandes e amendoados. Meu coração se acalma ao
saber que ela está ali.
Meu porto seguro está ali, pronta pra me dar a mão e me tirar
da beira daquele enorme penhasco.
Capítulo 18
Vicenza me arrasta para o quarto depois de nos pegar em um
momento constrangedor. Meu coração ainda batia acelerado.
— O que estava acontecendo lá na sala? — Vicenza
pergunta curiosa e cheia de malicia na entonação.
— Nada!
— Conta outra vai, Nadine, sua cara não nega que estavam
se pegando — afirma rindo da situação.
— Ele me beijou, as coisas… ficaram quentes e … E eu
paralisei.
— Como assim? Ah, claro, você é virgem, é normal ficar
nervosa amiga, mas se quer que aconteça… — nego bruscamente
— É só deixar fluir.
— Não posso! Isso está além dos princípios que papai me
ensinou.
— Nadine, vou ser bem sincera com você, porque sou sua
amiga — ela senta ao meu lado na cama. — Você fugiu. Largou seu
noivo prometido. Deixou seu pai preocupado. Continua fugindo e
agora está prestes a casar com um homem que mal conhece pra
enganar o rei, que é o seu pai. Isso está incluso nos seus
princípios? — ironiza listando minhas loucuras na ponta dos dedos e
sendo sincera, por mais que doa ouvir a verdade, ela tem razão.
— Eu sei, é hipocrisia, mas eu não posso, a gente mal se
conhece e além de tudo isso, sonho em me entregar para o meu
marido, um de verdade.
— Só acho que isso é uma baboseira antiga, tem que se
entregar para um homem que você ame e confie. Tempos moderno
amiga. Temos o direito de escolher como, quando e com quem
perder a nossa virgindade. — Levanta a bandeira feminista em
pensamento. — Agora eu preciso de um favorzinho. — Ela balança
as sobrancelhas de um jeito engraçado.
— Já sei, vai me expulsar de novo, né!?!
— Amiga o apartamento dele está em reforma por causa de
um vazamento e sua amiga está precisando muito de um final de
semana de muito sexo — sorri maliciosa pegando minha bolsa no
armário. — Você tem um noivo que tem um quarto de hotel, ele não
vai te negar.
— Tudo bem dona Vicenza, aproveite muito bem o nosso
apartamento. — Sorrio cúmplice pegando algumas peças de roupa.
— Aproveite pra conhecer mais o seu noivo, e amiga… — ela
chama minha atenção para encará-la. — Desencana, você merece
aproveitar as coisas boas da vida. — Ela rebola insinuando sexo.
— Conselho anotado sua depravada. — Rimos.
Dominic não me deixou ir para o hotel, insistiu para que eu
ficasse em seu apartamento. Naquele momento eu não sabia o que
fazer, sentia-me acuada, envergonhada pelo que fizemos.
Dom é um homem mais velho, experiente, sabe o que fazer
pra me instigar, não sei quanto tempo mais eu consigo resistir.
As palavras de Vicenza, os ensinamentos do papai e o beijo,
não saiam da minha cabeça. A sensação do toque de seus lábios
não queria se afastar. Estou em êxtase. Ansiando por mais daquela
dose maravilhosa de adrenalina.
Nunca tinha me sentido tão enlouquecida como me senti com
aquele beijo.
Suas mãos segurando em minha cintura… o arrepio na
espinha, o acelerar do coração que por pouco não saiu pela boca.
As pernas bambas. Olhos fechados. Lábios entreabertos e
vulneráveis aos seus.
Não conseguia tirar aquele olhar fogoso da mente, uma
mistura eletrizante de luxúria e romantismo. E, só de pensar no que
poderia ter acontecido se não tivéssemos sidos interrompidos faz
meu corpo reagir positivamente aos meus delírios voluptuosos.
Não pensei que seria capaz de desejar realizar tais
pensamentos.
Pelo menos não com um homem real de carne e osso.
Imaginar os personagens dos livros e a cenas que eles
protagonizavam já estava de bom tamanho pra mim.
Deito na cama macia do quarto de hóspedes e encaro o teto
com atenção. A claridade da lua entra avassalante pela brecha da
janela entreaberta. Não resisto em levantar e caminho na escuridão
até a sacada da sala.
Vislumbro o silêncio da noite acompanhada da esplendorosa
lua cheia. O céu está límpido. As folhas emitem uma bela melodia
sendo tocadas pelo vento sonoro.
É tão bom poder não escutar nada e tudo ao mesmo tempo…
Enquanto tento tirar da cabeça minhas últimas ações, escuto
Dominic gritar. Corro descalça pelo corredor escuro e entro em seu
quarto. Ele está encolhido em posição fetal. Sua testa molhada do
suor excessivo e ainda geme com uma dor dilacerante na alma.
Chamo seu nome suavemente, não quero assustá-lo,
chacoalho seu braço e mesmo assim seu pesadelo insiste em
atormentá-lo. Encosto a boca em seu ouvido e com a voz melosa e
baixa tento acordá-lo mais uma vez. Seus olhos encontram os
meus, sua respiração aos poucos vai suavizando deixando-o mais
calmo.
— Você está bem? — pergunto.
— Obrigado — ele se limita em agradecer.
— Dom, conversar sobre esses sonhos pode ajudar…
— Não quero falar sobre… — pede ressabiado, evitando me
olhar nos olhos.
— Tá bom, vou pegar água pra você — Levanto e ele segura
minha mão com força, sua palma está quente e úmida, não me
importo.
— Fica aqui, por favor — suplica com aquele mesmo olhar,
aquele olhar que me conquistou inconscientemente. Aquele olhar
que pede socorro, que implora por ajuda, por um colo, carinho… —
Não vai ser a primeira vez que dormimos na mesma cama — ele
acrescenta lembrando da primeira noite que estivemos juntos.
Aconchego-me ao seu lado na cama, tremendo, com medo
de não conseguir resistir a ele, ao desejo …
Estática feito uma múmia, mantenho distância, ele ri me
olhando de rabo de olho.
— Relaxa Nadine, não vou fazer nada que não queira —
brinca sem senso de humor.
Dominic abre os braços e espera ansioso eu me ajeitar entre
eles, sem pensar, deito em seu peito sendo aninhada por seu calor.
Consigo escutar as batidas do seu coração, forte e rápido. Sua mão
desliza por minhas costas, até chegar nos meus fios soltos do meu
cabelo, fecho os olhos ao sentir seu cafune gostoso.
Seguro sua mão e acaricio os nós de seus dedos, e ao
perceber uma marca familiar, levanto a cabeça incrédula.
Ele ri.
— Dominic, você…
— Sou!
— Não pode ser… eu sabia que já tinha te visto em algum
lugar, mas…
— Coincidência, não!? — Ele não parecia surpreso, já sabia
que eu era a mulher atrapalhada que o atropelou no aeroporto.
— Que vergonha, como eu não me lembrei… Porque não
falou nada?
— Você estava assimilando tudo, não queria que ficasse sem
jeito por conta disso.
Ele me incentiva a voltar para seu peito. Deito sem acreditar
no destino, alisando a cicatriz que deixei em sua mão.
O sono começa a pesar meus olhos, mas sou despertada
com sua voz baixa, tão baixa e sussurrante como um gemido
inexprimível.
— Meus medos mais profundos me assombram através dos
pesadelos, Princesa, pra uns pode até parecer besteira, mas só
quem sente, só quem passa por isso sabe o quão difícil é se livrar
dos fantasmas do passado. Meu pai era um homem bom,
trabalhador, honesto, de família. Um homem admirado por todos.
Ainda não entendo porque ele desistiu, porque não foi forte por mim,
porque se deixou levar por um vício idiota… e ela, ela simplesmente
deu as costas pra ele, me levou pra longe e não pude estar com ele
em seus últimos momentos. Meu pai morreu sozinho… Não tinha
ninguém pra segurar em sua mão. Ninguém pra dizer que ia ficar
tudo bem…
Ouço-o fungar, está chorando, não me mexo, fico imóvel
apenas escutando seu desabafo doloroso.
— A culpa por não ter ficado, por não ter batido o pé e ficado
com ele me corrói todos os dias. E vê-la tão bem, feliz, me
incomoda. Egoísmo? Pode ser! Mas a atitude dela me deixou com
um enorme vazio no meu peito por indiferença. Um ponto de
interrogação por não entender o porquê que as coisas aconteceram
dessa forma — suspira aliviado. — É princesa, você tinha razão,
falar sobre isso me deixou mais tranquilo. Quem sabe um dia eu fale
com você estando acordada, aposto que terá uma boa solução pra
esse coração defeituoso — brinca e posso imaginar um sorriso
descontraído.
Continuo imóvel, penso em reagir e mostrar que ouvi com
atenção a sua dor, e que simpatizo com ela, mas não me mexo.
Dom apoia sua cabeça na minha e adormece.
Desperto com a claridade do sol que entra pela brecha da
janela impedindo meus olhos de se abrirem rapidamente. Viro para
o lado e analiso Dominic ainda dormindo, parece um anjo. Seu
maxilar quadrado e barba loura o deixam tão sensual. Pele clara, e
algumas marcas de expressão na testa, aposto que é de tanto
franzi-la quando está nervoso ou estressado, resumindo, quase todo
o tempo.
Cabelo ralo, nariz pontudo, lábios rosados e incrivelmente
gostosos, — suspiro sentindo um frenesi bem no centro da minha
barriga. Seu braço está sobre o cobertor fino, a luz do sol
reverberando luz sobre ele, contrastando com seus pelos aloirados.
Dom não é musculoso, mas tem o corpo bem definido, braços
grandes e rasgados que fazem minha boca secar de um jeito
surpreendente.
Ele se mexe e me assusto, e então percebo que não devo
explorar seu corpo viril dessa maneira. Levanto devagar e corro
para o outro quarto, e sem demora entro debaixo do chuveiro quase
frio.
É ótimo pra baixar esse fogo que consome meu corpo.
Por isso que dizem: pessoas apaixonadas não pensam
direito. E não pensam mesmo! Não sabia que era assim tão
consumidor e perturbador querer tanto algo proibido, bom, eu sabia
que queria sair da mansão, mas no que se refere a homens nunca
tinha passado por isso, e confesso que apesar de saber que é
errado, estou totalmente instigada a fazer o que não devia.
Nadine… Nadine! — a voz de papai soa em minha mente
despertando-me dessa maldita hipnose chamada Dominic Levy.
Saio do banho mais calma, e ao abrir a porta tomo um susto
daqueles. Dominic está sentado em minha cama encarando as
mãos a sua frente. O susto foi tão grande que sem querer soltei a
toalha deixando-o boquiaberto ao vislumbrar meu corpo nu.
Por alguns instantes sinto-me paralisada tentando cobrir
minhas partes íntimas, ele percebe meu constrangimento, mas não
liga. Levanta e olhando-me nos olhos, com aquele sorrisinho meia
boca, bem cafajeste, abaixa a minha frente e recolhe a toalha do
chão e me entrega.
— Sabia que portas são feitas para serem batidas antes de
entrar? — Enrolo-me na toalha angustiada.
— Desculpa, não queria ser invasivo, vou sair pra você se
trocar.
Ele bate os calcanhares em direção a porta e antes de sair
olha para trás.
— Mas que você é gostosa pra caralho, não posso negar! —
elogia cheio de malicia e seu comentário me faz jogar o travesseiro
em sua direção.
Só pode estar de brincadeira!
— Não demore, vamos comprar as alianças hoje — grita do
corredor fazendo-me revirar os olhos.
Capítulo 19
Ter Nadine em meus braços, outra vez, foi assombroso. Sentime acolhido e seu cheiro tem me viciado de uma forma
descontrolada. Só consigo desejar ter essa mesma sensação todas
as noites.
Meus olhos buscam constantemente por ela… Porra! Eu estou
mesmo apaixonado.
Ainda mais depois daquele beijo… Ah… Aquele beijo foi
diferente de todos os que já experimentei em toda a minha vida,
foi… quente, inocente, carinhoso. Foi como se estivesse tocando em
um tesouro precioso.
Eu simplesmente amei sentir seus lábios.
É loucura, eu sei. Temos um acordo. Um contrato de
casamento que não inclui nada disso, mas foi inevitável.
Incontrolável resistir aos seus lábios bem ali na minha frente,
pedindo para serem tocados.
E agora, pensando bem, entendo que foi uma péssima ideia.
Não posso me deixar envolver. Nadine é uma moça inocente apesar
de sua força. Não está acostumada com a maldade de homens
como eu. Homens que na maioria das vezes só pensam com a
cabeça de baixo.
Não quero ser esse homem. Não pra ela. Quero ajudá-la de
todo o meu coração, não só porque ela salvou minha empresa, mas
porque quero que ela conquiste o mundo a sua volta.
Quero que Nadine realize todos os seus sonhos. Que viva no
mundo colorido que somente ela enxerga, mesmo sabendo que não
é toda essa beleza. Quero proporcionar a Nadine liberdade e poder
de escolha.
Por algum motivo nossos caminhos se uniram. Por algum
motivo ela faz eu querer me libertar desse passado sombrio onde
me enterrei por anos. Ela faz eu querer respirar. Ela é meu destino.
Acordo procurando seu cheiro na cama, mas encontro
somente o vazio. Cogito ter sonhado. Me desespero. Imediatamente
vou até o quarto de hóspedes e ouço o barulho do chuveiro, me
tranquilizo e espero, não deveria, mas meus pés fincam no chão, e
ali enraízo.
Seu corpo nu bem exposto a minha frente, ainda úmido pelas
gotas que escorriam de seu cabelo, foi um martírio. Uma visão
extraordinária que jamais serei capaz de esquecer e entender. Por
que se fosse qualquer outra mulher, outra ocasião, não sairia
daquele quarto enquanto não saciasse minha sede.
De pau duro volto para o quarto. Não me faço de rogado em
correr para um banho frio. Inevitável não aliviar o tesão pensando
naquela imagem que ficou gravada em minha mente. Enquanto
punheto meu pau rígido embaixo da água fria, lembrando com
riqueza de detalhes as sensações do nosso beijo. O mesmo beijo
que estou louco pra sentir outra vez…
Minha mente percorre por seu corpo levemente bronzeado,
seios pequenos. Posso imaginar como eles caberiam perfeitamente
na palma da mão. Pele macia como veludo… Ah… Posso sentir suas
pernas tremerem só de imaginar meus dedos acariciando sua fenda
úmida e inocente. Deslizando suavemente, sentindo-a ficar pronta
pra mim. Totalmente molhada. Não consigo conter a vontade de
penetrá-la, apertada, latejando em volta de meus dedos, implorando
pra sentir meu pau em toda a sua extensão…
Ahh… Puta que pariu. — Gozo sentindo o prazer percorrer por
todo o meu corpo só de imaginar.
Encontro Nadine na cozinha. Está fazendo café, o cheiro
maravilhoso do grão fresco se alastrando por toda a parte. Sinto-me
envergonhado por saber que acabei de me masturbar pensando
nela. Mas não dou bola.
Seu olhar me fuzila. Também pudera, onde eu estava com a
cabeça, ficar lá em seu quarto igual uma estátua. Maníaco!
— Café? — pergunta quebrando o silêncio agonizante.
— Quero! — me aproximo da bancada de mármore. —
Nadine, desculpa, não tive a intenção de…
— Tudo bem! Não precisamos falar sobre isso — corta o
assunto de imediato. — Toma logo o café, assim podemos resolver
isso de uma vez por todas. — Acrescenta fria, arregalo os olhos
assustado. Será que ficou tão chateada assim?
No carro não conversamos. Quando fiz menção em dizer
algo, ela aumentou o som quase que no último volume.
Entendi Princesa, entendi!
Estaciono em frente a joalheria. Ao descer Nadine me
repreende:
— Nada de extravagâncias. Uma coisa simples somente pra
manter nossa farsa.
— Tudo bem! — respondo chateado. Bem feito. Fantasiei
uma história de conto de fadas e caí do cavalo. Pensei que estava
rolando um clima, algo diferente, mas já entendi que foi só um
momento.
— Que tal essa? — ela aponta para uma aliança simples com
uma pedra pequena, porém brilhante e delicada tanto quanto ela.
— Tanto faz! — respondo frustrado por meus pensamentos.
O atendente que nos observa estranha nossa distancia, talvez
estivesse faltando paixão pra quem vai se casar.
— Vamos levar aquela — Nadine pede ao atendente outra,
completamente diferente da qual seus olhos brilharam. Finjo não me
importar. Eu não queria me importar com isso.
De volta ao carro, Nadine pede para que eu a deixe no
restaurante, não me oponho.
Subo para o escritório e aproveito para organizar os
pagamentos das dívidas. Enquanto alimento a planilha, preencho
um sorriso satisfeito nos lábios, estou feliz, contente por saber que
não terei que fechar ou abandonar o legado de meu pai. Não terei
que mandar ninguém embora. Ou baixar a qualidade dos serviços
que prestamos.
Não percebo a hora passar, quando olho no relógio na tela do
computador, desligo tudo e vou de encontro a Nadine no
restaurante.
Observo de longe seu cuidado e prazer de estar onde sempre
sonhou. Quando o último garçom se despede me aproximo em
silêncio.
— Que susto Dominic! — ela dá um pulo quando me vê
encostado no batente da porta.
— Já está tarde, vamos?
— Não. Pode ir. Vou ficar por aqui, depois chamo um táxi.
— Porquê? — me aproximo sem desviar meu olhar do dela.
— Porque ainda estou ocupada, e não quero te atrapalhar…
— Acabei de pagar as contas do restaurante. Obrigado
Nadine, por estar me ajudando, serei eternamente grato por você,
por sua generosidade — agradeço sincero, um pouco sem jeito.
— Não me agradeça. Fizemos um trato e eu cumpri minha
parte — diz experimentando um pouco do caldo que fervia na
panela.
— O que é isso? — pergunto disfarçando meu desconforto
por ela estar sendo tão fria e indiferente. Tudo bem que mais cedo
fiz a mesma coisa, mas estou tentando ser maleável e gentil, mas
ela não dá uma trégua.
— Estou testando novos pratos. Terei uma prova importante
na faculdade, preciso de um cardápio diferenciado. E se der certo
também posso incluir algumas receitas suecas aqui quando tiver
oportunidade.
— Posso? — ela assente e leva a colher até a minha boca.
— Hum, isso tá muito bom, agridoce — comento gesticulando
positivamente o gosto agradável do molho.
— É um molho especial sueco com doce de mulberry.
— Está uma delícia… — Antes mesmo de eu terminar de falar
ela coloca outra colherada em minha boca, derrubando um pouco
de molho em minha camisa branca.
— Aí, desculpa Dominic, foi sem querer, — ela corre pra
pegar o pano em cima da bancada, e ao esfregar suja ainda mais.
— Sempre desajeitada… — resmunga envergonhada. Acho fofo.
— Tudo bem, não tem problema, é só uma mancha…
— Tira, eu vou passar um pouco de detergente pra não
manchar.
— Tenho outra camisa lá em cima, não precisa…
E antes mesmo que eu pudesse questionar, Nadine
desabotoa os primeiros botões. Creio que não percebeu o quanto
isso pode ser embaraçoso pra nós dois. Quando analisa meu dorso
nu, ela para quase que instantaneamente. Seu olhar sobe de
encontro ao meu lentamente, deixando o ar tenso e sensual.
— Acho melhor você pegar a outra camisa mesmo, não sei
lavar esse tipo de tecido, pode piorar, e …
Acho graça em sua desculpa. Fitando seus olhos desabotoo
o resto dos botões em sua frente. Seu olhar escurece e suas pupilas
dilatam em desejo mirando meu corpo.
Nadine pode não ser experiente, mas não é boba e sabe
exatamente o que quer, pode não assumir, mas ela me quer, tanto
quanto eu a quero.
— O que está fazendo — censura desviando o olhar para a
panela.
— Tirando a blusa como você pediu.
— Agora estou pedindo pra você colocar novamente! —
replica nervosa fingindo não prestar atenção no meu tanquinho.
— Porquê? — indago buscando seu olhar, mas ela
desvencilha. E mais uma vez estou perdido na hipnose que essa
mulher tem sobre mim. Esquecendo que horas atrás decidi me
afastar, manter esse contrato, apenas como um maldito contrato.
— Tá! Me dá logo essa camisa — esbraveja controlando-se
ao máximo. Tiro a camisa sob seu olhar especulativo, vejo o
nervosismo na secura de seus lábios.
Nadine puxa a camisa de minhas mãos e segue até o
banheiro, não hesito em ir atrás dela. Em silêncio ouço seus
múrmuros em sueco. Aprecio seus lábios enrijecidos e a tensão que
carrega em seus ombros. E apesar de não entender uma palavra
sequer, aposto que está dizendo o quanto queria me sentir de novo.
Aposto!
Caminho mansamente até ficar atrás dela, observando sua
tensão pelo reflexo do espelho. Nadine está tão absorvida em suas
contestações que não percebe minha aproximação. Encaro-a até
que seus olhos encontrem os meus.
— O que está fazendo? — questiona depois de engoli em
seco. Sem dizer nada, encosto meu corpo ao seu, fazendo-a
bambear com o toque frio do meu corpo. Seus olhos se apertam
como se estivesse obrigando a razão a concordar com a loucura
que ânsia em fazer.
— Conseguiu tirar a mancha? — Encosto ainda mais o meu
corpo ao dela, sussurrando em seu ouvido. Quero que ela sinta
como me deixa enlouquecido.
Exijo seu olhar. Não penso em mais nada e jogo ao vento
minha coerência e cavalheirismo.
Seu desejo se aperta na garganta e posso ver nitidamente o
que quer.
— Tá… Tá… Tá saindo, mas não precisa ficar em cima de
mim desse jeito — Tenta se afastar, mas impeço colocando um
braço de cada lado da pia. Encurralando-a e obrigando-a a me olhar
nos olhos.
— Seja sincera princesa. O que está rolando entre a gente?
— sussurro a centímetros de distância de seu rosto, deixando-a
desconfortável por estar tão próximo a mim sem camisa. — O que
foi? Nunca esteve tão perto de um homem assim? — acrescento
cafajeste.
— Para de ser escroto, Dominic. E não está acontecendo
nada! Foi só um beijo, que não devia nem ter acontecido. Somos
amigos e temos um trato. Contente-se com isso.
— E se eu não conseguir me contentar?
Capítulo 20
Sentir Dominic respirando no mesmo espaço que eu, está me
deixando em um desatino terrível. Como ele ousa me provocar
dessa maneira?
Seu perfume inebriando meus sentidos. Sua pele macia
encostando-se a minha, causando arrepios em lugares que eu não
estou sabendo controlar.
Ele é homem. Óbvio! E talvez a palavra casamento, mesmo
que de mentirinha, tenha causado algum tipo de transe. Deixando-o
ansioso pra tentar me levar pra cama, mas isso não vai acontecer,
não mesmo!
Tento me desvencilhar de seus braços, impossível. Um
homem daquele tamanho, mas parecia um armário perto de mim.
— E se eu não me contentar? — sua voz sussurrante entra
em meus ouvidos como um alerta de perigo. Dominic Levy era um
perigo pra mim, para o meu corpo e todos os meus sentidos.
Sem falar na minha reputação. Ainda sou uma princesa. Não
qualquer uma.
— Vai ter que arrumar um jeito. Não confunda as coisas —
falo deixando claro meu posicionamento, mas Dominic parece não
ouvir nada do que eu disse.
Com um impulso abrupto me pega pela cintura e me coloca
em cima da pia, encaixando-se entre minhas pernas, segurando
firme em minha nuca.
Sinto minha alma abandonar meu corpo naquele momento,
pra depois não dizer que teve alguma coisa a ver com isso.
Com as pontas dos dedos ele acaricia meu rosto com ternura
e carinho. Seu olhar penetra o meu e brilha ao me olhar como se eu
fosse sua salvadora, seu porto seguro.
Tento falar, mas a voz simplesmente não sai. Tento sair dali, e
meu corpo não me obedece. Continuo no mesmo lugar. Vulnerável…
Disponível para sentir o toque de suas mãos, e saciar o desejo de
sentir seu corpo colado ao meu.
— Dominic… — sopro sem forças para fugir.
— Shiii — Ele coloca o polegar sobre meus lábios, impedindo
que eu estrague o momento.
Seu olhar me contempla com atenção, como se estivesse
gravando meus detalhes em sua mente. E ali, debaixo de sua
atenção expressiva de puro desejo e romantismo, entrego-me.
Deixo a tensão me abandonar e dou as costas pra razão, mesmo
sabendo que vou me arrepender por isso. Absolutamente.
Seu cheiro me devasta, e seu hálito mentolado me chama pra
mais perto.
Tento não olhar, mas encaro seu abdômen com lascívia, ele
percebe.
— Quer passar a mão — pergunta cheio de tesão.
Nego com um gesto rápido e nervoso.
Sua mão pega na minha e a coloca sobre seu peito, posso
sentir o bater acelerado de seu coração. Ele também está nervoso.
Respiro ofegante, com a mão ainda parada no mesmo lugar.
Dominic me lança um olhar devasso, com aquele meio
sorriso que me entorpece. Sinto bem lá no meio das minhas pernas
minha vagina latejar. De novo esse alvoroço incontrolável aqui
embaixo.
Um calor escaldante sobe fervorosamente por todo o meu
corpo. Não estou mais aguentando esse clima embriagador. Sua
mão guia a minha para o outro lado do seu peito deslizando para o
abdômen, sinto as ondulações de sua barriga perfeita moldurada
pelos exercícios físicos.
— Você gosta assim? — pergunta imoral com uma
sensualidade fora do normal.
Limito-me ao silêncio. Melhor não dizer nada enquanto estou
enfeitiçada pelo santo das calcinhas molhadas. E que os deuses
das viciadas em livros hot, me livre desse devaneio.
Isso que dá idealizar um avatar e encontrar um bem na sua
frente: Gostoso e cheio de atitude, capaz de te levar a loucura com
apenas um olhar penetrante, um meio sorriso safado e 1,80
estonteantemente desconcertante.
Subo meu olhar lentamente procurando pelo seu.
Dominic está pronto…
Pronto pra me levar ao paraíso, ao mundo obsceno dos
amantes aventureiros…
Sua língua umedece os lábios, inclinando minha atenção
para encarar sua boca rosada e apetitosa.
E nessa fração de segundos uma corrente eletrizante de
desejo e frenesi toma meu corpo fazendo-me perder a compostura.
Apoio a outra mão em sua nuca trazendo-o para perto de
mim unindo nossos lábios com delicadeza, sentindo o gosto de
menta, o mesmo gosto que me faz ficar totalmente excitada, capaz
de me fazer esquecer de tudo…
Quem eu sou. Quem ele é! E o que temos…
Um contrato para minha liberdade.
Seu beijo me entorpece, e sua pegada firme em minha
cintura me deixa em alerta.
Sinto seu membro rígido dar volume dentro da calça social. A
inquietação me consome, tento me soltar de seu beijo, mas seus
braços me envolvem em um abraço apertado.
— Não foge de mim, princesa, não foge… — pede vacilante
deixando sua vulnerabilidade dominar, mostrando o verdadeiro
Dominic. O homem sensível, carinhoso e traumatizado, o homem
todo imperfeito como um brinquedo quebrado, pronto para ser
consertado.
— Não podemos fazer isso. Não posso… — rebato
segurando em suas bochechas.
— Por favor… — pede baixando o olhar. — Preciso de você.
Não sei explicar, mas preciso de você, dos seus beijos…
— Não precisa. Não desse jeito. Estou aqui e sempre vou
estar, mas não desse jeito. — Ele me olha aflito. — Dom, não vai ser
bom pra nenhum de nós dois. — Selo um beijo em sua bochecha e
desço de cima da pia, ele não impede. — Melhor pegar sua outra
camisa, essa ficou toda molhada — informo apontando para a blusa
que foi parar dentro da cuba.
— Nadine, eu…
— Não precisa dizer nada, só vamos esquecer que isso
aconteceu.
Depois do “incidente” do banheiro, evito ao máximo ficar a
sós com ele, e parece que ele também. Foco meu tempo no
restaurante e no cardápio que preciso elaborar. Não quero que nada
atrapalhe meus estudos e os meus sonhos.
Faz uma semana que o Chef Antonie foi embora e agora a
responsabilidade de comandar esse lugar é minha, com a
supervisão do Chef Bastien. Mesmo assim estou empolgada com
esse desafio.
Nada pode dar errado.
Vicenza não tem me dado um minuto de paz com a ideia que
Dominic e eu estamos apaixonados.
Agora tesão mudou de nome — murmuro irritada.
Até brigamos por causa dessa ideia descabida, não quero
ficar falando sobre isso.
Não estou apaixonada, e ele muito menos. Só estamos
carentes, e confusos, e aconteceu. Só isso. Acabou!
— Oi — ele diz sério encostado na porta da cozinha.
— Oi Dom, tudo bem? — pergunto sem encará-lo.
— Está pronta?
— Vou demorar um pouco. Se quiser pode ir, depois chamo
um táxi.
— Negativo. Vou esperar você! — Ele entra e se senta em
uma das mesas. Mexe no celular enquanto termino de arrumar a
bancada. Estamos sem jeito desde o último beijo. Sem assunto,
mas ele continua sendo cavalheiro, me traz para o trabalho todos os
dias, depois me leva para faculdade e depois para casa. Não sei se
ele faz isso para manter a farsa, ou sei lá. Não. Talvez seja só para
manter a farsa mesmo.
Vou ao seu encontro carregando uma bandeja com Boeuf
bourguignon, que fiz no almoço e como uma verdadeira boba fiquei
esperando-o descer para comer, mas ele simplesmente ignorou
minha mensagem.
— Onde vai com isso? — pergunta surpreso.
— Preciso saber o que acha. Bastien gostou muito, mas
estava esperando você me dizer.
— Minha opinião é tão importante assim? — questiona frio e
soa grosseiro.
— Pra mim, sim!
— É só um picadinho de carne bovina cozido em vinho,
cebola, bacon e cogumelos — ele dá de ombros desdenhando do
prato simples.
— Será que você pode comer e me dizer o que acha?
Ele assente.
Dominic come algumas garfadas, o silêncio é um martírio.
— E então?
— Está divino como sempre, Nadine.
Sorrio satisfeita e o contagio com minha empolgação. Ele
sorri e me sinto mais tranquila por saber que ele ainda gosta de
mim, pelo menos um pouquinho.
Dom levanta e me acompanha até a cozinha, ergue as
mangas da camisa e começa a lavar a louça, estranho, mas o deixo
lavar. Enquanto ele lava, seco a louça guardando-as no lugar.
Nossos olhares se encontrando cada vez que nos encostávamos
sem querer.
— Estou orgulhoso de você, está evoluindo muito — elogia
sem desviar atenção da pia.
— Obrigada Dom. Estou dando o meu melhor.
— Não espero menos que isso. Você é perfeita…
Olhamo-nos intensamente. Seus olhos brilham e sua boa se
contrai, ele tinha mais a dizer, mas se conteve.
— Amanha esteja pronta as 20h, quero te levar em um lugar
— pede assim que me deixa em casa depois de um dia exausto de
prova na faculdade.
Falta uma semana para o casamento, e ainda não
resolvemos quase nada, não ia ter festa, só uma reunião para
assinarmos os documentos.
Olho no relógio e o ponteiro marca 19h e 45 minutos, estou
pronta e curiosa. Sem fazer ideia de onde ele vai me levar. A
campainha toca as 20h em ponto e sorrio, ele sempre é pontual,
gosto disso.
— Você está maravilhosa — Dominic me endeusa ao me
vislumbrar de cima a baixo.
Vestia um vestido justo, com um decote generoso em V no
colo, e uma fenda sensual na perna esquerda. Percebo quando ele
engole em seco. Sua mão pousa em meu ombro alisando meus
cabelos que especialmente hoje, está sedoso e com todos os fios no
lugar. Seu nariz inala meu perfume quando seus lábios se arrastam
por minha bochecha. Faço o mesmo, inalo seu perfume forte e
amadeirado com notas cítricas. Uma mistura incrível de homem
cafajeste com homem sedutor.
— Você também está muito bonito.
— Hoje é um dia especial — rebate guiando-me para o carro.
No carro ele faz suspense e não me conta onde vamos. O
silêncio predomina, e não me importo, hoje estamos bem, sem
aquele clima de corda bamba que nos separada desde aquele dia.
Quando Dom estaciona em frente ao Le Pre Catelan um dos
restaurantes mais famosos de Paris, fico boquiaberta.
— Como você disse que queria algo íntimo escolhi este
restaurante para oficializarmos nosso noivado — diz sério e sem
muito entusiasmo.
— Dom, eu amei. Esse restaurante é lindo e um dos mais
famosos. O cardápio é impecável e de excelente bom gosto. Não é
à toa que possui 3 estrelas Michelin.
— Sabia que ia gostar. Ah, convidei Diogo e sua amiga,
espero que não tenha problema.
— Tudo bem. — Assinto maravilhada com o requinte do
lugar. O casarão imponente e de conservação impecável projeta a
sofisticação gastronômica que a casa oferece. Detalhes de uma
arquitetura moderna com um toque vintage. Sem falar nos móveis
de tons escuros que contrastam perfeitamente com as paredes
brancas e com detalhes em cinza.
A hostess nos leva até a mesa reservada um pouco distante
das outras. Vicenza e Diogo já estão lá.
— Porra amiga, você tá muito linda — elogia Vicenza
levantando-se pra me abraçar.
— Você também — retribuo sem graça pelo olhar sagaz de
Dominic.
Vicenza que me ajudou a escolher, estilo piriguete
comprometida, disse ela. Não sei ser uma mulher muito sensual,
mas acho que o meu jeito o agrada.
— Hoje é o noivado da minha amiga, tenho que estar à altura
— brinca lançando-me uma piscadela.
— Boba.
Depois do jantar divino, Dominic tira do bolso a caixinha com
as alianças de compromisso. Fico boquiaberta quando vejo a
aliança que gostei, a mesma que ele disse “tanto faz”.
— Como… — emudeço surpresa e ele não diz nada, apenas
a coloca em meu dedo.
— Senão fosse meu amigo, eu diria que era preciso fazer um
pedido formal e essas coisas, mas se tratando de Dominic Levy,
isso já é extraordinário — caçoa Diogo levantando a taça para um
brinde.
Fico apreensiva, ainda mais pela tensão horrível que se
instalou entre nós. Contudo, gosto do jeito que ele faz as coisas pra
me agradar, mesmo que de um jeito seco e grosseirão.
— Um brinde aos noivos — brinda Diogo empolgado.
Tomo um gole de champanhe e saboreio o prato especial
feito especialmente para nós.
Sorrio feito boba usufruindo de um momento descontraído
pelo qual sonhei por anos. Estar entre amigos. Jantar em um
restaurante qualquer. Rir e jogar conversa fora. Eu me sentia em um
sonho.
Abuso do champanhe e cochilo durante o caminho de volta pra
casa, acordo assustada quando ele estaciona em frente ao prédio.
— Chegamos!
— Você quer subir? — convido sem pensar nas
consequências caso ele aceite.
— Melhor não! Tenho que ir pra casa.
— Tudo bem, então até amanhã. Nos vemos no hotel? — falo
hesitante e sem jeito por ter ouvido um não imediato.
Também Nadine, você não sabe o que quer.
Inclino a cabeça em sua direção pra selar um beijo em seu
rosto, e a coordenação motora falha, e deixo um beijo no canto de
sua boca.
Estremeço.
— Boa noite, Nadine.
— Boa noite, Dominic — replico sem jeito pelo clima
pesaroso.
Respiro aliviada do lado de fora do carro. Ficar sobre aquele
olhar é desconcertante demais.
Eu fico sem saber o que fazer ou falar.
Totalmente abobalhada.
Abro a porta e me encosto nela olhando para o anel em meu
dedo. Pensei que estaria aflita por me casar, mesmo que de
mentira, mas não estou, pelo contrário, estou curtindo cada
momento.
Digito uma mensagem para Dominic e não consigo me livrar
do sorriso bobo nos lábios.
Eu: Obrigada pelo anel.
Dominic: Não foi nada.
Sua resposta chega minutos depois. E como nos últimos
dias, suas palavras foram mínimas.
Eu: Tenho notado você tão distante. Está tudo bem mesmo?
Dominic: Tudo ótimo! Não foi você que disse que temos que
manter o contrato? Estou mantendo.
Digito outra mensagem, ele conseguiu me irritar.
Eu: Manter o contrato, significa me ignorar quando não
estamos na frente das pessoas?
Apago a mensagem, melhor deixar sua ira como o fim da
conversa.
Talvez seja melhor assim.
Falta apenas três dias e James está apreensivo. Ele ainda
acha que é uma péssima ideia eu me casar com um completo
estranho.
Não vou mentir, o nervosismo começou a me perturbar, estou
ansiosa. Com medo de estar fazendo a maior burrada de toda a
minha vida.
Mas levando em consideração a minha situação, não vejo
outra alternativa.
Ser herdeira de um trono não é algo que se recusa com
apenas uma conversa. É muito mais complicado e burocrático que
isso.
Em minha última ligação com James, ele não me pareceu
preocupado somente com o meu casamento, tem alguma coisa que
não quis me contar.
Bom, talvez seja só preocupação mesmo. Vai saber!
Papai deve estar enfurecido por ter contratado os melhores
investigadores e não terem achado nada. E não que eu tenha feito
um bom trabalho em me esconder, mas papai sempre me
subestimou, achou que eu não teria coragem de voar por cima
daqueles muros e olha onde estou…
Voando em Paris.
O que me diz papai?
Capítulo 21
Sentado no sofá de casa encaro com atenção e gula a garrafa
de whisky no canto da sala. Prometi a mim mesmo que ia tentar, e
estou tentando. Faz exatamente quinze dias que não coloco uma
gota de álcool na boca.
Mas não ter Nadine por perto como eu gostaria, me faz
querer beber. Faz eu querer esquecer que jamais serei bom o
suficiente pra ela.
Jamais estarei à altura de uma Princesa…
E bastou um beijo. Um olhar e eu já estava fantasiando
minha vida toda ao seu lado. Tolo. Imbecil.
Não entendo como isso aconteceu. Como deixei me levar
desse jeito. Como me peguei viciado em sua companhia. Nos ruídos
de sua risada. No brilho do seu olhar que me acalma…
Só de saber que ela está por perto fico bem, sorrindo
abobalhado, achando o máximo suas descobertas. E quando ela
está longe, fico sem chão, emburrado, mal humorado, querendo
afogar meus pensamentos dentro de um copo.
Nadine tem focado no restaurante e tem atraído muitos
clientes com suas mãos habilidosas e simpatia absurda. Sempre
com um sorriso nos lábios faz questão de recepcionar os clientes e
depois saber o que eles acharam pessoalmente de seus pratos. Ela
é muito talentosa, e Bastien concorda, me disse que ela é
promissora.
Não quis comentar nada com ela, mas já tem uns dias que
um dos críticos gastronômicos mais famoso da França, visitou
nosso restaurante ao ouvir dizer que estávamos com um novo chef.
Ela ainda não sabe do seu potencial, não sabe o quanto tem talento.
Fiquei com medo, confesso, medo dela ficar nervosa, de me
deixar… Medo da princesa descobrir o mundo enorme que a espera.
Egoísta? Sim. Eu fui! Eu sou, e não me arrependo.
Ainda não saiu a crítica na revista, e sinceramente espero
que não saia. Isso complicaria as coisas pra ela, e pra mim.
Literalmente.
— Dom, eu estava olhando as planilhas e estão todas
zeradas. O que aconteceu? — Diogo entra na sala absorto, sem
desgrudar os olhos da tela do tablet, sem entender completamente
nada.
— Paguei todas as dívidas — respondo sem dar muitas
informações, torcendo para que ele não questione.
— Como? Onde arrumou o dinheiro?
Diogo é meu melhor amigo, ainda assim não consigo dizer a
ele o que estou prestes a fazer. O que estou fazendo.
— Consegui um empréstimo — minto e ele semicerra os
olhos desconfiado. — O importante é que está pago — acrescento
colocando meu paletó, caminhando em direção a saída dando fim a
nossa conversa.
— Como conseguiu? Onde você vai?
— O que importa é que não vamos fechar. Está tudo certo!
Nadine está indo bem no restaurante, as contas foram quitadas, e o
hotel voltou a ter movimento. Tudo sob controle — acrescento sem
encará-lo. Me sentia péssimo por mentir, mas…
— Vamos comemorar então! — convida ainda sem entender
direito o que aconteceu, mas está feliz.
— Claro. Nos vemos mais tarde.
Entro no elevador indo em direção ao restaurante, precisava
vê-la nem que fosse de longe. Na verdade, nos últimos dias tenho
feito isso, espreitando a princesa como um stalker.
Como expectador observo seu sorriso delicado cantarolando
uma canção qualquer, enquanto mexe em suas panelas. Ela
simplesmente fica radiante fazendo o que ama.
E como se um passarinho soprasse em seu ouvido, seu olhar
mira o meu. Fico sem graça por alguns instantes ao perceber que
ela vem em minha direção.
— Oi!
— Oi — respondo inquieto.
— O que faz aqui? Veio para o almoço?
— Não. Só queria saber se precisa de ajuda com as coisas
do casamento. Depois do jantar de noivado você ficou bem ocupada
por aqui, e… — Minto e repreendo meus pensamentos por estar
sendo um covarde mentiroso.
Nadine me olha em silêncio, aposto que tentado absorver
minha mentira. E então como num estalo ela diz:
— Bom, não conheço nada e nem ninguém por aqui. Então
se quiser convidar alguém — sugere.
— E seu vestido… Já escolheu?
— Ah, é uma recepção simples com o juiz de paz, não acho
que seja necessário um vestido de noiva — comenta desanimada, e
apesar de Nadine falar que não liga pra essas coisas, dá pra ver em
seus olhos que esse deveria ser um momento especial.
— Tudo bem! — finjo não me importar.
Ao sair do restaurante vou de encontro a dona Louise,
preciso contar para minha mãe sobre o casamento e aproveitar seu
toque feminino para comprar um vestido bonito para sua futura nora
de mentirinha.
