// LIVRO

Refugio nos Seus Braços.200Z

Refúgio nos Seus Braços

Eu sei que deveria ficar longe dele. Mas, quando meu padrasto traficante de drogas me expulsa, não tenho para onde ir. Agachar-me em um galpão abandonado na fazenda do avô de Ian parece um plano tão bom quanto qualquer outro. Ian me encontra lá, é claro, e ele insiste que eu mude para seu quarto de hóspedes. Eu deveria dizer não, mas o apelo de um telhado e uma cama quente é demais. Sem mencionar os olhos castanhos e braços fortes de Ian. Não somos nada parecidos, mas a faísca entre nós é inegável. Minha vida finalmente está melhorando. Até eu chamar a polícia para o meu padrasto e, sem querer, fazer minha mãe grávida ser presa. Agora eu tenho que sacrificar meus sonhos para cuidar do bebê da minha mãe. Ela é a única família que me resta. Enquanto isso, a banda de Ian está decolando; seus sonhos estão se tornando realidade. Ian é minha única chance de amor. Só espero que ele não se torne a única chance que escapou.

CAPITULO 1
HAZEL
— Eu acho que você está no lugar errado, — diz Big Paw 1quando me
sento na frente dele em seu escritório. — Você tem que ir ao restaurante
Farmhouse para se candidatar a uma vaga de garçonete.
Sentar em frente a um homem como Big Paw faz uma pessoa se
sentir menor do que pequena. Obviamente, seu nome não é realmente Big
Paw, mas é assim que todos na cidade o chamam. Ele é o senhor mais
velho com seus oitenta anos e uma força e tanto por aqui. Você não mora
em Eres sem saber quem é o Big Paw. Ele faz jus ao seu nome também. É
um homem grande, tanto em peso quanto em altura. Ele deve ter bem
mais de um metro e oitenta e cinco e cerca de 110 quilos,
facilmente. Mesmo com sua idade, ele não se curva muito, mas se move
um pouco mais devagar. Sempre usa a mesma coisa, dia após dia. Uma
camisa xadrez com um macacão, botas de cowboy e um chapéu de
caminhoneiro. Eu juro, seu armário deve ter um milhão de camisas xadrez
e macacão, ou sua esposa, Holly, lava muito a mesma roupa.
Eres, Nebraska, é um lugar desconhecido para a maior parte do
mundo. Andamos por estradas de terra, e a maioria dos habitantes são
reles pobres. Se você tem um emprego em Eres, é um sortudo, embora
provavelmente não pague muito. Você trabalha de salário em salário, se
tiver sorte. Se não tiver, provavelmente fará um empréstimo com Big Paw,
que não esperará que você pague de volta, embora ele diga regularmente
que lhe deve. O velho Kenny da oficina ainda deve a Big Paw cinquenta mil
dólares. Essa dívida está retida desde 1987 e eu duvido que algum dia ela
1 Patas Grandes; Grandes Patas.
seja paga. Ainda assim, durante todas as reuniões da cidade, Paw traz o
assunto com um olhar mal-humorado colado no rosto.
Big Paw é basicamente o padrinho de Eres. Ele dirige o Rancho Eres,
que é a peça central de toda a cidade. Dos campos de cultivo ao gado, Big
Paw criou algo que ninguém mais parece ser capaz de fazer em Eres: ele
construiu algo que dura.
O Rancho Eres funciona bem há mais de sessenta anos, e a maioria
das pessoas que trabalham na cidade trabalha para Big Paw. Seja no
rancho ou na Fazenda.
Eu definitivamente não estou sentada em seu escritório na
esperança de uma posição de garçonete, mesmo que pareça que não fui
feita para o rancho.
— Com todo o respeito, Sr. Big Paw…
— Big Paw, — ele corrige. — Nada de ‘Sr.’ ou outras porcarias
assim. Simplesmente Big Paw. Não continue me fazendo sentir mais velho
do que já me sinto.
Engulo em seco. — Sim. Desculpe. Big Paw, com todo o respeito, não
estou interessada em um cargo no restaurante. Eu quero trabalhar no
rancho.
Seus olhos disparam para cima e para baixo de mim, observando
minha aparência. Claro, tenho certeza de que a maioria das garotas da
minha idade não quer descer e sujar-se nos chiqueiros ou estábulos, mas
preciso desse emprego e não irei embora até que o garanta.
— Você realmente não se parece com minha equipe habitual. — Ele
bufa e faz uma careta. Mas não levo isso para o lado pessoal, porque Paw
está sempre bufando e fazendo caretas. Se ele sorrisse para mim, eu
sentiria como se fosse um desejo de morte.
— Não sei se você tem o que é preciso para trabalhar nos celeiros, —
explica, remexendo na papelada. — Tenho certeza que Holly pode
conseguir uma boa posição para você no restaurante.
— Eu não quero um cargo em restaurante, — argumento
novamente. Então paro e engulo em seco, percebendo que o interrompi. As
pessoas não interrompem Big Paw. Ou pelo menos não vivem para contar
a história. — Desculpe, mas preciso de um emprego no rancho.
— E por que isso? — Seus olhos estão tão escuros que parece estar
olhando para o maior buraco negro enquanto ele olha em sua direção.
— Não é segredo que os funcionários do rancho ganham o dobro dos
funcionários do Farmhouse. Eu preciso do dinheiro.
Ele tira um charuto da gaveta da escrivaninha, coloca-o entre os
lábios e recosta-se na cadeira. Não o acende, mas o mastiga na ponta. Ele
sempre tem aquele charuto na boca, mas nunca o vi acendê-lo. Talvez seja
apenas um velho hábito ao qual ele se agarra. Ou talvez Holly o tenha
repreendido e ordenado que ele pare de fumar. Ela está decidida a fazer
Paw cuidar de sua saúde, mesmo que ele não queira, e eu juro que aquele
homem fará qualquer coisa para deixar sua esposa feliz. Holly é
provavelmente a única alma viva que já recebeu seus sorrisos.
— Você mora nos trailers, certo? — Ele pergunta, roçando o polegar
contra o lábio superior.
— Sim, senhor. — Ele ergue uma sobrancelha ao ouvir a
palavra senhor. Limpo minha garganta e tento novamente. — Sim, Big
Paw. É isso mesmo.
— Quem são seus parentes?
— Apenas minha mãe, Jean Stone.
— Jean Stone… — Suas sobrancelhas se aproximam enquanto ele
bate os dedos contra a mesa. — Ela está namorando Charlie Riley, não é?
Meu estômago revira um pouco com a menção de Charlie. — Sim,
se…Big Paw.
Por uma fração de segundo, Big Paw não parece mal-humorado,
parece quase triste. Ele mastiga o charuto e balança a cabeça. — Esse
menino não é bom. Ele causa muitos problemas em nossa cidade,
trazendo aquela porcaria que mexe com os corpos e cabeças das
pessoas. Não tenho lugar na minha equipe se houver algum tipo de uso de
drogas. Não tenho tempo para essa bagunça.
— Eu juro, eu não uso. Na verdade, odeio com força. — Quase tanto
quanto odeio Charlie.
Charlie é o marido da mamãe – meu querido padrasto – e está em
nossas vidas desde que eu me lembro. Eu nunca soube que cobras podiam
ser pessoas até que cresci para descobrir o tipo de pessoa que Charlie
é. Ele é a mancha escura em Eres, uma infecção tóxica que se espalhou
pela cidade. É o maior traficante de drogas e a principal causa do vício em
metanfetamina que assumiu o controle da cidade.
Charlie Riley é um problema – e ele é muito bom em seu trabalho
para ser pego.
Há muitos motivos para odiar aquele homem, mas meu principal
motivo é baseado na pessoa em que ele transformou minha mãe.
Mamãe sempre disse que ama Charlie, mas ela não gosta muito
dele. Pelo menos não quando ele está bêbado, e se há alguma coisa em que
Charlie é bom, é em estar bêbado. Às vezes, Charlie fica tão bêbado e
chapado que joga coisas e bate na mamãe até que ela comece a chorar e se
desculpar por coisas que nunca fez.
Uma vez perguntei a ela por que não o deixava, e ela me disse: —
Tudo o que temos é por causa daquele homem. Esta casa, as roupas do
corpo, a comida que você come. Você não vê, Hazel? Sem ele, não somos
nada.
Eu não entendo isso. Não entendo porque alguém é autorizado a
machucar você só porque lhe dá coisas. Talvez ela esteja certa sobre
Charlie nos dar coisas, mas se não tivéssemos nada, isso significaria que
ela também não teria olhos inchados e negros.
Ela me disse para parar a conversa e não tocar no assunto
novamente, porque ela ama Charlie e nunca o deixará.
Faz três anos desde que tivemos essa conversa. Agora estou com
dezoito anos e parece que, dia após dia, mamãe está começando a ficar do
lado de Charlie em vez do meu. Sei que não são esses seus pensamentos,
no entanto. Charlie envenenou seu corpo e mente a tal ponto que mamãe
não tem ideia de que lado está. Ela é uma escrava de seu controle e seu
suprimento de drogas. Quando olho nos olhos de mamãe atualmente,
quase não vejo minha mãe de verdade olhando para mim.
Já teria me mudado se não fosse pelo fato de que mamãe está
grávida de quatro meses. E me sinto um pouco responsável por meu irmão
que logo nascerá. Deus sabe que Charlie não cuida das necessidades dela.
Preciso do emprego no Rancho Eres para economizar dinheiro para
minha irmã ou irmão. Preciso de dinheiro para comprar vitaminas prénatais para mamãe. Dinheiro para ter certeza de que sua geladeira tenha
comida. Dinheiro para garantir que de alguma forma o bebê possa vir ao
mundo com um pouco mais do que eu.
Então, com o resto do dinheiro, comprarei uma passagem só de ida e
deixarei Eres e nunca mais olharei para trás. De alguma forma,
convencerei mamãe a vir comigo também, com o novo bebê. A última coisa
que ela precisa fazer é criar um filho com Charlie por perto.
Mamãe estava certa; temos um teto sobre nossas cabeças por causa
de Charlie. Mas só porque alguém lhe dá quatro paredes para ficar, não
significa que não seja uma prisão. Eu mal posso esperar pelo dia em que
arrecadarei dinheiro suficiente para comprar minhas próprias quatro
paredes. Essas quatro paredes estarão cheias de amor, não de
ameaças. Com felicidade, não medo.
E o nome Charlie Riley será uma memória distante.
Big Paw esfrega a nuca. — Estamos procurando trabalhadores para
o rancho, não uma garota que provavelmente tem muito medo de sujar as
mãos.
— Eu não tenho medo disso. Vou trabalhar e me sujar como todos.
— Precisa ser capaz de levantar mais de trinta quilos.
— Vou levantar quarenta.
Ele ergue uma sobrancelha e se inclina para frente. — Tem que estar
aqui antes do nascer do sol, e se você não terminar a tarefa, você fica
depois do anoitecer, e não há hora extra. Você recebe pelas tarefas diárias
concluídas, não pelas horas que trabalha. Se terminar cedo, pode sair
mais cedo. Se você comete um erro, vai embora. Entendeu, garota?
Se alguém mais me chamasse de “garota”, eu bateria meu punho
direto em seu nariz para mostrar a eles o quanto sou uma garota, mas
ouvir isso vindo de Big Paw não é um insulto. Ele chama qualquer pessoa
mais jovem do que ele de “garoto” também, porque ele pode. Tenho certeza
de que as pessoas que se identificam de forma diferente ficam ofendidas
com o título que Big Paw lhes dá, mas ele está velho demais para se
preocupar em se corrigir.
Cachorro velho, novos truques e tudo.
— Compreendo. — Concordo. — Serei a trabalhadora mais esforçada
que existe, prometo.
Ele resmunga mais um pouco e esfrega a barba. — Tudo bem, mas
não venha reclamar para mim quando você estragar seu par de sapatos
favorito no chiqueiro. Se apresente aos estábulos amanhã ao meio-dia em
ponto para treinar com meu neto, Ian. Ele ficará encarregado do seu
treinamento.
Sento-me um pouco mais ereta enquanto meu estômago se
contrai. — Espere, Ian estará me treinando? — Faço uma careta. — Tem
certeza de que Marcus, James ou outro não pode me treinar?
— Não. Esses meninos já estão treinando outros trabalhadores do
rancho. — Ele ergue a sobrancelha mais uma vez. — Já está se tornando
difícil, não é?
Balanço minha cabeça. — Não, senhor… er… Big
Paw. Desculpe. Está bem. Amanhã ao meio-dia. Estarei lá.
A ideia de ser treinada por Ian Parker me dá vontade de vomitar. Ele
é conhecido como o astro do rock playboy de Eres. Ian se formou três anos
antes de mim, e eu fui a garota de sorte com meu armário ao lado do dele
durante meu primeiro ano. O que significa que tive uma visão central dele
trocando saliva com qualquer groupie2 de cidade pequena que estava
enrolada em seu dedo mindinho no momento.
Fiquei chocada que a mononucleose3 não estava sendo espalhada
por aí devido aos costumes de Ian Parker e suas prostitutas. Não há nada
que eu odiasse mais do que ter que abrir caminho entre ele e a garota loira
da semana para chegar no meu armário. Agora, ele será o responsável pelo
meu treinamento no rancho.
Eu duvido que ele saiba quem sou, uma vez que passei boa parte do
meu tempo no colégio me esforçando para não me destacar. Meu guardaroupa consistia em preto com preto com uma pitada de preto. Combinava
com meu cabelo cor de carvão, unhas com esmalte preto e olhos verdes
profundos. A escuridão de tudo isso combinava com minha
personalidade. Eu era solitária e achava a vida um pouco mais fácil
assim. A maioria das pessoas me chamava de gótica solitária de Eres e me
achavam indigna do seu tempo. Embora um bom punhado de garotas
tivesse reunido energia para me intimidar durante os anos do ensino
médio, como se eu tivesse sido um caso de caridade agressivo. Oh? Veja
Hazel Stone cuidando de sua vida; vamos fazê-la se destacar mais jogando
comida nela durante o almoço. Essa é a atenção que ela anseia.
Se eu desaparecesse, provavelmente ninguém viria me procurar. Não
quero ser excessivamente melodramática, mas é verdade. Uma vez eu fugi
de casa por duas semanas, e quando voltei, mamãe me perguntou por que
eu não tinha lavado a louça. Ela nem percebeu que eu estava desaparecida
e, se minha própria mãe não notou, duvido que qualquer outra pessoa em
Eres tenha notado. Especialmente alguém como Ian. Ele estava muito
ocupado com as mãos em torno de uma mulher ou dedilhando seu violão.
2 Groupie é uma pessoa que busca intimidade emocional e/ou sexual com um músico.
3 Muitas vezes chamada de mononucleose ou doença do beijo, uma infecção com o vírus
Epstein-Barr. A Mononucleose é transmitida pela saliva.
No dia seguinte, apareço no rancho duas horas antes de ter que me
encontrar com Ian. Passo pelos estábulos, fazendo hora antes de ir
trabalhar. Eu não tenho um carro para chegar ao trabalho, então levo
quase trinta minutos para andar até a casa de Charlie. Com o sol
queimando minha pele, forçando o suor a escorrer por minha
testa. Minhas axilas são a terra dos sonhos do Shrek4 com base na
umidade semelhante ao pântano. Afasto meus braços do corpo, tentando
impedir que as manchas de suor se aprofundem, mas o sol de verão em
Eres não se desculpa com os meros seres humanos que ataca.
Quando duas horas se passam, vou para o escritório do rancho,
onde devo me encontrar com Ian. Fico sentada lá por trinta
minutos. Depois, quarenta e cinco minutos. Uma hora se passa.
Eu não tenho ideia do que devo fazer. Verifiquei meu relógio umas
cinco vezes, para ter certeza de que não apaguei e perdi meu horário com
Ian.
Depois de esperar mais de uma hora, começo a caminhar ao redor
do rancho, na esperança de cruzar com Ian ou alguém que possa me levar
até ele. Quanto mais o tempo passa, mais nervosa fico pensando que se
Big Paw descobrir que eu não estou em treinamento, ele me despedirá
antes mesmo que eu tenha a chance de trabalhar.
— Licença, você pode me ajudar? — Pergunto a um cara carregando
uma pilha de feno nas costas. Ele se vira para mim com um olhar
exausto. Deve ter cerca de 23 quilos de feno repousando sobre ele, e me
sinto mal por interrompê-lo, mas não posso perder meu emprego.
— Sim? — Ele inspira profundamente. Eu também o tinha visto na
escola. Ele é James, o melhor amigo de Ian. James é muito menos
4 Personagem representado por um ogro verde que mora no pântano do filme Shrek, da
DreamWorks Pictures.
promíscuo do que Ian. E sorri muito mais também, mesmo com o feno
pesado prestes a quebrar sua espinha. Os dois estão em uma banda
chamada Wreckage5, e embora Ian seja o vocalista, James é o coração da
música. As pessoas anseiam por Ian, enquanto querem ser o melhor amigo
de James. Eles formam um time legal. James veste uma camiseta branca
com as mangas levantadas nos braços e um boné de beisebol virado para
trás. Sua camisa parece ter visto dias melhores, coberta de sujeira e
rasgos, mas ainda assim, ele encontrou uma maneira de sorrir para mim.
— Meu nome é Hazel, e devo me encontrar com Ian para o meu
treinamento. É meu primeiro dia.
James arqueia uma sobrancelha antes de jogar o feno no chão. Ele
esfrega as costas da palma da mão na testa e pigarreia. — Você está
trabalhando aqui? — Pergunta, parecendo mais perplexo do que eu
gostaria.
— Sim, estou. É meu primeiro dia, — repito.
Seus olhos se movem pelo meu corpo e ele balança a cabeça, fazendo
toda insegurança que tenho vir à tona. É engraçado como um simples
olhar pode destacar a timidez de alguém com tanta facilidade.
James deve ter percebido meu desconforto, porque ele me dá um de
seus sorrisos gratuitos e se encosta na pilha de feno. — Você vai morrer
aqui, vestindo todo esse preto. Calça jeans preta e uma camisa de manga
comprida? Essas são botas de combate? — Ele ri. — Tem certeza de que
não deveria estar em Farmhouse?
Sua risada não é um insulto. Estava confusa, mas ainda assim, eu
não gosto.
— Não estou preocupada com o meu guarda-roupa. Eu só quero
trabalhar.
— Você deve se preocupar com seu guarda-roupa, visto que o sol
neste rancho não poupa. A insolação é uma coisa séria.
5 Significado: Destroços.
— Você sabe onde Ian pode estar? — Pergunto com os dentes
cerrados. Não vim ao rancho para receber crítica de moda. Estou aqui para
trabalhar.
— Conhecendo Ian, ele provavelmente está no escritório fora dos
estábulos dos cavalos. Mas um pequeno aviso… — James diz, mas eu o
interrompo.
Não tenho tempo para um alerta.
Eu já estou quase uma hora e trinta minutos atrasada.
— Obrigada, — falo, correndo em direção ao pequeno escritório
anexo aos estábulos. Big Paw mencionou que eu deveria me encontrar com
Ian no escritório do estábulo? Teria eu o entendido mal ao aparecer no
escritório principal? Caramba. Não só cometi uma falta, como já estraguei
tudo.
No momento em que chego ao escritório, abro a porta, já com
minhas desculpas na ponta da língua. — Oi, Ian, sou Hazel e oh meu Deus!
— Solto, olhando para cima para ver uma garota de joelhos na frente de
um Ian meio vestido. Sua camiseta branca ainda está vestida, mas sua
calça jeans e boxer estão enrolados em seus tornozelos enquanto os lábios
de uma mulher estão em volta do seu…
Oh, minha Santa, é para ser tão grande? Como a garota não se
engasga até a morte com esse bastão de dinamite na boca? A maneira
como as veias se projetam de seu pênis me faz pensar que aquela coisa
pode explodir a qualquer segundo, e a garota de joelhos não tem nenhum
problema com o fato daquilo ocorrer entre seus lábios cobertos de batom.
Eu me viro para desviar o olhar, surpresa com o que encontrei. —
Desculpa, me desculpa! — Grito, sacudindo minhas mãos assustada.
— Dê o fora! — Ian grita, sua voz rouca pingando de irritação e
prazer ao mesmo tempo. Quem diria que você pode ficar irritado e
satisfeito ao mesmo tempo? Qualquer homem recebendo um boquete
interrompido, eu suponho.
— Desculpa, desculpa! — Repito, correndo para fora da sala. Fecho
a porta rapidamente atrás de mim e respiro fundo. Minhas mãos tremem e
meu coração bate forte contra meu peito. Essa é a última coisa que eu
esperava que acontecesse dentro de um estábulo de cavalos à uma hora da
tarde de uma quarta-feira. Deixei que Ian me desse um belo cenário
naquela tarde. Uma visão que eu gostaria de apagar de minha mente.
Fico lá como uma completa idiota por alguns minutos antes de
verificar meu relógio.
Como eles ainda não terminaram?
Ora, eu não sou uma especialista em boquetes, mas com base no
tamanho, nas veias e na determinação da dita mulher de joelhos, Ian
deveria estar perto de concluir.
Ainda assim, não ouço aquele gemido de felicidade sair de seus
lábios, e o dia está passando.
Bato na porta.
— Cai fora, — a voz de Ian sibila.
Ainda aquele sujeito encantador de que me lembro do colégio.
— Eu faria se pudesse, mas não posso. Você deveria começar meu
treinando hoje.
— Volte amanhã, — ele ordena.
— Não posso. Big Paw me disse que tenho que treinar hoje com você,
sem se, e, ou mas, e me recuso a perder esta oportunidade de emprego. Eu
preciso disso.
— Guarde a história triste para alguém que se importa, — ele rosna,
fazendo minha raiva crescer mais e mais.
Quem esse cara pensa que é?
Só porque ele encontrou um vislumbre do sucesso musical na
internet e tem todas as mulheres – e alguns homens – em Eres querendo
sua atenção, isso não significa que tem o direito de falar com as pessoas
da maneira como fala. Quer dizer, diabos, ele é uma estrela do rock no
meio do nada, em Nebraska. Não é como se ele fosse Kurt Cobain ou Jimi
Hendrix.
Abro a porta do escritório para encontrar os dois ainda nas mesmas
posições e coloco minhas mãos nos meus quadris. — Sinto muito, você
deveria estar me treinando, portanto, esta situação provavelmente deveria
esperar até mais tarde.
Ian olha para mim e ergue a sobrancelha mais alta da história, e
para que conste, estou trabalhando muito duro para não notar a outra
parte de seu corpo arqueada em exibição.
— Que tal você pegar a dica e entender que ele está ocupado
comigo? — A mulher zomba, finalmente se afastando de sua boca cheia.
Boa menina. Suba para respirar um pouco de ar fresco.
— Que tal você não falar comigo? — Eu retruco. — É meu primeiro
dia, — repito, desta vez com os dentes cerrados enquanto olho para Ian. —
E você é meu treinador, então espero ser treinada.
Seus olhos me perfuram. — Você sabe quem eu sou?
Sério?
Ele acabou de usar essa frase clichê?
Você sabe quem eu sou?
Novamente, não Kurt Cobain, amigo.
— Sim, eu sei quem você é. Meu treinador. Então, se pudéssemos…
— Não vou treinar você, — diz ele. — Agora você pode desaparecer.
— Sim, vá embora, — diz a mulher.
— Sinto muito, há um eco desesperado aqui? — Eu pergunto,
atirando meu olhar para a mulher, então de volta para Ian. — Não vou
embora até que você me treine.
— Bom, então, aproveite a vista, — ele comenta, colocando as mãos
atrás da cabeça da mulher para trazê-la para mais perto de seu pau.
— Ok. Tenho certeza de que Big Paw ficará bem em saber o que você
estava fazendo ao invés de me treinar, — ameaço.
A mulher solta uma risada maliciosa. — Como se Ian se importasse
com o que Big Paw pensa. — Ela vai se inclinar, mas as mãos de Ian
levemente a movem de volta.
— Já era, estragou o clima. Tentaremos novamente mais tarde. —
Ele fala.
Ela olha para ele, atordoada. — Você está brincando, certo?
Ele encolhe os ombros. — Não estou no clima agora.
Essas palavras também são conhecidas como “Estou morrendo de
medo do meu avô e não quero ficar mal com ele”. Até mesmo o astro do rock
da cidade tem seus medos.
— Eu posso fazê-lo voltar, — ela diz, se inclinando, mas ele a para
novamente.
— Que tal você pegar a dica e entender que ele está ocupado
comigo? — Deixo escapar, zombando das palavras que a mulher tinha me
dito, sentindo meu nível de atrevimento atingir o ponto mais alto. Eu não
sou uma garota atrevida – a menos que alguém mexa comigo
primeiro. Olho por olho e tudo mais.
Ela se levanta e alisa o vestido de verão. Quando passa por mim, dá
a Ian um sorriso sedutor. — Ligue-me mais tarde, sim?
— Claro, Rachel.
Seus olhos se arregalam. — Meu nome é Laura.
— Foi o que eu disse. — Ian acena com desdém. Se ele pudesse ser
mais um clichê idiota de cidade pequena, ele seria Jess de Gilmore
Girls6. Arrogante e convencido, muito sexy.
Eu não me sinto atraída por ele de forma alguma, devido à sua
personalidade nojenta, mas fingir que Ian não é sexy é uma perda de
tempo. O homem exala sex appeal como magia negra. É como se ele tivesse
vendido sua alma ao diabo para parecer tão bonito. Cabelo preto, corpo
tatuado, braços que fazem parecer que ele levanta gado durante sua
6 Gilmore Girls é uma série de televisão norte-americana, de comédia dramática.
folga. E esse maldito sorriso de estrela do rock. Você conhece o
sorriso. Aquele que diz, eu posso fazer você me chupar bem aqui e agora, se
quiser. Esse mesmo sorriso que tenho certeza que ele deu a Laura mais
cedo naquele dia. Moramos no campo, onde os guarda-roupas da maioria
das pessoas são camisas xadrez e jeans, vestidos de verão e botas de
cowboy, mas onde a maioria das pessoas tem uma aparência mais ou
menos comum, Ian parece um semideus que nasceu na maldita galáxia
errada.
Enquanto ele puxa para cima sua boxer e jeans, eu me afasto, dando
a ele um pouco mais de privacidade do que eu tinha dado há alguns
momentos.
Quando termina, ele limpa a garganta. Olho para ele, enquanto roça
o polegar no nariz. Seus lábios estão espremidos, insatisfeitos. Sem
dúvida, ele não está me dando seu sorriso de boquete. — Quem diabos é
você?
Obviamente, sua nova inimiga.
— Hazel.
— Hazel o quê?
— Stone. Hazel Stone.
No minuto em que digo meu nome completo, as sobrancelhas de Ian
franzem fortemente enquanto um sorriso de escárnio cai contra seus
lábios.
— Sua mãe é Jean Stone?
Engulo em seco. Qualquer um que conhece minha mãe
provavelmente não é um grande fã dela, porque eles sabem de sua conexão
com Charlie – o lobo mau de Eres. — Sim, é ela.
Suas mãos se fecham em punhos enquanto a informação se assenta
em sua cabeça. — Big Paw sabe disso?
— Sim, ele foi informado. Não vejo o que isso tem a ver com…
— Ele sabia disso, — ele me interrompe, — e disse que devo treinar
você?
— Isso foi o que ele disse.
Há um instante de silêncio enquanto os punhos de Ian se apertam.
— Uma hora, — Ian rosna, parecendo muito mais irritado agora do
que quando eu interrompi seu boquete. Minha conexão com Charlie
realmente tinha um efeito tão grande nas pessoas?
Quem estou enganando? Claro, que sim.
— O que você quer dizer com uma hora? — Eu pergunto, não
querendo pressionar o claramente irritado Ian mais do que ele já está.
— Eu te dou uma hora antes de você sair correndo deste lugar
chorando como um bebê. Você não tem o que é preciso para trabalhar
aqui, para trabalhar sob minha supervisão.
— Sem ofensa, mas você não sabe o que eu tenho. E consigo lidar
com o trabalho no rancho. — Isso é verdade? Diabos, se eu sei. Não sei
nada sobre trabalhar em um rancho, mas tenho determinação de
sobra. Não há margem para o fracasso.
— Oh, querida, — ele diz, — você não sabe para o que acabou de se
inscrever. Bem-vinda ao inferno.
Ele passa por mim, enviando arrepios por minha espinha. Quero dar
um soco na mandíbula dele por me chamar de “querida”. Se há algo que
odeio mais do que apelidos de mulheres, são apelidos
condescendentes. Baby. Querida. Rosto de boneca. Que tal ele ir à
merda? Eu quero chutá-lo pelo apelido estúpido e depreciativo, mas ele
não me dá a chance de me vingar, pois já está falando sobre as tarefas que
cumpriremos na hora seguinte, antes que eu fuja e desista como uma
criança soluçando.
Porcos. Estábulos. Galinheiros.
Ele continua falando sobre os trabalhos de merda que terei que
assumir, o que combina bem com sua personalidade de merda. Sei que ele
não estava brincando sobre o inferno, e com o veneno escorrendo de sua
boca, estou 100% convicta de que Ian Parker é o próprio diabo.
2
IAN
Hazel Stone é filha de Jean Stone, enteada de Charlie Riley e uma
pessoa que eu não tenho nenhum desejo de conhecer – muito menos
treinar. Qualquer coisa e qualquer pessoa ligada à gente como Charlie
Riley não é ninguém que eu queira na minha vida. Isso inclui Hazel.
A gola da camiseta preta de manga comprida de Hazel está bem
pressionada sobre suas narinas enquanto estamos nos chiqueiros. Eu a
instruo para começar a limpar o curral, e ela está se esforçando, assim
como sabia que faria. Não deve ter sentido o prazer de sentir os aromas
imundos de merda de porco, a camiseta que cobre seu nariz é a prova
disso. Ela deve se considerar sortuda por isso. O velho Eddie trabalha nos
currais por tantos anos que não entende porque as pessoas olham
estranhas para ele quando ele vai para a cidade cheirando a esterco. O
pobre idiota não consegue nem sentir o cheiro de si mesmo.
De vez em quando, Hazel faz sons de engasgo, como se estivesse
prestes a vomitar seu almoço.
O que diabos Big Paw estava pensando quando contratou Hazel para
trabalhar no rancho? A velhice deve ter afetado suas boas habilidades de
tomar decisões, porque nada sobre contratar aquela garota faz o menor
sentido.
Ela parece ter saído de um caixão de vampiros cinco minutos antes
de entrar no rancho, com todo o delineador preto que tem rebocado em
seu rosto. Esse guarda-roupa escuro não faz com que ela pareça menos
vampira. Se a escuridão fosse uma pessoa, seria Hazel Stone. Suas roupas
são largas e grandes, e ela não sabe como sorrir. Não posso culpá-la por
não saber sorrir. Eu também não tenho uma grande cara sorridente, mas
o que mais me incomoda é como ela tinha interrompido meu tempo com
Erica…er…Rachel? Diabos, qualquer que fosse o nome da garota que tinha
seus lábios enrolados em torno do meu pau. Agora, estou sofrendo de um
caso de bolas azuis. Não é como se eu estivesse planejando abandonar um
boquete. Isso nunca aconteceu comigo, mas eram preliminares, depois eu
teria deitado a mulher sobre minha mesa e transado com ela até as vacas
chegarem em casa – o que acontece por volta das seis da tarde.
Agora, ao invés disso, estou andando pelo rancho com a porra da
Wandinha Addams7 me seguindo, falando sobre o que é preciso para ser
uma ajudante no Rancho Eres. Novidade: Ela não tem o que é preciso.
Está tão longe do que é preciso para o trabalho no rancho a ponto de eu
me sentir um idiota por desperdiçar minha tarde mostrando-lhe o local.
— Não pense que alguém vai te dar uma vida fácil por aqui só
porque você é uma menina, — falo enquanto ela coloca feno sujo no
carrinho de mão.
— Não sou uma menina, — ela grunhe, lutando para erguer o
forcado8, mas não desistindo.
Olho-a fixamente de cima a baixo.
Claro, ela usa roupas largas, mas debaixo delas posso ver um belo
par de seios destacados um pouco atrás de sua camisa.
Antes que eu possa comentar, ela dispara seu olhar para mim. —
Sou uma mulher.
Eu bufo. — Por um triz. Quantos anos você tem, dezoito?
— Sim. Que é exatamente a idade em que se torna uma mulher. Não
sou uma menina.
Reviro os olhos com tanta força que tenho certeza de que perderei
minha visão. — Mulher, menina, garota, tanto faz. Apenas termine seu
7 Personagem do filme A Família Addams.
8 É um instrumento utilizado na agricultura e na jardinagem, constituído por um cabo
longo de madeira, de dois a quatro dentes compridos na ponta, geralmente de metal,
assemelhando-se a um grande garfo.
trabalho. Está perdendo muito tempo nesse único cercado. Há mais sete
que você tem que limpar.
Ela engasga. — Sete? Não há…
— Não, o quê? — Eu interrompo. — Você não consegue limpar os
sete? — Levanto uma sobrancelha e ela percebe. Um sorriso sinistro surge
em meus lábios. Passaram-se apenas quarenta e cinco minutos e parece
que a pequena Hazel já está perto de sacudir a bandeira branca.
Ela rola os ombros para trás e se endireita. — Eu posso limpar os
sete currais. Eu vou limpar. Mesmo que leve a noite toda.
A julgar pela velocidade que ela está indo, realmente demorará a
noite toda. Tudo bem para mim – tenho ensaio mais tarde naquela noite na
casa do celeiro, então estarei na propriedade até tarde de qualquer
maneira. Se Hazel não quiser jogar a toalha ainda, ela poderá passar o
resto da noite nos cercados, se quiser.
Leva três horas para terminar dois currais.
Três malditas horas.
Demora muito mais do que deveria, mas tenho que admitir – ela não
desistiu. Nem sequer parou no intervalo para beber água, exceto quando
eu a forcei a fazer isso.
— Está trinta e cinco graus lá fora. Faça uma pausa. Caso contrário,
vou arrastá-la pelos tornozelos e levá-la às pressas para a sala de
emergência, — ordenei.
Relutantemente, ela fez uma pausa, mas depois voltou a trabalhar.
Por volta das sete, junto minhas coisas no escritório e vou verificar
Hazel mais uma vez. — Quantos mais? — Pergunto.
— Três. — Ela parece irritada. — Só mais três.
Balanço a cabeça uma vez. — Estou indo para a casa do celeiro
ensaiar com a banda. Pare lá quando terminar, e me peça para vir conferir
seu trabalho.
Ela não responde, mas sei que ela me ouviu. Pelo menos é bom que
tenha, porque eu não quero repetir, e se eu não verificar o trabalho dela
até o final da noite, ela ficará sem sorte para o trabalho.
Nem sei por que ela está trabalhando para o rancho. Não entendo
por que ela se colocou na posição em que está. Poderia simplesmente ter
procurado seu padrasto de merda e ingressado no negócio de tráfico de
drogas da família.
Após uma resposta silenciosa dela, vou em direção à casa do celeiro
para me encontrar com os outros caras. Nos últimos cinco anos estive na
banda The Wreckage, que consiste em mim e meus três melhores
amigos. Tínhamos nos aproximado muitos verões atrás, quando tínhamos
dezesseis anos – exceto Eric, que tinha apenas treze – e fomos forçados a
trabalhar no rancho. Fui forçado pelo Big Paw, porque ele não queria que
eu causasse problemas durante o verão, e o resto dos caras foram forçados
pelos pais a ajudar suas famílias com a renda.
Se você mora em Eres e tem dezesseis anos, provavelmente há uma
boa chance de ter um pequeno emprego para ajudar a levar dinheiro para
sua família. O salário de um pai não é suficiente para colocar comida na
mesa a maior parte do tempo.
Os caras e eu passamos aquele verão limpando merda e formando
uma banda para ajudar a passar o tempo. Em uma cidade pequena, você
faz tudo o que pode para acelerar o tempo. Os dias de verão se arrastam e
as noites são tediosas. A música mudou isso para nós. Não demorou muito
para que realmente nos importássemos com o que estávamos criando e, ao
longo dos anos, havíamos de alguma forma, encontrado um pouco de
sucesso. Não o suficiente para deixar nossos empregos diários, mas o
suficiente para sonhar com uma vida fora de Eres.
Além disso, todos nós temos talento suficiente para fazer nossa
banda se destacar.
Primeiro, há James, o cara agradável. Se há uma alma que precisa
de amor, James está lá para dar a eles. Ele toca baixo e tem uma
personalidade tão calorosa que pode fazer um inimigo jurado ajoelhar a
seus pés. E não é apenas um fodão no baixo, mas o rosto sorridente em
nossas contas de mídia social que atraem os fãs.
Marcus é o baterista dos deuses e o palhaço da banda. Ele é o alívio
cômico sempre que as tensões começam a se elevar entre nós – o que
acontece quando você tem um grupo de artistas que às vezes possui visões
diferentes sobre criatividade.
Eric, nosso tecladista, é o mago por trás de nossas mídias sociais.
Juro que seu cérebro trabalha em código. Ele é o mentor por trás da
formação de seguidores para o Wreckage em todas as plataformas. Mesmo
sendo o mais novo de nós – irmão de Marcus – é uma parte fundamental
da banda. Por causa dele, conseguimos uma base de fãs. Mais de
quinhentos mil seguidores no Instagram, seiscentos e cinquenta no
YouTube, e um número no TikTok que eu não posso nem dizer. Eric está
sempre procurando uma maneira de expandir nosso alcance, e isso
significa muita animação nossa nos ensaios da banda e trabalhando em
nossa pequena cidade, vivendo no rancho.
Afinal de contas, as pessoas gostam de ver músicos de rock vivendo
realmente um estilo de vida country. Não entendo o apelo, mas Eric é um
profissional que dá aos fãs o que eles querem ver. Se não há uma câmera
na sua mão ou se não estiver instalada em algum lugar próximo, ficarei
convencido de que ele está gravemente doente. Mesmo quando você não
acha que ele está gravando, deve saber que provavelmente está.
Depois há eu. O cantor principal que escreve as letras e conduz os
vocais. Sou o que tem a personalidade mais fraca, e sei que se não fosse
por minha banda, eu não teria encontrado a fração de sucesso que tenho.
Sou uma espécie de idiota, no geral. Não sou bom com as pessoas, e pior
ainda com as mídias sociais. Mas adoro a música. A música entende
partes de mim que as pessoas nunca chegarão perto o suficiente para
descobrir. A música me salvou nos piores dias da minha vida. Eu não sei o
que teria sido de mim sem o Wreckage. Nossos ensaios diários eram o que
me mantinha ancorado.
Ao entrar no celeiro, os caras já estão debatendo sobre os próximos
passos na música.
— Temos que fazer um show local e transmiti-lo ao vivo no
Instagram, — Eric fala enquanto passa as mãos pelo cabelo ruivo. — Se
não dermos aos fãs um gostinho da nova música, seremos pisoteados por
pessoas que estão trabalhando duro nas redes sociais. Se quisermos ser o
próximo Shawn Mendes a ser descoberto on-line, temos que impulsionar
nosso trabalho, — diz ele.
— Cristo, tome um calmante, E. Eu não quero que você tenha um
ataque cardíaco por causa dessa besteira do Instagram, — Marcus
resmunga, pegando uma cerveja de seu pacote de seis. — Que tal
diminuirmos a mídia social por um minuto e criarmos alguma merda boa?
— Marcus sempre foi assim – mais voltado para a música, menos para a
fama.
— Calma… — Eric começa a bufar enquanto caminha pela casa do
celeiro. — O que você quer dizer com parar as redes sociais? A mídia social
é nossa única chance dessa coisa decolar, e você quer voltar a ficar apenas
perdendo tempo no celeiro? Nossas visualizações caíram 5% nas últimas
semanas, e todos vocês estão agindo como se não fosse o Armagedom9!
Sorrio para meu colega de banda extremamente nerd, mas
apaixonado.
Se há uma maneira de irritar Eric, é fazendo com que Marcus diga
que a mídia social não é importante. Os dois discutem como os irmãos que
são.
— Talvez porque não seja o Armagedom, — diz Marcus com um
encolher de ombros.
9 Fim do mundo.
Eric tira os óculos, estala o quadril como minha avó depois de um
dia duro de limpeza e belisca o nariz. — Trinta e sete por cento, — diz ele.
— Oh, ótimo. Lá vai ele com as estatísticas novamente. — Marcus
geme.
— Sim, lá vou eu com as estatísticas de novo, porque elas realmente
importam. Trinta e sete por cento dos cidadãos dos Estados Unidos estão
no Instagram. Nossos maiores seguidores estão nos Estados Unidos, você
conhece a faixa etária deles?
Eu me junto ao grupo e me sento na beira do palco de madeira que
Big Paw construiu anos atrás, ouvindo, sabendo que Eric está prestes a
levar Marcus para uma lição de escola.
— Por favor, compartilhe. — Diz James, obviamente interessado.
— Noventa por cento tem menos de trinta e cinco anos. Isso significa
que estamos lidando com um mundo de millennials e Z10, que têm como
foco um cachorrinho perseguindo o próprio rabo. Se não captarmos a
atenção deles e dermos a eles um motivo para se importar com nosso som
e nossa marca, eles passarão para a próxima mais rápido do que uma
Kardashian11 fodendo com o time de basquete. Precisamos nos
concentrar. Precisamos pensar grande. Caso contrário, perderemos o
equilíbrio que ganhamos ao longo dos anos.
Todos se calam após as palavras de Eric, porque está claro que ele
sabe do que está falando. Além disso, concordo 100 por
cento. Ultimamente, eu me sinto cansado. Como se a música não estivesse
indo para os lugares que espero. Tenho sonhos e objetivos enormes, da
mesma forma que os outros caras, mas parece que estamos presos. Não
descobri como chegar ao próximo grande sucesso. E sei que Eric está certo
10 O termo “Millennials” é utilizado para caracterizar as pessoas que nasceram nos anos
80, englobando também os nascidos até meados dos anos 90. Já a Geração Z, abrange os
que nasceram a partir dos meados da década de 90.
11 Sobrenome da família de socialites/celebridades americanas envolvida em vários
escândalos.
sobre o lado da mídia social das coisas, mas se não tivermos a música,
nenhuma pressão fará de nós um sucesso.
Precisamos de sucessos, não apenas de sons medíocres.
— E quanto às letras novas em que você estava trabalhando,
Ian? Talvez possamos trazer algumas dessas faixas para a transmissão ao
vivo, — oferece James.
Eu me encolho. Nenhuma das coisas em que estou trabalhando está
pronta para ser explorada. Minha mente parece presa, e quando uma
mente está presa… — Ainda estou trabalhando em algumas coisas.
— Mas até que esteja pronto, temos que seguir em frente. Iremos
tocar nossas melhores faixas nas próximas semanas. Convide todos os
habitantes da cidade e transmita ao vivo. Vai, pelo menos, fazer com que a
força motriz volte a funcionar, — Eric oferece.
— Boa. Então, que tal examinarmos um set list12 e ensaiarmos isso?
— Marcus oferece. — Torná-lo brilhante e limpo e essas coisas.
Finalmente todos entramos na mesma página e começamos a fazer o
que amamos – música.
Horas se passam enquanto ensaiamos com apenas uma pausa para
o jantar, onde Eric compartilhou conosco o conhecimento de que pizza é a
comida mais instagramada – sushi e frango tomando o segundo e terceiro
lugares.
Eu juro, a quantidade de informação na cabeça daquele cara está
destinada a ser usada no Jeopardy!13 algum dia. Você não pode saber
tanta coisa e não acabar em algum game show noturno.
Quando as portas da casa do celeiro se abrem, fico chocado ao ver
Hazel entrando. Ela parece uma bagunça completa. Seu cabelo está
puxado para cima no coque mais bagunçado que eu já vi, seus olhos estão
12 Lista de música.
13 É um programa de televisão atualmente exibido pela CBS Television Distribuition. É
um show de perguntas e respostas (quiz) variando história, literatura, cultura e ciências.
brilhando de exaustão e suas roupas estão esfarrapadas, rasgadas e
cobertas de merda – literalmente. As botas de combate foram destruídas e
seu espírito está claramente quebrado, mas ela ainda está lá. Lutando,
mas não arruinada.
— Desculpe interromper, mas acabei com os chiqueiros. — Ela me
diz, acenando com a cabeça uma vez. — Se você quiser vir verificar meu
trabalho.
Enfio um pedaço de pão de alho na boca e esfrego minhas mãos
sujas de graxa contra meu jeans. — Demorou bastante. Eu irei para lá em
alguns minutos.
Ela não diz uma palavra, apenas gira nos calcanhares e se afasta.
James ergue uma sobrancelha. — Você realmente não a fez limpar
aqueles chiqueiros sozinha, não é? Você sabe que Big Paw normalmente
tem três caras nessa tarefa.
— Inferno, sim, eu fiz. Achei que se a quebrasse agora, não teria que
perder meu tempo pelo resto do verão.
— Eu teria jogado a toalha, — comenta Marcus. — Parece que ela
tem muito mais alma do que você pensa.
Depois de sofrimentos suficientes, as almas têm um jeito de ceder.
Talvez Hazel tenha sobrevivido ao longo do dia, mas com o tempo irei
quebrá-la.
Desejo boa noite para os caras e, quando começo a ir em direção aos
currais, James corre atrás de mim. — Ian, espere.
Viro-me para ele e cruzo os braços. — Sim?
— Aquela garota, Hazel – ela é enteada de Charlie, certo?
Eu concordo. — Sim.
James solta uma nuvem de ar quente e balança a cabeça. — Escute,
não seja muito idiota com ela por causa disso. Ela não é Charlie. Você não
pode colocar seu ressentimento por aquele idiota sobre os ombros dela.
— Qualquer pessoa que seja parente daquele homem é um inimigo
meu.
— Mas Hazel não viciou seus pais. Ela não é responsável pelo que
aconteceu com eles.
Cerro minha mandíbula e aceno em direção à casa do celeiro. — Que
tal você garantir que tudo esteja fechado. Vou lidar com Hazel da melhor
maneira que achar.
Ele não discute, porque sabe que sou um idiota teimoso e não há
muito que me afete. Como eu disse, James é o pacificador.
Eu, por outro lado? Não muito.
Vou para os cercados, onde encontro Hazel encostada em uma das
áreas fechadas, ainda parecendo como se tivesse erguido a maldita lua
inteira sobre os ombros naquela noite.
Ando ao redor dos currais e, para minha surpresa, eles estão
perfeitos. Ela lidou com todas as tarefas que eu dei e de alguma forma
conseguiu fazer melhor do que qualquer um dos caras que normalmente
cuidam dos estábulos.
Fico chocado.
Eu não irei deixá-la saber de seu trabalho bem feito, no
entanto. Ainda estou convencido de que ela estragará tudo em algum lugar
no futuro. — É um trabalho medíocre, — eu falo.
Seu queixo cai. — Medíocre? Eu trabalhei pra caramba aqui, e
parece ótimo.
— Como você saberia? Duvido que você já tenha passado um tempo
em um chiqueiro antes.
— Isso não significa que eu não sei o que parece bom. Este lugar
parece muito melhor.
Dou de ombros. — Tanto faz. Esteja de volta ao nascer do sol
amanhã para mais trabalho.
— É isso aí? — Ela corta. — Apenas um comentário de ‘estar de volta
ao nascer do sol’? Sem ‘trabalho bem feito’ ou ‘ótimo trabalho, Hazel’?
— Eu sinto muito. Não sabia que estava no pacote distribuir elogios
aos funcionários apenas por fazerem o seu trabalho. Se precisa de
aplausos para cada tarefa, você está no lugar errado. Agora, se você puder
se mover para que eu possa trancar este lugar e sair daqui…
Ela empurra a alça da bolsa mais para cima no ombro e caminha em
direção à porta da frente. — Oito horas.
— O quê?
Ela olha por cima do ombro para mim. — Oito horas. Durou oito
horas a mais do que você pensou que duraria. — Ela me dá um sorriso de
– foda-se – e eu juro que a garota quase fez uma reverência para mim da
forma mais sarcástica antes de ir embora.
Por que tenho a sensação de que aquela garota será um pé no saco?
3
HAZEL
Cada centímetro do meu corpo dói, e quando digo cada centímetro,
quero dizer cada centímetro maldito. Do topo da minha cabeça aos dedos
dos pés. Eu nem sabia que meus pés podiam doer até que trabalhei um
dia no rancho. No final da semana, tenho certeza de que meu corpo irá se
rebelar contra qualquer forma de movimento. Mas eu continuei
adormecendo por volta da meia-noite e acordando antes do nascer do sol
para caminhar até o rancho.
Ian também não está desistindo de mim. Tenho certeza de que ele
está determinado a me quebrar e, sinceramente, não sei o porquê. Não
pode ter sido tudo por causa do boquete, porque se for, isso faz de Ian o
homem mais mesquinho da história do mundo.
Mas estou convicta de que sua raiva e mau humor vem de um lugar
mais profundo do que isso. Eu só não tenho ideia de como descobrir de
onde. A verdade é que eu realmente não me importo em
descobrir. Contanto que eu faça meu trabalho bem feito, não tenho nada
com que me preocupar.
Ele não pode se livrar de mim se eu não mostrar nenhuma razão
para ele fazer isso.
Desde que comecei a trabalhar, mamãe fez as tarefas que eu
normalmente faço. A pia está empilhada com pratos, e a lavanderia cheia.
Há pontas de cigarro por toda a casa, jogadas ao redor como se os
humanos que lá vivem nunca tivessem ouvido falar de um cinzeiro, e latas
de cerveja vazias estão espalhadas em toda parte.
Mamãe senta no sofá assistindo TV. Ela adormeceu naquele sofá na
noite anterior, e eu não consigo deixar de pensar se ela havia saído
daquela posição desde então.
— Já era hora de você chegar em casa. — Ela comentou. — Charlie
disse que você precisa limpar este lugar antes que ele chegue em casa.
Um cigarro está entre seus lábios e isso faz meu estômago revirar. —
Mamãe, pensei que íamos trabalhar para você parar de fumar por causa
do bebê.
— Estou desistindo. Eu tenho diminuído. Não entre aqui me
julgando.
— Eu não estou julgando. Apenas certificando-me de que está
cuidando bem de si mesma. — O que ela não está, é claro. Mamãe fuma
um maço por dia. A redução dela não é muito provável.
— Estou. Além disso, fumei como uma chaminé grávida de você. E
você se saiu decente.
— Bem, obrigada, mamãe. — Digo, revirando os olhos. Arregaço as
mangas e vou até a cozinha para começar a trabalhar na louça. É estúpido
que eu seja responsável por limpar a casa mesmo quando eu não baguncei
tudo, mas não estou interessada em pegar o lado ruim de Charlie. Será
melhor se eu fizer as tarefas domésticas e mantiver minha boca
fechada. Cinderela tem duas irmãs e uma madrasta malvada; eu só tenho
um padrasto mau e uma mãe desinteressada. Poderia ser pior.
Depois que termino a louça, encho a máquina de lavar roupas e
volto para a cozinha. Abro a geladeira e percebo a falta de comida. Parece
que se eu não fosse às compras, isso não aconteceria. Tenho certeza de
que Charlie está comendo fora, mas mamãe mal sai de casa. Se não há
comida na geladeira, provavelmente ela não está comendo, o que é um
problema. Especialmente quando ela deveria estar comendo por dois.
— Mamãe, você jantou?
— Charlie disse que trará comida chinesa.
Olho para a hora no micro-ondas. Já passa das dez. Conhecendo
Charlie, ele pode ficar fora por horas. Quem sabe quando ele trará a
comida para a mamãe?
— Posso fazer um queijo grelhado para você, — ofereço.
Ela aceita e, quando termino, entro na sala de estar e me junto a ela
no sofá. Ela parece muito magra para quem está carregando um bebê. E
está com quase cinco meses, mas mal aparece. Mamãe sempre teve um
corpo pequeno, mas eu me preocupo que ela não esteja recebendo nutrição
suficiente durante o dia. Quando eu receber meu primeiro cheque, vou
garantir que a geladeira esteja no topo da minha lista.
— Terminou a limpeza? — Ela pergunta, mordendo seu sanduíche.
— Sim. Só tenho que colocar as roupas na secadora; então está tudo
pronto.
— Ótimo. Isso significa que podemos conversar agora, antes que
Charlie chegue em casa. — Ela coloca seu prato na mesa de centro e pega
minhas mãos nas dela. — Charlie e eu achamos que é melhor se você
seguir em frente.
Meu coração fica preso na garganta. — O quê?
— Ele disse que todas as suas coisas precisam estar prontas
hoje. Ele não gosta da sensação de que você está sempre julgando nosso
estilo de vida e não consegue cuidar da casa. Você está sempre correndo
para Deus sabe onde…
— Eu trabalho, mamãe.
— Parece uma desculpa para mim. De qualquer forma, você não
pode mais ficar aqui. Simplesmente não há espaço suficiente com o novo
bebê chegando e tudo. Arrume suas coisas e vá.
— Mas eu não tenho para onde ir, mamãe. — Ela realmente me
mandou limpar a casa inteira antes de me expulsar? É essa a mulher que
eu chamo de mãe?
Ela puxa outro cigarro e o acende. – Você tem mais de dezoito anos,
Hazel. É hora de você voar do ninho. Não vamos apoiá-la para
sempre. Então vá embora.
Quero discutir com ela e dizer como eu fiz mais por ela nos últimos
anos do que ela fez por mim. Eu quero gritar e berrar que, se alguém está
agindo como um fardo são eles. Eu quero chorar.
Puxa, como quero desmoronar. Minha mãe é tudo que tenho neste
mundo, e ela está me afastando sem uma fração de culpa ou remorso. Ela
volta a assistir à TV, soprando a fumaça por entre os lábios.
Quando Charlie entra pela porta da frente, meu estômago
embrulha. Foi bom eu ter feito um queijo grelhado para mamãe, porque
aquele homem não tinha comida chinesa nenhuma.
Seus olhos disparam de mamãe para mim e de volta para mamãe. —
Eu pensei ter dito para você tirá-la quando eu voltasse.
— Eu fiz. A menina é teimosa como o pai. — Mamãe deixa escapar,
soltando uma nuvem de fumaça. Ela quase nunca fala de meu pai. Eu
nem sei o nome dele, mas sempre que ela o menciona, é para insultálo. Eu realmente não posso apoiá-lo muito, visto que ele não significa nada
para mim.
— Não tenho para onde ir esta noite, — eu digo, levantando-me do
sofá.
— Mas você é osso duro de roer… quando eu tinha dezoito anos,
meus pais também me expulsaram. Isso se chama ser adulto. Se eu
consegui, você também pode. — Charlie ordena. — Cansei de você ser um
fardo e não contribuir com a casa. Tire suas coisas na próxima hora e siga
em frente. Tenho que transformar aquele quarto em um berçário.
— Já passa da meia-noite.
— Eu não dou à mínima, — Charlie responde enquanto acende um
cigarro. — Apenas saia.
Mamãe não diz uma palavra. Ela volta a assistir televisão como se
não tivesse participado do esmagamento da minha alma.
Engulo em seco e caminho em direção ao meu quarto. Não sei para
onde irei ou o que farei. Tudo que sei é que tenho sessenta minutos para
recompor minha vida e partir.
Há algo tão enervante em perceber que toda a sua vida cabe dentro
de dois sacos de lixo. Saio de casa sem qualquer despedida e luto contra
as lágrimas que estão queimando no fundo dos meus olhos.
Meu primeiro pensamento sobre os lugares para ir é o trailer de
Garrett – meu namorado intermitente. Ele também é sobrinho de Charlie e
seu braço direito nos negócios da família. O grande sonho de Garrett é
assumir o lugar de Charlie em algum momento. Ele idolatra seu tio, o que
é uma grande falha em minha mente. Não consigo imaginar por que
alguém iria querer ser como Charlie. Ele não é alguém para se admirar.
Meu relacionamento com Garrett acabou, devido ao fato de que ele
dormia com mulheres que não eram eu. E disse que a culpa foi minha,
porque eu não fazia sexo com ele, mas isso é uma idiotice. Jamais
entenderei como um traidor pode culpar outra coisa que não seja sua
infidelidade, mas, novamente, sou a idiota que volta uma e outra vez para
ele.
É incrível como a baixa autoestima pode fazer você cair nos braços
errados.
Quando me aproximo da casa de Garrett, me lembro de uma
característica que herdei de minha mãe: namorar idiotas.
— Você não pode ficar aqui, a menos que se ajoelhe, — diz Garrett,
soprando uma nuvem de fumaça de seu cigarro. Ele usa uma camisa
xadrez e shorts jeans que são grandes demais para seu corpo magro. Um
cinto velho e surrado os segura nos quadris.
— Não seja grosseiro, Garrett. Ouça, Charlie me expulsou. Preciso de
um lugar para dormir esta noite, pelo menos.
— Como eu disse, de joelhos, ou você pode encontrar outro lugar
para dormir.
— Você está brincando?
— Estou rindo?
Só então, uma garota se aproxima por trás dele e eu a reconheço
imediatamente. Megan Kilt – a mesma garota que Garrett disse ser apenas
uma amiga. Naquela época, eu sabia que não devia acreditar nele.
No momento em que Megan me vê, um sorriso malicioso cai em seus
lábios. — Bem, se não é a Barbie gótica, — ela murmura. — Sério, por que
você usa tanto delineador? É um exagero.
Mostro o dedo do meio para ela, e olho de volta para Garrett. —
Apenas me deixe dormir no seu sofá esta noite, e você pode fazer o que
quiser com a Barbie estúpida, — ofereço. — Vou até usar fones de ouvido.
— Desculpe, Hazel. Charlie me disse para não aceitar você. Disse
que você precisa aprender e se cuidar sozinha.
Não há nenhum ensinamento no que Charlie está fazendo comigo. É
cruel.
— Charlie não precisa saber.
— Charlie sabe de tudo. Até a merda que você acha que ele não
sabe.
Odeio que seja verdade. É como se Charlie tivesse olhos na nuca e
pudesse estar um passo à frente de tudo e de todos.
Garrett sopra outra baforada de fumaça e Megan coloca as mãos em
volta dos ombros dele, como se estivesse tentando deixar claro que ele
agora é seu brinquedo. Por mim tudo bem. Eu sempre soube que Garrett
não é para mim. Ele é apenas aquele que sempre estava lá.
Exceto quando eu mais preciso dele.
Garrett é o bad boy que os romances fazem você pensar que quer,
embora, ao contrário dos romances, ele não mudará. Não houve um
momento em que ele disse a coisa certa ou falou comigo de uma forma
poética que eu me apaixonasse mais por ele a cada dia. Ele não fez
sacrifícios pelo nosso relacionamento nem se rendeu ao nosso amor.
Ele era apenas Garrett, o garoto que estava lá quando nenhum outro
cara olhou na minha direção. Gostaria de poder ter dito que sou forte o
suficiente para desviar o olhar, mas às vezes a solidão faz você desejar
qualquer tipo de conexão – mesmo daqueles que sugam sua alma.
A única diferença entre ele e Charlie é o fato de que Garrett nunca
colocaria as mãos em mim. Ele é um idiota, mas não é fisicamente abusivo
como Charlie.
Ainda assim, isso não o torna alguém digno de ser adorado.
Às vezes, desejo que Garrett seja um personagem fictício.
Eu teria matado para ver seu crescimento.
— Hazel, antes de você ir, como está sua mãe? Com essa coisa de
gravidez? — Pergunta ele, apagando o cigarro. — Charlie a está tratando
bem? Se certificando de que ela esteja comendo?
Balanço minha cabeça. — Você sabe que Charlie só tem uma coisa
em mente. E não é minha mãe. Eu quem garanto que ela está sendo
cuidada, não ele. E de alguma forma ele conseguiu que ela me expulsasse.
Garrett puxa outro cigarro e acendeu-o. Eu juro, o cara fuma como
uma chaminé. — Vou verificar como ela está para você, para ter certeza de
que ela não está perdendo suas vitaminas e outras coisas.
Bem, isso é bom e extremamente diferente dele.
— Obrigada.
— Sim. Minha mãe provavelmente vai querer ter certeza de que ela
está bem também.
A mãe de Garrett, Sadie, tinha sido a melhor amiga de mamãe nas
coisas boas e ruins. Sadie não é uma pessoa má. Simplesmente, se
colocou em situações ruins.
Como muitas pessoas, eu imagino.
Garrett liga e desliga o isqueiro na sua mão livre. — Você deveria ir
embora, antes que Charlie encontre você aqui e isso nos deixe em apuros.
Eu parto, passando por adolescentes bagunceiros nas ruas e adultos
bebendo muito dentro do Carl’s Bar, devido à liberdade da noite de sextafeira.
Continuo caminhando, embora meus pés doam de tanto andar. Eu
não posso usar meus coturnos, visto que os tinha arruinado nos
chiqueiros, então estou usando sandálias estúpidas e desconfortáveis que
peguei da minha mãe sem ela saber.
Sem pensar muito, me vejo de volta ao rancho. Parece o único lugar
que posso pensar em ir. A casa do celeiro está iluminada com música
explodindo, provavelmente da banda de Ian, e na maior parte parece
incrível – sem as letras ruins.
Não me entenda mal; Ian sabe cantar. As letras são apenas um
monte de porcaria.
Atrás da casa do celeiro, através da área arborizada, há um pequeno
galpão abandonado que eu encontrei alguns dias atrás enquanto tentava
aliviar uma cãibra no meu quadril. Vou naquela direção e abro a porta.
Não há muito dentro, mas tem um tapete velho e surrado que
enrolo. Servirá bem como cama para a noite. — É como acampar, Hazel. É
como acampar, — digo a mim mesma. Há um grande buraco no telhado do
galpão que exibe o céu estrelado. Sempre que olho para o céu, me sinto em
paz. A galáxia faz com que eu me sinta pequena e, estranhamente, isso me
faz sentir melhor sobre as coisas. Quase como se houvesse tanto no
mundo que minha situação atual não é tão terrível. As coisas
mudarão. Tem que mudar em algum momento. A vida não é para ser tão
triste, e tenho certeza de que encontrarei o caminho para sair desta cidade
esquecida por Deus mais cedo ou mais tarde. Esperava que mamãe se
juntasse a mim, mas está claro que ela escolheu o lado dela e eu não estou
mais em seu time.
Coloco uma das sacolas com minhas roupas no tapete e uso-a como
travesseiro. Olho para o céu através do buraco e ouço os Wreckage criarem
sons que valem a pena ouvir. Posso odiar o vocalista deles, mas não é
mentira que, como um todo, seu som é de tirar o fôlego.
Agora, se apenas aquelas letras fossem melhores…
Fecho os olhos naquela noite ao som da voz de Ian Parker e tento o
meu melhor para não pensar em mais nada.
Amanhã será melhor e o sol nascerá novamente.
A história parece estar do meu lado, porque o sol nasceu na manhã
seguinte. Estou tendo dificuldade para me livrar do sentimento de traição
de mamãe, mas pelo menos tenho o trabalho para me manter
ocupada. Mesmo que eu devesse ter o dia de folga, ainda apareço para
trabalhar no rancho. Se eu estiver trabalhando, não poderei pensar na
minha atual situação de sem-teto. Quando você está limpando o estrume,
é difícil pensar em outra coisa senão no fato de que quer vomitar.
Além disso, agora que estou hospedada no galpão quebrado, não
preciso andar trinta minutos para ir e voltar do trabalho todas as noites.
— O que diabos você pensa que está fazendo? — Uma voz rouca ecoa
enquanto sento nos estábulos, escovando Dottie, o cavalo mais lindo que
eu já coloquei meus olhos. Dottie e eu tínhamos compartilhado uma maçã
não muito tempo atrás e, desde então, estamos engajadas em conversas de
garotas, porque minha vida está agora no estágio em que converso com
animais para me sentir menos sozinha.
Ótimo.
Sinceramente, os animais são muito mais gentis do que os
humanos, então conto minha amizade recente com Dottie como vitória.
— Pensei em vir ajudar hoje, — respondo ao Ian Rabugento
McGrump14 parado no batente da porta.
Eu me pergunto se ele sabe o que é um sorriso… com certeza ele tem
mais motivos para sorrir do que eu, e ainda assim, não encontra motivos
suficientes para isso.
14 Bichinho virtual muito rabugento.
— Você não está no cronograma. — Ele me repreende.
— Eu sei. Estava na vizinhança.
— Bem, saia da vizinhança.
— Por que isso importa? Os caras mal escovam Dottie e os outros da
maneira que deveriam ser escovados. No mínimo, você deve estar feliz por
eu estar ajudando.
Suas sobrancelhas se erguem. — Você não está sendo paga por isso.
— Sem problema. Eu sei como funcionam os empregos.
— É claro que não, porque aparecer para o referido trabalho no seu
dia de folga não é assim.
Paro de escovar Dottie e deixo minhas mãos caírem no meu colo
enquanto olho para Ian. — Por que você é tão mal-humorado comigo?
— Por que você faz coisas idiotas para me deixar mal-humorado? —
Ele retruca. Seu cabelo está selvagem e indomado, seus braços estão
cruzados firmemente em frente ao seu peitoril tonificado. Se seus bíceps
pudessem acenar, eles provavelmente se mexeriam.
— Apenas me ignore, — eu ofereço. — Não estou atrapalhando
ninguém e Dottie está gostando da minha companhia.
— Ela é um cavalo, não consegue desfrutar da companhia das
pessoas.
— É meio bobo pensar que só porque ela é um cavalo não tem
sentimentos. Quando foi a última vez que você perguntou a ela como ela
estava se sentindo?
— Pelo amor de… — Ele murmura, antes de passar a mão pelo
cabelo. — Você não pode ficar na propriedade enquanto não estiver
trabalhando. Isso é chamado de invasão. É contra a lei.
— O quê? Você vai ligar para o xerife Cole para vir me prender por
escovar Dottie?
— Não me teste, Hazel. — Diz ele com os dentes cerrados. — Está
tentando me irritar ou isso é natural para você?
— Como respirar.
Ele resmunga um pouco mais e passa o polegar sob o olho
esquerdo. — Se eu ouvir sobre você atrapalhar alguém, você está fora. E
não me refiro apenas para hoje, quero dizer para
fora, fora. Rua. Entendeu?
— Ouço você bem alto e claro, treinador.
— E pare com o sarcasmo.
— Isso vem naturalmente, como respirar também.
Antes que ele possa latir seu aborrecimento para mim, uma mulher
entra nos estábulos e olha para Ian. — Você está pronto para ir,
Ian? Tenho uma pausa para o almoço… você sabe. — Ela olha para mim e
desvia o olhar, ficando com o rosto um pouco vermelho.
Oh, acredite em mim, querida, todos nós sabemos.
Se eu tivesse um dólar para cada mulher que vi se aproximando de
Ian nos últimos dias, nem teria que trabalhar mais no rancho. E estaria
rica no nível de Kylie Jenner15. Eu provavelmente poderia ter feito uma
paleta de maquiagem inteira baseada nas cores dos olhos das mulheres
que cruzaram seu caminho e foram a seu escritório.
Verde esmeralda. Azul da meia noite. Sombras negras.
Ian olha para mim como se quisesse me repreender um pouco mais,
mas seu desejo de foder aquela garota é maior do que sua vontade de
mandar em mim. Fico satisfeita quando ele me deixa sozinha. Dottie e eu
temos coisas mais para colocar em dia.
15 É empresária e personalidade da mídia norte-americana. É a irmã mais nova da família
Kardashian-Jenner.
4
IAN
— Ela é uma dor na minha bunda, — reclamo para Big Paw após
algumas semanas do treinamento de Hazel. Dia após dia, aquela garota
continua aparecendo com seu guarda-roupa preto e botas de combate,
pronta para trabalhar. Não importa a tarefa que eu dê, ela sempre
completa. Às vezes, fica até tarde da noite para terminar, mas sempre
deixa seu trabalho concluído, não me dando nenhum motivo para despedila. Mesmo que eu realmente quisesse um motivo maldito para deixá-la ir.
Além disso, em seus dias de folga, ela ainda está à espreita. É como
se não tivesse vida fora do rancho. Seu passatempo favorito é conversar
com os cavalos como se algum dia eles respondessem de volta. Conheço
Dottie bem o suficiente para saber que ela não liga para o que Hazel está
dizendo – ela só quer aquelas malditas maçãs.
Todos os outros caras no rancho parecem estar bem e confortáveis
com Hazel vagando como um cachorro perdido. James disse que ela não
atrapalha e até foi útil quando ele precisou de um par extra de
mãos. Marcus e Eric a acharam igualmente útil, e eu juro que o Velho
Eddie beijou a bochecha de Hazel quando ela se ofereceu para ajudá-lo no
galinheiro.
Parece que sou o único idiota que não a quer por perto, e sei muito
bem que é por causa dos meus problemas pessoais e sua conexão com
Charlie.
Ver Hazel todos os dias me lembra de Charlie, e pensar em Charlie
me lembra de meus pais. Tento o meu melhor para não pensar
neles. Esforço-me muito para mantê-los enterrados no fundo da minha
mente, mas ver Hazel torna isso quase impossível.
Não conheço a garota, mas o gosto que ela deixa na minha boca me
enjoa. Se ela está conectada a uma cobra como Charlie, nada de bom pode
vir de seu trabalho no rancho. Ela veio de um mundo tóxico.
— E você é uma dor na minha, — responde Big Paw, sentado em sua
mesa em casa. Ele coça a barba crescida que vovó está tentando fazer que
ele raspe e boceja sem cobrir a boca. — Ela tem trabalhado mais do que
metade dos estúpidos lá fora. Cada vez que passo pelo rancho, eu a vejo
trabalhando duro, lutando às vezes, claro, mas trabalhando. Ao contrário
de metade da sua equipe, que acho relaxando e não fazendo nada.
— Sim, mas… — Eu gemo, sabendo que não tenho argumentos,
mesmo assim querendo a porra de um. — Você sabia que ela é enteada de
Charlie?
— Você acha que eu não pesquiso meus funcionários antes de
contratá-los? Claro que eu sabia disso.
— E você ainda a trouxe? — Pergunto, pasmo. — Sabe que Charlie é
a razão de mamãe e papai…
— Não comece garoto, — diz Big Paw com desdém, com sua voz
revestida de aborrecimento. Ele sacode o dedo contra seu nariz. — Não
tenho tempo para você tocar nesse assunto. Hazel Stone está trabalhando
no rancho e você supervisionará o trabalho dela. Fim da história.
— Mas…
— Eu disse fim da história!
Como ele pôde esquecer isso tão rápido? Se não fosse por Charlie,
mamãe e papai nunca teriam ficado viciados em metanfetamina todos
aqueles anos atrás. Não teriam fugido em uma névoa de drogas,
perseguindo sua próxima dose. Eles ainda seriam os pais de que eu
precisava em minha vida.
Então, foda-se Charlie e foda-se todos que estão ligados a ele. Ele
arruinou vidas – incluindo a minha.
Desejo não ter conhecido meus pais antes das drogas entrarem em
suas vidas. Eu gostaria de não ter visto seu lado bom, mas vi por treze
anos da minha vida. Tenho uma série de memórias em meu cérebro que
me lembram de como minha mãe era antes da metanfetamina. Lembro-me
de como ela adorava ajudar a vovó no jardim. Lembro-me de sua risada,
seu perfume com aroma de rosas, seu sorriso. Durante o verão, papai me
deixava ir até o depósito de lixo e usar a empilhadeira lá fora para ajudá-lo
a mover automóveis quebrados.
A pior parte de ter pais que desenvolveram o hábito de drogas ao
longo do tempo é lembrar que nem sempre foram tão fodidos. Se eles desde
o início tivessem sido pessoas ruins, eu teria tido mais facilidade quando
eles partiram.
— Você deveria pensar em deixá-la ir. Ou pelo menos ter alguém
cuidando dela, —ofereço. Isso teria tornado tudo menos irritante para
mim, se eu não tivesse que cuidar de Hazel.
— Não posso deixá-la ir. Devo a alguém próximo a ela essa
oportunidade.
— Quem? A quem você possivelmente deve?
Suas sobrancelhas franzem e ele evita minha pergunta. — Quanto
você está pagando pelo aluguel da propriedade no rancho? — Ele diz, sua
pergunta carregada, e eu sei exatamente que armadilha ele está
preparando.
— Big Paw…
— Pergunta fácil, garoto. Agora responda.
Afundo na minha cadeira. — Nada.
— Estava conversando com Tyler no mercado outro dia, e ele me
disse que aquela casa vale facilmente mais de duzentos mil. E me
perguntou se está à venda. Estou debatendo se devo aceitar a oferta.
— Tudo bem, eu já entendi.
— Eu não acho que você entenda. — Ele junta as mãos. — Poderia
estar ganhando dinheiro com aquela casa, mas não ganho porque você é
meu neto e sei que você não seria capaz de encontrar um bom lugar
sozinho sem ajuda. Empresto a casa do celeiro para você e seus colegas de
banda ensaiarem, embora eu pudesse lucrar alugando-a para outras
pessoas. Em uma cidade onde tantas pessoas estão lutando, você está
vivendo como um maldito rei e tem a coragem de entrar no meu escritório
choramingando como um bebê porque não gosta de uma garota que
trabalha mais do que a maioria das pessoas? Bem, amigo, se você quiser
que ela tenha um novo treinador, desista. Mas Deus sabe que você perderá
tudo o que vem com sua vida confortável.
Eu não digo mais nada, porque Big Paw está certo. Estou sendo um
pouco idiota e tendo um ataque porque não consigo o que quero.
— Você teve uma boa chance de viver, Ian. Algumas coisas ruins
aconteceram com você com a partida de seus pais, mas, no geral, você
recebeu bênçãos pelas quais a maioria das pessoas na cidade mataria. Não
deixe seu ego ficar tão grande a ponto de achar que os outros não
merecem uma chance, a mesma bênção. Hazel não fez nada para
provar que é parecida com Charlie. Ela simplesmente recebeu essa
merda. Deixe-a jogar suas cartas o melhor que puder e pare de ser um
idiota chorão sobre isso.
Confie a Big Paw para ajudá-lo a perceber que você e sua opinião
idiota são inválidos e nulos.
— Pensando bem, tenho uma ideia ainda melhor, — diz ele,
recostando-se na cadeira. — Aquele quarto vago na casa do rancho, dê
para Hazel.
Engasgo com minha próxima respiração. — O quê?
— Tenho a sensação de que ela precisa de um lugar para ficar.
— O que te faz pensar isso?
— O fato de que eu a peguei cochilando naquele galpão quebrado
nas últimas noites. Tenho dormido na minha caminhonete para ter certeza
de que ninguém a incomode. Eu sei que alguns bandidos entram
sorrateiramente no rancho quando eles estão entediados e causam
tumulto, e não queria que eles incomodassem Hazel. Eu queria oferecer a
ela um lugar para ficar, mas tenho a sensação de que ela ficaria com
vergonha de admitir que precisa, então quero que você ofereça a ela.
— Psh, sim, certo. Ela nunca aceitaria uma esmola de mim.
— Ela faria se você oferecesse a ela em uma bela caixa com um laço
chique no topo.
— Como vou fazer isso?
— Eu não sei, Ian. Seja criativo.
Estreito meus olhos, sabendo que meu avô está me preparando para
tornar impossível não oferecer a Hazel o quarto. — E se eu não fizer?
— Bem, — ele mastiga a ponta do charuto como se fosse chiclete —
Acho que terei que ver quanto Tyler está disposto a oferecer pela casa.
Imaginei.
Coço a ligeira barba por fazer no meu queixo e faço uma careta. —
Por que ela está dormindo naquele galpão?
— Não sei. Não é da minha conta, mas tenho a sensação de que
provavelmente se deve ao mesmo idiota pelo qual você a odeia. Faça
amizade com ela.
— Amizade? — Eu grito. — Ela e eu não temos nada em comum.
— Não diga “não” como se você não tivesse educação. Essa é a
segunda parte do negócio. Dê a ela um lugar para ficar e faça-a se sentir
bem-vinda. Faça amizade com ela. Ela não tem ninguém, então você pode
muito bem dar a ela alguém para recorrer quando precisar.
Eu teria o dissuadido disso, mas sei que nada de bom virá. A última
coisa que preciso é um homem de oitenta anos chutando minha bunda.
Ser amigo de Hazel Stone?
Eu não sei nada sobre ser amigo de uma garota como ela. Não temos
nada em comum fora o fato de que ambos trabalhamos no rancho. Como
farei uma conexão com alguém que é completamente o oposto de mim?
Além disso, eu não estou realmente procurando um colega de
quarto, muito menos um amigo. Os únicos amigos que preciso são meus
companheiros de banda, e às vezes isso parece opressor.
Passo minhas mãos por meu cabelo, sabendo que não haverá
nenhuma maneira de ser capaz de fazer Paw desistir. Quando ele se
decide, não há como mudar, a menos que vovó for quem insistir pela
mudança.
Faço uma careta. — Vou fazer o meu melhor.
— Faça melhor do que isso. — Ele ordena. — Deve chover em alguns
dias, e não preciso de nenhuma garota morrendo de pneumonia na minha
fazenda.
Antes que eu possa responder, vovó enfia a cabeça no escritório. Ela
está usando luvas de forno nas mãos e tem sempre o mesmo sorriso
carinhoso estampado no rosto. — Vocês já terminaram de ser cabeçasduras? Porque o jantar está pronto e eu não tenho dificuldade em comê-lo
sem vocês.
— Mulher, você não vê que estamos conversando aqui? — Big Paw
sibila, jogando uma mão de dispensa para vovó. Isso só fez vovó caminhar
mais para dentro da sala.
— Harry Aaron Parker, se você falar assim comigo de novo, vou
enfiar essa luva de forno tão longe no seu traseiro que você vai se
perguntar por que sua boca tem gosto de cocô. Agora, peça desculpas, —
ela ordena. Minha avó é uma mulher pequena o que não a faz menos
feroz. Ela não aceita merda de ninguém, especialmente de Big Paw.
E como sempre, Big Paw abaixa a cabeça e coloca o rabo entre as
pernas. — Desculpe.
— Desculpe o quê? — Vovó repreende.
— Desculpe, lovebug16.
Tento segurar minha risada com o apelido. Deixe que a vovó amoleça
o coração do velho. Os dois são atrevidos e intensos e cheios de muito
amor. Se algum dia eu encontrar tempo para me apaixonar, gostaria de ter
uma história de amor como a deles.
16 Amorzinho.
— Isso foi o que eu pensei, — diz vovó, caminhando até Big Paw. E
dá um tapa na nuca dele com a luva. — Agora, vá para a sala de jantar
antes que eu mude de ideia e leve o jantar para a igreja para o estudo da
Bíblia esta noite.
Isso nos faz ficar de pé. Minha qualificação na cozinha é em
esquentar comida congelada, e muito mal às vezes. Até torro o pão de
hambúrguer, mas isso foi o fim da minha experiência culinária. Isso e
miojo. Eu posso fazer um prato foda de miojo. Sabor frango – obviamente.
Fora isso, conto com as sobras da vovó. Ela é muito boa em me
manter saciado.
Enquanto caminhamos para a cozinha, vovó reclama do piso de
madeira que range. — Precisamos chamar alguém para consertar isso. —
Ela resmunga.
— Calma, mulher. Vou chamar quando tiver a chance, — diz Big
Paw.
— Você tem dito isso desde 1995. Não estou vendo você dar jeito.
— Talvez se eu desse um jeito, você não seria capaz de ser tão
atrevida, — ele responde.
Ela lança um olhar que poderia matar, e Paw sorri um pouco. É
preciso muito para fazer aquele homem sorrir, e a avó sempre consegue. —
Desculpe, lovebug.
— Você ficará ainda mais triste no sofá esta noite. — Ela diz em
resposta.
Eu não posso deixar de rir da conversa dramática dos meus avós. O
amor verdadeiro é engraçado, e adoro que meus avós não levem seus
insultos muito a sério.
Depois de encher minha barriga na casa dos meus avós, vou para
minha casa com sobras suficientes para me sustentar nos próximos dias.
Graças a Deus por isso.
Sem miojo esta semana.
Quando chego em casa no terreno do rancho, um enorme nó se
forma em minhas entranhas. O galpão em que Hazel está aparentemente
ficando é um depósito de lixo. Inseguro também. Deixe que ela faça algo
tão idiota.
Pare de ser um idiota. Você nem conhece a garota.
Eu não consigo me livrar do fato de que ela está conectada a Charlie,
embora saiba que Big Paw está certo. Então vou em frente e engulo meu
orgulho, paro no galpão e bato na porta.
Ouço alguém se mexendo por um minuto antes de ficar em
silêncio. Levanto uma sobrancelha. — Olá? — Eu grito. Mais movimento
silencioso. Bato na porta. — Abra, Stone. Eu sei que você está aí.
Mais silêncio. Menos movimento.
Um suspiro pesado passa por mim quando abro a porta e vejo Hazel
sentada contra o canto do galpão com aqueles olhos verdes arregalados
dela. A sensação que tenho é de que ela pensa que irei atacá-la, o que é
mais uma razão para ela não ficar no maldito galpão. Tem sorte de ser eu
andando atrás dela, ao invés de algum bêbado da cidade cruzando seu
caminho.
— O…o que você está fazendo aqui? — Hazel pergunta, com sua voz
trêmula.
— O que eu estou fazendo aqui? — Aponto a luz do meu telefone em
sua direção. — Não. O que diabos você está fazendo aqui?
Ela se levanta e pisca os olhos algumas vezes. Não tenho ideia do
que ela fez, mas seu cabelo está molhado, como se ela tivesse acabado de
tomar um banho. Algumas de suas peças de roupa estão penduradas nas
prateleiras, incluindo sua calcinha de algodão, que tem unicórnios
estampados nela. Ela corre, pega a calcinha da prateleira e a empurra
para trás.
— Você está morando aqui?
— Não! — Ela responde rapidamente.
Levanto uma sobrancelha. — Você está morando aqui, — repito,
desta vez como uma declaração.
Ela suspira. — Apenas temporariamente.
— Você não pode viver neste galpão.
— Por que não? — Ela pergunta. — Não é como se alguém estivesse
usando.
Eu gemo. — Essa não é a questão. A questão é que você não pode
viver em um maldito galpão como um animal. Falta metade do telhado,
Hazel!
— Gosto de olhar para as estrelas.
— Venta muito à noite.
— Eu gosto da brisa.
— Você é sempre tão teimosa?
— Você é sempre tão mandão? — Ela responde, e puta merda, eu
não posso imaginar viver com alguém tão chato quanto aquela garota.
— Só sou mandão com pessoas que agem como crianças.
— Não estou agindo como uma criança. Estou agindo como uma
pessoa que precisa de um lugar para ficar por um tempo.
— Sim, bem, você não pode morar aqui. — Digo com
naturalidade. — Isto não é uma casa. É um galpão quebrado. Em
propriedade privada, devo lembrá-la. Você não pode viver aqui.
Por uma fração de segundo, o exterior duro de Hazel racha, e vejo
um flash de preocupação correndo por ela. A casca dura que ela usa no
dia a dia é para protegê-la de se machucar, e naquela fração de segundo,
vejo suas verdades escaparem por seus olhos.
Merda. Talvez tenhamos mais em comum do que eu pensava.
Minha casca dura é feita do mesmo material.
— Você vai ficar na minha casa, — eu digo com uma voz
severa. Cruzo meus braços e balanço a cabeça uma vez. — Pode ficar com
o quarto vago.
— De jeito nenhum vou morar com você! — Ela engasga, surpresa
que estou mesmo oferecendo a ela uma saída do galpão.
— Inferno, sim, pode. O que não pode é ficar aqui, Hazel. É estúpido
e não é seguro. Eu tenho um quarto livre. Venha.
— Não preciso da sua esmola.
— Diz a garota que vive literalmente em um galpão.
— Odeio quando as pessoas dizem a palavra literalmente. É uma
palavra estúpida que as pessoas usam quando não conseguem encontrar
uma frase melhor.
— Literalmente, literalmente, literalmente, — eu solto. E faço um
gesto em direção a seus sacos de lixo com coisas. — Pegue sua calcinha de
unicórnio e vamos embora.
— Eu sei que você provavelmente está acostumado com as mulheres
largando tudo para ceder às suas demandas, mas eu não sou uma dessas
garotas. Eu disse não e quis dizer não. Não vou aceitar uma esmola sua,
não quero ou preciso da sua ajuda.
O que diabos está acontecendo com essa garota? Ela está recebendo
uma oferta de um lugar para ficar de graça e recusando por causa de seu
maldito orgulho? Como eu devo fazer o que Big Paw quer se ela não está
disposta a ceder um centímetro? Nunca conheci uma mulher tão teimosa
em minha vida.
— Você sabe o que? Dane-se. Bem. Fique aqui fora com seus
rastejadores e roedores. Eu não vou perder meu tempo com alguém que
está optando por sofrer. Fique por aqui.
5
HAZEL
Ian sai bufando, xingando baixinho enquanto fecha a porta do
galpão. Todo o espaço treme e engulo o nó que se forma na minha
garganta.
Caramba. Esse homem com certeza sabe como me deixar
inquieta. Estou tão confusa com toda a interação entre nós. É como se ele
ainda fosse rude e mal-humorado, mas também… legal? Oferecer a alguém
um lugar para ficar parece bom, mas eu não posso deixar de pensar que
vem com alguma coisa. E jurei nunca tirar algo de um homem. Dessa
forma, ele nunca será capaz de jogar na minha cara. Durante anos,
observei Charlie lançar o fato de que mamãe e eu morávamos em sua
casa. Comíamos sua comida. Dormíamos em suas camas. Nada que
tínhamos era nosso, e odeio como ele usava isso contra nós, fazendo
parecer que não valíamos nada sem ele.
De agora em diante, seja o que for que eu tenha, ficarei sozinha.
Bem, exceto pelo galpão onde estou temporariamente. Terei que
pagar Big Paw de alguma forma pelo tempo que passo em Betsy.
Sim. Isso está mesmo. Eu nomeei o galpão com o nome de Betsy. E
cara, se essas paredes pudessem falar, aposto que elas teriam um monte
de histórias para contar.
Cristo. Sinto-me tão sozinha que não só estou fazendo amizade com
cavalos, mas também com objetos.
Preciso parar de ser tão solitária o mais rápido possível.
Nem sempre fui assim – sozinha. Quando eu era mais jovem, tive
uma melhor amiga chamada Riley – não um cavalo ou um galpão. Uma
pessoa que vive e respira. Riley era filha de um dos clientes de Charlie. Às
vezes, eles vinham até a casa para tratar de negócios e os adultos nos
expulsavam para o quintal para nos tirar de perto. Alguns dias, Riley e eu
fingíamos que éramos bruxas e criamos poções mágicas para nos levar a
mundos mágicos. Outras vezes, fingíamos que éramos uma banda só de
garotas, inventávamos nossas próprias letras e cantávamos para os
esquilos.
Riley foi tão boa para mim. Ela era minha melhor amiga e a primeira
pessoa a me fazer sentir como se pertencesse a Eres. Quando seu pai
finalmente ficou limpo e se mudou, Riley me escreveu por um tempo, mas
as cartas começaram a ficar cada vez mais curtas até que pararam
completamente. Suponho que ela tenha encontrado um mundo fora de
Eres, e não posso culpá-la por isso. Depois que eu partir, não planejo
olhar para trás também.
Uma em um milhão.
Isso é o que a amizade de Riley era para mim. Eu nunca tive essa
conexão com ninguém, e partiu meu coração pensar que uma amizade
como a dela é o tipo de situação uma em um milhão.
Tenho certeza de que nunca encontrarei esse nível de conexão com
outro ser humano novamente – além de Garrett. Mas sendo honesta, o que
Garrett e eu tínhamos não é uma amizade. Claro, nós namoramos por um
tempo, mas não conversamos sobre as coisas. Nós basicamente apenas
nos beijávamos e eu o observava ficar chapado e jogar videogame por
horas. Nada para escrever uma história de amor.
Então isso me deixa falando com as paredes e esperando que a
madeira seja grossa o suficiente para conter todos os meus segredos.
Quando acordo na manhã seguinte, saio do galpão e encontro uma
cesta cheia de algumas guloseimas. Garrafas de água, uma escova e pasta
de dentes, uma caixa de cereal frio e um pequeno jarro de leite com um
copo e uma tigela. Ao lado dele um colchão de ar duplo com um conjunto
de lençóis e um edredom.
Há também uma nota que diz:
Se você quer ser teimosa, então seja teimosa.
Mas não durma naquele maldito chão sem cama.
Ian
PS: Pare de ser idiota e vá para a porra do quarto de hóspedes.
Nunca, em um milhão de anos, pensei que seria Ian Parker quem me
salvaria durante alguns dos dias mais difíceis da minha vida.
Tenho um pouco de tempo livre antes de ir para os estábulos
naquela manhã. Sento-me de pernas cruzadas na cama inflável comendo
uma tigela de cereal frio enquanto escrevo em meu diário. Escrevo todos os
dias da minha vida desde os oito anos de idade. Eu costumava escrever
feitiços e outras coisas estúpidas de crianças nos livros com Riley, mas
com o tempo isso se tornou uma coleção de coisas em minha
mente. Poesia e prosa. Minhas esperanças, desejos e sonhos estão todos
em um só lugar.
Um dos meus maiores sonhos é entrar na faculdade. É meu sonho
alcançar uma vida completamente oposta àquela em que fui criada, e a
faculdade parece o primeiro passo para esse futuro. Farei tudo ao meu
alcance para tornar esse sonho realidade também.
Não quero me tornar minha mãe. Eu não posso me tornar minha mãe.
Eu não quero me transformar na pessoa que minha mãe se
tornou. Quero mais. Anseio tanto partir que meus ossos doem com a ideia
de ficar em Eres para sempre. Se eu ficar, há uma chance de acabar tão
triste e deprimida quanto ela, em um relacionamento com um homem que
não tem nenhum respeito ou amor por mim, perdendo cada chance de vida
que surgir no meu caminho.
Enquanto escrevo em meu diário, penso em Ian. O menino malhumorado que me deu uma cama. Não posso deixar de me perguntar o
motivo ou por que ele está me ajudando. Sinceramente, fico um pouco
surpresa por ele não ter me chutado para fora do galpão e me despedido
na hora quando me encontrou lá. Sei que ele está procurando uma razão
para me despedir, e a invasão parece um bom motivo para me mandar
embora.
Durante o dia no trabalho, Ian não me provoca como costuma
fazer. Ele não me pressiona para me esforçar mais do que os outros e não
me repreende por um trabalho medíocre. Qual é o problema dele? Por que
ele não está me tratando do jeito que fez nas últimas semanas? Ian Parker
não sair do meu caminho me fez me sentir péssima, mas agora, se eu não
o conhecesse melhor, parece que ele está sendo… agradável. Não, não é
possível. Isso seria ridículo. Mas ele está muito mais amansado do que o
normal. Isso me deixa satisfeita e desconfortável. É um sinal de alerta
quando alguém passa de frio para quente tão rapidamente.
Tento o meu melhor para não pensar demais nisso, embora seja tão
óbvio que uma mudança ocorreu.
Naquela noite, no colchão inflável, adormeço depois de passar horas
olhando para as estrelas, e minhas costas não me odeiam pela manhã.
No dia seguinte, acordo com o som de marteladas do lado de fora do
galpão.
Corro para fora e encontro Ian parado no topo de uma escada,
colocando pranchas de madeira no telhado para cobrir o buraco gigante.
— O que você está fazendo? — Pergunto, confusa por ele consertar o
telhado e um pouco atordoada pelo fato de que ele está sem camisa. Seu
corpo é esculpido pelos deuses, e vê-lo sem camisa faz arrepiar minha
pele, embora eu não o ache nem um pouco atraente.
Não, de jeito nenhum.
Ian Parker é muito feio.
As mentiras que dizemos a nós mesmos para não sermos provocadas
por homens que deveríamos odiar.
— O que parece? Estou consertando o telhado.
— Você não tem que fazer isso por mim.
— Quem disse que estou fazendo isso por você? Estou no comando
deste rancho e é meu trabalho fazer as tarefas, — diz ele com o suor
escorrendo pelo peito e, oh, Senhor, como ver um homem suar me deixa
excitada instantaneamente?
Estive solteira a maior parte da minha vida, exceto meu
relacionamento mundano e livre de paixão com Garrett, e obviamente
ultrapassei o prazo em que você fica excitada por coisas extremamente
estranhas, como homens suados. Qual será a próxima? Ian irá lamber
uma casquinha de sorvete e eu gemerei enquanto observo?
Relaxem, hormônios. Em breve assistiremos a um filme de Chris
Hemsworth17 e colocaremos todos esses sentimentos para fora.
Ian continua fazendo coisas assim. Consertando o galpão. Movendo
coisas. Deixando comida e suprimentos do lado de fora da porta. Eu não
consigo acompanhá-lo me ajudando, e toda vez que o repreendo sobre isso,
ele deixa claro como o dia que não está fazendo isso para me ajudar em
nada. Sempre que tenho vontade de agradecer a ele, diz algo malicioso e
rude, o que transforma meu agradecimento em um foda-se.
Estar perto de Ian é uma coisa estranha. Nunca conheci um
indivíduo que seja quente e frio, tudo em dois minutos. Ele está
confundindo o meu cérebro, e eu me sinto como se estivesse em um ritmo
acelerado tentando acompanhar suas mudanças de humor.
Quando chega o dia do pagamento, sei exatamente para onde vai a
primeira parte do meu cheque.
— O que é isso? — Ian pergunta quando entrego a ele cem dólares.
— Dinheiro.
Ele resmunga e revira os olhos. — Sei que é dinheiro, mas por que
você está dando para mim?
17 Ator de nacionalidade australiana, que faz o personagem Thor, da franquia Marvel.
— É pelas coisas que você está deixando fora do galpão para
mim. Não aceito esmolas e quero pagar por tudo isso. Não tenho certeza de
quanto custou o colchão inflável, então se precisar de mais, me avise.
— Eu não dei a você na esperança de ser receber de volta. Achei que
você não tinha o suficiente para comprar essas coisas, vendo como você
estava dormindo naquele tapete surrado.
— Bem, agora que recebi meu salário, posso lhe dar o dinheiro por
ele.
— Eu não quero seu dinheiro.
— E eu não queria sua ajuda, mas aqui estamos.
Ele belisca a ponte do nariz. — Por que você não pode receber ajuda
de ninguém?
— Porque eu sei como eles podem jogar na sua cara no final.
— Você honestamente se feriu tanto assim?
Engulo em seco, e meu silêncio é sua resposta.
Ele estreita os olhos e olha para mim – quero dizer, realmente olha
para mim. Ele olha como se estivesse tentando descobrir meus segredos, e
eu olho para ele da mesma maneira, como se pudesse tocar nas palavras
que Ian frequentemente sente e nunca exibe. Ele pode ser um homem
rabugento, mas aquela raiva veio de alguma fonte, e eu não posso deixar
de me perguntar de onde exatamente. Que raiz de lutas anteriores
alimenta sua aversão? Quem ou o que o tornara assim?
E por que diabos as mulheres são atraídas por ele?
Não me imagino ser íntima de alguém tão frio quanto Ian. Não pode
haver nenhum bom coração em suas interações – ele não parece o tipo que
se entrega muito a alguém.
Então, novamente, ser íntima dele significará que estará sem
camisa, e isso não é uma ideia tão terrível para mim.
— Escute, deve chover nos próximos dias. Você não pode ficar nesse
galpão de merda. Mesmo comigo consertando o telhado, ainda não está
seguro. Tudo o que você possui ficará arruinado e provavelmente ficará
doente de verdade. Pegue o quarto na minha casa. Vou até ficar em outro
lugar, se ficar desconfortável comigo estando lá.
— Por que você quer que eu fique com você? É claro que você não
me suporta.
— Também está claro que você passou por situações difíceis. Se
precisa de um lugar para dormir, a porta está aberta para você.
— Não, obrigada.
Ele solta um suspiro pesado e balança a cabeça. — Você é tão
teimosa. Não é seguro por aqui à noite, certo? Só porque vivemos em uma
cidade pequena, não significa que não haja gente má por aí. Eu peguei
muitos vagando pelo terreno no passado.
— Está bem. Posso me proteger.
Ele bufa como se não acreditasse em mim. — O que você quiser,
querida.
Querida.
Maneira de me fazer vomitar.
Ele começa a se afastar e diz: — Mas aposto que tomar banho com a
mangueira de água fora dos estábulos não é a sensação mais agradável.
Tomo banho com aquela mangueira de água muito cedo, e a ideia de
que Ian viu faz meu estômago revirar. — Como você sabe que eu estou
tomando banho com a mangueira?
— Porque é isso que eu teria feito.
Ele me deixa ali em campo aberto com um milhão de pensamentos
que quero decifrar. Em vez de perder mais tempo tentando entender a
mente de Ian, vou trabalhar. Graças a Deus pelo árduo trabalho no
rancho. Isso não me dá tempo para pensar.
É apenas um vira-lata; é apenas um vira-lata.
Essas são as palavras que repito para mim mesma enquanto ouço
um farfalhar do lado de fora do galpão.
Ou talvez seja uma galinha que saiu do galinheiro. Ou uma vaca
vagando por aí. Talvez Dottie esteja aqui para uma conversa de garotas.
Ou talvez seja um assassino em massa psicótico que está aqui para
me esfolar viva e fazer um ensopado com partes do meu corpo.
É engraçado como durante o dia os lugares parecem os mais seguros
do mundo, mas então, quando o sol se põe e as sombras da noite tomam
conta, tudo se torna horrível.
Puxo meu edredom até meu peito enquanto a chuva martela contra
o galpão e a água vaza para dentro por uma variedade de buracos que Ian
não conseguiu cobrir. Na maior parte do tempo, consigo ficar seca, graças
a ele me ignorar quando disse que não precisava consertar o telhado.
Nota para mim mesma: agradecer a Ian por não me ouvir.
Ouço mais movimentos lá fora, e entro em pânico quando o som de
vozes se torna audível acima da chuva forte. Têm pessoas lá fora. Pessoas
conversando no galpão, perto de mim.
— Há boatos de que há uma garota dormindo aqui, — uma voz diz,
me forçando a levantar. Então há uma batida de punho contra o galpão.
Olho ao redor por algo que eu possa usar para me
proteger. Qualquer coisa para espantar quem está do lado de fora da
minha porta. Pego uma lanterna que Ian deixou há alguns dias e seguro
com força em minhas mãos. Eu não tenho certeza se cegarei as pessoas
até a morte ou baterei nelas na cabeça. Tudo que sei é que a única coisa
que atualmente me protege é aquela lanterna de metal.
Nota para mim mesma: agradecer a Ian pela lanterna.
— Vamos chamar os outros para checar, — diz um deles.
Espero alguns segundos e ouço eles se afastarem. No momento em
que penso que eles devem ter partido, abro a porta, corro para fora do
espaço e acelero como Dottie pelo campo direto para a casa de Ian. Toco a
campainha repetidamente, tremendo com a chuva e meus nervos malditos
enquanto olho por cima dos ombros em pânico de novo e de novo, com
medo de que alguém tenha me seguido.
Começo a bater contra sua porta enquanto meu coração sobe para
minha garganta. E tento o meu melhor para engolir, mas minha mente
está girando muito rápido.
Toc. Toc. Toc.
Abra a maldita porta, Ian!
No momento em que ela se abre, solto um suspiro de alívio e corro
para o espaço sem um convite. — Ok, você venceu. Vou ficar com o quarto
de hóspedes. — Digo, com minha voz trêmula quando começo a andar em
sua sala de estar. Dele… sala de estar muito bem decorada. Muito bem
decorada e aconchegante.
Calor.
Oh, Deus, isso é tão bom.
— Uh, posso ajudá-la? — Uma voz pergunta. Eu finalmente me viro
para ver a pessoa que abriu a porta, e definitivamente não é Ian. É uma
mulher vestindo suas roupas, no entanto. Pelo menos presumo que sejam
suas roupas. Fora isso, ela está usando roupas cinquenta vezes maiores
do que seu corpo. Eu não deveria ter assumido, no entanto. Acho que faço
a mesma coisa.
— Oh, desculpe. Eu pensei… — Franzo meu nariz e esfrego minha
testa. — Ian está?
— O que está acontecendo aqui? — Uma voz profunda pergunta,
fazendo-me virar a cabeça em direção ao corredor. Lá está ele em toda a
sua glória. Uma toalha enrolada em sua cintura, seu cabelo molhado, e
seu corpo brilha com gotas de água como se ele tivesse acabado de sair de
uma foto com cenário de cachoeira, e oh, meu Deus, estou olhando para a
protuberância sob sua toalha enquanto seu membro está emitindo o canto
da sereia para mim.
Eu me pergunto se sua metade inferior pode atingir as mesmas
notas altas de seus vocais.
Espera.
Não.
Eu não me pergunto nada disso.
Giro para longe dele e cubro meus olhos com as mãos. — Oh, Deus,
eu sinto muito. Eu não sabia que você estava ocupado com outra
coisa. Caramba. Isso é nojento. Ok, eu vou indo agora. — eu digo,
tentando me afastar, mas esbarrando em uma mesa, enviando um abajur
no chão. Espio por entre meus dedos e me encolho. — Oops? Desculpe-me
por isso.
Olho para Ian, e ele ainda está naquela maldita toalha e ainda me
dando sua expressão descontente.
— O que você está fazendo aqui? — Ele pergunta, passando a mão
pelo cabelo pingando.
— Imaginei… — começo.
Ele ergue a mão para mim. — Você não. — Seus olhos disparam
para a outra mulher. — Você. O que você está fazendo aqui?
Seus olhos a penetram como se ele estivesse além de irritado. Ele
olha para ela com ainda mais ódio do que oferece para mim – o que diz
muito.
Ela passa as mãos pela roupa e dá um sorriso malicioso. —
Sim. Achei que poderíamos tentar ter aquela noite juntos que perdemos
alguns dias atrás.
— Você quer dizer a noite em que descobri que você tem um marido?
— Ele murmura.
— Escute, é complicado. Meu marido e eu não somos mais íntimos.
— Não me importo. Não é problema meu. No minuto em que um
cônjuge é revelado, estou fora. Não tenho tempo para o seu drama. Leve-o
para outro lugar. Eu não sei como você entrou na minha casa…
— A porta da frente estava destrancada, — ela comenta. — E ouvi
rumores de que, se a porta da frente estiver destrancada, as mulheres
podem entrar imediatamente.
— Besteira. Então vá embora. Tire minhas roupas e deixe-as aqui
também.
Bem, isso está desconfortável.
Fico ali congelada durante a situação mais embaraçosa da vida de
qualquer pessoa. A mulher parece derrotada enquanto se remexe em suas
roupas e a veste rapidamente antes de sair na chuva.
Se eu fosse uma tartaruga, seria uma tartaruga constrangida parada
aqui.
Ian passa as mãos no rosto e solta um suspiro pesado enquanto
conto as gotas de água que ainda rolam em seu peito tonificado.
Um, dois, três…
Cada gota de água desce por seu abdômen para atingir o topo da
toalha, e lá estou eu, olhando mais uma vez para sua virilha.
Afasto meus pensamentos inadequados e limpo minha garganta. —
Você costuma ter mulheres aleatórias invadindo sua casa sem serem
convidadas?
— Ficaria surpresa em saber que isso acontece com muito mais
frequência do que imagina. Agora, o que você está fazendo aqui?
Mordo minha unha do polegar e tento controlar os nervos que
balançam dentro de mim. — Eu estava me perguntando se aquele quarto
ainda estava disponível?
Ele ergue uma sobrancelha. — O quê? Você se assustou lá ou algo
assim?
— Não. — minto, cruzando os braços. — Suas habilidades de
cobertura não são tão impressionantes quanto deveriam ser. — Gah,
Haze. Pare de ser tão atrevida e sarcástica. Ele lhe ofereceu um ramo de
oliveira. Não mije nele e acabe no galpão com os psicopatas assassinos. —
Desculpe. Minha reação instantânea é sarcasmo.
— Está bem. Minha reação instantânea é ser um idiota.
— Bem, contanto que nós dois saibamos quem somos, morar juntos
deve dar certo. Mas eu tenho algumas regras sobre nós morarmos juntos.
— Por que isso não me surpreende?
Sorrio um pouco e mantenho meus braços cruzados. — Eu pago
aluguel. O que quer que você esteja pagando, eu pago a metade.
— Feito. O que mais?
— Gosto de cozinhar e, se sobrar, você pode ficar com eles. Eu odeio
sobras.
— Ok. Mais alguma coisa, querida?
— Ai, sim. Não me chame de ‘querida’.
— As garotas adoram ser chamadas de ‘querida’, — ele rebate.
— Mulheres não gostam de serem chamadas de ‘garotas’ ou
‘queridas’. Realmente, para uma estrela do rock, você com certeza é
ignorante sobre o que as mulheres desejam.
Ele dá alguns passos, se aproximando de mim e baixa as
sobrancelhas. Seus olhos cor de chocolate me perfuram. A barba por fazer
em seu queixo é tão perfeitamente arrumada e seus lábios parecem suaves
o suficiente para beijar. Ele desliza os dentes lentamente contra seu lábio
inferior antes de passar o polegar contra ele e levanta uma sobrancelha. —
E o que exatamente as mulheres desejam, Hazel Stone?
A maneira como ele fala meu nome completo me deixa atordoada e
confusa. Puxa, eu o odeio. Odeio o quão arrogante, confiante,
temperamental e sexy ele é ao mesmo tempo.
— Elas que…querem ser chamadas de qualquer coisa no mundo que
não seja ‘garota’ ou ‘querida’.
Ele me olha de cima a baixo e coloca as mãos contra o topo de sua
toalha, prendendo-a no lugar. — Devidamente anotado. Mais alguma
regra?
— Sim, e esta é importante.
— Sou todo ouvidos.
— Nós trancamos a porta à noite. A última coisa que preciso é um
pouco de Amber, Reese ou Sue entrando sorrateiramente em casa,
procurando encontrar você para uma rodada de aventuras sexuais, então
tomar o caminho errado e acabar na minha cama.
Um sorriso malicioso atinge seus lábios. — Isso não parece tão ruim
para mim. Estaria disposto a me juntar à festa.
Sinto meu rosto corar e tento o meu melhor para afastar meus
nervos. — Estou falando sério, Ian. Não quero uma pessoa qualquer
entrando. Isso me deixa nervosa.
Ele esfrega a nuca, ainda olhando para mim como se estivesse
tentando dissecar minha mente. Então se afasta do meu lado, caminha até
a porta da frente e tranca-a.
Uma respiração sussurrada deixa meus lábios. — Obrigada. Quer
me mostrar qual é o meu quarto? — Peço, dando um passo em direção ao
corredor, mas sua mão pousou no meu ombro.
— Agora espere um minuto. Você não é a única com regras na
casa. Eu tenho algumas também.
— Oh? E elas são?
— Você não pode me julgar pelo número de mulheres que trago
dentro e fora desta casa. Todos nós temos nossos hobbies, e acontece que
o meu envolve muitos momentos íntimos com mulheres diferentes.
— Ignorar seus modos de prostituto. Entendi. O que mais?
— Sou mais música do que homem. Quando estou inspirado, posso
começar a tocar ou cantar em horas estranhas da noite. Se eu não fizer
isso, vou me afogar. Não quero reclamações de barulho.
— Faz sentido. Mais alguma?
— Esta é a mais importante de todas. Vou ficar fora da sua vida e
você vai ficar fora da minha, mas se Paw perguntar a você… você e eu? Nós
somos amigos. Bons amigos.
— Por que isso importaria se Big Paw pensa que nós somos… —
Minhas palavras somem e eu levanto uma sobrancelha. — Ele pediu para
você ser meu amigo e me deixar morar com você?
Seu silêncio diz tudo.
— Inacreditável. — Suspiro. Mas, novamente, é realmente tão
inacreditável? Claro que há uma razão para Ian querer que eu durma em
sua casa. Sei muito bem que ele não gosta de mim desde o início, então o
fato de ele me convidar para ficar com ele não faz o menor sentido. — Por
que Big Paw faria isso?
— Ele descobriu que você estava hospedada no galpão e não queria
que fizesse algo assim, visto que é idiota e não é seguro.
Lá está o Ian que conheço e amo. Sr. Encantador.
— Então ele disse para você me deixar ficar com você?
— Sim.
— E se você não fizesse?
— Ele venderia a casa, e eu estaria morando em um maldito galpão
também. Olha, eu sei que isso não é o ideal para nenhum de nós, mas nós
dois temos um lugar seco para colocar nossas cabeças à noite. Então,
vamos aproveitar ao máximo e, se Big Paw perguntar, somos amigos. Ok?
— Ok. Posso lidar com isso. Quanto devo pelo aluguel a cada mês?
— Grátis. Eu não pago aluguel, então metade disso não é nada. Vou
me preparar para dormir, mas seu quarto fica no corredor à
esquerda. Deixei algumas roupas sobressalentes para você, se precisar.
— Por favor, não me diga que são as roupas que outras mulheres
usaram.
— Não se preocupe; foram limpas recentemente. Se você precisar de
mais alguma coisa.
Ele se vira e leva sua bunda mal-humorada e um tanto sexy para a
cama.
— Boa noite, melhor amigo. — Grito, com a língua na bochecha.
— Não force, Hazel Stone.
Eu não posso evitar. Provocar Ian Parker está se tornando um dos
meus passatempos favoritos.
Vou para o meu quarto e encontro um banheiro anexo a ele. Tenho
meu próprio banheiro. Um que eu não preciso compartilhar com ninguém
além de mim. Nunca na minha vida pensei que teria algo assim. Pego as
roupas da cama, vou direto para o chuveiro e o ligo bem quente.
O calor toma conta de mim enquanto esfrego meu corpo com um
sabonete com um cheiro muito masculino – provavelmente o mesmo
sabonete que Ian usa contra sua pele.
Esqueci como é bom estar dentro de um banheiro e ter água quente
correndo por meu corpo. A mangueira de água do lado de fora dos
estábulos está sempre gelada. Depois do banho, pego as roupas que Ian
deixara sobre a cama e parece um pouco demais com a mulher que saiu
mais cedo naquela noite. Eu teria reclamado disso se as roupas não
estivessem tão malditamente confortáveis e secas.
Quando chega a hora de dormir, agradeço aos céus por um colchão
de verdade e um travesseiro para encostar minha cabeça. Lágrimas se
formam em meus olhos com a bondade de Big Paw. O fato dele ter me visto
batalhando e forçado seu neto a me ajudar foi a mais verdadeira forma de
gentileza. Não tenho nada a oferecer ao Big Paw. Eu praticamente não
possuo nada em meu nome, e mesmo assim, ele escolheu me ajudar.
Devo tudo a ele e muito mais.
Fiquei sem teto por duas semanas e meia, e foram as semanas mais
difíceis da minha vida. Não consigo imaginar como é para as pessoas que
vivem aquela vida regularmente.
Mesmo que todas as peças do meu quebra-cabeça bagunçado não
estejam juntas, estou grata, porque sei que em algum lugar lá fora,
homens e mulheres dormem em cantos perigosos do mundo sem um Big
Paw para ajudá-los à noite.
Naquela noite, prometo a mim mesma que, sempre que tiver a
chance de ajudar alguém, farei imediatamente.
6
IAN
Que diabos é esse cheiro?
Acordo com um cheiro insuportável enchendo a casa e, no momento
em que me sento na cama, sei exatamente o que é o cheiro – cocô de porco.
Saio da cama e vou em direção ao quarto de Hazel. Bato várias vezes
contra sua porta, e ela abre, ainda com o rosto cansado, mas recém-saída
do chuveiro. Ela está vestindo um par de shorts e um top e nenhuma gota
de maquiagem.
Ela parece… diferente.
Completamente diferente do que eu imaginava que ela fosse. Hazel
tem uma estrutura muito menor do que suas roupas de tamanho
exagerado me faziam acreditar, e sua pele é perfeitamente lisa, com
pequenas sardas dançando sobre seu nariz.
Seus olhos verdes brilham muito mais sem aqueles quilos de
maquiagem em seu rosto também.
Ela é linda.
Foda-se… Hazel Stone é de tirar o fôlego.