— O QUÊ! — ela grita ao ouvir a palavra casamento. — Com
quem? Como assim, Dominic Levy?
— Aconteceu, e…
— Aconteceu? Você terminou o seu namoro de cinco anos
com a Bella, por não querer casar, e agora você diz pra mim que vai
se casar com uma moça que eu nunca nem vi. Está bebendo, Dom?
Ou ela está grávida — ela se aproxima e tenta cheirar minha boca.
— Eu não estou bebendo. Já faz semanas que não coloco
uma gota de álcool na boca — ela me olha da dúvida. — E ela não
está grávida, foi amor à primeira vista, a gente se conheceu,
começamos a sair e eu a pedi em casamento. Você vai gostar dela
— falo aborrecido por sua desconfiança.
— Se você deixou de beber por causa dela. Eu já amo essa
menina.
— Não exagera! — censuro sua entonação.
— E o que eu posso fazer por você? Não é sempre que meu
príncipe me pede ajuda. Estou até emocionada — zomba
acariciando meu cabelo.
— Mãe, menos. — Caminho até a sacada e olhando para as
luzes acessas da cidade, peço: — Preciso que decore o salão do
hotel e me ajude a escolher um vestido para Nadine, só isso!
Sem paciência encaro as horas no relógio de pulso. Acho que
nunca conversamos por tanto tempo assim.
— Porquê? Ela não vai usar um vestido?
— Vamos fazer uma recepção simples. Nadine não gosta de
extravagâncias.
— Tudo bem! Conheço um lugar. Vamos!
No carro dona Louise não para de falar. Está eufórica. E me
senti mal por isso, por ser uma mentira. Talvez eu também quisesse
que fosse um momento especial, justamente por nunca ter
imaginado me casar antes. Queria que fosse verdade.
Paramos em frente à loja de vestidos de noiva. E um
sentimento estranho me abate, me sinto irritado, muito irritado.
Porque ela me afasta? Porque me faz lembrar a cada
instante que isso não passa de uma farsa?
Daqui há uns meses tudo vai acabar, ou até antes, se tudo
der certo pra ela. E como fico? Como vou me sentir estando sozinho
de novo? Sem ela…
Abro um sorriso sarcástico, eu sabia bem aonde estava me
metendo. Sempre soube que ela não ia ser uma passagem bonita
em cima da minha cama. E que não passaria desapercebido em
minha vida.
Aquele esbarrão no aeroporto não foi por um acaso. Foi
destino. Nadine apareceu de repente com seu jeito desastrado pra
me tirar do fundo do poço. E, desde então tenho me agarrado em
suas mãos sempre que posso, fazendo meu subconsciente lembrar
a cada milésimo de segundo que eu preciso ser melhor, melhor pra
estar ao lado dela, pra ela me enxergar, e me ver como um homem
merecedor de seu amor e confiança.
E como um cometa que passa tão rápido no céu me
apaixonei, e tenho medo que essa paixão me consuma tão
depressa quanto sua passagem na terra.
E como um homem fraco propenso ao alcoolismo que sou,
estou tentando deixar a bebida por estar viciado naqueles olhos.
Bizarro não é mesmo?!
— Dom? Filho, o que acha desse? — mamãe chama minha
atenção livrando-me dos meus pensamentos deploráveis.
— Está perfeito — me admiro ao imaginar Nadine dentro
dele. É como se esse vestido tivesse sido feito sob medida para ela,
tão delicado e perfeito quando seu sorriso.
— Seus olhos estão brilhando — Louise comenta, deixandome irado e sem graça por seu comentário.
— Vamos!
— Quero conhecer essa moça Dom, antes do casamento! —
exige em tom de ameaça por estar sabendo do casamento somente
agora.
— Tá, mãe! Vou fazer um jantar amanhã, assim você pode
conhecê-la, ok?
— Bella já sabe?
— Não, e a senhora não vai falar nada! — censuro antes
mesmo que ela pense em comentar.
— Filho, porque uma cerimônia simples? Eu sonho com o dia
do casamento do meu único filho durante anos. Uma grande festa, e
agora vai fazer uma recepção no salão do hotel? — questiona
murcha.
Quem dera eu pudesse concordar com ela.
— Porque queremos assim, e fim de assunto. Te vejo
amanhã à noite — falo após estacionar em frente à sua casa.
— Tudo bem! — responde contrariada e bate os calcanhares
para dentro.
Nadine está nervosa, achou que não ia precisar conhecer
minha mãe.
— Como estou? — pergunta ansiosa, suando de nervoso.
— Linda como sempre — elogio analisando lentamente seu
corpo naquele vestido justo. E sem disfarçar sua timidez ela olha
para todos os lados, menos pra mim.
— Dom, eu…
— Desculpa por estar agindo igual um idiota, não estou
bebendo e isso está me deixando ansioso, nervoso, não quero
descontar em você… — interrompo.
— Porque descontaria? — retruca segurando em minhas
mãos. Um gesto ingênuo e sem intenção que demonstrou saudade,
como se contasse os dias pra me tocar outra vez, de se aproximar
novamente.
E num ato de defesa contra seus encantos e meu amor
frustrado, puxo minha mão da sua evitando qualquer tipo de contato.
Seus olhos me encaram assustados, e suas bochechas ruborizam
quase que no mesmo instante, ela não esperava uma reação tão
brusca, e sinceramente, eu também não.
— Dom, você não está bebendo, isso é maravilhoso —
comenta orgulhosa. E com seu jeito espevitado me envolve em seus
braços em um abraço forte e esperançoso.
Desde o nosso beijo no banheiro do restaurante, não consigo
tirar ela da cabeça. Não consigo parar de pensar em suas palavras,
no seu cheiro, no seu beijo… No que eu senti ao tocar em seu
corpo.
É como se ela fosse a cura pra tudo que me envolvia em uma
sombra escura de amargura e solidão.
Se não estou jogado no chão depois de beber até cair, é por
ter vergonha que ela me encontre assim. É por querer a aprovação
dela em tudo o que faço.
Droga!
Tento me soltar de seus braços, mas ela resiste.
— Estava com saudades de você, sabia? Da gente
conversar. Ficou tão estranho de repente — confessa ainda com a
cabeça apoiada em meu ombro. Respirando fundo, tão fundo que
senti em meu peito seu suspiro de alivio.
— Também estava com saudades, Princesa — minha voz sai
sussurrante enquanto acaricio seus cabelos.
— Porque me afastou, Dom — ela me encara franzindo a
testa em contestação. — Achei que éramos amigos antes de
qualquer coisa.
— Somos — rebato sem conseguir olhá-la nos olhos.
— Não está parecendo… — Nadine hesita pensando se
insistiria na argumentação. — Eu sei que aquele beijo deixou tudo
meio confuso, mas não quero esse clima entre a gente. Vamos nos
casar! — Abre um sorriso grande querendo mudar o rumo daquela
atmosfera gritante.
— É …
— É o quê? — Nadine questiona, porém não sai mais nada
da minha boca. Não consigo formular palavra alguma, não consigo
ser sincero e dizer o que sinto por ela. — Está arrependido? Se
estiver tudo bem, eu entendo, não quero pressionar você. Não
precisa me devolver o dinheiro, eu dou outro jeito — acrescenta
sensata,
E vendo-a imaginar mil e uma coisas, encosto seu corpo
contra a parede e encaro seus grandes olhos com atenção, tão
intensamente quanto se é possível. Ela fica em alerta, mas não
recua, não me afasta.
A tensão se instala e só consigo admirar seus cílios
cumpridos batendo rapidamente sob a face avermelhada. Lábios
secos. Respiração entrecortada. Tesão. Desejo. Ansiedade tomando
conta de tudo, fazendo o sangue ferver ardorosamente nas veias.
— Nadine…
Capítulo 22
De novo estou indo contra tudo o que lutei nos últimos dias…
Mas deixar as coisas esfriarem e fingir indiferença não
adiantou nada. Passei dias lubridiando meu subconsciente, tentando
fazer ele acreditar que sou apenas uma mulher com quem ele
assinou um contrato de casamento. Um acordo sem segundas
intenções.
É difícil entender isso, Nadine?
Sentimentos avassaladores obviamente não estavam incluso
nesse contrato. Não estava nos meus planos querer conhecê-lo
melhor. Não estava nos meus planos querer salvá-lo de si mesmo.
Cuidar para que um homem tão maravilhoso como ele, não se
afunde em suas próprias frustrações.
Posso enganar Vicenza.
Posso enganar Dominic que isso não passa de um maldito
acordo.
Mas não posso enganar meu coração que bate forte em
verdade toda vez que ele está por perto. Não posso enganar minha
barriga que dói com tantas borboletas que voam quando ele me olha
com aquele olhar de menino perdido. Não posso fingir para o meu
corpo que não o desejo, porque ele reage com volúpia toda vez que
ele me toca e me lança aquele meio sorriso enlouquecedor.
E parece que quanto mais eu me afasto. Quanto mais o faço
lembrar que isso é só um trato, um acordo, eu me arrependo,
jogando-me em um mar de dúvidas.
— Nadine … — ele sussurra pensativo, trêmulo.
E então paro pra pensar que se pra mim é um sentimento
desconhecido, pra ele também é, e me coloco em um lugar onde
jamais pensei que estaria…
Na beira de um rio onde não tem ouro, não tem prata, um rio
de água escura, onde encontro apenas pedras. Sobretudo, meu
instinto me faz olhar bem lá no fundo, embaixo de toda poluição e
sujeira, e vejo esperança nessas águas. Posso estar enganada,
iludida pela falta de experiência, mas eu sinto que tem algo mais…
eu sei que tem…
Quero sentir que nessas águas tempestuosas, existe um mar
calmo, onde eu não precise me forçar a nadar, porque não quero ter
que me cansar pra finalmente encontrar terra firme.
— Não precisa dizer nada, só vamos deixar as coisas assim
— aconselho forçando-me a acreditar que existe verdade em
minhas próprias palavras.
Porque eu sou só uma menina. Uma sonhadora. Uma
aventureira que fugiu pra não se afogar no desespero de assumir
algo que não quer. Uma mulher que por muito tempo se calou no
próprio silêncio em busca de se encontrar por completo. E agora
que se encontrou, não permitirá que a aprisionem novamente.
E então, se um novo sentimento desconhecido, e
avassalador persistir em me consumir, tem que ser leve, tão leve
como uma pluma, tão singelo como o soar do vento ao tocar as
folhas das árvores. Tão genuíno quanto o amor de Deus para com
seus filhos e tão simplório quanto a ingenuidade de uma criança…
Porque é assim que eu sou, tão intensa quanto o céu
brilhante e a noite escura, e tão marcante quanto o contraste do
arco-íris.
Simples e extrema. Ousada na minha inexperiência. E certa
dos meus ensinamentos. Uma menina mulher, pronta pra conhecer
o mundo inteiro.
— Não sei como agir com você… — Dominic assume
cabisbaixo segurando em minha mão.
— Não precisa fazer nada, Dom. Vamos nos casar e conviver
juntos por um tempo, vamos ter tempo de nós conhecer.
Dominic não aceita meu argumento, não ouve uma só
palavra do que eu acabo de dizer. Seu corpo invade meus sentidos.
Sua respiração bate quente em minha pele, e mais uma vez não
consigo dizer nada, mais uma vez meu corpo não me obedece e
não se move. E outra vez me sinto perdida na avalanche de
sentimentos desconhecidos que me fizeram viciar em Dominic Levy.
Seu olhar procura por chama. E sua intenção é saber o que
quero, o que desejo. Ele tenta me decifrar, tenta manipular meus
sentidos porque sabe que eu não resisto. Sabe que nesse jogo de
provocação não tem vencedor. Que nesse tabuleiro de damas, os
dois perdem feio.
Por isso nos afastamos, por isso a distância é necessária.
Por que sabíamos que juntos a faísca ascende. O desejo aflora e o
fogo se alastra tão rápido quanto um pensamento involuntário.
A mistura contrastante do preto e do branco; da paz do
desconhecido e da assombração de um passado conturbado.
Como o encaixe perfeito de um quebra-cabeça difícil.
Seus olhos escurecem de desejo, e o meu rebate na mesma
intensidade. Meu corpo amolece totalmente entregue, viciado
naquele homem sexy me analisando sem pudor.
Minha cabeça é lançada para trás quando seu nariz encosta
suavemente em meu pescoço, Dominic inala meu perfume, e sinto a
saliva descer apertada por minha garganta. Ele rasga meu
autocontrole jogando-o no lixo. Mostrando que eu e o meu plano
ridículo não mandam em mais nada.
Agora quem manda é ele…
Com seu olhar intenso e lascivo… Com seu meio sorriso
luxurioso que me tira da compostura… Com seu corpo que me
instiga e me excita como louca… Ah… como eu quero senti-lo por
inteiro… Deus sabe como eu quero isso…
A deusa da calcinha molhada está de prova!
Mas eu não posso me entregar, não posso! E quando penso
que ainda tenho o mínimo de controle sobre mim, me traio, entregome a saudade de sentir seus lábios nos meus; ao toque molhado de
sua língua devorando minha boca, invadindo meus sentidos com
desejo, e paixão.
Dominic explora minha intimidade, e suas mãos não
escondem a vontade que tem em me possuir, de fazer amor comigo,
de me proporcionar uma experiência inesquecível. Gozar até gritar
por seu nome, sentindo um prazer intenso jamais sentido antes.
Deslizando pelos vértices da minha coxa, Dominic alcança
minha calcinha, roça seus dedos sobre ela com a mesma tensão de
antes, fazendo-me gemer por antecipação.
— Dom… — Um urro incontrolável, implora para que ele pare
de me torturar, e como um pedido ouvido pelos deuses da tentação,
a campainha toca bem no momento em que seus dedos puxam a
lateral da minha calcinha. Ainda foi possível sentir seus dedos
tocarem de relance meu clitóris encharcado.
Tremi ao sentir seu toque ali. Seria um caminho sem volta.
— Shiii — pede lançando-me um olhar tentador.
— Deve ser sua mãe, melhor atender — Tendo me
desvencilhar de suas garras de homem gostoso, ele me trava.
— Não faz isso comigo, olha como estou? — ele me faz mirar
o volume estrondoso embaixo da calça. — Nadine…— suplica.
— Melhor dar um jeito nisso. — Saio apressada ajeitando
meu vestido e antes de abrir a porta, confiro meu reflexo acalorado
no espelho.
Não estava acontecendo nada. Nadinha.
— Boa noite dona Louise — cumprimento assim que a
senhora de cabelos aloirados me encara de cima a baixo.
— Você deve ser a sortuda por quem meu filho se apaixonou
— comenta um pouco arrogante entrando na casa sem desviar seu
olhar do meu, procurando um rastro familiar ou defeito.
— Acho que sim — Fecho a porta atrás de mim, vermelha de
vergonha.
— Onde ele está?
— Ah, ele já vem — informo sentindo-me coagida pelo que
estávamos fazendo minutos antes. — Vinho? — ofereço e ela senta
no sofá reparando em tudo. Acho que queria ver se mudei alguma
coisa por aqui.
— Claro! — enquanto pegava as taças, sentia o olhar
especulativo de dona Louise sobre mim. — Então você também é
uma MasterChef?
— Sim!
— Já trabalhava no restaurante antes de namorar, quero
dizer, noivar com meu filho? — questiona desconfiada. Não senti
que ela não estava me interrogando, entendi que era apenas
curiosidade de mãe.
— Sim, trabalhava… Trabalho.
— Oi mãe — Dominic chega e me tira de um assunto
embaraçoso. — Já conheceu minha linda noiva?
— Sim, ela até já me serviu vinho. — Lança uma risada falsa.
— O que está fazendo minha nora, o cheiro está delicioso —
pergunta inclinando o olhar para o fogão.
— Fatias de salmão defumado, com batata cozida, molho
branco e endro. É um prato típico de onde eu venho.
— Pensei que fosse francesa — comenta ácida procurando
rastros de minha origem. E como uma princesa fugitiva, tinha receio
de falar qualquer coisa.
— Não, — forço um sorriso convincente e doce. — Sou da
Suécia, dona Louise. Mas estou me habituando muito bem aqui,
graças ao seu filho também, é claro! — respondo sentando-me ao
lado de Dominic no sofá. Ele entrelaça nossos dedos chamando
minha atenção.
— Então onde se conheceram? Dom não me conta nada,
estou muito curiosa, Nadine.
— Mãe, por favor, vamos comer, vai esfriar — Dom interfere,
mas ela insiste e então ele responde: — Nos conhecemos no
aeroporto, quando meu voo fez uma parada na Suécia.
Encaro apreensiva para Dominic que pronuncia as palavras
como se lembrasse com riqueza de detalhes daquele dia. E como
num passe de mágica puxo na memória.
— E como foi, me conta os detalhes, filho — pede
entusiasmada e dessa vez com um sorriso empolgado nos lábios.
Dominic bufa sem paciência pela insistência da mãe, mas ao
olhar pra mim, e ver que estou tão interessada quanto ela, começa a
descrever:
— Estava indo para o portão de embarque quando Nadine
esbarrou em mim sem querer, derrubando minha maleta no chão.
Ela estava tão apressada que mal olhou pra mim, mas eu não me
esqueci desses olhos tão marcantes — ele me olha com atenção. —
Tivemos a sorte de embarcar no mesmo avião, e como uma
pegadinha do destino, uma turbulência e ela foi parar bem em cima
do meu colo.
Sua mãe ergue uma sobrancelha com malicia e ri alto.
— E como se não bastasse as coincidências, Nadine é amiga
de uma das meninas que trabalha no hotel, e então aconteceu. Foi
questão de tempo me apaixonar perdidamente por ela — acrescenta
me deixando sem graça e abobada por suas palavras parecerem
tão sinceras e verdadeiras.
— Então vamos comer? — Levanto seguindo pra cozinha
ainda absorta por sua declaração convincente.
Depois de uma longa conversa e muitas especulações sobre
mim, minha vida e minha família, dona Louise finalmente foi embora
tirando um peso enorme dos meus ombros.
— Sua mãe é muito legal, Dom — comento enquanto lavo a
louça.
— Se você tá dizendo — rebate sarcástico encostando-se
atrás de mim pra colocar o resto da louça suja na pia.
— Dominic, não! — repreendo sua provocação.
— Não estou fazendo nada. — Levanta as mãos em
rendição, preenchendo no rosto um sorriso safado. E pra não correr
o risco, viro imediatamente e recuso olhar aquela tentação.
Ouvir Dominic contar sobre nosso primeiro encontro me fez
pensar que estou sendo mesmo muito egoísta. Estou tão focada em
mim e na minha vida que não o reconheci. Não me importei em
colocá-lo nessa confusão. Achei que poderia comprá-lo por que
senti sua necessidade, eu fui horrível.
Não consigo conter a indignação por não ter o reconhecido
de primeira. Depois papai quer que eu seja princesa. Como vou
decorar tantas coisas, se não guardo um rosto. Impossível!
— Prontinho, agora eu vou indo, já esta tarde e amanhã
tenho que ir cedo para o restaurante.
— Fica mais um pouco? — pede com aquela voz macia que
arrepia a espinha.
— Acho melhor não, Dom …
— Vai me afastar de novo? — indaga inflando seu olhar no
meu.
— Porque está falando assim?
— Porque é isso que você faz, você atiça, me enlouquece,
me deixa louco, Nadine, e depois você simplesmente vai embora e
me afasta. Queria saber porque eu estava distante, é por isso, pra
me proteger de você — Dominic desabafa levando as mãos no alto
da cabeça como se o desespero o sufocasse. Como se precisasse
jogar na minha cara tudo o que está sentindo. — O que você quer?
Quer brincar? Se aventurar? Quer transar, me diz o que você quer,
por que eu não sei mais o que pensar… — declara exausto
sentando no sofá com a cabeça apoiada entre as mãos.
E com medo de falar besteira, de magoá-lo ainda mais, o
envolvo em um abraço. Queria dizer que me sinto da mesma forma.
Gostaria de declarar que estou feliz por estar descobrindo todas
essas sensações com ele, mas não posso ceder.
Não posso deixá-lo se iludir. Eu não posso me iludir…
Não vamos ter um casamento de verdade. Como vou explicar
que sou virgem e que eu não posso dar mais esse desgosto ao meu
pai, de me entregar a um homem que não vai ser meu marido para
sempre.
— Desculpa por te colocar nessa situação, sinto muito de
verdade — declaro sussurrante em seu ouvido.
E depois de acalentá-lo, levanto sob seu olhar devastado, e
vou embora.
Capítulo 23
Meus olhos marejam com meu reflexo no espelho. Mamãe
estaria feliz se me visse assim. Meus olhos brilham de felicidade. E
a maquiagem elegante que os contornam os deixam ainda mais
vibrantes. Lábios rosados, e o cabelo preso em um coque frouxo.
— Querida nora? — dona Louise bate à porta e entra com
uma caixa grande nas mãos.
— O que é isso? — especulo.
— Espero que goste, Dominic quem escolheu, ele disse pra
eu não contar nada, mas achei que deveria saber — lança uma
piscadela cúmplice. —Vou deixar você a vontade, se precisar de
ajuda, é só me chamar, estarei no quarto ao lado — assinto
embasbacada colocando a caixa sobre a cama.
Olho para minhas mãos trêmulas, estou nervosa, mentira ou
não, é o meu casamento. E ao abrir o laço vermelho em volta da
caixa bonita, vislumbro um lindo vestido branco com pequenas
pedras brilhantes por sua extensão. Delicado e elegante.
Não pude conter as lágrimas, mais uma vez Dominic me
surpreendeu, mais uma vez ele me deixou sem palavras.
Coloco o vestido com cuidado, e quando me olho no espelho
fico impactada com a bela mulher que ele reflete, uma mulher
radiante em um lindo vestido branco.
O vestido não é bufante, nem cheio de pano, é simples sem
precisar de todo o requinte que o papel exige, digno de uma
princesa
O busto bordado com um decote atraente, e mangas caídas
sobre os ombros esbanja sensualidade em um tecido suave que
abraça perfeitamente minha pele.
Ouço batidas na porta interrompendo meu vislumbre, penso
ser minha sogra querendo saber o que achei do vestido, mas ao
abrir, encaro surpresa seus olhos azuis sem conseguir formular
palavra alguma.
— Não vai dar um abraço no seu irmão? — James me abraça
com força afagando sua respiração emocionada em meu pescoço.
— Senti tanta saudade — confessa ainda sem me soltar.
— Irmão. Não acredito, como? — reajo surpresa.
— Você está linda — me rodopia esbanjando um sorriso
branco e encantador. — Pensei que depois de algumas semanas
longe do seu irmão predileto, sentiria mais saudades, Princesa —
sentencia ofendido por minha indiferença, e apesar de estar mesmo
com muita saudade, tive medo de sua presença, uma estranheza,
um arrepio misturado com desespero.
O que ele estaria fazendo aqui? Com quem? Pra quê?
— Como me achou?
— Como você está irmão? E papai, ele está bem? — ironiza
entrando no quarto. Fecho a porta absorta e o sigo.
— James, estou feliz em te ver, porém surpresa. Como me
achou? O que veio fazer aqui?
— Nadine, sou mais novo que você, mas não sou burro,
sempre soube onde você estava. Só te deixei a vontade pra tomar
suas próprias decisões. — Ele senta na cama mudando totalmente
a fisionomia. — Achei que não ia ter coragem de se casar… — bufa
exausto — Pensei que isso não passaria de uma ideia maluca que
me arrependi amargamente de fazer parte.
— Colocou alguém atrás de mim, James? — repreendo
aborrecida por ter sido uma idiota em confiar no meu irmão, meu
melhor amigo.
— Nadine, jamais ia me perdoar se alguma coisa
acontecesse com você, você é minha irmã, minha responsabilidade.
Ajudei você, porque concordo que deva fazer aquilo que te faça
feliz, mas casar com um desconhecido? Arrumar um problema pra
se livrar de outro, não acho que seja a solução mais acertada.
— Você me deu a ideia! Você quer ser rei, você quer aquela
vida, eu não!
— Depositei aquela alta quantia por que você me pediu, mas
sinceramente, Princesa, não achei que teria coragem de chegar até
o fim. E vim te impedir de fazer a maior burrada de toda a sua vida,
e colocar em decadência o nosso nome.
— Nosso nome, — limpo a garganta em deboche sentandome na cadeira da penteadeira, encaro meu reflexo apreensivo no
espelho e disfarço. — Desde quando você concorda com essas
baboseiras. O que aconteceu? — pego o batom e deslizo sobre os
lábios não dando importância a sua missão.
— Você não vai casar hoje! — determina colocando-se ao
meu lado.
— Contou para o papai onde estou? — pergunto engolindo
em seco o meu nervosismo, eu queria me casar, queria ter a chance
de me livrar do peso de uma monarquia que eu não escolhi, do peso
da responsabilidade de uma coroa que eu não quero.
E nesse emaranhado de contestações e medo, lembro do
toque suave dos beijos de Dominic, do seu olhar escuro que me
encanta, e que me direciona como um farol no cais.
— Não contei. Disse apenas que ia seguir uma pista, Liam
veio comigo!
— Que bom, pelo menos não vou me sentir sozinha na
cerimônia — pondero não dando ouvidos a sua voz de autoridade.
— Nadine você não vai casar. Vamos dar outro jeito, te
prometo! — Tenta me convencer, mas não acredito.
— Vou me casar. Já está decidido! Dominic é um bom
homem, James, você vai gostar dele, vai ver que estou em boas
mãos até o contrato acabar.
— Não é só isso. Dá pra ver que não é só isso! O que você
fez, Nadine? — me encara duvidoso e sei exatamente o que está
insinuando.
— Não fiz nada, não se preocupe — minto.
— Querida, está pronta? — dona Louise abre a porta e
agradeço a interrupção. — Desculpe, não sabia que estava com
visitas.
— Tudo bem, esse é James, meu irmão. Essa é a mãe do
Dominic, dona Louise.
Apresento os dois que estendem a mão para um
cumprimento formal.
— Você está simplesmente deslumbrante. Não é à toa que
meu filho se apaixonou perdidamente por você, parece uma
Princesa — ela me aprecia deixando-me desconfortável com o olhar
especulativo de meu irmão caçula que a essa altura, estava me
irritando por seu machismo de achar que tem que tomar conta de
mim a todo instante.
— Vamos? Estou pronta!
— Que bom que seu irmão veio, ele é tão bonito e elegante.
Seu pai também veio?
— Não pôde, está viajando a negócios — invento com medo
de sua curiosidade.
James apenas observa de longe acompanhado de Liam.
— Dona Louise, pode levar meu irmão até o salão, por favor.
— Será um prazer — aceita solicita cruzando seu braço no
dele, que me fuzila com o olhar.
Quando souber que ele tem apenas dezenove anos, vai
surtar. James aparenta ter bem mais idade por seu porte atlético e
postura de homem responsável, mas é só um menino. E ela pelo
visto gosta muito de flertar com garotões.
Penso por alguns instantes e decido ir de encontro a Dominic,
preciso vê-lo antes de assinar o documento que vai mudar minha
vida pra sempre. Estou com medo.
— (…) — Dominic abre a porta após ouvir batidas
desesperadas.
Sem jeito, espero uma reação, mas ele fica calado, apenas
me olhando como se estivesse vendo uma miragem no deserto.
— Posso entrar? — pergunto, e em completo silêncio ele
abre mais a porta dando-me passagem.
— Você está linda, Princesa — elogia encostando-se na
porta. — Eu sei que o casamento é de fachada, mas a senhorita não
sabe que dá azar o noivo ver a noiva antes da cerimônia? — brinca
na tentativa vã de demonstrar tranquilidade.
— Precisava te ver. Você está bem? Meu irmão está aqui!
Estou com medo, Dom.
— O que ele faz aqui?
— Disse que sempre soube onde eu estava. James estava
me vigiando como um verdadeiro traidor — ralho enfurecida.
— Ei — ele puxa meu queixo para fitá-lo. — Estou aqui com
você, vamos fazer isso, vamos nos casar e em breve você será a
chef mais disputada de toda a França.
Sorri ao ouvi-lo tão empolgado, mesmo depois da nossa
última noite.
— Obrigada por estar comigo nessa loucura. Está certo
disso? Não terá volta…
— Não me imaginaria em outro lugar. — Suas mãos
envolvem minha cintura com carinho, e sinto meu corpo se arrepiar
por completo. Seu olhar penetra no meu carregando uma mistura
inebriante de certeza e fé, e mesmo estando completamente perdida
em relação aos meus sentimentos, sentia-me protegida ao seu lado,
segura que tudo daria certo.
— Então quer dizer que meu noivo que escolheu meu
vestido, — sorri mudando de assunto pra não chorar. — Eu amei, é
lindo, Dom — acrescento passando a mão em seu cumprimento.
— Dona Louise… — ele revira os olhos por ela ter contado.
— Ficou perfeito em você.
— Dom, está na hora. Você viu a Nadine, porque eu… —
Diogo abre a porta abruptamente nos deixando envergonhados. Não
estávamos fazendo nada, mas o olhar que trocávamos era tão
intenso que seria fácil pra qualquer um imaginar mil e uma coisas.
— Porra! Vocês não podem esperar a lua de mel? — brinca
como pedido de desculpas. Rimos. — E aí, vamos casar? —
apressa ele com seu jeito espalhafatoso de sempre.
— Vamos! — respondemos em uníssono.
Dentro do elevador só conseguia pensar que tínhamos uma
conexão estranha, uma amizade intensa carregada de paixão.
Ao mesmo tempo que nos esbarrávamos em beijos e luxúria,
nos afastávamos como cão e gato.
— Está pronta? — pergunta Dom assim que a porta do
elevador se abre. Diogo sai na frente e vejo de longe acompanhar
Vicenza até os seus lugares de padrinhos.
— Estou!
— Depois disso, estará feito. Tem certeza? — insiste sem me
olhar nos olhos.
— Dom, olha pra mim — peço. — Eu sei que ficou um clima
estranho entre a gente nos últimos dias, quase não nos falamos,
mas eu quero que saiba que estou muito grata por estar fazendo
isso por mim.
—Temos um acordo, como você mesmo disse. Somos
parceiros! — ele olha inexpressivo com seu meio sorriso cheio de
charme.
Ele tinha esse péssimo costume de ser bipolar nos momentos
mais impróprios.
A música começa a tocar. Respiro profundamente sabendo
que estou prestes a tomar a maior decisão de toda a minha vida.
Sempre fui maluquinha, sonhadora demais para o tamanho da
coleira que por herança estava amarrada em meu pescoço, mas,
ainda assim, sou uma menina, uma mulher que tem medos,
anseios, e uma coragem que não cabe em meu ser. É, com certeza
coragem é a palavra que me define nesse exato momento.
Quero fazer isso… Quero fazer isso com Dominic.
Seus dedos entrelaçaram nos meus e a passos macios nos
posicionamos em frente a grande porta do salão.
A porta se abre e os olhares dos poucos convidados recaem
sobre nós.
— Vamos acabar logo com isso — sussurra.
Dom segura minha mão com força e com um aceno positivo
entramos e sorrimos para os convidados, alguns sorriam de volta,
outros nos olham surpresos.
Também acharia estranho um casamento às pressas. Surgiu
comentários que eu estaria grávida. E em vista da verdade, até que
é um motivo mais aceitável pra esse casamento.
— Que lindo! É meu filho — dona Louise eleva a voz atraindo
a atenção.
— É minha amiga — grita Vicenza me dando apoio.
E James estampando uma carranca de infelicidade, apenas
observa de longe, certo de que eu estava louca, e que nada ele
poderia fazer para impedir.
— Se quer que tudo pareça verdade, tente sorrir, faz bem,
sabia? — repreendo Dominic baixinho enquanto caminhávamos em
direção ao juiz.
E então ele abre um meio sorriso, não aquele que me deixa
louca, mas um que não gostei nada de ter visto. Um que me causou
dúvidas por alguns instantes.
O juiz de paz limpa a garganta chamando a atenção de
todos, assim que paramos no fim do tapete vermelho forrado de
pétalas brancas, ele foi um fofo, pensou em tudo mesmo.
— Amei as flores — agradeço sincera sabendo que isso é
obra dele, e o meu comentário o faz suavizar a tensão em seus
ombros, fazendo desaparecer o V que marca sua testa, trazendo-o
para o nosso momento.
Dominic tenta disfarçar a felicidade em ter me feito mais uma
surpresa, ele se importou em transformar essa farsa em um
momento especial pra mim, mesmo tentando não esboçar emoção.
Aperto sua mão com firmeza e meu olhar demostra apoio.
— Tudo bem ficar com medo — murmuro pra ele, mas na
verdade era pra mim mesma.
Seus dedos apertam os meus, ele está nervoso.
O juiz fala algumas palavras e após assinarmos o
documento oficial, dona Louise grita:
— O anel, filho!
Dom ergue as sobrancelhas como se fosse óbvio e retira do
bolso a caixinha, e encarando-me com doçura, coloca em meu
anelar uma linda aliança que combina perfeitamente com o solitário
de noivado. Faço o mesmo memorizando aquele momento, meu
casamento, que por algum motivo estranho estava sendo o dia mais
feliz da minha vida.
— Os declaro, marido e mulher — o juiz anuncia causando
alvoroço nos convidados.
— Beija. Beija. Beija — as vozes preenchem o salão
deixando o clima tenso entre a gente.
É claro que não podia ser outra pessoa a puxar o couro:
Vicenza!
E como um casal inexperiente, nos aproximamos devagar,
Dom segura em minha mão com carinho e me olha profundamente
nos olhos, como se pedisse permissão para beijar meus lábios na
frente de todos, aproximo-me de seu corpo envolvendo minhas
mãos em seu pescoço, unindo nossas bocas em um beijo
apaixonado.
— Parabéns ao casal — James diz sério e incomodado.
— Muito prazer James. Dominic Levy, não tivemos a chance
de nos apesentar antes, mas estou feliz que esteja aqui! —
cumprimenta Dom todo educado sem negar que está feliz.
— O prazer é meu, mas não precisa fingir pra mim, eu sei
bem do que se trata esse casamento e quanto custou.
— James! — repreendo enfurecida por seu comentário que
deixou Dominic altamente desconfortável.
— Estou mentindo?
— Não faça isso, por favor! — peço com os olhos marejados,
nunca imaginei que ele me faria passar uma vergonha dessas. —
Podemos conversar em particular? — O puxo para um canto
reservado antes mesmo dele responder.
— Combinaram a farsa direitinho, estou admirado. Parece
mesmo que estão apaixonados.
Engulo em seco.
— O que deu em você? Porque está agindo dessa maneira?
— Por que eu te ajudei nessa loucura. Se alguma coisa der
errado e isso arruinar o seu futuro, Nadine, não vou me perdoar,
você não entende isso? — desabafa segurando em meus braços.
— James, — solto-me de suas mãos. — Entendo que está
preocupado, mas não preciso de outro homem controlador em
minha vida. Um homem que não sabe respeitar as minhas escolhas.
Se não pode suportar as minhas decisões, vá embora e finja que
nem esteve aqui!
— Nadine…
— Chega! Estou casada…
Capítulo 24
Nadine tem o péssimo habito de fugir quando sente medo,
talvez ela não seja muito diferente de mim, eu bebo pra esquecer
meus problemas, e ela foge.
Não sei o que está acontecendo comigo, um dia estava
frustrado procurando consolo em uma garrafa de whisky e em um
corpo curvilíneo em minha cama. E no outro, projetando uma vida
ao lado de uma princesa fujona, acreditando que de alguma forma
nossos caminhos foram entrelaçados pra que ela pudesse me
salvar.
É estranho, porque nunca senti isso antes, nunca me
apaixonei a esse ponto, ao ponto de não conseguir enxergar mais
os meus dias sem aquela pessoa ao meu lado.
E esse sentimento desconhecido me assusta.
Tenho medo de sofrer, de sentir ainda mais dor, porque é
basicamente isso que eu tenho vivido nos últimos anos. A dor lenta
e aguda de uma frustração que me corrói dia após dia. Um
sentimento doloroso do tipo que vem e te consome lentamente.
Constantemente. Abrindo cada vez mais uma ferida que não
cicatriza nunca.
E quando você menos espera, quando não acha que existe
solução pra sua triste e amarga vida, surge uma mulher totalmente
diferente de você, e então você finalmente consegue respirar,
porque de mansinho ela vai se tornando parte vital pra sua vida.
Parte dos milésimos de segundos do seu dia. E passa as horas
pensando naquela garota sonhadora e sorridente que consegue ver
o mundo colorido, mesmo com tantas adversidades em seu
caminho.
E consegue dormir sem ter pesadelos, e quando acorda
lembra daqueles olhos castanhos e acha que o problema de ontem
ficou no passado, então surge uma pontinha de esperança pra uma
alma escura e fria.
Mas, então eu lembro que o problema não está nos
pesadelos, ou no fundo do um copo de whisky, o problema sou eu…
O problema de ontem, é o problema de hoje, e vai ser o problema
de amanhã, porque sei que não sou suficiente pra ela. E nunca
serei. Tudo isso não passa de uma farsa. Eu sou uma farsa!
Sou um homem problemático, que vê, ou via a solidão como
minha melhor companhia. Porque eu sei que por mais que eu tente
ser diferente, por mim, por ela, o meu problema vai persistir todos os
dias. O problema sou eu.
Foi isso que seu Roberto deixou pra mim, um vício
desgraçado com uma frustração profunda, uma ferida que não
cicatriza mesmo depois de todos esses anos, eu não entendo, eu
não consigo entender, como um casal feliz que se amava, se perdeu
nos dias que mais deveriam se amar?!
Sofro calado, não consigo perguntar o motivo a ela. Não
consigo confrontá-la! E por isso carrego dentro de mim essa dor que
não me cabe…
Ando depressa até a cozinha e sirvo um copo generoso de
Bourbon, encaro o líquido marrom no copo decidindo se voltaria à
estaca zero. E naquele momento a imagem de Nadine me vem à
mente como um lembrete do porque tinha decidido parar, porque
tinha decido tentar…
E só naquele raro momento em que penso em outra pessoa
além de mim mesmo, é que consigo me manter firme. Levo os
dedos na boca e sinto o gosto de seu beijo, e a maciez dos seus
lábios nos meus, é como um lembrete sensorial. Fecho os olhos e
imagino seus braços em volta do meu pescoço, encarando-me com
aqueles grandes olhos brilhantes que me transportam pra outro
lugar…
Um lugar onde não existe nada além daquele lindo sorriso.
Derramo a bebida na pia e volto para o sofá onde continuo
me lamentando por não conseguir dizer a ela o que sinto. Dizer que
não quero manter somente um contrato, mas quero ficar ao seu
lado, fazer parte de sua vida, e beijar seus lábios todos os dias.
Quero dizer a ela que ardo de paixão. Que não consegui
controlar esse sentimento que tomou um espaço significativo dentro
de mim, e que agora não consigo mais dormir sem sentir o cheiro.
Quero dizer que ela é a minha cura, que me faz acreditar
que posso ser melhor do que eu jamais fui.
Eu poderia dizer a ela para esquecer dos nossos beijos, mas
se eu fizer isso, estarei selando o fim da esperança que ela mesmo
plantou dentro de mim. E seria um grande erro rejeitar esse
sentimento que me faz tão bem, mas que por algum motivo também
me paralisa, por que não sei se ela sente o mesmo. Não sei se a
Princesa realmente só quer se livrar da coroa, ou se existe algo a
mais que podemos viver juntos.
E o que eu faço? O que eu faço quando esse contrato
acabar?
Crio uma missão imbatível de encontrar a mulher mais
perfeita e incrível do mundo, só porque não consigo me declarar
para a mulher que eu verdadeiramente amo?
É engraçado dizer isso, eu realmente a amo…
E o que eu faço pra convencer o meu coração de que ele
deve continuar sozinho e esquecer o que tem sentindo por ela?!
Devo persuadir meu coração a se relacionar com outra
pessoa, e fingir que a felicidade é apenas saciar o momento? E me
convencer que outra mulher é o grande amor da minha vida, e
enganar a mim mesmo dizendo que a amo? E talvez aprenda a
amar com o tempo, porém lá no fundo, bem lá no fundo vai saber
que aquele cantinho especial jamais será preenchido, porque a
mulher que faz seu coração bater mais forte, não será ela…
Tento me concentrar no trabalho e não pensar no que
aconteceu na noite do jantar. Estávamos evitamos nos ver a sós, e
começo a pensar que essa é a melhor decisão.
— Dominic — Bella entra em minha sala sem nem ao menos
bater na porta.
— O que está fazendo aqui? — questiono colocando-me de
pé atrás da mesa.
— O que estou fazendo? Exigindo uma explicação. Casar? É
sério? O que aconteceu com “eu não quero me casar?”
— Aconteceu! — me limito a dizer evitando qualquer tipo de
discussão.
— Aconteceu? — ela solta uma risada alta regada de ironia e
sarcasmo. — Estava com ela, antes de terminar comigo? —
pergunta entristecida.
— Não, nosso relacionamento é recente.
— Tão recente que decidiu se casar? Ela está grávida?
— Bella, ela não está grávida, e eu não te devo explicações.
Não estamos mais juntos já faz meses.
— Não importa! Eu fiquei com você cinco anos. Cincos anos
perdidos em um relacionamento sem futuro. Dominic, eu tive
esperanças que um dia você fosse se abrir comigo, que fosse deixar
eu te ajudar e ficaríamos bem juntos…
— Preciso trabalhar, Bella. Era só isso que queria saber?
— Você é um idiota, sabia? Que mentira contou a ela? Que
história inventou pra ela aceitar se unir a uma pedra de gelo como
você? — desdenha limpando as lágrimas que teimaram em rolar por
seu rosto.
— Eu nunca quis magoar você. Nunca te prometi nada, e
nunca dei a entender que me casaria com você. Desculpa de
verdade se por alguma brecha minha você criou esperanças. Não
era pra ser assim.
— Não era pra ser assim? Ótimo, Dominic! Quem é ela? Uma
aproveitadora? Ou uma riquinha que vai tirar seu restaurante da
lama? — julga e acerta em cheio meu ponto mais fraco. Onde o
orgulho é ferido com maestria. Onde minha capacidade de me
reerguer foi lançada ladeira a baixo.