Ela ergue uma sobrancelha enquanto eu ergo outra parte do
corpo. — Posso ajudar? — Pergunta.
Tento o meu melhor para me livrar do meu momento de confusão e
limpo minha garganta. Começo a cheirar o ar e olhar ao redor de seu
quarto enquanto coço meu cabelo bagunçado. — Cheira a porcos aqui.
— Se você acha que dizer a uma garota que o quarto dela cheira a
porcos é a sua maneira de fazê-la se sentir bem consigo mesma, então
você está muito enganado.
— Eu pensei que você fosse uma mulher, não uma garota.
— Meninas, mulheres, garotas, queridas – de qualquer forma, não
gostamos que digam que cheiramos a porcos.
Quase sorrio. — Não disse que você cheira como um porco. Eu disse
que o seu quarto sim.
Entro sem ser convidado e continuo procurando, continuo farejando
o ar, e então meus olhos pousam no par de botas de combate rasgadas no
canto do quarto. — Haze! Você não pode simplesmente deixar esses
sapatos aqui. Eles vão feder todo o lugar. E daí você nem sentirá mais os
cheiros de porco, e sua vida, sem dúvida, será horrível a partir desse
ponto.
Vou buscá-los e ela pula na minha frente, erguendo as mãos para
me parar. — Não, pare!
— Ouça, se for sobre os sapatos, tenho certeza que você pode
comprar um novo.
— Eu não quero um novo par. Estes são meus.
Levanto uma sobrancelha e a estudo. Ela parece como se estivesse à
beira das lágrimas por causa de algumas botas de combate malditas. — O
que eles significam para você?
— Tudo.
— Por quê?
— Eles foram a última coisa que minha mãe comprou para mim, —
ela confessa, e por algum motivo essa confissão parece tão estranha para
ela compartilhar comigo. — Eu amo essas botas. Claro, são muito baratas,
têm buracos nas solas e beliscam meus dedos dos pés, mas são minhas. E
guardam uma memória especial.
Eu não posso argumentar contra isso. Ainda tenho artigos de roupas
de mamãe e papai em uma caixa no meu armário. Mas, caramba, essas
botas cheiram muito mal.
Ela pigarreia e cruza os braços. — Durante uma das tentativas de
mamãe para ficar limpa e longe de Charlie, ela pegou algum dinheiro dele
e ficamos em um motel por duas semanas. Foram as duas melhores
semanas da minha vida. Comíamos das máquinas de venda automática
diariamente, assistíamos a Pretty Woman 18repetidamente e ríamos de tudo
e qualquer coisa sob o sol. Foi o maior período de tempo que eu já tive
minha mãe para mim. Uma tarde, ela me levou para fazer compras e
encontramos essas botas de combate na loja Goodwill 19e eu me apaixonei
por elas. Ela disse que se servissem, seriam minhas. Lembro-me de colocálas, desejando e torcendo para que servissem… Quando elas subiram pelas
minhas pernas, dei a mamãe um grande sorriso e girei com elas. Estavam
esmagando meus dedos dos pés, mas eu não queria dizer isso a
ela. Queria muitas aquelas botas para deixá-las passar. Ela comprou as
botas para mim e eu as uso todos os dias desde então. Isso foi há mais de
três anos e foi a última coisa que mamãe comprou para mim. Essas botas
representam a felicidade para mim, e agora estão cobertas de esterco de
porco, o que parece uma metáfora apropriada para minha vida. Felicidade
é uma merda, — ela brinca.
Dou a ela um sorriso torto. O que provavelmente ela nem percebe,
porque seus olhos estão fixos nessas botas.
Droga.
Essa é uma razão boa o suficiente para manter botas de merda por
perto.
Eu não digo nada. Saio do quarto, pego alguns itens e volto para ela
com uma pilha de coisas em minhas mãos.
— O que é isso? — Hazel pergunta.
— Purificadores de ar plug-in e spray de purificador. Se você vai ficar
com elas aqui, então vai precisar de toda a ajuda que puder conseguir. —
Começo a ligá-los ao redor do quarto dela, e então dou ao espaço uma boa
borrifada de purificador de ar lavanda. Saio de novo e volto com dois pares
de sapatos.
18 Filme Uma Linda Mulher, estrelado por Julia Roberts e Richard Gere.
19 Loja no estilo brechó que recebe doações de produtos novos ou usados e revende a
preços acessíveis.
— Você pode ir com o tênis branco ou o preto. Tenho certeza de que
os dois pares serão grandes demais para você, mas é melhor do que
coberto dessa porcaria de botas. — Eu sorrio, e acho que ela percebe
porque seus lábios se curvam também, e quem imaginaria? Hazel Stone
tem um sorriso lindo.
Ela pega os pretos.
Eu rio. — Tive a sensação de que você escolheria os pretos.
— Tenho uma imagem a zelar, — brinca ela. — Eu realmente não
posso estar usando sapatos brancos quando minha alma é negra.
Por que tenho a sensação de que não há nada de negro em sua
alma? Parece mais que sua alma está simplesmente ferida e magoada –
outra coisa que temos em comum.
Viro-me para deixar seu espaço e paro quando ela me chama. —
Obrigada, melhor amigo. — Ela diz com uma pitada de sarcasmo e uma
pitada de gratidão.
Sempre que The Wreckage faz um show na casa do celeiro, todos na
cidade aparecem. Não há muitas oportunidades para as pessoas se
reunirem, comerem e beberem de graça, mas esta é uma delas – graças ao
Big Paw fornecendo alimentos e bebidas. Antes de um show, eu sempre
fico com o estômago cheio de nervosismo, que não passa até que eu
coloque os pés no palco e caia no personagem de Ian Parker – o astro do
rock. Houve tantos dias em que me senti um impostor, e estou sempre
esperando o outro cair diante de mim.
Eric termina de configurar o equipamento de transmissão ao vivo, e
pouco antes da banda subir ao palco, vovó aparece e nos apresenta. Eu
juro, não há ninguém no mundo mais adorável do que minha avó. Ela tem
um sorriso que pode deixar os homens mais rabugentos felizes – Big Paw e
eu somos a prova viva disso.
— Agora, só quero dizer o quanto estou orgulhosa destes meninos
aqui. Durante os últimos anos, eles não faltaram a um ensaio, e aparecem
dia após dia para produzir sua música. Bem, talvez eu não compreenda as
músicas de hoje – sou mais uma garota do tipo Frank Sinatra. Ah, e Billie
Holiday20. E, oh, deixe-me falar sobre isso uma vez quando eu fui ver Elvis
no Mississippi e…
— Vovó, — eu chamo do lado do palco, sabendo que ela está prestes
a entrar em um de seus grandes monólogos que durarão a noite toda, se
possível.
Ela sorri e alisa as mãos sobre o vestido floral. — Certo. Como eu
estava dizendo, por favor, deem as boas-vindas aos Wreckage!
A multidão vai à loucura e todo medo que tenho evapora quando
meus companheiros de banda e eu subimos no palco. O show é o maior
barato que eu já consegui. Nunca cheguei ao cenário das drogas. Sei o que
fizeram com meus pais, e escolho não seguir essa linha na vida, não
importa o que aconteça. Mas quando canto diante de uma multidão,
parece a melhor euforia natural que eu já experimentei.
Assistir as pessoas se perdendo na música me faz querer chorar
como um maldito bebê. Eles estão balançando lado a lado, cantando
minhas canções, e isso me surpreende. E me lembra de uma época em que
as únicas pessoas que compareciam àquele celeiro para nos ver tocar eram
a vovó e o Big Paw. Agora, toda Eres está parada na nossa frente,
cantando, dançando e ficando bêbados e felizes. Além disso, o fato de
milhares de fãs estarem sintonizados na Live no Instagram é uma loucura.
Cada música que tocamos deixa a multidão animada. Assisti-los
acreditar em nosso desempenho deve ter me deixado o homem mais feliz
do mundo, e confie, estou feliz, mas ainda assim, há algo sentado no fundo
da minha mente que me impede de realmente me sentir completamente
eufórico.
20 Foi uma cantora e compositora norte-americana. Tinha como gênero musical o jazz.
Falta uma faísca na apresentação e eu não consigo definir o que
é. Preciso explorar isso, se algum dia for capaz de descobrir os próximos
passos da carreira da Wreckage. Algo está faltando e farei o que for
necessário para localizar a peça que falta.
— Isso foi incrível! — Marcus exclama, batendo as baquetas contra a
coxa depois que terminamos nossa última música da noite. Eric checa e
verifica novamente todas as nossas contas de mídia social com um enorme
sorriso no rosto, mostrando que também está satisfeito.
James já está se misturando para agradecer a todos por terem
aparecido e, ainda assim, eu me sinto mal.
Foi um bom show, mas não foi ótimo.
Por que não foi ótimo?
— Ian, oh, meu Deus, você foi tããão bom. — Uma garota diz,
vagando até mim com o braço de sua melhor amiga enlaçado no dela.
— Sim, tipo, você é tããão bom e tããão gostoso. — A outra garota ri.
Dou a elas um meio sorriso, um pouco vivendo o momento, um
pouco pensando demais na performance que aconteceu. — Obrigado,
meninas. Significa muito que vocês vieram nos ver.
— Nós adoraríamos ver um pouco mais de você individualmente. —
Diz a primeira garota.
— Ou mesmo as duas contra um, — acrescenta a outra, rindo.
Em uma noite normal, eu aceitaria a oferta, mas minha mente está
um pouco mais no show do que nas mulheres. Eu não serei capaz de
pensar em mais nada até descobrir o que há de errado. Infelizmente, isso
significa uma noite sem sexo para mim.
As meninas gemem e bufam, mas finalmente vão buscar mais
bebidas. A festa no celeiro continuará por mais algumas horas até que Big
Paw enxote todos para fora. As pessoas ficam bêbadas, namorando e
tomam decisões ruins que parecem boas.
Uma típica noite de sábado em Eres.
Vago pelo rancho com um caderno e uma caneta na mão. Continuo
rabiscando as letras e riscando-as antes de tentar novamente criar algo
melhor, mais forte – mais real. Eu anseio por desbloquear as peças que
estão faltando. Enquanto ando para frente e para trás, então uma voz
brilha na minha mente.
— São as palavras.
Olho para cima para ver Hazel sentada na cadeira de balanço que
Big Paw construiu para minha mãe anos atrás. Eu costumava sentar no
colo da mamãe enquanto ela lia histórias para mim antes de dormir, anos
atrás.
Houve momentos em que pensei em me livrar da cadeira para
esquecer aquela memória, mas ainda não encontrei forças para isso.
— O que você quer dizer com as palavras? — Pergunto, subindo os
degraus da varanda. Eu me inclino contra a grade de frente para ela.
Ela pisca e inclina a cabeça em minha direção. — Suas palavras são
um lixo.
— Como é que é?
— As letras de suas canções. São um lixo completo, recheado de
clichês. Não me interprete mal, o estilo musical e a banda são
brilhantes. Embora me dói admitir, sua voz é tão sólida e comovente que
você poderia ser uma estrela em um piscar de olhos. Mas as letras? Eles
são merda de porco.
— Eu acho que o ditado é merda de cavalo.
— Depois de passar semanas em um chiqueiro, merda de
porco parece realmente resumir meus sentimentos sobre sua música. Mas
meu Deus, sua voz… É uma voz boa.
Tento afastar seu insulto e ignorar seu elogio também. Mas é
difícil. Tenho um ego que é fácil de machucar, e Hazel está balançando
seus socos enquanto fala palavras de elogio. É como se cada hematoma
que ela faz, rapidamente cobre com um creme calmante.
Insulto, elogio, insulto, elogio. Lave, enxágue e repita.
— Todos os outros pareciam gostar da apresentação, — respondo,
tenso com minhas palavras.
— Sim, bem, ‘todos os outros’ são idiotas e estão bêbados demais.
— Oh? E você acha que poderia fazer melhor?
Ela ri. — Sem dúvida.
— Ok, Hazel Stone, mestre das letras, dê-me algo para acompanhar.
Ela gesticula em direção à outra cadeira de balanço ao seu lado – a
que papai costumava sentar.
Eu me sento.
Ela aperta os lábios. — Ok. Dê-me uma de suas canções. Um que
você reconhece que é uma porcaria, mas está fingindo que não é.
— Eles não são…
— Mentir não vai nos levar muito longe esta noite, Ian.
Estreito meus olhos e murmuro um palavrão antes de começar a
folhear meu caderno para encontrar uma música para Hazel melhorar
magicamente. — Bem. Podemos fazer ‘Possibilities’
21.
— Hmm… sobre o que é isso?
— Um novo relacionamento se formando. Eu quero mostrar esses
sentimentos iniciais, sabe? Os medos e emoções. O nervosismo. O
desconhecido. O…
— Primeiros capítulos do amor. — Ela conclui meus pensamentos.
— Isso.
Ela tira o lápis de trás da minha orelha e arranca o caderno da
minha mão. — Posso?
— Por favor. Vá em frente.
E começa a rabiscar, riscar coisas, adicionar outras, fazer o que quer
que venha à sua mente. Ela trabalha como uma louca, caindo em um
mundo de criatividade que eu não pensei que tivesse dentro dela. A única
coisa que sei sobre Hazel Stone é de onde ela vem e as roupas que
21 Possibilidades.
usa. Não sei de mais nada, mas agora ela está se derramando na página e
eu mal posso esperar para ver o que diabos está rabiscando.
Ela respira fundo e me devolve o caderno. — Se você odiar, sem
problemas ou ofensas. — Diz ela.
Meus olhos disparam sobre as palavras. É possível que isso seja o
nosso para sempre. É possível que alcancemos as estrelas. Vamos lutar por
isso; vamos torná-lo real. É possível, possível, mostrar como me sinto?
— Merda. — Eu solto uma lufada de ar. — Hazel… isso é… Porra. É
como se você rastejasse na minha cabeça e lesse os pensamentos que não
consigo decifrar. Esse é o refrão. É isso aí.
— Você realmente gostou?
— É meio perfeito. Ajude-me com o próximo verso? ‘Muito tarde para
ir, muito cedo para ficar, só quero descobrir o que leva um sorriso ao seu
rosto. Isso é falso ou real? A batida do meu coração… ‘ — Pauso. — As
batidas do meu coração…
— ‘As batidas do meu coração e os arrepios na minha pele. Apenas
me deixe saber se você será meu’, — ela diz, como se fosse fácil. Ela faz
isso uma e outra vez com minhas outras letras também. Adicionando as
peças que faltam que eu procuro há anos.
O que diabos está acontecendo? Como Hazel consegue acessar uma
fonte que eu nunca fui capaz de encontrar?
— Como você faz isso? — Eu pergunto. — Como você simplesmente
… consegue?
— Fácil. — Ela encolhe os ombros. — Eu não sou uma parede de
tijolos como você.
— O que diabos isso quer dizer?
— Significa exatamente isso. Você é uma parede de tijolos. Você não
entra em contato com suas emoções, o que significa que suas letras saem
sem graça e sem autenticidade. Não há coração nelas, porque você não
tem coração para dar.
Essas palavras parecem um ataque pessoal.
Eu fico tenso. — Besteira. Eu sinto coisas.
— Não, você não sente.
— Pare de falar como se você me conhecesse.
— Não estou falando como se te conhecesse, porque tenho quase
certeza de que não te conheço. Duvido que muitas pessoas te conheçam,
porque, novamente, você é uma parede de tijolos. Não deixa as pessoas
entrarem, porque está com muito medo.
Eu não posso acreditar nessa garota. Ela está falando sem parar
sobre como sou frio e fechado, mas não sabe do que diabos ela está
falando. E pensar que eu lhe dei meus sapatos pretos! Meu peito aperta e
eu me levanto da cadeira de balanço enquanto arranco o caderno de suas
mãos. — Eu não preciso que você me diga quem eu sou ou do que tenho
medo. — Retruco. Sentindo-me um pouco inquieto com a forma como ela
parece me ver de uma forma que ninguém mais faz.
— Pode ficar irritado com isso, mas eu sei que você está, apenas
porque estou certa.
— Você não está.
— Eu sou também.
— Nem sei por que estou perdendo meu tempo com você. —
Resmungo e solto um suspiro pesado. — Tenho coisas melhores para
fazer.
— Como escrever letras piores?
— Qual diabo é o seu problema? — Pergunto, sentindo um fogo
queimando em meu peito. Já faz muito tempo desde que alguém conseguiu
entrar em minha pele, mas Hazel está lá, arranhando seu caminho em
minhas irritações.
— Meu problema é que você é talentoso o suficiente para sair desta
cidade, mas é teimoso demais para ir mais fundo. Eu mataria para ter o
dom da música que você tem. Seus vocais são incríveis e você está a
segundos de conseguir, mas está com muito medo de tentar.
Eu não quero ouvi-la mais, porque é irritante, e crítica e certa pra
caralho.
Calço os sapatos e me dirijo para a porta da frente. Quando abro a
tela, Hazel me chama. Não me viro para encará-la, mas paro para ouvir
suas palavras.
— Você não pode escrever a verdade se estiver mentindo para si
mesmo.
Ela está certa, e eu sei disso, mas menti para mim mesmo durante a
maior parte da minha vida. Com o tempo, as mentiras quase parecem
reais.
7
HAZEL
Ian e eu ficamos alguns dias fora do caminho um do outro. Desde
que contei a ele sobre suas letras, ele tem feito o possível para me evitar
como uma praga. Eu não posso culpá-lo – não fui muito gentil com relação
a isso. Mas eu ouvi tantas pessoas babando atrás do traseiro de Ian depois
de sua performance que imaginei que ele poderia precisar um pouco de
sinceridade. Ficou claro que ele não estava se sentindo totalmente
confiante sobre seu desempenho, com base em suas letras.
Na noite de terça-feira, ele vem ao meu quarto, irritado como
sempre, e para na minha porta. — Então você está me dizendo que é capaz
de escrever letras assim porque está em contato com seus malditos
sentimentos?
Eu concordo. — Sim, exatamente.
— E você acha que eu não posso porque estou fechado?
— Sim, exatamente.
Seus olhos se estreitam e uma ruga percorre seu nariz enquanto ele
pensa profundamente. Ele coça a nuca e murmura algo baixinho antes de
olhar para mim mais uma vez. — Essa é a coisa mais estúpida que já ouvi.
— Sim, bem, também é a verdade.
Ele não gosta dessa resposta, então continua a me ignorar.
Não é até o final da sexta-feira seguinte quando ele dá uma espiada
em meu quarto. — Ei, você está acordada?
Ele parece muito mais calmo do que antes. Seus olhos não estão tão
duros e distantes.
— Oh, sim, Ian. Eu sou uma perdedora a ponto de ir para a cama às
nove em uma noite de sexta-feira. — Respondo sarcasticamente. Mesmo
que eu definitivamente estivesse prestes a ir para a cama às nove da noite.
Ele me ignora em resposta ao meu tom sarcástico. E mostro meu
dedo do meio em retorno. Estávamos claramente nos tornando melhores
amigos.
— E aí? — Pergunto.
— Nada. Deveria ensaiar com a banda, mas Eric pegou uma gripe ou
resfriado, ou ele estava saindo da cidade ou algo assim.
— Precisamos que você trabalhe em suas habilidades de
comunicação.
— Provavelmente você está certa. De qualquer forma, eu ia convidar
uma amiga, se não houver problema…? — Ele parece tímido,
envergonhado até.
— Você está me perguntando se pode receber uma amiga? — Eu
rio. — Você sabe que esta é a sua casa, certo? E não é uma das regras
básicas que eu não tenho permissão para julgá-lo por seus modos de
prostituto?
Ele passa as mãos pelos cabelos e morde o canto da boca. — Sim, eu
sei, mas bem, é a sua casa agora também, e eu não quero, tipo… só quero
que você se sinta confortável.
— Ian… — Olho para o meu traje, que é um pijama de futebol. —
Estou vestindo um pijama. Nunca estive tão confortável em minha vida, e
se você está realmente perguntando se não há problema em trazer uma
mulher para casa e ter relações sexuais com ela, então sim. Vamos ao que
interessa, melhor amigo.
Ele se encolhe. — Sabe o quanto constrangedora você é?
— Estou totalmente ciente.
— Temos que trabalhar em suas habilidades de comunicação, — ele
zomba. — Ok, bem, tenha uma boa noite. Se precisar de alguma coisa, —
ele faz uma pausa, — não precise de nada esta noite, ok?
Eu rio e balanço a cabeça. — Ok. Apenas certifique-se de não tocar
nenhuma de suas músicas durante o sexo. É meio como um broxante
instantâneo, — brinco.
Ele me mostra o dedo do meio dessa vez.
Eu retribuo o gesto. Obviamente.
Poucas horas depois, sou acordada por um Ian em pânico de pé
sobre mim, sacudindo meus ombros. — Hazel, acorde!
Sento-me ereta na cama e esfregando os olhos. — Que diabos está
acontecendo?
— Shh, — ele sussurra, colocando o dedo contra meus lábios. Meus
olhos se movem para seu dedo e seus olhos se moveram para o mesmo
lugar. Olhamos para o nosso toque por um momento, que parece um
pouco como uma eternidade, antes que ele lentamente remova o dedo da
minha boca. — Desculpe. Mas preciso de sua ajuda.
— Ainda está escuro lá fora, Ian, — murmuro, tentando me deitar de
volta no meu travesseiro, mas ele não deixa.
— Eu sei, eu sei, mas preciso de você. Por favor. — Ele parece
realmente desesperado.
Suspiro e me endireito. — O que foi?
— Lembra que eu disse que tinha uma amiga vindo? — Ele
pergunta.
— Sim.
— Bem, eu preciso que ela saia.
Olho para o meu relógio. Quatro da manhã. E levanto uma
sobrancelha. — Você quer que eu a enxote? Às quatro da manhã? — Ele
assente. — Você vê que é uma coisa realmente horrível chutar uma garota
para fora de uma casa às quatro da manhã, certo? — Ele acena com a
cabeça novamente. Mas para de fazer contato visual. Aproveito o tempo
para realmente acordar e olho para ele. Suas mãos estão fechadas em
punhos e seu rosto está vermelho. Seu pé bate nervosamente no chão sem
parar.
Parece que há algo realmente o incomodando, devorando-o por baixo
da pele, mas não diz nada. Nós não nos conhecemos suficientemente bem
para perguntar, então eu saio da cama.
— Você quer que eu seja má ou simpática? — Eu pergunto.
Ele não responde, mas enfia as mãos na lateral do colchão e
continua batendo os pés. Agora as batidas não parecem nervosas.
O que significa que ele está.
Quando acordo na manhã seguinte, a casa está vazia. Escovo meus
dentes, me perguntando se minha interação com Ian na noite passada foi
real ou apenas um sonho estranho. Movendo-me para a cozinha, olho pela
janela para o quintal, onde vejo Ian cortando pedaços de madeira. Sua
camisa branca não está em seu corpo, mas enfiada na lateral de sua calça
jeans enquanto ele balança o machado em um pedaço de madeira.
Seus braços são musculosos e bronzeados, como se ele trabalhasse
quase todos os dias ao sol. Pego um copo d’água e saio para a pequena
varanda dos fundos. Há um balanço na varanda em que me sento com
prazer, ainda de pijama. Balanço para frente e para trás, e vejo seu corpo
reagir ao som do balanço rangendo enquanto balança comigo nele. Ele
sabe que estou aqui, mas não se vira na minha direção.
Depois de abrir e fechar minha boca algumas vezes, finalmente crio
coragem para fazer a pergunta a ele. — Você quer falar sobre a noite
passada?
Ele ergue o machado e parte outro pedaço de madeira ao meio. —
Não.
Ele ainda não se virou para olhar para mim.
Gostaria de poder entrar na cabeça de Ian e ver o que ele está
pensando. Mesmo que ele e eu brincássemos muito sobre ele dormir por
aí, sei que seus problemas são muito mais profundos do que deixa
transparecer. Eu deveria ter deixado ele em paz, permitido que ficasse
sozinho, mas algo em meu coração está me dizendo para não ir
embora. Algo em meu coração me pede para ficar.
— Você não precisa ficar tão fechado o tempo todo.
— Eu sei, mas eu quero ser.
— Ninguém quer ser fechado.
— Eu quero.
— Por quê?
— Pare de insistir. — Ele ordena, cortando um pedaço de madeira,
mas eu não posso evitar. Tenho a sensação de que a maioria das pessoas,
além de seus avós, não pressiona Ian de nenhuma maneira, jeito ou forma.
— Vou parar de pressionar assim que você se abrir.
— Bem, provavelmente você ficará aqui para sempre.
— Eu não trabalho hoje, então tudo bem.
Ele suspira enquanto ergue o machado e o bate no pedaço de
madeira à sua frente. — Droga, Hazel. Que diabos tem de errado com
você? Por que você não pode simplesmente me deixar em paz?
— Porque você quer mais. — Dou de ombros. — E ontem à noite algo
aconteceu quando você me pediu para me livrar daquela mulher. Algo o
consumiu bem no fundo, e estou apenas avisando que não precisa guardar
para si mesmo. Eu cresci guardando coisas para mim. Sei como isso pode
ficar difícil e pesado no peito.
— Sim, bem, você e eu não somos os mesmos.
Essa é a declaração mais verdadeira já falada.
Eu me levanto do balanço da varanda e mexo a cabeça uma vez. —
Ok. Bem. Seja desse jeito. Mas não me culpe quando tudo se tornar
demais para você.
— O que te faz pensar que vai ficar?
— Sempre fica, até que suas emoções se exacerbem e você
desmorone.
Ele bufa. — Experiência pessoal?
— Algo parecido.
Eu me viro para entrar e paro quando ouço Ian soltar o suspiro mais
dramático da história dos suspiros. — Ela falou de meus malditos pais.
Chamou-os de drogados e continuou a falar deles como se os
conhecesse. É preciso muito para me irritar – como você disse, construí
paredes de tijolos – mas os comentários sobre meus pais sempre me
afetam.
Olhando para trás em sua direção, vejo o peso em seus olhos
enquanto ele pousa as mãos no cabo do machado. — E por que isso?
— Porque os comentários sempre parecem verdadeiros. Meus pais
eram drogados. Meus pais me abandonaram. Meus pais escolheram seu
hábito fodido em vez de seu próprio filho. Eles deixaram este lugar e foram
embora, deixando seu filho com seus próprios problemas fodidos. Ok? É
por isso que me incomoda.
Meu peito aperta ao ouvir Ian falar sobre seus pais. Sei que há um
problema com drogas em Eres e sei que grande parte desse problema é
causado por um homem em particular. — Charlie era o traficante deles? —
Pergunto, as palavras doendo enquanto caem da minha língua.
Ele roça o polegar contra a ponte do nariz e assente. — Sim.
— E é por isso que você me odeia?
— Não. — Ele balança sua cabeça. — Eu não te conheço o suficiente
para te odiar. Só não gosto do que você representa – a memória do que
aconteceu aos meus pais.
Entendo esse conceito. Talvez mais do que ele pode ter imaginado. —
Também não gosto.
— O que você quer dizer?
— Eu também perdi minha mãe nas mãos de Charlie. É por causa
dele que eu morava naquele galpão. Minha mãe me expulsou porque ele
queria que eu fosse embora, e se não fosse por seu vício em drogas, duvido
que ela teria feito isso. Ela costumava ser minha melhor amiga, mas as
drogas têm um jeito de mudar isso. Gostaria de não a ter conhecido antes
das drogas porque simplesmente… — Suspiro enquanto minhas palavras
se perdem. Eu nem tenho certeza de como explicar, mas Ian parece
entender.
— Só fica mais difícil lembrar de uma época em que as drogas não
eram um problema, — ele conclui para mim.
— Sim. Exatamente.
Ele empunha o machado novamente, bufando enquanto fala. — Isso
me irrita, —confessa. — Como pais podem permitir que algo como drogas
os separem de seus filhos.
Olho para Ian – realmente olho para ele – e vejo o garoto quebrado
que vive em sua raiva. Há algo tão cru e real sobre como ele corta a
madeira, segurando aquele machado com toda a agressão reprimida nele.
Entro em casa e volto para fora com uma caneta e papel na
mão. Sento no balanço da varanda e dou um sorriso para o homem suado
e exausto. — Ok, vamos fazer isso.
— Vamos fazer o quê?
— Use sua raiva para criar música.
Ele resmunga um pouco enquanto belisca a ponta do nariz. — Não
estou interessado.
Antes que eu possa responder, ele se afasta, deixando-me parecendo
uma garota boba que queria quebrar a parede de pedra.
8
HAZEL
Faz quatro semanas desde que mamãe e Charlie me expulsaram, e
eu não fui capaz de realmente lidar com tudo isso. A cada dia, ainda me
preocupo com a saúde e o bem-estar dela. Todos os dias, penso nela e oro
para que esteja bem. Quando tudo fica pesado em meu coração, vou para
a casa deles para verificar como ela está depois que termino meu turno no
trabalho.
Sei que será um inferno se Charlie me pegar lá, mas não me
importo.
Apareço com mantimentos para a geladeira da mamãe e, quando
bato na porta, a ouço arrastando os pés.
— Quem é? — Ela grita.
— Sou eu, mamãe. É Hazel.
Os movimentos parecem mais apressados e, quando ela abre a
porta, engasgo ao vê-la. Os mantimentos em minha mão caem no chão
quando dou um passo à frente. — Mamãe! O que aconteceu com você? —
Respiro fundo, observando seu rosto machucado. Seu olho esquerdo está
quase fechado e seus pulsos são pretos e azuis.
— Não faça barulho. — Ela avisa, me dispensando. — Charlie e eu
acabamos de entrar em uma discussão. Cometi um erro nos negócios dele,
eu deveria ter prestado atenção.
— O quê? Não. — Falo, invadindo a casa. — Não importa o
problema, ele não tem o direito de colocar as mãos em você, mamãe. Não
está certo e realmente deveríamos dar uma olhada em você. Deixe-me levála ao hospital.
Ela balança a cabeça. — Não. Eu não vou para o hospital. Estou
bem.
— Precisamos ter certeza de que o bebê está bem, mamãe. Por favor.
Ela abaixa a cabeça e vejo a dor em seu coração. Há uma luta em
sua cabeça. Na verdade, não consigo imaginar o que está acontecendo em
sua mente. De vez em quando, vejo flashes de arrependimento em seus
olhos que combinam com os meus. Minha mãe vive uma vida de lutas, e
eu a vejo lutando contra a dor cada vez que pisca.
— Não tenho dinheiro para uma consulta médica… — ela começa. —
Não tenho seguro e Charlie ficará chateado se receber uma conta.
— Eu vou cobrir o custo. Sério, mamãe. Deixe-me ajudá-la.
Ela está a segundos de concordar. A segundos de fazer a coisa certa
para ela e para o bebê, mas antes que possa falar, Charlie se aproxima de
mim. Eu me viro para ver seus olhos se arregalarem quando ele me vê, e
então ele olha para mamãe.
— Que diabos está acontecendo aqui? — Ele grunhe.
— Vou levar mamãe para sair um pouco. — Informo, tentando o meu
melhor para não mostrar o medo que está na minha garganta. Claro,
Charlie não parece um homem ameaçador, mas conheço a aspereza que
vive dentro dele. Não é a primeira vez que noto o corpo de mamãe sendo
machucado nas mãos de Charlie, mas imagino que, desde que ela
engravidou, ele não a machucaria.
Eu estava muito esperançosa de acreditar que Charlie não é um
monstro maior.
— Onde? — Ele pergunta. — Você nem deveria estar aqui.
— Tenho direito de ver minha mãe, — rebato. — Vamos,
mamãe. Pegue suas coisas e vamos embora.
— Ela não vai a lugar nenhum com você. Vá em frente e faça uma
pizza para mim, Jean, — ele ordena a mamãe, o que faz minha irritação
disparar.
— Ela está machucada. — Eu repreendo. — Vou levá-la para uma
consulta.
Ele ergue uma sobrancelha e olha para mamãe. — Você vai para um
hospital? — Ele pergunta, suas palavras baixas e controladoras. — O que
diabos você vai fazer, Jean? Entregar-me? Dizer que te machuquei?
Ela hesita enquanto mexe com os dedos, olhando para o chão. —
Claro que não, Charlie.
— Porque eu não machuquei você, machuquei?
A maneira como suas palavras escorregam de sua língua faz os pelos
da minha pele se arrepiarem. Puxa, eu o odeio muito e desprezo como ele
usa sua autoridade para controlar os pensamentos de mamãe.
— Não, você não fez. — Ela mente. Ela pisca os olhos fechados e
balança a cabeça para frente e para trás. — Eu tropecei. Você sabe que
sou desajeitada, Hazel.
Não, mamãe.
Não o deixe controlar você assim.
— Mesmo assim, você deveria ser examinada por causa do bebê. —
Ofereço, tentando domar a raiva correndo por mim. Preciso tirá-la
daqui. Fora desta casa, fora do controle de Charlie. Porque eu sei que se
ela ficar mais tempo, acabará morta por ele ir longe demais.
Talvez se fugirmos juntas, ela será capaz de limpar sua mente
novamente. Talvez perceba que não precisamos de Charlie. Que ficaremos
melhores sem ele, que…
— Ela não vai a lugar nenhum. — Charlie interrompe. — O bebê está
bem, e ela também. E você não é mais bem-vinda aqui. Então saia.
Eu me aproximo de minha mãe, protegendo-a de Charlie. — Não vou
embora sem levá-la comigo.
Ele arregaça as mangas da camisa e dá um passo em minha
direção. — Saia, Hazel.
— Não! — Digo severamente. — Eu não vou a lugar nenhum.
Ele me agarra pelo braço e começa a me arrastar em direção à porta
da frente. Para um cara aparentemente pequeno, seu aperto dói.
— Solte-me! — Eu grito. Tropeço quando ele me puxa, e no segundo
que encontro meu equilíbrio, empurro com força contra seu peito, fazendoo tropeçar para trás.
Antes de qualquer pensamento, sinto a picada de seu punho
batendo no meu rosto. E caio direto no chão.
Puta merda.
A sensação de ferroada que toma conta de mim me dá vontade de
vomitar. Ele não apenas me deu um tapa; me deu um soco. Ele me enviou
voando para trás e caindo no chão como se não tivesse nenhuma
preocupação no mundo por suas ações. Foi isso que fez com a mamãe? Ele
a socou repetidamente como se ela fosse uma boneca de pano e não uma
pessoa?
Minha cabeça começa a latejar e as lágrimas caem dos meus olhos
enquanto a dor irradia para todo o meu corpo. Eu me levanto, mas Charlie
vem correndo em minha direção e me empurra de volta.
— Eu te disse para ir embora, porra. — Ele sussurra, sua voz
pingando de ódio.
— Vai se foder. — Eu choro.
Ele ergue o punho para me bater de novo, mas mamãe entra
correndo e segura a mão dele. — Pare, Charlie. Por favor. Ela
entendeu. Está saindo e nunca mais vai voltar. — Ela jura.
Eu tropeço enquanto meu olho direito permanece fechado. A
umidade escorre do meu rosto enquanto eu o enxugo. Isso é sangue? O
anel de Charlie deve ter cortado minha pele.
— Certo, Hazel? — Mamãe pergunta, olhando para mim com os
olhos arregalados cheios de medo. Ela vive com esse medo diariamente.
— Venha comigo, mamãe. — Imploro, com meu peito subindo e
descendo em velocidade errática.
— Outra vez, ela não vai a lugar nenhum. Agora, saia antes que eu
desconte em vocês duas. — Diz Charlie.
Está claro que ele é um psicopata. Não sente uma pontada de
remorso por suas ações – muito pelo contrário, na verdade. Parece estar
pronto para me dar outro golpe a qualquer segundo agora.
— Vá, Hazel, — implora mamãe, com lágrimas nos olhos. — Por
favor.
Quero discutir, mas sei que se pressionar Charlie, ele baterá em
mim e nela. Não consigo lidar com a ideia de ele machucar mamãe, então
vou embora.
A dor em meu peito não me faz sentir nada além de culpa por deixála naquela situação terrível. Por um momento, quando ela agarrou o braço
de Charlie, eu vi minha mãe. Minha mãe de verdade, não a humana
drogada que ela se transformou ao longo dos anos. Ela interveio para me
proteger, e matou meu coração que não há ninguém para protegê-la.
Vou para a casa de Ian e, enquanto caminho, tento o meu melhor
para manter minha cabeça baixa e coberta. A buzina de um carro soa para
mim, enviando nervosismo por minha espinha. Mantenho minha cabeça
baixa e continuo andando. — Hazel! — Uma voz grita do carro. Eu ainda
não olho para cima. – Ei, Hazel, é Leah. Irmã de James Scout. Ele trabalha
no rancho, e estou indo para lá para ver os cavalos. Você está indo nessa
direção? Posso te dar uma carona.
Ela para o carro, estaciona e corre até mim. Conheço Leah há algum
tempo. Tínhamos nos formado juntas e ela é a definição da realeza em
nossa cidade. Leah Scout é linda. De seu lindo cabelo loiro a seus olhos
azuis cristalinos. Tem um sorriso que pode ser usado em comerciais de
pasta de dente, e ela dá aquele sorriso a todos que olham em sua
direção. Ela é exatamente como seu irmão mais velho, James, também –
excessivamente simpático com qualquer um e com todos.
Quando ela me alcança, engasga e coloca as mãos sobre a boca. —
Oh, meu Deus, o que aconteceu com você?
— Eu, hum, não quero falar sobre isso. — Começo a andar e Leah
mantém seu ritmo ao meu lado.
– Espere, Hazel. Quem fez isto em você?
— Não quero falar sobre isso. — Respondo brevemente. — Só quero
chegar em casa e me limpar.
— Ok. — Ela acena com a cabeça e liga seu braço ao meu.
— O que você está fazendo?
— Estou acompanhando você até o meu carro para que possa levá-la
para casa. Não deveria estar andando por essas ruas com esta aparência
e, definitivamente, não deveria estar sozinha. James disse que você está
ficando com Ian por enquanto, certo?
Concordo. — Sim. Mas você não…
— Não seja boba, Hazel. Nós, garotas, temos que cuidar umas das
outras em uma cidade cheia de idiotas. Não é grande coisa. Venha
agora. Vamos levá-la para casa para que possamos limpar esse ferimento.
Quando chegamos em casa, tento fazer Leah continuar com o seu
dia, mas ela não sai do meu lado.
— Você não pode deixar de limpar esse olho. Caso contrário, ficará
inchado e fechado por um tempo. Sou voluntária no consultório
do Dr. Smith. Posso te ajudar, — ela oferece.
Eu não tenho energia para lutar contra ela para ir embora. Além
disso, uma parte estranha de mim não quer ser deixada sozinha.
Sento-me na beira da cama enquanto Leah se dirige à cozinha para
pegar um pano úmido e gelo para o meu olho. Quando ela volta, senta-se
ao meu lado e faz o possível para cuidar de mim.
— Quem fez isso, Hazel? — Ela sussurra.
Balanço minha cabeça. — Não importa.
— Claro que sim. As pessoas não deveriam ter permissão para
machucar você assim. Eles devem pagar por suas ações.
Dou a ela um sorriso torto e permaneço quieta. Eu não preciso que
estranhos saibam muito sobre minha vida pessoal. Mesmo que Leah seja
legal, não tem a necessidade de colocar todas as minhas lamúrias nela.
— Estou muito bem. — Minto.
Ela me dá um sorriso conhecedor. Então franze a testa e balança a
cabeça. — Ian vai enlouquecer assim que descobrir.
Levanto uma sobrancelha. — Isso não é muito provável.
— Você está de brincadeira? Claro que é. Você é colega de quarto
dele e alguém te machucou. Ele vai se preocupar com isso.
Eu rio. — Nós realmente não somos esse tipo de companheiros de
quarto. Praticamente ficamos fora do caminho um do outro, a menos que
ele precise que eu chute uma garota qualquer às três da manhã.
Leah passa a mão no rosto. — Eu não sei, Hazel. Esse tipo de coisa
atinge Ian. Seu pai costumava colocar as mãos sobre a mãe dele antes de
partirem, anos atrás, e isso deixava Ian louco. Ele não gosta de mulheres
sendo abusadas.
Abusada.
Eu não sei por que aquela palavra me faz querer vomitar. Essa
palavra faz as ações de Charlie parecerem ainda mais intensas, mas é
verdade. Ele abusou de mim. Ele abusou da minha mãe. E sei que ele não
irá parar, porque quando se trata de Charlie, o abuso é uma segunda
natureza.
— Escute, eu sei que Ian é difícil, mas ele é realmente um cara
bom. Eu o conheço toda a minha vida, vendo como ele é o melhor amigo do
meu irmão. Quando seus pais fugiram, isso o afetou, mas aquele menino
de bom coração ainda está lá.
— Ele é frio o tempo todo. Não tem sentimentos.
Leah ri alto. — Isso é ridículo. Na verdade, Ian Parker sente
demais. Esse homem tem mais sentimentos do que a maioria das pessoas
neste mundo. E fica tão dominado por suas emoções que ergue essa
parede. Mas cara, ele se importa. Ele se importa tanto que acho que o
deixa louco.
Abaixo minha cabeça por um minuto e seguro a toalha com gelo
contra meu rosto. Não tenho certeza do que mais dizer para Leah, então
encolho meus ombros e dou a ela um pequeno sorriso. — Estou ficando
com um pouco de dor de cabeça. Acho que vou descansar um pouco.
— Essa é uma boa ideia. Tome um comprimido de ibuprofeno para a
dor e coloque gelo no olho a cada hora para ajudar com o inchaço, ok?
— Ok, obrigada, Leah. De verdade, obrigada. — Ela não tinha que
me ajudar, mas ainda assim, ajudou. Isso significa mais para mim do que
jamais saberá.
— Claro. — Ela se levanta da minha cama e me dá um sorriso. — E
se você precisar de algum tempo de menina, me avise. Ficar cercada por
estes meninos no rancho me deixariam louca. Estou sempre visitando os
cavalos de qualquer maneira, então talvez alguns dias possamos almoçar
ou algo assim.
Dou a ela um sorriso verdadeiro e genuíno. — Eu adoraria.
— Descanse Hazel. Espero que você esteja se sentindo melhor
logo. E faça o que fizer, não deixe o idiota que fez isso com você escapar
impune.
Depois que Leah sai, tranco a porta do banheiro enquanto as
lágrimas rolam pelo meu rosto com a dor passando por mim. Quanto mais
o tempo passa, mais o soco no rosto começa a doer. O lado direito do meu
rosto está inchado e ficando mais preto e azul a cada segundo. Pareço
mamãe, e isso parte muito meu coração.
Charlie nunca colocou a mão em mim antes… ele nunca cruzou essa
linha porque mamãe sempre levava os golpes por mim. Agora, sei como ela
se sentia, o que ela passou, as lutas que ela teve.
A dor em meu peito não é apenas por mim – é por mamãe. Eu quero
tirá-la de lá. Preciso afastá-la daquele psicopata. Quem sabe com que tipo
de mentiras ele a está envenenando? Que tipo de drogas está injetando
nela sem que ela saiba? Charlie é desesperado para controlar as pessoas, e
mamãe torna tão fácil para ele reinar sobre ela, porque é muito fraca e tem
medo de lutar.
Naquela noite, não consigo pensar direito, porque estou com muito
medo do que irá acontecer com mamãe. Fico em meu quarto, não
querendo que Ian me veja em meu estado atual. Não consigo comer, não
consigo dormir e não consigo parar de chorar. Fico pensando em como
preciso tirar mamãe daquela situação terrível, longe de Charlie – ou pelo
menos tirar Charlie dela. Sei o suficiente sobre Charlie por Garrett e
mamãe, para ser capaz de armar para ele de alguma forma. Posso colocálo em problemas suficientes para que ele não possa mais puxar mamãe
para baixo. Não sei exatamente se meu plano funcionará – mas sei que
preciso tentar. Do contrário, mamãe não apenas perderá o filho que está
carregando, mas também a própria vida.
Então, tarde da noite, pego o telefone da casa de Ian e ligo para a
delegacia.
— Polícia de Eres. Como posso ajudar? — Uma voz cansada diz
através da linha.
— Olá, sim, gostaria de fazer uma denúncia anônima sobre um
grande tráfico de drogas que acontecerá nos próximos dias.
A voz baixa do outro lado da linha. — Connor, é você? Você está
brincando de novo?
— O quê? Não. Eu realmente tenho uma dica.
— Ok, — a pessoa diz, sem acreditar. — Fale logo. O que você sabe?
— Uma vez por mês, Charlie Riley distribui seus suprimentos para
seus homens levarem para outras cidades. Acontece bem na periferia de
Eres, na velha lavanderia da Wood Street com a Timber Avenue. Acontece
por volta das duas da manhã e deve acontecer daqui a dois dias.
Estou grata por Garrett ter ficado alto o suficiente para derramar
essa informação para mim todo aquele tempo atrás sobre por onde o
suprimento de Charlie entra e sai. Ele ficou tão tonto com o tio dando-lhe
mais liderança no – negócio – da família que ficou bêbado e drogado e me
contou tudo sobre isso durante uma de suas farras de videogame.
— E como você sabe disso?
— Confie em mim, eu simplesmente sei.
— Sim, ok, Connor, vamos investigar isso.
— Eu não sou Connor! — Argumento, passando minha mão contra
meu rosto. Eu realmente soo como um menino? Que diabos? — Olha,
apenas confie em mim. Na lavanderia é onde acontecem os negócios de
Charlie. Você encontrará tudo o que precisa lá. Certifique-se de levar
reforços também.
— Ok. Isso é tudo?
— Sim. — Mordo meu lábio inferior enquanto meu estômago
embrulha. — Isso é tudo.
— Ok. Lavanderia. Charlie Riley. Drogas. Entendi. Boa noite,
Connor.
A linha fica muda e respiro fundo quando meu pânico começa a se
acalmar e penso em como as coisas serão diferentes para mamãe em dois
dias. Em dois dias, ela não terá que escapar das mãos de Charlie. Em dois
dias, ele será arrastado por conta própria.
Ela não terá que tentar fugir dele nunca mais.
Desta vez, nós venceremos.
Dez anos atrás
– Vamos, Hazel, se apresse. Apenas pegue algumas coisas. — Mamãe
ordena enquanto me puxa da cama. Ela tem uma mala na minha cama e
está jogando algumas das minhas roupas nela.
O céu ainda está escuro quando bocejo. — O que está acontecendo,
mamãe? — O sol nem tinha nascido ainda, então não entendi.
— Estamos indo embora, querida. Estamos dando o fora daqui ok? —
Sua voz está tão baixa, e ela fica na ponta dos pés, como se não quisesse
que ninguém ouvisse seus sons.
Eu sei que é por causa de Charlie.
Mamãe sempre sussurra quando não quer que Charlie a ouça.
— Agora vamos e fique o mais quieta que puder, ok? — Ela pede.
— Estamos indo mesmo? — Eu pergunto, com minha voz tímida.
Mamãe tinha falado sobre deixar Charlie antes, mas nós nunca
realmente fizemos nossas malas para ir. Comecei a acreditar que sempre
estaremos sob o controle de Charlie, não importava o quanto quiséssemos
ir. Ele era mau com a mamãe e não gostava de como ele a fazia chorar.
— Sim, querida, realmente. Agora, pegue o que precisar, porque não
vamos voltar.
— Nunca?
Ela se abaixa na minha frente e afasta o cabelo do meu rosto. Ela tem
lágrimas nos olhos e isso me deixa triste. Odeio quando mamãe chora, e ela
chora muito ultimamente. — Nunca, nunca, baby. É isso. Estamos fugindo e
nunca mais olharemos para esta cidade. Ok? Só você e eu. Apenas nós
duas.
Pego meu bicho de pelúcia na minha cama e abraço perto de mim
enquanto coloco minha mão livre na de mamãe. — Ok.
— Pronta? — Ela pergunta.
— Pronta. — Respondo.
Eu estou pronta há tanto tempo que não posso deixar de sorrir ao
pensar em fugir com mamãe.
— Só nós duas, — murmuro para mim mesma enquanto me afasto
com mamãe segurando minha mão.
Isso é tudo que eu sempre quis.
— Você está chorando porque está triste?
— Não, querida. Estas são lágrimas de felicidade.
Lágrimas de felicidade.
Eu não sabia que as pessoas podiam chorar quando estão felizes.
Quando descubro isso, começo a chorar também.
9
IAN
— Vocês idiotas terminaram de ensaiar? Se for assim, posso te dar
uma carona para casa, James, — Leah diz, entrando no celeiro com o
mesmo sorriso que sempre está estampado em seu rosto.
— Você pode me dar uma carona para casa? Não está com meu
carro hoje? — Pergunta James. — Portanto, não seria eu te dando uma
carona para casa?
— Aí, tanto faz. Vamos. Preciso encher a cara de pipoca e ver um
filme na Netflix. — Ela acena para mim e para os outros caras. — Vocês
estão muito bem.
Eric assente. — Poderíamos soar melhor. Você está nos seguindo em
todas as plataformas de mídia social, Leah? Realmente adoraríamos o
apoio. — Eric é como um traficante de mídia social – sempre depois do
próximo, curta e siga.
— Claro que estou. — Leah sorri e caminha em minha direção. Ela
enfia as mãos nos bolsos do short e balança para frente e para trás em
seus chinelos. — Ei, Ian. Como é morar com Hazel?
Dou de ombros. — Nós realmente não nos cruzamos muito.
— Eu me formei com ela. Ela é uma pessoa muito legal. Quieta, mas
boa. Sabe, acho que ela é bem interessante depois que você a
conhece. Sempre foi muito inteligente na escola também. Aposto que às
vezes ela fica muito solitária.
Minha sobrancelha arqueia para a doce Leah. Sei que ela está
chegando a alguma coisa; portanto, gostaria que ela simplesmente
cuspisse. — O que você está tentando dizer, Leah?
Ela sorri brilhante como sempre e encolhe os ombros. — Só dizendo
– não te mataria conhecê-la. Ela passou por muitas coisas terríveis. Seria
bom se tivesse alguém legal com quem conversar às vezes.
— Não sou uma pessoa legal. — Digo a ela.
Ela revira os olhos da maneira mais dramática e me dá um tapinha
nas costas. — Sim, ok, Ian, e eu não sou viciada nas Kardashians. Não
pense por um segundo que esqueci quem apareceu por duas semanas
direto para jogar jogo da velha com minha avó quando ela estava no
hospital depois de quebrar o quadril.
— O que posso dizer? Eu adoro jogo da velha.
— Apenas seja legal com ela, idiota. Tenho a sensação de que ela
precisa de um amigo.
— Então você seja amiga dela.
— Isso está em andamento, mas por enquanto, ela precisa de um
amigo, seu colega de quarto. Alguém que está perto dela o suficiente para
abrir sua concha.
Faço uma careta, ainda inseguro, e Leah me dá mais uma revirada
dramática de olhos.
— Bem! Seja um idiota, mas apenas seja menos idiota, certo? Pare
de ser tão duro com ela no rancho.
— Sou duro com todos ao redor do rancho. — Murmuro. Um pouco
irritado com o que Leah quer dizer. Trato a todos da mesma forma por
essas bandas, e não gosto de como ela faz parecer que sou mais duro com
Hazel do que qualquer um dos outros trabalhadores do rancho.
Leah suspira, ficando cansada das minhas respostas da mesma
forma que estou ficando cansado das dela. — Tanto faz, Ian. Você trata
Hazel pior do que os outros. Eu vi a maneira como você manda nela,
quando provavelmente é uma das trabalhadoras mais esforçada deste
lugar. Quero dizer, inferno, ela trabalha mais do que meu irmão.
— Ei, me deixe fora disso! — James dispara enquanto empacota
suas coisas. — Mas ela não está errada. Hazel é uma ótima trabalhadora,
e às vezes você é duro com ela.
Bem, não há nada tão grandioso quanto ser repreendido pelos
irmãos escoteiros. A merda disso é que eles são duas das pessoas mais
legais que existem. Então, se eles têm problemas com a maneira como
estou tratando Hazel, provavelmente estão certos sobre isso. Verdade,
meus julgamentos baseados em Charlie podem ter afetado a maneira como
tratei Hazel no rancho, e ter Leah e James apontando esse fato para mim
me faz sentir como um grande idiota. Eu farei o meu melhor para manter
isso em mente e tornar as coisas um pouco mais fáceis para ela.
O que significa que tenho que me lembrar repetidamente que ela não
é o mesmo tipo de pessoa que Charlie é, simplesmente porque foi criada
pelo próprio diabo.
— Você deveria pegar leve hoje. Está muito quente para trabalhar
tanto. — Aviso a Hazel no dia seguinte, enquanto ela coloca feno na
traseira de uma picape. A temperatura está se aproximando de trinta
graus, e ela veste sua roupa sempre preta, com mangas compridas. Está
quente demais para esse tipo de roupa, especialmente quando Hazel
trabalha diretamente no sol. Ela até está com um moletom com capuz
como uma louca.
— Tudo bem. Eu cuido disso. — Ela murmura, com a voz baixa
enquanto limpa o feno. Não falou muito nas últimas horas, o que é
estranho. Normalmente, ela teria um comentário rude e sarcástico a fazer
para mim, mas não há nenhum para ser ouvido.
Nem mesmo zombou de mim na noite anterior sobre eu queimar o
jantar. Pensando bem, eu nem mesmo a tinha visto em casa. A porta do
quarto dela estava fechada e, embora eu a ouvisse se movendo, ela não
saiu. Quando acordei de manhã, ela já estava de saída para trabalhar na
fazenda.
— Não me diga que você ainda está chateada por eu não querer me
abrir com você sobre meus sentimentos e merdas naquela outra manhã?
— Ao contrário da crença popular, nem tudo é sobre você, Ian
Parker. — Ela retruca.
Eu deveria ter deixado isso – e sua atitude ruim – nisso. Ainda
assim, assistir o sol batendo nela está me deixando tonto. Merda, estou a
segundos de desmaiar por ela.
— Vamos lá, querida. Não seja estúpida. A insolação é uma coisa
real. — Eu a chamo de “querida”, apenas para tentar irritá-la, mas ela não
reage de forma alguma. Droga. O que há com aquela garota?
Ela puxa as pontas do capuz e limpa a garganta antes de voltar ao
trabalho. — Está bem. Eu estou bem.
— Pelo menos vá para os chiqueiros. Eu até te ajudarei lá. Ou faça
uma pausa para beber água. É também…
— Eu disse que estou bem! — Ela finalmente explode.
No momento em que ela se vira para mim, meu peito aperta. Seus
olhos estão vermelhos, como se ela tivesse chorado nas últimas horas, e
ela sua quilos e quilos de maquiagem. Claro, ela se maquia regularmente,
mas hoje parece que está fazendo um teste para RuPaul’s Drag Race22.
Eu nem sei por que, mas ver aquele nível de tristeza em seus olhos
quebra meu coração frio. — O que há de errado? — Eu insisto.
Ela balança a cabeça enquanto as lágrimas começam a dançar por
suas bochechas. — Nada. Estou bem.
— Você está mentindo.
— Deixe para lá, Ian.
— Não posso, querida.
22 RuPaul, a drag queen mais famosa do mundo, apresenta o concurso mais colorido da
televisão. As concorrentes precisam ser divas com muito glamour para ganhar o cobiçado
título de Drag Queen Superstar.
Ela separa os lábios para talvez me repreender, o que me fará sentir
um pouco melhor sobre seu estado atual. Se ela tem o suficiente para me
xingar, então não está muito longe de seu jeito chato de sempre.
Mas, em vez de falar, seus olhos se cruzam e ela larga o forcado em
suas mãos. Quando cai no chão, vejo seu corpo balançar para frente e
para trás.
Porra.
Ela vai desmaiar.
Seus olhos começam a rolar para trás em sua cabeça, e corro até
ela, pegando-a bem a tempo antes de ela cair. Ela desmaia em meus
braços, seu corpo ficando mole contra mim. Eu a levanto, corro na direção
da casa e continuo repetindo as mesmas palavras sem parar.
— Eu peguei você, querida, — murmuro. — Tudo bem.
No momento em que chegamos em casa, Hazel está acordando, e eu
rapidamente a jogo no chuveiro e corro água fria em seu corpo. A sensação
de frio a acorda rapidamente enquanto ela grita de horror.
— Oh, meu Deus, que frio! — Ela grita, estremecendo com as gotas
de gelo que atingem seu corpo. Ela esfrega as mãos para cima e para baixo
nos braços enquanto se senta na banheira.
— Bom, — eu resmungo. — Eu disse que estava muito quente para
estar lá fora naquele sol.
Ela estende a mão para desligar a água e estremece. — Estou bem.
— Você não está. Precisa de água para se recuperar do calor. Tenho
alguns energéticos na geladeira. Aqui, uma toalha para se secar. — Agarro
a mais próxima do gancho e estendo para ela. Ela rapidamente começa a
enxugar a água do rosto e com a água vai sua maquiagem.
— O que diabos aconteceu com o seu rosto? — Grito, horrorizado
com os hematomas que são revelados quando ela removeu a maquiagem.
Seus olhos se arregalaram e ela se afasta de mim. — Não foi nada.
Coloco minhas mãos em seus ombros e viro suas costas para me
encarar. — Besteira. Isso não é nada. Parece que alguém deu um soco na
sua cara.
A maneira como seus olhos lacrimejam me faz perceber que foi
exatamente o que aconteceu.
Puta merda.
Alguém deu um soco na cara dela.
— Quem fez isto com você? — Pergunto, minha voz tensa de
raiva. Eu nem sei de quem diabos estou com raiva, mas estou chateado. —
Foi um homem?
Ela assente lentamente.
— Diga-me quem, — ordeno.
As lágrimas começam a cair mais rápido do que nunca pelo seu
rosto enquanto ela balança a cabeça para frente e para trás. — Está
bem. Estou resolvendo. — Ela tenta se levantar e tropeça um pouco, ainda
sem equilíbrio, e eu a pego em meus braços. Ela me dá um sorriso
quebrado. — Você é bom nisso.
— Em quê?
— Em me pegar.
— Bem, seria melhor se você parasse de cair.
— Confie em mim, — ela solta um suspiro pesado. — Estou
tentando.
Eu não sei o que dizer sobre isso, porque parece muito
comovente. Eu quero a Hazel Stone sarcástica e rude de volta. A triste me
dá vontade de chorar ao lado dela.
— O que posso fazer por você? — Pergunto, com minha voz falhando
enquanto olho para seu olho inchado. Que tipo de idiota coloca as mãos
em uma mulher? Que tipo de bastardo fraco faz uma coisa tão fodida? Eu
sei quem – meu pai. Lembro-me de vê-lo atacar minha mãe em sua fúria
bêbada quando eu era criança. Lembro-me dos hematomas de mamãe e
como ela tentou escondê-los com maquiagem – da mesma forma que Hazel
fez.
Eu quero matá-lo.
Nem sei quem ele é, mas quero seu sangue.
Hazel tenta o seu melhor para continuar sorrindo em meio à dor. —
Bem, primeiro, uma bebida, — diz ela. — E então a noite, vodca.
Eu levanto uma sobrancelha. — Você não é muito jovem para beber?
— Sim. — Ela assente. — Mas eu tive um dia muito ruim.
Bem, ok então.
Será vodca. Depois do energético.
Se há o prêmio de maior peso leve do mundo, será para Hazel. Ela
tomou três shots sob minha supervisão, junto com uma bebida mista, e
está dançando em círculos na sala de estar. Cantarola uma melodia que
eu não consigo identificar, mas de alguma forma parece perfeita.
— Por que você não bebe também? — Ela me pergunta, levantando
uma sobrancelha enquanto se joga no sofá.
— Não estou com vontade de beber esta noite.
— O quê? Claro que você está com vontade de beber esta
noite. Todos deveriam estar se sentindo bem para beber todas as
noites. Beber é divertido, — ela exclama.
Sento-me no lado oposto do sofá. — E quantas vezes você já bebeu?
— Oh, psh. — Ela franze os lábios e solta um suspiro pesado. —
Contando hoje?
— Uh-huh.
Ela ergue dois dedos e então os estuda com um olhar
perplexo. Então deixa cair um dedo. Eu não posso deixar de rir, porque ela
deixou o dedo médio levantado sem nem mesmo saber.
Hazel Stone está oficialmente participando de seu primeiro
experimento com a bebida e está oficialmente com uma cara de merda.
— Você sabe do que eu sinto falta? — Ela pergunta, esfregando as
costas da mão contra a boca.
— Do que?
— Do galpão.
Eu rio. — Sou tão mau companheiro de quarto que você prefere
morar em um galpão?
— Não. — Ela dá uma risadinha, e parece fofo. — Só quero dizer que
sinto falta de olhar para as estrelas e o céu através do teto. Amo as
estrelas e a lua. Isso me faz perceber que há muito mais do que meus
problemas por aí.
— Você é o tipo de pessoa que faz pedidos às estrelas?
— Eu sou o tipo de pessoa que deseja tudo. — Ela inclina a cabeça
na minha direção. — É sempre tão bom assim? Ficar bêbado?
— Depende. Não posso beber whisky, porque me deixa triste.
— Por que diabos você tem que ficar triste? Você canta como um
deus, vive sem pagar aluguel e seus avós são incríveis! Além disso, você é
H-A-W-T23. Hawt. Tipo, se eu não soubesse em quantas mulheres você
colocou seu pênis, pensaria em você colocar seu pênis em mim também,
sabe, se eu deixasse as pessoas colocarem seu pênis em mim.
As palavras saem de sua língua com tanta facilidade, e sei que se ela
estivesse sóbria, se chutaria por dizer essas coisas em voz alta.
Não significa que eu não posso me divertir um pouco com isso.
— Oh. Você acha que eu sou HAWT? — Pergunto.
— Sim, eu sei. Se eu fosse portador de um tesão feminina, ela ficaria
erguida todos os dias quando estou perto de você. Mesmo quando você é
mau para mim.
23 Gíria americana para atraente, gostoso.
Faço uma careta. — Lamento ter sido mau com você, Haze. —
Quanto mais eu a observo em seu estado de embriaguez, mais a culpa me
atinge por ser tão rigoroso em relação a ela.
— Está bem. Estou acostumada com as pessoas sendo más comigo.
Isso me faz sentir uma merda completa. Passo meu polegar contra
meu nariz e me aproximo dela.
— O que você está fazendo? — Ela pergunta nervosamente.
— Checando seu hematoma. Posso? — Pergunto, com minha mão
pairando no ar.
Ela assente lentamente.
Meus dedos pousam em sua bochecha, e ela não vacila com o
toque. Apenas continua cantarolando para si mesma.
— Isso dói?
Ela balança a cabeça. — Não sinto nada além de bem.
— Outro efeito colateral da bebida.
— Por que você foi tão mau comigo? — Ela pergunta, com seus olhos
verdes me perfurando.
— Porque sou um idiota. — Confesso. — Tenho alguns problemas
com o seu padrasto.
Seus dedos se movem por cima dos meus, que ainda estão
descansando em sua bochecha, e ela fecha os olhos. — Ele não é meu pai.
— Ele fez isso com você? — Sussurro, com um pouco de medo de
dizer mais alto. Eu não sei por que, mas a ideia de Charlie machucar Hazel
me dá vontade de vomitar.
Ela assente lentamente. — Ele é um monstro.
— Eu sei.
E eu irei matá-lo.
— Os hematomas da mamãe estão piores, — ela diz suavemente
enquanto passa a mão pelo cabelo cor de carvão. — Ela não tem como
escapar dele, e ele a machuca muito mais do que jamais me machucou.
— Por que ela não o deixa?
— Ela tentou, uma e outra vez. Ele sempre a encontra e a puxa de
volta. — Lágrimas caem por seu rosto e ela balança a cabeça enquanto eu
as enxugo. — A vodca pode deixar as pessoas felizes e tristes?
— É possível.
— Mas não quero mais ficar triste. Eu quero ficar feliz.
— Você ficará, — prometo. — Às vezes só leva tempo para chegar à
canção feliz.
— Quando você vai escrever canções felizes?
Solto uma risada. — Na verdade, estou procurando contratar uma
garota para me ajudar no final da letra.
Ela empurra a língua na bochecha e estreita os olhos. — Aposto que
ela é muito bonita.
— Ela não tem ideia do quanto, — gentilmente respondo. — Com e
sem maquiagem.
Ela se endireita um pouco mais, aparentemente surpresa com
minhas palavras.
— Obrigada.
— Posso perguntar por que você usa tanta maquiagem?
Hazel passa as mãos pelos cabelos novamente e encolhe os
ombros. — Isso é por causa de Charlie também. Quando eu era mais
jovem, por volta dos quatorze anos, costumava usar sempre uma regata e
shorts pela casa. Uma noite, quando Charlie estava bêbado, ele entrou em
meu quarto e fez comentários sobre como ele queria tocar meu
corpo. Sobre como eu estava exibindo isso para ele com minha pele
morena. Então comecei a me vestir com pesadas camadas de roupas e
maquiagem para afastá-lo.
Eu me sinto mal do estômago quando ela me diz isso. Que tipo de
psicopata é Charlie? Se eu tinha planos para matá-lo antes, agora estou
furioso com a necessidade de estrangular o bastardo.
Tal suavidade cai sobre ela quando ela olha na minha direção. —
Ian?
— Sim?
— A Hazel bêbada gosta muito de você.
Eu rio. — Vamos trabalhar para que a sóbria Hazel goste de mim
também.
— Isso é bastante fácil. — Ela boceja na minha cara, sem se
preocupar em cobrir a boca. — Basta dizer oi para mim às vezes, e ajuda
se você tirar a camiseta também.
Maldição! Como eu tratei alguém como Hazel como merda por tanto
tempo? Se eu tivesse puxado minha cabeça para fora da minha própria
bunda, teria percebido que não há nada nela que se pareça com
Charlie. Ela é o oposto completo, na verdade. É carinhosa, engraçada,
bonita e gentil.
Cristo. Que idiota de merda eu fui.
— Ei, Ian?
— Sim?
— Eu vou vomitar agora.
Passo os últimos dez minutos segurando o cabelo de Hazel para trás
enquanto ela vomita no banheiro. Enquanto murmura sobre como ela
nunca beberá de novo, sorrio para mim mesmo, pensando em todas as
noites ruins de bebedeira em que disse exatamente essas mesmas
palavras.
Quando ela termina seu violento ataque no banheiro, ela se deita no
chão e se enrola em posição fetal. — Vou dormir aqui, — ela murmura.
Eu rio enquanto me abaixo para levantá-la em meus braços. — Não.
Não… vai dormir na sua cama.
— Eu durmo na sua cama, — ela repete, aninhando-se em meus
braços.
Não é exatamente certo.
Depois de deitá-la na cama, coloco um balde para vômitos no chão,
só por precaução, e depois a acomodo.
Ela levanta seus braços e os envolve ao redor do meu pescoço,
puxando-me para um abraço. — Obrigada, melhor amigo, — sussurra,
antes de se jogar contra o travesseiro. Quando me viro para ir embora,
Hazel murmura um pouco mais. — Eu tenho que ajudá-la.
— Ajudar quem?
— Mamãe. Eu tenho que tirar ela e o bebê de lá. Eu tenho que
ajudar, — ela diz com os olhos fechados enquanto começa a cair em um
sono profundo.
Eu não tenho certeza se ela sane o que está dizendo, mas digo: —
Vou ajudá-la com isso, Haze.
— Promete? — Ela sussurra.
— Prometo, — respondo.
10
HAZEL
O que é esse som excruciante?
É um galo? Um galo está honestamente gritando do lado de fora da
minha janela enquanto minha cabeça lateja como se fosse explodir?
Por que minha boca está tão seca?
Por que eu me sinto tão enjoada?
— Cock-a-doodle-doooo! – O Sr. Galo grita, fazendo-me empurrar um
travesseiro sobre meu rosto. Eu odeio como o galo está acordado e feliz,
como se não tivesse bebido toda a vodca da terra na noite anterior.
Vodca.
Ugh. Foda-se a vodca.
Meus olhos se abrem com cautela quando me apoio nos
cotovelos. Eu gemo quando meu estômago embrulha. Só então, o som
doloroso da campainha tocando dispara. Quando continua apitando,
arrasto-me do meu quarto para atender, visto que Ian não tem planos de
chegar até a porta.
Abro enquanto a luz do sol irradia em minha direção. Eu nunca me
senti mais como um vampiro em minha vida, e quando noto uma mulher
parada ali com uma cesta de guloseimas, imediatamente me sinto mal por
sibilar na cara dela.
Ela não franze a testa com a minha reação insana à luz, no
entanto. Sorri abertamente e inclina a cabeça para a esquerda. — Tenho
desejado passar por aqui para conhecê-la, — diz ela, entrando na casa. E
coloca a cesta de coisas na mesa e então se vira para mim e estende a mão
para um cumprimento. — Você deve ser Hazel. Sou Holly, avó de Ian.
A mulher para quem eu acabei de assobiar é a avó de Ian.
Que ótima primeira impressão.
Passo a mão pelo rosto e me encolho um pouco quando acerto o
hematoma. Esqueci que estava lá, e agora Holly olha para mim e minha
pele massivamente machucada. Estendo minha mão e aperto a dela.
— Desculpe, estou só acordando. Normalmente sou melhor nas
primeiras impressões. — Aliso minhas mãos sobre o meu pijama – pijama
que eu não me lembro de ter colocado – e dou a ela um sorriso tenso.
— Oh, querida, não se preocupe com isso. Você está bonita. — Ela
sorri tão brilhantemente que eu não posso deixar de sorrir também. Nunca
vi uma expressão tão genuína em toda a minha vida.
Holly é tão bonita sem esforço. Ela tem longos cabelos prateados que
estão presos em um rabo de cavalo e olhos que combinam com os de
Ian. Embora ela seja muito mais baixa do que Big Paw, mantém a cabeça
erguida. É esguia e fica mais ereta do que a maioria das pessoas da minha
idade.
Se eu não soubesse melhor, teria assumido que ela está no final dos
sessenta anos – não oitenta.
— Se você está procurando por Ian, parece que ele não está aqui, ou
talvez ainda não tenha levantado, — informo a ela.
Ela balança a cabeça. — Ah, não. Eu sei disso. Ele é quem me
ligou. Já está trabalhando no rancho e…
Meus olhos se arregalam de puro pânico. — Oh, meu Deus, que
horas são? Eu deveria estar no rancho trabalhando! — Sei que se Big Paw
descobrir que estou atrasada, estarei desempregada em um piscar de
olhos. — Sinto muito, Holly, eu tenho que ir…
Ela coloca a mão no meu braço e balança a cabeça. — Não, está
bem. Ian disse que você não está se sentindo bem hoje, então ele assumiu
suas tarefas.
Uma onda de alívio e choque percorre meu sistema. — Ele está
chateado? Que ele tenha que assumir essas tarefas?
— Senhor, não. Na verdade, ele me enviou para ver como você está e
se certificar de que coma um pouco de comida e um café. — Ela ergue uma
sobrancelha. — Você bebe café, certo?
Eu sorrio, sentindo o alívio cair sobre mim quando minha ansiedade
é substituída por conforto. — Claro.
— Ótimo. — Holly vai até sua cesta, tira alguns ibuprofenos e uma
garrafa de água e me entrega. — Agora tome isso e tome um banho, e
quando terminar, terei um café da manhã pronto para você.
Agradeço por sua gentileza e saio para entrar no chuveiro.
Entendo porque as pessoas bebem para esquecer. Ontem à noite, eu
me senti livre do peso das lutas de mamãe por uma fração de segundo. Eu
precisava daquela pausa para parar de sentir tudo tão fortemente. Mas,
infelizmente, não sou um daqueles humanos que esquece tudo o que
acontece quando bebem.
Não. Eu me lembro de tudo.
Especialmente as partes em que eu chamei Ian de – HAWT – e falei
sobre o tesão feminino que sinto por ele. Poxa. Na próxima vez que o vir,
tenho certeza de que estarei com cinquenta tons de vermelho de
humilhação.
Depois do banho, considero colocar maquiagem para cobrir meu
hematoma, mas como Holly já havia notado, não vejo muita razão para
fazer isso.
A casa tem um cheiro celestial, como se um Top Chef tivesse vindo
para preparar uma refeição para mim. Ao entrar na sala de jantar,
encontro Holly preparando dois pratos cheios de bacon, ovos e batatas
caseiras. Minha xícara de café está cheia até a borda e meu estômago
começa a dar cambalhotas de excitação.
— Isso parece e cheira incrível, — comento enquanto me sento.
Ela sorri. — O melhor remédio para a ressaca é cozinhar em casa, —
exclama. — Tive que cozinhar muitas dessas refeições para Ian e seus
melhores amigos ao longo dos anos.
— Ele tem sorte de ter você.
— Tenho sorte de tê-lo. Ele e Harry são minhas duas maiores dores
de cabeça. Só Deus sabe como lidei com seus humores rabugentos, mas
no fundo, aqueles dois são ursinhos de pelúcia. Eles constroem paredes
para evitar se machucar; isso é certo. Eu sou um dos poucos sortudos que
eles deixaram ver seu lado gentil.
— Então, eu não devo tomar o lado mal-humorado deles para o lado
pessoal?
— Céus, não. É apenas a sua parede de proteção contra se
machucar. Depois que minha filha e meu genro partiram, Harry e Ian
tiveram dificuldades. Ter alguém tão importante para eles partindo sem
um adeus realmente machucou seus corações. Meus meninos são
sensíveis. Mais do que a maioria das pessoas. Eles têm medo de se
machucar, então fingem que nada os magoa.
— Isso deve ser solitário.
— Sim. — Ela assente. — Eu me preocupo mais com Ian. Ele é tão
fechado e não deixa ninguém perto o suficiente para mostrar a ele
qualquer tipo de conforto – fora seus companheiros de banda. Mas então
ele tocou sua música para mim e eu vi uma faísca dentro dele que não via
há algum tempo.
— O que você quer dizer? O que você quer dizer com ele tocou minha
música para você?
— Aquela que você o ajudou a escrever. Ele veio e tocou para mim e
Harry, e ficamos maravilhados. Eu não o tinha visto investindo em sua
música há tanto tempo, e essas letras… — Ela pressiona as mãos contra o
peito e balança a cabeça com espanto. — Nunca ouvi meu neto cantar
palavras tão bonitas em toda a minha vida. Então, obrigada por isso.
— Pelo quê?
— Ajudando-o a encontrar sua voz. Ele está procurando há anos e,
pela primeira vez na vida, parece que descobriu algo, e acho que tem muito
a ver com você. Você é realmente talentosa com a escrita.
Sinto meu rosto ficar vermelho e me mexo na cadeira. — Ele é um
cantor incrível, só isso, — eu digo.
— Sim. — Ela estende a mão e coloca-a em cima da minha. — Mas o
que é um cantor sem palavras bonitas para cantar? Só estou dizendo que
você é boa para ele, mesmo que ele finja que não é. Além disso, acho que
se preocupa com você também, apenas pelo que disse quando ligou
pedindo para eu passar aqui.
— O que ele disse?
— Para ter certeza de que você esteja bem. Que ele precisava que
você ficasse bem.
E assim, meu coração salta com as palavras de Ian Parker.
Holly se inclina para frente e coloca as mãos no meu rosto
machucado. — Quem te machucou, querida?
Fecho meus olhos e respiro fundo. — Charlie, o namorado da minha
mãe.
— Isso dói?
— O hematoma? Um pouco menos do que antes.
— Não. Sua alma. Isso dói?
Engulo em seco. — Sim.
Ela enxuga uma lágrima caída do meu olho antes de sorrir aquele
sorriso gentil para mim. — Meu namorado antes de Harry costumava usar
suas mãos contra mim. Ele me machucava em lugares onde as pessoas
não podiam ver. Do lado de fora, parecíamos felizes. Por dentro, eu estava
morrendo. Foi quando ele deixou uma grande marca no meu rosto que eu
soube que precisava parar o ciclo de abuso. Eu me senti humilhada. Usei
muita maquiagem para tentar esconder os hematomas; então encontrei
uma maneira de sair. Com o tempo, os hematomas externos sararam, mas
os hematomas na minha alma demoraram muito mais. Então, quando
descobri que o marido da minha filha estava fazendo o mesmo com ela,
fiquei com o coração partido. Nenhum homem de verdade deveria colocar a
mão em uma mulher, exceto para mostrar a ela seu amor. Odeio que
alguém tenha feito isso com você. Eu odeio que alguém te machuque.
— Eu me preocupo muito com minha mãe, — sussurro, minha voz
tremendo. — Ela tem tantos hematomas, tanto por dentro quanto por fora,
e eu não os vejo sempre se curando com ela tão enrolada no dedo de
Charlie. Ele é tão abusivo com ela, e eu odeio isso. Odeio como ele a magoa
e odeio como ela fica. Eu odeio como ela cai nas drogas para cobrir sua
dor. Quase escapamos muitas vezes, mas ela sempre encontra seu
caminho de volta para o lugar tóxico. Eu odeio que ela seja tão fraca.
— Não, não, não. Ela está perdida, não fraca. Eu vi as drogas
tomarem conta da minha Sarah; eu vi como eles a transformaram em
alguém que ela não era. A mente de sua mãe está perdida e Charlie está
usando esse fato para controlá-la.
— E se ela nunca encontrar o caminho de casa de novo?
— Não desistimos das pessoas até elas encontrarem o caminho de
casa. Faz anos que minha filha e Brad fugiram juntos, mas quer
saber? Todas as noites, mantenho a luz da varanda acesa, para o caso
deles encontrarem o caminho de casa novamente. E eu os receberei de
braços abertos. Você sabe por quê?
— Por quê?
— Porque eu já estive perdida antes. Só porque não caí nas drogas
nem nada, não significa que sou melhor do que eles. Todos merecem um
lar para onde encontrar o caminho em algum momento de suas
vidas. Pode não acontecer tão cedo quanto você gostaria, mas se o coração
deles ainda estiver batendo, há uma chance de que possa acontecer.
— O que fazemos nesse meio tempo? — Eu pergunto.
— Bem, querida, oramos pelos perdidos. — Ela me dá um sorriso
tenso. — E deixamos a luz acesa à noite.
Ela segura meu rosto com as mãos e continua sorrindo. Puxa, eu
nunca soube que um sorriso pudesse curar até que Holly olhou na minha
direção. — Mas, por favor, saiba disso. Se Charlie colocar a mão em você
novamente, isso será o fim da vida dele.
Eu rio e enxugo minhas últimas lágrimas. — Por que isso? Você vai
lutar com ele?
— Não. — Ela balança a cabeça. — Essas foram as palavras de Ian,
não minhas. Ele disse que se Charlie se aproximar de você novamente, ele
não viverá o suficiente para se arrepender de suas ações.
Ian Parker está me defendendo, e isso é o suficiente para fazer a dor
na minha cabeça começar a desaparecer lentamente.
— Você me cobriu hoje, — eu digo enquanto Ian entra pela porta da
frente depois de um longo dia de trabalho. Sei que ele teve um longo dia,
porque tenho noção das tarefas que estavam na minha lista de afazeres.
— Eu fiz, — responde ele, esfregando as costas da mão contra a
testa. Ele parece esgotado e exausto.
Dou a ele um sorriso. — Eu lhe devo.
— Bem, na verdade, eu devia a você – por me ajudar com a música
alguns dias atrás. Mesmo que você tenha sido atrevida sobre isso, você me
ajudou muito.
— Para começar, a letra principal era sua. Eu apenas ajudei como
pude.
— Você mudou para melhor, o que me leva ao próximo problema em
questão – e, acredite, é doloroso dizer o seguinte: você estava certa.
— Eu estava certa sobre o quê?
— Eu tendo uma parede e preciso quebrá-la para colocar melhor
minhas emoções para minha música. Os caras concordaram depois de
ouvir a música.
Um sorriso malicioso aparece em meus lábios. — Você cantou a nova
música para sua banda?
— Sim. Todos eles adoraram. Então eu preciso que você me ajude.
— Ajudar você?
Ele assente. — Preciso que você me ajude a criar mais
músicas. Olha, eu sei que sou um idiota, e fui um idiota com você desde o
início, mas inferno… Farei qualquer coisa para que você me ajude com
essa merda de emoções, porque não entendo, e parece que você entende.
Meus olhos se estreitam quando cruzo os braços. — E o que eu
ganho com este negócio?
— Eu não sei. Você pode esfregar na minha cara e zombar de mim
pelo resto da eternidade?
— Bem, isso parece satisfatório, mas eu quero mais uma coisa.
— E o que é isso?
— Você me ajuda no chiqueiro. Pega metade deles para limpar.
Ele geme. — Eu sou mais um supervisor dos currais. Não os limpo
há anos. — Essa é uma das vantagens de ser gerente no Rancho Eres, eu
acho. Você distribui os trabalhos, mas não precisa se meter muito fundo
no trabalho sujo. Mas se Ian quiser minha ajuda, ele terá que descer ao
meu nível.
— Bem, essa é a minha condição. Eu te ajudo com a letra se você me
ajudar nos currais, quer muito aquele seu sonho, Ian?
Eu posso dizer pelo seu olhar o quanto ele quer.
Realmente muito.
Estendo minha mão em sua direção e sorrio. — Nós temos um
acordo?
Há um momento de pausa até que ele se aproxima de mim e aperta
minha mão.
— Combinado. Apenas me prometa uma coisa.
— E o que é isso?
— Nada de tesão de senhora nos currais.
Se meu rosto pudesse ficar mais vermelho, eu seria um tomate
maldito.
— Confie em mim, vamos ficar bem. Mas antes de continuarmos,
você pode dizer uma coisa de novo?
— Que coisa?
Empurro minha língua na minha bochecha. — Que eu estava certa.
Ele revira os olhos com tanta força que tenho certeza de que irá
prejudicar sua visão. — Cale a boca, querida.
Antes que eu possa responder a seus comentários, a campainha toca
e Ian se apressa para atender. — Posso ajudar? — Ele pergunta.
— Sim, dizem que Hazel Stone está morando aqui, — diz uma voz
profunda, me fazendo olhar para a porta da frente.
Garrett está lá todo de preto, parecendo mal-humorado como
sempre. Meu estômago embrulha quando nós dois fazemos contato
visual. Um fogo arde em seus olhos, em segundos, ele invade a casa de Ian
e agarra meu braço. Seu aperto é forte. Muito apertado.
— Que diabos, Garrett? Solte-me, — eu sibilo, tentando puxar meu
braço livre, mas ele não o deixa ir.
— Ouvi um boato louco hoje, — ele zomba, com sua voz revestida de
raiva e álcool. — Parece que alguém delatou Charlie. Você não saberia
nada sobre isso, não é?
Meus batimentos cardíacos aceleram enquanto tento arrancar meu
braço de seu aperto, mas não consigo. — Não, — eu minto, sentindo
minhas emoções crescendo mais e mais a cada segundo que passa.
Meu plano… funcionou. Realmente funcionou.
— Por que eu sinto que você está mentindo agora? — Ele pergunta.
— Deixe-me ir, — ordeno mais uma vez, me encolhendo em seu
aperto forte contra mim.
— Ele é meu tio, minha família. Todos nós éramos uma família, e
você foi e fodeu tudo.
— Ele bateu nela! Ele batia na minha mãe o tempo todo, Garrett. Ele
ia matá-la! — Eu choro, principalmente por causa dessa verdade, um
pouco pela dor de seus dedos cavando mais fundo em minha pele. O que
está acontecendo? Garrett não é como Charlie. Ele nunca me machucou
fisicamente, apenas mentalmente; ele nunca colocou as mãos em
mim. Não até agora. Agora, ele parece tão selvagem nos olhos que eu mal o
reconheço.
— Sim, bem, às vezes uma cadela precisa ser tratada.
O ácido sobe do meu estômago e senta-se na minha garganta
enquanto construo força suficiente para empurrá-lo para longe de mim. —
Vai se foder, Garrett.
— Eu te fiz um favor dando a você um minuto do meu maldito
tempo. Você acha que qualquer outra pessoa toleraria namorar sua bunda
nojenta? E então você vai em frente e acaba com a única família que você
já teve. Apenas três pessoas nesta cidade fora Charlie sabiam sobre o local
de entrega. — Ele agarra meus dois pulsos em sua mão desta vez e me
puxa para mais perto de seu corpo, pressionando-se contra mim. Sua
quente, intoxicada respiração roça minha bochecha enquanto lágrimas
queimam no fundo dos meus olhos. — Você sabe o que acontece com os
delatores, Hazel Stone?
Parece uma ameaça, mas sei que é mais. Garrett não veio de uma
família que oferece ameaças vazias. Sempre acabam sendo mais como
promessas.
Antes que eu possa responder, Ian corre e empurra Garrett, batendo
seu aperto para longe de mim.
— O que…? Cai fora, — Ian ordena, com seu peito subindo e
descendo.
Garrett cambaleia um pouco para trás, pego de surpresa. No
entanto, quando recupera o equilíbrio, arregaça as mangas e dobra o
pescoço. — Sabe, estou farto de vocês, fodidos mauricinhos, pensando que
são donos desta cidade. Hazel e eu estávamos tendo uma conversa que
não é da sua conta.
— Sim, bem, parecia que Hazel não estava realmente com humor
para conversar e, vendo como está acontecendo na minha casa, isso faz
com que seja da minha conta.
As mãos de Garrett formam punhos, e ele se aproxima de Ian. —
Bem, se ela não quer conversar, talvez você e eu devêssemos ter uma
conversa, idiota.
Ian arregaça as mangas. — Adoraria ouvir o que você tem a dizer.
— Vocês, parem. Por favor, — eu imploro, me colocando entre os
dois. — Apenas saia, Garrett.
Ele bufa. — Tudo bem, mas não pense que terminamos aqui,
Hazel. Você vai ouvir falar de mim novamente.
Só esse pensamento me apavora.
Quando ele começa a se afastar, se vira e liga e desliga o isqueiro em
sua mão. — Qualquer que fosse seu plano de delatar Charlie, deu
errado. Ele não foi o único preso, sua idiota. Sua mãe também estava
lá. Então, parabéns. Você também prendeu sua mãe.
11
IAN
— Você quer falar sobre isso? — Pergunto, batendo na porta fechada
do quarto de Hazel. Desde que aquele cara Garrett foi embora, ela se
trancou em seu quarto.
Eu ainda estou tentando juntar todas as peças, mas ouvir Hazel
soluçar do outro lado da porta é triste ‘pra’ caralho. Nos últimos dias, sua
vida parece estar em completa turbulência, e eu não tenho a mínima ideia
de como ajudá-la.
Mas se ela precisar de alguém para conversar, eu sou todo ouvidos.
— Estou bem, — ela funga. Suas fungadas são razão suficiente para
eu saber que ela está mentindo. — Só preciso dormir um pouco.
Eu não a conheço bem o suficiente para pressioná-la, mas cara, eu
quero. Quero ter certeza de que ela está bem e dar a ela tudo que ela possa
precisar para se sentir um pouco melhor, mas tenho a sensação de que ela
não sairá daquele quarto tão cedo. Então dou a ela as únicas palavras que
posso pensar.
— Eu teria feito o mesmo se fosse minha mãe, — ofereço. — Sei que
qualquer que seja o seu plano não saiu como esperado, mas eu teria feito a
mesma coisa. Pense desta forma – enquanto sua mãe estiver presa, Charlie
não poderá chegar até ela e ela não terá mais problemas. É uma chance
para ela recomeçar.
Lembro-me de quando meus pais costumavam sumir, torcia que a
polícia os pegassem. Dessa forma, eles teriam um lugar para dormir
naquela noite, e eles não poderiam ter mais problemas.
— Haze, — suspiro com minhas mãos pressionadas contra a porta
de madeira, — se você precisar de alguma coisa estou ao lado.
Um suave obrigada é tudo que ouço antes de me afastar para dar a
ela algum espaço para pensar e refletir. Tenho a sensação de que ela ficará
acordada a noite toda, pensando e refletindo muito.
Eu teria feito a mesma coisa.
Quando a porta se abre, fico surpreso ao ver uma Hazel de olhos
inchados olhando na minha direção. Estava convencido de que ela não
sairia até de manhã. — Você sabe o que ajudaria a tirar minha mente de
tudo?
— O que é isso?
— Se fizéssemos música juntos. Só preciso de uma distração e acho
que escrever músicas com você pode ajudar.
— Claro. Podemos ficar na sala de estar e começar a mexer em
algumas coisas nas quais venho trabalhando – e falhando. Vou pegar meu
violão e algumas canetas e papel, e te encontro lá.
— Ok, parece bom.
Começo a me afastar – e congelo ao sentir dois braços me envolvendo
por trás. Olho por cima do ombro para ver Hazel segurando-me como se eu
fosse sua preciosa vida, e levanto uma sobrancelha.
— Desculpe, — ela murmura, ainda se segurando em mim. — Eu só
preciso de algo em que me segurar por um segundo.
— Continue. — Eu me viro para encará-la e puxo-a para um abraço
apertado. — Somos dois.
Ficamos acordados bem depois das duas da manhã juntos, fazendo
letras que às vezes funcionavam e outras não. Hazel me fez perguntas que
são difíceis para minha alma responder – eu não sou de cavar fundo com
minhas emoções – mas tento o meu melhor para fazer isso por ela, porque
se alguém está tendo um dia horrível, é Hazel. Ela não precisa que eu seja
duro enquanto tenta me ajudar.
— Qual foi o dia mais difícil da sua vida? — Ela me pergunta,
deitada no sofá enquanto eu me sento em sua frente com um caderno em
minhas mãos.
— Essa é fácil. Quando meus pais me abandonaram.
Ela inclina a cabeça e olha para mim com os olhos mais genuínos. —
Conte-me sobre isso.
Engulo em seco. Foi o pior dia da minha vida e não gosto de falar
sobre isso. Embora tenha acontecido quase quatorze anos atrás, ainda
parece ontem. Mas, novamente, por ela, eu tentarei. — Eles disseram que
iam sair para comer e eu tinha idade suficiente para ficar em casa sozinho
por um tempo. Então, passei o dia todo os esperando voltarem para
casa. Quando amanheceu, comecei a ficar nervoso, mas ainda esperava,
porque não importava o que acontecesse, eles sempre voltavam para casa.
— Eu coço meu queixo e limpo minha garganta. — Exceto que desta vez,
eles não voltaram. Fiquei sentado naquela casa sozinho por 48 horas antes
que Big Paw e Vovó vieram e me encontraram. Lembro-me da vovó
desmoronando e chorando. Eles me acolheram imediatamente e meus pais
nunca mais voltaram.
— Você foi deixado esperando sozinho? Isso de ter sido horrível.
— Foi. É provavelmente a razão pela qual odeio ficar sozinho, mas
por incrível que pareça, eu afasto as pessoas, então sou forçado a ficar
sozinho.
— Por que você afasta as pessoas?
— Porque então eles não podem me deixar.
Ela franze a testa e, caramba, isso quebra meu coração. — Lamento
que tenha acontecido com você, Ian. Mas você fez um ótimo trabalho ao
crescer.
Eu rio. — Sou um idiota.
— Apenas na superfície. Por dentro, acho que você ainda é aquele
garotinho magoado que está tentando o seu melhor para sobreviver.
Agora é a minha vez de franzir a testa enquanto bato minha caneta
contra o caderno. — Garotinho machucado… Garotinho
machucado… como um menino perdido. Foi assim que me senti durante
toda a minha vida. Perdido.
Hazel sorri, percebendo que a inspiração está vindo para mim. —
Adoraria ouvir essa música.
Então começo a escrever. É difícil, doloroso e cru, mas todo o tempo
que eu escrevo, Hazel está lá, torcendo por mim e segurando minha mão
através das emoções que estão me dominando.
Pela primeira vez em algum tempo, não me sinto sozinho.
No dia seguinte, estou mais do que pronto para ajudar Hazel nos
chiqueiros. Claro, estou mais do que disposto a trabalhar, já que quero
tocar nossas letras mais cedo ou mais tarde, mas principalmente meu
objetivo do dia é ter certeza de que Hazel está bem.
Ela tenta negar minha ajuda no início, mas eu me recuso a desistir
do nosso acordo de aperto de mão.
— Ok, se você quiser começar nos currais mais à esquerda, vou
fazer estes aqui, — diz Hazel enquanto caminhamos para lá. — Vou puxar
o feno depois de terminarmos, e você pode sair mais cedo.
— Eu vou te ajudar com isso.
— Posso fazer isso sozinha.
— O objetivo de ter um parceiro é que você não precisa fazer isso
sozinha, Hazel.
Ela não responde. Tenho a sensação de que não está acostumada a
receber ajuda das pessoas. Ela tem um jeito muito independente com ela.
Começamos a limpar os currais e Hazel não diz uma palavra além de
alguns grunhidos e resmungos quando pisou em um local não tão
bom. Felizmente, vovó havia lhe dado um par de botas apenas para uso no
rancho; portanto, nenhum sapato mais será sacrificado em nome dos
porcos.
Música está tocando no meu telefone, mas ainda assim, parece
desconfortavelmente silencioso.
Eu não consigo parar de pensar no que aconteceu com aquele
Garrett na noite anterior. Eu não consigo parar de pensar em Hazel e no
estado de sua mente.
— Quer brincar de confissão? — Pergunto a ela, tentando quebrar a
estranheza de tudo isso.
Ela inclina a cabeça na minha direção. — O quê?
— Hora da confissão. James e eu jogamos quando limpamos os
currais para ajudar o tempo a passar mais rápido. — Ok, isso é uma
mentira. A hora da confissão foi algo que inventei na hora, porque quero
saber mais sobre Hazel e sei que ela não me dará detalhes por conta
própria. — É como se eu dissesse uma confissão e você também fizesse
uma.
Ela estreita os olhos. — Que tipo de confissão?
— Qualquer coisa, mesmo. Por exemplo, eu mijei na cama até os dez
anos de idade.
Ela grunhe. — Essa é uma confissão que você provavelmente deveria
ter guardado para si mesmo.
— Verdade, mas quanto mais embaraçosas ou profundas as
confissões, melhor. Isso torna o jogo mais interessante.
Ela diz, desconfiada: — E quais foram algumas das confissões que
James compartilhou?
— Ah, não. — Balanço minha cabeça. — As confissões que
acontecem no chiqueiro ficam no chiqueiro. Então fale. — Descanso minha
cabeça no topo do cabo da pá em minha mão. — Vamos com isso. Qual é a
sua confissão?
Ela faz uma careta como se o jogo fosse a última coisa que ela
quisesse participar. — Eu, uh, coloquei o nome do meu espaguete de
rancho.
— Chaato, — eu grito. — Tente novamente.
— Caramba, difícil. — Ela baixa o forcado e esfrega as mãos nas
coxas. — Ok. Quando eu tinha treze anos, roubei um bolo do
supermercado no meu aniversário.
Eu assobio baixo. — Temos uma rebelde sem causa aqui.
— Eu tinha uma causa. Minha mãe esqueceu meu aniversário –
de novo. E ela se esqueceu de ter comida em casa – de novo. Dividi o bolo
com algumas crianças da vizinhança ao redor da minha casa e fizemos
uma festa. Foi chato, e os presentes que eles me deram eram como pedras
e paus e porcaria, mas foi a melhor festa. Uma das minhas memórias
favoritas.
— Como você roubou um bolo inteiro?
Ela ri um pouco e balança a cabeça. — Derrubei uma prateleira
inteira de molho de tomate. Enquanto eles estavam distraídos com aquela
bagunça, peguei o bolo e corri. Provavelmente tenho algum carma ruim
vindo para mim por causa disso.
— Você dividiu o bolo, então tenho certeza de que equilibrou o
carma.
— É assim que funciona?
— Espero que sim, porque fiz algumas coisas ruins no meu passado
como uma criança estúpida, e espero que fazer algumas boas ações hoje
em dia equilibre a escala do carma.
— Como dar a uma garota um lugar para ficar.
— Sim, bem, eu percebi que te devia por ser um idiota.
— Palavras muita verdadeiras. Qual é a sua próxima confissão? Faça
bonito.
— Eu, uh, eu não acho que gosto de sexo.
Seus olhos se arregalam. — O quê? Todo mundo gosta de sexo,
Ian. Especialmente você, eu acho, com base no número de mulheres que
eu vi com você.
— Sim, mas… Eu não sei. Quer dizer, é bom, mas não parece
importante. Não é tão importante quanto todos acreditam que seja.
— Não faz jus ao exagero, hein?
— De modo nenhum.
— Então por que você continua namorando mulheres diferentes?
Dou de ombros. — Só esperando tropeçar no sexo alucinante de que
as pessoas falam, eu acho. Só estou procurando sentir algo mais profundo.
— Quantos anos você tinha quando você perdeu a virgindade?
— Quatorze.
— Puta merda. Quando eu tinha quatorze anos, estava misturando
poções no meu quintal, sem pensar em sexo.
— Poções?
— Você sabe… fazendo mágica. Pensar em sexo não estava em
minha mente. Ainda não está, realmente. — Ela ergue os olhos para mim,
e a cor aumenta em suas bochechas. — Hora da confissão: eu sou virgem.
— O quê? De jeito nenhum, — eu digo, fingindo que ela já não tinha
revelado esse fato durante a noite de Hazel bêbada.
— Verdade. Não que eu não tenha tido oportunidades, porque eu tive
com meu ex-namorado, Garrett – o cara que você teve o prazer de conhecer
ontem. Vai soar estúpido, mas eu não queria acabar como a maioria das
pessoas nesta cidade. Não queria acabar como minha mãe – uma
estatística de adolescente grávida. Eu não queria ter a chance de ficar
grávida antes de sair desse inferno.
— Isso faz sentido. Minha mãe engravidou de mim quando tinha
quinze anos. Eu não poderia imaginar ter um filho nessa idade.
— Quinze? E ela foi embora quando você tinha quantos anos?
— Oito. Ela e Pops fugiram da cidade.
— Eu não poderia me imaginar fazendo isso… afastando-me do meu
filho depois de tantos anos.
— Sim, bem, você seria melhor do que a maioria nesta cidade.
— Lamento que tenha acontecido com você. Eu nunca soube… faz
sentido por que você foi tão frio comigo quando me conheceu, vendo como
eu tenho uma conexão com Charlie.
— Não que isso seja certo, — eu rebato.
— Não, mas dá um pouco de clareza.
Eu sorrio e passo minha mão contra minha testa. — Hora da
confissão: tenho medo de que as pessoas me abandonem. Acho que é por
isso que não namoro. Não posso ficar para trás se não deixar as pessoas
perto o suficiente para me abandonar.
Ela larga o forcado e se aproxima de mim. Ela inclina a cabeça para
o lado e me estuda de cima a baixo. — Hora da confissão: eu sabia que
havia mais em sua história do que o homem mal-humorado que você se
apresentou.
— Ainda estou tentando não ser um idiota e ser tão duro.
— Você está indo muito bem, se me perguntar. Um passo de cada
vez.
— Alguma dica sobre espaço para melhorias?
— Apenas mantenha o bom trabalho. — Ela sorri e, porra, meu peito
faz uma coisa estranha de aperto. Que raio foi aquele?
— Ok, eu tenho que te perguntar uma coisa, e realmente não me
importo com a resposta. Porque, merda, não importa, e realmente não é da
minha conta, mas a curiosidade matou o gato e toda essa merda…
— O que é?
— Você é realmente uma bruxa? — Solto. — Você mencionou poções
e porcarias, então eu só quero saber.
Ela dá uma risadinha. — Por quê? Nervoso porque vou lançar um
feitiço em você ou algo assim?
— Nah. Quero dizer. Talvez. Mas realmente. Você gosta desse tipo de
coisa?
Ela balança a cabeça. — Não. Fiz isso quando criança para escapar
do mundo horrível em que vivia. Escrevia feitiços na esperança de que
mudassem meu futuro. Na esperança de que isso salvasse minha mãe de
sua própria tragédia, mas no final do dia, não existia magia. Eu era
apenas uma criança estúpida que escrevia encantos estúpidos que não
mudavam nada. Mas tenho um grande amor pela natureza. Pelas estrelas
e a lua. Eu sinto que há uma conexão de cura com os elementos do
mundo. Contanto que desaceleremos o suficiente para apreciar o
ambiente.
Ela é uma humana muito mais complexa do que eu jamais dei
crédito a ela ser. Quanto mais aprendo, mais quero saber.
— Agora, vamos. Comece a trabalhar, ou vamos ficar aqui a noite
toda, — ela ordena.
Eu não teria me importado de ficar lá por mais algumas horas
arrancando mais algumas confissões dela. Poderia ter pensado em um
milhão de coisas que teriam sido piores do que passar uma noite no
chiqueiro com Hazel.
— Espere, eu tenho mais uma confissão, — eu digo a ela.
— Fala.
— Acho que o que você fez para proteger sua mãe foi a coisa mais
corajosa que uma pessoa poderia fazer.
Seus olhos se suavizam e ela para seus movimentos. — Você
realmente acha isso?
— Eu acho.
— Obrigada, Ian, — ela sussurra com uma voz tímida.
— Sem problemas, melhor amiga, — brinco.
Ela sorri de novo, e eu me sinto privilegiado em testemunhar a curva
de seus lábios.
12
IAN
Hazel cumpre sua parte do acordo. Todas as noites depois do
trabalho, ela se senta comigo em casa, e nós criamos músicas
juntos. Algumas noites, trabalhamos tanto que o sol começa a aparecer no
céu.
Ela me pressiona para me abrir, para cavar mais fundo com meus
pensamentos e emoções, e está funcionando. Tudo está saindo de mim de
uma maneira que nunca aconteceu antes. A música parece mais real com
sua ajuda. Parece autêntico. Parece que Hazel Stone é a peça que faltava
para o meu sonho se tornar realidade. Ela é a musa pela qual eu estava
orando, e espero que ela continue me ajudando a coescrever as músicas
que mudarão minha vida.
— O que você acha disso, Hazel? — James pergunta enquanto ela
assiste a mais um de nossos ensaios. Da mesma forma que ela está
crescendo em mim, ela cresce para os meus companheiros de
banda. Inferno, eu não posso contar em minhas mãos a quantidade de
vezes que os encontrei pelo rancho, falando sobre nossa música em vez de
fazer seu trabalho. Eric e Marcus são viciados em pedir conselhos a Hazel
sobre seus sons, e ela está mais do que disposta a ajudá-los.
— Acho que soa bem. Talvez um pouco mais de solo de guitarra. —
Ela pisca para ele, falando diretamente para sua alma.
— Posso fazer isso! — Ele sorri, pegando seu violão e dedilhando os
acordes.
Ela faz isso por todos nós – nos deixa animados com a música, e
parece que já faz muito tempo que não tínhamos esse nível de alegria com
nossas criações.
Com o passar dos dias, os caras e eu trabalhamos mais duro do que
nunca para criar as próximas faixas. Eric foi rápido em postar amostras
dos novos sons em toda a mídia social, e a resposta geral foi incrivelmente
melhor do que qualquer coisa que já havíamos conseguido no passado.
— Mais de trezentas mil visualizações em vinte e quatro horas! —
Ele exclama no final da tarde de sexta-feira. — Puta merda! E esse foi
apenas um clipe de vinte e cinco segundos! Espere para ver o que acontece
quando lançarmos o clipe completo! — Ele respira, parecendo chocado
como sempre.
— É isso, — diz James, bufando como um idiota. — Este será o
nosso avanço.
— Lembre-me de beijar Hazel Stone quando a vir de novo, — brinca
Marcus, e porra, não acho engraçado.
— Fique bem longe dela, — eu o alerto, soando mais sério do que
deveria. Mas a ideia de Marcus beijar Hazel faz meu sangue ferver.
Por quê?
Por que esse pensamento me irrita tanto?
Marcus ergue as mãos em sinal de rendição. — Só estou brincando,
cara. Você sabe que eu não beijo onde meus melhores amigos estão
interessados.
— O quê? Não é desse jeito. Não estou interessado em Hazel. Só não
quero matar uma coisa boa tendo você partindo o coração dela ou algo
assim. Preciso que ela continue me ajudando.
— Certo. — James sorri. — E não tem nada a ver com você
desenvolver sentimentos pela garota.
— Sentimentos? — Eu bufo. — Por Hazel? — Bufo novamente.
De jeito nenhum. Eu não tenho sentimentos – exceto quando se trata
das letras mais recentes das minhas canções. Nelas, eu sinto tudo. Mas na
vida real? Ainda sou uma pedra fria. Sim. Meu coração ainda está fechado
para sentir as coisas em um nível mais profundo por qualquer pessoa.
— Claro, Ian. — Marcus se aproxima e me dá um tapinha nas
costas. — Continue dizendo a si mesmo o que for preciso para ajudá-lo a
dormir melhor à noite, cara.
Eu irei, porque o que estou dizendo a mim mesmo é verdade. Eu não
sinto nada por Hazel Stone.
Ela é apenas uma garota que ajudou a sentir a música em mim.
— Hora da confissão, preciso de sua ajuda, — diz Hazel em um
sábado de manhã, enquanto cuidamos de algumas tarefas
domésticas. Seu cabelo está puxado para trás em um rabo de cavalo alto e
ela não usa maquiagem. Ela não usa sua maquiagem escura nos fins de
semana, apenas quando está trabalhando no rancho e perto de outras
pessoas, como se o delineador pesado e as sombras profundas fossem
algum tipo de escudo para ela.
As roupas escuras e grandes permanecem, no entanto. Preto sobre
preto com um toque de preto.
Eu levanto uma sobrancelha e paro de dobrar as roupas do cesto de
roupa suja na minha frente. — Com o que?
— Eu preciso que você me leve a algum lugar hoje. — Ela passa a
mão esquerda para cima e para baixo no braço direito.
— Onde você precisa ir?
Seus olhos disparam para longe de mim e seu olhar cai no chão. —
Visitar minha mãe na prisão. Fica a algumas horas de distância e não
tenho outra maneira de chegar lá.
Balanço a cabeça uma vez, coloco um par de sapatos e pego minhas
chaves. — Vamos lá.
Percorremos todo o caminho quase em completo silêncio. Hazel
continua mexendo nas mãos e mordendo a unha do polegar, ligeiramente
de costas para mim. Eu não sei o que dizer a ela, porque não sou bom em
saber como a conversa deve ser quando você está dirigindo para ver sua
mãe, que foi presa por causa de uma ligação que você fez. Meio estraga
prazeres, se você me perguntar.
Então me volto para a única coisa que realmente sei: música.
— Alguma música que você queira ouvir? — Eu pergunto a Hazel.
Ela encolhe os ombros e continua olhando pela janela do
passageiro. — Não tem importância.
— Resposta errada. Todas as músicas são importantes. Portanto,
tem que haver algo de que você goste. Qualquer coisa, Haze. Você escolhe,
e eu tocarei. Contanto que não seja lixo completo.
— Realmente, não importa.
— Mais uma vez – toda música é importante. Quem é a sua banda
favorita?
Ela olha para mim, e eu juro que quase vejo um pouco de rubor em
suas bochechas.
Ela tem bochechas adoráveis… Eu não sabia que as pessoas podem
ter bochechas adoráveis. Mas é o tipo de bochecha em que você quer se
inclinar e beijar repetidamente.
Eu quero beijar as bochechas de Hazel Stone.
Se essa não é a percepção mais louca que eu tive há tempos, não sei
o que é.
— Você não pode rir, — diz ela com cautela.
— Prometo.
— O que uma promessa de um garoto como você significa para uma
garota como eu, Ian Parker?
— Tudo, — confesso. — Significa tudo. — Eu não sei por que, mas
tenho o estranho desejo de fazer o que for necessário para deixar aquela
garota feliz. Ela teve tantos momentos tristes em sua vida; quero levar
para ela alguns momentos felizes.
Seus lábios se curvam um pouco, mas ela se vira em direção à
janela, então eu não posso ver a timidez em sua boca. — Shawn Mendes.
— Sério? — Eu engasgo.
Ela me lança um olhar severo e aponta para mim. — Você prometeu!
— Não, está bem. Eu só… Não esperava que uma garota como você
gostasse de algo tão pop quanto Shawn Mendes.
— O que você achou que eu iria gostar? Slipknot24 ou o Grateful
Dead25? — Ela pergunta. — Por causa da minha aparência e da forma
como me visto?
— Honestamente? Sim.
Ela revira os olhos. — Você sabe o que acontece quando você coloca
pessoas em caixas?
— O quê?
— Elas escapam delas, provando que você está errado uma e outra
vez. Sou mais do que meu exterior.
Quase digo a ela como quero saber mais sobre seu interior do que
qualquer coisa, mas não quero soar como um idiota carente completo.
Pego meu telefone e coloco um dos álbuns de Shawn. Hazel, e não
consegue esconder o sorriso que cai em seus lábios quando ela começa a
balbuciar as palavras de cada música que toca. Seus dedos tamborilam
contra suas coxas e sua cabeça acena com a batida. Quando a música
“Perfectly Wrong26” toca, lágrimas rolam por aquelas bochechas que estou
pensando em beijar. Eu quero enxugá-las. Merda, quero beijá-las, mas sei
que não posso colocar minhas mãos contra sua pele sem sua permissão.
Ela funga um pouco e as enxuga sozinha.
24 Slipknot é uma banda americana de metal formada em Des Moines, Iowa, em 1995.
Advinda do seu estilo musical, nu metal, que explodiu no fim dos anos 1990 nos Estados
Unidos, a banda é conhecida por seu grande número de integrantes, pelas máscaras
usadas por cada um, e pelos shows enérgicos. 25 Grateful Dead foi uma banda norte-americana de rock formada em 1965 na cidade
de São Francisco, Califórnia, berço do movimento hippie. O grupo era conhecido por seu
estilo único e também por seu ecletismo, já que fundia em suas composições elementos
do rock, folk, country, psicodelia, jazz, blues e música experimental, além das
performances que se transformavam numa longa sessão de improvisações; esta
característica os fez serem caracterizados como uma jam band. 26 Perfeitamente errado.
— Eu gosto deles também, você sabe, — ela diz suavemente. —
Slipknot e os Grateful Dead. Eu sou uma garota com muitas facetas.
Estou aprendendo segundo a segundo. Ela é uma mulher
complicada e, dia após dia, quero saber tudo sobre seus lados complexos.
Quando chegamos à prisão, tenho que estacionar em uma área
designada. Hazel está constantemente esfregando as mãos na calça jeans
enquanto respira fundo.
— Quer que eu vá com você? — Eu pergunto.
— Não. Eu tenho que fazer isso sozinha. Não sei quanto tempo vai
demorar, então se você quiser ir para casa, posso tentar encontrar outro
jeito de ir embora.
Levanto uma sobrancelha para ela, perplexo com suas palavras. —
Levamos mais de três horas para chegar aqui. Por que diabos eu iria
deixar você agora?
Ela encolhe os ombros. — O tipo de pessoa que eu conhecia teria
partido.
— Eu a encorajo a conhecer pessoas melhores.
— Acho que estou no caminho certo, — ela murmura, tão baixinho
que eu quase não ouço. Ou talvez eu tenha inventado tudo na minha
cabeça e só quero que essas sejam as palavras que saiam de seus
lábios. De qualquer forma, espero estar no caminho do qual ela está
falando.
— Eu não vou a lugar algum, — digo, dando a ela minha palavra e
um pequeno sorriso. — Estarei bem aqui.
Ela sorri de volta e nem tenta esconder de mim. — Obrigada, Ian.
— De nada. Boa sorte aí.
Ela acena com a cabeça uma vez e vai embora, com as mãos
inquietas todo o caminho até a entrada.
Enquanto espero, toco a música “Perfectly Wrong” de Shawn
novamente, deixando a letra afundar em minha mente. Deixando uma
parte de Hazel cair em minha alma. Você pode aprender muito sobre uma
pessoa com base nas músicas que a fazem chorar.
Ela repete uma dúzia de vezes e, na décima terceira, meu peito dói
um pouco também.
13
HAZEL
Entrar em uma prisão sempre foi muito assustador para mim. Eles
revistam os visitantes como se fôssemos prisioneiros. Passamos por
detectores de metal e depois somos digitalizados com outro
dispositivo. Segue-se uma revista completa. A primeira vez que
experimentei esse tipo de procedimento foi quando tinha onze anos e
mamãe me levou para visitar Charlie com ela. Isso tinha me assustado
muito, e me lembro de ter pesadelos pesados após a visita.