Não consegui disfarçar meu olhar inquieto, e com seus
grandes olhos azuis encarando-me com atenção, deixei escapar
sem querer que existia alguma coisa a mais.
— Ah — ela sorri irônica. — Então você teve coragem
mesmo de conquistar uma mulher somente para se aproveitar dela,
parabéns — bate palmas em deboche deixando-me irado por sua
petulância. — Nunca pensei que se rebaixaria a tanto. Quando
penso que não vou mais me surpreender com você…
— Dom — a voz macia de Nadine soa atrás de nós. Penso
que não seria uma boa aquele encontro, mas Nadine soube
conduzir a situação perfeitamente. — Desculpe, não sabia que
estava com visitas.
— Não tem problema, vida. Essa é Bella Albuquerque. Bella,
essa é Nadine, minha noiva.
— Muito prazer, quero que saiba que sou muito sua fã — diz
Nadine simpática deixando Bella sem graça.
— Obrigada! Parabéns pelo casamento.
— Obrigada, estamos muito felizes. Aconteceu tudo muito
rápido, mas pra que esperar se estamos apaixonados, não é mesmo
amor? — Nadine me olha com aquele lindo sorriso grande, que me
faz ruborizar de vergonha pela situação constrangedora.
— Tenho que ir, felicidades Dominic.
Bella sai apressada nos deixando a sós, engulo em seco
constrangido pela situação.
— Ela não esperou nem eu agradecer — Nadine brinca
sentando-se na cadeira de couro a minha frente.
— Você sabe que ela é minha… — pergunto intrigado e ela
interrompe.
— Sua ex.? Sei sim!
— Você é incrível, sabia!? — Abraço Nadine
involuntariamente.
Ao dizer sim diante de todos, senti meu peito apertar, não de
um modo ruim, mas de um jeito diferente, como se ele estivesse
sendo preenchido com uma felicidade absoluta.
E mesmo que eu não pudesse festejar e correr por todo
aquele salão demonstrando minha alegria, eu estava muito feliz.
Mesmo sabendo que amá-la é um tiro no escuro.
É inevitável não temer sabendo que estamos fadados ao fim.
Mas nesse momento só quero aproveitar cada segundo ao seu lado
e fazer o meu melhor pra conquistá-la. Fazê-la feliz todos os
momentos possíveis para tornar o nosso contrato de casamento o
mais especial quanto se pode ser especial.
Porque é fácil ter medo. Ter raiva. Odiar. Mas, amar é difícil, é
difícil se doar, e entender que você é dependente de alguém. Então
mascaramos nossos defeitos, e evitamos que as pessoas
descubram nossas fraquezas. Lutamos pra sermos independentes e
autossuficientes, mas esquecemos que todos esses sentimentos
são essenciais para a nossa vida, porém a escolha de permanecer
parado no mesmo lugar, sem tentar evoluir, é opcional.
E eu escolho tentar. Escolho fazer dessa oportunidade que o
destino me deu, a minha chance de curar minhas feridas, de deixar
meu passado para trás e amar e me deixar ser amado.
— Filho. Nadine. Apesar de simples, o casamento de vocês
foi lindo. Estou muito feliz por vocês. Este é meu presente de
casamento.
Dona Louise entrega um envelope nas mãos de Nadine.
— Quero que aceitem essa viajem e aproveitem muito.
— Obrigada dona Louise, mas não posso ir e deixar o
restaurante… — recusa Nadine.
— Ah, você pode sim! Já cuidei de tudo, o restaurante ficará
em boas mãos, não se preocupe. Seu trabalho duro será mantido.
Prometo!
Mamãe cruza os dedos sobre os lábios e me lança um olhar
convincente.
— Se quer que pareça verdade, acho que poderia aceitar.
Faz bem se divertir um pouco, sabia?! — sussurro em seu ouvido
para convencê-la.
Ela sorri.
Capítulo 25
— É… Você casou mesmo, e parece que está muito feliz —
comenta James cabisbaixo.
— Casei. Agora você é o único herdeiro do trono de
Liechtenstein — declaro emotiva.
— Queria me desculpar por ter sido um imbecil com seu
marido e com você, eu estava preocupado e me deixei levar — ele
se desculpa revirando os olhos por ter que admitir que foi
inconveniente.
Nunca brigamos antes e isso com certeza me chateou.
— Não gosto de brigar, você é meu melhor amigo, James,
meu irmão. Jamais, nunca, vou te culpar por minhas escolhas, muito
pelo contrário, sou grata porque mesmo não concordando, você
esteve ao meu lado. Quero que volte para casa, e mostre ao papai
que você é merecedor daquele trono.
— Você gosta dele, não gosta? — James me olha com
ternura segurando em minha mão.
— Gosto, eu gosto muito dele, James — dou de ombros. —
Eu não queria gostar, não queria misturar esse contrato com
sentimento, mas aconteceu. Eu tenho me afastado, tenho fugido do
que estou sentindo, mas eu sei que vai chegar uma hora que não
vou conseguir mais fugir.
— Você acha que ele gosta de você?
— Talvez! Dominic tem um bom coração, é cavalheiro,
educado, sensível, mas carrega consigo um peso que não é dele, se
isola e se tranca em um mundo solitário e sombrio. E não sei se
consigo lidar com isso, então eu fujo, fugo pra não deixar que esse
sentimento se intensifique por querer provar a mim que ele pode
mais, sabe … — desabafo e James me abraça com carinho.
— Não vou dizer pra sair disso, porque agora você está
atolada até o pescoço, mas vai com calma, Nadine, não precipite as
coisas, deixa elas acontecerem naturalmente, você saberá o que
fazer no momento certo. Só quero que seja feliz.
— Obrigada irmão. Agora vai, porque eu vou pra Itália. E pela
primeira vez vou pra me divertir, sem guardas, sem regras, sem rei,
só eu e Dominic. — Balanço os ombros dançando divertida e ele ri.
— Boa viajem, Princesa, se cuida e me liga sempre. Vou
tentar segurar o papai o máximo que conseguir, mas saiba que
quando voltar terá que enfrentá-lo.
— Eu sei, mas não vou pensar nisso agora.
James sela um beijo em minha testa e segue de volta para
Liechtenstein, e eu para o aeroporto com destino a Villa Di Saturnia
em Toscana. Estou nervosa, estarei sozinha com Dominic durante
uma semana, sem ter pra onde fugir.
— Você está bem? — ele pergunta atrapalhando meus
pensamentos.
— Estou e você?
— Bem. Você já foi pra Itália? — puxa assunto querendo
quebrar a tensão estranha que se instalou entre nós.
— Já conheci algumas cidades da Itália, mas, Toscana ainda
não.
— Pensei que príncipes e princesas viajavam muito — ironiza
deixando em evidência seu meio sorriso sarcástico.
— Viajamos, mas não é a mesma coisa. Não é todos os
lugares que podemos ir sem segurança. — Ajeito-me na poltrona do
avião ansiosa. — Aposto que vai ser muito mais divertido me sentir
uma pessoa normal, uma turista conhecendo um lugar novo.
— Com certeza vai ser.
— Me conta, como é lá — peço encarando-o de frente.
— Bom, a Toscana é uma das regiões mais incríveis da
Itália. Castelos medievais, vinhedos, ruazinhas de pedra, vales,
montanhas e uma atmosfera bucólica que parecem até cenário de
filme — Dom sorri com o pensamento longe. — Mas tem um lugar
especial e singular que eu amo, lindas cascatas de água azul
turquesa que formam piscinas naturais termais.
— Já estou ansiosa pra conhecer o seu lugar favorito —
comento deixando meu olhar pesar sobre o seu sem perceber.
Dominic retribui aproximando lentamente seu corpo do meu, e antes
que pudéssemos unir nossos lábios em um beijo, o piloto avisa que
estávamos prestes a pousar.
Sem graça pelo que ia acontecer, disfarço meu rubor e volto
a folhear o livro que estava em minhas mãos.
— O que está lendo?
— After — Mostro a capa sem achar que chamaria a atenção
dele.
— Lê pra mim! — pede tenso, como se quisesse se livrar das
próprias ponderações.
Respiro fundo contendo a surpresa. Abro o livro e uma
avalanche de sentimentos me invade, é tudo tão recente e novo pra
mim. Me sinto uma menina acuada, afundando-me no medo de
minhas próprias decisões.
Suas sobrancelhas se erguem me encorajando a ler, endireito
as costas no assento e coloco o livro em minha frente.
— Eu li centenas de romances na minha vida. A maioria
deles alegando que o amor era o centro do universo. Que poderia
curar qualquer dano dentro de nós. Isso é o que precisamos para
sobreviver. De Darcy para Heathcliff, eu pensei que eles eram tolos.
Esse amor era algo fictício, somente encontrado nas páginas de um
livro, mas tudo isso mudou desde que conheci minha Elisabeth
Bennet. Eu nunca pensei que me encontraria completamente e
totalmente consumido por outra pessoa, até ela. Ela pegou em
minha mão e me tirou da escuridão, e me mostrou que seja lá do
que nossas almas são feitas, a dela e a minha são a mesma. Eu
sinto muito, por favor me perdoa. Uma vez você perguntou quem eu
mais amava nesse mundo. É você.
Fecho o livro engolindo em seco a intensidade daquela carta
que retrata uma dor cortante, e familiar.
— Porque gosta desse livro? — questiona Dominic olhandome nos olhos.
— É um amor tóxico que tenta vencer as diferenças de dois
mundos completamente diferentes. Um amor que luta com todas as
forças possíveis pra sobreviver diante a tantas batalhas. Uma
mulher como uma rosa deslumbrante e inexperiente, e um homem
sombrio que a queria só pra si. Um amor que machuca como os
espinhos de uma flor…
Dominic respira fundo, desvia o olhar e depois volta a me
encarar.
— É um amor tão voraz que ele não se contenta em admirála de longe. E sabe que se por ventura arrancá-la de seu lar, se tirar
ela do seu mundo, ela vai murchar, e seus espinhos irão machucar
sua alma, e os dois não serão felizes. — Dominic me encara atendo
e apreensivo, ele está sentindo a intensidade daquelas palavras
tanto quanto eu. — É um amor que apesar de sombrio e doloroso
ensina que eles precisaram abrir mão, precisaram entender que
amar também é deixar ir. Porque se você não resistir a vontade de
arrancá-la do seu belo jardim, e a levar para um mundo onde ela
não pertence, ela não sobreviverá.
— (…) — Dominic tenta formular as palavras pra contestar o
que acabara de ouvir, mas não consegue, seus olhos se mexem
inquietos e se cala diante da poesia de um amor que não sabemos
se terá um final feliz. — Eles ficam juntos no final? — pergunta por
fim encarando o céu pela pequena janela do avião.
— Não sei, ainda não li o último livro. Espero que sim!
— Eu também.
O avião pousa e ao desembarcar entramos no carro alugado
por Dominic e partimos em direção ao resort, durante o trajeto não
conversamos, o silêncio incisivo é quase palpável.
— Posso abrir? — pergunto com o dedo em cima do botão
para abrir o teto.
— Pode, mas … — ele hesita ao ver meus cabelos contra o
vento. Sempre quis saber a sensação de andar em um conversível
com o teto aberto.
O sol batendo no rosto. O vento forte e frio arrepiando a pele
e brincando com meus cabelos soltos. Momento único. Ele me fita
encantado, mas evito olhá-lo. Estou curtindo demais a vista.
E por alguns instantes me vem à mente que temos muito em
comum com Tessa e Hardin. A inocência e inexperiência, lutando
contra um passado doloroso demais pra ser compartilhado. Uma
frustração monstruosa que não cabe dentro do peito, encontrando
na bebida um refúgio momentâneo. Uma válvula de escape pra fugir
de seus próprios fantasmas.
O carro passa por um enorme portão dourado, fazendo-me
prestar atenção nas luzes que guiavam minha visão pelo caminho
florido, mesmo a noite é possível notar a beleza surreal do lugar.
— Vamos ficar no mesmo quarto? — questiono sem pensar,
e a recepcionista me encara desconfiada.
Dominic me olha sem entender e tento disfarçar.
— É brincadeira. Ainda estou me acostumando com a vida de
casada. — Forço um sorriso falso. — Com certeza só tem uma
cama no quarto também, né!? — O olhar da moça fica ainda mais
duvidoso e forço um outro sorriso, dessa vez mais convincente.
O desespero por ficar no mesmo quarto que Dominic me
consome, fico nervosa, não sou de ferro.
— Por um minuto achei que estava com medo de ficar sozinha
comigo, Princesa — zomba Dom ao abrir a porta da suíte
presidencial. Parece até que leu meus pensamentos.
— Eu? Imagina, porque estaria com medo? Já dormimos na
mesma cama outras vezes. — Disfarço comentando um fato
verídico.
— Minha mãe não tem jeito! — Dom resmunga, colocando as
malas no chão.
— Ual… — admiro o quarto regado de pétalas vermelhas,
champanhe e toalhas em formato de cisnes, sobre a cama. Tão
romântico.
— Gostou?
— Claro que sim! Você não?
— Tanto faz! — ele responde seco e me incomodo com sua
mudança drástica de humor.
— O que foi agora, Dominic? Porque você sempre tem que
fazer isso? — Passo a mão no rosto tentando me controlar pra não
surtar.
Também é novo pra mim e nem por isso estou descontando
nele.
— Isso o quê?
— Isso, — aponto pra ele — por que tem que ser tão bipolar?
— Eu, bipolar? — Solta uma risada alta cheia de ironia. — Só
estou tentando levar isso da melhor forma possível. Só não me peça
pra mudar meu jeito também…
— Mudar? Do que está falando, Dominic?
— Estou casado, de lua de mel, em um relacionamento de
mentira. Tudo mudou, mas não vou entrar no seu jogo, Nadine. Não
vou participar da sua brincadeirinha de aventura de conto de fadas.
— Que brincadeira? Você ficou maluco? Do que você está
falando, Dom? Porque está falando desse jeito comigo? —
questiono chorosa sem entender porque um comentário sem malícia
se transformou em uma discussão sem sentido. — Pensei que
estava certo do que estava fazendo, não te obriguei a aceitar,
fizemos um acordo.
— É, um maldito acordo. Aproveite o quarto, vou dar uma
volta.
Ele simplesmente dá as costas e sai. Fico sozinha naquele
quarto imenso. Ao ouvir o eco seco da porta batendo, desabo em
lágrimas. Achei que pudesse confiar nele, achei que independente
de qualquer coisa, tínhamos nos conectado em uma amizade
verdadeira. Tola!
James estava certo, ele é um desconhecido. Impossível
conhecer alguém de verdade em apenas algumas semanas, ainda
mais uma pessoa cheia de camadas, que se esconde atrás dos
próprios sentimentos.
Que fere pra não ser ferido.
Magoa pra não ser magoado.
Mas não vou levar isso em consideração, sempre soube que
não seria fácil. Sabia que ele era único desde o dia que o vi no chão
daquele escritório, totalmente vulnerável. No dia em que se abriu
pra uma completa estranha.
E mesmo sendo consumida por esse sentimento avassalador,
não vou abandoná-lo, não vou deixá-lo sozinho, e não vou permitir
que me afaste, porque agora eu também não vou mais fugir.
Escrevo uma mensagem na esperança que ele enxergue
suas limitações e aprenda a conversar direito, como um homem
adulto.
Eu: Existe beleza nos lugares mais inesperados. Até mesmo
na escuridão. Existem lugares incríveis para serem conhecidos. Até
nos dias sombrios. E se não existir…Você pode ser aquele lugar
incrível, com infinitas possibilidades. Basta se permitir…
Ele não visualiza. Eu que não vou ficar chorando. Tomo um
banho rápido e decido saborear uma bela refeição no salão. Se é
assim que ele quer, sem problemas. Escolho um lindo vestido preto
com uma fenda generosa na perna direita. E logo penso em Vicenza
que colocou muitas roupas de piriguete dentro da mala.
Admiro a bela mulher de lábios vermelhos e muito sensual no
espelho, tiro uma foto e envio para Vicenza. Aproveito e posto no
Instagram. Se aprendi alguma coisa fora dos muros do palácio, é
que a gente pode ser quem a gente quiser, e hoje eu vou ser uma
mulher sexy sentada em um restaurante desfrutando de uma
deliciosa refeição e depois vou sentar no bar e pedir um drink, um
que eu jamais tenha tomado.
No elevador chamo a atenção de um homem muito bonito,
moreno, alto, e com um sorriso encantador.
— Está sozinha por aqui? — ele pergunta mirando-me com
malicia.
— Não. Estou com meu marido, — ele demonstra
estranheza. — Relacionamento moderno — acrescento lançando
uma piscadela e saio quando a porta grande de ferro se abre.
Após me acomodar em uma das mesas, sorri feito boba
admirando as pessoas, o lugar, tudo é tão magnifico em sua
peculiaridade. O restaurante traz em seu cardápio uma grande
variedade de receitas, a maioria culinária local.
Peço um pappardelle, uma massa achatada, feita com ragù
de javali. Já tinha feito essa receita com a Nana na mansão quando
papai organizou o baile de máscaras ano passado. Contudo, será
uma experiência única experimentar o prato feito pelas mãos de um
chef local e muito bem recomendado.
Peço uma taça de vinho branco que acompanha minha
refeição que está simplesmente divina. Mesmo sendo aspirante a
chef, e tido a oportunidade de experimentar uma lista incontável de
pratos dos chefs mais renomados do mundo inteiro, ainda não
consigo me acostumar com a sensação gratificante que o paladar
nos traz. O prazer de sentir a arte na boca, a mistura inédita de
ingredientes capaz de nos fazer sentir sensações únicas. Cada
cozinheiro com seu amor pela cozinha retratado em receitas.
Sigo em direção ao bar.
— Um Martine, por favor — peço sentindo-me o máximo por
estar tendo essa experiência sozinha. Bebo o líquido levemente
ardente em apenas alguns goles, saboreando o azedinho da
azeitona verde.
Depois de tomar mais quatro daqueles, sentia-me um pouco
zonza, mas não o suficiente pra dar a noite por encerrada. O celular
vibra e vejo o nome dele na tela.
Dominic: Não acha que já bebeu demais, Princesa?
Ao ler a mensagem olho para todos os lados procurando por
seu olhar vigilante, não encontro, ignoro.
Dominic: Se eu fosse você, ia mais devagar. Não é bom para
uma mulher sozinha beber desse jeito.
Bufo por não conseguir resistir a vontade de respondê-lo a
altura, enfurecida digito freneticamente.
Eu: Quem você pensa que é pra dizer o que eu devo ou não
fazer? Você me deixou sozinha, esqueceu? Então vai curtir sua
noite, porque eu estou ótima!
Vejo o rapaz do elevador do outro lado do bar me
observando, e já que o meu marido ciumento não vai aparecer,
vamos ver se ele aguenta jogar. Por que agora “eu” quero brincar.
Caminho devagar pra não cair, e apesar de me sentir mais
confiante, ainda sou aquela princesa desajeitada de sempre, me
aproximo do moreno alto.
— Posso te pagar uma bebida? — ele pergunta sorrindo,
deixando em evidência suas covinhas fundas.
— Deve! — respondo sentando-me ao seu lado.
— Dois Martines, por favor — pede voltando a atenção para o
meu sorriso.
— Mora aqui, ou está de passagem? — pergunto
despertando interesse.
— Estou aqui a trabalho, volto para Miami amanhã —
responde arrastando sua mão lentamente por cima do balcão.
E depois de beber todo drink, tudo gira, tento disfarçar
sorrindo feito uma boba.
— Nem perguntei seu nome — falo mais alto do que planejei.
— David Morello, e você? — Ele acha graça.
— Nadine Levy — respondo desvencilhando sua mão que
pousa sobre a minha. — Pode me trazer uma água, por favor —
peço ao garçom que me atende de pronto.
Não acredito no que estou vendo!
Encaro Dominic conversando com uma loira muito bonita em
uma parte mais reservada do bar. Não pude disfarçar meu
incomodo. Os cabelos dela brilham e ela é alta, parece uma modelo.
A mão dela desliza por cima da coxa dele e seu sorriso fácil se joga
em direção a boca dele. Dominic percebe meu olhar especulativo,
sua mão vai até o cabelo da moça, que o encara intensamente
esperando uma aproximação mais íntima.
Tudo bem? É assim que quer jogar Dominic Levy, veremos
quem desiste primeiro.
— O que você faz, David? — pergunto melosa sentindo a
brisa do álcool se esvair lentamente.
— Construção civil, e você?
— Hum, estou diante de um engenheiro — seguro em seu
ombro dando-lhe ousadia para me tocar também, ele não pensa
duas vezes ao acariciar meu braço. — Estou no início da minha
carreira gastronômica. Ainda vou ser uma chef muito famosa —
acrescento empolgada.
— Não tenho dúvidas… — Seu olhar escurece de desejo e
ele tenta uma aproximação, que recuso gentilmente com um abraço.
— Desculpe, você disse que era casada, e eu estou passando dos
limites.
— Tudo bem. Sem problemas, mas está ficando tarde, acho
melhor voltar para o meu quarto.
— Quer que eu te acompanhe? Prometo não tentar nada —
ele levanta as mãos em rendição e aceito. E antes de sair do bar,
lanço um olhar repreensivo para Dominic que me encara na mesma
medida julgando pela situação.
— Você é muito bonita, se eu fosse seu marido não te
deixaria sozinha um minuto sequer — declara o rapaz respeitando
um espaço considerável entre nós.
E antes que a porta do elevador se fechasse, Dominic
aparece destilando raiva e ciúmes.
— Sai! — ordena para o rapaz que me olha assustado. — Eu
disse pra sair de perto da minha mulher.
— Sem briga Dominic! O que pensa que está fazendo? —
questiono irritada por seu show.
— Ainda está aqui? — Dom encara David que assente e sai
para evitar uma confusão ainda maior.
— Que vergonha! — exclamo fitando suas costas tensas. —
Porque você faz isso?
A quietude no cubículo pressiona o ar deixando todas as
emoções à flor da pele.
— Estou falando com você, Dominic! — elevo o tom de voz,
sentindo minhas bochechas queimarem de raiva. — Porque fez isso,
o que quer de mim?
— Quero você! Só você… — sussurra ainda de costas.
— Dominic… — um fio de voz sai involuntariamente de meus
lábios e ele se vira encarando-me profundamente e com uma
aproximação brusca, declara luxurioso:
— Você é minha. Só minha, Princesa!
Capítulo 26
A porta do elevador se abre e a tensão se instala. É quase
palpável. Paramos frente ao quarto. Foi como flutuar até lá.
Dominic não desvia seu olhar do meu, passa o braço por mim
e abre a porta lentamente, e uma rajada de vento que não faço ideia
de onde vem percorre meu corpo. Talvez fosse nervosismo. Minhas
pernas amolecidas tremem, e um calor enlouquecedor sobe bem no
meio das minhas pernas.
— Estava com ciúmes? — ele pergunta e sinto meu corpo
entorpecer com a intensidade de suas palavras.
— Sim, fiquei com ciúmes! — assumo com a coragem que o
álcool me deu. Ele abre aquele maldito sorriso meia boca que me
tira do eixo e pressiona meu corpo contra a porta recém fechada,
obrigando-me a sentir seu hálito quente.
— Você é minha, Princesa… — sussurra possessivo em meu
ouvido, e meus olhos se fecham com o efeito hipnótico que sua voz
tem sobre mim.
Deixo-me levar quando uma de suas mãos acariciaram meu
rosto, descendo lentamente por meu pescoço e ombros. Minha pele
se arrepia.
Dominic está diferente. Entregue…
Entregue ao que sente por mim, ao momento, ao desejo…
— Dom… — Murmuro ao perceber que sou fraca demais pra
resistir a tudo o que estou sentindo por ele, porque apesar de negar,
e insistir que o que temos é apenas um contrato; naquele exato
momento tive a certeza que é muito mais do que eu posso imaginar.
— Quero você. Só você, Nadine — declara possuindo minha
boca em sôfrego, cedo, eu precisava sentir. Sentir seu gosto. Sua
verdade.
A necessidade de blindar meu coração me assola. Precisava
ter certeza que não seria em vão. Que não irei contra tudo, por uma
noite apenas.
Um piscar de olhos e eu estava de costas, sentindo a
temperatura quente de seu corpo contra o meu, seu cheiro, aquele
perfume impregnado em minhas narinas. Viciada. Eu quero mais e
mais a cada milésimo de segundo.
Sua boca toca meu pescoço com carinho, seu nariz roça em
minha pele e soo gemidos sussurrantes absorvendo sensações
jamais sentidas.
Estou pronta. Pronta para ser amada. Pronta pra me entregar
e contemplar a paixão que tanto desejei sentir um dia. A mesma
paixão que almejei lendo linhas e linhas de um amor envolvente.
— Tem certeza? — sua voz entoa em meus ouvidos, e não
consigo responder, meu coração bate tão forte que as palavras
simplesmente não saem.
Viro lentamente para encarar seus olhos. Quero vê-lo. Fitá-lo
nos olhos. Mirei em seus ombros largos e forcei-me a tocá-lo,
contornando seus braços fortes, deslizando por seu peitoral que se
mexia rapidamente por causa da respiração ofegante.
Mordo o lábio inferior chamando sua atenção para minha
boca. Não penso duas vezes e puxo sua camisa com força, os
botões se espalharam pelo chão do quarto. Abro um sorriso
malicioso analisando meu feito.
Princesa sim, ingênua não!
Eu já tinha visto Dominic sem camisa outras vezes, mas tocar
maliciosamente foi completamente diferente.
— Esse. Seu. Cheiro… — diz ele pausadamente cheirando
meu pescoço, fecho os olhos pendendo a cabeça para o lado,
dando-lhe total acesso ao meu ponto fraco. Um gemido abafado
escapa por meus lábios quando sua mão segura firma minha
cintura.
— Diz que você é minha, Princesa… Promete que serei o
único a tocar em você… — Sua boca me toma com luxúria e
urgência. — Promete que jamais ninguém beijará seus lábios…
Sua mão toma minha nuca puxando-me para mais perto,
sinto-o duro dentro da calça, fico nervosa e a coragem que a
minutos antes me dominava começa a me abandonar.
— Promete… — insiste.
— Prometo! — declaro baixinho em seu ouvido e posso sentir
um sorriso de alivio. — Serei somente sua… — acrescento
entorpecida por seu toque, mesmo sabendo que um dia vou me
arrepender por essa promessa. Sobretudo, nesse instante me forço
a acreditar que não haverá arrependimento, que o que estamos
sentindo é tão forte e especial que vai durar para sempre.
Sua mão desliza sobre o zíper de meu vestido, e segundos
depois o sinto escorregar por meus ombros. Passo os pés por ele
ficando apenas de lingerie. Exposta. Dom se afasta e mira meu
corpo como se estivesse vendo a mais bela cachoeira em meio a
um deserto ardente.
Seus lábios tocam os meus outra vez, e sinto sua língua me
explorar, deixo ele me tomar em seus braços sentindo a incrível
sensação de pele com pele. Ele está tão quente. Tão vulnerável em
meus lábios.
Nos arrastamos até a cama sem nos afastar.
Dominic está contido, explorando com calma e atenção uma
mulher inexperiente, como navegar em um continente
desconhecido.
Ele me olha com ternura enquanto acaricia meu rosto. Suas
pupilas dilatadas demostram cautela, ele não quer me assustar.
Está se esforçando para transformar minha primeira vez em um
momento especial com ele.
Dominic me coloca na cama, e sorri. Um sorriso aberto, não
aquele meio sorriso charmoso, mas um grande e brilhante. Retribuo.
A luz está baixa, e de repente notas suaves preenche todo o
ambiente, só então percebo que ele apertou o botão do controle
remoto. A cama ainda está cheia de pétalas de rosas, e o cheiro
delas ainda é notável.
Meu coração bate depressa, e o nervosismo começa a
dominar cada molécula do meu corpo. Não sei se o que estou
prestes a fazer é certo, mas eu quero. Quero muito.
De joelhos em minha frente ele passa a camisa pelos
ombros, tira o cinto da calça e os sapatos. Seu olhar verde-mar e
intenso não desvia dos meus. Ele me venera.
Minha pele se arrepia e sei que não é de frio.
Ele estende a mão para que eu me levante.
Faço o que ele incita. Em chamas. Ansiosa. Nervosa.
As costas de sua mão tocam meu rosto, e aprecio o toque
macio. Elevo a minha até sua nuca e tento agarrar seu cabelo curto.
Sua testa cola na minha. E sinto como se minha mente estivesse
decorando cada minuto. Cada sensação.
Estivemos tanto no ponto do quase, que agora parece um
sonho a ser recompensado pela espera.
— Não consigo parar de pensar em você. Eu não consigo
parar de pensar em você, Nadine… — ele sussurra, mas não me
olha. Seus olhos estão apertados como se relutasse em dizer. — Eu
penso tanto em você que meu peito arde. Eu acordo querendo te
ver. Sentir seu cheiro. E quando penso em fazer qualquer besteira
eu penso em você, isso me acalma. Te amo… Te amo tanto, tanto
que me sufoca, é como se estivesse sendo consumido por amar
você… Eu sou seu, Princesa…
Meus olhos marejam observando o quanto lhe custou essa
declaração. O quando lhe custou acreditar que sentia algo a mais
por mim. Coragem essa que ainda não encontrei.
Seguro na lateral de seu rosto forçando-o a me olhar nos
olhos. Ele hesita ainda cabisbaixo. Forço e então encosto meus
lábios nos seus.
Ele sorri.
Um sorriso espontâneo e feliz como se eu tivesse derrubado
mais uma barreira em seu coração.
Sinto o peso de seu corpo sobre o meu, os beijos cada vez
mais intensos. Sua mão acaricia cada parte do meu corpo
exercendo toda a sua experiência.
— Linda… Você é toda linda — elogia beijando meu pescoço
com carinho, descendo suavemente por meus seios. Sinto sua
língua quente os possuir com delicadeza. Arfo segurando em seus
cabelos.
Está tão gostoso que sinto que posso explodir a qualquer
momento. E quando sinto sua respiração quente tocar minha
calcinha, encolho as pernas e enrijeço o corpo. Reação involuntária
de ser tocada ali. Vergonha.
— Vou beijar você aqui, Princesa — sua voz sensual
acompanha seus dedos na lateral da calcinha rendada. Aos poucos
relaxo, seus dedos invadem suavemente meu ponto sensível, foi
impossível não gemer mais alto.
Estou sendo tocada.
Tocada na intimidade por um homem que jamais pensei que
seria meu primeiro homem.
Seus lábios me tocam. Sua língua desliza, e a cada
movimento sinto que sou capaz de enlouquecer.
Não pude deixar de pensar: como eu não fiz isso antes. É tão
gostoso…
— Dom… — Resmungo segurando em suas mãos enquanto
sua língua me domina.
Ele não perde o foco. Me instiga. Embriaga. Provoca.
Minhas pernas tremem, a respiração se acelera de repente e
sinto uma onda veloz de adrenalina passar por todo o meu corpo
como um tornado.
Ele me olha de baixo e sorri.
— Você não imagina como estou feliz por ser protagonista do
seu primeiro orgasmo — se vangloria buscando meus lábios que
ainda estão entreabertos buscando por fôlego.
Eu não queria mais esperar. É ele. Eu o escolhi para ser o
meu primeiro amor. Meu primeiro homem.
Desabotoo sua calça fitando-o com desejo. Dom me olha
como se estivesse na dúvida se assumiria a responsabilidade de
tirar minha virgindade.
— Dom, por favor… — suplico entre seus lábios. — Quero
você… agora…
Sem desviar o olhar do meu, fica completamente nu, seu
pênis duro e rosado roçando em minha pélvis.
Seus lábios me beijam com carinho, beijo molhado, intenso,
apaixonado.
Dom rasga o invólucro da camisinha e não faço ideia de onde
ela surgiu.
Meu peito se movimenta com rapidez. Estou com medo.
Minha pupila dilata e seguro em suas costas com força olhando para
baixo.
— Ei, olha pra mim — pede baixinho. Sensual.
Reluto um pouco.
Quando finalmente abandono a tensão, o encaro, seu olhar
está romântico, preocupado, atencioso.
Ele se movimenta devagar pra dentro de mim, sinto uma dor
desconfortável e aperto os olhos com força.
— Tudo bem? Quer que eu pare? — se preocupa parando no
mesmo instante.
— Não. Não para… — ordeno grudando nossas testas.
Meus gemidos amedrontados são abafados por seu beijo.
Deixo-o me envolver com seus movimentos lentos e coordenados.
Arfo ao senti-lo todo dentro de mim. Minhas unham marcam
sua pele. E meus gemidos ficam mais intensos acompanhando suas
investidas. Um arrepio passa por toda a minha espinha, e contemplo
na boca do estômago uma sensação incrível e maravilhosa, como
se Dominic preenchesse algo que faltava dentro de mim.
Com as pernas ao redor de seu corpo enquanto me penetra,
ele sussurra coisas em meu ouvido, eu não consigo entender, estou
absorta demais para prestar atenção em suas palavras, mas sei que
são de carinho.
E quando gozo pela segunda vez sentindo todo o seu amor
dentro de mim, meus músculos enrijecem e depois relaxam,
amoleço. Meu corpo pede descanso, mas ele continua, minutos
depois se entrega, explode gemendo baixinho com a cabeça
afagada em meus cabelos.
— Você é maravilhosa, amor… — Beija minha bochecha e
depois minha boca.
Fico quieta. Quero dizer alguma coisa. Qualquer coisa. Que
eu tinha gostado e que foi maravilhoso, mas não consegui.
Dom sai de mim, e me senti como se estivesse sendo
separada de uma parte de mim mesma. Foi estranho.
— Vou preparar um banho pra gente — ele diz.
Observo aquela beldade levantar e se enrolar no roupão.
Que homem! Que homem!
Obrigada senhora das calcinhas molhadas!
Escuto o barulho da água enchendo a banheira, e nesse
momento de solidão não consigo evitar o pensamento de decepção
que meu pai terá de mim.
Fugi de casa. Abri mão do reino. Casei com um estranho. E
acabei de me entregar completamente a ele.
Abro um sorriso desesperado tentando desvencilhar a
vontade de chorar. Estou feliz com o que acabei de fazer com
Dominic, não quero estragar. Afinal, é minha vida. Foi pra isso que
fugi sem olhar pra trás. Para viver como eu bem entender.
Enrolo-me na toalha e vou ao seu encontro no banheiro. Dom
está em pé perto da banheira colocando sais de banho.
— Você está bem? — pergunta preocupado.
— Sim! — respondo trêmula forçando um sorriso
convincente, que não foi o suficiente, pois ele continua me olhando
como se esperasse sinceridade de minha parte.
— Fiz alguma coisa errada? Você não gostou? Te
machuquei?
Ele se aproxima e segura em meu rosto.
Como pode ser tão perfeito, sendo tão imperfeito!?
— Você foi maravilhoso, Dom — abro um sorriso sincero. —
Amei cada momento, foi… — hesito. — Incrível.
— E porque está com essa cara?
— Não achei que iria tão longe… — sua sobrancelha se
ergue incentivando que eu termine a frase. — Com tudo, Dom, o
plano de fugir, de permanecer foragida da minha própria família, de
propor um contrato de casamento e casar com um completo
estranho por quem estou completamente apaixonada…
— Está? — seu tom é cômico. Surpreso.
— Estou… — Abro um sorriso leve e suas mãos envolvem
minha cintura.
Eu falei! Me declarei sem nem ao menos perceber.
Sua boca devora a minha. E um abraço me conforta.
Depois de um banho relaxante e demorado na banheira cheia
de espuma, com direito a massagem e muitos beijos, aproveitamos
o quarto; champanhe, chocolate e morango com chantilly.
Certamente eu estava ansiosa para conhecer cada cantinho
da Toscana, mas estar com Dominic e sua versão romântica
também é algo que eu estou adorando conhecer.
O sorriso espontâneo. Os gestos de carinho. Palavras de
amor e um olhar genuíno. Dominic me olha como se vivesse um
sonho. Um sentimento tão puro que o faz flutuar, é exatamente
assim que eu me sinto.
Acordo bem cedo, o sol ainda não saiu, mas sei que ele vai
despertar e nos contemplar com sua cor e temperatura
esplendorosa. Me espreguiço sentada na beirada da cama e um
sorriso bobo preenche meus lábios. Dom acorda e beija meus
ombros com carinho, e me sinto realizada.
Enquanto tomo banho, Dom pede nosso café da manhã, e
antes mesmo de pensar em desligar o chuveiro, suas mãos firmes
tocam meu corpo com firmeza. Fico em alerta.
— Gostosa… — sussurra em meu ouvido mordendo o lóbulo
da minha orelha. Ascendo de desejo querendo-o outra vez.
Quero fazer amor com ele outra vez. E só de pensar minha
intimidade lateja. Ainda estou desconfortável pela noite anterior, mas
isso não impede que ele me toque. Com as costas contra a parede
fria, absorvo o movimento de seus dedos em meu clitóris inchado.
Não demora muito e cedo. Ter um orgasmo logo cedo, digno de
roteiro de filme, é uma experiência que com certeza quero repetir.
O turismo na cidade é maravilhoso, e os lugares são
esplêndidos. Não sei como ainda não tinha conhecido esse paraíso
tendo as condições que eu tinha como princesa.
Dom me levou para comer em vários restaurantes na
Toscana, fico vislumbrada com o requinte e peculiaridade de uma
culinária incrivelmente rica em criatividade. Saboreei tantas receitas
que sou incapaz de escolher a minha preferida.
E se um dia alguém me perguntar quais foram os dias mais
felizes da minha vida, com certeza vou me lembrar dessa semana.
O dia que me entreguei pela primeira vez. Que andei pelas ruas de
mãos dada com um homem, — sorri. — Beijei Dominic na boca no
meio da calçada e não tinha nenhum guarda me vigiando, muito
menos uma acompanhante me repreendendo a cada sorriso
espontâneo e alto que eu dei.
Fiz compras, comi tudo o que deu vontade, me sujei com
sorvete… Foi incrível, por alguns instantes eu era uma criança
espoleta descobrindo um mundo novo.
Na saída de um dos restaurantes em nossa visita na cidade
vizinha, nos deparamos com a Tarantela italiana, não penso duas
vezes e começo a dançar junto com as mulheres que se
movimentam como pluma, imito seus passos e retribuo o sorriso
alegre que estampam em seus rostos, me entrego naquele ritmo
totalmente envolvente.
Dominic me observa de longe e então o puxo pelas mãos
forçando a se juntar a mim. Ele hesita. Insisto. Ele gira enquanto as
pessoas aplaudem, os homens gritam e as mulheres continuam
sorrindo alegres.
Eu ri tanto que as bochechas ficaram doendo.
Ao sairmos, nos despedindo de nossos novos amigos, foi a
melhor experiência que eu tive em toda a minha vida.
Senti meu espirito livre.
Feliz.
Estou realizando sonhos que pensei que ficariam apenas nos
meus pensamentos.
Apenas idealizados e guardados em uma gaveta.
Um sonho de uma vida que jamais poderia viver.
Sonhar nunca foi tão encorajador.
Capítulo 27
Estou em chamas.
Uma sensação estranha que invade meu corpo e minha
mente. Sem ar. Estou sem ar.
Encosto na parede fria do banheiro. A banheira enche
enquanto lembro que Nadine está nua em minha cama. Engulo em
seco. Ainda não acredito no que acabamos de fazer. Finalmente eu
a tive por completo. Inteira. Entregue.
Ter Nadine em meus braços desencadeou um medo que há
muito tempo eu não sentia. Medo de perder esse sentimento
absoluto que queima dentro do meu peito. De voltar a sentir a
escuridão em sua imensidão na minha vida vazia.
Não quero mais me sentir assim.
Não quero mais ficar sozinho. Quero ela.
Quero Nadine em minha vida. Todos os dias da minha vida.
A culpa de um passado solitário e de atitudes que não me
orgulho me fazem questionar se sou merecedor de estar com ela.
Porra, ela é uma princesa!
Será que sou mesmo merecedor desse amor? De ter sido
presenteado com sua ingenuidade?
Sinceramente não sei…
O sol nos contempla com seu calor e luminosidade. Observo
Nadine se trocar. Caminho morosamente até o closet e admiro seu
corpo esculpido em um lindo maiô preto.
— Desse jeito vou mudar de ideia em querer sair — elogio
sem disfarçar meu olhar predador. Quero muito fazer amor com ela
outra vez.
— Muito vulgar? — ela pergunta insatisfeita e insegura
encarando seu reflexo no espelho.
— Você está linda.
Ela sorri.
— Vou matar Vicenza quando voltar. — Ela ri se observando
em frente ao espelho. — Ela colocou somente essas roupas de
banho. Sabia que devia ter comprado outra naquela loja por onde
passamos.
— O único problema que se antes eu já tinha ciúmes de
você, agora terei muito mais — me aproximo encarando seus olhos
através do espelho.
Agarro seu corpo por trás e inalo seu perfume doce e
altamente viciante. Nadine está sexy e maravilhosamente gostosa.
Beijo seus lábios com ganância segurando-a pelo pescoço, ela vira
e olha para baixo sentindo minha ereção explodir dentro da calça.
— Dominic, — ela suspira meu nome sem conseguir
esconder o desejo.
— A culpa é sua — mordo o lábio inferior pressionando meu
corpo contra o seu.
Ela se entrega. Deslizo o maiô por seus ombros ajoelhando
aos seus pés.
Olho pra cima e ela me encara em chamas. Atenta. Quente.
Escorrego por dentro de suas coxas e abro suas pernas pra ter total
acesso a sua intimidade. Passo os lábios com delicadeza por sua
fenda úmida, ela estremece.
Seus dedos puxam meus cabelos e seu corpo arfa contra a
parede.
Ela geme alto, liberta de seus desejos mais ocultos.
— Dom? — alerta ofegante.
Introduzo dois dedos absorvendo a maravilhosa sensação de
senti-la excitada, pronta.