Quando eu apareço agora, o nervosismo ainda ressoa em meu
estômago da mesma forma que faz aos onze anos. Só que desta vez, a
culpa me atinge também.
Em seguida, está toda a papelada que tenho de preencher para ver
minha mãe. Enquanto anoto minhas informações, tento o meu melhor
para não pensar demais sobre minhas emoções. Continuo tentando me
convencer de que fiz a coisa certa também.
Colo uma etiqueta com o nome na minha camiseta e me dirijo para a
área de visitas. Passo por um portão e me sinto a uma mesa onde espero
que um segurança traga minha mãe dos fundos. Enquanto espero,
tamborilo meus dedos repetidamente contra minhas coxas, inspirando
profundamente. À minha volta, há outras mesas onde os presidiários
conversam com seus familiares. Alguns riem, outros choram e alguns não
trocam palavras. Eles apenas ficam sentados em silêncio, olhando um
para o outro como se seus olhares dissessem todas as palavras por eles.
Quando um guarda traz mamãe para fora, eu me levanto, ainda
mexendo nas mãos. Não consigo parar de mover meus dedos um contra o
outro. Meus nervos estão à flor da pele.
As mãos e os tornozelos de mamãe estão algemados e isso parte meu
coração. Ela parece mais magra do que antes de entrar, o que é muito
preocupante, visto que mamãe já estava magra para começar. Ela é pele e
ossos, sem a barriga do bebê. Eu me pergunto se eles estão alimentandoa. Se eles estão cuidando dela, vendo como ela provavelmente está
sofrendo de abstinência por falta das drogas. Seu rosto parece
bizarro. Círculos escuros sob seus olhos, e sua pele mais pálida do que o
normal, como se ela estivesse doente por dias. Seu cabelo está selvagem,
emaranhado e com nós como se ela não tivesse se importado o suficiente
para passar os dedos entre eles, e seus lábios estão rachados e abertos.
Eles não têm protetor labial para os internos? Nem mesmo vaselina
ou algo assim?
Oh, meu Deus. O que eu fiz?
Imaginei que entregar Charlie era a opção mais segura para ela, e
depois que ela foi presa também, tentei me convencer de que ser presa foi
bom para ela, porque não pode entrar em mais nenhum problema. Achei
que estaria um pouco melhor do que quando a vi pela última vez,
machucada e ferida pelas mãos de Charlie. Mas, sinceramente, mamãe
parece ainda pior do que antes. Ela parece quebrada de uma maneira que
eu não sabia que humanos poderiam quebrar. Ela está destruída até o
âmago.
E é tudo minha culpa.
Não era para ser assim.
Ela se senta na minha frente, e quando seus olhos se encontram
com os meus, as lágrimas inundam meu olhar. Ela parece tão morta aos
olhos – como se qualquer luz que restou dentro dela tivesse sido drenada.
— Oi, mamãe, — sussurro, minha voz dolorida enquanto observo
seus dedos magros se mexerem juntos, da mesma forma que os meus. Eu
me mexo na cadeira e tento o meu melhor para abrir um sorriso. — Como
você está?
Que pergunta estúpida, embora eu não tenha certeza do que mais
poderia ter dito a ela. O que você diz para a mulher que ama mais do que a
própria vida, mas que também foi responsável por prender?
Ela bufa com a minha pergunta e desvia o olhar, escolhendo um
canto da mesa para focar seu olhar.
— A merda mais louca, — ela murmura, balançando a cabeça. —
Tenho tentado e tentado descobrir como fomos pegos, sabe? Ninguém
sabia sobre o local de entrega, exceto Charlie, eu, Garrett e… — Ela volta
seu olhar para mim e inclina a cabeça de uma forma curiosa. — Garrett
passou por aqui e me disse que você tinha algo a ver com isso.
Lágrimas explodem de meus olhos, e cubro minha boca enquanto
seus olhos me perfuram. — Sinto muito, mamãe, — choro, sentindo cada
onda de emoção passando por mim. — Eu não pensei que você estaria
lá. Achei que seria apenas Charlie.
— Por que você faria isso com ele?
— Porque ele é um monstro. Ele ia te matar. Ele ia matar você,
mamãe.
— Ele nunca me machucaria, — ela zomba, me lançando olhares de
ódio.
Ódio. Minha mãe, a única mulher que eu já amei, olha para mim
com tanto ódio que imediatamente começo a me odiar.
— Mas ele fez, mamãe. Ele te machucou uma e outra vez, e eu não
poderia continuar assistindo isso acontecer. Eu não poderia deixar ele
fazer isso com você. — Fungo e passo minha mão embaixo do meu
nariz. — Sei que isso não é perfeito, mas depois disso, quando você
terminar de cumprir a pena, podemos começar de novo. Você ficará limpa,
e tenho economizado algum dinheiro para conseguirmos nossa própria
casa. Podemos ir a qualquer lugar nos Estados Unidos. Podemos
recomeçar, mamãe. Podemos construir um novo começo e…
— Eu levei a pena, — ela sussurra, me fazendo levantar uma
sobrancelha.
— O quê?
— Por tudo isso. Eu assumi a responsabilidade por Charlie. Ele sairá
em breve, e eu ficarei aqui por muito mais tempo.
Meu coração começa a quebrar em um milhão de pedaços. — O
quê? Não. Mamãe, você não pode fazer isso! Você não pode levar a culpa
por…
— Ele é minha alma! — Ela grunhe na minha direção. — Tudo o que
sou é por causa dele, e eu farei qualquer coisa para protegê-lo.
Isso faz meu coração quebrar completamente. Ela está tão distorcida
em sua mente sobre o que é o amor e como ele parece, como funciona, que
ela realmente sairá do seu caminho, entregará sua própria vida, por um
homem que não se importa com ela… Ela está certa sobre uma coisa. Tudo
o que ela é, é devido àquele homem. Sua mente confusa, seu estilo de vida
cansado, tudo existe porque Charlie envenenou sua alma com sua
toxidade.
— Mas mamãe…
— Eu te odeio, — ela zomba, as palavras me atingindo como balas
no meu peito. — Odeio tudo o que você é e nunca mais quero ver você. Eu
gostaria de ter feito o aborto quando tive a chance. Ser sua mãe me deixou
infeliz. Você não é uma filha para mim.
— Não. — Balanço minha cabeça. — Você não quis dizer isso. Eu sei
que você está chateada e magoada, mas mamãe, eu te amo. Eu fiz isso por
você, para protegê-la.
— Você arruinou minha vida. Você me arruinou, e espero que sua
vida de agora em diante seja um inferno. Te odeio.
As lágrimas escorrem por meu rosto em uma velocidade impossível,
e eu nem me incomodo em enxugá-las. Estendo a mão para agarrar as
suas na esperança de que ela sinta meu calor, sinta meu amor, me sinta.
Ela se afasta antes que eu tenha a chance.
— Guarda, estou pronta. — Ela se levanta e me lança um olhar
severo enquanto suas mãos caem em seu estômago. — Pelo menos desta
vez, o bebê vai ser parecido com o pai, — ela afirma, chamando minha
atenção. — E Charlie será capaz de cuidar da criança assim que nascer,
não graças a você. Talvez este não seja uma decepção.
— Mamãe… deixe-me ajudá-la de alguma forma. Deixe-me…
— É uma menina, — ela interrompe enquanto descansa as mãos
contra o estômago. — Eu sempre quis uma filha de verdade.
Isso me corta mais profundamente do que qualquer coisa antes.
— Eu posso ajudar com o bebê, — ofereço.
— Você não acha que já fez o suficiente? — Ela pergunta enquanto o
guarda se aproxima para levá-la embora. — Nunca mais quero ver você de
novo, e quando o carma pegar você pelo que fez, espero que queime.
Ela é guiada para longe, deixando-me ali com um buraco no coração
e uma dor na alma. E a queima do referido carma? Acontece
instantaneamente. Todo o meu ser está em chamas.
14
IAN
Quando Hazel volta, ela está em um frenesi, enxugando as lágrimas
caídas de seus olhos em uma velocidade rápida. Salto da caminhonete e
levanto uma sobrancelha para ela. — Ei, você está bem?
Ela não diz uma palavra, provavelmente porque suas emoções estão
muito intensas. Ela tomba em minha direção quando a pego em meus
braços. Começa a soluçar contra meu peito, puxando-me para mais perto
dela, e eu permito. Ela está quebrando, e eu sou a única coisa que a
impede de cair no chão.
Não sei quanto tempo eu a seguro. Cinco minutos, talvez dez. Tudo
que sei é que ficarei o tempo que ela precisar que eu esteja lá.
Quando começamos nossa jornada de volta para casa, Hazel
permanece quieta e eu não a forço a falar. Sei que ela falará quando estiver
pronta, e quando chegar a hora.
Estamos a cerca de duas horas de viagem para casa quando ela
pigarreia. — Ela está assumindo a responsabilidade, então ele sairá antes
dela e será capaz de criar a criança assim que nascer… — Ela chora mais
forte. — Isso não está certo. Nenhuma criança deve ser criada por
Charlie. Eu já passei por isso. Isso não é bom. E aquele homem não quer
nem mesmo minha mãe ao lado deles… até embora ela lutasse, ela ainda
era uma mãe às vezes. Essa criança só terá o monstro.
— Merda… Sinto muito, Haze. Eu não sei… talvez haja uma maneira
de provar que Charlie não pode ficar com o filho…
— Eu pedi para ajudá-la, mas ela não quer minha ajuda. — Ela
encolhe os ombros e olha para as próprias mãos. — Disse que eu fui um
erro, que eu fui o erro mais idiota que cometeu na vida e gostaria de ter me
abortado quando teve a chance.
Sua cabeça abaixa, a as lágrimas voltam, e odeio o fato de estar
agora na estrada e não conseguir estender o braço para abraçá-la
novamente.
— Isso é uma coisa complicada de se dizer a uma pessoa. Você não
merece.
— Talvez eu tenha merecido. O que fiz foi horrível. E agora ela vai
ficar lá por mais tempo, porque eu não pensei em tudo.
— O que você fez salvou a vida da sua mãe.
— Eu não sei… todas as noites tenho pesadelos. Eu me viro e me
reviro na cama com o pensamento do que fiz. Acordo em pânico, porque
não consigo respirar. Então não posso voltar a dormir. Não acho que
mereço dormir confortavelmente enquanto ela está em um lugar tão
terrível. Por que eu deveria dormir em paz quando ela não pode fazer o
mesmo? Quero dizer, que tipo de monstro faria isso com sua própria
mãe? Achei que ela acabaria livre… — Ela funga e enxuga o nariz sob a
manga. — Só não queria que ela morresse.
Separo meus lábios para falar, mas ela balança a cabeça. —
Podemos apenas ouvir música? Eu não acho que preciso de conforto
agora. Quero me sentir uma merda por um tempo.
Concordo com seu pedido e ligo o segundo álbum de Tool27, meu
favorito.
Nós dirigimos o resto do caminho em silêncio, embora eu queira
continuar dizendo a Hazel que o mundo é melhor com ela nele. Mesmo que
continue mostrando seus motivos pelos quais ela não deveria ter
pertencido.
Estaciono a caminhonete na garagem e Hazel salta. Ela se vira para
mim e me dá um sorriso, mas não é um sorriso feliz ou qualquer coisa. Eu
27 É uma banda de rock norte-americana dos anos 90.
não sabia que sorrisos podiam ser tristes até que vi aquele descansando
em seus lábios.
— Obrigada, Ian. Desculpe por desperdiçar o seu dia.
— Não foi um desperdício. Estou feliz por tê-la ajudado. Se você
precisar de alguma coisa, estou por perto.
— Obrigada novamente. — Ela ri para si mesma e passa o dedo na
ponta do nariz. — Achei que ver minha mãe hoje teria me trazido um
pouco mais de conforto com o fato de hoje ser o dia que é.
— Que dia é hoje?
Ela esfrega as palmas das mãos sobre os olhos cansados. — Meu
aniversário.
— Merda, — murmuro. Que aniversário de merda. Que vida de
merda. — Feliz aniversário, Haze. Desculpe, por ser tão ruim.
— Está bem. Pelo menos não acabei ficando sozinha.
Mais tarde naquela noite, eu a ouço se mexendo e se virando na
cama novamente. Torna-me impossível dormir sabendo que ela está tão
angustiada. Então, sem um convite, entro em seu quarto na ponta dos
pés. Eu fecho a porta silenciosamente e vou até a garota angustiada,
girando e girando em seu sono.
— Haze. Hazel, acorde — sussurro, cutucando-a no braço. Ela se
senta, alarmada e apavorada.
— O quê? — Grita, coberta de suor.
Balanço minha cabeça um pouco. — Você estava tendo um pesadelo.
Sua respiração fica mais controlada enquanto ela penteia os cabelos
com as mãos. — Oh.
— Aqui, saia.
— Por quê?
— Quando eu era criança, costumava ter pesadelos depois que meus
pais iam embora. Vovó se deitava comigo de vez em quando e, nessas
noites, os sonhos não eram tão ruins. Ajudou ter alguém deitado ao meu
lado.
Cautelosamente, ela se afasta e se deita contra a parede. Eu subo na
cama ao seu lado.
Enquanto estou deitado ao lado de Hazel, seu corpo treme de
nervosismo, medo ou tristeza. Uma dessas coisas. Talvez todas os três.
Passo meus braços em volta do seu corpo e a seguro contra o meu.
Meus olhos se fecham depois que ela se sente segura o suficiente
para fechar os seus.
15
HAZEL
— Ei, você pode me ajudar com algo no celeiro? — Ian pergunta,
colocando sua cabeça em meu quarto enquanto escrevo em meu diário. —
Big Paw tem um grande tronco que ele quer mover, e eu não posso fazer
isso sozinho. Encontre-me lá em cinco minutos?
— Certo. — Coloco um par de sapatos para ajudá-lo. Faz uma
semana desde que fui visitar minha mãe, e nos últimos sete dias, Ian se
arrastou para a minha cama para se deitar ao meu lado. Eu não entendo
por que ele tem sido tão bom para mim, mas tê-lo deitado ao meu lado
torna muito mais fácil dormir à noite. Sempre que acordo em pânico, ele
está lá, acalmando meus batimentos cardíacos problemáticos.
Vou encontrar Ian na casa do celeiro, abro a porta – e engasgo
quando a vejo enfeitada com decorações. Balões, serpentinas e uma
enorme faixa pintada à mão que diz Feliz Aniversário, Hazel Stone.
Há uma mesa posta com um bolo enorme e mini cupcakes ao
redor. Junto com pizza e salgadinhos.
— O que é isso? — Pergunto, com minha voz trêmula enquanto
borboletas enchem meu estômago. Big Paw e Holly estão ao lado da mesa
de comida com sorrisos em seus rostos. Bem, Holly sorri. Big Paw exibe
seu rosto rabugento, que é um dos meus looks favoritos nele. Ao lado deles
está Leah, parecendo tão alegre como sempre.
— Você não pode imaginar? É sua festa de aniversário. Nós
organizamos tudo e arranjamos uma banda para você, — diz Holly.
Leah corre em minha direção e coloca os braços em volta de
mim. Nas últimas semanas, ela e eu passamos muito tempo juntas. Eu
nunca pensei que teria uma amiga tão alegre quanto ela – mas acontece
que Leah é uma luz no meu mundo escuro. Rir com ela se tornou fácil.
— Você gostou Hazel? Eu mesma fiz toda a decoração, embora os
meninos tenham tentado contribuir com tudo. Mas eu disse a eles para
ficarem em sua pista e prepararem o presente para você.
— O presente deles para mim?
Leah sorri de orelha a orelha. — Oh, meu Deus, Hazel. Você vai
adorar. É muito especial.
Antes que eu possa responder, Ian e seus três companheiros de
banda saem para o palco do celeiro. Meus olhos estão arregalados quando
eles pegam seus instrumentos.
Ian envolve as mãos em torno do microfone e me dá um meio
sorriso. — Estamos juntos no The Wreckage há anos, mas nós não
tínhamos realmente entrado nas profundezas de nossa música até que
uma garota vestida de preto apareceu e nos ajudou a abrir para as
possibilidades do que poderíamos criar. Hazel, sem você, essas músicas
não existiriam. Sem você, eu nunca teria mergulhado mais fundo na
música. Essas músicas são para você; essas músicas são por sua
causa. Feliz aniversário, Hazel Stone. Espero que seja tão especial quanto
você.
Ele olha para seus companheiros de banda e os quatro conversam
sem palavras, e então Marcus começa a tocar bateria.
Levo apenas alguns segundos para perceber que eles estão tocando
as músicas que Ian e eu elaboramos nas últimas semanas. Eles parecem
tão únicos e completos devido à forma como a banda montou os
instrumentais. A paixão que eles têm por sua música é demonstrada
enquanto eu observo aqueles quatro homens se apaixonarem mais
profundamente por sua criação, e cada centímetro de mim pertence à voz
de Ian. Ele se move no palco como se fosse feito exclusivamente para seu
talento. Sua voz goteja charme, suavidade, e sex appeal. Oh, como ele
parece tão bom lá em cima, cantando aquelas palavras que está
entregando direto para mim.
Se eu tivesse um dia favorito, seria esse. É uma memória que eu
repassarei uma e outra vez quando meus dias ficarem difíceis e minhas
emoções me dominarem. Eu voltarei para aquele momento em que Ian
canta suas canções exclusivamente para mim.
Essa banda explodirá em breve, e eu sei que serei sua maior fã.
Quando o show termina, todos mergulham na comida e sobremesa.
— Por que você fez isso? — Eu pergunto a Ian enquanto ele enche a
boca com outro pedaço de pizza.
— Porque você merece uma festa. Você merece um bom
aniversário. Desculpe pelo atraso de uma semana.
— Chegou na hora certa.
— Oh! Quase esqueci seus presentes. — Ele larga a pizza no prato e
corre para o canto da sala, onde pega uma caixa embrulhada –
terrivelmente embrulhada – e a estende para mim. — Embrulhar não é
meu talento, mas servirá. Vá. Abra.
Levanto uma sobrancelha e começo a desembrulhar o
pacote. Quando abro a caixa, meus olhos lacrimejam e meu peito
aperta. Lá estão elas olhando para mim – minhas botas de
combate. Limpas como novas, como se nunca tivessem pisado no
chiqueiro.
— Como você…? — Eu pergunto.
Ele sorri e encolhe os ombros. — Esfreguei muito a escova de dente
no começo, até que encontrei uma loja de limpeza de sapatos. Eles fizeram
o trabalho duro quando percebi que não conseguiria lidar com isso
sozinho. Eu sei que é meio estúpido e um presente barato dar a você algo
que já era seu, mas…
Eu o calo envolvendo meus braços ao redor de seu corpo. —
Obrigada, Ian. Você não sabe o que isso significa para mim. O que tudo
isso significa para mim.
— Você merece isso, Haze. Você merece que coisas boas aconteçam
com você.
A festa continua e recebo mais presentes de Big Paw e Holly. Eles me
deram um telefone celular para que eu possa entrar em contato com eles a
qualquer momento.
— Eu acho que telefone celular é o trabalho do diabo, mas Holly
estava determinada a te dar um, — Big Paw bufa. — E tudo o que a minha
senhora quiser, ela consegue, então feliz aniversário.
Agradeço a eles, sentindo-me muito indigna de tudo que esta família
fez por mim. No final da noite, depois que a festa acaba, Ian me puxa para
fora da casa do celeiro para uma última surpresa.
— Você já fez o suficiente, — eu digo, me sentindo tão indigna.
— Não fiz o suficiente, mas espero que goste mais deste último, —
diz ele. — Agora feche os olhos. — Faço o que ele disse e ele me conduz ao
presente final. — Ok, você pode abri-los agora.
Quando faço, engasgo ao olhar para o galpão anteriormente
quebrado que havia sido totalmente reformado.
— O que é isso?
— Bem, é a sua cabana, — ele explica. — Achei que você poderia
usar um bom lugar para criar. Sei que escrever é muito importante para
você, então achei que seria bom. Além disso, se você precisar de um lugar
seguro para fazer uma pausa e olhar para as estrelas… — Ele abre a porta
e eu engasgo enquanto entro. O teto é de vidro e olho para cima para ver
dezenas de estrelas no céu. Há uma bela cama de solteiro onde eu posso
deitar se quiser, e dois pôsteres de Shawn Mendes encostados nas
paredes, que me faz rir.
— Isso é demais, — eu digo, balançando minha cabeça em
descrença.
— Você merece.
— Não posso agradecer o suficiente. — Eu me viro para encará-lo. —
Mas eu tenho esse medo estranho de ficar aqui sozinha depois de semanas
atrás, quando esses caras estavam fora do galpão.
Ian morde o lábio inferior e enfia as mãos nos bolsos. — Hora da
confissão – éramos eu e James tentando assustá-la para que você viesse
ficar em casa comigo.
Meu queixo cai e bato em seu braço. — Ian Parker, você está
brincando comigo? Você me matou de susto naquela noite!
— Era esse o plano… escute, para ser justo, você estava naquela
teimosia, e se eu não a colocasse naquela casa, Paw iria me expulsar mais
cedo ou mais tarde. Então, tempos desesperados… — Ele encolhe os
ombros. — Confie em mim quando digo que este galpão é seguro.
Estreito meus olhos. — Eu quero ficar com raiva de você, mas
também, esta é a melhor coisa que eu já vi, então vou te perdoar por
agora.
Eu vou até a cama de solteiro e me deito para olhar as estrelas. Dou
um tapinha no local ao meu lado e Ian se junta a mim.
A cama é minúscula, e nossos corpos estão pressionados um contra
o outro apenas para evitar que o corpo grande e largo de Ian caia do
colchão.
— Aqui, deixe-me ver seu celular, — diz ele, estendendo a mão para
pegá-lo. Programa o número do seu celular nele e então envia uma
mensagem para si mesmo. — Agora posso enviar mensagens de texto
irritantes que fazem você revirar os olhos.
— Que alegria, — brinco, mas secretamente adoro a ideia.
Pego o telefone dele e o coloco na mesa. Segundos depois, meu
telefone apita.
Ian: Haze?
Hazel: Sim?
Ian: Espero que você tenha tido um bom aniversário.
Hazel: O melhor até agora.
Ian: Tenho um segredo para te contar.
Hazel: O que é?
Ian: Eu roubei o bolo do supermercado.
Começo a rir e cubro minha boca para proteger minhas risadas
quando me viro para enfrentar Ian. Caramba, como somos
cafonas? Mensagens de texto enquanto estamos um ao lado do outro.
— Você não roubou! — Eu grito.
— Ok, não. Pensei sobre isso, mas não havia uma boa prateleira de
molho de tomate por perto.
— Você é um idiota.
— Você é linda.
O quê?
Meus olhos caem em seus lábios para ter certeza de que essas
palavras escaparam dele. Minha pulsação aumenta quando me torno
incapaz de pensar direito. O que ele disse? E disse isso para mim? De jeito
nenhum. Fui chamada de muitas coisas na minha vida, mas linda nunca
foi uma delas. Eu imaginei. Não há nenhuma maneira de Ian dizer essas
palavras e dirigi-las para mim.
— Eu me odeio, você sabe, — ele sussurra, — pela maneira como
tratei você quando nos conhecemos. Eu fui um idiota completo e você não
merecia isso, Haze. Eu te julguei sem te conhecer, e isso foi uma coisa
horrível de se fazer.
— Você não tem que continuar se desculpando por isso. Nós dois
pensamos errado um do outro.
— Sim, mas você só respondeu às minhas maneiras idiotas. Você só
estava se defendendo da melhor maneira que sabe, e por isso, sinto
muito. Vou continuar me desculpando também, aconteça o que
acontecer. Então, deixe acontecer.
Enquanto estamos deitados na cama juntos, ele se aproxima,
mantendo-me aquecida e mantendo meu coração acelerado. Nas últimas
noites, senti sua dureza pressionada contra minha bunda quando nos
abraçamos, e estou começando a entender completamente por que as
mulheres parecem viciadas em encontrar seu caminho para dentro das
calças de Ian. Uma piscina de calor inunda meu centro e tremores atacam
meu interior. Tento o meu melhor para não pensar nisso enquanto sua
pele quente pressiona contra a minha.
— Ian?
Ele boceja. — Sim?
— Você é meu novo músico favorito.
Ele dá uma risadinha. — Aposto que você diz isso para todos os
garotos que dão festas para você, constroem galpões e limpam a merda de
suas botas.
Eu rio.
— Eu gosto disso, — ele sussurra. — Sua risada é meu novo som
favorito.
Borboletas, borboletas, oh, borboletas.
Eu me viro para ele e olho em seus olhos castanhos. Então olho para
seus lábios. Seus lábios que têm uma pequena respiração saindo deles a
cada poucos segundos. Seus lábios tem um arco de Cupido perfeito e são
da cor da pele. Seus lábios parecem tão macios.
Muito, muito macios.
— Ian? — Eu digo mais uma vez.
— Sim?
— Eu amo as novas canções. São perfeitas.
— É tudo por sua causa. Essas músicas só existem por sua causa.
— Ele me dá um sorriso sonolento, pega o telefone e começa a digitar.
Ian: Boa noite, Haze.
Hazel: Boa noite.
Ele adormece antes de mim naquela noite, porque pela primeira vez
em muito tempo, ficar acordada não parece um pesadelo. Fico congelada
no lugar enquanto seu corpo aquece o meu, e tento coletar todas as
informações do que aconteceu na semana anterior.
Número um: Ian dormiu ao meu lado para ajudar a manter meus
demônios afastados.
Número dois: ele construiu para mim uma maldita cabana para que
eu possa olhar para as estrelas.
Número três, quatro e cinco: ele cuidou de mim, compartilhou suas
confissões secretas e ouviu as minhas.
Por último, há a número seis: as borboletas que ele deixa flutuando
em minhas entranhas.
Ai, sim.
Não podemos esquecer as borboletas.
16
HAZEL
— Duas palavras para você: Fogueira, — Leah expressa
alegremente, agitando as mãos no ar com entusiasmo. Ela tem parado no
rancho para me visitar – e aos cavalos – quase todos os dias desde que me
pegou na beira da estrada. Eu teria tentado afastá-la, porque tenho medo
de deixar as pessoas se aproximarem de mim, mas Leah é como uma
explosão de sol no dia mais nublado. Não posso mantê-la longe nem se
quisesse.
— Eu acho que fogueira é uma palavra, — brinco, alimentando
Dottie com uma maçã.
Leah revira os olhos. — Não seja espertinha, Hazel. Duas palavras,
uma palavra – não importa. Há uma fogueira anual acontecendo neste fim
de semana nas margens do lago, e você precisa estar lá comigo.
— Haverá muitas pessoas?
— Toneladas de pessoas!
— Festejar e dançar?
— Muita festa e dança!
— E você disse uma tonelada de pessoas, certo?
Ela sorri ainda mais, como se fosse explodir de tanta emoção. —
Sim. Sim! Quase todo mundo na cidade vai para a fogueira de verão – uma
palavra, não duas.
Eu rio e balanço minha cabeça para frente e para trás. — Então vá
em frente e não conte comigo.
Sua boca abre. — O quê? De jeito nenhum. Você tem que vir
Hazel. Vai ser muito divertido.
— Não sou realmente uma pessoa muito divertida, então estar perto
de todas essas pessoas parece um pesadelo para mim. O único tipo de
pessoa com quem eu realmente gosto de sair é fictício e vive dentro das
páginas de um livro.
Leah revira os olhos e começa a escovar Dottie. — Você está sendo
louca. Haverá meninos lá. Meninos gostosos, sexys, bronzeados e
deliciosos. Oh, Haze, você tem que vir! Você apenas tem que fazer
isso. Pense nisso – maiôs, bebidas e boa música a noite toda.
Sei que Leah é nova no que significa ser minha amiga, então darei a
ela o benefício da dúvida por entender tudo errado sobre mim, mas a
última coisa que quero fazer é sair com estranhos em maiôs.
Leah deve ter visto a resistência em meu olhar. — Vamos,
Hazel. Você trabalha tanto no rancho e nunca se dá realmente nenhum dia
de folga. Acha que eu não vejo você trabalhando nos seus dias de folga? É
uma jovem viciada em trabalho, o que é um oxímoro28, se é que já ouvi
um. Então, solte o cabelo e venha para a fogueira comigo.
— Eu não sei Leah…
Ela suspira e joga as mãos para cima em derrota. — Bem, bem. É
muito ruim. The Wreckage estará se apresentando e achei que você
gostaria de vê-los.
Eu me endireito um pouco. — Ian e os meninos estarão se
apresentando?
— Sim. Eles têm sido os artistas nos últimos anos. É tradição. — Ela
me dá um sorriso conhecedor. — Você não gostaria de ver Ian se
apresentar na frente de uma multidão? Quer dizer, eu sei que ele se
apresentou para você na sua festa, mas vê-lo na frente de uma multidão
maior só o torna maior do que a vida.
28 Figura de linguagem em que se combinam palavras de sentido oposto que parecem
excluir-se mutuamente, mas que, no contexto, reforçam a expressão (p.ex.: obscura
claridade, música silenciosa).
— Quer dizer que eu não gostaria de ver a banda inteira? Não
apenas Ian.
— Bem, a maneira como suas bochechas ficam vermelhas quando
eu o menciono me dá a sensação de que você se preocupa mais com ele do
que com meu irmão e o outros dois. — Ela arqueia uma sobrancelha e se
inclina na minha direção. — Então é verdade?
— O que é verdade?
— Você tem uma queda pelo Ian?
— O que? O que? Não! De jeito nenhum! Uma queda por Ian? Ian
Parker? De jeito nenhum. — Oh, meu Deus, cada centímetro do meu corpo
está em chamas, como eu soo longe de ser convincente quando se trata de
meus sentimentos por Ian. Eu não posso contar quantas vezes eu me
peguei sonhando acordada com seus olhos, seus lábios, seu sorriso, seu
pa… — Nós somos apenas colegas de quarto, — eu me afasto, querendo
abanar meu rosto de vergonha.
Ela mexe as sobrancelhas. — Um colega de quarto com benefícios é
provavelmente algo em que você está interessada, hein?
— Não, Leah, de jeito nenhum, — minto como a maldita mentirosa
que eu sou naquele momento. — Além disso, mesmo se eu tivesse
sentimentos por Ian – o que não tenho – ele está tão fora do meu alcance
que eu não poderia imaginar que ele me desse uma chance.
— Desculpe-me, mas você está presa ao estúpido?
— O que você quer dizer?
— Para uma garota inteligente que sabe que fogueira não são duas
palavras, você com certeza é estúpida, Hazel. Ian é louco por você.
— Repete?
— Eu o vejo o tempo todo te observando pelo rancho, e quando você
não está nos ensaios da banda, ele fica falando sem parar sobre você como
se você fosse todas as estrelas do céu. Ele está obcecado por você.
Eu rio. — Ele não está. Acredite em mim, se Ian fosse obcecado por
mim, eu saberia.
— Mesmo? Então você acha que um homem que dorme de
conchinha com você toda noite e constrói um galpão não gosta de
você? Quer dizer, eu tenho namorado e dificilmente consigo uma
mensagem de bom dia, e ele está construindo galpões inteiros em sua
homenagem! Ele está, tipo, apaixonado por você! — Ela exclama.
— Cala a boca, Leah; ele não está. — Mas ele construiu um galpão
para mim. Isso significa algo mais do que apenas um colega de quarto
sendo legal? Ian…?
Não.
De jeito nenhum ele gosta de mim. Eu não sou o tipo dele. Vi seu
tipo. As garotas altas e curvilíneas que sempre cheiram a perfume caro. Eu
não ou o tipo de garota que chama a atenção de Ian. Sou mais a garota
que se esconde nas sombras, não os holofotes, e Ian namora garotas
iluminadas.
— Apenas venha para a fogueira e veja por si mesma. Agora que
despertei você para o fato de que Ian é louco por você, você vai
notar. Confie em mim. Um cachorro cego não poderia perder a conexão
entre vocês dois.
Hesito antes de lançar minhas mãos para cima em derrota. —
Bem. Eu irei, mas é apenas para provar o quão errada você está sobre esta
situação de Ian. Ele não me vê assim.
— Sim, ok, — ela me dá piscadela e uma cutucada. — Você verá,
Haze. Mas há uma coisa que precisamos fazer antes da fogueira neste fim
de semana.
— E o que seria isso?
A alegria de Leah se intensifica um milhão de vezes enquanto ela
atira os braços para o ar em comemoração. — Uma mudança de visual!
A fogueira ainda está a alguns dias de distância, mas graças a Leah,
eu me vejo observando cada movimento de Ian ao redor do rancho, e chego
a uma grande conclusão: Ian é gostoso. E sexy. E extremamente sexy. Eu
não tenho a menor ideia do que aconteceu comigo nos últimos dias, mas
sempre que estou perto dele, minha nossa…O tesão vem com força
total. Meus olhos dançam sobre ele como se ele fosse o melhor bife cozido
do mundo e quero devorar cada centímetro dele.
Não ajuda que algumas noites acordo do mais sujo dos sonhos sobre
ele tomando o controle de mim. Todas as noites, quando nos sentamos
para trabalhar nas letras, tenho que me forçar a não estender a mão e, ah,
você sabe, acidentalmente deslizar direto em seu pênis.
Se houvesse um aplicativo de namoro para as partes do corpo de
Ian, eu deslizaria para a direita até que as vacas voltassem para casa.
Acalme-se, senhora tesão; ele é apenas seu amigo.
Continuo dizendo a mim mesma essas palavras, mas está ficando
cada vez mais difícil de acreditar nelas a cada noite que ele se arrasta para
a cama comigo e pressiona seu abdômen duro contra o meu corpo. Só de
vê-lo trabalhar no rancho está me deixando quente. Nunca imaginei que
ver um homem sexy sem camisa escovando um cavalo pode ser tão
emocionante.
Claro, não parece um ato de sex appeal, mas meu Deus, essa é a
coisa mais sexy que eu já testemunhei na minha vida.
— Você quer montar? — Ian pergunta, olhando na minha direção.
— Oh, Deus, sim, — eu murmuro em um sussurro profundo
enquanto meus olhos dançam através de sua figura de uma forma
hipnótica. Balanço minha cabeça, me sacudindo do torpor em que resido e
tento manter o calor da minha pele em um nível domesticado. — Quero
dizer, o que?
Ele sorri na minha direção, aparentemente inconsciente do meu
estado atual de necessidade desesperada de mexer em suas calças. —
Você quer montar o cavalo? — Ele pergunta, dando tapinhas nas costas de
Dottie. — Quer dizer, parece que vocês duas são melhores amigas, mas eu
nunca a vi dando uma carona a você.
Oh.
O cavalo.
Ele quer que eu monte o cavalo.
Claro que é isso que ele quis dizer.
— Eu, er, nunca montei um cavalo e, para ser honesta, isso parece
muito assustador.
Ele ri. — Não é tão ruim quanto você pensa. Vamos; eu vou te
ajudar. Podemos cavalgar juntos.
— Você quer me montar? — Solto, então mentalmente bato na
minha testa. — Quero dizer, comigo. Você quer ir comigo?
— Vou cavalgar ao seu lado e garantir que Dottie te trate bem. — Ele
passa por mim, roçando seu braço contra o meu, e nem preciso dizer que
quase derreto em uma pilha de mingau. Cada vez que aquele homem se
aproxima de mim, meu corpo reage intensamente. Tudo o que posso fazer
é rezar para que ele nunca perceba.
Ele agarra uma sela para mim e leva Dottie para um passeio no
campo aberto. Volta aos estábulos e escolhe Big Red para ser seu
companheiro de cavalgada durante a tarde. Enquanto caminhamos para
fora em direção a Dottie, Ian me ajuda a aprender como montar.
— Certo, então temos configurado nosso banco de pés para que você
possa usar para subir em Dottie. Coloque sua mão esquerda na crina dela,
e depois coloque sua mão direita no outro lado. Coloque seu pé esquerdo
no estribo, e depois passe sua perna direita sobre a sela.
Sim, sim, Ian. Fale de cavalo para mim.
Após dizer tudo isso, ele me ajuda colocando a mão na parte inferior
das minhas costas. Assim que me sento em cima de Dottie, sinto como se
tivesse acabado de atingir o objetivo final da vida – subi em um cavalo
enquanto Ian me ajuda e vivo para contar a história.
— Bem, isso não é tão ruim, — eu digo, sentando em cima de Dottie
sem ter ideia do que fazer a seguir. Ian dirige-se ao Big Red e sela-o como o
cowboy estrela do rock quente que é. O cowboy estrela do rock parece um
oxímoro extremo, mas estou totalmente convencida disso.
— Ok, segure suas alças e mova-se lentamente, — diz Ian, puxando
Big Red para perto de Dottie e eu. Ele está perto o suficiente para que se
eu precise de sua ajuda, será capaz de me ajudar. Começamos muito
devagar, que é exatamente o que preciso, porque no segundo que Dottie
começa a se mover, meus medos voltam rapidamente para mim.
— Tem certeza de que é seguro? — Pergunto, me sentindo apavorada
com toda a situação.
— Cem por cento seguro. Acredite em mim, querida, você está em
boas mãos. Basta falar comigo para não pensar nisso. Mantenha sua
mente leve e seus movimentos mais leves. Você está indo muito bem.
— Está bem, está bem. Falar, falar sobre o que. Sobre o que
conversamos?
— Qualquer coisa. Diga-me o que você quiser. Que tal seu
nome? Como você conseguiu o nome Hazel?
Eu rio um pouco, pensando sobre isso. — História
engraçada. Quando nasci, tinha grandes olhos castanhos. Mamãe disse
que se apaixonou por eles imediatamente, mas não fazia ideia de que,
quando um bebê nasce, a cor dos olhos dele mudaria com o tempo. Então
ela me deu o nome de meus olhos castanhos, embora no futuro eles
tivessem se tornado verdes.
— Eu gosto dos seus olhos verdes, — ele comenta, e espero por Deus
que, minha senhora tesão invisível não cutuque Dottie.
Eu dou a ele um sorriso tenso e estranho, porque não sei mais o que
dizer sobre seu comentário. Não sei como receber elogios, especialmente
elogios de Ian. Se alguém tivesse me dito que o homem que conheci
semanas atrás que estava recebendo um boquete de alguma mulher
qualquer me diria que gosta dos meus olhos, riria na cara deles.
Agora, estou corando como uma idiota, mas esperando que os raios
de sol sejam desculpa suficiente para a vermelhidão em minhas
bochechas. Infelizmente para mim, não é esse o caso.
— Você sempre fica vermelha quando alguém te elogia?
— Eu não sei. Não recebi muitos em toda a minha vida.
Ele me olha de cima a baixo enquanto franze o nariz. — Isso te deixa
desconfortável, não é?
— Muito. — Eu rio. — Não sei como reagir quando me dizem coisas
boas. Não tenho prática suficiente.
— Bem, merda. Isso me faz querer dizer mais coisas boas para te
deixar desconfortável, porque você é fofa ‘pra’ caralho quando não sabe
como aceitar um elogio. A cor em suas bochechas aumenta e é adorável.
Minha vermelhidão provavelmente aumenta um pouco mais. — Cale
a boca, melhor amigo, — murmuro, sabendo que estou mais vermelha do
que uma maçã.
— Você tem um rosto lindo, Hazel Stone, — ele zomba. — Seus olhos
me lembram as estrelas. Você tem um nariz de formato perfeito, e eu
nunca vi um par de orelhas mais sexy.
Eu rio enquanto mostro o dedo do meio para ele. No momento em
que solto a alça com a mão esquerda, Dottie deve ter se assustado com
alguma coisa, porque ela dispara em uma velocidade louca, me deixando
em pânico total.
— Oh, merda, — ouço Ian murmurar enquanto ele parte em nossa
direção.
Agarro a alça que deixei cair para mostrar o dedo a Ian e seguro
forte. — Pare, Dottie! — Eu grito, esperando que minha futura ex-amiga
égua diminua seus movimentos.
Voo para cima e para baixo contra a sela enquanto Dottie começa a
perder sua maldita mente, e é assim, meus amigos, que Hazel Stone
quebrou sua vagina. Assim que consigo fazer Dottie parar, Ian corre e me
ajuda a deslizar para fora da sela. Cada centímetro de mim está golpeado e
machucado pela explosão aleatória de energia de Dottie, mas nada, e
quero dizer nada, dói mais do que minha vagina.
— Puta merda, você está bem? — Ian pergunta, sua voz tensa de
preocupação. — Eu nunca vi Dottie fazer algo assim antes. É como se ela
tivesse perdido a cabeça por um segundo ou algo assim. Porra. Você está
bem, Hazel?
Não consigo responder de imediato, porque estou muito ocupada me
curvando e segurando minha hoo-ha em minhas mãos. Você sabe o que eu
sempre quis na minha vida? Uma vagina machucada por andar a cavalo.
— Droga, Dottie bateu em você no Sul? — Ele pergunta.
— Bem abaixo da fronteira. — Concordo. — Um belo solavanco
enviou esta fava de baunilha direto para o inferno.
Ian ergue uma sobrancelha e um sorriso malicioso cai em seus
lábios. — Você sabe o que temos que fazer, certo?
— Não, eu não sei, — gemo, ainda dobrada na cintura de dor.
— Temos que congelar.
— Congelar o quê?
— Sua vagina.
— Minha vagina…O quê?!
— Temos que colocar gelo em sua vagina.
A vermelhidão da minha dor furiosa dispara direto para uma nova
forma de vermelhidão de vergonha quando me levanto. — Você não vai
colocar gelo na minha vagina, Ian Parker!
— Só estou dizendo que é a melhor maneira de diminuir a dor, e
você não quer inchar, hum, sabe… lábios… — Agora é a sua vez corar um
pouco. Quem diria que o playboy do século poderia ficar com vergonha de
falar sobre minha vagina inflamada?
— Bem, se alguém colocará gelo em mim, sou eu.
— Não, eu definitivamente posso fazer isso. É para isso que servem
os companheiros de quarto, de qualquer maneira, — ele brinca.
Eu rio em agonia. — Colegas de quarto são para dar gelo nas partes
íntimas uns dos outros?
— Quero dizer, apenas os melhores companheiros de quarto. Pense
nisso como uma situação de companheiros de quarto com benefícios.
— E o benefício é manter uma bolsa de gelo na minha região
inferior?
— Sim. É um trabalho difícil, mas alguém tem que fazer.
Balanço minha cabeça. — E esse alguém serei eu. Agora, se você me
der licença, vou mancar até em casa e nadar em uma piscina de minhas
próprias lágrimas.
— Não seja boba. Eu carrego você.
— Você não vai fazer isso Ian! — Comento enquanto ele me pega em
seus braços. — Ponha-me no chão!
— Eu irei, assim que chegarmos em casa. — Ele acena para outro
ajudante do rancho e o instrui a colocar os cavalos de volta nos estábulos
para nós.
— Não, faça agora! — Argumento, mas secretamente na minha
cabeça, meus pensamentos são mais como: Oh, sim, Ian. Leve-me de volta
para nossa masmorra e congele minha hoo-ha e diga que sou bonita e cante
no meu ouvido enquanto me alimenta com chocolate amargo.
Eu mencionei os peitorais de Ian?
Ei, Rock? Conheça o Hard29.
Resmungo como se estivesse irritada durante toda a caminhada de
volta ao rancho, mas na verdade me pergunto se aquela situação de
colegas de quarto com benefícios é real. Porque, uma vez que minha vagina
não estiver com uma onda de dor, aceitarei a oferta de Ian.
Quando entramos na casa, Ian me deita no sofá. — Vou pegar algo
para a sua situação. Fique aqui, — diz ele.
29 – Ela quer dizer que é duro como pedra;
Não argumento, porque tenho certeza de que não posso me mover,
mesmo se quiser. Minha mão massageia levemente minha região inferior
enquanto ele está fora, enquanto gemo de dor. Quando ele volta, tem um
pacote de ervilhas congeladas nas mãos e me dá um sorriso desleixado. —
Desculpe, isso era tudo que tínhamos.
Estendo minha mão, nem mesmo me importando. Pego a sacola de
vegetais dele e bato contra a minha metade inferior com um prazer
inacreditável. — Oh, meu Deus, sim, — gemo de empolgação com a frieza
que atinge minha região inferior. Bons sonhos são feitos de ervilhas.
Ian se senta na mesa de centro bem na minha frente. Ele ainda tem
um sorriso estampado nos lábios. — Isso é bom?
Fecho meus olhos e balanço a cabeça. — Você não tem ideia. Nunca
pensei que sonharia com o dia em que seria capaz de colocar ervilhas na
minha vagina.
— Se você quiser, posso segurá-las no lugar, — diz ele, irônico. Abro
meus olhos para ver seu sorriso malicioso. — Você sabe, apenas um colega
de quarto prestativo.
— Bem, você não é apenas o colega de quarto do ano?
— Levo minhas obrigações de quarto a sério, — brinca ele, olhando
para as ervilhas. Ou, bem, olhando minha vagina. É difícil dizer neste
momento. — Você estava cavalgando muito bem até Dottie perder a
cabeça.
— Não é? Eu realmente pensei que Dottie e eu éramos
amigas. Desnecessário dizer que não estamos nos falando por um tempo.
— Eu nunca a tinha visto fazer isso antes. Talvez ela estivesse
tentando me ajudar, para colocar o gelo em você.
Eu rio. — Ela poderia ter encontrado uma maneira melhor de fazer
isso.
— Você está bem, entretanto? Sinto-me um merda, porque foi minha
ideia fazer você montar. Achei que poderia ter sido uma boa pausa do
trabalho diário na fazenda. Além disso, você e eu não tivemos a chance de
sair, trabalhando com a banda e trabalhando no rancho.
Ele quer sair comigo fora do trabalho e da música?
Bem, isso é surpreendente de ouvir.
Passo a mão pelo cabelo e dou um sorriso fraco. — Talvez da
próxima vez possamos simplesmente sair para tomar um sorvete, —
brinco.
— Vou manter isso em mente. Droga… os caras vão me incomodar
quando souberem que eu coloquei você em Dottie e ela te tratou mal. Você
não acreditaria no inferno que eles me deram uma vez que ouviram que eu
praticamente te tratei como uma merda quando nos conhecemos. Eles
amam você. É como se você fosse uma gerente para eles ou algo assim. Eu
juro, às vezes eles vêm com ideias musicais quando você não está por
perto e dizem, ‘Devíamos perguntar primeiro para Hazel. Ela saberá se é
bom ou não.’ Eu não sei como você fez isso, mas você tem todos eles
enrolados em seu dedo.
Eu sorrio. — E você? Você também está enrolado no meu dedo?
Suas sobrancelhas escuras baixam e ele se inclina na minha
direção. Enquanto me perfura com seu olhar, cada cabelo do meu corpo se
arrepia de nervosismo. — Estou tão enrolado nesse dedo que você poderia
me dizer para mergulhar no chiqueiro, e acho que diria sim.
Mordo meu lábio inferior enquanto minha mão permanece colocada
contra as ervilhas. — Sei que brinco sobre nós sermos melhores amigos,
mas somos amigos, certo? Tipo, não somos apenas colegas de quarto e
colegas de trabalho, certo?
— Certo. Você é minha amiga, Haze. Não mereço ser seu amigo, mas
estou feliz por ser.
Só amigos? Penso comigo mesma, mas não deixo as palavras saírem
da minha boca. Eu me mexo no sofá e limpo minha garganta.
Ian olha dos meus olhos para as ervilhas. — Tem certeza de que não
quer minha ajuda para congelar sua vagina? Tenho certeza de que isso me
fará o melhor dos amigos, ajudando você assim.
Eu sorrio e balanço minha cabeça. — Tenho certeza de que você tem
mulheres suficientes que poderia estar gelando o Sul se quisesse, apesar
de não ter trazido ninguém para casa há algum tempo.
Ele fica um pouco sombrio e encolhe os ombros. — Eu não tenho
mais a necessidade de ficar com mulheres aleatórias.
— Oh, e por que isso? — Pergunto, um tanto apavorada com a
resposta.
Ele estreita os olhos em confusão, como se eu fosse a pessoa mais
lerda do mundo. — Vamos, Haze, — sussurra, passando as mãos pelos
cabelos. — Você realmente não pode estar perguntando isso, certo? Acho
que você sabe o porquê.
Eu pisco. — Talvez, mas…
— Por sua causa, — ele diz, me cortando, deixando isso claro como o
dia. — Não quero que nenhuma outra garota tente me dar
inspiração. Porque eu tenho você.
Nenhuma palavra sai da minha boca, porque não tenho certeza se
estou sonhando ou tendo delírios devido à minha metade inferior
latejante. Ian acabou de confessar ter algum tipo de sentimento por
mim? Ele acabou de se abrir de uma maneira que eu não esperava que ele
fizesse?
Ele gosta de mim da mesma forma que gosto dele?
Ele me dá um pequeno sorriso e se levanta. Quando ele se vira para
ir embora, chamo por ele. — Aonde você vai? — Eu pergunto.
— Acho que temos alguns brócolis para a sua vagina. Talvez, se eu
tiver sorte, você me deixe usar isso em você.
Oh, Ian.
Você pode colocar brócolis na minha vagina a qualquer hora.
17
IAN
Há muitas coisas que eu não gosto na vida de cidade pequena, mas
uma das melhores partes de Eres são nossas fogueiras de verão.
Realizamos um grande festival a cada verão com uma enorme quantidade
de fogueiras em volta da orla do lago. Todos os jovens da cidade vêm ao
festival da fogueira, onde eles dançam, bebem e se divertem. O céu
noturno se ilumina com luzes de fadas que tenho certeza de que um bando
de garotas se torceu em torno dos galhos das árvores, e a música explode
através dos alto-falantes sempre que a banda e eu não estamos nos
apresentando. É a melhor sensação das noites de verão e fogueiras.
As pessoas parecem tão livres e alegres no evento. É quase uma
garantia de que a maioria das pessoas também acabará no lago, nadando
bêbados e comemorando o verão. Apesar de nossa cidade ter seus
problemas, não perdemos a chance de comemorar no lago com cervejas
nas mãos.
— Quem diabos é aquela com Leah? — Marcus exclama quando
Leah e um grupo de seus amigos param no estacionamento para as
fogueiras. Todos eles parecem bastante normais para mim, mas há uma
garota usando shorts amarelos curtos e um top branco que se destaca na
multidão. Seu cabelo escuro está preso em um rabo de cavalo alto, e ela ri
e sorri com as outras garotas como se pertencesse ao grupo, e puta merda,
é Hazel.
Seu rosto não está coberto de maquiagem, e juro que sua pele
brilha. Ela parece estar flutuando em uma nuvem e sua confiança é fora
deste mundo.
— De jeito nenhum, — Eric diz, olhando na mesma direção que nós
dois. — Não pode ser Hazel.
— É. — Meu queixo está quase no chão, e a ereção na minha calça
jeans será um problema do caralho, mas puta merda, ela está de tirar o
fôlego. Eu quero tomá-la em meus braços e bater minha boca contra a dela
mais do que nunca. Também quero pressionar meu corpo contra o dela
para mostrar o quão duro ela está me deixando ultimamente.
Não posso contar quantas vezes eu acordei com o pau duro nas
costas dela. Houve momentos em que tive que sair furtivamente da cama
para ir me masturbar, com pensamentos de Hazel na minha mente.
Ela está incrível essa noite, mas ela sempre está incrível. Só que
nesta noite, ela veste cores. Shorts amarelos, para ser mais exato. Short
curto. E sua bunda parece incrível em amarelo. Sim. Ela definitivamente
deve adicionar mais cor ao seu guarda-roupa.
— O que todos nós estamos olhando? — James pergunta, seguindo
nosso olhar. — Puta merda! — Ele comenta.
— Eu sei certo? — Eric diz.
— Como diabos meus pais deixaram Leah sair de casa com aqueles
shorts curtos! Eu vou chutar a bunda dela! — Ele grita, obviamente não
percebendo a mesma coisa que nós e outros caras estamos olhando.
As meninas começam a andar em nossa direção e Marcus me dá um
tapinha nas costas. — Você pode querer fechar a boca antes que ela o veja
olhando-a como um maldito predador.
Fecho minha boca, mas não antes de dizer a ele para ir se foder.
— Oi, vocês. — Leah sorri brilhantemente. — O que está
acontecendo?
— O que está acontecendo é que você vai para casa colocar um
suéter e uma calça de moletom, — James ordena à irmã mais nova.
Leah revira os olhos. — Está quase quarenta graus aqui fora,
James. Não vou me cobrir. Além disso, tenho mais de dezoito anos. Posso
usar o que eu quiser. Assim como Hazel, — ela diz, mudando a conversa
para a garota quieta de quem eu não sou capaz de tirar os olhos. — Ela
não está ótima esta noite? — Leah sorri.
— Ela está, — comento, olhando Hazel de cima a baixo. Observo
enquanto suas bochechas coram com o meu olhar dançando sobre ela,
mas não posso evitar. Ela está incrível ‘pra’ caralho.
— Vamos lá pessoal. Vamos beber alguma coisa. Enquanto estamos
fazendo isso, que tal Ian e Hazel irem pegar uma das fogueiras para nós
sentarmos, — Leah diz, soando exatamente como a casamenteira que
preciso em minha vida.
Quero um tempo a sós com Hazel, mas não o tipo que passamos
sentados ao lado do fogo. Eu quero levá-la de volta para a nossa casa e
apresentá-la à dureza em minhas calças.
Dou a Hazel um meio sorriso e tento o meu melhor para parar de
pensar sobre como quero possuir seu corpo. Quando todos começam a se
afastar, balanço a cabeça em sua direção. — Você está bonita.
Ela morde o lábio inferior e me enlouquece, eu o quero morder
também. — Você está fazendo esse elogio para me fazer sentir
desconfortável?
— Não dessa vez. Apenas falando a verdade.
Ela sorri e eu adoro. — Vamos pegar alguns lugares.
O resto da noite é gasto comigo olhando para Hazel a cada chance
que tenho. Não sei por que, mas por alguma razão me sinto um idiota
perto dela. Tropeço nas minhas palavras e sai brega como sempre, sem
nem tentar. Essa mulher me deixa louco, e acho que ela nem sabe disso.
Felizmente, a banda não me dá muito tempo sozinho com ela para
continuar me envergonhando. Sentamos ao redor da fogueira sentindo o
cheiro das noites de verão em Eres.
Os meninos se apegaram bastante a Hazel nas últimas semanas,
olhando para ela como se ela fosse a mãe ursa do bando. Eles começaram
a chamá-la de – momanager30 – não muito tempo atrás. A Kris Jenner 31da
Wreckage.
De vez em quando, Hazel grita: — Você está indo muito bem,
querido, — e os caras coram como idiotas por conseguir sua aprovação.
Hazel tem essa característica: ela cuida das pessoas. Ela se esforça
para ajudar a vovó sempre que precisa e para ir além no rancho para o Big
Paw. Ela trabalha mais do que a maioria dos funcionários de Big
Paw. Uma vez perguntei por que ela se esforça tanto, e ela respondeu: —
Quero trabalhar duro por tudo que seus avós me deram.
Passamos a noite ao redor da fogueira, trocando histórias
constrangedoras sobre o outro para ver quem consegue fazer Hazel rir
mais.
— Não estou brincando, — exclama Marcus, tomando um gole direto
da garrafa de vodca, — Ian incendiou a caixa de correio entalhada à mão
de Big Paw enquanto estava chapado, e quando percebeu que o bem
precioso de Big Paw iria se transformar em fumaça, ele puxou seu pau e
tentou fazer xixi nas chamas.
Hazel dá uma gargalhada com a história.
— Felizmente ele engoliu uma tonelada de refrigerante, porque eu
juro que parecia que ele fez xixi por dez minutos direto antes de perceber
que não seria o suficiente para apagar o fogo. Juro, ele acenou com seu
pequeno Peter Pan para frente e para trás como se estivesse em busca de
Tinker Bell32. — Marcus dá uma risadinha.
— E Big Paw ainda não sabe que foi Ian? — Hazel pergunta.
— Não. Fizemos um pacto para nunca contar. The Wreckage tem um
punhado de segredos que não podemos contar às pessoas, — declara Eric,
segurando sua câmera nas mãos. Ele olha para baixo e desliga. — Quer
dizer, vou editar esses segredos.
30 Termo usado para designar uma mãe – agente.
31 Matriarca da família Kardashian/Jenner.
32 Personagens do conto de fadas Peter Pan.
Hazel ri. — Você sempre tem uma câmera na mão, não é?
Eric assente. — Se eu não tocasse teclado, provavelmente seria um
cinegrafista ou estaria no mundo dos computadores de alguma
forma. Tenho sorte de poder fazer tudo isso e tocar. Basta pensar, com
todas as filmagens que tenho, serei capaz de fazer um documentário fodão
para nós no futuro, algum dia a Netflix vai pegar. Você vê, da maneira
como faço minhas gravações…
— Pare de falar nerdices com ela, Eric! Você vai aborrecê-la até a
morte, — comenta Marcus, tomando um gole de vodca.
— Oh, de jeito nenhum! Não é chato. Eu acho interessante, — Hazel
diz, olhando para Eric com o maior sorriso. Quero que ela olhe para mim
com aquele sorriso. Com aqueles lábios, com aquela língua que às vezes
roça seu lábio inferior.
Porra, esses lábios. Eu me pergunto qual será o gosto deles.
Balanço minha cabeça e tento controlar a ereção que está
determinada a crescer com o pensamento dos lábios de Hazel. E me
concentro mais em como ela parece feliz e relaxada nessa noite na
fogueira. Na maioria das vezes, Hazel fica pensando demais na vida. Ela
escreve cartas para sua mãe todas as semanas e nunca recebeu uma
resposta. Ela pensa demais em como Jean está na prisão e conta os dias
até o nascimento do bebê.
— Ela provavelmente tem cerca de seis meses agora, — ela me disse
outro dia. — Em alguns meses, não serei mais filha única. Não é loucura?
O peso de suas palavras me entristece, porque a culpa goteja em seu
tom. Então, sempre que ela encontra uma maneira de rir, como fez hoje,
eu a absorvo. Ela é tão linda quando sorri, e eu não acho que tem ideia de
como é difícil para mim não querer ficar em torno dela a cada segundo.
— Puta merda! — Marcus exclama, pulando da cadeira dobrável em
que está sentado. Seu celular colado em sua mão enquanto ele o olha com
os olhos arregalados em choque. — Puta merda! — Ele repete, fazendo com
que todos se virem em sua direção.
— O que foi? — Pergunta James.
— É somente Max. Porra. Rider. Enviando um e-mail, para nós, —
Marcus diz, fazendo James, Eric e eu nos sentarmos eretos.
— Puta merda! — Gritamos em uníssono, levantando.
Hazel fica imóvel com um olhar confuso. — Quem é Max Rider?
— Não é Max Rider, — observa Marcus. — É Max Fodido Rider. O
agente conhecido por pegar artistas comuns do dia a dia e torná-los mega
super stars. Ele é como o padrinho da música. E faz obras-primas.
— O que ele disse? — Eu falo quando meu peito aperta.
Marcus pigarreia e começa a ler o e-mail. — ‘Oi, é Max. The
Wreckage, hein? Nome legal. Vi e ouvi algumas de suas faixas no YouTube e
Instagram. Acho que vocês fazem algo bom. Eu sei que é em curto tempo,
mas teriam algum tempo livre na agenda na próxima sexta-feira em Los
Angeles para me encontrar? Podem trazer algo novo para eu ouvir? Enviei
cópia para minha assistente no e-mail. Ela passará mais informações sobre
localização, data e hora. Falamos em breve. Max.’
— Oh, meu Deus, acabei de gozar na porra das calças, — Marcus
suspira, segurando a mão sobre o coração como se fosse ter um ataque
cardíaco.
— Puta merda, — James tosse, andando para frente e para trás. —
Temos de ir! É isso. Esse é o tipo de merda que faz e destrói as
pessoas. Vamos para Los Angeles na próxima semana, faça chuva ou faça
sol.
Hazel comemora tão descontroladamente quanto nós, porque ela
sabe o quanto isso significa para nós.
— É isso, — eu digo a ela, puxando-a para um abraço. Puxando
todos para um abraço. — Este é o momento que muda nossas vidas.
Nós decidimos enfrentar a merda e dançar a noite toda enquanto
batemos nos tambores e uivamos para a lua como os malditos animais que
somos nesta noite. Depois que os caras vão para casa, Hazel e eu
entramos cambaleando em casa, e ela continua cantando a letra da minha
música, balançando de um lado para o outro. Hazel Stone é a garota
bêbada mais fofa do mundo, e quando minhas letras saem de sua língua?
Puta merda, tesão instantâneo.
Quando ela entra em seu quarto, eu a sigo, nem mesmo caminho
para o meu quarto para me trocar.
Ela rapidamente se vira para a porta. — Ei, Ian, — ela grita, sem
saber que estou atrás dela. Ela se choca contra meu corpo e ri, cobrindo a
boca. — Desculpe. Não sabia que você estava tão perto.
Eu me aproximo.
Ela não se afastou.
— Desculpe, — eu murmuro.
— Desculpe, — ela responde.
Nós nem sabemos do que estamos nos desculpando. Talvez pela
nossa proximidade? Talvez por nossa embriaguez?
Talvez por nossos corações?
Merda, quero tanto beijá-la que meu peito dói fisicamente. Estou
bêbado e cheio de vida, e Hazel Stone é a humana mais linda em todo o
maldito mundo, e eu quero seus lábios contra os meus.
Ela coloca as mãos no meu peito e olha para cima para encontrar o
meu olhar.
Ela sente isso?
Ela sente meu coração bater e como bate por ela?
— Estou tão orgulhosa de você, Ian. Você merece isso. Você merece
tudo isso.
— Quero levar nossas canções, — confesso. — Quero tocar para ele
as músicas que você me ajudou a escrever. — Nos últimos meses, Hazel
me ajudou a criar dezenas de canções. Estar perto dela, trabalhar com ela,
é algo tão natural. Para o mundo exterior, nós dois provavelmente
parecemos polos opostos, mas para mim?
Para mim faz todo o sentido.
Ela me inspira de uma maneira que nunca havia sido inspirado. Ela
me incentiva a criar músicas de uma forma que eu nunca considerei. Ela
me desafia; ela me treina. Ela é minha musa. Ela é a música.
Ela está… mais perto.
Ela está muito mais perto do que alguns segundos atrás. Eu a puxei
para mim? Ela se moveu sozinha? Como minhas mãos pousaram na parte
inferior das suas costas? Por que ela não tentou afastá-las?
— Hora da confissão: eu quero você, — suspiro, sabendo que a
rejeição é uma possibilidade, mas estou bêbado e corajoso o suficiente
para não me importar.
— Hora da confissão. – Ela engole em seco. — Eu também quero
você.
— Você está bêbada, — eu sussurro.
— Estou, — ela responde. — Mas, você também está bêbado.
— Estou.
Seu olhar muda dos meus olhos para os meus lábios e depois volta a
subir. — Toque essas músicas. Afinal, elas são suas.
— São nossas, — eu discordo. — Elas são nossas.
— Mas é o seu futuro. Eu daria a você cada letra que vive dentro de
mim para tornar seus sonhos realidade, Ian.
Meu olhar muda de seus olhos para seus lábios. Meu olhar fica lá. —
Os únicos sonhos que tenho agora envolvem beijar você, Haze. Eu quero
deitar com você naquela cama e beijar você até o sol raiar pela manhã.
— Às vezes eu acordo e você ainda está dormindo, e penso em me
inclinar. Quero você mais do que jamais quis qualquer coisa, Ian, e isso
me assusta. Eu nunca quis beijar alguém tanto quanto quero beijar você.
— Eu também, — confesso. — E bem, agora estamos bêbados e
dizendo merdas que provavelmente não diríamos normalmente, então é
isso.
Ela sorri e eu adoro. Porra, eu adoro. Se a única coisa que eu
pudesse olhar novamente fosse o sorriso de Hazel Stone, eu seria o
bastardo mais sortudo do mundo.
— Talvez devêssemos dormir, — diz ela, apontando para a cama. —
Fique sóbrio e veja como nos sentimos sobre as coisas pela manhã.
— Sim, tudo bem.
Tiro minha camisa e calça, ficando apenas de boxer. Viro minhas
costas para ela enquanto ela veste o pijama.
Subimos na cama e nossos corpos se fundem como se tivéssemos
que nos fundir como um só. Beijo sua testa sem pensar muito. Deixo meus
lábios permanecerem lá também. Meus lábios contra sua pele, engolindo o
pequeno sabor que está sendo permitido.
Seus olhos se fecham enquanto ela se aproxima, entrelaçando
nossas pernas. Nossas testas repousam uma contra a outra, e sua
pequena respiração roça minha pele.
— Você é meu melhor amigo, — ela diz suavemente, suas palavras
me perfurando. — Eu sei que seus companheiros de banda são seus, e eu
sei que não posso tomar seus lugares, mas para mim, você é isso,
Ian. Você é meu melhor amigo. Nunca tive um melhor amigo antes, mas
quero que saiba que é você, e estou muito orgulhosa de você por seus
sonhos se tornarem realidade. Isto é apenas o começo. Você vai ser grande
algum dia. Você vai ser uma estrela.
— Você é a estrela, — sussurro, com nossas bocas tão próximas que
se eu me mover um centímetro, estaremos pressionados um contra o
outro. Porra, isso foi piegas e, porra, eu nem me importo. Hazel me faz
querer ser o idiota mais brega do mundo. — Você tem sido minha luz,
minha musa, minha inspiração. Haze… você é todas as estrelas do maldito
céu. Você é minha galáxia.
Seus lábios caem em um sorriso e seus olhos se fecham enquanto
ela se move um pouco mais perto de mim e descansa a cabeça no meu
peito. Enquanto eu inalo e exalo, não consigo parar de pensar em como me
sinto tão vivo com ela em meus braços. Meu coração, que eu pensei que
tinha morrido no dia em que meus pais me abandonaram, está
funcionando totalmente mais uma vez, tudo por causa de uma garota que
não tem medo de me pressionar o suficiente para me acordar de novo.
Adormecemos naquela noite, embriagados em um mar de desejos,
esperanças e sonhos.
E se Hazel e eu estivermos destinados a ficar juntos? E se nossas
peças do quebra-cabeças se encaixarem perfeitamente? E se tudo o que
sempre quisemos estiver do outro lado de nosso medo?
— Ian. Ian, acorde, — Hazel sussurra, me cutucando um pouco.
Aperto meus olhos um pouco e noto um pequeno feixe de luz vindo
de sua janela. Minha cabeça dói devido à grande quantidade de bebida que
consumi. — E aí? — Resmungo, ainda cansado. Olho para a janela e o sol
não está completamente alto.
Então me viro para Hazel, que olha para mim.
— Você ainda está bêbado? — Ela pergunta, mordendo o lábio
inferior.
— Não. Só com um pouco de dor de cabeça.
— Sim, eu também.
Levanto uma sobrancelha. — Você me acordou para me dizer que
está com dor de cabeça? Quer que eu compre ibuprofeno para você? —
Começo a me levantar e ela coloca a mão no meu braço.
— Não. Acordei você porque, embora agora esteja sóbria, ainda
quero te beijar.
Isso me faz sentar um pouco mais. Um sorriso sonolento e bobo
provavelmente aparece em meus lábios. — Oh, sim?
— Sim. E você?
— Haze… Faz semanas que quero beijar você. Com álcool, sem
álcool, merda… Eu só quero…
Ela me corta inclinando-se em minha direção e colocando sua boca
contra a minha. Claro, ela começa o beijo, mas eu assumo a liderança a
partir daí. Minhas mãos envolvem seu corpo e eu a puxo para mais perto
de mim enquanto a beijo forte com luxúria, com desejo, com
necessidade. Separo seus lábios com minha língua e deslizo para dentro de
sua boca, saboreando cada parte dela e esperando que eu não esteja em
algum sonho fodido, porque preciso que isso seja minha realidade.
Seus beijos são tão doces enquanto o calor enche meu peito. Ela me
puxa mais, beijando-me com mais força, permitindo que sua língua dance
com a minha.
Sinto sua necessidade, seu desejo, e isso só me faz ansiar mais por
ela. Nossos corpos estão pressionados um contra o outro, e tenho certeza
que ela sente a dureza do meu pau contra sua coxa, mas ela não o afasta,
e eu não tento esconder isso. Quero que ela saiba o que faz comigo, como
ela faz meu corpo reagir aos seus toques, aos seus beijos, a ela.
Se o céu é um beijo, vive contra os lábios de Hazel.
Ela se afasta um pouco e mordisca suavemente meu lábio inferior
antes de se deitar contra seu travesseiro. Deito de frente para ela e nossas
respirações estão pesadas. Seus olhos dilatados e selvagens, e ela se
recusa a desviar o olhar de mim.
Suas bochechas coram e ela coloca o cabelo atrás da orelha. Sua
boca se abre e ela acena com a cabeça uma vez. — De novo? — Ela
sussurra.
Porra, sim…
Novamente.
18
IAN
— Vou vomitar, porra, — Marcus geme enquanto caminhamos em
direção à casa de Max Rider. Pousamos em Los Angeles na noite anterior e
eu juro que nenhum de nós conseguiu pregar o olho. Parece que somos
crianças de cinco anos esperando pela manhã de Natal – esperando que
nossos sonhos se tornem realidade.
Minha mente está atordoada e confusa enquanto caminhamos para
a porta da frente de Max. Estamos literalmente encontrando o criador de
estrelas em sua maldita mansão para um encontro sobre nossa música. O
que significa esta vida? Como é que nós, garotos burros de cidade
pequena, acabamos numa reunião com Max Fodido Rider?
Vovó chama de destino.
Hazel chama de talento.
Paw chama de trabalho duro ‘pra’ caralho.
Seja o que for, estou grato por isso. Tudo o que oro é para que não
desperdicemos a oportunidade quando entramos naquela casa.
A assistente de Max, Emma, nos acolhe na casa. Ela nos leva para o
estúdio, porque Max Fodido Rider tem um maldito estúdio em sua
casa. Esperamos um pouco, talvez uma hora ou mais, e ficamos quietos
como ratos. É quase como se estivéssemos com medo se fizéssemos um
som, puf! – e o sonho irá embora.
— Alguém mais está suando como um lutador de sumô? — Marcus
murmura, afrouxando a gravata que Eric fez todos nós usarmos. — Eu
juro, minhas bolas estão úmidas ao nível do pântano. Meu pau parece um
Slip ‘N Slide33 pegajoso.
— Visual horrível demais, Marcus, — comenta James.
— Achei que foi declarado com bom gosto, — diz uma voz atrás de
nós, fazendo todos nós virarmos.
Lá está ele em toda a sua glória. Max Fodido Rider, entrando em
uma conversa sobre a bunda de pântano de Marcus.
Se essa não for uma boa primeira impressão, estaremos ferrados.
Todos nós nos levantamos com a boca aberta. Então, como idiotas
enlouquecidos, começamos a cumprimentar o homem ao mesmo tempo,
tagarelando sem parar sobre o quão excitados e honrados estamos e
outras merdas.
— É tão bom conhecer você! — Diz James.
— Temos tanta sorte que você está tirando um tempo do seu dia, —
Eric comenta.
— Você não tem ideia do quanto isso significa para nós, — eu digo.
— Porra de sapatos fantásticos. — Marcus finaliza.
Não podemos levar Marcus a lugar algum.
— Ok, ok, chega de conversa de bunda. Vamos direto ao assunto. —
Max se senta em sua cadeira giratória enorme em frente ao sistema de
som e se vira para nós. Ele junta as mãos e acena com a cabeça uma
vez. — Acho que conseguiram alguma coisa.
Oh meu Deus, temos algo!
— Não estou dizendo que não precisa de trabalho. Pelo que ouvi, foi
bom, mas não… ótimo. Está faltando a magia. Pedi que viessem aqui por
dois motivos. Um, para ver se vocês realmente fariam acontecer em tão
pouco tempo. Para trabalhar comigo, você tem que querer o sonho.
— Oh, nós queremos! — Marcus exclama. — Mais do que qualquer
coisa, porra!
33 É uma espécie de escorregador de lona. Geralmente molhado, usado em jardins e
quintais.
Pare de xingar tanto, Marcus.
— Ótimo. E dois… Eu me dou melhor ouvindo bandas ao
vivo. Qualquer um pode soar bem online com todos os apitos e sinos, mas
ser capaz de se apresentar ao vivo, como uma banda, é o que leva o
ordinário e o torna extraordinário. Então vão em frente. — Ele gesticula à
nossa frente, onde um conjunto de bateria, um baixo, um teclado e um
microfone esperam por nós. — Mostre-me sua música. E não as mesmas
faixas que ouvi antes. Eu pedi algo melhor. Dê-me o seu
melhor. Impressione-me.
Todos nós respiramos fundo e caminhamos em direção ao seu
equipamento. Antes de irmos para nossos lugares, nós nos reunimos, e
James conduz nossa conversa estimulante. Nós fazíamos isso antes de
cada apresentação em uma cidade pequena, e se alguma vez houve um
momento para a magia hippie de James, é quando estamos prestes a nos
apresentar na frente do maldito Max Rider.
Nós seguramos as mãos um do outro e inclinamos nossas cabeças.
— Queremos enviar ondas de amor, luz e energia para o universo
como um agradecimento por nos trazer todos aqui hoje. Este lugar, esta
experiência, não foi nada além de poderoso para todos nós. Isso é mais do
que poderíamos ter pedido e mais do que merecemos, mas juramos fazer o
bem com este presente. Vamos dar nossa música para que ela possa
curar. Vamos dar nossa música para que ela possa desafiar. Daremos
nossa música como uma forma de tornar esse mundo fodido um pouco
melhor. Ontem, hoje e amanhã. Até para sempre, — diz James.
Aperto as duas mãos que estou segurando, e elas apertam de volta
enquanto todos dizemos em uníssono: — Até para sempre.
Foi o pacto que fizemos desde que éramos crianças. Estar sempre lá
um para o outro, até para sempre.
Então pegamos nossos lugares, seguro o microfone e começamos a
tocar. Tocamos cinco músicas para Max. É difícil dizer se ele está
interessado, porque ele tem uma expressão fria enquanto ouve, e seus
olhos estão escondidos atrás de óculos escuros. Sempre que terminamos
uma faixa, ele acena com a mão no ar e diz: — Próxima.
Quando ele finalmente levanta a mão hesitante, todos nós
respiramos, exaustos, mas mais do que dispostos a tocar a noite toda, se
necessário.
— Tudo bem, venham.
Estamos pingando de suor e empolgação quando paramos na frente
de Max. Ainda assim, é quase impossível lê-lo. Não sei dizer se ele gostou
ou não gostou do que ouviu. Até que ele tira os óculos escuros e dá um
meio sorriso.
— De onde diabos veio essa música de ouro? — Ele pergunta.
Meu coração explode, e espero que ele não possa ver isso acontecer.
— Não foi nada parecido com as gravações que ouvi no
Instagram. Essa merda é mágica. É paixão. É o tipo de música viva,
respirando e fazendo o que eu anseio. O que mudou?
James sorri e me cutuca no braço. — Ian se inspirou em uma
garota.
— É sempre uma porra de garota, — Max murmura, balançando a
cabeça. — Eu não sou de mentir ou perder o fôlego, então acredite em mim
quando digo que você tem o poder para ‘isso’. Até mesmo sua pequena
conversa de vitalidade em grupo familiar antes da apresentação foi
importante. Vocês não tentam ofuscar um ao outro. Todos vocês brilham
porque trabalham como uma unidade. São justos, algo que a maioria das
bandas não podem dizer uma sobre a outra. Podem facilmente ser o
próximo Maroon 534.
Todos nós olhamos um para o outro, sentindo-nos um pouco
desanimados com essas últimas palavras.
O próximo Maroon 5.
34 É uma banda de pop dos EUA.
Sei o que todos os companheiros de banda estão pensando, então
limpo minha garganta para falar. — Com todo o respeito, Sr. Rider, não
acho que queremos ser os próximos Maroon 5. Queremos ser os primeiros
Wreckage.
Ele faz uma pequena careta, sua sobrancelha baixa e malhumorada. Se há alguém no mundo que é difícil de ler, é
Max. Porra. Rider. Se ele fica satisfeito, você não saberá dizer. Se ele está
chateado, não há como saber. Seu cérebro se move rápido e, quando ele se
decide, ele se decide.
Eu me sinto mal pensando que tinha acabado de dar um tiro no
maldito pé por discordar dele sobre o nosso futuro. Se ele quer que
sejamos o próximo Maroon 5, então deveríamos estar em êxtase com o
fato. Minha resposta deveria ter sido, Sim, Sr. Rider. O que você disser,
Sr. Rider. Chuparemos seu pau se for preciso, Sr. Rider.
Estarei disposto a fazer o mesmo sacrifício final que os bravos
homens do Festival Fyre, e eu ficaria de joelhos e explodido Max Fodido
Rider se ele pedisse.
Pegue um para a equipe, Ian.
Mudo de posição e tusso nervosamente.
Max coloca os óculos escuros e se levanta. — Acho que isso é tudo
por hoje, meninos.
Ele começa a se afastar e eu me sinto como se tivesse levado um
soco.
— Espere, Sr. Rider…, — eu começo.
— Espero que vocês estejam bem deixando a vida de cidade
pequena, — ele interrompe. — Porque vamos estar ocupados começando o
mais rápido possível para torná-los o primeiro Wreckage.
E assim, nossos sonhos se tornam realidade.
19
IAN
— Diga-me de novo, — Hazel diz através do telefone enquanto eu me
sento na cama naquela noite, recitando para ela tudo que aconteceu com
Max Fodido Rider naquela tarde. Os outros caras estão no segundo quarto
do hotel, celebrando o encontro bem-sucedido que havíamos realizado.
Max quer que saiamos em duas semanas para estarmos prontos
para trabalhar para caramba. Tudo está acontecendo tão rápido, e eu mal
consigo entender o está vindo em nossa direção.
Parece um sonho estranho e estou com medo de acordar a qualquer
segundo agora.
Eu rio no telefone. — Já disse três vezes.
— Eu sei, mas adoro ouvir a emoção na sua voz.
Eu mal posso esperar para voltar para Eres e beijá-la. Sempre que
não estou pensando em música, penso em Hazel e naqueles lábios
carnudos e grossos dela. Tem que significar algo, o fato de que quando as
boas novas chegaram a nós, ela foi a primeira pessoa com quem eu quis
compartilhar. Ela foi a primeira pessoa que veio à mente. Ela é… minha
pessoa.
— Você é minha melhor amiga, — eu sussurro, calafrios correndo
por mim enquanto as palavras saem da minha língua.
Mais arrepios me atingem quando ela diz isso de volta. — Você é
meu melhor amigo.
Eu não falo as próximas palavras que passam pela minha mente,
porque sei que seria muito confuso e muito, mas eu a amo. Eu a amo
muito, e não sei se é apenas um tipo de amor de amizade ou um tipo de
amor romântico, mas não importa para mim.
Porque o amor, não importa o tipo que seja, é uma coisa boa. Ela me
ensinou isso me fazendo explorar minhas emoções… ela tocou no amor
que ainda vive em mim, embora eu achasse que tudo tinha acabado depois
que meus pais me abandonaram. O amor é uma coisa boa, e Hazel Stone é
uma coisa boa ‘pra’ caralho para mim. Ela é a melhor coisa, e eu a amo
tanto que me assusta um pouco.
As últimas pessoas que eu amei tanto foram meus pais, e eles se
afastaram e nunca olharam para trás. O amor é tão bom, mas por trás
dele está o medo de que um dia possa ir embora. Eu não direi a ela
ainda. Manterei a coisa do amor para mim e segurarei por tanto tempo
quanto puder.
— Hora da confissão, — diz ela, enquanto deito no travesseiro com
uma das mãos apoiada na nuca. — Eu não dormi muito bem sem você ao
meu lado.
— Hora da confissão. Tenho abraçado meu travesseiro todas as
noites pensando que é você.
— Hora da confissão. Eu sinto falta do seu sorriso.
— Hora da confissão. Tenho saudades do teu riso.
— Hora da confissão… — Ela respira fundo e solta lentamente à
medida que cada palavra sai de seus lábios. — Eu … sinto falta … de você.
— Eu sinto mais sua falta.
— Não é possível.
— Sempre é possível.
— Quando você voltar, podemos nos beijar mais um pouco? — Ela
pergunta.
Eu rio. — Hazel, quando eu voltar, tudo o que vamos fazer é nos
beijar. Nos chiqueiros. Em casa. Na casa do celeiro. Nas ruas. Vou roubar
tantos beijos seus para economizar enquanto estiver fora em Los Angeles.
Ela fica quieta por um segundo. — Você está realmente se mudando
para LA, hein? Isso está realmente acontecendo.
Aquele é o primeiro momento em que percebo que estamos
realmente indo para Los Angeles. Que nossas vidas estão realmente
prestes a mudar para sempre. Merda.
— Você percebe o quão grande isso é, certo, Ian? Esta é a maior
oportunidade da sua vida, e é com o Max Fodido Rider, — ela exclama
dramaticamente, de alguma forma parecendo mais animada do que eu.
Ficamos no telefone naquela noite até que Marcus e James voltaram
para o quarto para dormir. Depois que eles dormiram, pergunto a Hazel se
posso ligar de volta para ela. Ela diz claro, e eu durmo com o telefone
pressionado contra o ouvido. Adormecemos um com o outro, embora
estejamos a quilômetros de distância.
Quando ouço seus pequenos roncos, deixo meus olhos pesarem
também.
20
HAZEL
Enquanto os caras estão em Los Angeles pegando as chaves de seus
sonhos, estou em Eres tentando o meu melhor para acabar com meus
pesadelos. Escrevo cartas para mamãe sem parar, procurando ter uma
ideia de como ela está. Presumo que eles cuidam das presidiárias grávidas
até certo ponto, mas com base no conhecimento que tenho sobre o
assunto – também conhecido como assistir documentários de prisão na
Netflix e chorar lágrimas reais durante cada um deles – tenho um grande
conjunto de medos.
Ela está recebendo suas vitaminas? O bebê está saudável com o uso
de drogas no passado? A criança realmente irá para Charlie quando ele
sair?
Pelo que eu sei, Charlie ainda está preso e eu sou grata por isso. O
que eu não agradeço é o fato de não ter como saber como minha mãe
está. Se ela é cuidada, se sente medo.
Claro, ela deve estar com medo. Como pode não estar?
Quando meus pensamentos ficam muito altos e todos os
pensamentos aterrorizantes passam por minha mente, crio coragem
suficiente para ir ao meu antigo bairro e bater na porta de Garrett.
Uso um dos moletons grandes de Ian e estou com o capuz
levantado. Tenho dormido com seus moletons todas as noites desde que
ele saiu. Gosto de como eles ainda têm o cheiro dele. É quase como se ele
estivesse comigo todas as noites.
Meus olhos continuam correndo ao redor do parque de trailers com
esperança de que ninguém note que estou aqui. As palavras anteriores de
Garrett continuam brincando na minha cabeça.
Você sabe o que acontece com os informantes?
Quando ele vem até a porta, resmunga enquanto abre a tela. Com
um cigarro pendurado entre seus lábios, ele solta uma nuvem de
fumaça. — Você tem muita coragem para vir aqui, — murmura.
— Sim, eu sei, mas eu não conseguia pensar em mais o que
fazer. Tenho tentado entrar em contato com minha mãe, mas ela não
responde a nenhuma das minhas cartas. Não posso mais visitá-la e estou
preocupada com ela.
— Oh, é mesmo? Você está preocupada com a mãe que você
prendeu? Que caralho de filha atenciosa você é, — ele comenta
sarcasticamente, soprando mais fumaça diretamente no meu rosto. Ele
parece destruído – como se estivesse usando mais do que o
normal. Quando estávamos juntos, ele nunca parecia tão tenso quanto seu
estado atual. Tinha perdido muito peso, ao que parece, vendo como seu
jeans está tão baixo contra os ossos do quadril. Ele está comendo? Está
cuidando de si mesmo?
Engulo em seco e faço o meu melhor para afastar o pensamento.
Não é mais minha preocupação.
Faço uma careta. — Só quero saber se ela está bem. Você já entrou
em contato com ela?
— Como se eu fosse te contar alguma coisa.
— Por favor, Garrett, — eu imploro. Eu estou implorando. Preciso de
respostas para as perguntas que passam pela minha cabeça dia após
dia. — Só quero saber se o bebê está bem e o que vai acontecer quando ele
nascer, já que não sei se Charlie vai sair da prisão para cuidar dele. Você
sabe de alguma coisa, Garrett? Você sabe de algo?
Garrett me dá um sorriso que envia calafrios enervantes pela minha
espinha. — Talvez eu saiba.
— Por favor, — imploro novamente. Pareço tão desesperada, mas
não me importo. Se ele quiser que eu caia de joelhos na frente de seu
maldito trailer, farei isso e rastejarei em seus sapatos.
— Você precisa dar o fora daqui antes que eu deixe as pessoas
saberem que você está de volta por aqui, — ele ameaça, fazendo meu peito
apertar de medo.
Dou um passo para trás. — Ok. Mas, por favor… você pode apenas
ter certeza de que o bebê está bem? Eu sei que você me odeia, e não posso
culpá-lo por isso. Eu me odeio o suficiente por nós dois. Mas se você se
preocupa com aquela criança, por favor, certifique-se de que ela fique
bem. Você sabe como é crescer por aqui, Garrett. Você teve mais sorte,
porque sua mãe é realmente uma boa mãe, mas você conhece a vida em
que a maioria das crianças por aqui crescem. Você conhece o mundo em
que cresci. Esta criança merece mais do que isso. Ele merece mais.
Deixo por isso mesmo e começo a me afastar.
— Hazel. — O som do meu nome me faz virar. Garrett fica ereto,
ainda fumando aquele cigarro que está pendurado entre seus lábios. — É
uma menina.
Uma pequena respiração cai de mim quando uma onda de emoções
passa por mim. — Eu sei. Ela me disse.
Ele apaga o cigarro no parapeito e o joga na estrada de cascalho. —
Ela odeia estar grávida, e porra, parece que está afetando-a, mas ela está
bem. Minha mãe e eu fomos vê-la na semana passada.
— Ela precisa de alguma coisa? Dinheiro? Suprimentos? Manteiga
de cacau? — Eu solto, meu coração batendo mais rápido e mais rápido a
cada segundo.
Ele encolhe os ombros. — Todo mundo precisa dessa merda. Se
quiser, pode deixá-lo comigo em duas semanas, quando mamãe e eu
formos visitá-la novamente. E mamãe vai cuidar do bebê por enquanto.
Sadie cuidará do bebê.
A menina.
Minha irmã pequena.
Isso é bom. Sadie tem seu quinhão de falhas, mas ser uma mãe ruim
não é uma delas. Lembro-me de ser jovem e desejar que ela fosse minha
mãe. Ela levava Garret ao parque. Saiam para ir ao cinema. Comprava
presentes de Natal para ele todos os anos. Pode ter sido duvidoso como ela
conseguiu dinheiro para fazer todas essas coisas, mas cada centavo que
ela já teve foi para aquela criança.
Tanto conforto cai sobre mim sabendo desses detalhes.
— Vou trazer as coisas em duas semanas. Obrigada, Garrett.
— Tanto faz. Cai fora, sim? — Ele diz, pegando seu maço de cigarros
e puxando outro para acender. — Estou cansado de ver a porra do seu
rosto.
Eu não argumento com seu pedido. Afasto-me com um pouco de
calma no meu coração enquanto volto para a casa de Ian. As palavras de
Garrett voam pela minha cabeça repetidamente enquanto eu caminho.
Quando chego em casa, vejo a caminhonete de Ian parada na
garagem e corro para dentro da casa.
Ele está em casa! Ian está de volta e tenho muito a dizer a ele, muito
a compartilhar. Tantos beijos para compensar devido ao tempo
perdido. Procuro por toda a casa e não encontro Ian em lugar nenhum.
Subo para o meu quarto para me trocar e quando abro a porta, um
sorriso cai em meus lábios quando vejo Ian sentado na minha cama,
esperando por mim.
— Oi, — ele diz, se levantando.
— Oi, — respondo.
— Novamente? — Ele pergunta, levantando uma sobrancelha. Sei
exatamente a que ele se refere também.
Vou até ele, passo meus braços em volta de seu corpo e fico na
ponta dos pés para alcançar seus lábios, e o beijo.
Novamente.
Eu gostaria de ter um controle remoto capaz de congelar o
tempo. Para fazer uma pausa em belos momentos, para retroceder esses
mesmos segundos para repetir as melhores partes. As próximas duas
semanas do meu tempo com Ian e o resto da banda voaram rápido
demais. Tento o meu melhor para estar presente em todas as situações,
mas o peso de tudo isso mudando em poucos dias é maior do que posso
suportar.
Eu gostaria que as coisas fossem diferentes. Gostaria de ter mais
tempo para manter conversas filológicas com James. Gostaria de ter mais
tempo para conversar com Eric sobre sua paixão por mídia social. Eu
gostaria de poder ouvir mais piadas ruins de Marcus.
Eu gostaria de ter mais beijos com Ian. Mais tudo com ele, sério.
Se houvesse um mundo onde nós dois pudéssemos ficar no mesmo
lugar, eu já seria completamente dele amanhã. No entanto, a triste
verdade de tudo isso é que não temos um amanhã. Só temos esse dia.
Big Paw e Holly estão dando uma festa de despedida para os caras
na casa do celeiro, e todos na cidade comparecem. Eles são conhecidos por
sediar grandes eventos, e como vêm com comida e bebida de graça, todos
sempre comparecem.
Suas festas são uma lufada de ar fresco em uma cidade muito
tóxica.
Eu estive vagando pela festa, procurando por Ian, nos últimos vinte
ou mais minutos.
— Você não vai encontrá-lo aqui, — uma voz diz, me fazendo virar.
Eu sorrio para James, que segura uma lata de refrigerante na
mão. — Onde ele está? — Pergunto.
— Esperando por você.
— Mas onde?
Ele sorri. — O mesmo lugar de que te assustamos semanas atrás. A
propósito, desculpe por isso.
Eu rio.
O galpão.
James coloca a mão no meu braço e me dá outro sorriso. — Hazel,
obrigado por tudo que você fez por esta banda, por Ian. Nem sei se
teríamos essa oportunidade se não fosse por você.
— Vocês eram bons o suficiente sem mim.
— Sim, mas você nos fez melhores. Você o fez melhor. Então,
obrigado por isso. Eu nunca o tinha visto realmente amar uma garota
antes. Fica bem nele.
Meu coração pulou um milhão de batidas.
Amar?
Ian me ama?
James deve ter visto o pânico em meus olhos, porque ele desvia seu
olhar do meu e tenta recuar. — Quero dizer, er, tipo, ele tem amor por
você. Quer dizer, o que eu quis dizer… ah, merda. De qualquer forma, Ian
está no galpão.
— Obrigada, James.
— Sem problemas. E Haze?
— Sim?
— Você pode manter isso em segredo sobre o fato de que Ian te
ama? Não tive a intenção de estragar antes que ele dissesse a
você. Merda. Não quero estragar o momento quando acontecer.
— Talvez isso não aconteça, — argumento.
— Confie em mim, — ele balança a cabeça. — Vai acontecer. Apenas
espere e veja. E diabos, finja surpresa, sim? Mas não muito surpresa. Uma
quantidade normal de surpresa. Nem muito nem pouco.
Eu rio e balanço a cabeça. — Vou fazer. Ele disse a você que me
amava durante o seu jogo de confissão?
James baixa as sobrancelhas, perplexo. — Jogo da confissão?
— Você sabe, o jogo que vocês dois jogam nos currais ao limpálos. Para fazer o tempo passar mais rápido.
— Uh, eu não tenho ideia do que você está falando.
Ele parece completamente perturbado com o meu comentário, e
aquelas borboletas voltam voando para mim em um instante.
Oh, Ian. Você e suas mentiras para me conhecer.
21
IAN
As pessoas sempre dizem que você sentirá saudades de casa assim
que sair, mas não acredito nisso. Eu não sentirei falta daquele lugar – nem
por um minuto. Não sentirei falta de trabalhar nos chiqueiros ou de andar
pela cidade com gente mesquinha. Não sentirei falta de estrume ou
feno. Não sentirei falta dos mosquitos que são assassinos. Eu não sentirei
falta das coisas que compunham Eres, mas há pessoas das quais eu
sentirei falta.
Três, para ser exato.
Eu sentirei falta da vovó e de suas refeições caseiras. Eu sentirei
falta de como ela ainda vem para a minha casa dobrar minhas roupas,
embora eu diga a ela que posso fazer isso sozinho. Eu sentirei falta de seus
abraços e conforto. Suas palavras sábias. Sua personalidade
positiva. Suas doses diárias de amor.
Eu sentirei falta de Big Paw também. Provavelmente até sentirei falta
dele me enchendo por coisas estúpidas. Eu sentirei falta de seu estilo duro
de paternidade. Eu sentirei falta de seus quase sorrisos, quando você faz
algo para deixá-lo orgulhoso. Eu sentirei falta de sua atitude e amor.
Em seguida, há Hazel. Eu sentirei falta de tudo sobre ela. Mesmo as
coisas que eu ainda não descobri.
Sento-me dentro do galpão enquanto olho para as estrelas no céu. A
algumas centenas de metros de distância está a casa do celeiro, onde uma
festa animada acontece. Eu disse a minha avó que os meninos e eu não
queríamos uma festa de despedida, então é claro que ela e Paw nos deram
uma festa de despedida.
— Você vai ficar sentado aqui a noite toda refletindo ou vai vir a sua
festa e comemorar? — Uma voz pergunta.
Olho para cima para ver Hazel vestindo um dos meus moletons e
shorts pretos. Suas coxas parecem lisas e grossas e, porra, quero me
enterrar entre elas e ficar por um tempo. Ela usa seu par favorito de
sapatos pretos da sorte. Meus sapatos. Não há como negar que eles
parecem melhores nela do que em mim.
— Você sabe que não dou a mínima para essa festa, — respondo. —
Prefiro ter minha última noite com as pessoas de quem mais gosto.
— Como quem?
Dou a ela um sorriso conhecedor. As suas bochechas coram quando
ela me devolve o sorriso.
Essas fodidas bochechas beijáveis.
— Que tal você ir lá fora e sair comigo. Estou com vontade de
balançar nos pneus.
Faço o que ela diz e encontro-a fora do galpão.
Ela começa a vagar na direção dos velhos balanços de pneus
colocados contra os dois grandes carvalhos do rancho. Logo atrás das
oscilações dos pneus há um poço de desejos que está fora de serviço desde
antes de eu nascer, mas mesmo assim as pessoas chegam e jogam suas
moedas no poço na esperança de que seus sonhos se tornem realidade.
Hazel enfia a mão no bolso de trás e tira duas moedas. — Você
acredita em mágica? — Ela pergunta.
— Desde você, estou começando a acreditar um pouco mais a cada
dia.
Ela me entrega uma moeda. — Então faça um desejo. Faça um
bom. Já ouvi falar desses desejos também. Como as pessoas desejaram
dinheiro, bebês e casamento. Então, todos os seus desejos se tornam
realidade.
Vou jogar a moeda no poço e Hazel salta na minha frente. — Espere,
Ian! Você não pode simplesmente jogar fora. Você tem que tomar seu
tempo e ter certeza de que seu desejo está claro como o dia. Você só tem
uma chance de acertar as palavras. Faça o seu desejo contar.
Dou a ela um sorriso desleixado e jogo minha moeda no poço.
Ela franze a testa e segura a moeda perto do coração, fecha os olhos
e inclina a cabeça para a lua. É uma lua crescente. Se você tivesse me
perguntado meses atrás se eu sei a diferença entre lua cheia, lua nova e
lua crescente – ambos crescentes e minguantes – eu o teria chamado de
louco.
Mas esse é o tipo de merda que eu conheço agora, tudo por causa de
Hazel e sua mente intrigante.
Ela leva a moeda aos lábios antes de abrir os olhos e jogá-la no poço
e depois girar nos calcanhares para me encarar. — Aposto que meu desejo
se tornará realidade antes do seu, já que demorei muito para fazê-lo.
— O que você desejou?
— Você não pode contar às pessoas o seu desejo, caso contrário, isso
o anula. — Ela estreita os olhos. — O que você desejou?
— Ah, não. Você não vai estragar o meu desejo.
Assim que alcançamos o balanço, não conversamos muito. Hazel
observa as estrelas com tanta admiração em seu olhar. Às vezes, ela fecha
os olhos e eu juro que ela está fazendo mais desejos.
— Você ouve essa música, Ian? — Ela pergunta, balançando para
frente e para trás em seu pneu.
— Sim, eu ouço.
— É uma das minhas favoritas.
— Oh? O que é isso?
Ela encolhe os ombros. — Não sei, mas posso dizer que vai ser uma
das favoritas do momento.
Eu rio. — Você é estranha às vezes.
— Sou sempre estranha. — De repente, Hazel salta do balanço e
estende a mão na minha direção. — Venha dançar comigo.
— O que? Não. É uma música lenta. Eu não danço músicas lentas.
— Você dança músicas rápidas?
Eu pauso. — Bem… não.
— Ian Parker, se você não sair desse balanço e dançar comigo, juro
que direi a todos que foi você quem colocou fogo na caixa de correio do Big
Paw.
Levanto uma sobrancelha. — Você não ousaria.
Ela empurra a língua na bochecha e coloca as mãos nos quadris. —
Teste-me.
— Isso vai contra as regras da matilha de lobos.
— Felizmente, não faço parte da matilha.
Eu rio. — Depois desses últimos meses, acho que você faz mais
parte da matilha do que eu. Você realmente não contaria a Big Paw.
— Quer apostar nisso?
Estreito meus olhos para ela, e ela estreita os dela de volta.
Ela está blefando.
Ela tem que estar.
Balanço minha cabeça. — O que isso importa? Estou saindo desta
cidade pela manhã, de qualquer maneira.
— Você acha que Paw não vai rastreá-lo para chutar sua bunda por
arruinar a caixa de correio dele? — Ela pergunta.
Bem, sim.
Eu sei que ele irá. Ele esculpiu aquela caixa de correio à mão há
mais de vinte e cinco anos. Essa caixa de correio era mais velha do que eu
e provavelmente irritou Big Paw muito menos do que eu.
Eu me levanto do meu pneu e aponto o dedo em sua direção. — Se
eu dançar com você, você não pode me chantagear com a caixa de correio
novamente.
— Eu não vou.
— Promete?
Ela pega os dedos e faz uma cruz sobre o peito. — Cruzei meu
coração.
Se ela não fosse tão irritante naquele momento, pensaria que ela é
bonita.
Quem eu estou enganando? Ela é linda.
— Eu posso liderar, — eu digo.
— Não seria de outra maneira, — responde ela, estendendo a mão.
Relutantemente pego a sua mão na minha e começamos a dançar a
música lenta que ela não conhece, mas tem certeza de que é sua nova
favorita.
— Ai! — Ela salta para trás segundos depois que pio em seu pé.
— Desculpe, — eu murmuro. — Eu disse que não danço música
lenta.
Ela se reagrupa e se aproxima novamente. — Está bem. Você pode
melhorar com a prática.
Dançamos para frente e para trás, e Hazel encosta a cabeça no meu
ombro. Enquanto balançamos, ela cantarola a música como se conhecesse
cada palavra.
— Veja? — Ela sussurra. — Isso não é bom?
Não respondo, mas a verdade é que não odeio. Odeio muitas coisas
na pequena cidade de Eres, mas dançar música lenta com Hazel não é
uma delas.
— Você está com medo, Ian? Sobre sair de casa?
— Nem um pouco, — respondo rapidamente. Não há nada de
assustador em deixar a cidade e ir para Los Angeles para perseguir minha
carreira musical. A única coisa assustadora para mim é ficar em uma
pequena cidade e nunca alcançar meus sonhos.
Se eu não deixar Eres amanhã, tenho quase certeza de que nunca
irei embora.
— Então vou ficar com medo por você, — ela comenta, me segurando
com mais força, e eu permito, porque tudo que quero fazer nas próximas
quinze horas é segurá-la perto de mim. — Só não quero que você se perca,
sabe. Muitas vezes as pessoas correm atrás deste grande sonho de
Hollywood e se perdem.
— O que você sabe sobre as pessoas perseguindo seus sonhos de
Hollywood? Ninguém que conhecemos jamais fez o que minha banda e eu
estamos fazendo.
— Eu sei, mas já vi filmes o suficiente para saber que Hollywood
muda as pessoas.
Talvez.
Mas não eu.
Eu só quero tocar minha música para um público maior do que os
velhos no celeiro.
— Eu vou ficar bem, — eu digo a ela.
— Bom, porque eu gosto de você do jeito que você é. Sabe o que,
Ian?
— Humm?
Hazel olha para mim com os olhos marejados e balança a cabeça um
pouco. — Às vezes eu penso em como você não vai estar mais por perto, e
meu coração dói muito.
— Vamos, Hazel. Não fique muito emotiva. Eu voltarei.
— Não, você não vai, — ela sussurra, colocando a cabeça para trás
no meu ombro.
Eu não respondo, porque sei que ela está muito certa, e quando eu
voltar, provavelmente terá ido atrás de seus próprios sonhos.
— Vou sentir muito a sua falta, Ian, — ela confessa.
Continuamos dançando entre as oscilações dos pneus, Hazel
continua sorrindo na minha direção e, caramba, vou sentir falta desse
sorriso.
A música muda para uma mais rápida, mas mantemos nossa
velocidade lenta.
Ela olha para mim e me dá outro sorriso. Desta vez é mais triste. —
Novamente?
Eu a beijo.
Eu a beijo lento e suavemente e deixo meus lábios demorarem,
porque estou com muito medo de me afastar dela.
— Haze… — sussurro, olhando em seus olhos. Sinto tudo por essa
garota. Quero contar a ela sobre as palavras voando na minha cabeça. Eu
quero que ela saiba como o amor corre por cada fibra da minha existência
e que o amor pertence a ela. Mas estou com medo, porque de manhã eu
irei embora. De manhã, e não poderei fazer nada sobre o dito amor.
Ela olha para mim e acena com a cabeça. — Eu sei, Ian, — diz
suavemente, como se pudesse ler meus pensamentos e minha mente
confusa. — Eu também.
Sua cabeça cai para trás no meu ombro, e balançamos pelo resto da
noite. Então eu a levo para seu quarto e a seguro uma última vez.
Enquanto estamos deitados na cama, começo a fechar meus olhos,
mas paro quando sinto uma mão acariciando levemente minha boxer. Se
há alguma coisa que acordaria um homem cansado, é uma mão se
movendo contra seu pênis.
Inclino minha cabeça para olhar em sua direção, me perguntando se
o leve toque foi um erro sonolento, mas seu olhar está totalmente focado
em mim enquanto faz o ato. Ela toca a faixa da minha boxer antes de
puxá-la para longe da minha pele, abrindo espaço suficiente para ela
deslizar a mão dentro. Enquanto agarra meu pau, começa a acariciá-lo
para cima e para baixo lentamente, mantendo contato visual comigo
enquanto faz isso. Então ela adiciona um pouco de pressão aos seus
golpes, me fazendo gemer de prazer com a leve sensação que ela me dá.
Ela tira a mão da cueca por um segundo e lambe a palma da mão,
depois chupa cada um dos dedos, lubrificando completamente a mão,
antes de colocá-la de volta e tornar suas carícias um pouco mais
rápidas. Meu pau cresce em sua mão quando ela me excita, deslizando a
mão sobre a cabeça e movendo-a para baixo para o eixo. Cada vez que ela
acaricia, minha mente quer explodir.
— Haze… Assim como… isso, — eu suspiro, incapaz de manter meus
olhos abertos enquanto a sensação de desejo me domina.
Ela se senta na cama e começa a puxar minha boxer por minhas
pernas. Ela joga para o lado do quarto e se abaixa para ficar ajoelhada no
chão, bem na frente da cama.
— Gire seu corpo, — ordena. — Chegue mais perto de mim.
Faço o que ela disse, com meu coração batendo forte como se eu
fosse uma porra de uma criança na manhã de Natal enquanto ela mantém
seus golpes fortes. Move sua boca para mais perto do meu pau, e sua
respiração quente roça meu interior das coxas enquanto ela beija minha
pele levemente. Sua língua desliza para fora de sua boca, e circula a ponta,
fazendo calafrios correrem pela minha espinha.
Porra!
Porra, porra, porra.
Então ela me leva em sua boca, chupando meu pau longo e forte,
permitindo que sua mão deslize para cima e para baixo junto com sua
boca. Sua língua faz a porra de um oito contra a base, e porra, tenho que
cobrir meu rosto com as mãos para não gritar de prazer. Ela mantém o
ritmo e me engole por inteiro, permitindo que a intensidade do boquete me
ultrapasse. Coloca a mão livre logo abaixo da minha barriga e empurra
levemente contra mim, e porra, gozarei na boca de Hazel Stone se ela não
parar a qualquer segundo. Meus pés começam a bater contra o chão
enquanto meu corpo começa a se erguer do colchão por estar tão perto de
gozar.
— Pare, pare, pare, — eu ordeno, puxando-a para longe.
Ela olha para mim com confusão em seu olhar. — Eu sinto
muito. Você não gostou…
— Merda, Haze, — murmuro, balançando minha cabeça. — Eu amei
isso ‘pra’ caralho. Mas eu quero provar você primeiro. — Eu a puxo do
chão e a coloco contra a cama. — Eu quero provar cada pedaço de você.
— Oh…? — Ela pergunta enquanto suas bochechas avermelham em
um instante. — Então, o que você precisa que eu faça?
— Isso é fácil. Eu preciso que você tire suas calças.
22
HAZEL
Eu nunca tive um cara que tivesse me beijado lá embaixo. Tudo que
Garrett e eu tínhamos feito era namorar, e eu dava a ele punhetas e
boquetes de vez em quando, mas ele nunca fazia nada comigo. Ele disse
que isso era muito nojento e que não gostava de estar lá.
Nunca pensei muito nisso, porque não me importo. Se eu quiser
gozar, há muitas maneiras de fazer isso sem um garoto estúpido que é
muito criança para agradar a uma mulher.
Mas com Ian naquela noite? Não há problema no mundo. Ian tira
minha calça de pijama e calcinha com tanta calma. Ele olha para o meu
corpo de uma forma que Garrett nunca fez – como se ele adorasse cada
curva.
Puxa minha camiseta pela cabeça e eu sento lá com meu sutiã,
quase completamente nua na frente do primeiro homem a ter controle total
sobre meus batimentos cardíacos. Em seguida, passa os lábios em cada
pedaço de mim. Todas as partes que eu amo e aquelas que me trazem
inseguranças. Sua língua dança no meu pescoço, nas curvas do meu
peito, contra as dobras do meu estômago, através dos ossos do meu
quadril, contra a parte interna das minhas coxas.
Uma poça de calor cai contra meu núcleo quando Ian abre minhas
pernas. Ele respira contra o meu sexo enquanto deito, a antecipação
fazendo minhas inalações e exalações cada vez mais difíceis de
alcançar. Então ele pega dois de seus dedos contra meu núcleo e me abre,
criando um V com seus dedos. E bem entre o V, ele coloca sua língua, me
lambendo para cima e para baixo, chupando meu clitóris enquanto grito
de prazer.
Oh, meu Deus…
Como ele faz isso com a língua? Como move tão rápido e devagar,
para cima e para baixo, cada vez mais fundo.
Oh, meu Deus, Ian se enterra em mim enquanto meus sucos se
libertam de seus desejos… necessidades e desejos. Ele desliza dois dedos
dentro de mim e faz um movimento de gancho contra o meu núcleo, me
trazendo cada vez mais perto de um orgasmo. Eu não tenho certeza de
quanto mais poderei aguentar. Não tenho certeza se serei capaz de me
controlar para não me soltar totalmente.
— Toda você, — ele sussurra, olhando para cima para me olhar nos
olhos. Desliza outro dedo com os outros dois e trabalha-os como um
mágico, enchendo-me com seus poderes místicos. — Eu quero provar tudo
de você. Solte, Haze. Deixe ir, — ele ordena antes de retornar sua língua ao
meu sexo e mais uma vez começar a me foder forte e profundamente com
sua língua. Meus dedos se enredam nos lençóis enquanto meus quadris
empurram da cama em direção à sua boca. Minhas pernas começam a
tremer enquanto ele acelera. Dentro e fora, dentro e fora, golpes longos e
úmidos de sua língua.
— Ian, — eu choramingo, mas nenhuma palavra sai enquanto
liberto cada gota de mim em sua boca. Ele lambe e lambe, me chupando
como se fosse um animal faminto, não querendo deixar uma única
gota. Quando ele termina seu curso, senta-se sobre as pernas e sorri para
mim. Seu rosto brilha com meus sucos, e eu coro ao vê-lo lamber seus
lábios para limpar. Então meus olhos caem para a dureza de seu pau, que
ele está acariciando lentamente para cima e para baixo. Meus olhos ficam
fixos em assistir sua mão se mover para cima e para baixo em seu enorme
pau, e uma onda de desejo volta para mim.
— Leve-me, — eu sussurro, sentando em meus antebraços.
Ele ergue uma sobrancelha. — Haze…
— Leve-me, — repito, balançando a cabeça. — Por favor, Ian. Eu
quero muito você agora, bem aqui… por favor…
Ele se levanta do chão e se aproxima de mim. Seu corpo paira sobre
o meu e ele me beija com força, permitindo-me me provar contra seus
lábios. Nossas línguas dançam e ele me beija como se estivesse tentando
me contar um segredo que um dia eu irei desvendar.
— Se fizermos isso, não podemos fingir que não somos um casal,
Hazel, — alerta. — Se eu deslizar para dentro de você, você é minha.
— E você é meu, — eu respiro contra seus lábios, colocando minhas
mãos em seu peito. — Você é meu. — A verdade é que ele sempre foi
meu. Eu só estava esperando pelo dia em que também seria dele.
Ele se firma em cima de mim e esfrega sua dureza contra meu
sexo. — Se doer… me pare, ok?
— Ok, — minto. Eu não tenho planos de impedir Ian de deslizar para
dentro de mim. Não tenho planos de impedir que ele me preencha.
Ele alcança a mesa de cabeceira e pega um preservativo de sua
carteira. Enquanto o coloca, assisto com espanto. Ele bombeia a mão para
cima e para baixo em seu eixo algumas vezes antes de esfregar contra mim
novamente. Então desliza dentro de mim.
Minha boca se abre quando ele encontra seu caminho tão
profundamente dentro de mim. Surpreendentemente, não dói tanto quanto
eu pensei que doeria. Demoro alguns segundos para me acostumar com a
nova sensação, mas quando me acomodo e permito que Ian se empurre
fundo em mim, começo a gemer porque me sinto… tão…
Bem.
Eu já me sinto como se estivesse à beira de outro orgasmo enquanto
seus quadris balançam contra os meus. Ele pega meus pulsos em suas
mãos e os prende acima da minha cabeça enquanto se dirige para mim
com força e puxa lentamente, me provocando, fazendo meu desejo crescer
mais e mais.
Cada vez que ele puxa lentamente e bate de volta em mim, meu
corpo treme todo. Cada músculo do corpo de Ian é destacado de uma nova
maneira quando ele me prende na cama.
— Ian… Eu vou… Eu vou… — Grito. Puxo minha mão da dele e
agarro o travesseiro mais próximo. Cubro minha boca com ele enquanto
solto os gemidos do melhor orgasmo da minha vida. Meu corpo inteiro
treme de nervosismo enquanto Ian continua. Mais forte, mais rápido, mais
profundo…
— Foda-se, — ele geme, — Haze, eu vou… porra, eu vou…
— Por favor, — imploro, querendo que ele se sinta tão bem quanto
eu. Quero que ele goze dentro de mim. Eu quero que ele se perca. Quero
ser responsável por seus olhos rolarem para a parte de trás de sua cabeça
de felicidade completa.
E quando isso acontece, quando seu corpo começa a tremer em cima
de mim, eu também me perco. Ele fecha os olhos quando goza com força
dentro de mim, e meu coração dispara com orgulho, admiração,
com… amor.
Oh, meu Deus, eu o amo.