— Você está tão pronta, Princesa… — forço a dizer ardendo
de desejo
Sentia-me eufórico, ansioso pra possuir seus desejos mais
intensos. Seu gozo é meu… O seu prazer dela é meu e de mais
ninguém.
Ela me escolheu. Foi eu o escolhido para lhe apresentar o
prazer. O melhor dos prazeres.
— Dominic! — Seu tom se enche de urgência.
— Ainda não, Princesa, ainda não — barro seu orgasmo.
Quero sentir. Sentir sua explosão em volta de mim.
Ela me olha irritada, afoita.
Passo a camisa por cima da cabeça e me livro da calça, ela
me encara puxando-me para perto, tomando minha boca em um
beijo luxurioso.
Suas unhas deslizam em minhas costas, e o arrepio de seu
toque me consome como droga, uma dose de adrenalina altamente
viciante invadindo todas as moléculas e terminações nervosas do
meu corpo.
Nadine é minha cura e minha ruina. O trevo de quatro folhas
que me trouxe sorte, e por outro lado, a mesma que me coloca de
frente com meus medos mais profundos. Que me faz pensar que em
breve esse sonho bonito vai se transformar em um terrível pesadelo,
lançando-me de volta para o abismo.
— Quero você agora! — ela diz arrastando-me para o sofá.
Seu corpo esculpido sobre a camurça aveludada, contraste
perfeito.
Deito sobre seu corpo sentindo a temperatura quente de sua
pele. O cheiro adocicado. A ingenuidade se esvaindo pelos poros.
Navego por suas curvas decorando cada parte delas, Nadine
geme e me entorpece com sua entrega. Seu corpo enrijece quando
me enterro dentro. Está tão pronta que me movimento com
facilidade, entrando e saindo de sua intimidade.
— Dom…
Abafo seus múrmuros com um beijo carinhoso, cheio de
desejo e paixão.
— Dom! — Ela se desespera ao sentir o ápice se aproximar.
Suas pernas tremem e uso sua reação como combustível. Meto com
força esquecendo que horas atrás o sexo ainda era desconhecido
para Nadine, mas ela gosta. Pressiona suas mãos em meu quadril
acompanhando meus movimentos.
Seu olhar não é mais inocente e agora reside e aflora uma
sedução ardente. Um fogo que me atrai cada vez mais para o seu
mundo.
Respiração ofegante. Coração acelerado. O suor escorrendo
na pele. Sinto seu prazer se contrair em volta do meu pau, ele
desliza fácil com seu gozo. Ela sorri satisfeita.
— Quero ficar por cima — anuncia já se virando.
Urro de prazer quando ela senta encaixando-se em mim. Meu
pau desliza até o fundo sentindo toda sua extensão úmida e
apertada. Ela arfa lançando a cabeça para trás e a visão de Nadine
totalmente nua em cima de mim me paralisou. Seus seios pequenos
e durinhos balançando acompanhando seus movimentos.
Seus cabelos caídos como cascata sobre os ombros
emanava um perfume delicioso. Lábios contraídos. Olhar atento. Ela
geme baixinho envergonhada pela exposição.
— Nadine … — imploro sussurrante, não aguento mais
segurar.
— Goza pra mim, Dom — pede dengosa e sensual
acelerando ainda mais suas investidas.
Encaro seus olhos e deixo a explosão me tomar. Ela sorri
satisfeita caindo sobre meu peito. Ainda dentro dela acaricio seus
cabelos com carinho, o silêncio predomina. Gosto de me sentir
assim: seguro e sem necessidade de dizer nada.
— Dom — chama baixinho.
— Oi — respondo no mesmo tom.
— Foi incrível — declara e um sorriso bobo preenche meus
lábios.
— “Você” é incrível! — rebato selando um beijo em sua
cabeça. Ela me olha e seus olhos brilham. Um sorriso doce
preenche seus lábios e gravo essa imagem como uma linda
paisagem.
Queria saber o que se passa em sua cabeça. Na outra noite
praticamente me declarei como um adolescente loucamente
apaixonado e patético e ela não disse nada.
Será que não sente nada por mim?
Não. Se não gostasse aposto que não se entregaria pra mim.
Nadine não é dessas. Ela não se deixaria levar por um momento
esquecendo das virtudes pela qual foi criada, é importante pra ela.
— Estou morrendo de fome, vamos sair? — anuncia
cobrindo-se com minha camisa.
— Vamos!
Levanto agarrando-a pela mão, tomamos um banho rápido e
nos arrumamos pra tomar café no salão do hotel. Eu não quero ficar
pensando nos meus sentimentos, quero apenas curtir, deixar as
coisas fluírem naturalmente. Sobretudo, todas vezes que esses
pensamentos invadem minha mente, meu olhar fica distante, meu
coração acelera e pareço esmorecer em desespero.
— Você está bem? — ela pergunta bebericando um pouco
mais de seu suco de laranja encarando-me com atenção.
— Melhor impossível — minto tentando esconder o receio.
Ela é só uma menina crescida que acabou de sair de dentro
de casa. Está descobrindo o mundo aqui fora e se aventurando nas
descobertas, como fui capaz de me envolver nisso!? Desde que a vi
naquele aeroporto eu sabia que não tinha sido em vão aquele
esbarrão, mas confesso que ainda busco por respostas. O destino
não ousaria colocar a esperança em meu caminho para depois
tomá-la de mim! Ou ousaria?
Os últimos dias foram intensos, paixão, sexo, carinho e a
experiência de um relacionamento que eu jamais pensei em viver.
Carreguei sacolas. Fiz compras e até tive paciência para
esperar ela olhar as vitrines e se encantar com coisas tão simples.
Partimos em direção as nascentes de Di Saturtini. É lindo
demais. Sentados em uma das pedras com os pés dentro da água
contemplamos a calmaria estonteante. A temperatura aquecida e
relaxante que nos dá a sensação de leveza, como se estivéssemos
sendo lavados de todo o peso das nossas próprias frustrações.
Senti-me revigorado.
Tudo bem que o motivo da minha felicidade tem outro nome,
e não é de fonte.
— Dom! — Nadine chama minha atenção enquanto
chacoalha o pé na água. Eu estava atrás dela sentindo o calor de
seu corpo contra o meu.
— Oi amor.
— O que a gente faz agora? — indaga ainda olhando para
frente.
— Como assim?
— Tínhamos um contrato, aliais, temos. Mas eu não
esperava dormir com você, nem passar dias tão maravilhosos como
estes… — comenta e percebo vergonha em seu tom de voz.
— Não sei! — respondo e me arrependo em seguida por ter
lhe dado uma resposta tão superficial, mas eu também não sei a
resposta.
Imediatamente ela me olha espantada, eu sei, vacilei.
— Calma! Não é um não sei, de não estou nem aí, só não
tenho a resposta pra essa pergunta agora — expliquei, mas não a
convenci.
— Então o que me disse todos esses dias foi da boca pra
fora, Dominic?
Seus olhos me observam com decepção.
— Nada do que eu disse foi da boca pra fora, Nadine —
sentencio nervoso, não quero que ela pense que fui um cafajeste ou
aproveitador. Muito menos quero brigar. Eu realmente a amo.
— Estamos casados por um contrato idiota! — vocifera sem
se importar com as pessoas que nos olham atentos.
— Isso é ruim? Está arrependida, Princesa? — ironizo porque
eu não estou arrependido, muito pelo contrário, Nadine é a minha
ancora, eu estava me afogando ela me salvou.
Se hoje vejo a luz do dia e sinto a brisa leve em meu rosto, é
porque ela apareceu em minha vida. Porque está fazendo parte da
minha vida.
— Não estou arrependida, mas eu tinha planos Dom, eu tinha
planos e estava certa deles até me ver envolvida por você. Eu não
previ isso. Eu pensei que casaríamos, eu abriria mão do trono, e
pronto, em menos de ano tudo estaria acabado.
— É isso que você quer?
Ela respira fundo encarando as arvores acima de nós, faz
menção em dizer algo, mas é vencida pela covardia.
— Não sei! — exclama depois de alguns minutos. — Eu
sempre me vi tão presa com ordens e regras que jurei a mim
mesma, que quando tivesse oportunidade seria livre, eu iria atrás
dos meus sonhos.
— E gostar de mim te impede de ser livre ou de correr atrás
de seus objetivos? Que eu saiba você está indo muito bem no seu
curso de gastronomia. O restaurante está voltando a ter uma boa
clientela por sua causa.
Ela sorri, sabe que é verdade.
Entendo que tudo o que está acontecendo é novo.
Eu já me relacionei outras vezes. Já deitei em muitas camas.
Viajei pra muitos lugares diferentes. Contudo, pra ela é tudo uma
descoberta. Uma aventura que assusta.
A puxo para meu abraço e aconchego seu corpo entre
minhas pernas. Não sei dizer por quanto tempo ficamos assim, em
silêncio, apenas contemplando a obra de arte da natureza; as
árvores verdes e cumpridas se contrastando com o céu azul límpido;
as flores iluminadas com a claridade do sol dando aquele toque
especial na paisagem. Nos galhos os pássaros cantam sem parar; e
a nossa frente a nascente mais linda que já vi na vida, parecia ter
sido pincelada por um artista romancista, uma mistura inédita de
branco e azul-claro, que se destaca ainda mais entre as pedras
rústicas.
Um verdadeiro paraíso.
Depois do almoço resolvemos caminhar pela cidade. O
assunto do casamento ou dos últimos dias cessou por hora e
agradeci mentalmente por isso.
Mas não por muito tempo.
Diogo insiste em me ligar, e eu insisto em recusar suas
chamadas. Nadine está empolgada com o comercio local, comprou
presentes para Vicenza e até para o Diogo. Ela não tem ideia como
fica linda sorrindo assim.
— Este é pra você! — ela me entrega um boneco de madeira
e sorri.
— Pinóquio? — exclamo absorto e analiso o boneco em
minha mão tentando achar semelhança daquele boneco comigo.
Será que ela me acha um mentiroso?
— Você me lembra Pinóquio, esculpido a partir do tronco de
uma árvore seca por um entalhador. Pinóquio nasceu como um
boneco de madeira, ele que sonhava em ser um menino de
verdade, ele queria ser amado como uma pessoa de verdade.
Gepeto o amou mesmo ele sendo de madeira, assim como eu
gostei de você.
Nadine dá de ombros como se o que tivesse acabado de
dizer fosse algo simples, mas eu entendi o que ela quis dizer, eu era
oco, uma peça rústica, e mesmo assim ela viu potencial em mim,
me entalhou para que eu pudesse ser parte de sua vida,
independentemente do motivo real.
Abro um sorriso amando o presente. Passou a ser meu
objeto favorito.
E assim que desbloqueio a tela do celular meu sorriso se
desvai com o que leio.
Diogo: Não queria estragar sua lua de mel, mas seu sogro,
no caso o Rei de Liechtenstein se hospedou essa manhã no hotel e
está movendo céus e terras para encontrar, Nadine. Que por
coincidência é sua esposa e uma princesa, não é irônico eu não
saber disso?! Simplesmente tem um Rei hospedado no meu hotel.
Sua mensagem faz meu coração acelerar tanto que me falta
o ar. Encosto em uma parede qualquer e ali fico olhando Nadine
sorrir ao deslizar suas mãos pelos lenços pendurados em uma das
lojas. Seu sorriso é contagiante e sincero que me sinto culpado por
estragar isso.
Era o momento dela.
Nosso momento.
— O que foi? Você está bem? — Ela volta ao perceber que
não a sigo.
— Sinto muito! — falo sentindo meus olhos marejarem em
lágrimas.
Respiro ofegante. Acho que estou tendo um ataque de
pânico.
Nunca pensei em casar. Muito menos de mentira. Uma
mentira que se transformou em quase verdade, e com uma
Princesa. E agora pareço um bobo. Uma criança com medo de
perder o brinquedo favorito.
— Dom, respira. Olha pra mim — ela pede, mas meus olhos
não desgrudam da tela do celular, e isso automaticamente a faz
prestar atenção também.
Um gesto brusco e ela toma o aparelho de minha mão.
Segundos depois Nadine está sentada ao meu lado, em
choque. Muito mais tensa do que eu.
— O que eu faço agora? — sussurra, sua voz quase não sai,
parece mais um ruido desesperado. Tão desesperado que se
perdeu ao vento.
Eu quero consolar Nadine, ela precisa que eu diga alguma
coisa. Qualquer coisa, e o que eu fiz? Hrum! Fiquei igual a uma
múmia olhando-a se afogar no medo.
Só percebi que estava sozinho quando a vi longe, se
afastando cada vez mais. Minhas pernas estão amolecidas demais
para correr atrás dela. Continuo parado sentindo meu coração se
estilhaçar só de imaginar ela longe de mim.
O que o pai dela vai fazer? Será que vai obrigá-la a voltar
para Suécia? Será que vai obrigá-la a se divorciar de mim?
Não estou preparado pra isso agora.
Quando minha respiração volta ao normal, e me sinto seguro
para levantar, corro o mais rápido que posso atrás dela. Sei que não
vou alcançá-la, mas corro sem parar.
Apoio as mãos nos joelhos ao chegar em frente do hotel.
Recupero o fôlego e entro na recepção procurando por Nadine. A
atendente simpática confirma que ela passou por ali a pouco. Subo
pelo elevador. Estou nervoso. Minhas mãos soam enquanto encaro
os números se movimentando no visor da parede.
Abro a porta do quarto e vejo Nadine se mover depressa com
suas coisas nas mãos as colocando na mala.
— O que está fazendo? — me desespero.
— Vou pra outro lugar. Não vou voltar, Dominic.
Sua voz está trêmula, mas ela não chora.
— Espera! Vamos conversar — peço colocando-me a sua
frente. — ESPERA! — aumento o tom de voz quando ela me ignora.
Nadine senta na beirada da cama e trava o choro na
garganta. Não sei se pela minha voz dura, ou se está colocando pra
fora o medo que está sentindo nesse momento.
— Desculpe, não queria gritar com você — me ajoelho entre
suas pernas. — Também estou medo, não esperava que seu pai, o
Rei, fosse te encontrar. Pensei que conseguiríamos resolver isso um
dia — solto uma risada sarcástica que a faz rir também.
— Não quero voltar. Não quero deixar o restaurante. Não
quero deixar Paris. Não quero deixar você, Dominic.
Suas palavras aquecem meu coração. E sei que mesmo que
ainda não tenha dito com todas as letras que gosta de mim, ela
gosta, sei que gosta!
— Você é minha mulher agora! Ele não pode te forçar a
voltar. Além do mais, você é de maior.
— Você não entende… — ela levanta e caminha de um lado a
outro no quarto me deixando ainda mais nervoso. — Eu fui criada
pra ser uma rainha. Meus passos. Minha vida; tudo foi cronometrado
para que eu desse seguimento a dinastia da família real — ela para
em frente a janela e expira rápido como se todo aquele ar tivesse o
poder de acalmá-la. — Temos nossas próprias crenças, nossas
leis… um futuro traçado desde que nascemos, Dom. Quando fugi
coloquei em risco a minha própria família, o nome do rei e seu
mandato. Na hora achei que fosse o certo a fazer por mim, mas
agora, me sentindo encurralada, percebo que não pensei em todas
as possibilidades. Não pensei nas consequências que meu ato traria
a mim e para aqueles que coloquei em minha vida — acrescenta
apoiando as mãos na janela.
— Amor, escuta — aconchego suas costas em meu peito. —
Não vou permitir que nada e nem ninguém te obrigue a fazer o que
não quer. Você é minha esposa, nos casamos em Paris, e lá as leis
são outras — falo cheio de certeza. Com a mesma certeza que me
fez me declarar a ela dias atrás.
Nadine se vira de repente e me abraça. Seus braços me
envolvem com tanta força que preciso me equilibrar pra não cair.
Não sei o que nos espera ao voltar pra casa. Mas o que
estiver lá. Quem estiver lá. Vai ter que entender que eu a amo, que
o que sinto nesse momento transborda meu peito de esperança, a
mesma esperança que eu tinha antes de meu pai morrer. Eles terão
que entender que essa princesa desajeitada, sensata e cheia de
amor pela vida, colocou cor na minha.
Jamais senti por alguém o que sinto por ela. É assombroso.
Estou com medo desse sentimento novo que tomou conta de mim e
do meu coração; da minha vida. Em um dia estava falido e a beira
do caos, e no outro estava casado com uma linda Princesa,
totalmente dominado por ela. Escolhendo ficar sóbrio dia após dia
para que ela sinta orgulho de mim, pra que eu seja digno de estar
ao seu lado.
Porque estar com ela, me faz querer ser um homem melhor.
Capítulo 28
Meu coração está doendo. Uma angustia agonizante corrói
meu peito e não me deixa pensar direito. Eu quero gritar. Colocar
pra fora essa dor, mas não posso. Se eu pudesse não sentir medo…
Se todos pudessem me ouvir eu os faria compreender meus
motivos. Tentaria explicar, e com muita sorte eles entenderiam, mas
não posso. Sou obrigada a reprimir todos esses pensamentos e me
sentir absolutamente sozinha nessa luta pela liberdade.
Dentro do avião em direção ao meu pesadelo, mantenho-me
em silêncio. Dom cruza seus dedos nos meus e meu coração se
acalma com seu toque. Estou com medo do que me aguarda em
Paris. E sei que ele também está assustado e me sinto culpada por
tê-lo colocado nessa situação, temo só de pensar no que papai
pode fazer para prejudicá-lo.
Sem dizer absolutamente nada ele apenas acaricia seu
polegar em minha mão e me sinto segura, como se ele dissesse em
silêncio: Vamos dar um jeito. Sei que vamos.
Horas depois estávamos dentro do táxi a caminho do hotel.
Meu corpo pedia por um banho relaxante e o aconchego da minha
cama, mas a ansiedade de resolver toda essa situação falou mais
alto.
— Ei — Dom toca em me braço antes de passarmos pela
porta. — Independente do que aconteça, quero que saiba que estou
com você, entendeu? — declara sério, e meu sorriso espontâneo e
sem sentido o faz ficar na dúvida se havia entendido o que ele
acabara de dizer.
— Entendi! — respondo apreensiva.
Assim que a porta se abre e dou os primeiros passos para
dentro, vejo o exagero de guardas espalhados pelo hall da
recepção. De longe vejo Vicenza que me lança um olhar
desesperado e reconfortante. Desesperado porque ela parece estar
com mais receio do que eu, e reconfortante por que sabia que eu
daria um jeito em toda essa bagunça, e também porque ela é minha
amiga. Ela corre em minha direção e antes que os guardas barrem
sua aproximação desvio e encontro seus braços.
— Amiga… — ela murmura chorosa em meu ombro.
— Tudo bem. Vai ficar tudo bem — minto, eu não sabia se
tudo ficaria bem.
Os guardas se curvam a me reverenciam, isso me faz revirar
os olhos.
— My Lady, é bom saber que está bem — declara um dos
guardas de meu pai.
Não respondo.
Vejo James parado em frente a sala de conferências, abro
um sorriso angustiante de “eu sei que estou muito ferrada” e ele que
continua inexpressível.
— Quer que eu entre com você? — Dom oferece, mas nego
quase que no mesmo instante.
— Espere aqui! — oriento confiante.
Papai fechou o hotel apenas para ele, seus guardas e
seguranças pessoais.
Patético.
Deixo as malas no chão e me aproximo de James que abre a
porta lentamente, e antes de passar por ele lanço um olhar
repreensivo em sua direção, espero que esse encontro não tenha
nada a ver com ele. E mesmo com repulsa por essa dúvida, luto
contra a vontade de abraçá-lo.
— Nadine… — seu sussurro e olhar piedoso deixa evidente
que não contou nada, e fico mais tranquila. Confio nele, apesar de
que nesse exato momento não é isso que sinto.
Papai está parado de frente para a janela, perfeito em seu
terno de grife. Cabeça inclinada para cima como se estivesse
pensando no que fazer a respeito de toda essa merda.
A sala parece ter sido reservada como seu escritório
particular. Ele sabe que sou eu a entrar na sala, mas não me olha.
Continua parado olhando para fora, como se o que estivesse vendo
fosse mais importante do que eu.
— Pap… — Decido quebrar o silêncio, e sou interrompida por
sua voz branda.
— Sabe Nadine, durante todo esse tempo eu me perguntei
onde errei com você. Questionei minha conduta como pai, como
rei… Temi por sua vida, filha. Temi que algo de ruim tivesse
acontecido com você, mas agora entendendo um pouco toda a
situação, tenho a certeza que não criei uma princesa. Muito menos
uma rainha. Criei uma garota mimada, uma mulher egoísta que só
pensou em si mesma.
— Papai… — Tento me defender, e mais uma vez sou
interrompida, mas agora sua voz não está mais branda, está
alterada, alta e imponente. Ele finalmente me encara e gesticula em
minha direção.
— Eu ainda não terminei! — vocifera.
Engulo em seco e fico parada no mesmo lugar forçando
minhas pernas a continuarem enrijecidas.
Nunca fui capaz de bater de frente com sua autoridade.
Nunca contei a ele como me sentia porque sabia que ele jamais
aceitaria uma vida fora do reino. E eu estava certa!
— Você sabe como me senti como pai ao ler aquela carta?
Sabe quantas noites passei em claro movendo equipes de buscas
atrás de você? Guardas. Polícia, até investigadores! Não foram
poucas, Nadine! Não foram…
Sua voz parece perder a força com a tristeza e decepção.
E apesar de não estar arrependida, eu me sentia triste por
toda a dor e sofrimento que causei. Não dimensionei as
consequências, e sim, fui egoísta. Pensei somente em mim e no
meu futuro, por que por mais que ame meu pai com todas as
minhas forças, eu não poderia abrir mão de mim.
É minha vida.
E antes que eu pudesse falar qualquer coisa, papai joga todo
o seu peso sobre mim, abraçando-me com toda a sua força. Fico
sem reação. Seus múrmuros demostram que está emocionado. E
naquela demonstração de carinho, tenho a certeza que mesmo com
sua carranca grotesca e autoritária, mesmo estando bravo e
decepcionado ele ainda me ama.
— Agora vá! Arrume suas coisas, vamos para casa hoje
mesmo — orienta segurando-me pelo ombro.
— Eu não vou! — rebato e me afasto para encarar seus olhos
que me fitam surpresos.
— Como…
— Papai eu não vou voltar para casa. Não vou me casar com
o príncipe Willians. Não vou me tornar Rainha… — interrompo antes
mesmo que ele me fizesse perder a coragem.
— Como ousa, Nadine — ele se empertiga irado. — Você
ainda é minha filha e eu ainda sou seu pai e o seu Rei.
— Sim, e eu o amo, mas não estamos em Liechtenstein,
papai, aqui o senhor não é Rei, e não esqueça que eu sou de maior
e responsável por minhas escolhas.
— Nadine não me obrigue a te levar a força. Não me obrigue
a tomar medidas drásticas quanto a sua postura. Está sendo uma
menina minada e irresponsável. Como assim não quer se tornar
rainha? — ele ri sarcástico andando de um lado para o outro,
nervoso.
— Não querendo! Estou estudando, pai. Estou trabalhando
no restaurante do hotel, e estou indo muito bem. É isso que quero
fazer, papai — argumento orgulhosa pelo meu amadurecimento,
mas ele não se orgulha.
— James — papai eleva a voz chamando por meu irmão.
— Sim senhor! — Ele entra prontamente como se já
estivesse com a mão na maçaneta.
James me olha e sabe que as coisas não serão tão simples
de se resolver.
— Leve Nadine para pegar suas coisas, ela volta para
Liechtenstein hoje mesmo!
— EU. NÃO. VOU — dito pausadamente a fim de que ele
entenda de uma vez por todas que não manda mais em mim.
— E posso saber o que te faz pensar que pode decidir por si?
— Porque agora ela é minha esposa! — Dominic entra na
sala triunfante causando um silêncio absoluto.
Papai encara Dominic ao meu lado confuso, e quando sua
mão se arrasta até a minha entrelaçando nossos dedos em sinal de
apoio, papai fuzila Dom com o olhar, respira fundo e espera uma
explicação.
— Estávamos em lua de mel — limito em dizer sentindo meu
coração bater na boca.
Papai olha para James que finge estar tão surpreso quanto
ele.
— Isso é algum tipo de piada ou brincadeira de mal gosto,
Nadine? Não é possível que tenha se perdido de tal forma, minha
filha — repreende calmamente sem querer acreditar em nada do
que estava ouvindo. — Foram apenas algumas semanas… O que
esse homem te disse pra ludibriar você dessa maneira!? — ele anda
desolado de um lado para o outro, frustrado e furioso. — Nunca
pensei que passaria por uma situação como essa com você filha,
estou demasiadamente decepcionado, e com certeza, de onde quer
que sua mãe esteja, ela também está.
— Não ouse falar da mamãe, ela nunca permitiria que eu
vivesse infeliz somente pra seguir as suas malditas regras e leis.
— Minhas? São regras do seu país, Nadine. Onde você foi
criada. Onde o povo respeita a hierarquia e você querendo ou não,
My Lady, faz parte dela — rebate irônico e autoritário. — Você vai
voltar comigo, querendo ou não. Vamos cancelar esse casamento e
dar um jeito nisso! — diz como se existisse algum problema que
precisa de solução.
E no momento que pensei em sair andando e por um ponto
final naquela discussão terrível, um esbarrão na porta me faz parar.
— Príncipe Willians? — James e eu falamos em uníssono.
— Majestade, My Lady, Lorde James — ele se curva em
minha direção, puxa minha mão e sela um beijo sobre ela.
Ele simplesmente ignora Dominic ao meu lado.
— O que faz aqui Príncipe Willians? — papai questiona
confuso.
— Tentei acompanhá-los na viajem, infelizmente não deu
tempo, sobretudo minha chegada não é em vão. — Ele pega um
envelope da mão de seu guarda e caminha em direção ao meu pai.
— Não temos mais nada para conversar papai, nos
despedimos aqui! — falo depois de analisar toda aquela situação
constrangedora.
— Fique My Lady, acho que vai precisar se explicar, afinal,
você é minha noiva.
— Não, não sou, Willians! — rebato sem jeito pelo olhar
humilhado de Dominic.
— Willians? — ele repete sarcástico e entrega o envelope
para o Rei. — Sei que não é uma princesa indefesa precisando de
um príncipe encantado para lhe salvar, mas vou lhe ajudar a sair
dessa confusão em que se meteu.
Ergo a sobrancelha sem entender do que ele está se
referindo.
Papai abre o envelope e fica em silêncio enquanto observa o
que parece ser algumas fotos.
— Não estou com raiva, My Lady, só quero que tudo se
resolva pra voltarmos para o reino e seguir com nossas vidas — Will
encara Dominic que se mantém inquieto e em silêncio, segurando
com força minha mão.
— Não vou me casar com você. Nunca quis! Eu já me casei,
Dominic é o meu marido.
Ele ri. Na verdade, gargalha deixando o momento ainda mais
constrangedor.
Meus olhos começam a lagrimejar, sentia-me tão nervosa
que facilmente sairia correndo se minhas pernas não estivessem tão
bambas.
Dom aperta minha mão com força, e por incrível que pareça
me sinto segura com ele.
— Melhor respeitar a decisão de Nadine, estamos casados,
isso não vai mudar — Dom arrisca e Willians rebate:
— Pode acabar com a farsa — ele encara Dominic com
crueldade. — Pesquisei sobre você, não passa de um empresário a
beira da falência, um homem em puro declínio. Um alcoólatra.
Dominic não se defende, olha para baixo humilhado e depois
encara Willians com a mesma raiva. Seu maxilar enrijece e percebo
que está se segurando.
— Se eu estivesse no seu lugar teria vergonha de ter se
aproveitado da nobreza e ingenuidade de uma princesa rebelde.
Aproveitou de sua situação para…
— Para o quê? — papai interrompe as acusações tentando
compreender o que o Príncipe está insinuando.
— James fez uma transferência de alta quantia para Nadine,
que repassou para ele, semanas depois se casaram, não é
estranho?
Papai parecia aliviado, e muito mais irritado.
— Isso é verdade James? — ele o questiona sem aumentar o
tom de voz. — Sabia esse tempo todo onde sua irmã estava e não
se compadeceu de minha preocupação? — indaga decepcionado.
— James não sabia onde eu estava, mas sim, ele me ajudou
com dinheiro. E sim, paguei as dívidas do meu marido, o que tem de
errado nisso?
— My Lady, por favor, vamos acabar logo com isso, assuma
de uma vez que se casou com esse plebeu apenas para ter a opção
de abrir mão do trono. Está tudo bem, eu perdoo você, ainda quero
me casar com a senhorita.
Willians se aproxima e puxa minha mão, causando uma
separação inesperada do toque seguro de Dominic.
— O que tem de ruim nisso? — repete em alto e bom som —
Tudo! — Papai se aproxima ficando a poucos centímetros de
Dominic. — Então quer dizer que isso tudo não passou de uma
farsa? — Sua risada irônica nos atinge.
— Nada foi uma farsa. Amo a sua filha, e nos casamos,
aceite! — Dominic fala sem desviar o olhar de meu pai, que me olha
em seguida esperando que eu diga alguma coisa.
— Esse casamento será cancelado agora mesmo! James vá
atrás de um advogado — ordena. — E depois vamos conversar
sobre sua traição.
James bate os calcanhares para fora, mas antes que saia
grito:
— PARA!
Todos me olham.
— Não vou me separar. E ninguém mais vai humilhar
Dominic, ele cuidou de mim enquanto eu estava aqui. E foi eu que
propus pagar todas as suas dívidas em troca dele se casar comigo.
Sim, Príncipe Willians… — falo melindrosa a fim de provocá-lo. —
Tudo era, escute bem “era” uma farsa, mas não é mais, eu me
apaixonei, me entreguei…
— Você o quê? — papai se enrijece e parece um pavão em
alerta.
— Eu sou uma mulher adulta, e tomei minhas próprias
decisões. Não sou mais sua garotinha. Não sou mais a princesa
desajeitada que precisa de uma sombra a fim de controlar e
coordenar cada passo meu como se eu fosse uma marionete. Eu
cresci papai, e não serei mais parte do seu jogo de xadrez, não
serei mais uma peça manipulável para uma maldita hierarquia que
eu não aceito!
Papai se aproxima de mim e sem que eu esperasse essa
reação, sinto o baque em meu rosto. A ardência entorpece meus
sentidos, e não sei se é pela dor ou pela decepção dele ter
encostado a mão em mim pela primeira vez. Dominic ameaça ir para
cima dele, mas o impeço. Melhor não provocar ainda mais a sua ira.
— Não ouse desrespeitar o seu Rei dessa maneira! Posso
mandar prender você por desacato, sabe disso! Além do mais sou
seu pai — ele respira exasperado muito mais decepcionado com
sua atitude do que eu. — Não te reconheço mais como minha filha,
e pelo jeito você também não.
Capítulo 29
O que eu fiz?
Paralisada vendo a bagunça que eu mesma causei, sentiame sufocada. O ar não estava sendo suficiente para que eu
conseguisse respirar.
Seguro no braço de Dominic e ele sabe que não estou bem.
— Nadine — ele me segura pela cintura.
— Não consigo respirar — sussurro ofegante.
— Solte já a minha filha! — ordena papai puxando-o pelo
braço.
— Venha Princesa, eu te ajudo — Willians segura-me pela
cintura, sentia-me tão amolecida que não consegui recuar.
Dominic se afasta das mãos de meu pai e empurra Willians,
causando um grande transtorno. Os guardas se colocaram de
prontidão esperando somente a ordem do rei que encarava Dom
com fúria.
— Parem já com isso! — vocifero. Eles me olham atentos. —
Chega de briga. Chega dessa discussão sem sentido. — Encaro o
rei com desdém. — Papai eu não vou voltar para o reino, meu lugar
no trono será abdicado e passado para James. Está decidido! —
Príncipe Willians… — encaro seus grandes olhos azuis e topete
perfeito. — Não vou me casar com você. Aceite! Não será rei por
minha causa, tire essa ideia de sua cabeça.
— Você está bem? — Dom ignora todos a minha volta e se
aproxima. Ele não estava com medo de toda aquela autoridade e
hierarquia. Ele foi tão corajoso.
Abro um sorriso sincero em sua direção. Ninguém entende o
motivo da graça, mas eu entendo. Ele se preocupa mesmo comigo.
— Ei, fala comigo. Você está bem? — Dom se aproxima
segurando-me pela cintura. Não vejo mais nada.
Estou sorrindo. Correndo entre os jardins da mansão. O sol
quente e radiante aquece minha pele, e meus olhos brilham ao ver
Dominic perto do balanço florido. Corro em sua direção e sou
acolhida por seus braços fortes. Sinto-me protegida. Aninhada em
seu peito. Ele sussurra algo em meu ouvido, mas não consigo
entender, presto atenção em seus lábios, mas continuo sem
entender o que ele diz. Seguro em seu rosto, peço que repita, e ele
se cala, me desespero, choro… ele limpa minhas lágrimas com o
polegar e me olha com ternura.
— Nadine… — uma voz conhecida me chama atenção. Olho
para trás imediatamente e vejo Alec, lindo e perfeito em seu traje de
general. Sinto orgulho ao vê-lo tão bem. Corro para abraçá-lo. Seu
cheiro é tão bom. Ele me segura forte e me sinto feliz.
— Nadine… — Dom me chama e sinto-me obrigada a
escolher em qual abraço ficar. O desespero por ter que escolher me
domina e petrifico. O desespero me desola e em um estalar de
dedos estou sozinha, o sol antes brilhante dá lugar a escuridão da
noite. Não tem lua. Nem estrelas. Só silêncio, vazio e escuridão…
— Nadine, por favor acorda…
Sinto um puxão e forço meus olhos a se abrirem. Estranho ao
notar que estou no quarto de hotel, o mesmo onde eu e Dominic
dormimos juntos pela primeira vez, enquanto ainda éramos meros
desconhecidos.
Ele suspira aliviado e me abraça. Vejo papai, e James na
saleta, eles olham para nós e se limitam ali.
— O que aconteceu? — pergunto confusa.
— Você desmaiou. Fiquei tão preocupado amor… — Dom me
abraça outra vez, dessa vez mais forte.
— Estou bem, foi só um mal-estar.
— Princesa — papai se aproxima e só então lembro do
sonho estranho que tive. Não estava interessada em outra
discussão com ele, só queria entender porque sonhei com Alec,
porque ele apareceu daquele jeito em meus sonhos.
Dominic me traz um copo com água e coloca uma bandeja
com salada e um filé de peixe em minha frente, exatamente como
gosto.
— Come! — ele ordena carinhoso e preocupado sentando-se
ao meu lado.
— Não estou com fome — murmuro afastando a bandeja
para longe.
— Você não comeu nada no voo, e nem quando chegamos.
Está pálida, por favor, coma um pouco — pede sem se importar com
a presença de meu pai ali.
Contrariada, arrasto a bandeja de volta para perto e me forço
a comer algumas garfadas.
Papai nos observa em silêncio encostado na soleira da porta,
o clima é demasiadamente estranho. Mal suporto olhar para ele.
James cabisbaixo encara o chão, papai deve ter lhe
ameaçado e o condenado ao fracasso como sempre faz.
— Podemos conversar? — papai arrisca chateado.
— Pode falar na frente de Dominic, ele é meu esposo, papai,
não temos segredos.
— Não consigo entender porque fez isso, o que eu te deixei
faltar, Nadine?
— Dinheiro. Sobrenome, e um cargo na política não é bem o
que eu esperava receber do senhor, pai! — Ajeito-me na cama
afastando o prato superficialmente mexido. — Depois da morte da
mamãe precisávamos do nosso pai, não do Rei. — Ele gesticula,
tenta achar palavras para se defender, e não as encontra. — O seu
apoio nos foi tirado por um rei tirano e autoritário. Éramos apenas
crianças, tínhamos perdido nossa mãe…
— Eu perdi minha esposa, minha companheira… — contesta.
— Mais um motivo para que ficássemos juntos, mas o senhor
fez questão de levantar uma barreira entre nós. Começou a nos
tratar como robôs vazios e sem sentimento. Fez de mim a sua
missão impossível para me transformar na mamãe, porém isso não
vai acontecer. Sou Nadine, uma mulher completamente diferente da
Rainha Esther, com sonhos e objetivos diferentes.
James se levanta e se aproxima de nós.
— James quer ser Rei, é seu filho, o homem que usa de seu
tempo pra ser melhor a cada dia. Ele se dedica tanto, mas o senhor
não vê… — Aponto para ele que me olha indeciso.
— Isso não é verdade… — papai empertiga desolado.
— É sim! O senhor me treina para ocupar uma monarquia
arcaica e machista na qual eu não quero fazer parte. Já se
esqueceu o que mamãe achava disso?! Ela nunca concordaria com
isso, nunca me obrigaria a ocupar um lugar onde eu não estaria
feliz.
— E o que eu faço, Nadine? Existe leis. Como posso dar o
exemplo ao nosso povo, se dentro de minha própria casa as regras
não são seguidas?!
— Explicando a mesma lei que me dá o direito de abdicar o
trono. Me casei com Dominic, pai! Está feito!
— Você fala como se fosse fácil. Você fugiu, deixou seu noivo
no reino e se casou com outro. Onde fica a sua responsabilidade,
Nadine? Onde fica o nosso nome com os Donavan? Casou com
um… — hesita olhando para Dominic que se arma para se defender.
— Fez um contrato! Um contrato! — levanta as mãos ao céu
derrotado. — Se a mídia descobre uma coisa dessas estamos
arruinados. Quer destruir o império que eu construí durante toda a
minha vida?
— Não quero destruir nada, só quero viver minha própria
vida, não pedi para fazer parte disso. Esse legado é seu, não meu.
— Ok, Nadine. Você venceu! Se é assim que quer, eu vou
respeitar sua decisão, como sua mãe dizia, criamos filhos para o
mundo, não é mesmo!? Treinarei James para ser Rei assim que o
documento oficial decretar sua abdicação.
Sorri satisfeita. Como assim ele aceitou tão fácil?
— Uma única condição — acrescenta sem me olhar nos
olhos.
— Sim.
— Voltará para Liechtenstein e fará um casamento com as
nossas tradições. Daremos um jeito no sobrenome dele, com o
tempo as pessoas vão esquecer essa vergonha.
— Papai, meu casamento com Dominic tem um prazo de
validade, assim que o documento sair ele estará livre de mim — falo
sem pensar, esquecendo os momentos incríveis que vivi ao lado
dele.
— Podemos conversar a sós, Princesa? — Dominic me
encara apreensivo e papai se ausenta com James.
Fico de pé e ajeito-me em frente ao espelho. Estou péssima.
— É isso que quer? — ele questiona me observando através
do espelho.
— Isso o quê?
— Que o nosso contrato acabe.
— Não sei. Não quero te prender a isso. Mas, também não
quero perder você. Você aceitou se casar comigo por um motivo, e
não era por amor, Dom — soo fria e confiante, ele estreita os olhos
e pensa por alguns instantes.
— Mas agora é! O que a gente faz? Esquece tudo o que
aconteceu? Não valeu de nada pra você o que vivemos nos últimos
dias? — Dom se enrijece esperando uma resposta.
— Claro que valeu! — me aproximo segurando em seu rosto.
— Eu nunca me imaginei fazendo isso, propondo um contrato de
casamento para um estranho — solto uma risada alta e nervosa. —
Casei com você pra me libertar, e não posso prender você ao meu
mundo. O mesmo mundo do qual estou fugindo. Não é justo.
— E é justo fazer eu me apaixonar por você, Princesa? — ele
me encara sério e desesperado. — É justo me trazer de volta a
superfície e me deixar sozinho à deriva?
Foi intenso o que tivemos, e sinto por ele a mesma paixão
que ele sente por mim, mesmo que não tenha dito, é diferente.
Dominic está me fazendo parecer cruel em escolher a mim como
prioridade.
— Escuta, presta bastante atenção no que eu vou te falar,
Dominic Levy — ele me olha atencioso e aflito, os olhos marejados.
— Me apaixonei por você. Me entreguei a você de corpo e alma.
Nunca senti nada parecido por ninguém. Mas, talvez eu tenha me
precipitado em tomar uma decisão como essa, me casar… — sento
na cama soltando um suspiro profundo e duvidoso. — Fugi para não
ter que casar e estou casada, qual o sentido disso?
— Pelo que eu entendi, casar comigo te deu a chance de
abdicar do trono, agora se tivesse casado com aquele projeto de
boneco “Quem”, teria que assumir o reino ao lado dele.
— Verdade — Rimos.
Dom senta ao meu lado e suspira, eu o entendo, está
assustado. É um sentimento novo pra ele também, sobretudo, muito
mais pra mim, e ele está fazendo eu me sentir cruel por cogitar
libertá-lo desse contrato.
— Se precisa de mim para manter sua reputação diante do
reino, eu vou — decreta baixinho segurando em minha mão.
— Dom, quando eu disse que em alguns meses tudo
acabaria eu quis dizer o contrato, não o que existe entre nós. Não
quero perder você. Mas sinceramente, não sei o que nos aguarda
daqui pra frente, o meu mundo querendo ou não é outro. Um
completamente diferente do que você conhece, está mesmo
disposto a passar por isso comigo?
— Quando nos conhecemos eu estava no fundo do poço, a
ponto de desistir de tudo… de mim. Você me salvou, fez eu sentir
meu coração bater novamente, fez eu querer viver outra vez —
encarou o chão envergonhado. — Sei que estou te assustando com
essa conversa, e não quero que se sinta mal, mas eu preciso saber
o que você quer, o que sente, porque preciso me proteger… Preciso
me proteger de você Nadine…
— Dom… — Encaro seus olhos. — No que se refere a
relacionamentos, eu sou inexperiente, sabe disso! É tudo novo pra
mim, e eu quero curtir. Quero viver esses momentos da melhor
forma possível, sem pressão, entende!? — ele assente. — Não
quero que se esqueça do nosso contrato, preciso dele pra seguir o
meu caminho, mas quero que esqueça os bastidores. Vamos só
deixar as coisas fluírem, pode ser?