Ele desaba em cima de mim, suado e sem fôlego. Não diz uma
palavra por um momento, então ele desliza para fora de mim e rola para o
lado esquerdo da cama.
— Santa… — ele murmura.
— Merda, — eu termino, rindo um pouco.
— Você não entende. Aquilo foi… isso aí… aquilo foi… merda… — Ele
suspira de novo, esfregando a mão no rosto. — Eu nunca senti isso assim,
Haze. Nunca foi tão bom, porra. — Ele se inclina e beija minha
bochecha. — Aquilo parecia mais do que sexo. Isso parecia mais
profundo. Parecia fazer… — Suas palavras vão sumindo e ele se controla
antes de dizer mais algo. Embora eu saiba o que ele está pensando.
Parecia fazer amor.
Ele me dá um sorriso preguiçoso. — Gostei quando você gritou meu
nome em seu travesseiro.
— Eu gostei quando você fez… — Faço uma pausa e franzo o
nariz. — Tudo.
Ele se senta e remove o preservativo sujo de seu pau e joga-o na lata
de lixo. Então ele se senta nu na beira da minha cama, ainda tentando
recuperar o fôlego. Ele leva minha mão ao peito e coloca-a sobre o
coração. — Você vê o que você faz comigo, Haze? Você faz meu coração
ficar selvagem.
Adoro essa sensação. Eu amo como ele me deixa controlá-lo, e amo
como ele me controla exatamente da mesma maneira.
Deitamos um ao lado do outro, ainda nus e expostos, nossos corpos
e nossos corações.
— Já estou com saudades, — ele diz, apoiando os lábios na minha
testa.
— Eu sinto mais sua falta. — Mordo meu lábio inferior. — Quando
você voltar, podemos fazer isso de novo?
Ele ri para si mesmo. — E de novo. E de novo. Afinal, você é minha.
E você é meu, Ian Parker.
Todo meu.
23
IAN
Eu tive um total de três horas de sono na noite anterior devido à
como as coisas se desenrolaram entre Hazel e eu. E não estou nem um
pouco incomodado com isso. Eu teria me rendido às três horas que
consegui se não fosse pelo fato de ela ter adormecido primeiro.
Meus avós e Hazel me ajudaram a colocar minhas malas na
caçamba da caminhonete de Big Paw. Quando tudo foi dito e feito, não
posso deixar de sentir um nó se formando em minhas entranhas. Não sei
como são com as despedidas, principalmente porque nunca tive que lidar
com elas antes. Nunca tive a chance de dizer adeus aos meus pais antes
deles fugirem e, desde então, todos que conheço têm um jeito de ficar por
perto.
Isso é uma coisa sobre estar em uma cidade pequena por toda a vida
– você nunca tem que realmente dizer adeus àqueles que significam mais
para você, até que a morte nos separe.
Mas agora, tenho que fazer isso. Preciso me despedir de minha
família e, no fim das contas, não estou pronto. Parece que mãos estão em
volta do meu pescoço, forçando minha respiração a ficar mais difícil.
— Bem, eu vou primeiro, — diz vovó. Seus olhos já estão pesados de
lágrimas. Ela se aproxima e me envolve em um abraço. — Não se esqueça
de tirar suas lentes de contato à noite, certo? Caso contrário, você pode
ficar cego.
— Sim, senhora.
— E fio dental. Eu sei que provavelmente não vai me ouvir, embora
eu tenha falado a vida toda, mas se você quiser manter esse seu sorriso, é
melhor usar fio dental diariamente. Se não for diariamente, dia sim, dia
não.
— Sim, senhora.
— E pelo amor do Senhor, por favor, separe suas roupas brancas
das coloridas ao lavar roupa. E, por favor, por favor, por favor, lave sua
roupa. Não deixe empilhar no canto até que você esteja com seu último par
de boxers, — ela ordena.
Eu rio. — Sim, senhora.
— E uma última coisa. — Ela coloca as mãos no meu rosto. —
Quando você precisar de nós, você liga. Dia ou noite, você liga para
casa. Ok?
— Ok, eu prometo.
Ela se inclina e beija minha bochecha antes de bater suavemente
com a mão contra ela. É assim que ela “deixa os beijos no lugar”. — Ok,
bom.
Eu me viro para Haze, que está um pouco para trás.
Esfrego meu ombro esquerdo. — Tem certeza de que não quer ir
conosco ao aeroporto, Haze? Ou mesmo vir para LA? — Estou meio
brincando. Não consigo tirar os pensamentos de nossa noite juntos da
minha cabeça. Tudo o que quero é mais noites como a anterior. No mundo
perfeito, eu voltaria para casa de um dia no estúdio, puxaria ela para o
chuveiro comigo e faria amor com ela sob a água fumegante. Faria amor
com ela na cozinha também. Na sala de estar. Sala de jantar. Em cada
lugar possível, eu faria amor com ela.
— Não me tente, — diz ela. — Se eu fosse para LA com você, duvido
que gostaria de voltar.
— Tudo bem, bem, acho que acabamos de dizer bom…
— Não faça isso, Ian, — interrompe ela, fechando os olhos. — Não
diga adeus, ok? Apenas me abrace e acabe com isso.
Faço o que ela disse e ela me segura com mais força do que antes.
— A noite passada foi perfeita, — eu sussurro em seu ouvido.
— Perfeita, perfeita, — ela responde. Então se afasta um pouco de
mim. — Você vai me ligar, — ela ordena. — Sempre que você tiver uma
chance.
— Vou fazer. E você pode usar minha caminhonete enquanto eu
estiver fora para dar uma volta, se quiser.
Eu rio um pouco quando ouço Big Paw perguntar a vovó: — Quando
eles se aproximaram?
— Você está sempre dormindo durante as coisas, Harry. Perdendo as
coisas bem na sua cara, — ela responde.
Paw resmunga um pouco e coça a barba. — É melhor irmos
andando, caso contrário, não chegaremos ao aeroporto a tempo.
É uma longa viagem até o aeroporto mais próximo, o que significa
que temos que sair mais cedo do que eu gostaria.
Um pouco mais de tempo com Hazel e Vovó não seria horrível.
Como eu já estou com saudades de casa quando nem fui embora?
Balanço a cabeça uma vez em direção a Big Paw e, em seguida, dou
a vovó e Hazel um último abraço.
Abro a porta do passageiro da caminhonete e começo a subir em
meu assento.
— Ian, espere!
Olho para a minha esquerda e vejo Hazel correndo em minha
direção.
Ela salta em meus braços e pressiona seus lábios contra os
meus. Eu a beijo forte e profundamente, desejando nunca ter que deixá-la
ir.
— Vou sentir sua falta, Ian. Quando você se tornar um astro, não se
esqueça de nós, pessoal da cidade pequena, ok?
— Eu não poderia te esquecer nem mesmo se eu tentasse. Além
disso, vou ligar para você todas as manhãs e todas as noites, — eu juro.
Ela morde o lábio inferior. — Não sei como isso funcionará, Ian. Você
vai estar tão ocupado com sua vida e…
— Nós reservamos tempo para as coisas que importam, — eu afirmo,
interrompendo-a. — Você é uma coisa que importa.
Sua cabeça abaixa por uma fração de segundo, e quando ela olha
para cima, está com aquele sorriso que eu amo. E a beijo novamente. Pela
primeira vez na minha vida, a música não é a única coisa que realmente
importa.
— Obrigado, Haze.
— Pelo quê?
— Por ter me ensinado como sentir novamente.
— O que diabos é isso? — Big Paw late.
Vovó acena para fora de seu tom irritado. — Oh, cale-se, seu
velho. Deixe as crianças serem crianças. Lembro-me de um certo menino
que costumava me beijar assim também.
— Quem era? — Big Paw zomba. — Vou chutar a bunda dele.
Vovó ri e balança a cabeça. — Shh. Agora, mexa-se antes que você
perca o voo e ele terá que voltar e beijar Hazel novamente.
Isso acende uma faísca sob a bunda de Paw, e ele corre para o banco
do motorista.
Aceno um adeus uma última vez antes que Big Paw coloque a
caminhonete em movimento.
Observo as duas mulheres acenarem para mim através do espelho
lateral até que estejam fora de vista.
A viagem para o aeroporto é bem tranquila. Big Paw e eu não
gostamos muito de conversar, e o silêncio não me incomoda nem um
pouco. Minha mente está muito ocupada pensando no futuro e no
passado. Quando chegamos ao aeroporto, ele me ajuda a pegar minhas
malas na parte de trás. Pego o estojo do meu violão e o coloco no meio-fio
para que possa dizer meu adeus final.
Big Paw não para de coçar a barba. — Ian, olhe, eu sei que não sou
bom com palavras como sua avó. Ela é muito mais emocional do que a
maioria das pessoas e, bem, ela sempre diz a coisa certa. Não sou eu,
então vou dizer o que preciso dizer e tirar isso do caminho.
Ele troca o boné de beisebol em sua cabeça antes de enfiar as mãos
nos bolsos. E pigarreia. — Você tem sido um pé no saco desde que era
criança.
Não é o discurso de despedida que eu esperava.
— É verdade. — Ele assente. — Você tem sido uma porra de um pé
no saco. Ao longo de toda a sua infância, você me irritou. E me deu todos
os fios de cabelo grisalhos da minha cabeça.
— Isso é para ser um adeus inspirador, por que…
— Apenas feche a boca e deixe-me terminar, certo? — Ele dispara.
— Sim, senhor.
Ele move os pés de um lado para o outro antes de beliscar a ponta
do nariz. Quando fixa os olhos nos meus, seu olhar se enche de lágrimas e
eu juro que nunca vi meu avô chorar. — Eu só quero que você saiba que
você herdou todas essas características de mim. As partes boas, ruins e
complicadas. Você é um espelho do seu velho, Ian, e eu não gostaria que
você fosse outra coisa senão quem você é. Então você vai para Los Angeles
e dá uma merda neles, certo? Você é um pé no saco dos diabos, mas você é
meu. Irritante ‘pra’ caralho. Incomode o mundo inteiro até realizar o seu
sonho. Você obtém esse sucesso e se apega a ele. Não se atreva a olhar
para trás, para este lugar, até que realmente precise, mas quando você
precisar olhar para trás, estaremos aqui esperando.
Droga…
Agora eu estou chorando.
Fungo um pouco e balanço a cabeça. — Sim, senhor. Eu prometo.
— Ótimo. Agora vamos. Vamos acabar com essa porcaria enfadonha.
— Ele estende os braços na minha direção e me puxa para um abraço. Eu
o seguro e sinto sua falta antes mesmo de deixá-lo ir. — Estou orgulhoso
de você, filho, — ele diz suavemente antes de me largar. — Agora vá. Vá
ser uma estrela do rock.
Pego a caixa do meu violão e agarro as alças das minhas malas. Ao
entrar no aeroporto, uma pequena parte de mim quer se virar e olhar para
trás, mas não o faço.
Olhar para trás não é uma opção. De agora em diante, só olhar para
frente.
24
HAZEL
As cores do outono pintam as folhas de Eres, e não demora muito
para que o verão acabe e o outono entre em cena. Passo as semanas
seguintes tentando muito me manter ocupada no rancho.
Quando Big Paw me chama em seu escritório, estou tão nervosa
quanto no primeiro dia em que o conheci. Mesmo que nos últimos meses,
tenhamos ficado mais próximos – de um jeito tipo Big Paw, que ainda
parece não estar perto – ele ainda me assusta um pouco.
— Sente-se, Hazel, — diz-me com sua voz rouca, charuto mastigado
pendurado na boca.
Faço o que ele disse e limpo minha voz. — Se isso tem alguma coisa
a ver com as galinhas saindo do galinheiro, eu assumirei total
responsabilidade. O novo cara deixou o portão aberto, mas isso foi porque
eu não disse a ele para fechá-lo, — digo, as palavras saindo da minha
língua quando as palmas das minhas mãos começam a suar.
— Não se trata de nenhum maldito galinheiro, — ele profere.
— Oh. — Mudo meu peso na cadeira e limpo minhas mãos nas
pernas. — Então, por que você me chamou?
— Eu vi sua mãe outro dia.
— Desculpa, o que?
Ele se recosta na cadeira e esfrega o queixo com a mão. — Eu dirigi
até a prisão para falar com ela. Para ter certeza de que ela estava bem. Ela
disse que tem recebido suas cartas, mas se sentiu mal em respondê-las
depois da última conversa com você. Ela ainda estava se desintoxicando, e
acredito que disse algumas coisas que não quis dizer.
— Como… espera… que? Como você conhece minha mãe?
Suas sobrancelhas franzem enquanto suas mãos se cruzam. — Holly
e eu criamos crianças nesta cidade desde que podemos nos lembrar. Jean
era apenas uma criança quando passou por aqui. Ela estava grávida e com
medo – quase como está agora. Nós a acolhemos e fiz o meu melhor para
cuidar dela. Holly e eu fizemos. Ela era uma ótima criança. Quieta, mas
forte. Ela também tinha sonhos. Falava sobre como iria para a faculdade e
se formaria. Como ela iria tornar sua vida melhor do que a dela. Como ela
te amava. Ela tinha sonhos para si mesma e para você – mas veio de uma
família desfeita. E tinha muitos hematomas emocionais. — O olhar
sombrio que surge em seu rosto me faz querer chorar. — Ela, hum… ela se
aproximou de minha filha – a mãe de Ian – o que foi a pior coisa que
poderia ter acontecido com ela, eu acredito. Até hoje, eu me culpo.
— Se culpa pelo quê?
— Eu não sei, — ele sussurra, abaixando a cabeça e tirando o
charuto dos lábios. — Tudo. Eu não sabia que minha filha e seu namorado
já estavam se metendo em problemas. Eles tinham um filho de três anos, e
percebi que eles estavam apenas encontrando seu caminho como
pais. Depois que você nasceu, passou alguns meses na minha casa
com sua mãe, até que sua mãe decidiu que queria morar com minha filha
na casa da fazenda. Foi quando minha Sarah a apresentou a Charlie.
O ar é arrancado de mim quando me recosto na cadeira,
completamente perplexa com essa revelação. Eu já morei naquela casa
antes com minha mãe? Minha mãe conheceu Charlie por causa dos pais
de Ian?
Minha mente está se movendo a um milhão de quilômetros por
minuto. Tenho tantas dúvidas, mas nem sei por onde começar. Big Paw
deve ter percebido a confusão em meu rosto, porque ele se endireita na
cadeira e, por um momento, penso ter visto um lampejo de emoção em seu
olhar. Um lampejo de culpa.
— Eu me culpo muito pelo que aconteceu com sua mãe ao longo dos
anos. Se ela não tivesse a amizade com minha filha, quem sabe como suas
vidas poderiam ter sido? Ela teria um diploma universitário. Ela teria feito
algo de si mesma. Ela nunca teria se envolvido com Charlie.
— Talvez. — Dou de ombros. — Ou talvez ela tivesse ficado
pior. Talvez ela tivesse acabado morta se você nunca a tivesse acolhido.
Paw, você não pode se culpar pelas escolhas que sua filha ou minha mãe
fizeram. Não é seu fardo para carregar.
— Então por que parece tão pesado nas minhas costas?
Eu sorrio, estendo minha mão sobre a mesa e coloco na dele. —
Porque seu coração é tão grande, que se culpa pelas tragédias dos outros.
Seus olhos se movem para a minha mão na dele, e então ele me
lança um olhar severo. E puxo minha mão lentamente.
Ok, não estamos no tocante estágio de conforto do nosso
relacionamento. Devidamente anotado.
— Tudo o que estou dizendo é que minha mãe fez escolhas que
afetaram sua vida. Você a acolheu quando ela precisava de um lar, e isso
era mais do que a maioria das pessoas teria feito. Além disso, você me
acolheu. — Faço uma pausa e estreito meus olhos. — Você fez isso para
compensar o que aconteceu com minha mãe?
Ele assente lentamente. — Eu devia a você. Queria que você tivesse
a chance de transformar sua vida em algo, como sua mãe queria fazer,
mas nunca teve a chance de encarar.
Para um homem grande e mal-humorado, Big Paw é a pessoa mais
doce do mundo. Posso ver como Holly se apaixonou por ele. Atrás de seu
exterior grande e mau, está o homem mais suave do mundo. Ian deve ter
herdado isso dele. Ambos são como ogivas – extremamente azedos até que
a doçura seja revelada.
— Eu não vou decepcioná-lo, senhor.
Ele ergue uma sobrancelha.
Eu limpo minha garganta. — Quero dizer, Big Paw. Eu não vou te
decepcionar, Paw.
— Bom, o que me leva ao próximo tópico que quero discutir – você
trabalhando aqui no rancho. Você gosta do seu trabalho?
— Sim. Mais do que eu jamais poderia expressar. — Pela primeira
vez na vida, sinto que pertenço a algum lugar. Eu realmente nunca tive
tempo para sonhar grande, porque percebi que sonhos são apenas para
pessoas que não cresceram no mundo que eu tinha, mas trabalhar no
rancho mudou isso para mim. Eu nunca pensei que seria uma garota que
ama trabalhar em um rancho, mas lá estou eu, conversando com cavalos,
perseguindo galinhas e amando cada segundo disso.
— Bom. Bom. Sem rodeios – sua ética de trabalho ofusca todos os
que vieram antes de você, meu neto incluído. Você vai além com um
sorriso no rosto. Você também é rápida para ajudar os outros. Isso é muito
importante para mim. Preciso de bons rancheiros que não tenham medo
de ajudar uns aos outros. É por isso que quero lhe oferecer um
aumento. Quero que você assuma a posição de gerente de Ian.
Meus olhos saltam do meu rosto. — O quê? Sério?
— Sim. Eu acho que você se encaixa perfeitamente e mostra grandes
habilidades de liderança. Acho que, se você estiver interessada, pode
continuar subindo a escada por aqui.
— Estou honrada, Big Paw, e juro que vou trabalhar mais duro do
que nunca para que você não se arrependa de sua decisão.
— Eu acredito. Mas existe uma condição.
— E o qual seria?
— Você deve se inscrever em um programa de faculdade. Você pode
ter aulas na faculdade comunitária fora da cidade, ou pode fazer um
programa online, mas de qualquer forma, precisa cursar a faculdade,
Hazel. Você é maior do que apenas uma garota de cidade pequena. Pode
obter um diploma e melhorar seu futuro. Não se preocupe com os
custos. Holly e eu vamos cuidar disso. Se administrar coisas como o
rancho é algo em que você possa estar interessada no futuro, um diploma
em administração pode ser muito útil. Quero que você tenha todas as
possibilidades que sua mãe perdeu. E quero que você tenha mais.
É naquele momento que sei que Paw realmente se importa comigo,
no fundo de sua alma. Ele acredita em meu futuro também, o que faz
meus olhos se encherem de lágrimas. Eu não choro, porém, porque sei que
esse tipo de emoção o deixará desconfortável. Você chora com Holly; fica
forte na frente de Big Paw. É assim que funciona com os avós de Ian. Os
avós de Eres.
Aperto a mão de Big Paw e me levanto da cadeira para voltar ao
trabalho. Depois de terminar o dia, a primeira coisa que farei será pular
em um computador e começar a pesquisar faculdades.
— Obrigada mais uma vez, Paw. Isso é uma mudança de vida para
mim.
— Acredito que sim. Você é uma boa criança, Hazel. Não se esqueça
disso.
Eu sorrio e me viro para sair de seu escritório quando meu coração
se enche com o elogio de Big Paw. Ele me chama.
— Espere, Hazel, mais duas coisas antes de ir.
— Sim?
— Suas cartas para sua mãe… continue escrevendo-as. Ela está
lendo. Apenas sente como se sua vida fosse melhor sem ela e seus
pecados, mas aquelas cartas… Acho que elas a estão ajudando a manter a
mente clara. Continue.
— Vou fazer. E a outra coisa?
Suas sobrancelhas se franzem enquanto ele junta as mãos. — Meu
neto, Ian… você se preocupa com ele?
— Sim, senhor – Big Paw.
— Faça-me um favor e faça o possível para não o machucar. Ele
levou anos para se abrir novamente depois que seus pais o deixaram, e eu
sei que isso tem muito a ver com você entrando em sua vida. Se você se
importa, fique com ele. Eu não acho que ele poderia lidar com outra perda.
Dou minha palavra a ele. A verdade é que a ideia de as coisas não
funcionarem com Ian, seja lá o que somos, me apavora. Pela primeira vez
na vida, sinto como se alguém tivesse realmente sido capaz de ver minhas
cicatrizes e ainda marcá-las como lindas. Sempre que penso em Ian, meu
coração dá cambalhotas. A última coisa que quero é arriscar nosso felizes
para sempre.
Quanto mais ocupada eu me mantenho no rancho, menos tenho
tempo para pensar em Ian não mais me segurando a cada noite. Continuo
dormindo com seus moletons, porém, desejando que seja sua pele contra a
minha. Além disso, ele deixou sua caminhonete para eu usar, o que é útil
para quando preciso dirigir por aí para arejar minha cabeça.
Como prometido, conversamos todas as manhãs. Mesmo com a
diferença de horário de duas horas e a programação insana de gravação de
Ian, ele consegue me encaixar em conversas de bom dia e conversas de
boa noite.
Mandamos mensagens o dia todo, todos os dias também. Tenho
certeza de que sua vida está um turbilhão. O grupo está recebendo cada
vez mais cobertura. Eles lançaram oficialmente seu primeiro EP, que tem
três de suas músicas, e foi muito bem recebido.
Eu sigo as cinco contas no Instagram. Cada um dos caras e sua
página principal da The Wreckage. Estaria mentindo se dissesse que não
abri e fechei o aplicativo um milhão de vezes na esperança de atualizações.
— Então Rihanna é tão incrível pessoalmente quanto parece ser, e os
rumores são verdadeiros. Ela cheira bem ‘pra’ caralho, — Ian exclama
tarde da noite enquanto estou enrolada na cama. Já passa das duas da
manhã na minha hora, um pouco depois da meia-noite para ele. Os caras
tinham uma agenda louca de entrevistas de rádio e aparições na TV para
seu novo single. Eles estavam indo sem parar até tarde da noite.
Eu rio. — Você deveria ter perguntado a ela se eu poderia comprar
um pouco de seu novo delineador Fenty35. Estou morrendo de vontade de
experimentar.
— Você deveria ter me avisado antes. Eu teria!
Eu rio. — E como você encontrou Rihanna?
— Estávamos saindo de um estúdio de gravação quando ela estava
entrando para uma reunião. Claro, provavelmente não tinha ideia de quem
éramos, mas disse oi. Hazel, preste atenção. Rihanna disse oi para nós. As
coisas estão ficando selvagens.
Cubro minha boca para bocejar e afasto o telefone de mim para que
Ian não ouça a sonolência em minha voz. Cada vez que ele me ouve
bocejar, ele acelera nossas ligações.
— Parece que você tem muitas groupies aparecendo na estação de
rádio. Eu vi a foto que Marcus colocou.
— É uma loucura, certo? Quem poderia imaginar que esses meninos
de cidade pequena iriam receber tanta atenção. Havia centenas de pessoas
gritando nossos nomes.
— Só não se esqueça que gritei seu nome primeiro, — brinco.
— Mal posso esperar para ouvir você gritar de novo. Eu quero que
você fale tão alto que todo os EUA ouçam você.
Eu sorrio, pensando em como, quando fizemos amor, tive que cobrir
minha boca com um travesseiro. Então, uma estranha pontada de
nervosismo se instala em meu estômago.
— Parecem muitas fãs femininas.
— Sim. Marcus e Eric estão consumindo a atenção. — Ele para um
instante. — Você não está… com ciúmes, está?
Sei que não tenho o direito de estar. Sei que não preciso ficar com
ciúmes. Na verdade, confio em Ian. O que eu não confio são em fãs
raivosas que não se importam com a vida privada que Ian tem em
35 Fenty Beauty é uma marca de cosméticos lançada em 8 de setembro de 2017 pela
Rihanna. A marca é popular por sua ampla inclusão em todos os tons de pele e gênero.
casa. Para eles, ele é Ian Parker, o astro do rock emergente que exala sex
appeal como um rio fluindo. Mas para mim, ele é meu Ian. O menino de
uma cidade pequena que passa os dias limpando estrume comigo e as
noites se apresentando em um celeiro.
— Você não tem nada com que se preocupar, Hazel. Quero
dizer. Claro, há muitas garotas por aí, mas tudo que eu realmente penso é
em como quero uma pausa na minha agenda para estar de volta ao seu
lado. Nosso assessor de imprensa está decidido a continuarmos
trabalhando sem parar nos próximos meses, porque estamos crescendo e
subindo. Max está nos chateando muito sobre estarmos cem por cento
comprometidos com a música e apenas a música. Sem distrações
externas. Ele disse que se me pegar no meu telefone no estúdio mais uma
vez, ele vai quebrá-lo.
Mordo meu lábio inferior. — Espero não estar te distraindo. Vou me
certificar de não enviar muita mensagem.
— Não. Por favor. Envie-me tudo, todas as coisas. Pode levar um
tempo para eu responder. Mas vou responder, Haze. Eu juro. Eu quero
saber de você. Você é meio que minha bússola. Eu não quero me perder
neste mundo. Você é minha casa no mapa.
Sorrio com suas palavras e puxo seu moletom até meu nariz para
inspirar. Borrifo sua colônia de vez em quando. Caramba… Eu estou
viciada.
— Falando em ser seu mapa… hoje as pessoas me fazem muitos
elogios cafonas que vão direto à minha cabeça, — diz ele. — Então, em
uma tentativa de não ter um grande ego, estou solicitando que você me
diga um punhado de minhas falhas.
Eu rio. — Oh, garoto. Você tem certeza? Ficaremos aqui a noite toda.
— Mergulhe direto. Rasgue-o como um band-aid.
— Você peida durante o sono, — digo. — E eles são
fedorentos. Como ovos podres em seu rosto, pior do que os chiqueiros,
ruim.
— Oh, uau. Ok, não demorou muito para tirar isso.
— Você nem sempre dá descarga no banheiro. E coloca o papel
higiênico ao contrário como um homem das cavernas. Às vezes você sai do
banheiro tão rápido que duvido que tenha lavado as mãos, o que me dá
vontade de fazer o TVM.
— TVM? — Ele pergunta.
— Teste de verificação manual. Sabe, quando alguém sai do
banheiro e você aperta a mão dele para ver se está molhada ou fria por ter
lavado. Você pode cheirá-los também, para ver se cheiram a
sabonete. Então você sabe que eles os limparam bem.
Ele ri. — Não me diga que você anda por aí cheirando as mãos das
pessoas.
— Bem, não. Mas não se assuste se eu fizer isso da próxima vez que
sairmos.
— E onde você aprendeu sobre TVM?
— Minha mãe costumava fazer isso quando eu era criança. Eu
estava obcecada em mentir sobre lavar as mãos. Então ela criou o TVM
para me fazer parar. — Paro por um segundo. Meu estômago aperta e
tento o meu melhor para afastar mamãe das minhas memórias. Há tão
poucos bons momentos que sempre que um surge na minha cabeça, me
faz querer ficar emocionada na hora. Claro, quero relembrar os bons
momentos com mamãe, mas também pensar nisso me faz sentir ainda
mais saudades dela.
— Como ela está? — Ian pergunta, provavelmente tomando nota do
meu silêncio.
— Ah, você sabe. O melhor que ela pode estar. Garrett tem me
atualizado surpreendentemente sobre ela. Ela deve dar à luz em algumas
semanas.
— Como você está se sentindo sobre tudo isso?
Demais. Estou sentindo muito.
Eu me enrolo em uma bola mais apertada. — Você ronca durante o
sono como um rinoceronte. Quando você corta as unhas dos pés, deixa os
pedaços voarem para qualquer lugar, mesmo que seja na cozinha. Eu
mencionei que você pendurou o papel higiênico do jeito errado?
Ele dá uma risadinha. — Está bem, está bem. Obviamente, não
estamos mais falando sobre sua mãe, mas você está errada sobre o papel
higiênico.
— Não. Você o pendura com o papel voltado para cima. Isto é errado.
— Não, — ele argumenta. — Isso torna mais fácil puxar. Fácil
acesso.
— Errado, errado, errado. — Eu bocejo. Isso escapa sem pensar, e
eu rapidamente cubro minha boca.
— Ah, merda. São quase três da manhã aí, não é? Vá dormir, Haze.
— Estou bem. — Bocejo novamente.
— Mentirosa. Ligo para você de manhã, antes de você sair para o
rancho. Durma bem. E Haze?
— Sim?
— Você ronca como um elefante com um amendoim preso no nariz.
Eu rio. — Boa noite, Ian.
— Boa noite.
Ele desliga o telefone e, alguns minutos depois, meu telefone apita
com uma mensagem de texto.
Ian: Aqui está um pouco de material de leitura para a próxima
vez que você sentar no banheiro.
Seguindo a mensagem, há cinco artigos sobre como alguém deve
pendurar o papel higiênico por cima e por baixo.
Hazel: Eu também poderia encontrar um artigo online sobre
como o Pé Grande é real, se você estiver interessado. E a verdade
sobre o Papai Noel.
Ian: O Pé Grande é real. Assim como o Papai Noel. Você
realmente deveria começar a acreditar em tudo que lê na
internet. Tipo, agora há um artigo circulando dizendo que tenho um
pau enorme. Acredite nisso, Hazel.
Não se preocupe, Ian. Tenho provas suficientes sobre o assunto.
Hazel: Está nos olhos de quem vê.
Ian: Convido você a contemplar com seus olhos quando eu te vir
novamente.
Eu sorrio.
Hazel: Vá dormir, esquisito.
Ian: Haze?
Hazel: Sim?
Ian: Você sabe o que estou pensando agora?
Hazel: Sim, e eu também.
Ian: Ótimo. Boa noite.
Conheço seus pensamentos, embora ele nunca tenha dito isso
diretamente.
Eu também te amo, Ian Parker.
Antes de adormecer, ligo o Spotify e coloco as músicas do The
Wreckage em reprodução para me ajudar a adormecer. Mesmo que eu não
saiba quando verei Ian novamente, já conto os dias até nosso
reencontro. E assim como qualquer outra garota ao redor do mundo, finjo
que as canções de amor foram escritas para mim.
Na manhã seguinte, acordo com meu telefone recebendo uma
mensagem de texto. Corro para atender, pensando que era Ian, mas não
é. O nome de Garrett brilha na tela.
Garrett: A criança chegou cedo. Está em algo chamado UTIN36.
Não parece tão forte.
36 Unidade de terapia intensiva neonatal.
Com a mente girando, eu me levanto. Meu peito sobe e desce
enquanto coloco algumas roupas e saio do meu quarto, escrevendo para
Garrett de volta.
Hazel: Que hospital?
Garrett: São Lucas. Cerca de três horas da cidade.
Hazel: Você e sua mãe estão aí?
Garrett: Nah. Não tinha dinheiro para gasolina esta semana.
Hazel: Estou a caminho.
Garrett: Eles provavelmente não vão deixar você chegar perto.
Hazel: Ela é minha irmã. Estou a caminho.
Garrett: Achei que você gostaria de saber; não vamos ficar com a
criança.
O quê?
Hazel: O que você quer dizer com isso? Por que não?
Garrett: Sua mãe decidiu mandar para adoção.
Não…
Leio essas palavras repetidamente, como se com força de vontade
suficiente eu pudesse mudá-las.
Corro para a casa de Big Paw, onde ele e Holly estão bebendo suas
xícaras de café da manhã e fazendo palavras cruzadas.
— Ei, um, eu, a, minha mãe — Meu Deus. Eu não consigo tirar
nenhuma palavra da minha boca sem que elas saiam confusas.
— Calma, querida. O que foi? — Holly pergunta.
— Minha mãe teve a bebê, mas ela está na UTIN. O hospital fica a
três horas de distância e eu preciso ir para lá. — Minhas unhas cravam
nas palmas das minhas mãos. — E acho que estou muito instável para ir
sozinha.
Big Paw levanta-se da mesa e resmunga um pouco enquanto pega
seu boné de caminhoneiro e o coloca na cabeça. — Tudo bem, vamos lá.
Holly se levanta e vai até a geladeira. — Vou preparar alguns lanches
para você e vamos indo. — Ela tira alguns pedaços de fruta e alguns
sanduíches de café da manhã que havia preparado para o outro dia. Então
ela se aproxima de mim e me dá um grande sorriso. — Não se preocupe,
Hazel. Tudo vai ficar bem.
— Como você sabe disso? Como você pode dizer que tudo ficará
bem? Ela está na UTI. Não sei muito sobre a UTIN, mas sei que isso
significa que não é bom. E… se a mamãe não puder estar lá com ela… ela
está sozinha. Ela está lá sozinha, e isso parte meu coração.
— Sim. Eu sei como tudo isso pode ser muito, mas por enquanto,
tenho certeza que ela tem muitos médicos cuidando dela. Tenho certeza de
que há enfermeiras olhando para ela, monitorando cada movimento. Ela
não está sozinha, e em breve você estará lá também. Então, tudo ficará
bem. Você tem que ter fé.
Não digo mais nada para Holly, porque acreditar em sua fé é difícil
quando eu não cresci em um mundo onde a fé realmente existe.
Nós dirigimos em silêncio, sem nada além de uma estação de rádio
esportivo ligado. De vez em quando, Big Paw murmura algo para os
apresentadores do talk show, como se eles pudessem ouvir suas queixas
sobre más jogadas de beisebol da noite anterior.
Holly senta-se no banco da frente, tricotando algo em que vem
trabalhando há algum tempo, e eu fico quieta no banco de trás, mexendo
nas unhas. Ian me mandou mensagem algumas vezes, mas eu não
encontrei forças para responder ainda. Minha mente está muito ocupada
pensando demais.
Como mamãe poderia pensar que colocar minha irmã para adoção é
a resposta certa? Eu sei que minha situação de vida atual não é perfeita,
mas não consigo me imaginar sabendo que tenho uma irmã lá fora que
não faz parte da minha vida. Preciso lutar para mantê-la em minha vida de
alguma forma.
Quando chegamos ao hospital, pela graça de Deus, podemos ver
minha irmãzinha. Ela ainda não tem um nome e está conectada a um
milhão de fios em máquinas. Minúsculos tubos percorrem seu corpo, e sua
pequena respiração oscila dentro e fora enquanto seu peito sobe e desce.
— Ela é uma lutadora, — uma enfermeira nos diz enquanto estamos
por perto. — Ela já passou por algumas coisas, mas está lutando como o
inferno para voltar e ficar forte.
— Ela é tão pequena, — eu sussurro, olhando para a recémnascida. Ela é bonita. Mesmo com todos os tubos e o barulho perturbador
das máquinas, sei que ela é tão bonita…
Eu me pergunto se ela nasceu com olhos castanhos também. Eu me
pergunto se ela sabe que não está mais sozinha.
— Enfermeira, tudo bem se sairmos para uma conversa? — Big Paw
pergunta, sua voz pesada e profunda.
— Claro.
Os dois saem da sala, deixando Holly parada comigo. Ela coloca as
mãos nos meus ombros, sentindo o tremor do meu corpo.
— Ela não pode ser encaminhada para adoção, — eu digo. — Ela
não pode. Ela é a única coisa que me resta… ela é a única ligação familiar
que tenho, Holly. Eu perdi muito e não posso perdê-la também. Não posso
perder minha irmã.
— Shh… querida. Vai ficar tudo bem.
Eu gostaria que ela parasse de dizer isso, porque parece muito longe
de estar bem. Tudo está uma bagunça completa, e eu não vejo como
qualquer uma dessas questões pode ser resolvida com o pensamento
positivo.
Sentamos no quarto com o bebê enquanto Paw conversa com a
enfermeira. Eu não consigo parar de tremer enquanto Holly mantém os
braços em volta do meu corpo. Meu telefone apita mais algumas vezes
enquanto esperamos.
Ian: Tudo bem?
Ian: Não é típico de você ser fantasma.
Leio suas palavras uma e outra vez antes de me levantar. – Já volto,
Holly.
— Tome seu tempo, querida. E diga a ele que o amo, — ela comenta,
sabendo que irei ligar para Ian.
Encontro uma escada e fico lá com o celular na mão. Digito o
número de Ian e uma calma toma conta de mim quando ouço sua voz.
— Ei, Haze. E aí?
25
IAN
— A bebê nasceu e ela está na UTIN. Ela não está indo muito bem,
mas as enfermeiras parecem esperançosas de que ela terá uma chance de
lutar para se recuperar, — Hazel diz, sua voz baixa e controlada.
— Você está bem?
Eu posso dizer pelo som de sua voz que ela não está. Tudo faz
sentido que ela tivesse silenciado o telefone naquela manhã, porque seu
mundo está dando uma guinada. Ela tem uma irmãzinha agora que está
ocupada lutando por sua vida.
— Eu não sei. Minha mãe está falando sobre entregar a bebê para
adoção em vez de deixar com Garrett e sua mãe. Isso parte meu
coração. Eu sei que parece idiota, mas essa menina é a única família que
tenho… e agora existe a possibilidade de ela ir para outra pessoa.
— Não pense demais nisso agora. Faça o seu melhor para focar que
a bebê ficará cada vez melhor. Ok?
Ela funga um pouco. — Sim, tudo bem.
— Qual é o nome dela?
— Ela não tem um ainda.
— Ok, então me fale sobre ela. Como ela se parece? Diga-me o bom,
Haze. Sempre há algo bom nas partes ruins de cada história. O que é
bom?
— Ela é cabeluda, — diz. Eu ouço a energia de sua voz mudar um
pouco quando começa a procurar em sua mente o que é bom.
— Mesmo?
— Uh-huh. Está preto como meia-noite. Grosso também. Mamãe
sempre disse que eu era um bebê careca e não tinha cabelo até os dois
anos de idade. Mas minha irmã tem um monte.
— O que mais?
— A enfermeira disse que suas estatísticas estão melhorando. Com
tudo que minha mãe fez antes de engravidar, estou surpresa que ela não
tenha mais problemas. Ela é uma lutadora.
— Deve ter herdado isso de sua irmã mais velha.
Ela ri levemente antes de ficar sombria novamente. — O que eu vou
fazer, Ian? O que farei se eles a levarem embora?
— Ei, vamos lá. Tudo vai ficar bem.
— Você está parecendo muito com sua avó agora.
— Mais de vinte anos de vida com a vovó, e ela ainda não se
enganou sobre esse fato. Apenas tenha um pouco de fé. Você não precisa
de muito. Apenas o suficiente para aguentar até amanhã.
— Ian, que diabos? Precisamos de você lá dentro, — diz Max,
invadindo fora do estúdio para me encontrar sentado contra o meio-fio
conversando com Hazel.
Merda.
— Você disse que estava indo ao banheiro e eu o encontro aqui
nesse seu maldito telefone.
Merda, merda, merda.
— Haze? Eu tenho que ir. Conversaremos mais tarde, certo?
— Ok. Mais tarde.
Desligo o telefone e me viro para ver um Max Fodido Rider
extremamente irritado parado atrás de mim. — Sinto muito, — grito.
— Você não deve entender a oportunidade que está tendo aqui,
Ian. Milhões de pessoas matariam para estar neste estúdio, e aqui está
você, desperdiçando o tempo e o dinheiro de todos, tudo porque você teve
que atender a uma maldita ligação para falar com uma garota.
— Não é apenas uma garota, — discordo. — Ela é a garota e
precisava de mim.
Max me olha de cima a baixo. — Vamos lá, cara. Você está prestes a
mudar sua vida para sempre e está arriscando tudo por um
romance? Acorde. Há três companheiros de banda seus esperando por
você para dar a essa coisa o mesmo respeito que todos eles. Você é o líder
dessa banda, certo?
Eu faço uma careta. — Sim.
— Então pare de agir como uma criança maldita, cresça e lidereos. As pessoas não estão brincando com você quando dizem que esta é
uma oportunidade única na vida. Não estrague tudo por causa de alguma
garota de cidade pequena.
Minhas mãos formam punhos cada vez que Max fala sobre Hazel
como se ela fosse nada além de uma parte do meu passado, quando tento
descobrir como puxá-la direto para o meu futuro. Eu não discuto com ele,
porque na superfície de tudo, sei que ele está certo. O Wreckage está tendo
uma chance com a qual milhões de pessoas sonham, e Eric, James e
Marcus contam comigo para aparecer e dar tudo de mim, da mesma forma
que eles vêm fazendo.
— Desculpe, Max. Eu juro, estou comprometido.
Ele estreita os olhos e olha para mim, como se não estivesse
completamente convencido, mas segue em frente. — Tudo certo. Vamos
trabalhar, então.
Ele estende a mão para mim.
— O quê?
— Não banque o idiota, Ian. Dê-me seu celular. Ele será cortado
durante os dias de gravação.
Só voltamos para o nosso apartamento bem depois da meianoite. Tenho certeza de que Hazel já está dormindo. Quando pego meu
celular de Max, tem uma dúzia de mensagens de texto dela. Ela se
desculpou algumas vezes sobre me colocar em apuros e tomar meu tempo
quando ligou mais cedo. E me atualizou que sua irmã está um pouco
melhor, mas sob monitorando. E ela também me dá uma confissão.
Hazel: Hora da confissão: Queria que você estivesse aqui. Sei que
é egoísmo e sei que é impossível, mas é o que desejo, Ian. Eu queria
que você estivesse aqui para me abraçar esta noite.
Mando uma mensagem de volta e tento afastar a culpa final que se
senta em meu estômago por não estar lá para ela.
Ian: É tarde, e eu sei que você provavelmente está
dormindo. Pelo menos, espero que você esteja. Mas eu quero dizer que
te amo, Hazel. Eu não queria dizer isso por mensagem de texto. Eu
queria esperar até que estivéssemos cara a cara novamente e eu
estivesse segurando você em meus braços, mas parece que a vida tem
uma maneira de nos manter longe dos lugares onde mais gostaríamos
de estar. Mas preciso que você saiba que te amo. Sei que seu mundo
está uma bagunça agora e gostaria de poder pegar as partes difíceis e
segurá-las para mim. Eu gostaria de poder abraçar você. Eu gostaria
de poder beijar você. Eu gostaria de poder dizer eu te amo contra sua
pele e afastar suas preocupações. Por enquanto, tudo o que tenho são
essas mensagens. Amo você, Hazel Stone. E tudo vai ficar bem.
Ao clicar em enviar, fico surpreso quando ouço meu telefone
começar a tocar. O nome de Hazel aparece na tela e eu respondo
imediatamente.
— Você deveria estar dormindo, — eu digo a ela, caindo contra
minha própria cama.
— Você também deveria estar, — ela argumenta. — Mas depois de
ler sua mensagem, sabia que tinha que falar com você. Eu tinha que ouvir
você dizer isso para mim… talvez não pessoalmente, mas preciso ouvir de
seus lábios. Então, por favor…
Ela parece tão cansada. Como se já estivesse dormindo e falando
comigo apenas em um estado de sonho.
— Eu te amo, — sussurro. — Eu te amo, eu te amo, eu te amo.
Seus suspiros são tão gentis contra o receptor, mas meu telefone
está pressionado com força contra minha orelha enquanto ela responde,
dizendo as palavras que espero que ela sinta. — Eu também te amo.
— Por que você parece tão triste com isso?
— Porque eu já vivi a vida o suficiente para saber que às vezes o
amor não é suficiente. É por isso que eu não queria começar com isso. É
por isso que eu estava com tanto medo de cruzar essa linha com você. Sua
vida está indo tão rápido, Ian, e são todas coisas incríveis que estão
acontecendo com você e os garotos. Você trabalhou tão duro para chegar
onde está agora, e há muito mais por vir. Tudo está se movendo em alta
velocidade, e estou muito feliz por você, mas não estou nesse
mundo. Agora, minha vida parece estar se movendo para trás, não para
frente. Na verdade, estou congelada no tempo. Estamos em prazos
diferentes e não quero que você tente desacelerar o seu para me deixar
entrar.
Eu me mexo na minha cama. — Você está sobrecarregada e
cansada.
— Você teve problemas por falar comigo hoje? — Ela pergunta.
— Haze…
Ela respira fundo. — Talvez você esteja certo. Talvez eu só esteja
cansada. Foi um longo dia e eu deveria dormir um pouco.
— Sim, tudo bem. Ligarei para você pela manhã.
— Está tudo bem, — diz ela. — Não precisa.
— Ligarei para você de manhã, — repito. — Eu te amo.
Ela solta uma exalação. — Eu também te amo.
É naquele momento que eu soube que amar alguém pode ser triste
também.
26
HAZEL
— Eu a quero, — digo severamente para Paw e Holly enquanto ando
para frente e para trás na sala de espera do hospital. É nosso terceiro dia
lá, e minha irmã está se recuperando de maneira estrondosa de todo o
trauma pelo qual passou.
Os avós de Ian se sentam nas cadeiras de metal do hospital com as
mãos entrelaçadas e caretas no rosto.
— Não é tão fácil, Hazel, — diz Holly, balançando a cabeça. —
Existem regras e procedimentos…
— Danem-se as regras e procedimentos. Eu a quero. Eu quero
minha irmã. Eu posso cuidar dela; eu sei que posso. Então faça o que você
fez por minha mãe todos aqueles anos atrás e por outros filhos
adotivos. Ou pelo menos me ajude a ser capaz de abrigá-la. Eu cuido de
tudo, eu juro.
— Não é tão fácil, — diz Paw, repetindo as palavras de Holly, e isso
me enfurece.
— Sim, ela está…
— Essa situação é diferente. Esta é uma bebê recém-nascida,
Hazel. Uma filha que a mãe quer desistir…
— Ela não faria se soubesse que eu a quero. Ela iria querer nos
manter juntas. Não gostaria de separar suas meninas.
— Hazel… — Holly começa, mas eu a interrompo.
— Não. — Eu me levanto e passo meus braços em volta do meu
corpo. — Não. Você prometeu. Você jurou que tudo ficaria bem e que as
coisas iriam dar certo, então tem que haver um jeito. Tem que haver
alguma maneira de fazer aquela menina ficar comigo. Ela é a única família
que tenho. Posso pagar por sua ajuda para entrar em contato com as
pessoas certas.
— Você sabe muito bem que esta não é uma situação sobre dinheiro,
garotinha, — grita Big Paw, como se estivesse profundamente incomodado
por eu assumir tal coisa. Mas como posso evitar? Minha mente está
girando e o desespero me engole por completo.
— Então, o que é? — Grito.
— É você, — ele atira de volta, apontando para mim. E se levanta da
cadeira e é ele quem começa a andar. — É você e seu futuro, Hazel. Você
tem o mundo inteiro bem ali na sua frente. — Ele estala os dedos. — Está
bem aí na sua frente, e me recuso a deixar você jogar isso fora. Você
trabalhou tão duro para não acabar com uma vida como esta. Criar uma
criança enquanto você ainda é uma. Você passou sua vida cuidando dos
outros, de sua mãe. Nunca teve a chance de ser uma criança. Então eu me
recuso a fazer isso. Eu me recuso a tirar a pequena chance que você tem
de uma vida para que possa cuidar de outra. Já vi o que acontece quando
alguém tão jovem é forçado a criar um filho antes de estar pronto. Eu vi
minha própria filha desabar e desmoronar, arruinando qualquer chance
que ela tivesse de um futuro. E proíbo que essa seja a sua história. Eu
proíbo você de jogar fora sua chance de um futuro. — Ele tem lágrimas
nos olhos e suas palavras se quebram ao saírem de sua boca.
Eu nunca vi Big Paw tão emocionado e sei que as palavras que ele
fala vêm do fundo de sua alma.
Ele funga um pouco e eu fico ali, atordoada, enquanto olho para o
gigante que trabalhou tanto para permanecer forte.
— Big Paw… — Eu digo suavemente, balançando minha cabeça. —
Com todo respeito, eu não sou sua filha. Jamais assumiria o papel da
maternidade e fugiria dele. Eu não abandonaria vocês, nem minha
irmã. Estaria aqui completamente comprometida com isso. Sei que
encontrar meu caminho é importante, e vou trabalhar para isso, juro. Mas
há uma coisa que eu sempre quis.
— E o que é isso?
— Uma família.
Holly franze a testa. — Mas, querida, você é tão jovem…
— Por idade, não experiência. Por favor, vocês dois. Apenas me
ajudem a descobrir isso de alguma forma. Ajude-me pelo menos a ver se
isso é uma possibilidade. Caso contrário, vou passar o resto da minha vida
pensando em como não fiz tudo ao meu alcance para manter o pequeno
pedaço de família que me restava.
Eles ficam em silêncio por algum tempo, lançando olhares para
frente e para trás. Os dois têm uma forma poderosa de se comunicar sem
usar palavras. Big Paw bate o punho contra os lábios e Holly esfrega a
palma da mão na bochecha.
— Não vou fazer nenhuma promessa, — Paw resmunga, finalmente
voltando-se para mim. — Nunca passei por nada parecido com isso e sei
que haverá muitos obstáculos que teremos de superar.
— Tudo bem, — respondo ansiosamente, engolindo a pequena ideia
de que Big Paw está a bordo com a tentativa de colocar o bebê sob minha
custódia. Farei qualquer coisa para que isso aconteça. Eu saltarei sobre
todos os obstáculos se isso signifique que terei uma chance de criar minha
irmã.
— E você ainda tem que frequentar a faculdade, porque não importa
o que aconteça você vai se formar.
— Posso fazer aulas online, — juro. — Eu farei o que for preciso. Eu
juro, Paw.
Ele faz uma careta, mas sei que a única razão pela qual ele está
fazendo isso é porque ele irá me deixar tentar descobrir tudo. — Vocês,
mulheres, serão a minha morte, — ele murmura.
Corro para ele, envolvendo meus braços em volta de seu corpo, e
seguro com muita força, provavelmente tirando todo o ar de seus
pulmões. — Obrigada, Big Paw.
— Não me agradeça. Não fiz nada ainda.
— Mas ainda assim, obrigada. Por tudo que você fez por mim.
Ele me dá um meio sorriso, e eu juro que é a primeira vez que vi
seus lábios fazerem uma coisa dessas com alguém que não fosse a
Holly. — Se pela graça de Deus conseguirmos isso, eu me recuso a trocar
fraldas.
— Oh, Harry. Você vai fazer tudo o que dissermos para você fazer, —
diz Holly.
Big Paw resmunga um pouco mais, porque ele sabe que ela está
certa. Ele senta-se na cadeira e gesticula em direção ao corredor. — Vá ver
sua irmã. Estaremos lá em alguns minutos.
Faço o que eles disseram e desapareço no corredor. Antes de ir para
a UTIN, lavo bem as mãos. Minha irmã foi transferida para um novo
espaço na UTIN. Ela não está conectada a tantas máquinas e há buracos
em sua incubadora, o que permite que as pessoas alcancem e segurem
suas mãos.
Depois de ter acabado de me esfregar, vou até ela e sorrio enquanto
ela descansa ali. Ela é tão pequena, mas tão feroz, tão forte. Uma guerreira
lutadora.
Deslizo minha mão para a incubadora e coloco meu dedo em sua
palma para que ela possa segurá-la. Seus dedos estão gelados e faço o
melhor para aquecê-los. Fungo um pouco enquanto ela se remexe e faz os
sons mais baixos. Tantos bebês choram horas a fio na UTIN, mas minha
irmã não. Ela mal dá uma espiada. Se eu não pudesse ver, não saberia
que há um bebê na minha frente.
— Ei, querida, — eu sussurro, olhando para o anjinho. — Eu sei que
você não me conhece, mas você vai muito em breve. Veja, sou sua irmã
mais velha. Eu é quem vou cuidar de você daqui em diante. Eu sei que
provavelmente não é para isso que você se inscreveu. O Senhor sabe que
não era assim que eu via minha vida, mas essa é a coisa da vida: às vezes
ela simplesmente muda sem nossa permissão. Mas é por isso que temos
que ficar juntas, certo? Porque quando a vida muda, é mais fácil se você
tiver alguém em quem se agarrar, então se segure em mim, maninha. —
Pode ter sido minha imaginação, mas juro que sinto como se ela apertasse
um pouco meu dedo. Enquanto seguro sua mão, ela finalmente abre os
olhos para mim. Estive esperando dias para ela olhar na minha direção,
para ela me olhar fixamente.
Seus lindos olhos castanhos.
— Ela é deslumbrante como a irmã, — diz uma voz, me deixando
tensa enquanto puxa minha mão da incubadora. Sua voz é profunda,
esfumaçada e minha.
Minha boca se abre e uma mão voa para o meu peito quando me viro
para ver Ian parado ali. Seus olhos têm olheiras e seu cabelo está
desgrenhado, como se ele não passasse uma escova por ele há dias. Ele se
ergue com uma aparência relaxada. Seus olhos brilham quando olha em
minha direção com as mãos enfiadas nos bolsos da calça jeans, e o menor
sorriso aparece em seus lábios.
Uma sensação de peso toma conta do meu estômago enquanto meu
batimento cardíaco dispara. — O que você está fazendo aqui?
— Vamos, Haze, — ele diz suavemente, caminhando em minha
direção. Passando os braços em volta de mim e me puxando para um
abraço. — Acho que você sabe a resposta para isso.
Derreto em seu toque como se ele fosse o sol e eu um cubo de
gelo. Minhas mãos caem em seu peito e continuo rezando para não estar
sonhando com sua presença.
— Você está realmente aqui? — Eu pergunto.
— Estou realmente aqui. — Ele beija minha testa e eu me apaixono
ainda mais. — Desculpe, estou atrasado.
— Mas como? Pensei que sua agenda estivesse lotada por um bom
tempo.
— Encontrei um pouco de espaço.
— Ian… — Eu me sinto desanimada, pensando que ele me escolheu
em vez de sua música. É com isso que estou mais preocupada, ele
perdendo de vista seus sonhos porque estou embaçando sua visão.
— Shh, Haze. Está tudo bem. Confie em mim. Eu resolvi. Tínhamos
um dia livre e peguei um voo de volta para casa. Saio esta noite com os
olhos vermelhos, mas eu não poderia imaginar não estar aqui com você
enquanto precisa de mim.
— Só ficará aqui por algumas horas? — Eu pergunto. — Você deve
estar tão exausto.
— Sim. Mas vale a pena. Agora vamos. Apresente-me a sua irmã. —
Ele começa a andar em direção a ela, mas eu me coloco na sua frente
como uma mamãe ursa superprotetora.
— Espera! Você tem que lavar as mãos antes de tocá-la.
Ele sorri e ergue as mãos no ar. — Eu já fiz isso. A enfermeira me
informou antes de eu entrar. Vá em frente, faça um teste de TVM.
Inclino-me perto de suas mãos e cheiro, sentindo o cheiro do
sabonete do hospital em sua pele. Eu sorrio. — Ok, continue.
Cada um de nós pega um lado da incubadora e coloca as mãos
dentro. Ian pega sua mão esquerda e eu a direita. Quase parece que ela
também sorri. Claro, sei que provavelmente não é um sorriso, e ela pode
ter gases ou algo assim, mas seus lábios estão curvados para cima, e isso
me faz feliz. Em paz depois de alguns dias sem paz.
— Quero gritar com você por estar aqui, mas também quero beijar
você por estar aqui, — sussurro para Ian enquanto estamos deitados no
quarto do hotel. Big Paw, Holly e eu estamos hospedados em um hotel nos
últimos dias para ficar mais perto do hospital caso algo der errado. Eles
estão de volta ao seu quarto fazendo pesquisas enquanto eu absorvo cada
segundo do meu tempo com Ian.
Ele partirá em cerca de duas horas, e tudo que quero fazer é me
envolver em torno dele e não soltar.
— Vá com a opção de beijar. Esse é o melhor.
Eu sorrio, o que por sua vez o faz sorrir.
— Sinto falta disso, Haze. Sinto falta do seu sorriso. Não vou mentir
– você me assustou quando conversamos outra noite. Sobre como minha
vida está avançando e a sua está congelada. Parecia que você tinha todas
essas dúvidas, e isso me assustou muito.
— Eu sei, e sinto muito por isso. Mas ainda me sinto assim, para ser
honesta. E com tudo que está acontecendo com a minha irmã, minha vida
vai virar de cabeça para baixo se eu cuidar dela. Sei que você não se
inscreveu nisso, Ian, e não quero que isso atrapalhe seus sonhos. Você
não pode desacelerar agora. Você está prestes a decolar.