— Como quiser, Princesa. Desculpe se fui insensível, eu só
me impressionei com essa questão de casamento real, e tradições…
— ele muda de assunto.
— Não é nada demais. Só preciso entrar na igreja de vestido
de noiva e a capa real que é passada de geração em geração.
Depois fazemos um desfile de carruagem, como se fosse uma
marcha nupcial.
Ele ri divertido e a carranca tensa de antes dá lugar a um
sorriso brilhante. Adoro quando ele sorri assim. Sorriso grande e
aberto.
Papai bate na porta e entra com James.
— Partiremos pela manhã, estejam prontos.
— Não podemos ir assim. Acabei de voltar da lua de mel e
preciso ver como está o restaurante… — argumento preocupada.
— Ele vai sobreviver sem você por mais alguns dias, não se
preocupe.
— Mas papai… — contesto.
— Não faça eu questionar minha decisão, Princesa. Já estou
sendo complacente demais com todo esse devaneio. Não me teste.
Bufo estarrecida, pensando em novos argumentos.
Mas não os encontrei, porém sentia-me poderosa em
questioná-lo.
Meses atrás eu não ousaria.
Capítulo 30
— Aiiii — grita Vicenza ao entrar no jatinho particular do Rei. —
Eu estou tão ansiosa, não tô acreditando que vamos pra um palácio
de verdade!
O Rei sentado no assento da frente não olha para trás, apenas
balança a cabeça inconformado.
Nadine encara o céu pela janela pequena, pensativa,
distante.
Diogo ficou no hotel, vai nos encontrar no final de semana
para o casamento e minha mãe, bom, ela não perderia essa
oportunidade. E apesar de Dona Louise ainda estar sem entender
como pude me casar com uma princesa e não contar nada a ela,
está adorando todo esse tumulto real.
A chegada do Rei em nossas vidas me deixou inseguro, acho
que nunca tive tanto medo, como estou tendo agora, e não sei se é
pelo fato da dependência que criei com Nadine, ou pelo simples fato
de estar lidando com pessoas importantes.
Quem sou eu nessa história!?
Um idiota. Sim, estou fazendo papel de idiota sem nenhum
esforço. Implorando pra estar com uma mulher que só quer viver
livremente, e meu jeito controlador e possessivo não está facilitando
muito. É incontrolável, quando vi, já estava sentindo meu coração
bater apertado, e um calor melindroso aquecendo meu corpo me
fazendo falar coisas absurdas, talvez seja abstinência. O álcool
costumava me fazer pensar melhor.
Nunca me senti assim, perdido e incompreendido. Sem saber
o que fazer ou pensar. Desde a morte de meu pai me tornei um
homem prático, sem muitas complicações, principalmente no que se
refere a mulheres, mas parece que fui colocado à prova de minhas
próprias convicções.
Nadine chegou como um furação, abalando minhas
estruturas, limpando meu interior com seu jeito doce e desajeitado,
que me faz rir só de lembrar. Eu confiei meus medos mais secretos
a uma mulher que eu mal conhecia, porque somente com seu olhar
escuro como a noite e brilhante como a lua, ela me fez sentir
seguro. Envergonhado. Sim, eu me senti envergonhado por ela ter
presenciado meu lado mais sombrio, derrotado e fraco.
Absorto em meus pensamentos, assusto-me quando Nadine
levanta de seu assento e me olha indo em direção ao banheiro.
Vicenza leva na malícia aquela situação e me cutuca com o pé
apontando para o fim do corredor. Naquele momento meus
pensamentos se dispersam e discretamente vou atrás dela.
Coloco a mão sobre a maçaneta da porta estreita do
banheiro, ela se abre e encontro seus olhos vivos e amendoados
me encarando, brilhando e ardendo de paixão e adrenalina. Nadine
me puxa para dentro.
— O que está fazendo, Princesa? — pergunto desejoso, eu a
queria é claro, mas saber que seu pai, seu irmão, o ex. e minha mãe
estavam a poucos centímetros de nós, não estava ajudando muito.
— Quero que faça amor comigo — pede abrindo os botões
de minha camisa.
— Agora?
— É, agora!
A pressão da plateia não permite que meu amigo se
apresente. Nadine abre o cinto e o zíper da calça colocando suas
mãos macias no meu pau escondido.
— Não faz isso comigo — murmura me olhando nos olhos,
massageando meu pau com ganância. Ela está sedenta.
Enlouquecida.
O que é mais uma vergonha para a lista, não é mesmo!?
Beijo sua boca com vontade, explorando seus lábios,
mordendo, lambendo, chocando nossos corpos na parede do
banheiro apertado. Levanto seu vestido puxando sua calcinha para
o lado, ela arfa ao sentir meus dedos dentro dela. Está tão pronta.
Sua cabeça é lançada para trás dando-me a chance de deslizar seu
pescoço com a ponta da língua. Nessa altura até me esqueci onde
estávamos, e com quem estávamos.
Enlaço uma de suas pernas em minha cintura e não me
acanho em sorrir ao ver que ainda não perdi o jeito em meio a um
momento de pressão. Ela sorri ao senti-lo duro e rígido, latejando
para sentir sua bocetinha quente e molhada. Pressiono seu corpo
contra a parede, enterro meu pau dentro dela, e ela geme. Calo
seus ruídos com um beijo molhado. Suas unhas se agarram em
minhas costas com força, ao sentir fundo minha vontade em possuíla por inteiro.
— Você é doida — sussurro ofegante em seu ouvido.
— Você não tem ideia.
Meto com força. Selvagem. Diferente das últimas vezes em
que fizemos amor.
Nadine estremece, seu corpo amolece e a seguro com
firmeza ainda dentro. Ela sorri e pede mais, obedeço como um
verdadeiro submisso, como um cachorro obediente.
Onde está toda a minha experiência de macho alfa?!
Com ela não! Com Nadine não consigo ser assim, só sei ser
uma versão desconhecida de mim mesmo. Melhor, talvez! Com
certeza melhor.
Gozo enchendo-a com todo o meu prazer. Abraço seu corpo
esguio afagando seu rosto em meu peito.
— Acho melhor voltarmos — digo forçando-me a soltá-la.
Saio primeiro e sou surpreendido pelo boneco pálido do ex.
— Acho que não tem noção com quem está lidando! —
ironiza de braços cruzados. Ignoro sua provocação e sigo para meu
assento, ele me segue achando-se superior, como se eu devesse
satisfação por alguma coisa.
— Estou falando com você — Willians me puxa pelo ombro.
— O que quer? Não te devo satisfação alguma — rebato
enfurecido, com uma vontade incontrolável de golpeá-lo com um
soco, certamente ele merece por ser um babaca petulante.
— Perdeu o respeito? O rei bem ali e vocês fazendo… — ele
hesita procurando uma palavra adequada.
— Sexo? Bom, coisa que acho que você não faz — sorri em
tom de deboche. Ele se arma. — Nadine é minha esposa, aceite!
Não tenho nada a ver com o passado de vocês, sinto muito se ela te
abandonou, mas isso não é problema meu — acrescento sem dar a
chance de ouvir sua resposta.
Minutos depois Nadine senta ao meu lado, se apoia em meu
peito e logo adormece.
Vicenza sorri cheia de malícia deixando James
desconfortável que olha constantemente em direção ao Rei que
continua feito uma estátua.
Minha mãe me olha preocupada. Até que ela está lidando
bem com as novidades das últimas horas. A impaciência começa a
me dominar. O Rei olha para trás encarando meus olhos, sua filha
deitada em meu peito dormindo feito um anjo, ele observa por
alguns instantes. Meu coração se acelera. Por algum motivo óbvio
ele me deixa muito desconfortável.
— Tudo bem, filho? — Dona Louise pergunta segurando em
minha mão.
— Tudo.
— Não quer me contar nada? — insiste sob o olhar vigilante
de James e Vicenza.
— Não! — rebato nervoso.
Respiro fundo quando o carro estaciona em frente a um
grande portão dourado. A mansão que Nadine dizia morar, não é
nada comparado com o que imaginei. É muito maior.
Vicenza e minha mãe não se acanham e entram atrás do Rei
que por um bom motivo estava as tratando cordialmente bem
mediante a situação.
— Vai ficar tudo bem — Nadine segura em minha mão,
encorajando-me a entrar.
— Plebeus! — zomba Willians passando por nós.
— Não liga pra ele — diz Nadine selando um beijo doce em
minha bochecha. Sorrio enchendo os pulmões de ar, e entramos.
Passamos pela porta grande e nos deparamos com uma
quantidade enorme de funcionários, todos a postos. Uma senhora
negra de cabelos encaracolados corre e abraça Nadine com força
soltando nossas mãos.
— Minha menina — choraminga ela em meio a um abraço
apertado. — Fiquei tão preocupada com a senhorita.
— Estou bem Nina, não se preocupe. Quero que conheça uma
pessoa — ela olha pra mim. — Esse é Dominic, meu marido. — O
olhar da senhora se escurece e um grande ponto de interrogação se
faz.
— Muito prazer, dona Nina — estendo a mão para um
cumprimento enquanto ouço burburinhos das outras pessoas.
Ela acena com um gesto delicado, e não diz nada.
— Escutem bem — o Rei eleva a voz chamando a atenção de
todos — A Princesa Nadine está bem e a salvo, não há o que temer
— eles riem e se abraçam olhando para Nadine que reverencia a
todos com um sorriso discreto.
Aguardei ele dizer que estávamos casados e que teriam um
casamento para organizar, mas ele finalizou seu discurso breve e
saiu, sumindo pelo corredor enorme.
— My lady, que bom que está de volta — diz uma senhora
carrancuda e antipática que mirou Nadine de cima a baixo, talvez
estranhando suas roupas.
— Obrigada! Vem Vicenza, vou te mostrar o seu quarto. A
senhora também dona Louise.
Seguimos Nadine por uma linda escada de tapete vermelho e
corrimão dourado. Eram tantos detalhes que seria impossível
decorar.
— Esse quarto é todo pra mim? — Vicenza vislumbra o
quarto grande e espaçoso com uma luxuosidade fora do normal.
— Claro que é! Aproveite. — Nadine sorri contente.
O quarto de minha mãe é bem parecido com o outro, e ela só
consegue sorrir, estática com a realidade em que seu filho se meteu.
— Você vai ficar no meu quarto senhor Levy… — Nadine
sentencia audaciosa. Acho que criei uma provocadora nata, ou só
fiz florescer?
Entramos para o quarto. É lindo nos tons de branco e salmão.
Nadine me agarra pelo pescoço e me surpreende com um beijo
apaixonado.
— Onde está seu pai — interrompo o beijo preocupado. Não
quero ser desrespeitoso igual fui no avião.
— Cala a boca e me beija — ordena e obedeço obcecado por
essa nova versão. Essa com certeza é enlouquecedora.
— O que pensam que estão fazendo? — A porta se abre
bruscamente e somos pegos desprevenidos.
Capítulo 31
Um fogo ardente consome meu corpo cada vez que penso em
Dominic. Sinto-me luxuriosa, sem conseguir entender como ele
consegue extrair do meu âmago esse desejo incontrolável.
Ainda não acredito que o provoquei até realizar minha
fantasia de transar no avião, sobretudo fui irresponsável,
desrespeitei meu pai, e Willians, querendo ou não, devo explicação
aos dois. Contudo, não me arrependo, foi incrível. E quero mais,
muito mais…
Meu coração quase salta para fora do peito ao ver papai feito
um dois de paus em minha porta. Onde já se viu entrar no quarto de
uma dama dessa maneira!
— Estava mostrando o quarto para o Dominic — expliquei
nervosa enquanto Dominic tentava disfarçar o constrangimento.
— Mudou o jeito de apresentar um cômodo e eu não estava
sabendo, Princesa? Achei que se via com os olhos e não com a
língua — bufa papai enraivecido.
— Não estávamos fazendo nada demais, papai. Dom é meu
marido, não vejo problema em beijá-lo.
— Ele ficará no quarto no fim do corredor. Ninguém sabe que
estão casados, então mantenha discrição — orienta sério dando as
costas para nós. — Vamos Dominic, eu mesmo vou levá-lo até seus
aposentos.
Papai nos deixa desconfortáveis, e não ousamos questionar.
Dominic o segue desconfiado e temo que meu pai o assuste, sei
bem como ele é assustador e persuasivo quando contrariado.
Caminho até o quarto de Vicenza e a encontro admirando o
jardim através da sacada.
— É tão lindo amiga — declara com os olhos marejados
depois de uma virada rápida para me fitar.
— É sim, isso por que não viu o jardim de inverno, — ela sorri
empolgada. — Prometo te levar lá — acrescento.
— Onde está seu marido?
— Papai o levou para se acomodar. Disse que até nos
casarmos ficaremos em quartos opostos.
Vicenza me observa em silêncio por alguns minutos, senta na
cama e arrasta a mão para que eu sente ao seu lado.
— Sabe o que percebi?
— Hum! — murmuro em curiosidade.
— Estar presente na realidade que foi criada te deixa frustrada.
É perceptível em seu tom de voz. No seu olhar. Você fica reclusa.
Pensativa. Sempre atenta com o que vai dizer, ou fazer, nada
parecido com a Nadine sonhadora, espontânea e determinada que
conheci.
— Eu sei — suspiro expulsando o ar pesado e profundo de
dentro do meu peito. — Toda essa história foi longe demais, Vi.
Pensei que quando assinasse a petição com minha exoneração,
estaria livre da opressão de meu pai e do reino, mas não medi as
consequências. Coloquei Dominic no meu mundo e agora estou
com medo do que meu pai pode fazer. Medo do que eu estou
sentindo, e do que ele está sentindo e de como está levando esse
nosso relacionamento.
— Nadine, vocês tiveram algo forte…
— Muito forte — acrescento maliciosa, lembrando das nossas
tardes de amor em Toscana.
— Não acredito! Perdeu a virgindade? — Vicenza levanta
dando pequenos pulinhos enquanto sorrio convincente.
— Shiii — peço descrição.
— Vai, me conta tudo! — ela senta de novo ao meu lado e
conto tudo o que aconteceu e como me senti sendo uma mulher
completa.
Foi bom mudar de assunto, não queria parecer tola ao falar de
como me sinto uma marionete em minha própria casa.
Dois dias se passaram e não consegui conversar com papai
sobre os preparativos do casamento, muito menos consegui ficar a
sós com Dominic. Nas refeições sentamos em lados opostos e Nina
não sai de perto de mim por ordens expressas do Rei, e o próprio
não sai de perto de Dominic, o enchendo com baboseiras reais.
Vejo tédio e desconforto em sua feição. Está se sentindo
deslocado, e sinto muito por isso.
Sem falar que o Príncipe Willians não foi embora, e
sinceramente não sei o que ele ainda faz aqui. Será que não se
cansa de ser humilhado?! Contudo, um pressentimento me faz crer
que ele não está aqui por acaso.
— Princesa? — Willians interrompe minha leitura no jardim.
— Sim.
— Podemos conversar?
Assinto fechando o livro em meu colo.
— Sei que está magoada comigo por ter exposto sua farsa de
casamento, mas quero que entenda que fiz isso por você. Por nós…
— Ergo uma sobrancelha em dúvida. — Ainda existe esperança
para nos acertarmos. Aceito você assim…
— Assim como? — questiono esbravecida. Levanto e me
coloco a sua frente.
— Você se perdeu. Se entregou a qualquer um, manchou a
reputação de sua família…
— Poxa, estou mesmo arrependida disso — zombo irônica o
deixando sem reação. — Escute bem uma coisa, Príncipe Willians.
Nós ficamos noivos pela vontade de meu pai e não pela minha. Eu
fugi, me casei com outro, me apaixonei e me entreguei, sim! Estou
feliz e é isso que importa.
— Eu não entendo. Fugiu pra não se casar e agora está
disposta a abrir mão de tudo pra continuar com aquele plebeu!?
Qual sentido de tudo isso?
— Talvez não tenha sentido, eu fugi pra não me casar com um
homem que eu não amo, casei com outro para abdicar de uma
responsabilidade que eu não quero. E agora irei casar diante do
reino por que estou apaixonada. Só posso acreditar em destino. —
Viro as costas para sair, mas ele insiste puxando-me pelo braço.
— Esse é o seu destino! — exclama convicto e recuo
eloquente.
— Mas eu não aceito esse destino! — exclamo petulante. —
Vocês não entendem, ou não querem entender? Eu quero viver
livre, sair dessa gaiola. Só aceite! — rebato e saio deixando-o
sozinho no jardim.
Vicenza já se familiarizou com a Nina e com a Nana, já até fez
amizade com os guardas e os seguranças da mansão, sem falar na
amizade repentina com meu irmão. Só quero ver quando Diogo
chegar. Será que está acontecendo alguma coisa que não percebi?
Não! James me contaria, ela me contaria…
Dona Louise está aproveitando os dias de folga e não parou
um dia sequer em casa, está estupefata com a cultura e comércio
local do reino. Realmente nossa cidade é muito bonita e exorbitante
com sua paisagem composta por muito verde; castelos e montanhas
altas e vistosas. No inverno elas ficam cobertas de gelo, realmente é
uma visão magnífica.
— My Lady, o Rei a espera no escritório — anuncia madame
Mikaela com a mesma feição de trocentos anos.
— Estou indo, obrigada.
Desço as escadas correndo, e ao chegar lá embaixo, encaro
a governanta que me olha inconformada por eu estar de tênis.
Lanço um sorriso sarcástico e sigo para o escritório.
A porta está entreaberta, empurro e entro olhando para
dentro com atenção, papai está sozinho.
— Pai? — chamo baixinho controlando a vontade de
perguntar onde está Dominic.
— Sente-se! — ordena ainda de costas.
Detesto quando ele faz isso.
— Nos últimos dias tenho observado você e seu …
— Marido — completo, mas ele ignora.
— De fato, porém vou ser claro no que vou te falar, minha
filha, além de ser seu pai, sou o seu Rei e temo por sua felicidade e
por seu futuro. Não acho que deva prosseguir com essa loucura de
casamento, Dominic não me parece ser um homem ruim, mas
certamente não é um homem que esteja a sua altura. Você é uma
Princesa, tem sangue real e precisa aceitar isso.
— Entendo seu receio e preocupação, papai, mas eu sou
uma mulher agora, e tomo minhas próprias decisões. O senhor me
trouxe aqui para casar com Dominic diante da corte, para que seu
nome não fique manchado, pois bem, aqui estou, mas não me peça
para abrir mão da minha vida, pois isso não vai mais acontecer.
— Nadine, Nadine… — ele repete meu nome caminhando em
minha direção com as mãos nos bolsos, olhando-me por cima de
seus óculos quadrados. — Você que pensa que se governa, eu
apenas estou permitindo que pense assim, mas não me teste. Eu
realmente não quero usar de minha autoridade de supremo com
você.
Lanço a ele um olhar confuso, não entendo seu comentário.
— O que quer dizer? — forço-me a perguntar e papai
permanece em silêncio, era angustiante seu jogo sujo. — O que
está tramando? Não ouse prejudicar Dominic papai, eu não o
perdoaria…
— Cale-se! — balbucia. — Você não permite nada. Não
passa de uma menina mimada que acha que o mundo gira em torno
de seus caprichos.
— Querer viver fora da dinastia que o senhor me impôs é um
capricho? Hrum! Não vou me sentar naquele trono, isso não vai
acontecer. Nunca! — retruco furiosa apoiando-me sobre a mesa
ilustrada e brilhante. Ele me olha impugnado e rebate:
— Você não se casará com aquele plebeu, isso que não vai
acontecer!
— Não foi pra isso que me trouxe?
— De algum jeito você tinha que voltar para casa!
Seu tom é sarcástico e isso me irrita de uma forma
incontrolável.
— Está querendo me dizer que me enganou? Mentiu pra
mim? — murmuro ofendida com os olhos cheios de lágrimas.
— Talvez sinta um pouquinho do que eu senti. — Papai vira
as costas e me deixa sozinha naquela sala enorme, onde eu só
ouvia minha respiração ofegante. O choro me consumindo em
segundos. Confiei nele.
— Amiga, até que enfim te achei. Vamos, tenho uma
surpresa pra você… amiga… — Vicenza me encontra na sala de
reuniões e não percebe que estou à beira do caos. — O que
aconteceu? Porque está chorando? — Ela me abraça forte.
— Ele está tramando alguma coisa, eu sei… — resmungo
entre soluços.
— Quem? Quem está tramando algo contra você? — ela
questiona preocupada.
— Quem? O REI — grito despejando minha raiva em quem
não tem culpa. Vicenza fecha os olhos e absorve minha ira e depois
me guia segurando em minha mão em sinal de apoio. Seu toque
doce e carinhoso me acalma, e me sinto culpada por ter gritado com
ela. — Desculpa, Vi, eu…
— Tudo bem, não peça desculpa, eu entendo, vem, seu
irmão está te esperando no jardim.
Acompanho Vicenza pelos corredores e me distraio com sua
empolgação, ela realmente não faz ideia da encrenca que a amiga
dela se meteu.
— Você viu Dominic? — pergunto, mas ela não responde, só
continua sorrindo enquanto me puxa para fora.
— Princesa… — James me reverencia com um aceno suave
e não aguento a pressão, lanço-me em seus braços e desmorono.
Vicenza observa chocada, ela nunca me viu tão aflita.
— Shiii!!! — James pede calma acariciando meus cabelos. —
Vamos dar um jeito nisso, não fique assim.
— Você sabe o que ele está arquitetando, não sabe?
Ele se mantém calado.
— James? — sentencio.
— Vá para a praia, tem uma surpresa esperando por você.
Encaro seus olhos azuis e sei que ele não vai me contar
nada, corro em direção à praia, o coração batendo forte e o vento
esfriando minha pele. O sol está escondido entre as nuvens e seu
calor está cada vez mais distante. Passo pelas folhagens e sorrio ao
ouvir o barulho do mar.
Como senti saudades desse lugar.
Respiro fundo sentindo a brisa calma me envolver.
Procuro por minha surpresa e atrás das rochas Dominic
surge sorridente. O vento balançando sua camisa branca, os pés
descalços contra a areia fina. Meu coração se alegra, eu precisava
senti-lo. Corro em sua direção e nesse momento me imagino em um
daqueles filmes de comédia romântica quando a mocinha corre em
câmera lenta à beira mar para os braços de seu amado.
— Finalmente — ele diz quando seus braços me envolvem
ansiosos.
O abraço tão forte que penso que poderia esmagá-lo.
— Senti sua falta — confesso afagada em seu peito, as
lágrimas brotando em meus olhos novamente.
— Vai ficar tudo bem — sussurra em meu ouvido, eu
realmente queria acreditar que tudo ficaria bem, mas não vai.
— Dom…
— Depois. Vem, tem uma surpresa pra você.
— Você preparou?
— Com a ajuda da Vicenza e do seu irmão, claro — sorri
abobalhada. — Não conseguimos ficar sozinhos nos últimos dias e
eu estava louco de saudade de beijar sua boca.
— Beija agora — peço puxando-o para mim. Seu corpo cola
ao meu e entrego meus lábios a saudade que me atormenta. Sua
língua me invade ascendendo meu corpo inteiro, exigindo liberdade.
Cedo ao seu toque, e deixo que as lágrimas molhem nosso beijo.
Ele não me solta, pelo contrário, me aperta ainda mais contra seu
corpo acolhedor.
Podia ser coisa da minha cabeça, mas eu sentia que algo de
muito ruim estava prestes a acontecer. Papai não diz nada que não
faça sentido pra ele mesmo, e ele dizer que não vou me casar com
Dominic, só me faz crer que está aprontando alguma coisa. Que
plano de me casar diante da corte foi apenas uma desculpa idiota
para me trazer de volta a prisão.
E eu feito um animal indefeso achei que estava segura, cai
feito uma idiota nesse plano ridículo.
Dominic separa nossos lábios inesperadamente, sou
obrigada a abrir os olhos ao sentir o frio e o vazio que essa
separação me causou.
— Nãoo!!! — protesto deixando um meio sorriso.
Dominic me guia e seguimos até um local atrás de um dos
rochedos, fico admirada com uma cesta de piquenique em cima de
um lençol quadriculado, o olhei boquiaberta, eu realmente não
esperava por isso.
— Você fez isso? — Seguro em sua cintura nos
aproximando.
— Talvez eu tenha feito umas pesquisas dos tipos de clichês
que princesas como você gosta.
— Princesas como eu? — rebato chegando mais perto.
— Princesas do tipo rebelde — ele acrescenta com seu
sorriso encantador que me faz resplandecer de tão apaixonada.
Sentamos sob o lençol aveludado e observo Dom servir um
pouco de suco de uva. A cesta está cheia de frutas e sinto o cheiro
de bolo de chocolate, o meu preferido, a receita que só Nana
conhece.
— Esse cheiro… — Fecho os olhos sentindo o gosto em meu
paladar.
— Seu preferido. — Ele tira um pote de dentro da cesta, e
isso me deixa feliz.
Saboreio um pedaço e resmungo em êxtase:
— Meu Deus, eu gosto mesmo desse bolo.
Ele sorri satisfeito.
Sento no meio de suas pernas e me aconchego em seu
abraço. Ficamos em completo silêncio por um bom tempo
apreciando o mar tocando a areia branca e macia, somente eu, ele,
e o mar…
— O que aconteceu? — pergunto ao perceber sua mão
machucada.
— Nada, não se preocupe.
Estranho, mas não insisto.
O sol se escondeu cedo hoje e não nos permitiu contemplar
seu descanso, o céu nublado e o vento gélido nos incentivou a
preparar nossa partida.
Mas eu ainda não queria ir…
Capítulo 32
Muitas vezes me sinto um fracasso por não me achar
perfeito. Eu sei que essa é uma ideia idiota que nós, idiotas
colocamos na cabeça. Devíamos ter a obrigação de nos achar
perfeitos, pelo simples fato de sermos nós mesmos, pessoas
individuais e únicas. Porque quando você coloca na cabeça a
missão de ser alguém que não é, entra em uma viajem longa e
tormentosa.
— Dói, não é mesmo? — o Rei se empertiga e sua voz
autoritária me chama a atenção.
— Não entendi? — rebato encarando-o de cima.
O Rei tem tentado me diminuir a cada segundo nos últimos
dias, a cada palavra ele tenta me mostrar que não sou bom o
bastante para sua filha. Como se eu mesmo não me cobrasse por
isso. E até entendo sua preocupação de pai, mas ele não está
preocupado com a felicidade dela, só está focando no reino e no
que vão falar ao seu respeito quando descobrirem.
— Estar em um mundo que não é seu! — responde, pigarreia
e continua: — Quando acordei pela manhã e não vi minha filha
sentada na mesa para tomarmos nosso desjejum, eu achei que ela
estivesse indisposta, mas quando Nina me informou que seu quarto
estava vazio e sob a penteadeira uma carta de despedida,
estremeci, eu realmente me senti culpado e me perguntei aonde
errei. O que tinha feito de tão ruim para receber tamanho castigo. —
Ele senta em sua poltrona e continua com o discurso. — Então
foram noites em claro, angústia, medo. Eu temi por minha filha, por
sua vida. Infelizmente temos muito inimigos e pensei no pior.
— Rei Arthur, eu…
— Não me interrompa, não terminei — contesta. — Quando
descobri onde Nadine estava e que estava bem, meu coração de pai
se alegrou, mas também se decepcionou com suas escolhas. Não
me entenda mal Dominic, não tenho nada contra você, e acredito de
verdade que é um bom rapaz, apesar de seu histórico. — Sua feição
se transforma em pura ironia. — Minha filha parece mesmo gostar
de você, mas não foi para isso que a criei com tanto esmero. Esse
mundo que ela quer viver não pertence a ela, e não tardará para
que ela perceba isso. Preciso que entenda o que estou querendo
dizer, você entende?
— Eu amo a sua filha, e jamais desejaria que ela fosse infeliz,
mas o que está me pedindo…
— Não estou pedindo nada! — ele interrompe na tentativa de
me lubridiar com seu dom de persuasão.
— O senhor acha que não sou suficiente para ela, e entendo,
de verdade, mas não estou disposto a abrir mão só porque está
querendo manipular o futuro dela.
— Manipular? — contra-ataca. — Só estou querendo que
veja que esse não é o seu mundo, como o seu, não é o dela. Nadine
não foi criada com a mesma malicia que você, Dominic. Não acha
que já tirou muito dela?
— Quer mesmo falar sobre isso? — questiono sentindo um
rubor de raiva subir pelo meu pescoço.
— Você tirou a honra da minha filha. Tirou a inocência dela e
agora a reputação dela está nas mãos de um príncipe que sabe a
verdade. Nadine foi prometida a ele, Willians a esperou e quando
estava prestes a consumar o casamento, ela fugiu. Eu dei minha
palavra a família dele. A união entre os reinos precisa ser realizada.
Não permitirei que minha palavra seja jogada ao vento pelas
atitudes impensadas de minha filha.
— O que ela quer não é levado em consideração? O que ela
sente não é importante para o senhor? Tudo é pelo bem do reino. E
o bem dela? Não conta?
— Cada pessoa é destinada a um futuro, Dominic, e o dela é
sentar naquele trono ao lado do Príncipe Willians e governar
Liechtenstein, não ao lado de um…
— Um homem normal? Honesto?
— Honesto? — a voz irritante do engomadinho preenche o
ambiente ao entrar no escritório e nos agraciar com sua dispensável
presença. — Você se casou com uma princesa por dinheiro. Estava
falido e se aproveitou do desespero de uma jovem que queria fugir
de suas responsabilidades. É isso que você chama de honestidade,
Dominic?
Inflo de ódio ao ouvir suas palavras. Não é tudo mentira, mas
não fiz isso somente por dinheiro.
— Com licença — falo e saio deixando-os sem resposta. A
raiva crescendo dentro de mim como um tornado. Soco a parede
com força pra controlar a vontade de socar Willians, príncipe de
merda.
Encontro James perto do jardim e como se ele fosse meu
melhor amigo me aproximo na esperança de ter um ombro
complacente naquele momento.
— Tudo bem? — ele pergunta intrigado.
— Seu pai me odeia — desabafo derrotado.
— Não se preocupe, ele odeia todo mundo.
— Tem algo errado, James. Ele tem me mantido distante de
sua irmã, falado coisas que…
— Dominic, meu pai nunca aceitou e nunca vai aceitar essa
história, infelizmente Nadine brincou com fogo e agora está prestes
a se queimar, e você foi o dano colateral. Não leve para o pessoal,
você é um cara legal, mas o futuro dela já foi traçado ao lado do
príncipe Willians. Sinto muito — lamenta sincero e um suspiro
desesperado escapa.
— Sinceramente não sei onde estava com a cabeça quando
aceitei fazer parte disso. Agora estou apaixonado, e prestes a ser
jogado em um calabouço ou algo parecido — brinco em verdade e
James ri.
— Vem comigo.
O acompanho até a cozinha, James pede que Nana prepare
uma cesta com frutas e o bolo preferido de Nadine.
— O que está fazendo?
— Vou te ajudar a ficar a sós com minha irmã. Ela gosta
dessas coisas clichês, — ele dá de ombros. — Fiz parte desse
plano maluco, e agora temo que ela sofra as consequências da pior
forma possível.
— Ela está louca de saudades de você — comenta Vicenza.
Sorri aliviado por saber que conquistei aliados.
— Nana, viu dona Louise? — pergunto ao sentir falta de
minha mãe.
— Sim, ela saiu com um dos motoristas, foi até a cidade fazer
compras — responde solicita.
Dona Louise é a que mais está se divertindo, longe de toda
essa confusão. Não se fez de rogada por estar em um país
diferente, e sozinha se aventurou em conhecer cada lugar indicado
por Nadine.
Saio da cozinha com a cesta cheia e um lençol entregue por
Vicenza, que estava mancomunada com o plano de James. Sigo
pelo jardim atento com as instruções até chegar à praia. Vislumbro o
lugar com gratidão. Agora entendi porque este é o lugar preferido de
Nadine. É esplêndido. Preparo o local ansioso por sua chegada.
Minhas mãos suando frio.
A praia é deserta então não me preocupo em olhar para
todos os lados à sua procura. Meus olhos a encontram, seu
semblante preocupado, mas suaviza à medida que se aproxima. Ela
corre em minha direção e faço o mesmo, não estava suportando
mais nenhum centímetro de distância de seus braços.
Seu cheiro me invade, e seu corpo me aconchega. Respiro
fundo e torço para que meus batimentos voltem ao normal. Pareço
um adolescente de quinze anos com a primeira namorada. Patético.
Eu costumava me dar bem com as mulheres. Sem medo e
sem insegurança, bom, talvez seja porque não envolvia
sentimentos. Mas com Nadine é eminente, com ela me abri, e me
entreguei. Entreguei meu coração. E agora me sinto em um beco
sem saída. Com medo do que vai acontecer com a gente.
Passamos uma tarde incrível. Não sei descrever como me
senti feliz e realizado por estar com Nadine, sem pensar em todos
os problemas e obstáculos que nos cercam.
— Acho melhor a gente ir, amor — obrigo-me a dizer.
— Ainda não, — suspira pensativa. — Dom… — Ela chama
minha atenção sem desviar os olhos do horizonte.
— Oi — respondo em seu ouvido.
— Promete que não vai me abandonar, que não vai deixar
meu pai te convencer que o que fizemos não é certo, promete?
Engulo em seco. Na dúvida se posso fazer uma promessa
que não tenho certeza se conseguirei cumprir.
— Promete? — insiste ao me encarar angustiada, minha
princesa está angustiada. Com medo. — Dom… — suplica, e sua
voz trêmula me faz voltar a atenção para seus olhos angustiados.
— Prometo! — minto. Eu não sabia o que ia acontecer, não
sabia se esse pressentimento que me afugenta iria me levar para
longe dela, mas eu não podia dizer outra coisa.
Ela sorri e me abraça.
— Vamos embora, vamos para longe. Quero voltar para
nossa vida, eu quero aquela vida, Dom, no restaurante, com a
Vicenza, com você. Sem reino, patriarcado, rei ou príncipe, eu não
quero isso — desabafa em puro desespero.
Merda!
— Vamos dar um jeito em tudo isso, está bem!? — pondero
beijando sua têmpora.
Nadine assente e com as pontas dos dedos limpo as lágrimas
que insistiam em cair.
— Você está ficando gelada, vamos voltar antes que seu pai
mova um exército atrás de nós — brinco na intenção de desviar
meus próprios pensamentos.
De mãos dadas caminhamos de volta para a mansão, e logo
na entrada encontramos Príncipe Willians na espreita como um
bandido. Não suporto esse cara.
— Porque saiu sem os guardas, Princesa? — exigi uma
explicação ponderando sua inveja no tom de voz.
— Estou com meu marido e não te devo explicações —
Nadine o responde a altura e me seguro para não rir.
Subimos para o quarto e sem nos preocupar com o olhar
vigilante do guarda no corredor, nos trancamos. Não me faço de
rogado e rapidamente tiro a blusa, ela faz o mesmo divertida e
sensual.
— Tem certeza? — alerto em chamas.
— Você ainda pergunta? — responde pulando em meus
braços, suas pernas envolvem minha cintura e meu pau reage
dentro da calça implorando liberdade. Seus lábios tocam os meus e
mais uma vez me entrego em um mundo paralelo.
É assim que me sinto quando estou com ela, fora de órbita.
— Te quero tanto, sabia? — confesso levando-a para cama.
Exploro seu corpo com volúpia. Eu a quero tanto que a consciência
do que é certo ou errado me foge, e só consigo pensar em como
desejo estar enterrado dentro dela.
Meu pau se enrijece ainda mais quando suas mãos o tocam
por cima da calça, ela desliza pra cima e para baixo, encarando o
volume com atenção. Seus lábios se entreabrem e percebo o que
tem em mente.
— Quer colocar na boca? — arrisco e ela ri envergonhada.
Sem responder, Nadine se abaixa deslizando por meu peito e
abdômen, ela me olha de baixo e arfo só de me imaginar entre seus
lábios. Sua mão delicada desliza o zíper e rapidamente estou nu.
Ele lateja e eu ofego apreensivo.
Sinto sua boca quente na cabeça, lábios macios me tocando
com suavidade e delicadeza… Sua mão acompanha os movimentos
de sua boca de forma descoordenada pra cima e pra baixo, mas
não demora até que encontre o ritmo perfeito.
— É assim? — pergunta sedutora e concentrada.
— É. É assim, — murmuro hipnotizado, controlando-me para
não gozar.
Nadine continua me chupando com lascívia, sentindo-se
poderosa pelo que está fazendo e eu sortudo por ser o primeiro.
— Princesa… — rosno repreensivo, mas ela não me dá
ouvidos e acelera os movimentos. Seguro em seu cabelo deixando
as contrações involuntárias provocarem uma sensação de prazer
intenso e gozo em sua boca, ela se assusta quando o jato quente
explode em sua garganta.
Que visão esplêndida e inesquecível.
Ela engole tudo.
Observo Nadine se levantar, absorto e em êxtase, ela tira a
roupa sem pudor, e se envolve em seu roupão de seda. Só admiro
totalmente vidrado.
— Coloca isso! — ordena entregando-me a calça.
Obedeço sem questionar.
Nadine abre a porta e olha para o corredor com cuidado para
não ser vista.
— Vem! — chama brincalhona achando graça do perigo.
— Nadine? — repreendo.
— Está com medo? — indaga deixando o roupão cair por
cima dos ombros, me instigando bem no meio do corredor.
— É claro que tenho medo do Rei, afinal, ele é o Rei.
Descemos as escadas sem fazer barulho, estranho o silêncio,
mas depois de olhar no relógio pendurado na sala que são quase 1h
da manhã, entendo.
Perdemos a noção do tempo dentro do quarto e naquela
fração de segundos me pergunto que milagre aconteceu para que
não fossemos incomodados. Tendo em vista que nos últimos dias o
Rei não me deu um minuto de paz.
Ela abre a porta no fim do corredor e me puxa para dentro, é
a sala de jogos. A luz baixa preenche o local, e ela sorri travessa,
provocativa, me excitando.
Fecho a porta atrás de mim sem desviar meu olhar do dela,
Nadine caminha até a mesa de sinuca, e me convida. Seus olhos
pousam sobre a mesa, e não preciso de muito pra saber o que ela
quer.
— Quer ser fodida aí em cima? — provoco me aproximando.
Capítulo 33
Por algumas horas esqueci de tudo. Foquei no que
verdadeiramente queria.
Arrasto Dominic para a sala de jogos e me aventuro em
realizar mais uma fantasia. Se já estou encrencada, porque não
aproveitar o perigo.
Sensualizo para Dominic que me olha atento, pupilas
dilatadas, em chamas.
Passo a mão sobre o veludo esverdeado da mesa de sinuca
e ele sorri, sabe o que eu quero e a culpa é da El James por ter
colocado esse desejo em minha cabeça.
Dom se aproxima e meu coração acelera, ainda estou
pegando o jeito nesse negócio de ser sexy.
— Quer ser fodida aí em cima? — ele provoca passando a
mão por minha cintura.
Meu sorriso diz tudo, e num impulso abrupto, Dom me vira
pressionando minha pélvis contra a beirada de madeira maciça. Arfo
de desejo imaginando seus próximos passos. Ele desliza o nariz por
meu pescoço, fecho os olhos absorvendo todo o seu poder sobre
mim. O roupão escorrega por meus ombros e seus dedos me tocam
com delicadeza, suave feito uma pluma. Seus lábios deixam rastros
de beijos acompanhando a curvatura de minhas costas.
— Dom… — Ofego ansiosa.
Ele não responde, abaixa meu dorso sobre a mesa deixandome exposta. O roupão se perde ao chão e sua perna afasta as
minhas. Estou nua. Vulnerável. E ansiosa para senti-lo todo dentro
de mim.
Sua mão desliza por todo o meu corpo e seu toque firme me
causa um arrepio dos pés à cabeça, minha respiração se aperta e o
nervosismo aflora incontrolavelmente cada molécula do meu corpo.
Ele se afasta. E segundos depois sinto sua respiração quente no
meu traseiro. Arregalo os olhos, eu não fazia ideia do que ele ia
fazer.
— Confia em mim? — pergunta sentindo meu corpo tenso e
ereto.
— Confio — murmuro sussurrante sorrindo feito uma boba.
Sua língua me invade, desliza para dentro e fora da minha
intimidade molhada e ardente. Gemo baixinho segurando na
garganta o prazer que ele me causa. Sua língua passa por minha
bunda e paraliso. Seu dedo acaricia meu clitóris e meu corpo reage.
Faço menção em levantar, ele impede.
— Quietinha princesa, você não queria brincar? — seu tom
rouco e arrastado me deixa em alerta. Alerta por estar tão
hipnotizada por ele, totalmente entregue, capaz de fazer tudo o que
ele me pedir.
Seus dedos me preenchem e arqueio acesa, seus
movimentos se intensificam e sinto meu corpo se preparar para
explodir. Ouço o zíper de sua calça abrir e sorrio.
— Dom, por favor — suplico em sôfrego, eu preciso senti-lo.
Devagar sinto cada centímetro me invadir, ele geme,
murmura em meu ouvido, acariciando meus seios que cabem
perfeitamente na palma de sua mão. Ainda de costas beijo sua boca
com urgência, ele não para, e me introduz devagar.
— Mais rápido — peço entre os dentes e seu meio sorriso me
enche de desejo.
Dominic me apoia novamente sobre a mesa, puxa minhas
mãos para trás e as prende acima de minha cintura. Sem dizer nada
ele me possui firme e voraz, causando um grande alvoroço em todo
o meu ser. Deliro com suas investidas urgentes e me derreto
sentindo o ápice se aproximar. Tão rápido como a aparição de uma
estrela cadente. Sinto minhas pernas estremecerem e então ele
para.
— Por que parou? — reclamo sem me mover.
— Está preparada? — rebate, o tom sedutor e cheio de
malícia.
— Para quê?
— Pra ser minha e de mais ninguém! — argumenta e deixo
escapar uma risada nervosa.
Em provocação, levanto e miro seu corpo nu atrás de mim.
Deslizo por seu peito e abdômen, ele me observa sério, luxurioso,
olhar escuro e indecifrável.
— Quero você inteira, só minha, só pra mim… — confessa.
Seu corpo cola ao meu e nos envolvemos em um beijo
apaixonado. Dom me arrasta para a poltrona, ele senta e me
encaixo, ele arfa e geme baixinho entre meus lábios.
Cavalgo devagar sentindo cada centímetro dele me
preencher, sentindo-o fundo.
— Está tão gostoso… — choramingo agarrada em seu
pescoço.
Suas mãos acariciam minhas costas até chegar na minha
bunda, ele aperta com força e depois alisa suavemente. Fez isso
algumas vezes até deslizar para o meio das minhas nádegas, me
empertigo de imediato. Assustada.
— Você sabe que é tudo pra mim, não sabe!?
Desta vez não respondo, em vez disso apoio os cotovelos em
seus ombros, entrelaçando os dedos em seu cabelo curto e tomo
seus lábios em iminência. Dom levanta meu corpo e pressiona seu
pau duro e melado bem na entrada da minha bunda. Meu coração
acelera, não estou com medo, um pouco de receio talvez, mas é
isso que eu quero, ser dele. Completamente dele…
Aos poucos sinto a pressão se esvair para dentro de mim, ele
não desvia o olhar, está concentrado, sedutor.
Ele me deixa conduzir, sento devagar sentindo seu pau me
abrir lentamente. Minha respiração se ofega e meus olhos se
apertam, é estranho, dói, mas é gostoso à medida que vai entrando
cada vez mais.
Uma onda de adrenalina me possui e o tesão invade cada
terminação nervosa do meu corpo, deixando-me enlouquecida, isso
é bom demais.
— Isso amor, assim… — Geme excitado segurando-me pela
cintura quando está todo dentro. Não consigo dizer nada, estou
concentrada e movimento meu corpo devagar, preenchida e
invadida pelo amor da minha vida. Ele me segura pela nuca e se
empertiga ajudando-me com os movimentos precisos e
maravilhosos. Seus lábios me tomam e me entrego de corpo e alma
para Dominic.
Ele me tem por completo…
— Você é o meu anjo, princesa Nadine — sua voz soa
baixinho em confissão enquanto nossas respirações se misturam
com as batidas descompassadas de nossos corações.
— Eu amo você — declaro apoiada em seu ombro, ele
prende a respiração e me encara.
— Repete! — pede absorto, ele não sabia definir uma reação.
— Eu. Amo. Você — dito devagar segurando em seu rosto.
— Te amo, princesa, mais do que tudo nessa vida. Você foi o
sopro de esperança que eu precisava pra lembrar que eu ainda
estava vivo… — ele respira exasperado e não entendo o que
aconteceu.
— O que foi?
— Acho melhor irmos para o quarto antes que alguém nos
pegue desse jeito — um sorriso falso estampa seu rosto e me pega
de surpresa.
Dom me tira de seu colo com cuidado, estranho sua reação,
mas concordo.
— Você está bem? — pergunta ajudando-me com o roupão.
Assinto sem jeito.
Subimos para o quarto em silêncio, e por sorte o corredor
ainda estava vazio. Puxo Dominic pela mão, sua feição está ainda
mais distante e estranha, é como se lutasse com algum tipo de
sentimento ou pensamento inconveniente.
— Vamos tomar banho? — convido.
— Vou deixar você a vontade, te vejo amanhã no café, pode
ser? Você foi incrível. — Ele sela um beijo rápido em meus lábios, e
sai.
Fico sem entender que porra acabou de acontecer aqui!
Não consigo controlar as lágrimas que brotam em meus
olhos. Porque ele sempre tem que fazer isso? Mudar de humor de
repente e me deixar assim, perdida, sem saber o que fazer ou
pensar.
Depois de um banho rápido deito em minha cama e encaro o
teto até o cansaço me vencer. Acordo quando um raio de sol entra
pela janela e aquece minha pele.
Lembro da noite passada e sorrio, e no mesmo minuto
lembro de como acabou.
— My lady, bom dia, como dormiu? — Nina aparece
sorridente pronta para preparar o meu banho.
Não respondo. Tomo banho em silêncio e me visto para o
desjejum. Nina respeita meu mal humor e me acompanha até a
sala de jantar.
— Querida nora, você está linda — elogia dona Louise
sorridente.
Vicenza também sorri e me lança uma piscadela. James
acena e está lindo como sempre. Até papai sorri reverenciando
minha chegada. Será que todos estão de bom humor, menos eu?
— Obrigada — me limito em dizer.
Em seguida meu pesadelo se junta a nós.
— Bom dia a todos. Princesa, a senhorita está deslumbrante,
como sempre. — Willians para ao meu lado e exige um contato
visual.
Olho para ele e forço um sorriso amarelo que o satisfaz.
Madame Mikaela me encara e não resisto a revirada de olhos
como de costume.
— Onde está Dominic? — pergunto ao me dar por vencida.
Eu tinha um sapo enorme entalado na garganta.
Não conseguia entender, como que uma tarde maravilhosa e
um sexo esplêndido na madrugada tinha acabado daquela maneira.
— Deve estar dormindo, My Lady — responde Willians com
um sorriso glorioso.
— Com licença. — Levanto constrangida pelos olhares e vou
atrás dele.
Bato na porta duas vezes e o silêncio ecoa.
— Dominic, abre a porta, por favor — peço mantendo-me
calma. — Dominic? — insisto. — Eu não vou sair daqui enquanto
você não abrir essa porta e conversar comigo, como uma pessoa
adulta e civilizada! — ralho enfurecida por sua afronta.
Ouço o trinco se mover e respiro aliviada. A porta se abre
lentamente e me deparo com um Dominic totalmente diferente da
noite passada.
— O que você quer? — seu tom é baixo, quase inaudível.
— O que você fez? Você bebeu, Dom? — me decepciono ao
me aproximar e sentir o odor forte de whisky.
— Porque o espanto? — ironiza com desdém sentando-se na
poltrona.
Não consigo dizer nada, estou apavorada.
— Quando me conheceu eu já bebia, Princesa. Só tomei um
drink ontem à noite, o que tem de mal nisso? — ele olha pra garrafa
vazia em cima da cama.
— Um drink? — repito desacreditada. — Dom, você não
bebia há meses, o que aconteceu? — tento me aproximar, ele
impede.
— O que você quer de mim, hein? O que você viu em mim
pra me escolher? — Dominic apoia a cabeça entre as mãos, os
cotovelos sobre os joelhos, está bêbado.
Não sei o que o fez voltar a estaca zero, ele estava indo tão
bem, estava se controlando, firme em sua decisão de não beber
mais.
— Dominic, olha pra mim, — peço ajoelhando-me a sua
frente. Ele hesita. — Olha pra mim! — ordeno.
— O que você quer? O que mais quer de mim? — brada e
me assusto com seu olhar frio e distante.
— Você tem que me dizer o que está acontecendo, Dom, eu
preciso entender… Ontem tivemos uma tarde maravilhosa e depois
fizemos um sexo incrível. Só que você está me deixando confusa.
Você muda de humor toda hora e não conversa comigo… Fala
comigo! Me diz o que você está sentindo? Por que você bebeu? —
imploro
— É essa a sua preocupação? Porque eu bebi? Foda-se que
eu bebi, e daí! É isso que você quer pra sua vida? — ele levanta
bruscamente e me desequilibro caindo de bunda no chão. — É esse
tipo de homem que você ama? Interesseiro. Inseguro. Alcoo…
— Cala a boca! — grito espantada, eu nunca o tinha visto tão
devastado.
— Eu não mereço você, Nadine, eles têm razão…
— Quem? Quem tem razão?
— Todos! Todos que me olham com pena. Um empresário
falido que se aproveitou de uma princesa ingênua, que queria fugir
de uma vida luxuosa e cheia de regalias. Será que estamos mesmo
caminhando para o mesmo lugar? — gesticula passando os dedos
nos cabelos desgrenhados.
— Para de falar tanta besteira, Dominic — falo no mesmo
tom. — Eu disse pra você não ligar para o que meu pai ou o
Príncipe falam. Eu te amo, e é isso que importa.
— Não é tão simples assim! O que eu posso te oferecer,
vossa majestade? Hum. Deixa que eu mesmo respondo. — Ele ri
desdenhando de mim. —Nada! Não posso te oferecer nada,
Princesa Nadine, nem minha sobriedade. Foi só eu me senti um lixo,
que escolhi um copo de whisky como companhia. Passei a noite
bebendo e pensando: o que será que ela viu em mim?
Meus olhos ardem e não consigo segurar a vontade de
chorar. Ele grita e anda de um lado para o outro e ainda não
consegui entender que merda aconteceu aqui!
— Você me deu tudo! — ele se aproxima pressionando meu
corpo contra a parede. — Tudo o que eu pedi, você entregou…
entregou sua inocência pra um cara… — Dominic soca a parede
atrás de mim, irado, me encolho assustada, meu coração palpita e
choro ainda mais desesperada.
— Para com isso! Para de falar essas coisas — imploro
segurando em seu pescoço, ele me evita, se afasta transtornado,
esse não é o meu Dominic, não é o homem carinhoso e gentil que
eu conheço.
— Para você de querer enxergar em mim alguém que não
sou. Talvez você devesse ouvir seu pai, ele está certo, esse é o seu
mundo, essa é a sua vida, Nadine. Você não pode falar sério
quando pensa em viver ao lado de um homem como eu!
— Como você? — rebato enxugando as lágrimas. — Gentil?
Carinhoso? Amoroso? Protetor? Amigo? — argumento. — Todos
temos defeitos, Dominic. Ninguém é perfeito!
— Você é! — ele me olha apreensivo. Os olhos vermelhos e
desolados.
— Não, eu não sou! Eu tenho tantos defeitos quanto você! —
me encosto na parede abraçando o próprio corpo. — Porque você
está fazendo isso comigo? Falando essas coisas? — Minha voz
trêmula sai mais alta do que imaginei.
— Odeio tudo isso! E me odeio pra caralho por ter entrado na
sua vida. Eu estrago tudo o que entra em contato comigo, — bufa
exausto. — Sou um homem sombrio, mas a culpa não é sua,
Princesa. Você tentou ver o melhor em mim, você é mesmo um
anjo, e eu não vou permitir que perca sua luz por estar ao meu lado.
Não vou permitir que se corrompa tentando sobreviver com as
partes que eu ainda não destruí!
— Cala a boca! Para de falar tanta besteira. Você é um idiota,
sabia?! Eu me entreguei a você porque eu te amo, porque me
apaixonei por você, aliais, por sua outra versão. Não essa escrota e
deplorável que está na minha frente agora. A outra disposta a ser
melhor por si mesmo.
— Nadine… — sussurra a poucos passos de mim e posso
sentir ele se fechando. O brilho que tanto me alegra desaparecendo
aos poucos, se apagando na escuridão, levando o homem que eu
tanto amo pra bem longe de mim.
Quando ele finalmente desvia os olhos dos meus, desistindo
de nós, consigo ver claramente que o perdi.
— É isso? Não vai nem tentar? — contesto absorta e
decepcionada.
O silêncio é cortante e desesperador. Ele não me olha nos
olhos. Não consegue olhar pra porra dos meus olhos.
— Estou falando com você, Dominic! — vocifero.
Um movimento brusco e ele joga tudo que está em cima da
mesinha de canto no chão. Não me assusto, talvez esperasse por
isso. Ele adora jogar coisas.
Encaro para o seu feito e vejo que estava lendo After,
preencho uma risada sarcástica nos lábios e pego o livro do chão.
Ele observa. Folheio as páginas, e vejo que algumas estão
marcadas. Paro em uma das marcações e leio:
— O sofrimento pode mudar uma pessoa, trazer forças, e no
fim, fazer com que a pessoa não precise tanto da fé. Você precisa
de si mesmo. Você precisa ser forte, e não permitir que o sofrimento
tome conta ou o empurre para o nada. Você e Hardin tem mais em
comum do que pensa. — Empurro o livro contra seu peito e caminho
para saída.
— Espera, onde você vai? — ele segura minha mão.
— Me deixa em paz!
— Nadine, espera, não vai…
— Precisa de mais tempo pra se autossabotar? — ironizo. —
Você está certo, Dominic, eu não preciso disso. Estou cansada e
exausta de ficar em alerta constantemente. Com medo se você vai
se transformar em um babaca no minuto depois que fizer amor
comigo. Estou cansada de tentar fazer você entender o quanto é
especial pra mim. O quanto você é um homem maravilhoso.
Ele me solta confuso e arrependido.
— Defeitos? Medos? Inseguranças? Quem não tem? Eu fugi
da minha vida repleta de luxo e regalia, para acordar cedo, trabalhar
e estudar. Não porque sou ingrata ou reclamo de barriga cheia, mas
porque eu dou valor para pequenos esforços que se transformam
em grandes conquistas. E eu tenho sonhos para serem
conquistados. Não vou permitir que nada tire o meu foco.
— Eu te amo… — declara encarando o chão.
— Não, você não me ama. Você está doente, Dom, e eu não
tenho a cura para o seu problema.
Dominic me olha constrangido, as lágrimas escorrendo pelo
rosto, eu tive pena dele. Meu coração se apertou e se dilacerou com
aquela cena, com as palavras que eu mesmo disse, e mais uma vez
o vi jogado a beira de um abismo escuro e profundo, e não tem
nada que eu possa fazer se ele não aceitar que precisa de ajuda.
— Melhor tomar um banho, vai se sentir melhor! — oriento.
Ao passar pela porta, esbarro em dona Louise que
provavelmente escutou nossa discussão, ela me olha aflita e sei que
queria ter algo a dizer, mas o silêncio foi a melhor escolha.
Capitulo 34
— Dominic o que você pensa que está fazendo? — dona
Louise entra no quarto e fecha a porta, ela está assustada, perplexa.
— Não grita, minha cabeça vai explodir — reclamo entrando
para o banheiro. Bato a porta com força, e ela ignora minha
grosseria.
Tomo um banho demorado, repassando na mente cada
palavra idiota que disse para Nadine, porra! — bato com a cabeça
na parede. — Que merda eu fiz? Como deixei aquela filha da puta
entrar na minha mente daquele jeito?
Droga! Perdi tudo o que lutei e conquistei nos últimos meses.
E agora ela está com raiva de mim, e com razão.
Que vergonha, Dominic, que vergonha! — ralho para meu
próprio reflexo em frente ao espelho.
Ao sair do banho me deparo com dona Louise me esperando.
— Filho, o que aconteceu? Porque estavam discutindo? —
ela olha pra garrafa vazia sem acreditar. — Você bebeu… — sua voz
se perde.
— Agora não, dona Louise, agora não! Eu quero ficar
sozinho, você pode sair?
— Não, eu não vou sair, — ela levanta e se aproxima. —
Dominic, olha pra mim — pede preocupada, hesito, eu não queria
ouvir ninguém. Minha consciência já estava me condenando
sozinha.
— Chega de sermões por hoje, por favor — suplico
segurando a cabeça entre as mãos.
— Não vou te dar nenhum sermão. Só quero entender o que
te fez voltar a beber, você estava sóbrio, filho. Estava progredindo,
estava feliz. O que aconteceu? Qual o problema?
— Nadine, meu problema é a Nadine, então foda-se. Foda-se
esse contrato e toda essa merda… — brado com um nó apertado na
garganta. — Ela é meu problema, porque não posso fazer isso com
ela, não posso… — minha voz some aos poucos e me arrasto até
sentar no chão.
Naquele momento achei que ela questionaria de que contrato
estava falando, mas ao contrário disso, sem pestanejar me
aconchegou em seus braços.
— Vai ficar tudo bem… — ela sussurra beijando o topo na
minha cabeça, mas ela está errada, não vai ficar tudo bem. — Filho,
você não pode beber desse jeito, eu ouvi o que disse pra Nadine,
você a magoou, ela está assustada, eu não quero que ela odeie
você…
— Porquê? — a encaro. — Porque se importa?
Minha querida mãe se cala, como sempre faz.
— FALA! — grito e ela se assusta, me arrependo, mas estou
tão irado que penso ser capaz de atravessar uma parede se
pudesse.
Fico de pé, os punhos cerrados e fechados ao lado do corpo,
dona Louise se coloca a minha frente, respira fundo e tenta me
tocar, recuo.
— Estou esperando. Porquê? — insisto.
— Não quero que o amor que ela sente por você, se
transforme em ódio ou medo. Não quero que ela passe o que eu
passei com o seu pai, Dominic. E não quero que você termine como
ele. — Ela chora, um choro profundo e angustiante.
— Do que está falando? — questiono engolindo em seco a
raiva que se impregna em cada parte do meu corpo.
Minha mãe senta na cama e encarando as mãos começa a
falar:
— Seu pai começou a se descontrolar com a bebida quando
você tinha 7 anos, eu tentei ajudar, — interrompo com uma risada
desrespeitosa. Ela ignora. — Tentamos psicólogos, remédios,
fizemos até terapia de casal, porque segundo ele, a culpa era
minha. Cada dia que passava ele bebia mais, chegava em casa de
madrugada gritando e quebrando tudo.
Suas palavras me fazem sentir culpa pelas vezes que agi da
mesma maneira.
— No começo ele só quebrava as coisas, gritava e dormia.
Eu relevava, mas com o tempo sua raiva era descontada em mim,
talvez ele quisesse que eu falasse alguma coisa, ou reagisse de
outra maneira, não sei.
— O que você está dizendo? — contesto indignado. Um
rubor de raiva crescendo dentro de mim.
— Eu aguentei firme, de alguma forma eu achava que tinha
que ficar ao lado dele, mas quando ele machucou você eu jurei que
não passaria mais uma noite debaixo do mesmo teto que ele…
— Não lembro disso…
— Você tinha 13 anos, estava dormindo quando ele chegou
de madrugada caindo de bêbado. Nós discutimos e ele me jogou no
chão, naquele momento eu só pensava em você. Não queria que
acordasse e visse aquela cena. Mesmo com a cabeça sangrando e
gemendo de dor no chão, ele tentou …
—Você tá mentindo. Tá mentindo! — repito várias vezes, afim
de acreditar nas minhas próprias palavras, mas no fundo eu sabia
que ela não estava mentindo.
Sua voz carrega uma dor dilacerante, está sofrendo em ter
que lembrar. Relutando em me dar o mínimo de detalhes.
— Mãe… — meus olhos enchem de lágrimas quando ela
suspira reunindo forças.
— Você acordou, correu em direção ao barulho na cozinha,
gritou ao ver seu pai em cima de mim, meu vestido levantado, o
sangue escorrendo por meu rosto… — acrescenta hesitante. —
Você foi tão corajoso, filho — ela sorri orgulhosa. — Você empurrou
seu pai de cima de mim e lhe deu um soco no rosto, mesmo
cambaleando ele tentou revidar, eu tentei impedir que ele te
machucasse, mas tomei outro empurrão.
Um flashback de lembranças me atingiu fortemente, era
como se eu pudesse reviver aquela noite, que até então estava
perdida em meu subconsciente. Olho para o meu braço, a cicatriz
de quando quebrei o braço, porém o motivo pelo qual isso se
sucedeu eu não me lembrava, minha mãe disse que cai, acreditei.
Mas naquele momento algo me dizia ao contrário.
— Eu não cai, não é mesmo? — questiono.
Ela concorda com um movimento lento e tormentoso.
— Ele te deu um tapa, você caiu e bateu com a cabeça… —
dona Louise tenta se aproximar, recuo absorto, queria lembrar os
detalhes daquela noite. — Filho, quando eu te vi desmaiado me
desesperei, eu realmente achei que ele tinha feito uma besteira.
— Isso parece roteiro de filme, sério! Quer mesmo que eu
acredite nisso? — desdenho em choque, eu não queria. Não queria
mesmo acreditar que meu pai era uma farsa. Um mostro. Um
homem covarde e cruel capaz de machucar a própria esposa, o
filho…
— Ele também se desesperou. Você sabe que ele te amava
mais que tudo, mas a bebida…
— Não defende ele, porra! — brado esfregando o rosto com
força, as lágrimas brotando sem parar, a dor instalada na garganta.
— Ele achou que tinha matado você, Dominic. Você não
acordava. — Ela tenta se aproximar outra vez.
— Não me toca — grito descontrolado, o nervosismo
dominando meu corpo todo. A vontade de beber prevalecendo outra
vez.
— Corremos para o hospital, por sorte não tinha sido nada
grave, mas você quebrou o braço e quando acordou não se
lembrava de nada — acrescenta chorosa. — Decidimos que aquele
incidente seria o último. Seu pai foi embora de casa prometendo se
tratar, ele voltaria quando estivesse sóbrio, firme o suficiente para
não nos colocar mais em perigo.
— Você o perdoou? — forço-me a perguntar.
— Demorou um tempo, mas eu perdoei. Dom, esperei por
seu pai durante dois longos e intermináveis anos, eu tinha
esperanças que ainda pudéssemos ser uma família, mas…
— Ele não melhorou, não é? Não quis mudar e continuou a
beber cada dia mais — interrompo.
— Eu só tinha quinze anos quando o hospital me ligou, ele
estava mal, engraçado que o telefone de emergência dele era o
meu, justamente o meu. Porque mãe, porque nunca me contou?
— Filho, você idolatrava seu pai, admirava ele
incondicionalmente. E eu não queria que o enxergasse como eu. O
que ele fez com a gente foi errado, ele estava doente e se
arrependeu amargamente. Ver você desacordado destruiu alguma
coisa dentro dele, eu sei, eu senti… O que quero dizer é que não
escondi a verdade de você, só evitei que tivesse uma imagem ruim
do homem que você se espelhava.
— Não entendo. Nada parece se encaixar, mas faz todo
sentido…
— Ele tentou se tratar, se internou, e eu achei mesmo que ele
conseguiria, mas era só alguma coisa dar errado que ele voltava à
estaca zero. E quando voltou a ficar violento e possessivo eu peguei
você e nos mudamos. Eu não queria mais viver aquilo. Você ter
esquecido aquela noite foi um milagre de Deus.
— Quero ficar sozinho — peço encolhendo-me no chão.
— Filho, me perdoa, não queria que soubesse dessa
maneira, eu só …
— Só está com medo que eu fique igual a ele — argumento
tentando manter a calma, mas ela tem razão. Sou agressivo,
descontrolado, inseguro, e é só uma coisa dar errado que logo
quero encher a cara.
Gritei com a Nadine. Agi como um imbecil e porquê? Porque
não sei lidar com minhas inseguranças sem precisar descontar em
alguém? Porque amo tanto aquela mulher que não consigo pensar
direito, muito menos me imaginar longe dela?
É Dominic você está se saindo muito bem na arte de ser um
escroto.
— Eu te contei a verdade não é pra que você sinta raiva do
seu pai, muito menos que se compare. Só quero que evite um
sofrimento desnecessário pra você e para Nadine, vocês não
merecem isso. São jovens e se amam.
— Você tá de brincadeira comigo! Eu odiei você por todos
esses anos, eu … — vacilo as palavras atordoado, eu não consigo
nem pensar. — Achei que você tinha abandonado ele naquele
estado, achei que não o amasse mais, só porque ele estava com
problemas, jamais imaginaria uma coisa dessas. Nunca. Jamais,
permitiria que ele encostasse em você, mãe… — as palavras se
perdem e estapeio meu próprio rosto, culpado. Desolado.
Totalmente perdido.
Que filho eu fui? Neguei apoio a uma mulher traumatizada
fisicamente e psicologicamente, uma mulher ferida na alma que
apanhou do marido e fez tudo o que pôde para me proteger. Preferiu
receber toda a minha raiva, para que ele ficasse com a admiração.
— Não precisa dizer nada, eu te amo, e é isso que importa —
declara abraçando-me com toda a sua força.
— Me perdoa. Perdoa por todas as vezes que fui frio e
distante. Por todas as vezes que te acusei e me afastei. Por nunca
ter perguntado…
— Não tenho o que perdoar, filho. Eu fiz uma escolha e não
me arrependo dela.
Capítulo 35
Caminho para quarto atordoada ouvindo o eco dos gritos de
Dominic, já tínhamos discutido outras vezes, mas nunca pareceu de
verdade como pareceu agora. Dona Louise passa por mim e seu
olhar se dilata em atenção, desespero e angustia. Vejo papai me
encarar no fim do corredor, e tenho certeza que ele também nos
ouviu.
Debruço-me sob a cama e desmorono. Choro com tanta dor
que eu mesmo me surpreendo em como me senti absorvendo suas
palavras que me cortaram profundamente.
Nunca me pareceu certo que qualquer destino ou briga
valesse arriscar quem somos. O amor não deveria doer, mas ao
contrário do mundo cor-de-rosa que pintam por aí, ele dói, e dói
muito. Amar alguém deveria ser um sentimento genuíno, leve,
merecido, não imposto. Não subjugado. Não deveria existir
cobranças, nem dúvidas…
Mas, talvez o amor não seja mesmo bonito. Nós que temos o
péssimo hábito de romantizar o que não é romântico. E por mais
que eu seja uma princesa de verdade, e tenha crescido imaginando
conquistar o mundo fora do conto de fadas; eu sempre sonhei em
me apaixonar e viver um grande amor. Ter ao meu lado um príncipe
encantado capaz de realizar meus sonhos de menina. Hrum. Lego
engano.
Não existe princesas e príncipes, não como nas histórias. Só
existem pessoas. Pessoas normais, com traumas, um passado,
defeitos, inseguranças, frustrações, cada um com seu enredo. E as
vezes essas histórias não combinam, e é onde o trem descarrilha.
Tem dias que me sinto tão forte. Tão madura e corajosa,
porém nesse exato momento me sinto pequena e frágil. Triste e
decepcionada com meu conto de fadas.
Os mais velhos deveriam nos ensinar desde crianças a não
criar expectativas com o esse sentimento. É lamentável o tempo que
perdemos tentando burlar a realidade com uma fantasia infantil.
Um dia estamos preocupadas com a roupinha da boneca e
no outro descobrindo o primeiro amor. Inevitavelmente a decepção
vem, e todo o resto perde o sentido.
É um insulto romantizar o amor.
Essa é a grande questão, amor não é o que se sente, é o que
se faz pelo amor. E muita das vezes fazemos coisas horríveis.
Amar é uma escolha. Esse compromisso tem que ser uma
escolha, e não uma consequência. Deveria ser a completude
inalcançável, algo tão bonito capaz de suportar tudo, mas não é
bem assim.
Olha pra mim agora, chorando feito uma boba, o coração se
contraindo em tristeza. Engolindo em seco a decepção de ver o
homem que eu amo desistindo de nós. Desistindo dele mesmo.
Não pedi que ele parasse de beber, mas sempre soube que
de alguma forma o tinha tocado para que desejasse melhorar, se
libertar desse refúgio fúnebre e solitário em que se trancou.
Sinceramente, não sei se estou mais chateada pela briga, ou
por saber que por tão pouco ele colocou tudo a perder.
Não é isso que quero pra mim.
Não foi desse jeito que sonhei em viver meu primeiro amor.
Será que sou egoísta em pensar dessa forma? Não sei. Não
sei mesmo.
Como ajudar alguém que não quer ajuda?
Que não se abre de verdade, que sucumbi toda a dor dentro
do peito, sufocando aos poucos. Esterilizando as chances de
felicidade, erradicando as oportunidades como se elas fossem uma
doença. Um vírus mortal. Afastando aqueles que o amam.
O choro incessante e a angústia me fazem abraçar o próprio
corpo. As dúvidas do que vem a seguir martelam em minha cabeça,
e o desespero me domina agressivamente.
A raiva cresce lentamente, e começo a conhecer uma nova
versão de mim. Dominic conseguiu despertar um colapso de orgulho
e ansiedade. Um sentimento tão obsoleto que inunda meu interior
causando danos que não sei se um dia poderão ser reparáveis. Eu
não queria ter dúvidas sobre ele, mas é tudo o que sinto agora:
dúvidas, e todas as suas raízes.
— Filha, posso entrar? — papai bate à porta, e o ar pesaroso
preenche todo o ambiente. Sentia-me tão chateada que vi seus
lábios se contraírem em um sorriso glorioso.
— Vai adiantar se eu disser que não? — repudio sua
presença sem olhá-lo nos olhos.
Seus passos firmes adentram o quarto e me pergunto qual
será o teor da conversa.
— Ouvi sua discussão com Dominic, e preciso dizer que te
avisei que isso não daria certo, filha, esse rapaz não é o homem
certo pra você…
— E o príncipe Willians é? — interrompo na defensiva.
— Sim. Ele é de uma família importante, educado, com
passado irrevogável. Foi criado e preparado para estar ao seu nível.
Solto um ruido parecido com de uma risada irônica, e papai
me analisa sério, tentando parecer amigável. Só tentando.
— Dominic pode ser um bom rapaz, mas tem problemas que
você não pode resolver — ele se aproxima e senta ao meu lado na
cama, — nem com dinheiro é possível — acrescenta sincero e
concordo mentalmente. — Filha, sei que está chateada, e que gosta
dele, mas isso vai passar, em breve você terá preocupações
maiores que te manterão longe desses pensamentos.
— Será que é só com isso que se importa? Sua vida está tão
melancólica que só pensa em passar suas responsabilidades? Por
que eu? — questiono cheia de indignação por sua frieza,
controlando-me ao máximo para não falar algo que me arrependerei
posteriormente.
— Você sabe porque você, Princesa. E não, minha vida não
está melancólica, sobretudo não é por isso que insisto nesse
casamento. Preocupo-me com seu futuro e com o futuro de
Liechtenstein. Você é a primogênita, inteligente e capaz tanto
quanto sua mãe.
— Entendo que sinta falta dela, eu também sinto, mas não
pode insistir na ideia de me transformar em sua cópia, papai. Essa
ideia está insustentável para mim. Porque apesar da aparência
idêntica, somos mulheres completamente diferentes — respiro fundo
lembrando-me dela. — Mamãe amava sentar naquele trono e
governar nosso reino, ela ficava simplesmente deslumbrante com o
poder, seus olhos irradiavam de orgulho. — Suspiro cheia de
inspiração, eu não quero ser rainha, mas com certeza quero ser
uma mulher como ela: guerreira, humana, determinada, confiante e
amiga.
Um aperto de saudade se instala em minha garganta e as
lágrimas brotam em meus olhos, papai tenta se aproximar, recuo.
Ele não entende, nunca quis entender, construiu uma barreira entre
nós e agora acha que vai ficar tudo bem com um abraço e meia
dúzia de palavras. Não vai ficar. Pelo menos não enquanto não for
pelos motivos certos.
— Posso ficar sozinha, agora? — afronto limpando o rosto
com as costas da mão.
Papai encara meus olhos com atenção. Com certeza tinha
um sermão elaborado na ponta da língua, mas preferiu se calar. O
rei Arthur levanta bem devagar, quase em câmera lenta e se
direciona até a porta, antes de sair diz:
— No fundo sabe que eu tenho razão.
— Papai… — recuso suas palavras encarando o chão, ele
continua.
— Infelizmente a gente não amadurece sorriso querida. Ser
adulto dói, e dói muito. — Ele sai deixando-me com o gosto amargo
de suas palavras.
Debruço sobre meus braços e caio em um choro sofrido e
tormentoso. Os pensamentos invadindo com força minha cabeça,
fazendo objeções e contestações horríveis.
Troquei o ponto de exclamação por reticências, na esperança
de evitar um ponto final na história que começou por um contrato.
Ignorei as vozes da minha cabeça que diziam claramente que não
íamos dar certo. Mas elas estavam certas. A verdade é que tentei
consertar uma coisa que claramente não tem conserto. Tentei curar
as feridas de um homem que conseguiu me deixar insegura, com
medo. Um coração tão sombrio que foi capaz de me fazer engolir
amargamente o desespero em pequenas doses de histeria.
Dominic, mesmo que involuntariamente poluiu meu coração,
arrancou de mim a inocência, e me deixou à deriva, completamente
sozinha…
Caminho até a sacada e respiro profundamente o ar gélido e
fresco que me envolve. O silêncio é tranquilizador, apesar das vozes
gritarem em minha cabeça.
Minha vontade é correr e abraçá-lo, aninhá-lo em meu peito e
dizer: estou aqui com você. Mas ele preferiu me afastar. Preferiu se
isolar em seu mantra de dor e autodepreciação. Então que fique só!
— rebato meu pensamento de piedade.
— Oi — James sussurra e me envolve pela cintura. — Você
está bem? — continua apoiando seu queixo em meu ombro.
— Papai já te contou? — Ele assente. Claro que contou.
— Não liga pra ele, casais brigam, é normal. Daqui a pouco
vocês se acertam, afinal, vocês vão se casar daqui uns dias.
— Espero que sim, James… — murmuro em dúvida e ele me
puxa para encará-lo.
— Ei, o que está acontecendo com a minha irmã corajosa e
otimista? — contesta em tom de brincadeira, e consegue extrair um
sorriso sem graça de mim.
— Não sei, sinceramente não sei pra onde ela foi… —
Suspiro controlando a vontade de chorar outra vez, eu realmente
não quero chorar, minha cabeça lateja e os meus olhos estão tão
inchados que se esforçam para ficarem abertos. James me olha
com pena sem saber o que dizer, e não tinha nada para ser dito
mesmo.
Sento na cadeira de balanço e admiro o jardim, os focos de
luz iluminando as flores. Gosto de admirá-las, me traz paz. James
senta ao meu lado e pousa sua mão sobre minha perna. Inspiro
várias vezes soltando o ar devagar, afim de colocar minhas ideias
no lugar. Eu só queria entender o que aconteceu, estávamos bem e
horas depois brigando de um jeito desconcertante e agressivo.
— Já discutimos outras vezes, mas nenhuma delas foi como
essa briga, — quebrei o silêncio balançando a cabeça em negação.
— O olhar dele estava diferente, enfurecido, cheio de raiva. Escuro
feito o breu da noite, ele parecia estar com raiva de mim…
— Nadine, Dominic te ama, isso é notável, ele só não estava
em um bom momento.
— Eu sei que está. Eu entrei na vida dele, atrapalhei seus
objetivos, e…
— E nada! — ele exclama confiante. — Dominic fez de você
o porto seguro dele, isso pode ser assustador às vezes. Vocês
fizeram uma coisa maluca, isso é verdade, mas olha por outro
ângulo. Você se apaixonou por ele, ele se apaixonou por você. Vai
me dizer que não acha que fez bem pra ele? — dou de ombros. —
Fez Nadine, você fez, o fato dele ter bebido outra vez, não quer
dizer que você não o ajudou.
— Eu apaixonada… — sorrio discretamente. — Irônico, não?
— Talvez. — Ele ri e me abraça.
Capítulo 36
Conversar com James sempre me confortou, e dessa vez
não foi diferente. Ele me fez rir e ter esperança que tudo vai se
resolver, tola foi eu por pensar que tudo seria perfeito o tempo todo.
Nina enche a banheira em silêncio e sai deixando-me
sozinha. Submerso meu corpo na água quente permitindo que o
perfume do sabonete inundasse minhas narinas, uma mistura cítrica
de limão-cravo. Volto a superfície revigorada. O coração acelerado,
cheio de esperança e determinação.
Desço para cozinha na intenção de espairecer, cozinhar
sempre me pareceu um excelente remédio. Vasculho os armários e
a geladeira colocando alguns ingredientes em cima da bancada. E
não faço ideia do que preparar, então deixo a imaginação coordenar.
Ao contrário das noites agitadas na mansão, hoje
especificamente está tranquilo. Agradeço por isso. Gosto de ficar
sozinha enquanto cozinho. Só eu e meus pensamentos. Dentro de
um recipiente redondo coloco ovos, leite, manteiga, farinha, canela,
e mexo coordenadamente, cantarolando a música que me faz
lembrar de Dominic. Aquela que escutei em seu carro em Paris.
Nunca vou me esquecer em como me senti ao ouvir aquela canção.
Acrescento gotas de chocolate e essência de baunilha e
formo pequenos montes redondos na forma, depois coloco no forno,
cookies sempre foi meu biscoito preferido.
Olho no relógio e marco o tempo, me surpreendo ao ver que
já passa da meia noite. Enquanto os biscoitos assam, caminho até o
jardim respirando fundo o ar fresco e puro de natureza. Volto para
cozinha tempo depois e confiro se o preparo está pronto. Tiro a
forma do forno colocando-a sobre a bancada fria, verifico se estão
bem assados mordendo um pedaço mesmo estando quente.
— Hum — murmuro assoprando os dedos — Está bom
mesmo.
Coloco os biscoitos em um pote e preparo um copo com leite.
Sigo em direção ao quarto de Dominic, ele não saiu do quarto o dia
todo, e se o conheço bem, não comeu nada.
Bato na porta cuidadosa para não fazer muito barulho. O
silêncio ecoa em meus ouvidos. Estranho. Será que ele está
dormindo? A vontade de conversar e acertar as coisas é mais forte
que o orgulho, giro a maçaneta e entro. O quarto está escuro, não
totalmente graças a uma brecha na janela entreaberta, que
reverbera o brilho da lua cheia.
Acendo o abajur da cabeceira, apoiando a bandeja sobre ela,
Dominic está dormindo, encolhido em posição fetal. Sento ao seu
lado e observo o semblante reprimido, os olhos apertados em
desespero, o maxilar serrado de tensão.
— Dom? — sussurro, não quero assustá-lo. — Dominic,
acorde, você está tendo um pesadelo — chacoalho seus ombros
delicadamente.
Seus olhos encontram os meus, engulo em seco, e a sintonia
que antes era palpável entre nós se perdeu, parecíamos dois
estranhos.
— O que está fazendo aqui? — ele se levanta e me encara
indiferente. Era como se o Dominic de ontem não estivesse mais
aqui.
Confesso que naquele momento me rendi a razão, eu devia
deixar meu orgulho tomar as rédeas da situação, engulo em seco
outra vez encarando seus olhos verde- intenso.
— Só queria ver como estava… — minha voz se perde na
tensão daquele olhar. — Quero conversar, saber o que está
acontecendo?
— Não está acontecendo nada! — rebate olhando para os
biscoitos na cabeceira.
— Trouxe pra você, acabou de tirar do forno — falo isso e me
sinto uma menina boba por ter feito biscoitos pra um homem de
ressaca, o mesmo que foi totalmente desnecessário comigo mais
cedo, mas fiz, está feito.
Percebo que ele resiste em pegar o pote da minha mão,
insisto e ele morde um, sorrio satisfeita, e ele sabe que espero que
diga alguma coisa.
— Está muito bom — diz seco e sem emoção.
— Tome o leite, vai te fazer bem — ofereço frustrada e
apreensiva com a quietude constrangedora.
Levanto certa de que foi um erro vir até aqui, bato os
calcanhares para saída e antes de passar pela porta sua voz rouca
e baixa chama minha atenção:
— Espera, Nadine!
Paro ainda de costas.
— Só preciso de um tempo. Só isso, está tudo bem, não se
preocupe.
Ele mente. Mente tão descaradamente que sinto nojo.
Viro para encará-lo.
— Desde quando nos conhecemos eu tive paciência com
você, estive ao seu lado quando precisou, pensei que éramos
amigos…
— Nós somos… — ele interrompe.
— Não, Dom, não somos. Somos pessoas diferentes que por
acaso o destino achou graça em nos juntar. Eu tento ter empatia por
você. Tento compreender suas frustrações, seus traumas, o medo,
mas eu já estou cansada de amar você no escuro. Cansada de
precisar me proteger de você. Cansada de ter sempre que barrar
meus sentimentos com medo de me apegar, sabendo lá no fundo,
que tudo vai acabar.
Ele tenta me interromper, não permito.
— Eu tô com medo de amar você, Dominic. Medo de assumir
que te amo mais que a mim mesma. Medo de acreditar que me iludi
com alguém tão problemático ao ponto de me fazer tanta desfeita.
Eu te dei meu coração, Dom, eu te dei minha amizade, e você não
me deu nada em troca! — brado sentindo um rubor de raiva subir
pelo pescoço.
— Fica calma, vamos conversar…
— Ah, agora você quer conversar? Minutos antes estava
monossilábico, e agora quer conversar? O que pensa que eu sou?
O que quer de mim, Dominic? — indago derrotada.
— Hoje realmente não é um bom dia, querida — sua voz soa
exausta, como se quisesse evitar outra discussão.
— O que eu preciso é de alguém que me dê esperança, e
não que me roube o pouco que tento manter dentro de mim. Você
precisa se resolver, ou tentar, não sei… — esfrego o rosto em
desespero. — Você me afasta e eu não sei porque faz isso… —
acrescento chorosa, o nó na garganta me apertando.
Eu só queria abraçá-lo, e sentir seu corpo quente no meu.
— Porque não quero que se corrompa com a escuridão que
habita em mim. Não quero que se magoe e se sinta responsável em
querer me consertar, talvez eu não tenha conserto, Princesa. Melhor
aceitar que sou um brinquedo quebrado e que não fomos feitos para
ficarmos juntos.
— Para! — vocifero e me aproximo. Encaro seus olhos
dilatados e entristecidos por alguns instantes, jogando meus braços
por cima de seu pescoço, apoiando a cabeça em seu peito. Ele
respira rápido, tão rápido que sinto seu hálito quente em minha
cabeça.
— Senta aqui — ele pede afastando nossos corpos. — Não
quero mais brigar, me desculpa por mais cedo eu realmente não
queria ter despejado minha raiva em você.
— Vai me dizer por que estava daquele jeito?
— Quer saber porque eu bebi? — rebate e assinto.
— Não tem motivo. Bebi porque sou alcoólatra, porque
estava com raiva por ser tão imperfeito ao seu lado, por achar que
merece mais do que isso — ele se olha referindo-se a si mesmo. —
Eu bebi porque esse é o meu subterfujo. Porque sei que, o que o
Príncipe e seu pai falam é verdade. Eu não mereço você, amor…
— Dom… — Interrompo acariciando seu rosto, e suas mãos
me impedem.
— Seu pai tem toda a razão, esse mundo não é pra mim.
Você não é mulher pra mim. E sinceramente, Princesa, me sinto
culpado por tudo que fiz, por ter sido o primeiro homem na sua
cama, e o primeiro homem que vai partir seu coração.
— Vamos dar um jeito nisso! Você não vai partir meu coração
— argumento, aquela conversa precisava acabar.
Ele sorri e desvia o olhar para os lados sem coragem de me
olhar nos olhos.
— Você está terminando comigo? — pergunto e a tensão se
instala bem diante de nós.
Acordo sobressalto, está escuro, meu coração bate acelerado
e as lágrimas escorrem por meu rosto suado, aperto os olhos
repetindo baixinho que tudo não passou de um sonho. Eu estava
cansada, chateada e sonhei com um monte de baboseiras,
acontece.
Acendo o abajur e confiro na tela do celular as horas, já
passa das 5h da manhã, vou até o banheiro e encaro meu reflexo
pálido e assustado no espelho. O cabelo grudado na testa. Lavo o
rosto tentando me livrar da sensação angustiante do sonho.
Dominic desistindo de nós. De mim. Escolhendo não lutar
pelo nosso amor. Aceitando o lugar sombrio que o acompanha.
Fico alguns minutos encarando meu reflexo, pensativa e
agoniada. O medo de que aquele sonho se torne realidade. Um
presságio.
Preciso ser forte. Enfrentar esse problema. Foi só uma briga,
James tem razão, casais brigam. Meu estômago se espreme, e faz
um barulho agudo lembrando-me que não comi o dia todo. Saio do
banheiro e me sirvo de um copo d’água, Nina sempre deixa uma
jarra na mesinha. Minhas mãos tremem, e as pernas se esforçam
pra continuar de pé.
Tento afastar os flashs do sonho, não consigo. A visão de
Dominic me olhando sem amor, sem emoção, tentando me dizer
que tudo não passou de um erro… a sensação de abandono me
corroendo lentamente.
Choro outra vez, os gemidos escapando involuntariamente da
minha garganta. Eu tô sendo uma idiota. Uma menina boba
chorando depois de uma briga com o namorado. Mas ele é meu
primeiro namorado. Meu marido. O homem que escolhi para
entregar tudo de mim, mesmo ciente dos riscos.
Corro pelo corredor e bato na porta de Dominic, o eco da
madeira chicoteando no ar. Bato mais forte, não há sinal de
resposta, giro a maçaneta e me deparo com a escuridão,
exatamente como no meu sonho, o vazio, o ar comprimindo o
desespero. A cama está arrumada, não tem sinal dele em nenhum
lugar. O banheiro está vazio. Meu coração acelera. Abro o armário e
suas coisas não estão mais lá.
Grito. Grito seu nome por todas as partes. Papai aparece na
porta de seu quarto assustado. Vicenza vem de encontro a mim,
mas não lhe dou atenção. Corro em direção a dona Louise que me
encara apavorada pelos gritos histéricos.
— Onde ele está? — pergunto olhando para dentro do
quarto.
— Quem Nadine? — rebate ainda sonolenta.
— Dominic…
Capítulo 37
Fui um babaca. Um cafajeste em tratar Nadine daquele jeito
depois dela ter me proporcionado o melhor sexo de todos.
Ela se entregou a mim como um anjo inocente, e eu fui o
vilão.
Mas, saber a verdade sobre meus pais me jogou em um
abismo de dúvidas e culpa, na qual eu não consegui sair. Fui
bombardeado com a sensação de ter a companhia de todos os
fantasmas que me assombram por todos esses anos.
O coração apertado. A respiração se transformando em
pânico, e o desespero se instalando lentamente em cada molécula
do meu corpo. Remoendo cada palavra, enquanto uma dor
dilacerante esmaga o peito. A sensação fulminante de ser cortado
por milhares de lâminas. A ferida sendo aberta outra vez.
As lágrimas se libertam relembrando nitidamente todas as
vezes que a julguei. Todas às vezes que desejei que ela tivesse
morrido no lugar dele, meu Deus… se arrependimento matasse…
Grito contra o travesseiro privando o ar de entrar em meus
pulmões.
Estou com raiva de mim. Muita raiva.
O que dói é saber que a minha vida; as nossas vidas
poderiam ter sidos diferentes se ela tivesse me dito a verdade.
Poderíamos ter sido mais unidos. Quanto tempo eu perdi! Quantas
vezes fui distante, calculista e juguei suas escolhas, sem ao menos
perguntar os motivos.
Bato no próprio rosto, afim de me castigar pela culpa. Não
adianta, não vou me perdoar. Essa culpa não vai passar. Não vou
conseguir esquecer o medo nos olhos de minha mãe. O tremor em
seu tom de voz, e o receio por se sentir obrigada a me contar a
verdade, para que a história não se repita. Para que eu não seja
como ele.
E eu não quero ser como ele.
Não posso ser esse homem para Nadine. Não posso deixar
que ela conheça o pior de mim. Eu sei, ela já me viu jogado em
poço de lamurio. Mas sei que posso ser pior e não quero que ela
tenha essa recordação de mim.
Vou magoá-la. Vou partir seu coração por não cumprir minha
promessa.
Só espero que ela entenda que essa é a melhor saída para
nós dois.
Melhor pedir perdão por ter ido, do que me arrepender
amargamente por ter ficado. E prolongar um assunto que já
sabíamos que estava fadado ao fim desde o início.
Preciso de um tempo sozinho. Pensar. Me refazer. Consolidar
meus princípios. E a parte mais importante, me tratar. Ficar sóbrio e
certo de que farei isso por mim, não por ela, não por minha mãe,
mas por mim. Para que eu seja merecedor de tudo o que conquistar
daqui pra frente.
Coloco minhas coisas na mala. O coração sangrando. A
tensão desesperadora instalada no ar. Não penso nas
consequências que minha decisão irá trazer, mas sei que essa é a
decisão certa. Eu preciso me afastar. Preciso deixar Nadine seguir
seu caminho sem mim.
Olho no relógio e são quase 1h da manhã, o silêncio é
ensurdecedor. Os gritos ecoam em minha mente e tudo vem à tona
a cada segundo. Como ondas vorazes de um mar tempestuoso se
quebrando no cais.
O medo me consome. Não queria ter que deixá-la. Não
queria partir e quebrar minha promessa… Só espero um dia ser
merecedor do seu perdão. Porque estou indo na esperança de ter
mais uma oportunidade, apenas mais uma para viver esse amor…
Esse amor que me trouxe esperança, que me deu a
oportunidade sonhar em ser feliz um dia. Quando estiver pronto.
Quando estiver limpo de toda essa merda.
Penso em deixar uma mensagem de áudio para Nadine, uma
despedida, mas então lembro que apesar de durona, ela é uma
apreciadora do romancismo épico, uma princesa rebelde que saiu
dos contos de fadas direto pra vida de um vilão solitário. Decido
escrever uma carta, não tão intensa como Hardin escreveria para
Tessa, mas tão sincera quanto.
Passo pelo quarto de Nadine na ponta do pé. Preciso vê-la
uma última vez. Olho pela brecha da porta, está dormindo. Entro
devagar e me aproximo da cama grande no centro do quarto. Ela
está coberta até a cintura. Os ombros desnudos e brilhantes em
contraste com um raio de luz que reverbera da lua através da
cortina entreaberta. Acaricio sua pele com delicadeza e cuidado pra
ela não acordar.
Apesar dos traços tensionados, ainda assim parece um anjo.
— Me perdoa, amor — sussurro engolindo em seco a dor da
despedida.
Beijo sua testa e inalo seu perfume, memorizando seu cheiro
adocicado que me fez dormir em paz muitas vezes.
Passo pela portaria hesitante. Os guardas me olham e
estranham a mala em minhas mãos.
— Pode pedir para o motorista me levar até o aeroporto? —
peço para o homem alto e de ombros largos que tem uma feição
séria e compenetrada.
— Sim senhor.
Pensei que ele questionaria pelo horário ou por outro motivo
qualquer, mas não.
Entro no carro e sou surpreendido por uma avalanche de
pensamentos:
É estranho como o destino é ardiloso. Precisei me casar
através de um maldito contrato. Estar em um país arcaico com uma
monarquia ativa. Enfrentando a ira de um pai protetor e rei cruel,
sem falar em um Príncipe rejeitado, para enfim, minha mãe me
dizer, assim, do nada que sofria violência doméstica.
Porra!
Ela sofreu durante anos em um casamento fracassado por
causa da bebida. Por causa da frustração de um homem que não
soube lidar com as consequências de suas próprias escolhas.
Meu pai era um homem ativo, trabalhador e temperamental.
Quando foi obrigado a diminuir o ritmo e aceitar que estava na hora
de se cuidar mais, foi o fim pra ele. O início do fim. E por saber disso
ela tinha o dever de me contar. Eu nunca teria colocado uma gota
de álcool na boca se soubesse.
E agora por causa da merda de um passado fodido, sou
obrigado a deixar para trás a única coisa que me fez feliz nos
últimos meses. A única pessoa que acreditou em mim e me forçou a
olhar para frente. A única capaz de me fazer sentir vergonha e
querer ser melhor. A única que confiou em mim, mesmo eu sendo
um homem inconfiável.
Eu entreguei meu coração sem perceber. Deixei-a ver quem
verdadeiramente sou sem nem ao menos perceber. Eu não a
escolhi. Não planejei me apaixonar. Talvez agora eu acredite em
destino. O amor genuíno de almas gêmeas. Ou melhor, quero
acreditar nisso.
Que fomos feitos um para o outro.
Que nosso futuro está traçado e que nenhum obstáculo será
forte o suficiente para acabar com esse amor.
Preciso acreditar e me apegar nisso.
Senão vou enlouquecer.
Capítulo 38
Ainda não acredito que Dominic foi embora sem mim…
Olho para os lados e me sinto perdida. Tínhamos um plano.
Ele me prometeu que não me abandonaria. Que ficaria comigo até o
fim. Ele mentiu…
Dona Louise tenta me consolar em seus braços. E por alguns
instantes cedi ao seu toque materno. Ela realmente se mostrou
preocupada comigo, ao contrário do meu pai, que não se
compadeceu com meu desespero.
— Não fica assim minha linda — dona Louise cochicha em
meu ouvido, sinto sinceridade em suas palavras.
Ela está tão surpresa quanto eu com a partida do filho.
Solto-me de seus braços e ignoro o olhar preocupado de
James e Vicenza e corro para dentro do quarto onde Dominic estava
e me tranco ali dentro. As costas contra a porta, o choro se
libertando de minhas entranhas. Desmorono escorregando até o
chão.
— Amiga. Nadine, abre aqui — Vicenza chama preocupada.
— Quero ficar sozinha, por favor — peço em sôfrego,
aliviando os gemidos exprimidos que me sufocam.
O silêncio grita no ar. A respiração invadindo meus pulmões
me cortando por dentro. Olho para um ponto fixo na janela. O sol
começa a nascer apontando um novo dia. O dia em que Dominic
decidiu não fazer mais parte da minha vida.
Não sei por quanto tempo fiquei sentada ali, no mesmo lugar,
ouvindo apenas os gritos da minha alma, e o pulsar lento do meu
coração. Era como se eu o sentisse quebrando. Sim, Dominic
quebrou meu coração em pedacinhos ao partir sem se despedir,
sem explicar seus motivos. Eu iria entender. Juro que ia.
O sol reflete sua luz em minha pele e sinto o calor me abraçar
suavemente. Levanto morosa e caminho até a janela, o céu está
limpo e azul, sem nuvens, e o sol grande e amarelo aquecendo e
iluminando tudo ao seu redor. O dia está mesmo lindo.
Observo a movimentação dos guardas e dos funcionários da
mansão. Todos ocupados com seus afazeres. Vicenza está sentada
com James no jardim, eles conversam e parecem concordar.
Dona Louise caminha ao lado de papai, e não consigo evitar
uma careta ao vê-los juntos. Não porque não goste da ideia que me
vem à cabeça, e sim pelo fato de ninguém estar nem aí para o meu
sofrimento. Poxa, eu fui abandonada as vésperas do meu
casamento de verdade. — Apesar que sou casada, então quer dizer,
casada e agora abandonada.
Ótimo Dominic, ótimo!
Sento na beirada da cama e aliso o lençol macio, imaginando
seu corpo e seu cheiro no tecido — levo o nariz até o travesseiro e
consigo sentir o amadeirado de sua loção pós barba sumindo aos
poucos.
Deito sobre o travesseiro querendo chorar outra vez, mas as
lágrimas me abandonam. Eu queria chorar e colocar pra fora a
angústia que sentia, não queria mais pensar nas dúvidas que agora
ficaram ainda mais latentes em minha cabeça. Só queria chorar e
esquecer esse dia. Esquecer que pela primeira vez tive meu
coração partido em dois…
Pela primeira vez entendi que só o amor pode causar
tamanha dor.
Porque você só sente esse aperto quando ama demais
alguém, quando se doa, quando entrega parte do seu coração para
outra pessoa, sem saber se ela cuidará dele com todo carinho e
apreço.
Eu tentei convencer meu coração que o que tínhamos não
importava. Que não significava nada além de um romance qualquer.
Eu realmente achei que estava no controle até me ver sem ele.
Agora estou com medo. Medo de abrir essa porta e ser obrigada a
aceitar que acabou.
Mas eu não entendo, e eu preciso entender, como acabou?
Estávamos bem, e de repente não existe mais a gente?
Queria dizer que não me importo. Que não me preocupo.
Que não estou apavorada. Mas estou! Pensei que fosse forte o
suficiente pra superar qualquer coisa. Invencível na arte de amar.
Achei que se um dia você partisse, eu superaria, e agora que você
não está aqui, meu coração implora pra você voltar. É involuntário.
E a cada milésimo de segundo que penso, e tento entender
toda essa merda, é como se uma faca cortasse bem no centro da
minha alma.
Encolho-me na cama fria e vazia, e embaixo do travesseiro
encontro um papel, uma carta. Por alguns segundos analiso o
envelope em minhas mãos. Porque ele deixaria ali? Será que
imaginou que me destruiria assim?
É Dominic, você acertou!
Abro o envelope com atenção e analiso sua letra cursiva,
sem coragem para ler.
O medo evaporando pelos poros. O medo de encontrar
respostas no meio daquelas linhas.
— Minha menina, trouxe seu almoço — Nina bate na porta e
sussurra.
— Não estou com fome, Nina — respondo sem desviar os
olhos da carta.
— Não comeu nada, precisa se alimentar — insiste.
Não respondo e ela vai embora.
Inspiro profundamente deixando o ar entrar livremente para
dentro de meus pulmões, sentindo a coragem se instalar outra vez.
“Uma vez uma linda princesa me contou uma história sobre o amor.
Ela me disse que esse era um sentimento devastador e ao mesmo
tempo lindo e genuíno. Era como admirar uma rosa deslumbrante e
não desejar arrancá-la de seu belo jardim. Ela disse que
precisaríamos ser altruístas e apenas contemplá-la de longe. Sentir
o seu perfume e vislumbrar sua beleza sem tocar. Seria impossível
não se machucar com seus espinhos. Ela murcharia ao ser
arrancada de seu lar e quem a arrancou se machucaria por não
merecer sua vivacidade. Seus espinhos o castigariam.
Então entendi que mesmo que a gente ame muito uma coisa.
Mesmo que queiramos muito ter uma beleza surreal somente para
si, devemos saber o momento de partir e deixar que aquela
lembrança boa, viva presente somente em suas lembranças.
Quero que saiba, Princesa, que você é a minha rosa. Não posso ser
egoísta em querê-la somente para mim, não sou merecedor do seu
amor. Do seu primeiro amor. Mas quero que saiba que onde quer
que eu vá, aonde quer que eu esteja, eu sempre vou amar você.
Estou te deixando livre para viver os seus sonhos, sem ter que
carregar o peso de um homem com um passado sombrio e
problemático, e o mais importante, te deixo livre para ser feliz sem
mim. Vou sentir saudades, é claro, porque você me deu algo que
não posso mais viver sem. Tive que fazer uma escolha difícil,
precisei decidir se ficaria e te amaria pela metade, ou se partiria e
torceria por uma chance de te amar por inteiro. Você já sabe qual foi
a minha decisão.
Preciso me reencontrar e descobrir quem eu sou de verdade e
quem eu quero ser. Que tipo homem eu quero ser pra você.
Não pense que está doendo só em você, te garanto que estou
partindo com meu coração em pedaços. E não chore, não fique
triste por mim. Seja feliz e continue buscando por seus sonhos. O
mundo é seu, minha Princesa fujona. Te amo.”
Leio a carta três vezes seguidas, sem acreditar que aquele
homem frio e solitário, tinha escrito palavras tão lindas. Suspiro
abraçando o papel contra o peito, acalmando o alvoroço que se fez
dentro de mim.
— Nadine, abre a porta, por favor — apela Vicenza.
Abro a porta ainda absorta com a carta deixada por Dominic.
— Fecha a porta, por favor — sussurro sem olhá-la nos
olhos.
— Não acredito que vai passar o dia chorando, amiga!
— Eu… Ah… — desisto de me defender.
— Nadine, aposto que ele deve ter tido um motivo muito forte
pra tomar essa decisão, e isso não quer dizer que estou defendendo
o que ele fez, só quero que erga essa cabeça e siga em frente.
— Como? Como vou seguir em frente, Vi? — resmungo
segurando para não chorar.
Sem dizer nada, Vicenza me abraça e me sinto acolhida.
Compreendida.
— Vai ficar tudo bem, amiga, — ela segura minhas mãos e
aperta. —Vamos dar um jeito nisso!
— Eu o amo tanto, Vi — confesso encarando o chão,
sentindo-me derrotada e de coração partido.
— Eu sei.
— O que eu faço agora? Meu pai não vai me deixar em paz…
— Vamos pensar em alguma coisa. Você casou com
Dominic, não vai poder casar de novo, né?
— Você não conhece o Rei, amiga… — Faço uma pausa
pensando em todas as possibilidades.
— Você acha que ele teve alguma coisa a ver com isso? —
ela pergunta sentando ao meu lado.
— Não acho, eu tenho certeza! Quer saber, vou falar com ele
e tirar essa história a limpo agora mesmo!
— Amiga, espera! — encaro sua feição duvidosa. — Melhor
tomar um banho primeiro, você está um caco — ela ri quando cheiro
minhas axilas e constato que realmente preciso de um banho.
Vicenza me acompanha até o quarto. Guardo a carta na
gaveta e sigo para o banheiro. Rapidamente Nina aparece e me
ajuda.
Fechos os olhos embaixo do chuveiro. Minha cabeça lateja,
meus olhos doem, e meu estômago faz barulhos monstruosos. Acho
que nunca passei tanto tempo sem comer, e chorando. Bom, só
quando mamãe morreu.
Encaro meu reflexo horrível no espelho, estou pálida e com
olheiras. Ergo a cabeça e repito várias vezes que isso vai passar.
Empondero-me de toda a minha força para encarar papai e toda a
sua arrogância superior e saio do banheiro revigorada.
Encorajada a encarar o que vem a seguir de cabeça erguida.
— Papai, o que faz aqui? — questiono vendo-o parado,
olhando pela janela do quarto.
— Aproveitando o seu momento de sensatez — rebate, a voz
arrastando em uma mistura de ironia e preocupação.
— Eu…
— Sei que gosta dele, e que está triste, mas precisamos
resolver coisas mais importantes.
Um ruido de indignação escapa de meus lábios e ele
continua:
— Sei que deve estar achando que tive alguma coisa a ver
com a partida de Dominic. E não, eu não tenho nada com isso.
— Não acredito! — respondo me aproximando dele.
— Vai ter que acreditar, porque agora você não tem para onde
correr.
Minha respiração acelera, e sei exatamente o que ele quer
dizer.
— O que você falou pra ele? O que aquele idiota do Príncipe
Willians disse, para que ele me deixasse? — brado sendo
consumida pela ira.
— Cuidado com o seu tom, Princesa. Já estou perdendo a
paciência com sua rebeldia, — papai me encara brando. — Essa
situação já era de se esperar, Dominic não se encaixaria em nosso
mundo…
— E quem disse que ele teria que se encaixar? Eu queria me
encaixar no mundo dele. Só voltei porque não queria te dar mais um
desgosto em não me casar diante da corte, mas já entendi que fui
enganada. Tudo não passou de um plano cruel para me obrigar a
ficar aqui!
— Talvez, mas é tudo…
— Para o seu bem — interrompo — é, eu já ouvi tudo isso.
— Sinceramente achei que precisaria ser mais claro sobre
minha relutância com esse casamento, Nadine, mas não precisei
me rebaixar. Dominic foi embora por conta própria, e se não se
despediu, bem provável que o compromisso dele com você não
fosse tão importante como achou.
— Chega! — vocifero apoiando a cabeça entre as mãos,
exausta de tantas brigas e discussões.
Estou triste demais pra questionar ou rebater as ironias de
meu pai. Só quero que isso acabe. Só não quero ter que sentir mais
isso.
— Gostaria de te dar mais tempo para se recompor, mas não
temos. Seu casamento com o príncipe Willians será mantido, e o
documento do circo que criou será cancelado em breve, meus
advogados já estão cuidando disso.
— Dominic foi embora à poucas horas e o senhor já quer me
empurrar para o calabouço? — ironizo vencida.
— Não temos tempo a perder, essa é sua família, sua corte e
seu reino, aprenda a amar essa parte de sua vida. Já estamos há
tempo demais compactuando com esse seu desvaneio, agora
chega! Dominic foi embora. Sua certidão será cancelada e você se
casará com o Príncipe no próximo dia 15.
— Dia 15 é daqui alguns dias — questiono estarrecida, e em
choque por sua frieza.
— Não se preocupe, logo esquecerá esse rapaz, filha.
Dominic não será o primeiro, nem o último homem que amará.
— Obrigada pela sensibilidade, — falo derramando uma
lágrima atrás da outra, eu só queria que tudo aquilo acabasse de
uma vez. — Tudo bem, papai, o senhor venceu. Desisto de resistir a
essa monarquia arcaica e machista que vai me obrigar a casar com
um homem que eu não amo, para o bem da política. — Serei infeliz
para satisfazer seu ego. Satisfeito? — interrogo em prantos, ele me
observa inexpressivo, analisando meu sofrimento sincero, mas não
se comove.
— Te espero para o jantar… — ele faz uma pausa, olhandome de cima a baixo. — Vista algo apresentável.
Papai sai do quarto e Vicenza entra, apavorada com o que
escutou da conversa.
Não consigo dizer nada e sou consolada por seu abraço.
— Quando Diogo chega? — pergunto limpando o rosto.
— Ele ligou mais cedo, ele não vem, disse que precisa
resolver umas coisas importantes, desconfio que ele saiba sobre
Dominic.
— Provavelmente.
— O que você vai fazer amiga?
— Nada. Chega de tentar fugir do meu destino. Eu me
machuquei e com certeza machuquei Dominic, magoei muita gente,
então chega…
No jantar príncipe Willians me olhou vitorioso, mantive-me
afastada, quieta, como uma verdadeira princesa. “Apenas fale
quando solicitado.” — Era isso que papai dizia. Foi isso que fiz,
silêncio absoluto.
Dona Louise queria me dizer algo, e ao invés disso se
mostrou empática. Vicenza disse que ela já até comprou sua
passagem de volta para Paris.
— Princesa, podemos conversar? — Willians me encontra no
jardim.
— Não estou…
— É rápido, só quero dizer que não estou feliz com toda essa
situação. Eu realmente queria que esse casamento fosse agradável
para nós dois.
— Queria é? — debocho na defensiva.
— Sim, queria. Gosto da senhorita, sabe disso…
— Gosta de mim, ou do cargo que terá ao se casar comigo?
— Sua feição empalidece, e nesse momento tenho plena certeza
sobre minhas dúvidas referente ao seu caráter. — Você quer ser
Rei, mas não é o primogênito, não é isso, Príncipe Willians?
Capítulo 39
Observar a feição manipuladora do Príncipe me causou um
doce amargo na boca. Um embrulho se fez em meu estômago e fui
obrigada a entornar grandes doses de desespero, até sucumbir a
raiva por me sentir presa a um homem sem escrúpulos como ele.
Um homem que está disposto a viver um casamento infeliz ao lado
de uma mulher que não ama, por um cargo. Por um título na
realeza.
— (…)
Ele não encontrou palavras, não adiantaria mentir para a
mulher que passaria os próximos anos ao seu lado.
— Que fique bem claro, Willians, não encostará em mim. Não
tocará em meus lábios. Não terá nada de mim, além da coroa.
— Parece justo — confessa e me presenteia com sua partida.
E mais uma vez um nó aperta minha garganta.
Enrolei o quanto pude até aceitar que não poderia fugir do
meu destino. Não me arrependo por ter me aventurado; por ter
conhecido Dominic. Mamãe certamente estaria orgulhosa por minha
coragem em simplesmente viver.
Foi bom enquanto durou.
Tem dias que penso que essa angústia não vai passar. A
saudade me consumindo aos poucos. Lentamente. Deixando-me
apagada. Ser cor. Eu realmente não me sinto a mesma, é como se a
luz que brilhava dentro de mim, tivesse sido aniquilada e não sei
como reascender. Não faço ideia.
Mesmo me esforçando para seguir em frente e esquecer o
que vivi em Paris, com Dominic… a dor do tempo e a veracidade das
minhas lembranças me torturam. Contestam minha covardia. Minha
desistência. Estou simplesmente abrindo mão dos meus sonhos,
entregando de bandeja a única vida que me foi concedida. Jogando
fora a chance de viver tão intensamente, quanto se é possível.
Talvez demore um pouco até eu me acostumar. Talvez eu
perca noites de sono, e fique sem paciência por um tempo. Talvez
eu me afaste daqueles que amo, e chore escondido lembrando de
você, ou da vida que poderia ter tido a seu lado…
Provavelmente vou me incomodar quando as pessoas
comentarem algo sobre você, ou toda vez que olhar para minha
aliança que em breve será substituída. Helvete. — Faço uma pausa
pesarosa. — A decisão de partir não foi minha, Dominic, você
desistiu de nós… — resmungo alisando a aliança em meu dedo.
— Nadine? — dona Louise bate na porta do quarto e entra.
Abro um sorriso desmotivado e ela se aproxima.
— Podemos conversar?
— Claro! — respondo dando espaço perto da janela.
— Meu voo é amanhã cedo, e antes de ir, quero ter certeza
que ficará bem.
— Vou ficar bem — minto, lançando um sorriso amarelo
enquanto suas mãos apertam as minhas.
— Sinto muito — declara com os olhos marejados. — Eu não
sei o deu no meu filho pra ir embora desse jeito. Estou tão
envergonhada, a culpa foi minha…
— A senhora não tem culpa, — interrompo e limpo suas
lágrimas com carinho.
— Tenho sim! — afirma olhando-me nos olhos. — Contei
para Dominic sobre meu passado com o pai dele, achei que ele
tivesse aceitado bem. E, agora sei que só fiz mal ao meu filho.
Piorei as coisas, e estraguei tudo entre vocês, me perdoa Nadine.
Eu estava tão feliz por vocês. Você conseguiu fazer meu filho sorrir.
Ele saiu daquele escritório, viajou com você. Largou a bebida por
você. E foi embora por você… — Seu choro é desesperador, sua
voz trêmula e cansada demostra dor e arrependimento.
— Não entendo, — sussurro surpresa. — Porque ele iria
embora por mim?
— Desde a morte do pai dele, Dominic se fechou em um
mundo sombrio só dele, você foi a única pessoa que conseguiu
conhecer meu filho verdadeiramente, suas fraquezas, seus medos e
traumas. Ele confia em você! — Dona Louise acaricia meu rosto. —
Sempre achei Dominic muito parecido com meu ex. marido, mas se
uma coisa ele puxou de mim, foi o dom de mascarar o medo atrás
de uma postura firme.
— Eu não sei o que dizer… — choramingo.
— Não precisa dizer nada. Só quero que saiba o porquê ele
foi embora, não justifica, mas me sinto que de alguma forma, fui
responsável por isso.
— O que disse pra ele? — questiono impaciente procurando
fragmentos de respostas.
— Antes de contar o que aconteceu, quero que entenda que
tudo o que eu fiz, toda a decisão que tomei foi pensando no bem
estar do meu filho.
— Dona Louise, eu jamais ousaria te julgar.
Ela segura minhas mãos com força, e consigo sentir sua dor,
o desespero em seu tom de voz, os batimentos pulsando forte em
seu pescoço.
— Pode confiar em mim — afirmo abraçando-a com força.
— Quando Roberto precisou se afastar do trabalho, ele
encontrou na bebida um refúgio. Antes era um ou dois drinks toda a
noite, depois as doses aumentaram, e com o tempo ele já não
queria mais beber em casa. Chegava quase todas as noites caindo
de bêbado. Algumas vezes trazido pelos amigos, e outras eu
precisava buscá-lo no bar.
— Sinto muito …
— O que era apenas um alivio para uma noite tranquila de
sono, se transformou em um inferno. Ele bebia de dia, de noite, eu
já não aguentava mais. Quando ousei questioná-lo, levei o primeiro
tapa, — ela respirou fundo voltando naquele exato momento, o
instante que teve sua dignidade abalada por aquele que prometeu
amá-la e protegê-la. — Engraçado que até hoje sinto o gosto
amargo e ferroso do sangue… — seus lábios se contraem e sinto a
dor vívida em sua memória. — Os pedidos de desculpas, as flores e
chocolates começaram a ficar mais frequentes. Eu relevei durante
muito tempo toda aquela situação, sofri sozinha e calada. Mas eu
não queria mais aquilo, e não conseguia abandoná-lo, eu o amava
muito. Queria minha família unida.
— E o que aconteceu? — incentivo quando ela faz uma
pausa longa demais. As lembranças gritando em sua mente; o
trauma trazendo toda a dor e sofrimento à tona. Ela abraça o corpo,
os pelos arrepiados como se estivesse sentindo a ardência e a dor
de cada soco e tapa desferidos em seu corpo e em sua alma.
— Um dia ele tentou me violentar e Dominic viu.
Espanto-me com a revelação e agora tudo faz sentido, isso
é muito para Dominic, e ele está lidando com isso sozinho.
— Roberto estava bêbado e gritava muito, Dom só tinha 13
anos, ele tentou me defender e foi golpeado por um empurrão que
causou uma fratura delicada em seu braço, Roberto ficou tão
desesperado quando viu o filho desacordado…
— A cicatriz no braço… — murmuro lembrando que acariciei
aquela cicatriz.
— Sim. Quando Dominic acordou no hospital e não se
lembrava de nada, decidimos que era hora de acabar com todo
aquele tormento. Decidimos juntos que seria melhor que ele se
tratasse longe do nosso filho. E ele até tentou por um tempo, mas
era qualquer coisa sair do controle que ele voltava a beber. Chegou
uma hora que cansei de esperar, cansei das importunações, das
gritarias na portaria, das ligações na madrugada e da humilhação de
escutar o quanto eu era uma vagabunda por tê-lo afastado do filho.
Eu cansei… — ela desaba e sua voz some, dando lugar ao choro e
a gemidos inexprimíveis.
— Shiii, está tudo bem. — Acalento seu corpo em meus
braços.
— Eu o amava, Nadine, mas eu não aguentei, não queria que
Dominic presenciasse o pai daquela maneira outra vez. Foram
muitas noites em claro. Muitas horas de maquiagem pra esconder
os machucados e não ter que explicar a ninguém. Passei meses
com medo. Mas, eu precisei ser forte, precisei ser corajosa, e ir para
longe. Eu precisava viver longe daquele relacionamento tóxico que
me machucava o corpo e a alma.
— A senhora fez certo. Pensou no bem estar do seu filho e
no seu. Não se arrependa por isso.
— Quando Roberto ficou doente não restava mais amor. Um
pouco de raiva e empatia, talvez, mas não tinha mais o que fazer, a
cirrose já estava em estágio avançado. Eu o perdoei. Quando o
visitei no hospital, conversamos e prometi que Dominic jamais
saberia sobre nós, ele simplesmente idolatrava o pai. E eu não
queria que ele o visse de outra forma.
— Dominic tinha pesadelos, um vazio no peito por não saber
porque as coisas tinham sido do jeito que foram. Ele merecia a
verdade — desabafo tomando as dores do homem que amo.
— Eu sei, não me orgulho por ter guardado esse segredo
comigo todos esses anos, mas precisei. Quando ouvi ele gritar com
você, jogar as coisas e agir descontroladamente por causa da
bebida, da insegurança que sente, lembrei de mim, do que passei.
Dos os olhos escuros exalando raiva, as mãos trêmulas procurando
algo para agarrar e descarregar toda a fúria. Jamais me perdoaria
se ele fizesse qualquer coisa que a machucasse, Nadine. — Dona
Louise declara. A sinceridade e preocupação estampada em seus
olhos.
Não consegui achar palavras que descrevesse o que eu
estava sentindo naquele momento. Só conseguia pensar em
Dominic, em como ele está se sentindo com tudo isso.
— Te considero como minha filha, apesar de nos
conhecermos há tão pouco tempo, sinto um carinho muito grande
por você.
— É um sentimento recíproco, dona Louise.
— Não fique com raiva do meu filho, ele não é o herói, mas
também não é um vilão, ele está tentando. Tenho certeza que ele
vai conseguir, tenho fé que se ele continuar tentando vai conseguir
se permitir ser feliz. E eu vou continuar a ter fé nele, porque foi por
ele que me refiz das cinzas. Foi por ele que fui forte e continuei
mesmo me arrastando, mesmo com o coração sangrando eu
continuei. Só peço que também não desista dele. Que continue
tendo fé no meu menino, até que ele consiga ter fé em si mesmo.
— Eu não desisti dele, dona Louise, eu o amo com todas as
minhas forças, mas não posso fazer nada. Estou fadada a um
casamento arranjando, em breve serei obrigada a sentar naquele
trono e esquecer tudo o que eu sempre quis.
— Você não vai desistir, só está magoada, sei que vai
encontrar uma solução, você vai ver.
Nos abraçamos bem forte, e naquele momento íntimo, senti a
presença da minha mãe, era como se ela tivesse me presenteando
com a amizade, carinho e confiança de dona Louise, uma mulher
guerreira e determinada assim como ela. Uma mulher disposta a
mover céus e montanhas se preciso for para defender um filho.
Se antes eu tinha orgulho da mulher que dona Louise é,
agora tenho muito mais.
Alguns dias depois
Permaneci isolada do mundo ao meu redor. Não consigo
pensar ou agir direito. Estou sem forças. Ancorada no passado e na
angústia que me paralisa.
Ainda não tenho notícias de Dominic. Dona Louise foi
embora, porém não conseguiu nenhuma pista de onde ele está.
Tem dias que eu realmente acho que vou enlouquecer. Tento
fazer planos e projetos como uma rainha deveria fazer as vésperas
da coroação, mas não, estou trancada em meu quarto questionando
minhas escolhas.
Vicenza tem sido uma boa amiga, não tem me pressionado e
sempre está por perto, e por sorte Diogo se compadeceu da minha
situação e a deixou passar o tempo que precisasse comigo. James
também tem sido ótimo, tem feito companhia a ela, já que eu,
sinceramente não estou com muito ânimo pra nada.
Quem diria Nadine, um dia estava livre e no comando de uma
grade cozinha, sentindo de perto o sonho se realizando e no outro,
de volta a gaiola real.
— Princesa, o Rei a espera no jardim — Nina avisa.
Ajeito-me no espelho e vou ao seu encontro. Ao passar pelo
grande salão de festas, repugno o alvoroço da mansão. Flores e
vasos de cristais para todos os lados. A prataria sendo polida com
apreço e a louça da coleção da rainha, exposta sobre a mesa.
— My Lady — reverencia Lian, e retribuo com um sorriso
falso.
— Sente-se! — pede o Rei deliciando-se com seu suco de
tomate matinal. — Sei que não era isso que queria pra sua vida,
querida, mas quero que aproveite o seu momento, é o seu
casamento. Quero que te levar no altar sabendo que está feliz —
acrescenta como se nada tivesse acontecido.
— Hrum, — deixo a indignação escapar. — Feliz? Sério,
papai? Não vou estar feliz casando com ele, eu já me casei…
— Não estou vendo nenhum marido aqui, você está? —
ironiza cruel.
— Posso ir? — peço sentindo a dor dilacerar meu coração, o
choro alcançando meus olhos.
Papai me encara frio, e até duvido que um dia amou alguém
de verdade. Seu olhar não tem emoção, e suas palavras são tão
vazias quanto suas atitudes. Nada parece verdadeiro. É como um
script de um filme ruim. Relacionamentos robotizados, palavras
cruéis e insensíveis. Uma vida vazia e sem verdade. Sem cor.
Um aceno silencioso me dá liberdade para sair daquele
transe constrangedor.
Caminho morosa pelos corredores da mansão, tentando não
prestar atenção nos detalhes do meu casamento. Vejo Príncipe
Willians de longe, está absorvido com os preparativos e parece não
se preocupar com a minha opinião.
Sento-me próximo ao jardim. O silêncio aqui é tranquilizador.
Fecho os olhos e aprecio o cantar dos pássaros e o vento que toca
minha pele com delicadeza.
— Princesa? — Uma voz que eu conhecia bem soa em meus
ouvidos e me paralisa. Engulo em seco e continuo sem coragem
para abrir os olhos. Penso estar em um sonho. — Não mereço um
abraço? — ele contesta, abro os olhos admirando seu porte alto e
cabelos ondulados.
— Alec! — corro em sua direção e me atiro em seus braços.
Foram os minutos mais maravilhosos dos últimos dias. — Não
acredito que está aqui — resmungo fungando em seu pescoço.
— A senhorita está linda — elogia respeitoso, girando-me em
sua frente.
— O que está fazendo aqui? — questiono movida pela
surpresa. Totalmente intrigada.
— Fui transferido para o casamento da futura rainha de
Liechtenstein.
— Hum — resmungo murchando como uma flor quase que
imediatamente.
— Confesso que fiquei surpreso, pensei que acharia um jeito
de ir atrás de seus sonhos.
— Longa história, outra hora de conto. Vem, me conta sobre
você, o que fez todos esses meses? — Pego Alec pela mão e o
arrasto para o jardim de inverno.
— Preciso falar com seu pai antes, Princesa — ele barra
minha empolgação.
Conversar com alguém que me conhece inteiramente era o
que eu precisava, contudo, Alec está diferente, mais sério e
responsável. Era como se eu não o conhecesse mais.
— Você já sabe o que aconteceu comigo, não sabe?
Seu olhar decepcionado me observa.
— Sei. Seu pai me contou. Ele sabe sobre nós, Nadine. Sabe
o que tivemos antes de eu ir embora. Pediu que eu voltasse pra me
torturar, ou te fazer acordar, você não pode se casar, não com
aquele cara.
— E o que eu devo fazer?
— Lute. Não desista! Estamos falando sobre a sua vida.
Sobre você! O reino ficará bem aos cuidados do James, sabe disso!
Você fugiu uma vez. Fuja de novo!
— Nadine. Amiga, acorda — Vicenza me chacoalha e me
assusto. — Estava dormindo? — zomba sentando-se ao meu lado.
— Distraída, só!
Temo estar ficando louca. Outro sonho tão real quanto
aquele.
Fico pensativa. Outra vez Alec visitou meus sonhos, e mais
uma vez me pediu para escolher, mas só agora consegui entender,
não é pra eu escolher entre ele ou Dominic, é escolher a mim.
Ele pede pra eu escolher a mim…
Capítulo 40
Alguns meses depois
— Dominic, gostaria de se apresentar?
Sou tirado de meus pensamentos pela palestrante. Levanto
sem jeito e depois de uma pausa longa, pigarreio e me apresento:
— Me chamo Dominic, sou alcoólatra, e estou sóbrio a 304
dias.
— Seja bem-vindo Dominic. — Todos presentes dizem em
uníssono.
— O que te fez perceber que precisava de ajuda? —
pergunta a palestrante.
— Quando me dei conta que poderia machucar minha esposa
— respondo.
— E ela sabe que você está aqui?
— Não! — meu tom não transmite certeza, e contenho a
vontade de me jogar no chão e chorar encolhido feito uma criança
birrenta.
Será que ainda tenho uma esposa?
— Porquê não contou a ela? — questiona.
— Sinceramente não sei. Talvez por medo, vergonha. Eu tive
uma grande decepção e me isolei, precisava ficar sozinho, e…
— E ficar sozinho te ajudou?
— Apesar da saudade, sim, me ajudou a colocar a cabeça no
lugar, a esclarecer contestações feitas por mim mesmo. Me ajudou a
descobrir quem eu sou, e quem eu quero ser. Se eu tivesse ficado,
talvez eu não teria outra chance. Com certeza teria estragado tudo.
— Obrigada, Dominic, pode sentar!
Todas as sessões são iguais. Eu me apresento e conto minha
história para os velhos e os novos integrantes. É cansativo, e por
muitas vezes neguei dizer palavra alguma. É vergonhoso demais.
Hoje entendo a necessidade de colocar pra fora o grito que
machuca de dentro pra fora. Hoje compreendo que precisava passar
por todo esse processo para aprender a lidar com as minhas
inseguranças, os meus medos, e descobri quem eu sou de verdade.
Meu tratamento está no final, mas ainda sinto que preciso de
regras. Um dia após o outro. Um de cada vez. Sem pressa. Sem
pressão. E o mais importante, sem julgamentos.
Não é fácil assumir que está doente, e que precisa de ajuda.
Eu precisei me sentir um lixo pra tomar essa decisão. Precisei ser
colocado de frente com a minha pior versão para dar um passo a
trás. Precisei não me reconhecer no espelho pra entender que eu
não sabia quem eu era.
Por anos quis ser aquilo que meu pai queria que eu fosse.
Um grande empresário no ramo da gastronomia. Um CEO de
sucesso. Se ele me visse hoje… — uma risada irônica escapa do
pensamento.
Se visse como fiquei parecido com ele, acho que ficaria
orgulhoso.
Não é mesmo, papai?
Eu fugi de mim. Fugi das respostas que por anos busquei. E
a verdade me machucou, fez um estrago que pensei que jamais
conseguiria reparar. A cicatrização é difícil, necessita de força de
vontade e dedicação. É preciso querer melhorar e deixar o passado
no passado.
Precisava de espaço, de um tempo para assimilar, pra
conseguir olhar para as duas mulheres mais importantes da minha
vida sem medo de fazer algum mal a elas.
Aprendi a liberar o perdão. Perdoei a mim, perdoei minha
mãe, e o perdoei. Não foi fácil, mas as sessões com a psicóloga me
ajudaram a entender o que eu precisava fazer para virar a página.
Eu precisei passar por isso.
Tive muito tempo pra pensar. Sem trabalho, sem notebook e
sem o celular tocando o dia todo, consegui me desintoxicar. O único
que soube do meu paradeiro foi o meu advogado, que precisou vir
até mim para assinar a venda do restaurante.
Nesse meio tempo descobri que não gosto do ramo
gastronômico por amor, era um ciclo que eu queria continuar por
causa dele, eu achava que devia isso a ele, mas agora não devo
nada. Ele morreu.
Apesar de saber a verdade que tanto me assombrou, ele
tentou ser um bom pai, as recordações que tenho são boas. Mesmo
assim desejei odiá-lo por ter sido um covarde com a minha mãe, por
ter ousado tocar nela. Desejei odiá-lo com todas as minhas forças
pelas mentiras… Não o odeio. Só não consegui manter a versão
heroica que tinha dele. Agora ele é só um marido que entrou na
estatística de homens violentos.
— Está pronto? — Diogo pergunta ao me encontrar em frente
a clínica, um pouco surpreso ao descobrir onde fiquei por quase 1
ano.
Olho para trás e o ar comprimido solta de meus pulmões
lentamente. Uma avalanche de lembranças das noites que me
contorci na cama em desespero me vem à mente.
É, eu evoluí, sinto-me limpo, mais leve. Sobretudo, o medo
ainda me assombra, é um fantasma constante. Passei meses dentro
de uma clínica, longe de tudo, das pessoas que amo, do trabalho
para o qual eu me dediquei por anos, do meu amigo, da minha mãe,
e da mulher que me fez questionar tudo… Longe da única mulher
que conseguiu ver além de mim, ela viu verdade enquanto eu não
via nada.
— Estou! — respondo feliz por ele ter vindo sem questionar.
Entro no carro confiante que “hoje” estou virando a página.
Olho pela janela contente, porque depois de muito tempo, consegui
me sentir um homem inteiro de verdade. O coração não… O coração
só estará inteiro quando Nadine voltar pra mim.
No trajeto Diogo me atualiza sobre tudo o que aconteceu nos
últimos meses. Fico inquieto para ouvir o nome dela. A ansiedade
fazendo morada em capa extremidade do meu corpo. O nervosismo
e a saudade batendo forte no peito. Porém não ouvi.
— Como você está? — pergunta mudando de assunto
propositalmente.
— Agora estou bem.
— Então quer dizer que o rei Arthur agora é seu amigo? —
comenta brincalhão me arrancando uma gargalhada, fazendo me
lembrar daquela tarde.
— Não necessariamente! — Rimos. — Quando meu
advogado entrou em contato com ele para a devolução do dinheiro,
o Rei exigiu saber onde eu estava, e quando soube, ficou surpreso.
Fez questão de vir até mim.
— Ele veio de te ver na clínica? — indaga surpreso.
Alternando entre mim e a direção no volante.
— Olha pra frente, não estou a fim de ir para o hospital —
falo sério e ele acata. — O Rei não só me visitou, como pediu
desculpas pelo modo que me tratou — acrescento impaciente. Não
era o tipo de assunto que eu queria ter no momento, mas cedi a
curiosidade do meu amigo.
— Vai Dominic, conta a história toda de uma vez, — ele sorri
exigente e curioso.
— Ele não aceitou o dinheiro de volta, de algum jeito sabia
que eu tinha vendido o restaurante e queria que eu usasse o
dinheiro para recomeçar.
— Você aceitou?
— Não, o orgulho não deixou.
— Então meu melhor amigo, agora é amigo do Rei de
Liechtenstein, cara você tá muito importante — Diogo zomba
soltando uma gargalhada divertida.
— Como ela está? — pergunto e ele sabe exatamente de
quem me refiro.
Eu tentei resistir. Não queria saber, não agora, mas à medida
que nos aproximávamos de casa o coração apertava cada vez mais.
A inquietação aflorando, fazendo meu coração bater tão forte e
acelerado que me faltava o ar.
— Vicenza e eu estamos morando juntos, quem diria não é
mesmo!? — Diogo muda de assunto e por um minuto me
surpreendo com a novidade.
— Sério? Você e a brasileira maluquinha?
— Sim, eu sou muito apaixonado naquela morena. Brigamos,
ficamos separados por um tempo. Voltamos, e resolvemos morar
juntos. Foi do nada, e estou muito feliz.
— Parabéns! — me limito em dizer, eu não sabia mais o que
falar.
— Sua mãe está feliz que está voltando pra casa, Dominic. —
Sua voz muda o tom, e sei que não foi só eu que sofri nesse tempo.
Eu sempre achei que era invisível aos olhos daqueles que eu
tentava não me importar. Estava enganado. O tempo que fiquei
longe de todos me fez perceber e lembrar com detalhes de todas às
vezes que fui prioridade para o Diogo, para minha mãe, e para
Nadine. Eles sempre se importaram comigo. E eu não dei valor.
— Eu sei. Sinto muito por não ter dito nada, precisei desse
tempo sozinho.
— Também senti sua falta, Dom. E estou orgulhoso de você.
— Sua mão apoia em meu ombro quando o semáforo fecha.
— Também senti sua falta, amigo.
O sinal abre e ele segue pela avenida movimentada Anatole de
France , ao passar em frente a torre Eiffel, lembro do olhar de
gratidão que gravei em minha mente quando Nadine vislumbrou a
torre pela primeira vez.
— Você não me respondeu — contesto agoniado.
— O quê?
— Quero saber como Nadine está? Não perguntei para o rei
Arthur, não quis ser indelicado depois de abandonar sua filha
daquela maneira.
— Ela está bem!
— Bem como? — Indago impaciente, exigindo respostas
concretas. — Ela está com alguém, é isso? Eu sabia! Sabia que a
perderia para sempre quando passei por aquela porta, deixando-a
para trás. Sabia que ela não me perdoaria por ter ido…
— Relaxa cara, ela não está com ninguém, pelo menos acho
que não. Vicenza não comentou nada.
— Porra! — brado socando o painel do carro.
A tensão se instala, e não consigo pensar em mais nada, era
como se um véu escuro de arrependimento tivesse caído sobre
mim.
E tudo o que trabalhei todos esses meses simplesmente cai
por terra. Dez meses trancafiado, aprendendo a controlar meus
sentimentos impulsivos, e só bastou uma palavra para esquecer
tudo.
Não vou dizer que estou inseguro, eu sabia dos riscos. Sabia
que tinha uma grande chance de perdê-la para sempre.
Não vou desistir, no momento certo terei oportunidade de me
explicar, terei a chance de pedir perdão olhando em seus olhos.
Capítulo 41
Alguns meses antes
— NADINE. NADINE. NADINE, — Vicenza grita
desesperada.
— O que foi, quem morreu? — me espanto assustada.
— Ainda ninguém, mas o seu pai está prestes a matar o
Príncipe.
— Porquê? — pergunto preparando-me para acompanhá-la.
— Amiga, eu não ouvi direito, mas o seu pegou o Príncipe
aos beijos com o Lian, aquele segurança gostoso.
— Você só pode estar de brincadeira!? — ralho correndo em
direção a biblioteca e ela vem atrás de mim.
Eu tremia, sem acreditar no que acabara de ouvir.
Paro em frente a porta entreaberta e escuto os gritos de meu
pai, ao entrar me deparo com Lian absorto em um canto isolado da
sala, enquanto papai segurava Willians pelo colarinho.
— Papai? — exclamo na tentativa de evitar uma confusão
ainda maior.
— Acabou casamento, você não se casará com esse
promíscuo — brada sem escutar o que o Príncipe resmunga em
defesa.
— Papai solta ele — peço empática, enquanto o Príncipe me
olha envergonhado.
Que ele não me amava eu já sabia, mas me trair com outro
homem as vésperas do nosso casamento, é demais.
— Podemos conversar, Nadine?
— Pra você é Princesa Nadine — brada papai furioso.
Vicenza e Nina observam de longe, e Lian encara o chão
com medo, ele trabalha para meu pai desde os17 anos, tem uma
carreira promissora no exército real. E agora ele pode ter colocado
tudo a perder.
— Papai, está tudo bem, — o acalmo acariciando suas
costas. — Nina, pega um copo d’água pra ele, por favor.
— Sim senhora! — Ela sai acompanhada de Vicenza,
levando meu pai para longe.
— Lian pode ir, depois conversamos, — ele me olha
apreensivo e depois olha para o covarde do Príncipe que não ousou
defendê-lo. — Fica tranquilo, está bem!?
Ele assente e sai desconfiado.
Juro que minha vontade era questioná-lo, e acusá-lo. Eu
mancharia sua reputação e me livraria do trono e do casamento de
uma única vez, sem danos a mim ou à minha família, mas ao invés
disso o abracei.
Willians pela primeira vez se mostrou vulnerável. Aquela
carranca de homem poderoso e dono de si tinham simplesmente
desaparecido.
— Perdoa-me, Princesa, eu não queria te envergonhar diante
de seu pai, eu…
— Tudo bem, não se preocupe.
— Não está com raiva de mim? — me encara surpreso.
— Raiva é uma palavra muito forte, estou um pouco chocada,
não surpresa, algo me dizia que sua insistência não era só pela
coroa. Você queria se casar comigo porque sabia que não teríamos
nada. Isso certamente seria benéfico pra você tendo em vista que
não gosta de…
— Minha mãe não aceita, não tive como confrontá-la. Só me
resta aceitar…
— Está se ouvindo? — repreendo sua covardia, a mesma
que me possuiu nos últimos dias.
— Da mesma forma que deve respeito ao seu pai e a
hierarquia que vem com o seu nome real, eu devo aos meus pais.
Não tive escolha.
— Sempre temos escolhas, Willians. Isso é um sinal…
— Sinal? — ele me interrompe.
— Sim. Esse casamento é um erro, pra mim, pra você, para
as pessoas que dependem de uma política verdadeira. Nosso povo
merece uma líder, um líder que estará à frente da coroa acima dos
próprios interesses. Essa deveria ser a nossa prioridade. Nos
preocupar com o bem-estar daqueles que confiam na monarquia.
— Você tem razão! Não estamos fazendo nada pelos motivos
certos. Só estamos preocupados em evitar uma guerra com nossos
pais, sem nos dar conta que não seremos os únicos prejudicados.
— Você deveria conversar com seus pais. Estamos no século
21, eles não podem te obrigar a casar com uma mulher. Não podem
obrigar você a ser quem eles querem.
— Nadine? — papai nos interrompe, dessa vez mais calmo.
— Papai, está tudo bem, não precisa…
— Não vim brigar, só quero me desculpar com o Príncipe, —
ele se aproxima, a voz branda e firme.
— Majestade, eu… — o príncipe tenta impedir.
Papai o interrompe:
— Peço desculpas, não deveria ter agido daquela maneira,
não quero que pense que sou preconceituoso ou algo do tipo, mas
fui pego de surpresa, afinal, você iria se casar com a minha filha.
Confiei em você. — Papai lamenta constrangido. O arrependimento
tomando posse de seu ser.
— Perdoa-me minha filha. Fui cruel quanto aos seus desejos,
iria obrigá-la a se casar com um homem que não seria um bom
marido para você. Estava cego, tomado pela amargura. O coração
empoeirado de sentimentos que não percebi o que estava fazendo…
— papai se emociona e o Príncipe nos deixa a sós.
— Pai, não precisa…
— Preciso. Preciso me desculpar o quanto puder. Eu fui frio,
deixei você e seu irmão se tornarem adultos sem mim, sem o pai de
vocês. Eu fiquei tão triste com a morte de sua mãe, que a única
forma de suprir a falta dela, era focar no reino, na única coisa na
qual eu ainda tinha controle… Sua mãe deve estar me odiando, —
ele ri nervoso.
— Ela te amava muito, jamais odiaria o senhor.
— Eu precisei ver uma cena tão estranha pra perceber o
quão bárbaro estava sendo com você e seu irmão. Você certamente
seria uma péssima Princesa, — ele gargalha me fazendo rir
também. — Não me leve a mal, mas você não leva jeito. Mesmo te
achando uma mulher muito sensata. Agora me diz, onde eu estava
com a cabeça quando achei que conseguiria te transformar em
quem não é!?
Papai me abraça forte, e essa foi a primeira vez depois da
morte dela que ele se abriu. Permitiu que eu me aproximasse e que
me compadecesse de sua dor. Permitiu que eu me abrigasse em
seus braços, e me deixou sentir seu coração bater.
Eu tive medo por muito tempo, medo de perdê-lo também.
— Papai… — resmungo sem querer soltá-lo.
— Quero que arrume suas coisas. Quero que volte para a
França e termine sua faculdade.
— Está falando sério? — questiono atônita.
— Não vou obrigá-la a se casar ou sentar naquele trono.
Estava com raiva por sua afronta. Queria te fazer entender a todo
custo que devia respeito ao seu Rei e ao seu pai. Escutei sua
conversa com o Príncipe, vocês estão certos. O reino merece um
líder responsável e complacente com as leis e as necessidades de
nosso povo. Vocês seriam péssimos juntos — ele ri mais uma vez, e
dessa vez consegui enxergar meu pai.
O homem carinhoso e extrovertido que ria de qualquer
bobeira; que sonhava alto, e nos fazia sonhar também. O mesmo
homem que nos ensinou a lutar pelo o que acreditávamos.
— E o que vai fazer? O que vai dizer aos convidados?
— A verdade. Quero dizer, quase toda a verdade. Vou dizer
que minha filha é uma excelente chef, e que está estudando para no
futuro, abrir seu próprio restaurante. Que ela é talentosa demais
para ficar sentada em um trono sendo consumida pela frustração.
— Ah papai… — o abraço novamente sem conseguir conter a
emoção. Sonhei tanto com esse momento.
— Você merece voar. Alçar voos maiores. E eu quero estar
ao seu lado, como amigo, como pai…
— Eu te amo papai, obrigada.
— Eu também te amo, minha princesa espoleta. Agora vá,
você tem muita matéria para colocar em dia — seu sorriso cativante
está de volta, ele está sendo sincero.
Olho dentro de seus olhos e me vejo. Seu olhar tem brilho,
cor… Uma chama de esperança voltou a queimar em seu coração.
Eu sei, eu sinto. Uma lágrima solitária escapa de seus olhos, era
assim que minha mãe me chamava: princesa espoleta.
— Também sinto falta dela, mas está na hora de se libertar
desse luto e viver. O senhor está vivo! Não sobreviva, papai, apenas
viva! — digo tocando em seu rosto e me preparo para sair, ele me
segura pelo braço.
— Não serei capaz de recuperar o tempo perdido. Mas, o que
eu puder fazer para me redimir e ver meus filhos felizes, eu vou
fazer, custe o que custar, até a coroa! — declara enfático e sorrio
feliz.
Finalmente poderemos ser uma família outra vez.
Corro para o quarto eufórica, contando tudo para Vicenza
enquanto arrumo minhas malas. Ela grita e pula comigo, se alegra
por mim. James abre a porta do quarto e antes mesmo de falar
qualquer coisa, me abraça forte.
— Estou feliz por você — declara ainda afagado em meus
cabelos.
— E eu por você! — replico sorrindo feito uma boba.
Antes de partir, dessa vez sem fugir, despeço-me do Príncipe
Willians que assumiu de vez o relacionamento com Lian, como
papai lhes deu apoio, seus pais não tiveram como questionar.
Mesmo contrariados, entenderam que o destino do filho, era próprio
e exclusivo dele mesmo.
Espero que sejam felizes.
Papai ficará no trono por mais alguns anos, até James ter
idade para começar seu treinamento real. E espero que quando este
dia chegar, ele já esteja apaixonado por uma bela princesa. Não
desejaria que ele passasse pelo mesmo que eu.
Casamento arranjado já está bem fora de moda.
— Em breve irei te visitar, — diz papai beijando minha testa
com carinho.
— Vou esperar ansiosamente.
— Aqui está! — Ele me entrega uma chave presa em um
chaveiro de coroa.
— O que é isso?
— Digamos que é um presente de remissão. É a sua nova
casa. Sua amiga pode morar com você se quiser — declara sorrindo
orgulhoso.
— Obrigada tio! — Vicenza o abraça e rimos por ela ter
conseguido deixar papai constrangido.
— Papai não precisa, eu moro com a Vicenza…
— Cuida bem dela, viu! — ele rebate cortando minha recusa,
abandonando a tensão dos ombros e retribui o abraço dela.
— Pode deixar, e obrigada por confiar em mim. — Nós
olhamos cúmplices e rimos.
— Hrum, estou de olho em vocês!
Nos despedidos e antes de entrar no carro, papai me entrega
um envelope.
— Mais presentes? — indago sorrindo.
— Não exatamente. Só acho que você tem o direito de
decidir o que fazer com isso.
Mesmo sem saber do que se tratava, agradeci e partimos.
Papai insistiu em nos ajudar por um tempo, ele queria que eu
focasse na faculdade. Mesmo explicando que eu queria viver sem
regalias por ser filha de um rei, não tive pra onde correr. Afinal, eu
sou mesmo filha de um rei.
No avião abro o envelope e me deparo com a minha certidão
de casamento. Não faço ideia do que vou fazer com isso…
Não sei onde ele está!
Não sei se ainda me quer, e se o nosso casamento ainda
existe.
Será que ele ainda me ama, ou será que decidiu que tudo
não passou de um contrato?
Uma paixão passageira movida pelas circunstâncias?
Capítulo 42
Dias atuais
Olho no espelho e não me vejo mais como a menina
desajeitada de antes. Hoje consigo me ver como uma mulher. E
sinceramente, estou muito orgulhosa por quem me tornei.
— Cheguei! — Vicenza grita da porta de entrada. — Está
pronta? — pergunta enquanto me observa encostada na soleira da
porta. Admirando-me com carinho.
— Quase!
— Você está linda, amiga, — ela se aproxima e se emociona
ao me encarar de perto. — Estou tão feliz por você, Nadine!
Faz alguns meses que dona Vicenza abandonou a vida de
pireguete solteira e foi morar com Diogo. Sinceramente, achei que
não ia durar muito o namoro dois, e quando pisquei ela já estava se
mudando. Começou com alguns finais de semanas, depois algumas
peças de roupa, até que foi de vez.
— Você também está linda — elogio e ela alisa o cetim rosa
que modela suas curvas.
Ajeito meu vestido e retoco o batom, estou ansiosa por esta
noite. É um grande passo. Um sonho se tornando realidade, —
sorrio frente ao espelho. — Quem diria que antes mesmo de me
formar estaria abrindo meu próprio restaurante?!
Ainda não está como eu gostaria, é simples e pequeno, mas
foi o que consegui por mérito próprio. Trabalhei duro, mesmo contra
vontade de meu pai. Eu queria muito dar esse passo por mim, olhar
cada detalhe e saber que conquistei sozinha. Por meu esforço. Meu
suor. Não foi com a ajuda financeira do meu pai. Não foi pela coroa,
muito menos pelo meu sobrenome. Economizei muito todos esses
meses para abrir o Je Vole[13] Bistrô do meu jeitinho.
Se dependesse do Rei, eu estaria abrindo um grande
restaurante requintado.
— Filha? — papai aparece na porta e por alguns segundos
achei que tinha pensado alto demais. — Você está linda, — ele me
gira e o vestido roda em torno de mim. — Está nervosa?
— Um pouco.
— Não tem porque, meu amor. Você vai brilhar, — papai
acaricia meu rosto com a ponta dos dedos, os olhos brilhando
enquanto me admira. — Estou tão orgulhoso de você… — Seus
braços me envolvem em um abraço acolhedor.
Tento conter a emoção, não quero borrar a maquiagem.
— Queria que ele estivesse aqui…— sussurro, e papai me
abraça ainda mais forte.
Ainda não consegui esquecer da menina apaixonada que
habita em mim. Ela simplesmente não me deixa esquecer.
São 365 dias sem Dominic. Sem notícias. Sem saber nada
sobre ele. Não sei se me esqueceu, ou se apaixonou-se por outra
mulher.
Minha razão me faz pensar que ele encarou aquele maldito
contrato como ele deveria ser: sem sentimentos. Porém, não
consigo fazer meu coração entender. Ele só me faz crer que ainda
resta esperança, me faz esperar, mesmo sem saber até quando.
A distância e a solidão não me mataram, como pensei que
aconteceria. Tinha dias que eu realmente achei que não suportaria
meu coração partido, mas nada disso aconteceu, pelo contrário,
amadureci.
Eu sofri com sua ausência. Sofri todas às vezes que estava
tão feliz que só queria compartilhar minhas conquistas com ele.
Chorei todas as noites que ardi em desejo lembrando das noites que
passamos juntos.
Lembrei constantemente durante meses, quando conheci sua
mãe, podia ser parte do nosso plano maluco, mas hoje olhando bem
para aquela noite, ele estava feliz. Lembrei dos filmes bobos que
assistimos, e de como amo o barulho estranho que ele fazia
enquanto ria.
Gravei em meu paladar o gosto amargo do seu café sem
açúcar. E de como ele ficava lindo todo atrapalhado na cozinha.
Chorei colocando no papel todos os planos que fizemos
juntos em nossa lua de mel de mentira. Sonhamos com tantas
coisas. E agora eu até rio, parece engraçado, mas ele não está mais
aqui!
Parece que tudo o que aconteceu não passou de um sonho.
De uma história tirada de um livro de contos de fadas moderno.
Eu me odiei por um tempo, porque eu não consegui odiá-lo.
Me odiei por ter gastado horas de conselhos. Me odiei por ter
tentado fazer ele se ver como “eu” o via. Me odiei por ter acreditado
em um amor, que agora eu não sei se existe mais, ou se um dia
existiu de verdade. Eu me odiei por ter achado que tinha o poder de
concertá-lo.
Achei que poderia fazê-lo superar os problemas com seu pai.
E só agora entendo que isso não dependia de mim. Mas ainda sinto
sua falta…
Quero mesmo acreditar, que quem ama não vai embora sem
um adeus…
— Eu sei, mas hoje é o seu dia. Nada de ficar triste. Lembra
aquela vinícola nova que te indiquei? — papai muda de assunto,
chamando minha atenção para o mundo real.
— Lembro sim!
— Você colocou na carta de vinhos?
— Fiz uma reunião com o representante mês passado. Só
achei estranho, queria ter tido a oportunidade de conhecer o dono
antes, talvez pudéssemos nos ajudar, mas enfim, só aceitei porque
foi o senhor indicou.
— Obrigado pela confiança, — seu tom alto se enche de
ironia positiva.
Papai me oferece o braço e seguimos para fora. Vicenza nos
acompanha e partimos para o Je Vole.
Tempo depois o carro estaciona em frente ao meu cantinho
de amor. Meu coração bate forte e um friozinho na barriga me faz
tremer e empertigar.
— Tem gente lá dentro — me espanto.
— Claro que tem, amiga. É a inauguração do prodígio da
gastronomia francesa — Vicenza anuncia orgulhosa. Só que em vez
de me acalmar, fico ainda mais nervosa.
É assim que o chef Antony me chama: Prodígio.
Quando ele soube que eu estava prestes a abrir meu próprio
restaurante, fez questão de me prestigiar pessoalmente. E como
estou no segundo ano da faculdade, precisava de um chef a altura
para me substituir como primeiro chef.
E quando o convidei para apadrinhar uma aspirante, aceitou
de imediato, amou o convite. Fiquei tão feliz. Ele torce por mim.
Sempre torceu. Foi o primeiro a acreditar no meu potencial. E tenho
uma gratidão enorme por ele, que não sou capaz de dimensionar.
Com certeza não poderia ter um padrinho melhor.
Respiro fundo em frente a porta. Papai passa por mim e entra
na frente acompanhado de Vicenza.
Espero alguns instantes e entro. A recepção está agitada.
Julie nossa hostess é simpática e recepciona nossos clientes com
um sorriso doce.
— Bem-vinda dona Nadine, — ela acena e sorri.
Retribuo a gentileza e me apronto para descer as escadas e
dar vida ao meu espaço. Olho com atenção cada detalhe como se
fosse a primeira vez.
As cortinas em tons de creme e vermelho, penduradas em
hastes douradas. Nas mesas, velas e flores. É um toque pessoal,
especial e romântico.
Sim, eu ainda acredito no romance.
Paro no meio da escada e aprecio o movimento. A música
ambiente e suave de fundo. Os garçons serviam vinho, canapés e
champanhe. As pessoas riam e pareciam estar à vontade. Estavam
gostando do ambiente e do serviço.
De repente a música fica mais baixa e todos prestam atenção
em mim. Abro um sorriso ameno e envergonhado e desço. Degrau
por degrau. Devagar. Firme para não cair ou tropeçar.
Papai vem ao meu encontro e me abraça. E passo os
próximos minutos abraçando e recebendo felicitações e elogios.
Meus olhos percorreram todo o espaço a procura de alguém
especifico. Meu subconsciente me traindo.
Fico inquieta e nervosa.
Meu coração acelera e viro duas taças de champanhe de
uma só vez.
— Você está bem? — James se preocupa.
— Estou!
— Papai pediu que fosse até o escritório. O dono do vinho
que está causando grande sucesso entre os seus clientes, quer
conhecê-la.
— Até que enfim! — bufo aliviada. Eu realmente estava
curiosa.
James me acompanha até o escritório e sai. Entro na sala e
não vejo ninguém. Aproveito o espaço isolado e silencioso para tirar
um poucos os saltos.
Se tem uma coisa que não me acostumo, é com saltos.
— Desculpa, James disse que eu poderia esperar a senhorita
aqui, não sabia que já estava…
Aquela voz. O perfume exalando e inundando meu
subconsciente. A respiração acelerada e nervosa. Engulo em seco e
me viro para encarar o dono de todo esse conjunto hipnotizante.
Ele se cala quando me vê. Sua voz some. Se perde com a
surpresa de encarar meus olhos depois de tanto tempo.
— Nadine… — Sua voz some à medida que sua respiração
fica cada vez mais pesada.
Não consigo dizer nada.
Um misto de alegria, amor, surpresa e raiva se misturam com
meu sangue quente, passando com toda a velocidade por minhas
veias.
Ele está vermelho de vergonha, ou surpresa, sei lá.
Continuo paralisada. Imóvel. Queria correr. Sair dali, mas não
consigo. Só miro bem dentro de seus olhos, e o admiro. Ele está
bonito. O cabelo mais cumprido e parece estar mais forte. Corado.
O relógio para no tempo. E parecíamos estar a oceanos de
distância um do outro.
Era como se não nos conhecêssemos mais, mesmo nos
conhecendo tão bem.
— Nadine…
Sua voz sussurrante penetra em meu corpo como um vírus,
uma droga altamente viciante capaz de me entorpecer.
Não consigo dizer nada além de seu nome. Não consegui
olhar para nenhum outro lugar além de seus olhos. Estava
totalmente vidrado.
Eu ansiei tanto por esse momento, que não fazia ideia de
como reagiria, se estaria preparado para o que viesse a seguir. Ela
está linda.
Deslumbrante em um vestido preto e pomposo estilo princesa
fujona. Uma calda cumprida na parte de trás que arrasta no chão, e
na frente um pouco mais acima dos joelhos. Sexy demais.
Depois da clínica me mantive ocupado. Não estava
preparado para esse reencontro, e não sei se estou. Respiro
devagar, repassando os exercícios para manter a calma
mentalmente.
Nadine me encara, e não faço ideia do que se passa em sua
cabeça linda. Ela simplesmente está maravilhosa. Com um ar
diferente.
Mais mulher.
Uma linda princesa poderosa e sensual.
O silêncio se torna pesado demais, penso em dizer alguma
coisa. Qualquer coisa que acabasse com aquele olhar indecifrável…
Um ruído escapa de meus lábios, quando ela se aproxima e
para a centímetros de distância de mim.
Se ela pudesse me tocar, sentiria que estou prestes cair.
Seu perfume doce se espalha ao redor, fecho os olhos, e
inalo o quanto posso.
Seu olhar escuro e amendoado continua a me observar,
alterno para seus lábios e minha garganta seca.
Um esbarrão abrupto me pega de surpresa e só volto em si
quando sinto o gosto de seus lábios nos meus. Seguro sua nuca
com avidez matando à vontade, a saudade de senti-la em meus
braços.
Um beijo sôfrego de raiva e saudade nos envolve. A tensão
preenche o ambiente e o desejo fala mais alto.
Minhas mãos deslizam por seu corpo com firmeza e gemo
ardendo em brasa. Suas mãos habilidosas arrancam meu terno e
minha camisa. Não me importo quando os botões se espalham para
todos os lados.
Naquele momento não existia nada e nem ninguém, somente
eu e ela.
Beijo seu pescoço nu, e aconchego meus lábios em sua pele
macia. Ela geme em meu ouvido e enrijeço. Nadine aperta meu pau
com força e o expõe para fora da calça.
Ela não queria amor, ou carinho, ela exigia sexo selvagem e
forte.
Viro-a de costas e rasgo sua calcinha. Introduzo dois dedos
em sua intimidade e deslizo para dentro.
— Está tão molhada, Princesa… — sussurro ardente, louco
para me enterrar dentro dela.
— Cala a boca e me come, Dominic!
Sua voz doce tinha simplesmente desaparecido, dando lugar
a aspereza de uma mulher dominada pela raiva. Pela luxúria
voluptuosa.
Meto com força, delirando ao senti-la tão molhada e sedenta.
Beijo seus lábios, segurando em seu pescoço enquanto
invisto cada vez mais forte. Ela geme alto, não se importa se alguém
nos ouve do lado de fora.
— Não aguento mais princesa…— urro sentindo o gozo se
aproximar, dominar meu autocontrole.
Nadine é gostosa demais e eu passei 1 ano tendo a
companhia da minha mão.
— Ainda não! — ela pede empurrando-me para o sofá. Ela se
encaixa em mim. Cavalga devagar, rebolando, me torturando,
castigando-me por ser um idiota.
Nadine lança a cabeça para trás atingida pelo ápice. Minutos
depois me entrego aliviando o tesão acumulado.
Ainda ofegante e com o coração batendo diligente, Nadine se
levanta e como se nada tivesse acontecido, me golpeia.
Totalmente nu e desconcertado pela ardência do tapa, encaro
seus olhos em fúria.
— Você tá de brincadeira, Dominic! — brada inquieta
andando de um lado para o outro enquanto me visto.
— Vou precisar de botões — brinco na tentativa vã de
amenizar o furacão que se forma.
— Responde! — exige.
— Nadine, eu sinto muito…
— Sente muito? O que pensa que eu sou? Você foi embora,
— ela se aproxima, depois se afasta. — Você foi embora, Dominic.
Você partiu sem nem me dizer adeus, porquê?
— Eu… eu…
— Porquê? — grita cedendo ao choro que exigia ser liberto
na minha frente. Ela precisava mostrar a mim o quanto sofreu.
O quanto ainda está sofrendo. O quanto está magoada.
Chateada e decepcionada comigo.
— Fala comigo, — murmura exausta. — Eu preciso saber por
que você foi embora sem falar comigo? Você deixou uma carta…
— Não podia te ver. Não podia ouvir sua voz….
— Porquê? Responde logo, porque estou cansada de
perguntar… — um fio de voz se perde nos gemidos de dor e
sofrimento de um coração partido.
— Se eu tivesse falado com você. Se tivesse escutado sua
voz. Se eu tivesse olhado em seus olhos, eu não ia conseguir… não
teria coragem de partir porque eu te amo demais, Nadine. Porque
tive medo de machucar você. Tive medo de ser igual a ele. Tive
medo de não ser bom o suficiente pra você.
— Dom…
— Eu precisava de um tempo sozinho. Precisava ser inteiro
pra completar você. Eu estava em pedaços. Você não merecia isso,
amor… — declaro envergonhado, o desespero palpável na voz.
Ela olha bem dentro dos meus olhos, e como se enxergasse
minha alma, desabafa:
— Eu sofri esse tempo todo por você… Não sabia onde você
estava, não sabia se estava bem. Eu passei noites sem dormir,
Dominic… — Sua angústia é tangível, e um nó aperta meu peito. —
Passei noites chorando e tentando compreender seus motivos.
Tentando ser o mais racional possível depois de saber a raiz do
problema.
— Eu estava em uma clínica, estou me tratando, sóbrio há
365 dias — argumento na defensiva, afim de amenizar o estrago
que suas dúvidas causaram.
Ela sorri e parece orgulhosa.
— Queria te contar. Eu juro que queria. Mas de uma coisa eu
te garanto princesa, não teve um dia, uma noite, um minuto sequer
que eu não tenha pensado em você, que não tenha te amado e
desejado você, — ela chora, eu me aproximo sem jeito e a toco. Ela
não recua e sinto que ainda tenho uma chance.
— Eu pensei em você todos os dias — ela murmura rouca e
pesarosa.
— Tem certeza? — brinco olhando para ela de cima a baixo.
— Olha pra você, está linda. Sempre soube que não desistiria, e
não precisou de mim — sorri descarregando meu humor seco.
Ela ri nervosa.
— Estou orgulhoso. Olha só tudo isso! — exclamo olhando
para os lados. —Inaugurando seu primeiro restaurante. — Rimos.
— Então quer dizer que o dono da vinícola Albany, é o antigo
dono do Levy’s?! — sugere sabendo da resposta.
— Digamos que realizei um sonho de menino, e apesar de
controverso, eu não coloquei nenhuma gota de álcool na boca.
— É impressão minha ou meu pai tem alguma coisa a ver
com isso? — questiona audaciosa, sentando-se no sofá de canto.
— Quando vendi o restaurante, tentei devolver o dinheiro, ele
não aceitou… Seu pai sabia onde eu estava, e antes que fique brava
com ele, eu pedi que não dissesse nada.
— Porque tentou fazer isso?
— Bom, era o certo a se fazer. Para resumir um pouco a
história, porque você tem que voltar pra a sua festa. Seu pai ao
invés de aceitar o dinheiro de volta, me ofereceu uma sociedade.
Achei que seria uma boa oportunidade para recomeçar.
— Estou surpresa, — ela pareceu indiferente.
— Por ele ter se oferecido ajuda, ou por um alcoólatra ser
dono de uma vinícola? — considero as duas hipóteses.
— Os dois — reponde, levanta e se aproxima da janela.
Caminho em sua direção e a toco. Nadine me olha
apreensiva, ela não sabia o que fazer, nem o que dizer.
Então eu disse:
— Casa comigo. Casa comigo de novo. De verdade agora?
O silêncio impregna, e soo frio.
Nervoso, ansioso enquanto seguro com força a caixinha e só
então percebo que ela usa nossa primeira aliança.
— Nadine… — forço uma resposta.
— Não!
Epílogo
5 anos depois
Por um tempo achei que pudesse ter sido mais corajosa. Que
poderia ter arriscado mais. Contudo, preferi lutar contra todas as
probabilidades. Preferi escolher a mim, ao invés de qualquer outro.
Hoje entendo que não estava perdida.
Entendi que precisei me refazer quando estava em pedaços.
Costumava julgar os amantes que amavam sem limites, uma
paixão enlouquecedora capaz de consumir tudo como fogo, até eu
sentir esse sentimento. Até ser consumida por um amor tão
avassalante quanto se é capaz. Até me debulhar em lágrimas,
quando senti que tudo tinha perdido o significado, quando não
encontrei seu olhar acolhedor, e seus braços fortes que me
protegiam… Quando o bater do seu coração estava cada vez mais
distante de mim.
Hoje olho para trás, para tudo o que passei e só consigo
sentir gratidão pela mulher foda que eu fui. Claro que tive medo,
mas fui com medo mesmo. Corri tão rápido em direção ao meu
destino sem olhar para trás.
Cai no meio do caminho. Chorei e me desesperei sem ver
uma solução. Sem enxergar a luz do fim do túnel para os meus
problemas. Fui covarde também. Tive medo e teve momentos que
pensei em ficar no chão, e aceitar o fracasso. Mas não era isso que
estava reservado pra mim.
As cicatrizes não vão desaparecer. E as rachaduras ainda
precisam de cuidados. O amor precisa ser conquistado diariamente
e a confiança ainda é uma incógnita.
Mas o passado não pode ser apagado. Não podemos mudar
o que aconteceu, e nem dizer coisas que desistimos de dizer. Ou
apagar o que por ira, falamos sem pensar. Mas podemos moldar o
futuro. Podemos escolher o que dizer hoje. E decidir o que fazer
amanhã.
Estamos vivos e tivemos uma segunda chance.
É impressionante que mesmo depois de tantos anos, ainda o
admiro como da primeira vez. Meu coração ainda bate forte e
acelerado quando ele está perto, e de como o desejo loucamente,
mesmo sabendo de cor as curvas de seu corpo.
Há cinco anos atrás, Dominic voltou para minha vida e trouxe
com ele todas as cores do meu primeiro amor. Seu pedido foi
espontâneo e desesperado. E naquele momento eu precisei dizer
não. Precisei ser sensata e cúmplice do meu coração. Precisei
proteger a mim mesma do amor lindo e genuíno que sentia por ele.
Não queria puni-lo. Só precisa fazer as coisas do jeito certo dessa
vez.
Lembro como se fosse hoje:
— Não? — ele replicou estarrecido, os olhos cheios de
lágrimas.
— Não vou me casar com você outra vez.
— Nadine, eu…
— Espera, deixa eu terminar — pedi confiante e certa de
minhas palavras. — Já somos casados. Não assinei o divórcio, essa
decisão não estava em pauta. Eu não ia desistir de você, pelo
menos não antes de olhar em seus olhos.
— Então… — ele se aproximou, segurou forte minha mão.
Estava suando frio. Aflito.
— Então vamos começar do começo. Vamos namorar, nos
conhecer. Estamos recomeçando. Você fazendo aquilo que
verdadeiramente gosta e cuidando de você, do seu corpo, da sua
mente. E eu trilhando meus objetivos. Quero terminar a faculdade,
me formar. Abrir um restaurante maior, ou outro, não sei…
— E você pode!
— Posso sim, mas se casarmos agora, se pularmos as
etapas outra vez, a chance de dar errado outra vez é grande, não
quero arriscar, não posso cogitar ficar sem você de novo — declarei
e um sorriso branco iluminou seu rosto.
Um raio de alivio nos abrilhantou e um abraço reconciliador
nos uniu.
O ar fugiu de meus pulmões quando ele me olhou feito uma
criança inocente e perguntou se eu ainda o queria.
— Eu sempre vou querer você! — respondi envolvendo meus
lábios nos seus.
Mostrando a ele que o meu amor é dele. Fazendo-o entender
que mesmo sem querer, eu o esperei. Mesmo sem querer, o amor
só aumentou. Mesmo contra minha vontade, guardei o melhor de
mim, pra ele.
Somos fogo e fogo. Brasa ardente e intensa.
Esse sentimento poderia ter nos matado, e que bom que não
matou, nos fortaleceu.
Nos fez ver as imperfeições e as fraquezas que
precisávamos tratar com carinho. Que por algum motivo
desconhecido não dávamos importância.
— Você está linda — Dominic me traz de volta a realidade
quando me abraça por trás e beija meu pescoço. Admira meu
reflexo pelo espelho e sorri.
— Você também!
— Está pronta? — pergunta virando-me para encará-lo de
frente.
— Nervosa.
— Você já fez isso! — beija meus lábios com carinho. — Vai
ser tudo perfeito — acrescenta e me deixa mais tranquila.
Dominic me deixa sozinha, respiro fundo retocando o batom.
Hoje é a nomeação da terceira estrela Michelin do meu
restaurante.
Não demorou para que eu conseguisse alçar voos maiores.
Não demorou para concretizar o inimaginável.
Sem querer me gabar, talento eu já sabia que tinha, mas aos
27 anos ser uma chef renomada e dona de um dos restaurantes
mais procurados de Paris, conhecido por qualidade, excelência e
um cardápio totalmente inovado, é incrível. Não sonhei tão alto, mas
aconteceu.
— Amor, onde estão as chaves do carro? Vamos nos atrasar!
— Dominic grita da sala e rio. Ele nunca lembra onde coloca as
chaves.
— No chaveiro, vida.
Faz três anos que decidimos morar juntos, e está sendo uma
experiência extraordinária. Dominic é o marido perfeito. E eu sou a
princesa sortuda por quem ele se apaixonou.
Minha mãe costumava dizer que apesar de querer voar pelo
mundo, eu era uma romântica incorrigível. Sonhando em dançar
uma melodia como nos filmes. Comecei a acreditar nela. Os
romances eram a minha perdição. Sonhava com tantos finais, com
mocinhas fortes empoderadas. Nunca imaginei uma mocinha que
não pudesse amar, e ainda sim ser uma mulher livre e dona de si.
Liberta do patriarcado e do machismo que a sociedade
impõe, até nos livros.
Por um tempo duvidei desse amor rotulado como perfeito.
Mas então eu o vi e soube que era ele, o meu príncipe. Não o que
me resgataria, mas o que me amaria incondicionalmente.
Não sei se penso assim porque agora estou um pouco mais
velha, ou por tudo o que passamos juntos e separados, mas gosto
de pensar que somos duas partes, que se encaixam perfeitamente.
Gosto de como me vejo em você. E gosto ainda mais em como você
se vê em mim.
É uma mistura envolvente, imperfeita e perfeitamente
magnifica.
— Eu te amo — ele diz olhando bem no fundo dos meus
olhos quando nos encontramos.
— Mesmo não sendo mais a mesma menina de 5 anos atrás,
eu ainda sou a mesma mulher loucamente apaixonada por um
homem tão maluco quanto eu, que aceitou assinar um contrato com
uma desconhecida — declaro envolvida pela paixão que ainda
queima dentro de mim.
Suas mãos rodeiam minha cintura.
— Que bom que assinei, assim você não tem escapatória,
Princesa. Estaremos ligados para sempre por um contrato.
Fim.

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