— Apenas me dê uma chance de provar que podemos fazer isso
funcionar, ok? Não desista de nós tão cedo, Hazel. Eu sei que há uma
maneira de isso acontecer.
As borboletas no meu estômago rodam quando ele aperta suas mãos
com as minhas. — Não estou fugindo, Ian. Eu juro, estou aqui. Apenas
sendo cautelosa e realista.
— Bem, pare com isso, — ele ri, beijando as palmas das minhas
mãos. — Sonhe um pequeno sonho comigo por um tempo.
Quero argumentar com ele que não podemos viver em um mundo
dos sonhos, mas em poucas horas ele terá partido novamente, e eu não
quero deixá-lo se sentindo inseguro sobre o que somos. Então eu beijo
seus lábios.
Ele me beija de volta e arqueia uma sobrancelha. — Assim… sobre
você gritando meu nome… — Ele comenta com um sorriso malicioso.
— Ok. — Eu rio. — Tire suas roupas.
Fazemos amor no quarto do hotel naquela noite e, nessas poucas
horas, me permito sonhar com um mundo onde nós sejamos mais do que
suficientes.
No dia seguinte, Paw, Holly e eu voltamos para Eres. Mesmo que eu
me sinta péssima ao deixar minha irmã, temos que ir e coletar mais
informações. Big Paw me disse que será melhor se pudermos fazer Charlie
concordar em assinar a custódia para mim, mas sinto que isso é um
grande tiro no escuro. Charlie nunca permitirá uma coisa dessas. Apesar
de ele ainda estar preso, sei que a última coisa que irá querer será dar algo
dele à garota que é responsável por isso.
Ainda assim, tentarei todos os caminhos que eu puder pensar antes
de desistir.
Enquanto voltamos para casa naquela tarde, o rádio toca uma
música do Wreckage, e nós três entramos em pânico de empolgação.
— Bem, eu serei amaldiçoado, — exclama Paw Grande, batendo a
mão na perna. — Ian está lá fora realmente fazendo algo grande, hein?
— Sim, ele está. — Holly sorri de orelha a orelha.
Big Paw aumenta o volume e eu canto a letra da música como se as
palavras estivessem tatuadas em minha mente. Ouvir sua voz no rádio me
dá uma estranha sensação de esperança de que talvez Ian e Holly estejam
certos. Talvez, no final do dia, tudo dê certo; tudo ficará bem. Se parece
que as coisas não estão dando certo, provavelmente não é o fim ainda. Eu
tenho tido fé suficiente para superar o ontem e terei o suficiente para
superar o amanhã.
Paciência é o nome do jogo, e tenho todos os planos para ser a
melhor jogadora.
27
HAZEL
Hazel: Hora da confissão: Tenho ouvido suas músicas
repetidamente.
Ian: Hora da confissão: Toda vez que canto uma canção de amor,
estou cantando para você.
Estou trabalhando em estreita colaboração com Big Paw e Holly para
descobrir como levar minha irmã para casa, para nós. Felizmente, muitas
das leis dizem que eles preferem colocar a criança na casa de um membro
da família e, vendo que é minha irmã mais nova, isso torna as coisas um
pouco mais esperançosas.
Ainda assim, preciso obter mais informações de pessoas que não
desejam mais que eu esteja em suas vidas.
O olhar nos olhos de Garrett me diz que ele está ficando muito farto
de eu lhe fazer perguntas, mas não sei a quem mais poderia ter procurado
para obter mais informações sobre Charlie. Sei que ele está em
comunicação com ele e preciso descobrir uma maneira de fazer Charlie
concordar que eu fique com a menina.
— Ouça Hazel, eu já dei a você mais do que você merece e estou
ficando muito cansado de você aparecer e fazer exigências. — O uísque
escorre de sua língua e seus olhos estão vermelhos. Ficou claro que ele
está bêbado, com base na maneira como tropeça de um lado para o outro,
e obviamente está chapado de algum tipo de droga. Quanto mais as coisas
mudam, mais elas permanecem as mesmas.
— Não é uma exigência, Garrett; é um pedido. Eu quero que você
tente convencer Charlie a me deixar manter minha irmã comigo. Não
poderia imaginá-la crescendo na casa de um estranho quando ela tem
família aqui.
— Você não tem nada para oferecer àquela garota. Uma família de
adoção poderia, no entanto. Você está sendo egoísta.
— Talvez, mas não será só eu. Big Paw e Holly estão planejando
ajudar também. Temos uma unidade familiar inteira pronta para apoiar
essa garotinha, e ela merece ficar com a família.
— Apenas deixe para lá, Hazel. Esqueça essa coisa toda, — ele
murmura, virando-se para voltar para sua casa.
Estendo a mão e o agarro pelo braço. — Garrett, espere. Por
favor. Eu não entendo. Eu sei que você me odeia por todos os seus
motivos, e eu entendo. Mas sei que você também me conhece. Você sabe
como a família é importante para mim. Se você pudesse apenas entrar em
contato com Charlie…
— Não vai ajudar, — ele retruca.
— Talvez.
— Confie em mim, não vai. Charlie não pode fazer merda nenhuma
por aquela criança.
Estreito meus olhos. — Claro que ele pode. Como pai…
— Jesus, Hazel! Use a porra de suas pistas de contexto, sim? — Dou
um passo para trás, completamente surpresa com a atitude de Garrett. —
Não é filha dele, porra. Ok? Esqueça isso. Deixe a criança ir. Apenas deixe
para lá.
Meu estômago aperta quando sou atingida por uma sensação de
medo incrivelmente forte. — O que você acabou de dizer?
— Eu disse para esquecer isso.
— Não. — Faço uma pausa, passando minhas mãos pelo meu
cabelo. — Você disse que Charlie não é o pai.
Ele baixa as sobrancelhas e roça o nariz com o polegar. — O
quê? Não, eu não disse. — A ruga em seu nariz mostra seus pensamentos
perplexos.
— Sim, você disse. Você disse que Charlie não é o pai.
— Merda, — ele murmura, esfregando as mãos no rosto. — Ouça,
você tem que ir, Haze. — Ele vai fechar a porta, mas coloco meu pé no
caminho.
— Garrett, — eu imploro. — Por favor.
Ele suspira, jogando as mãos no ar. — Você não vai ficar feliz com
isso.
— Está bem. Eu só quero saber o que está acontecendo.
Ele resmunga e enfia as mãos nos bolsos enquanto se encosta no
batente da porta. — Charlie não pode ter filhos. Ele fez uma cirurgia anos
atrás para impedir que isso acontecesse. Ele disse que não poderia dirigir
seu negócio se tivesse merdinhas por aí. Sempre disse que você já dava
muita dor de cabeça.
O quê?
— Então quem é o pai?
Seu lábio inferior se contrai e ele balança a cabeça. — Ouça, Hazel,
eu entendo por que você acha que quer saber isso, mas…
— Conte-me.
Sua cabeça abaixa, e ele murmura: — Sou eu. — Essas palavras
viram toda a situação de cabeça para baixo. — Por que você acha que me
importei tanto em checar sua mãe nos últimos meses?
Meu peito aperta quando o vento é batido para fora de mim, e
tropeço alguns passos para trás. — O quê?
— Eu não queria que essa merda acontecesse, certo? Uma noite, sua
mãe e eu estávamos nos drogando. Você estava na biblioteca estudando ou
algo assim, e bem, uma coisa levou à outra. E então outra e… — Suas
palavras vão sumindo e, sendo honesta, não consigo acompanhar os
pensamentos passando por minha mente. Essa é a última coisa que eu
esperava que ele dissesse.
Minha mãe dormiu com meu ex-namorado.
Se isso não é além de perturbador, eu não sei o que é, mas há uma
fresta de esperança em toda essa bagunça. Charlie não é o pai. Eu não
preciso de sua aprovação em relação à minha irmã. Preciso de Garrett.
Mesmo que a raiva corra pela minha alma e eu tenha o desejo de dar
um soco em sua mandíbula, seguro minha compostura, porque eu ainda
preciso de sua ajuda.
— Você não quer ficar com a criança? — Eu pergunto, com os dentes
cerrados.
— Merda, Hazel. Não há nada na minha vida que tenha espaço para
uma criança. Minha mãe queria que eu a acolhesse, porque, bem,
responsabilidade e merda. Mas sua mãe e eu decidimos que a verdadeira
responsabilidade seria dar a essa criança uma chance real na vida.
— Comigo, — eu digo, segurando minha mão no meu peito. — Ela
poderia ter uma chance real de vida comigo, Garrett. Eu não apenas a
quero; eu preciso dela. Ela é minha família.
Ele abaixa a cabeça e chuta os sapatos. Sei que ele está bêbado e
chapado, mas tem que haver uma parte dele que entende como sou a
escolha certa para ela.
— Eu não uso drogas. Quase não bebo e não vou mais. Cuidei da
minha mãe toda a minha vida. Eu cuidei de você quando você não podia,
Garrett. Sempre estive ao seu lado, mesmo quando não deveria, porque é
isso que eu faço. Eu cuido das coisas que amo. Eu vou cuidar dela para
sempre.
Ele passa a mão sob o nariz e encolhe os ombros. — Você realmente
quer isso, hein?
— Eu quero.
Ele semicerra os olhos enquanto o sol brilha diretamente em seu
rosto. — E você não me odeia pelo que eu fiz?
— Oh, acredite em mim, eu te odeio. Mas… isso não é sobre você e
eu. Isso é sobre ela, e não posso deixar meus sentimentos por você
atrapalharem o fato de eu cuidar dela.
Ele solta uma nuvem de fumaça e acena com a cabeça. —
Bem. Tanto faz. Apenas me diga o que eu tenho que fazer.
Eu não sabia que meu coração poderia estar tão quebrado e curado
com tão poucas palavras. — Você terá que fazer um teste de DNA e outras
coisas, e teremos que colocar tudo no papel.
— Certo. Tanto faz. Apenas me diga o que fazer e quando fazer.
Balanço a cabeça e agradeço a ele. Quando começo a me afastar,
Garrett me chama.
Parece estar cansado, como tantas pessoas com quem tínhamos
crescido ao redor. Seu cabelo está desbastado, seus dentes amarelos e ele
anda por um caminho em direção à vida que eu nunca quis para nós. Ele
parece muito mais velho do que sua verdadeira idade e, por um segundo,
sinto pena dele.
Houve tantos anos em que tudo o que eu queria era salvar Garrett
de sua própria destruição, mas estou aprendendo rapidamente que não
posso salvar pessoas que não querem ser salvas. Tudo o que você pode
fazer é deixar a luz da varanda acesa na esperança de que eles se salvem e
encontrem seu caminho de volta para casa.
— Rosie, — diz enquanto tira o cabelo caído e oleoso do rosto. — O
nome da minha avó era Rosie.
Balanço a cabeça uma vez, sabendo exatamente o que ele quer
dizer. — Obrigada, Garrett. Se cuida.
Ele não diz mais nada para mim, vou até a caminhonete de Ian e
dirijo para casa.
Casa, o lugar que logo será a casa de minha irmã mais nova.
Pequena Senhorita Rosie.
Depois que completamos toda a papelada e nos encontramos com
um punhado de assistentes sociais, pudemos trazer Rosie para
casa. Ainda há muito mais coisas para acontecer no tribunal. Tantos
obstáculos que teremos que pular, tantos encontros e procedimentos do
tribunal, mas por enquanto, Rosie está em casa conosco.
O berço dela fica no meu quarto e, embora ela não chorasse muito
no hospital, aquela garotinha descobriu seus pulmões assim que chegou
em sua nova casa. Os primeiros dias e noites foram quase insuportáveis.
Tentei me preparar mentalmente para o fato de que eu fiz dezenove anos e
crio uma recém-nascida, mas a verdade é que não tem como se preparar
para ter um filho.
Poderia ter lido todos os livros sobre bebês do planeta. Poderia ter
ido a todas as aulas de gravidez, mas nada disso importa,
realmente. Acontece que criar um filho é um processo de um passo de
cada vez. É opressor, e às vezes eu me vejo sentada no vaso sanitário
apenas por cinco minutos de descanso enquanto as lágrimas caem dos
meus olhos.
Tanta culpa cai no meu peito enquanto as lágrimas tombam, porque
talvez Garrett estivesse certo. Talvez eu estivesse sendo egoísta ao acolher
Rosie. Talvez ela tivesse ficado melhor com outra família. Mas preciso dela.
Eu preciso muito dela, talvez mais do que ela precisa de mim.
E então a cada dia ela faz algo que ilumina meu mundo. Sorrir,
risadinhas, dormir. Oh, eu adoro vê-la dormir enquanto seu peito se eleva
e cai em um padrão calmante.
Também ajuda que Big Paw e Holly estivessem mais do que
dispostos a vir e fazer turnos com Rosie. Eles a amam como se ela fosse
sua própria neta. Além disso, ver o grande e velho Big Paw segurando um
bebê minúsculo em suas mãos gigantes é a coisa mais adorável do mundo.
Eu perdi tantas chamadas de Ian. De manhã e à noite. Sempre que
recebo um segundo para respirar, fico inconsciente e, de outra forma,
estou atendendo a Rosie e suas necessidades.
Ian: Saudades de você. Sentindo falta da sua voz. Estamos em
Nova York esta semana, e tudo que consigo pensar é como gostaria de
estar de volta a Eres com você.
Hazel: Desculpe-me, minha vida está uma bagunça.
Ian: Eu adoraria bagunçar com você.
Eu não o entendo. Não entendo por que ele está sendo tão
compreensivo e paciente comigo. The Wreckage está explodindo no cenário
musical, e eles estão no estúdio trabalhando sem parar no lançamento do
álbum para o início do próximo ano, e ainda consegue arranjar tempo para
me ligar todas as manhãs e todas as noites.
Eu não mereço seu amor quando tudo que sou capaz de dar a ele
são migalhas.
Eu o pesquiso com mais frequência do que provavelmente deveria,
procurando artigos de notícias sobre a banda. Lendo tudo o possível sobre
o que o mundo está pensando sobre os The Wreckage.
Durante uma das mamadas de Rosie às 4 da manhã, estou
folheando algumas dessas notícias por hábito quando meus olhos caem
em um artigo com o slogan, o mais novo membro da Music, Ian Parker, está
solteiro e pronto para derreter sua calcinha com sua voz.
Fecho o artigo rapidamente, sem querer ler mais sobre ele.
Solteiro e pronto para derreter sua calcinha.
Droga. Se isso não é uma manchete do tipo chute na vagina, então
eu não sei o que é.
Tento o meu melhor para me afastar do nervosismo, mas não ajuda
o fato de eu entrar no Instagram e ver a enorme quantidade de mulheres
que apareceram no meet and greet37 dos caras. Garotas lindas, altas e
magras que estão se jogando em cima de Ian Parker.
37 Encontro com os músicos no camarim, geralmente antes ou após um show.
Sei que tenho que me esforçar mais com Ian se quiser manter nossa
história promissora crescendo em tudo o que ela pode significar. Ainda não
estou pronta para me soltar dele, de nós. É meu trabalho mostrar-lhe que
estou completamente comprometida com nosso relacionamento, por mais
complicado e complexo que ele tenha se tornado. Preciso provar a ele que
estou totalmente comprometida.
Mesmo que isso signifique menos sono e mais ligações. Estou
fazendo malabarismos com minha vida diante de mim. Há tantas peças no
meu quebra-cabeça. Criar uma recém-nascida. Procurando faculdades
online. Apaixonando-se cada vez mais à distância. Trabalhando na
fazenda. Cada uma dessas coisas é importante para mim. Então farei o
que tiver que fazer para ter tempo para tudo.
28
IAN
A banda e eu trabalhamos sem parar por semanas. Quando
novembro chega, eu mal sei em que dia e fuso horário estamos. Além
disso, sinto muita falta de Hazel mais do que malditas palavras poderiam
expressar, e odeio a culpa que me atinge ao ver aqueles artigos falsos
sobre eu estar solteiro.
— Tudo bem, garoto de cidade pequena, aqui está, — diz Max,
caminhando até mim com a papelada na mão. Começamos nossa semana
em NYC38, e agora estamos de volta a Los Angeles, passando dia após dia
no estúdio.
Os caras e eu estamos exaustos. O outono voa e mal temos tempo
para aproveitá-lo. Tudo em nossas vidas está se movendo tão rápido que
parece tudo um borrão. Estamos exaustos, mas felizes. Cansado, mas
abençoados.
— O que é isso? — Pergunto.
— Seus bilhetes de volta para casa para os feriados. Mandei Amy
limpar a agenda do fim de semana para vocês. Comprei todos os bilhetes
de primeira classe voltarem para Eres. Achei que poderiam precisar de um
pouco de tempo para sair da selvageria deste mundo. É muito para ser
lançado dentro. Além disso, eu esperava poder voltar para casa, também,
para me encontrar com minha família. Minha esposa está roendo minha
bunda por planejar perder outro Dia de Ação de Graças — Ele enfia a mão
na bolsa e coloca alguns comprimidos na boca. — Se ela soubesse que
aquelas férias perdidas pagaram por aquelas mansões que ela ama.
38 Cidade de Nova York.
Olho para as passagens e sinto um nó no peito quando suas
palavras se estabelecem. — Sério? Você está nos dando um tempo?
— Bem, vendo como seu single atingiu as paradas da Billboard Hot
10039, eu percebi que podemos te dar alguns dias de folga. Sei que não é
muito, mas…
— Não, não. É mais do que suficiente. Obrigado, Max. Você não tem
ideia do quanto precisamos disso. Agradeço isso e tudo o que você fez por
nós. Antes de contar para os caras, Max, tenho uma pergunta. Eu estava
navegando na Internet lendo artigos sobre a banda…
Ele balança sua cabeça. — Erro número um de novato. Não leia essa
merda. É tóxico e vai arruinar o seu humor nos próximos anos.
— Sim, mas foi uma das entrevistas que fizemos. A manchete dizia
que sou solteiro e algo sobre calcinhas. Eu nunca disse que sou solteiro
então isso me irritou.
Ele balança sua cabeça. — Tenho certeza de que Amy disse isso ao
entrevistador para aumentar seu apelo sexual.
Amy está encarregada de nos fazer parecer essa banda foda que as
mulheres anseiam. Entendo seu trabalho, mas parece que ela está
passando dos limites.
— Eu não quero enviar a ideia errada. Tenho uma namorada,
alguém de quem gosto muito, e não quero que ela veja esse tipo de merda
quando já estamos lutando com a distância.
— Certo, é claro. Eu entendi. Vou falar com Amy sobre isso. Mas,
por enquanto, deixe claro para sua garota que os tabloides correm com
mentiras. É apenas o jogo, é a maneira mais fácil de marcar pontos. Agora,
vá em frente e faça as malas.
Faço o que ele diz e por um minuto penso em ligar para Hazel e
avisar que voltarei para casa, mas me contenho. Quero surpreendê-la. Mal
39 É a tabela musical padrão dos Estados Unidos que avalia a lista das cem músicas mais
vendidas no decorrer de uma semana, publicada pela revista Billboard.
posso esperar para ter meus braços em volta dela e seus lábios contra os
meus novamente.
Sei que ela se sente péssima por estar tão sobrecarregada e exausta
ultimamente, mas não penso menos nela por isso. Na realidade isso fez
com que eu me apaixone por ela ainda mais. Ela é a definição de se
doar. Ela sempre se entrega aos outros dez vezes mais. É uma de suas
melhores qualidades para mim. Embora, ao mesmo tempo, deseje que ela
dê a si mesma tanto quanto se rende pelos outros. Ela merece as estrelas e
a lua, mas age como se até mesmo uma faísca de luz nela fosse atenção
demais.
Quando chego em casa na véspera do Dia de Ação de Graças, Hazel
está desmaiada em sua cama. Seu cabelo está em um coque selvagem, e
sua camiseta parece como se tivesse uma mancha de vômito de leite, e
ainda está linda ‘pra’ caralho.
Rosie repousa em seu berço, olhando para mim com os olhos
arregalados. Ela se parece com Hazel com aqueles olhos grandes.
Rosie começa a se mexer no berço e, quando começa a gritar, eu
rapidamente a pego.
Hazel salta de seu sono, alerta e alarmada. — Eu já vou, já vou, —
ela murmura, esfregando o sono de seus olhos.
— Está bem, estamos bem, — digo, segurando a bebê, que se acalma
um pouco enquanto eu a sacudo.
Quando Hazel percebe que estou em seu quarto, lágrimas enchem
seus olhos. Não sei se são de felicidade ou exaustão, mas ela corre até mim
rapidamente e me abraça por trás enquanto Rosie está em meus braços.
— Eu sinto que toda vez que você voltar para mim, eu vou
desmoronar, — ela sussurra em meu pescoço, beijando suavemente minha
pele.
— Sinto que toda vez que volto para você, não vou querer ir embora.
Rosie se agita um pouco mais em meus braços e Hazel franze um
pouco a testa. — Ela provavelmente está com fome. Posso tirá-la de você e
esquentar uma mamadeira.
— Está bem. Eu fico com ela. Você pode ir buscar a
mamadeira. Vamos esperar aqui.
Ela hesita como se fosse discutir, mas, em vez disso, murmura um
obrigada e sai correndo do quarto. Quando volta com a mamadeira na
mão, Rosie e eu estamos sentados na cadeira de balanço, encontrando um
bom ritmo.
Hazel sorri em nossa direção. — Parece que ela está confortável com
você.
— Eu gosto de crianças. Costumava ajudar a cuidar da irmã mais
nova de James e Leah quando ela era recém-nascida. É algo natural para
mim.
— Bem, eu gostaria de poder dizer o mesmo, — ela brinca. — Tentar
fazer com que ela se acalme quando está gritando é um novo tipo de
inferno. Você quer que eu a alimente?
— Eu posso fazer isso. — Pego a mamadeira e, assim que começo a
alimentar Rosie, ela mama como uma campeã. É uma loucura como a
primeira vez que a vi, ela parecia tão pequena e quebrada naquela
incubadora, mas agora está crescendo tão rápido, fazendo uma grande
mudança em seu início de vida difícil.
Hazel senta-se no chão à nossa frente e um olhar de espanto surge
nos seus olhos. — Eu quero perguntar por que você está aqui, mas
honestamente, realmente não me importo. Estou tão feliz por você estar
em casa.
Eu sorrio. — Eu também. Max surpreendeu a banda com passagens
para uma pequena pausa no feriado. Ele disse que foi um presente por nós
atingirmos as paradas da Billboard. Que… a propósito, atingimos as
paradas da Billboard.
Ela sorri. — Sim, eu sei. Li sobre isso esta manhã. — Ela pega o
telefone e me mostra. — Eu enviei uma mensagem de texto sobre isso, mas
obviamente estava muito fora de mim para lembrar de clicar em enviar.
— Ah… Não se preocupe. Você tem um bom motivo para estar
exausta.
— Sim, mas ainda assim, estou tão orgulhosa de você. Sem querer
soar como uma idiota completa, mas eu meio que persigo vocês na internet
como se fosse um vício em drogas.
— Cuidado. Você não pode confiar em tudo que lê online.
Ela ergue uma sobrancelha. — Engraçado, porque antes você dizia
acreditar em tudo na internet.
— Sim, bem, isso foi antes de eu ver os lados sombrios disso.
— Você quer dizer seu estilo de vida de solteiro e habilidades para
derreter calcinhas?
Eu me encolho quando essas palavras deixam sua boca. — Eu
esperava que você não tivesse lido aquele artigo.
— Esse é o problema de ser sua maior fã. Eu leio todos os artigos.
Rosie termina de comer e eu a coloco no ombro para arrotar
enquanto continuo balançando na cadeira. — Escute, Hazel, todo aquele
artigo foi obra do meu publicitário. Nós nem sabíamos que seria executado
dessa forma até que ele estava pronto. Conversei com Max sobre isso e
disse que não era legal. Eu quero que o mundo saiba sobre nós.
Ela balança a cabeça. — Estou bem com isso assim. Eu entendo que
parte de ser uma estrela do rock é ter o apelo sexual que faz as mulheres
derreterem. Nas palavras do All-American Rejects40, estou bem em ser seu
segredinho sujo.
Eu gemo. — Mas eu não quero que você seja meu segredinho
sujo. Eu quero que você seja minha garotinha suja em público.
40 É uma banda norte-americana de pop punk.
Um sorriso malicioso cai em seus lábios quando ela se inclina para
frente. — Eu posso fazer muitas coisas sujas em particular e
publicamente.
— Não diga coisas que você não quer dizer.
— Confie em mim. Quero dizer. No minuto em que Rosie dormir, eu
vou te mostrar.
Bem, isso não parece muito ruim. Enquanto seguro Rosie no ombro,
sinto uma umidade descendo pelas minhas costas quando percebo que o
bebê havia vomitado por todo o meu ombro.
Eu a seguro longe de mim, e Hazel é rápida para agarrá-la. —
Desculpe-me por isso. Puxa, ela está vomitando como uma louca depois de
comer.
— Não é realmente nenhum problema. Vômito acontece. Que tal
você tentar fazê-la dormir de novo? Vou tomar um banho rápido do longo
voo e, em seguida, falaremos sobre aqueles pequenos segredos sujos que
você mencionou antes.
Ela sorri e acena com a cabeça. — Estarei aqui esperando.
Corro para fora de seu quarto e pulo no chuveiro. Minhas mãos se
movem por todo o meu corpo, lavando o mais rápido possível, então
poderei me apressar e voltar para Hazel, desejando, rezando e torcendo
para que Rosie já esteja dormindo.
Volto para o quarto de Hazel, pronto para fazer coisas que eu só fui
capaz de imaginar nas últimas semanas, e toda a esperança morre no
momento em que a vejo deitada em sua cama, completamente desmaiada
enquanto Rosie dorme em seu berço.
Pois bem, este é um novo obstáculo do nosso relacionamento.
Em vez de me preocupar em acordá-la, me arrasto para a cama ao
lado dela e, sem pensar, ela enrola seu corpo contra o meu, como nos bons
velhos tempos. Naquele momento, fico feliz por ter algo que me faz sentir
como se estivesse oficialmente em casa novamente.
— Achei que ela poderia usar isso, — Paw resmunga enquanto está
na varanda da minha casa na noite anterior ao Dia de Ação de Graças. Ele
segura um macacão de peru para Rosie e parece tão bravo com isso, mas o
fato de estar segurando um macacão o faz parecer muito mais gentil. — Eu
vi na loja quando saí da cidade para comprar alguns suprimentos. Achei
que a garota deveria ter uma roupa de Ação de Graças.
— Vou me certificar de passá-lo para Hazel, — prometo, pegando-o
dele.
Ele coça a barba e murmura um pouco antes de olhar de volta para
mim. — Vi você e os meninos na TV outra noite. Você parecia bem. Muito
bem.
O que é que foi isso? Um elogio do Big Paw?
A pequena Rosie deve tê-lo deixado mole.
— Mas não deixe isso subir à sua cabeça. Você não é tão bom,
garoto.
Ah, isso parece mais com o avô que conheço e amo.
— Você, Hazel e Rosie devem vir para nossa casa esta noite para
ajudar a vovó com a preparação da comida. Além disso, ela preparou uma
refeição para você.
— Na verdade, estou me sentindo um pouco cansado, Paw. Eu
esperava dormir por algumas horas.
— Se você pode se apresentar para estranhos, pode aparecer para
sua avó, — diz ele. — Nos vemos em alguns minutos.
Ele se vira e vai embora, sem me dar muita escolha. Então,
novamente, ele está certo. Eu não fui capaz de conversar muito com meus
avós nos últimos meses e sinto falta deles.
O sono pode vir mais tarde; a família está sempre em primeiro lugar.
Não demora muito para convencer Hazel a vir comigo e, uma hora
depois, estamos a caminho. No momento em que entro pela porta, cheira a
Ação de Graças. O calor da estação enche a casa dos meus avós e eu o
aceito. Eu senti falta deles. Eu senti falta de casa. Depois de viajar e
trabalhar sem parar nos últimos meses, senti muita saudade de casa.
— Querido! — Vovó diz, sorrindo de orelha a orelha enquanto se
aproxima de mim usando seu avental de peru. Ela está coberta de farinha
e se movendo um pouco mais devagar do que eu me lembrava, mas
quando ela me abraça, sinto seu amor.
Puxa, sinto falta dos abraços da vovó.
Quando ela me solta, arregaço as mangas. — Como posso ajudá-la?
— Pergunto.
Ela dá uma risadinha. — Oh, querido, acho que estamos mais
seguros com você não entrando na cozinha.
Sei que ela deve estar sobrecarregada com essa comida toda.
O Dia de Ação de Graças em Eres não é um evento pequeno para
meus avós. Assim como fazem com tudo, eles pensam na diversão geral da
cidade. Portanto, o celeiro foi montado com mais de duzentas cadeiras
para as pessoas comparecerem e fazerem uma refeição. Funciona
principalmente porque cada um traz um prato para compartilhar.
— Tem certeza de que não quer que eu faça meu grande assado? —
Eu brinco.
Ela estremece. — Não, não. Isso não é feito para o dia de Ação de
Graças.
— Poderia ser. Vou até adicionar algumas fatias de queijo para
torná-lo elegante.
Ela declina isso rápido.
Que pena.
Só então, Hazel coloca a cabeça na cozinha. — Você precisa de ajuda
aqui, Holly? Big Paw está segurando Rosie por um tempo.
A vovó reage de maneira completamente diferente ao pedido de Hazel
para ajudar. Ela sorri de orelha a orelha e acena para Hazel na cozinha. —
Sim, sim, querida. Eu adoraria sua ajuda. Por favor, entre.
Hazel entra na cozinha e vovó dá suas tarefas instantaneamente, e
eu me sinto pessoalmente ofendido. — Você está de brincadeira? Eu posso
ajudar!
— É melhor ajudar Big Paw, — diz Hazel. — Ele está solicitando sua
presença no escritório.
Vou em direção ao escritório de Big Paw e, quando entro, rio um
pouco da imagem dele segurando a pequena Rosie nas mãos.
— É uma bela imagem, Paw, — brinco, mas ele não ri.
Ele acena com a cabeça em direção ao assento em sua frente. —
Sente-se, Ian.
— O que é isso? Um momento de conselhos? — Brinco.
— Sente-se, — ele ordena.
Engulo em seco com seu tom e sento. A severidade de sua voz me
deixa confuso e me atira de volta aos meus dias de colégio, quando ele
costumava me repreender por ser uma criança idiota.
Ele embala Rosie em seus braços – e para ser claro, ainda é hilário
de assistir – e estreita os olhos para mim. — Quais são suas intenções com
Hazel?
Eu rio, completamente desconcertado por suas palavras. — O
que? O que você quer dizer?
— Eu quero dizer exatamente o que eu disse, garoto. Quais são suas
intenções? Você vê algum tipo de futuro com ela ou está apenas passando
o tempo? Porque essa é uma boa garota com uma ética de trabalho árduo
que está criando sua irmã, então me ajude, se você a machucar, vou
chutar sua bunda com tanta força que você se tornará uma soprano.
— Que diabos, Big Paw? Eu sou seu neto, não o contrário. Você não
deveria estar tendo essa conversa com Hazel sobre suas intenções comigo?
— Eu já fiz, — afirma ele com naturalidade. — Ela é uma boa garota
que vê um futuro com você. Mas não posso deixar você brincar com as
emoções dela. Ela é um grande ser humano, Ian. Este mundo não tem
muitos seres humanos excelentes, e ela já passou por muita coisa em sua
curta vida, então, se isso não é algo que você se vê fazendo, se sua carreira
é o foco principal para você agora, tudo bem. Mas se for assim, deixe-a ir
agora antes que ela aprofunde mais nisso. Não a prenda se não quiser
mais nada. Então, pergunto outra vez: quais são suas intenções?
Junto minhas mãos e me recosto na cadeira, olhando diretamente
nos olhos do meu avô. — É o tipo de coisa que você tem com a vovó, — eu
afirmo, sentindo isso no fundo do meu coração. Quero fazer um milhão de
memórias com Hazel. Quero que nossos netos testemunhem nossa história
de amor em primeira mão à medida que envelhecemos um com o outro no
decorrer do tempo. Eu quero que ela me provoque pelo resto da eternidade.
Eu quero envelhecer com aquela garota que me ajudou a abrir meu
coração.
— Tudo bem, então. — Big Paw sorri com o canto da boca e acena
com a cabeça uma vez e apenas uma vez. — Não importa a fama e o
sucesso que você encontre, continue segurando aquela garota, certo? Não
importa o que aconteça, não a deixa ir.
29
HAZEL
— Por favor, me diga que você também ouviu a conversa de bom pai
de Big Paw, ele me disse que teve a mesma conversa com você? — Ian
pergunta enquanto voltamos para casa tarde naquela noite, depois de
ajudar seus avós.
— Ah, recebi a palestra e as ameaças que a acompanhavam. — Olho
de volta para Rosie dormindo em sua cadeirinha. Se há algo com que eu
posso contar, é Rosie adormecendo enquanto anda de carro. Ultimamente,
quando ela está muito sobrecarregada, eu nos empacoto na caminhonete
de Ian e dirijo o tempo que for necessário para acalmá-la. — Mas as
ameaças do Big Paw parecem um pouco mais domesticadas enquanto ele
passa mais tempo com a Rosie.
— Ele está obcecado por ela, hein? É engraçado vê-lo assim. Quem
diria que seria necessário um bebê para torná-lo gentil? Achei que só a
vovó poderia fazer isso.
— Não há um dia em que ele não esteja checando-a. Eu juro, ele
vem muito mais para o rancho agora que Rosie está por perto. Ela é uma
coisa especial, minha irmãzinha.
— Ela deve ser como você.
Eu sorrio para ele enquanto coloco minha cabeça contra o
encosto. — Posso te contar um segredo?
— Você pode me contar todos os seus segredos.
— Eu me preocupo um pouco com seus avós trabalhando tanto na
idade deles. Eles fazem muito pelos outros e deveriam realmente
relaxar. Holly ainda está trabalhando dia após dia na Fazenda, e Big Paw
está praticamente administrando a cidade. Não pode ser bom para a saúde
deles. Além disso, quando eu estava cozinhando com Holly esta noite, ela
pareceu ficar sem fôlego muito rápido.
— Eu sei. Tenho dito a eles para irem devagar nos últimos anos, mas
eles não ouvem. É como se não soubessem como fazer uma pausa na
rotina de tudo isso. Eles fizeram muito por esta cidade. É hora de dar um
passo para trás. Não sei o que será necessário para eles recuarem. Eles
não são realmente o tipo de pessoa que aceita ajuda – eles gostam mais de
ajudar.
— Isso me deixa triste por eles. Merecem uma pausa, um tempo
para eles.
— Diz a garota que não tem tempo para si mesma.
Eu rio. — Sei que parece loucura, mas me sinto mais eu mesma do
que nunca, desde que comecei a trabalhar na fazenda. Nunca pensei que
seria capaz de dizer que amava um trabalho como este, mas adoro. Por
muito tempo estive pensando em fugir deste lugar, e quanto mais o tempo
passa, mais penso em como seria bom ficar e ensinar Rosie sobre o rancho
quando ela tiver idade suficiente.
— Big Paw estava me dizendo o quão bom seu trabalho está. É difícil
impressionar aquele homem, então você deve se orgulhar.
— Estou. Quer dizer, é difícil, especialmente com Rosie, mas de
alguma forma estou mantendo minha cabeça acima da água. Estou me
lembrando de nadar.
Ele estaciona a caminhonete em frente à casa e desliga o motor. —
Acho que este não é o motivo pelo qual eu deveria convidar você para vir
em turnê comigo por algumas semanas, hein? Na minha cabeça, parecia
uma ótima ideia, mas agora que vejo o quanto você está amando sua vida,
me sentirei péssimo afastando você de tudo.
— Não sei se a equipe aguenta a minha saída por um longo
período. Depois de perder o The Wreckage no rancho, estamos tentando
treinar novos caras para serem tão bons quanto vocês quatro eram.
Ele sorri. — Boa sorte com isso.
— Mas quero ver você no show. Quero ver você em seu novo
mundo. Só pode demorar um pouco para eu conseguir chegar lá com Rosie
e tudo.
— Ela é sempre bem-vinda, você sabe.
— Em breve, — eu concordo, pegando sua mão na minha. — Eu
prometo que veremos você em breve.
Só então Rosie começa a chorar e eu olho de volta para ela. — Você
acha que podemos dar uma volta pelas estradas de terra para fazê-la
dormir de novo? — Pergunto.
Ian liga a caminhonete e põe em marcha. Em cinco minutos, Rosie
está dormindo novamente.
— Você já se viu criando um bebê aos dezenove? — Ian
pergunta. Sua mão direita ainda entrelaçada com a minha, e eu amo o
calor que seu toque envia através de mim.
— Na verdade, lutei muito para que isso não fosse minha realidade,
mas aqui estamos. Sinceramente, não me arrependo. Rosie é uma das
melhores coisas que já me aconteceram. Se você me perguntasse se eu
estaria namorando um dos maiores músicos promissores, eu também teria
te chamado de louco. Mas acho que essa é a coisa da vida – simplesmente
acontece.
Ele puxa minha mão para seus lábios e beija-a, enviando-me ondas
de conforto.
E às vezes o que acontece na vida é melhor do que se poderia
imaginar.
O jantar de Ação de Graças foi repleto de risos, conforto e lágrimas
na casa do celeiro. Estou sentada à mesa com o The Wreckage enquanto
Rosie brinca com um dos muitos brinquedos que os meninos trouxeram
para ela.
Eric, James e Marcus estão todos apaixonados pela garotinha em
seu macacão de peru, e parece que toda Eres está apaixonada pelos The
Wreckage.
— Lamento interromper o seu jantar de Ação de Graças, mas
gostaria de saber se eu e minha amiga poderíamos tirar uma foto com
você? — Pede uma jovem, tremendo ao se aproximar da nossa mesa. Sua
amiga recua um pouco, tremendo também. Elas não devem ter mais de
quinze anos, e as estrelas em seus olhos são tão brilhantes e cheias de
esperança.
Quando Ian e os rapazes concordam com a fotografia, as meninas
pulam de alegria. As fotos com fãs não param até que Big Paw faz um
anúncio, forçando a multidão a parar de atacar os caras.
— Quão estranhas são suas vidas? — Pergunto a todos eles,
sorrindo. Eu amei a atenção que eles estão recebendo, porque sei o quão
duro trabalharam para recebê-la.
— Muito estranho, — responde Marcus, empurrando comida em sua
boca. — Mas é um bom estranho.
— Com base no número de nossas contas bancárias, é realmente um
estranho muito bom, — Eric canta, sorrindo de orelha a orelha.
— E por falar em números em contas bancárias, — diz Ian,
colocando a mão no bolso do terno. Ele puxa um envelope e o entrega para
mim. — Isto é para você, de nós.
Levanto uma sobrancelha. — O que é isso?
— Abra e você verá, — diz James.
Lentamente, abro o envelope e, no momento em que vejo o que há
dentro, fecho-o e atiro-o sobre a mesa. — Que diabo é isso? — Eu expiro.
— É um cheque. Você já viu um cheque antes, certo? — Ian brinca.
— Não é um cheque com tantos zeros, e isso era uma vírgula depois
de dois números? As vírgulas não vêm depois de dois números em
cheques! — Eu exclamo. Meu coração bate forte contra o meu peito de
simplesmente tocá-lo na minha mão.
Dez mil dólares.
Os caras me entregaram um cheque de dez mil dólares como se fosse
a coisa mais fácil do mundo. Lembro-me de alguns meses atrás, Marcus e
Eric brigaram para ver quem pagava a conta de vinte dólares de comida
chinesa. Agora, eles distribuem cheques de dez mil dólares.
Engraçado como o mundo de alguém pode mudar rápido.
— Eu não posso ficar com isso, — digo a eles.
Ian pega o cheque e coloca-o de volta na minha mão. — Você pode e
vai. Se não fosse por sua ajuda com as letras, nunca teríamos sido
descobertos, e quanto mais decolarmos, mais agradeceremos. Isto é
apenas o começo.
— Ian…
— Não, — ele interrompe. — Não lute contra isso, Haze. Você
merece. Você faz muito pelos outros sem receber nada em troca. Já é hora
de você ser recompensada pelo que faz.
— E tem mais de onde isso vem! — Eric grita, pegando o pãozinho de
Ian de seu prato.
Quando a compreensão se estabelece, uma onda de conforto começa
a tomar conta de mim. Esse dinheiro irá me ajudar mais do que eles
imaginam. Eu poderei fazer mais por Rosie e por mim. Começarei a
economizar para um futuro que nunca pensei que poderia ter. Eu poderei
respirar um pouco mais fácil.
— Obrigada, pessoal. Vocês não têm ideia de como isso é enorme
para mim.
— Bem, vendo como você tem aproveitado com nosso garoto Ian,
tenho certeza de que você está acostumado a ver coisas grandes, — brinca
Marcus, me cutucando na lateral.
Meu rosto fica mais vermelho do que a gelatina que Mary Sue fizera
para o jantar.
— Pare de envergonhá-la, seu burro! — Eric diz, empurrando seu
irmão.
— O quê? Eu não estou! Não é como se esta cidade inteira não
soubesse sobre o enorme pau de Ian, — Marcus argumenta. — Além disso,
eu ficaria feliz como um cachorro comendo um osso de peru se minha
garota estivesse orgulhosa do meu pau enorme.
— Pare de dizer ‘pau enorme’, — Eric geme, batendo a mão na testa.
— Ennooomeee paaauu, — Marcus arrasta, tentando fazer seu
irmão mais novo subir pela parede.
— Enorme o quê? — Uma voz disse atrás de nós.
Todos nós olhamos por cima dos ombros para ver Holly parada ali,
doce como sempre, com uma sobrancelha levantada.
Agora é a vez de Marcus combinar seu rosto com a gelatina. — Uh,
nada, vovó, — diz ele, balançando a cabeça. Adoro como todos os caras
chamam Holly de “vovó”, como se fossem netos dela também. Com base
em como ela é com todos na cidade, é como se fosse avó de toda Eres.
— Não, vá em frente e diga a ela o que você estava dizendo, — Eric
incita. Marcus deve ter batido o pé com força no de Eric embaixo da mesa,
porque Eric grita como uma pessoa mergulhando no rio no dia de Ano
Novo.
Holly continua sorrindo e acena com a mão. — Oh, vocês meninos e
seu humor. A mesa das sobremesas está aberta. Vá em frente e pegue uma
torta para você.
Os olhos de James brilham com a menção de torta. — Você fez sua
torta de maçã caseira?
Holly assente. — Fiz um extra para que você possa ter a sua
própria. Além disso, há creme no freezer para acompanhar.
Isso faz com que ele e os irmãos se levantem de seus assentos e
saiam correndo. Ian continua olhando para sua avó com uma expressão
sombria em seus olhos. — E você, vovó? Já comeu?
Ela acena para ele. — Ah, não. Ainda não. Eu vou chegar lá. Só
quero ter certeza de que as barrigas de todos estejam cheias antes de me
sentar.
— Todo mundo é bastante autossuficiente agora, eu acho. Vá em
frente, vovó. Coma.
Ela o silencia antes de caminhar até ele e colocar as mãos em seu
rosto. Holly se inclina e beija a testa de Ian. — Estou tão feliz por você
estar em casa. Não poderia imaginar não passar o feriado com você. Eu
sinto sua falta.
Ian dá a ela um sorriso torto. — Eu também sinto sua falta, vovó. E
sinto muito não ter ligado o suficiente. Vou me certificar de remediar isso.
— Sempre que recebo uma ligação sua, fico grata. Mas não sinta que
precisa sair do seu caminho para ligar para mim e para o Big
Paw. Sabemos que você está ocupado se tornando o próximo Elvis.
Sorrio com a interação deles e invejo um pouco. Eu nunca conheci
meus avós, e assistir o amor que existe entre Holly e Ian é lindo.
— Agora, vá em frente. Pegue um pouco de torta. Vou notificar as
outras mesas de que está pronta, — diz Holly.
— Posso apenas me levantar e gritar que a sobremesa está pronta,
— Ian oferece, mas ela balança a cabeça.
— Não, não. Quero cumprimentar a todos e deixar que saibam que
sou grata por eles estarem aqui. — Ela olha para mim e estende a mão em
minha direção. Eu pego na minha e ela me dá aquele sorriso que me
aquece. — Estou muito grata por você estar aqui, Hazel.
Meus olhos devem ter lacrimejado, porque ela me ordena que não
chore antes de ir para as outras mesas.
— Puxa, ela é uma joia. — Eu fungo, enxugando as poucas lágrimas
que caem dos meus olhos.
— Vamos, Haze, — Ian diz, me cutucando. — Ela disse para não
chorar.
— Eu sei, eu sei. Estou tão feliz. Todo este encontro é além de
incrível. Eu não comemorei o Dia de Ação de Graças nos últimos
anos. Mesmo quando comemorei, éramos principalmente apenas minha
mãe e eu comendo um frango comprado no supermercado.
Ele ergue uma sobrancelha. — Meus avós organizam esse evento
desde antes de eu nascer, e é gratuito para todos na cidade. Por que você
não veio?
— Charlie não queria que nos misturássemos aos eventos da
cidade. Ele dizia que isso traria muitas oportunidades para pessoas
intrometidas atrapalharem seus negócios. — Ele franze a testa e eu odeio
isso. Odeio quando Ian parece triste pelo meu passado. Dou um tapinha
em seu joelho. — Mas estou aqui agora, e isso é tudo que importa.
— Se eu pudesse voltar no tempo, nunca teria te tratado do jeito que
fiz, Haze. Eu sei que o tempo passou desde nosso primeiro encontro, mas
caramba. Ainda me odeio um pouco por ser um idiota com você.
Eu rio. — Bem, você mais do que compensou esse fato, isso é
certo. Além disso, os dez mil dólares cobrem todos os comentários rudes
do passado, — eu brinco.
Ele fica sombrio e perco a felicidade que estava em seus lábios.
— O que é, Ian?
— Eu apenas sinto sua falta. Sinto falta disso, — diz ele,
gesticulando em direção à multidão. — Nunca pensei que sentiria tanto
saudades de casa até deixá-la.
— Do que você mais sente falta? — Eu pergunto.
Ele exala uma nuvem de ar quente. — Inferno, de tudo. As estradas
de terra esburacadas estúpidas. As fogueiras. Os animais da
fazenda. Dottie me chutando com seus cascos. Você. Eu sinto sua falta.
Inclino-me e beijo seus lábios. — Bem, estou aqui agora.
— Estou grato por isso.
— Estou grata por você.
Seu sorriso volta aos lábios e ele me beija mais uma vez. Enquanto
seus lábios estão contra os meus, ele sussurra para mim: — Posso fazer
amor com você até de manhã?
— Sim, — respondo, mordendo seu lábio inferior. — Ou pelo menos
até que Rosie precise de uma troca de fralda.
30
IAN
A curta viagem de volta para casa veio e foi mais rápido do que eu
gostaria, mas fico grato por cada segundo que pude passar com minha
família e entes queridos. Quando chega a hora de arrumar minhas malas,
Big Paw, Vovó e Hazel estão esperando do lado de fora de casa novamente
como da primeira vez que eu saí. A única diferença desta vez é Rosie
deitada nos braços de Big Paw.
— Nós realmente precisamos parar de nos separar dessa maneira, —
vovó brinca, beijando minha bochecha.
— Espero estar de volta mais cedo ou mais tarde.
— Para o Natal? — Ela pergunta, esperançosa.
Faço uma careta, sabendo que faremos shows de Natal. Nunca na
minha vida perdi o Natal com meus avós. Talvez Max nos dê algum tipo de
milagre de Natal. — Espero que sim, vovó. — Beijo sua bochecha.
Big Paw acena para mim e diz-me para não fazer a triste despedida
novamente. Beijo a testa de Rosie e aperto a mão do meu avô. — Faça
bonito lá fora, Ian. Então volte para casa.
— Sim, senhor.
Em seguida, vou até Hazel, que segura uma caixa nas mãos. Temo
dizer adeus a ela. Uma parte de mim quer implorar para ela se juntar a
mim na turnê, mas sei que é egoísta. Ela está construindo uma vida para
si mesma no rancho, e eu não posso esperar que ela desista de algo que
ama tanto só para que eu possa acordar com ela todos os dias.
Mas, caramba, quero acordar com ela todos os dias.
— Isto é para você, — ela diz, segurando a caixa na minha direção.
Levanto uma sobrancelha e abro a caixa. Ao estudar as peças lá
dentro, sinto como se meu peito fosse explodir de felicidade. Engraçado
como eu saí de casa para encontrar a felicidade, mas ela estava bem ali ao
meu lado todo esse tempo.
— É um pedaço de casa, — explica ela, vasculhando a caixa para
mim. — Este é um frasco cheio com a velha estrada de terra. Há uma vela
com cheiro de fogueira e algumas fotos de todos nós. Até tirei fotos dos
animais da fazenda. Além disso, Holly fez uma dúzia de seus biscoitos
para você e eu fiz alguns pães de banana. Apenas algo para lembrá-lo de
nós sempre que você precisar.
Eu a amo muito, mais e mais a cada dia. Não sabia que o amor
poderia continuar crescendo, mas toda vez que estou perto de Hazel, meu
coração sorridente cresce três vezes.
— Você é perfeita, — falo a ela, colocando a caixa para baixo e
puxando-a para um abraço. — Vejo você em breve, certo?
— Mas não tão cedo, — ela ordena. — Primeiro, seus sonhos
precisam se tornar realidade.
— Confie em mim. — Eu beijo sua testa. — Eles já se tornaram.
— Você é meu melhor amigo, Ian Parker.
— Você é minha melhor amiga, Hazel Stone.
— Vá fazer sua música e depois volte para nós, ok? Não se preocupe,
vamos deixar a luz da varanda acesa quando você voltar, — ela diz,
beijando minha bochecha.
Coloco a caixa na minha van alugada e digo meu último adeus. Paro
na casa dos outros caras para buscá-los e depois vamos para o
aeroporto. Enquanto estamos sentados no terminal esperando para
embarcar em nosso voo, continuo folheando as fotos que Hazel havia me
dado. É como se aquele lar não fosse um lugar – são as pessoas, e eu sou o
idiota sortudo que nunca ficarei sem-teto na minha vida.
— Isso é de Hazel? — James pergunta, apontando para as fotos.
— Sim, ela me fez um pacote de conforto, e você sabe o quê?
— O quê?
— Eu vou me casar com aquela garota algum dia.
Quando os caras e eu voltamos para a estrada, é um turbilhão
ininterrupto de apresentações. Tivemos a oportunidade de abrir para
megastars em todo o país e, em seguida, ainda trabalhar na preparação
para o lançamento oficial do nosso álbum no ano seguinte.
Muitas vezes, pensei que Eric teria um ataque cardíaco enquanto
observava nossos números nas redes sociais subirem a patamares
surreais. — Um milhão de seguidores do Instagram! — Ele grita no ônibus
de turismo quando estamos a caminho de Richmond, Virgínia, para um
show. — Acabamos de alcançar mais de um milhão de seguidores!
Todos nós comemoramos como se tivéssemos ganhado um maldito
Grammy. É bom saber que as pessoas estão nos notando. Essa é a maior
recompensa para mim – ter as pessoas conectadas ao trabalho que
estamos lançando.
Parece que estamos em uma avalanche de sucesso. A cada show que
realizamos, mais e mais pessoas aparecem cantando nossos nomes. Os fãs
descobrem em quais hotéis estamos hospedados. Torna-se cada vez mais
difícil andar pelas ruas sem ser reconhecido.
Estamos nos tornando tudo o que Max Fodido Rider prometeu para
nós – estamos nos tornando famosos, e tudo está acontecendo em um
piscar de olhos.
Sou grato pela conexão que ainda tenho em casa. Fico grato por
minhas ligações com Hazel, porque ela me mantém no chão.
Depois de um show incrivelmente bom em Richmond, coloco um
casaco de inverno e saio tarde da noite para tomar um pouco de ar fresco e
conversar com Hazel.
— Eu não posso acreditar que você abriu para Shawn Mendes e eu
não estava lá para ver, — Hazel suspira, provavelmente mais triste por
sentir falta de Shawn do que de mim.
— Estou meio que feliz por você não estar aqui, porque ele parece
melhor pessoalmente e canta melhor pessoalmente, e é uma pessoa boa
‘pra’ caralho. Não preciso que você me deixe por Shawn.
— Você está certo, — ela concorda. — Eu teria implorado para ele ter
meus bebês.
Eu sorrio. — A única pessoa a colocar um bebê em você serei eu. —
Meu telefone fica mudo e percebo o que falei. — Quer dizer, algum dia,
muito, muito longe. Quer dizer, merda. Isso saiu muito pesado. Finja que
eu não disse isso.
— Não, está bem. Realmente. Só não sabia que você queria filhos
algum dia.
Esfrego minha testa. Suponho que não tenhamos conversado sobre
isso antes. — Bem, sim. Algum dia. Não tão cedo, é claro. Mas eu posso
ver alguns Ian Juniors correndo por aí. Acho que ver Rosie realmente
reforçou isso para mim. Ela é fofa, e isso me fez pensar sobre o assunto.
— Ela tem esse efeito nas pessoas.
— E você? — Eu pergunto, com um nó no estômago. — Você quer ter
filhos no futuro?
— Ai, sim. Dois ou três, pelo menos. Até quatro ou cinco. Eu quero
uma grande família cheia de risos. Eu cresci sem parentes, além da minha
mãe. Quero construir uma grande família.
Eu também, Haze.
Eu quero construir essa família grande com você.
Eu não digo isso, obviamente. Parece um pouco ousado.
— Desculpe! Desculpe! Você é Ian Parker? — Uma voz chama atrás
de mim.
Merda.
Eu continuo andando. Max havia nos instruído que, se fôssemos
vistos em público e não tivéssemos interesse em sermos abordados,
deveríamos continuar andando em uma velocidade normal e agir como se
não fôssemos quem somos.
— Alguém viu você? — Hazel pergunta.
— Sim, mas eu vou jogar com calma e dar uma volta pelo hotel. Está
tudo bem.
— Desculpe! Por favor! Você é Ian Parker, certo? — Outra voz
diz. Desta vez é a voz de um homem. Na maioria das vezes, são as
mulheres que gritam por nós, então o tom profundo e masculino me deixa
confuso.
— Não, não sou Ian, — grito, mantendo meu ritmo.
— É você! — Diz a mulher. — É Ian! Eu posso dizer. Ian Carter,
somos nós.
Paro meus passos quando meu nome do meio sai da língua da
mulher.
Isso novo para mim. A última pessoa que me chamou de Ian Carter
foi minha…
Eu me viro para ver as duas pessoas me seguindo, e me sinto como
se tivesse levado um soco no momento em que fixo os olhos nos dois.
— Depois te ligo, Hazel, — murmuro, desligando o telefone. Meus
lábios se separam quando o choque atinge todo o meu corpo. — Mãe? Pai?
Eles parecem quebrados e esfarrapados, mas são eles. Seus olhos
combinam com os meus, sua carranca combina com a minha.
Mamãe passa as mãos pelo cabelo ralo, me dá um sorriso brilhante e
diz duas palavras como se ela não tivesse desaparecido da minha vida nos
últimos quatorze anos. — Olá, baby.
31
IAN
Olá, baby.
De todas as palavras que pensei ouvir minha mãe dizer depois de
catorze malditos anos, Olá, baby não estavam entre elas. Talvez Olá,
Ian. Desculpe por abandonar você e, oh, eu não sei, bagunçando sua cabeça
por quatorze anos. Ou Olá, filho. Desculpe por perder aqueles quatorze
aniversários. Ou Olá, filho. Ainda é fã dos Dallas Cowboys?
Honestamente, eu pensei que ouviria qualquer outra coisa na porra
do mundo além dessas duas palavras.
Não sei como isso aconteceu, mas de alguma forma nós três
acabamos sentados dentro de uma lanchonete na rua. É como se eu
estivesse no piloto automático – atordoado demais para perceber o que
exatamente acontece diante de mim. Os dois foram na frente e pediram
quase tudo do cardápio e encheram a barriga como se não comessem há
anos.
Eu não tenho apetite nenhum.
— Queríamos apenas agradecê-lo por se encontrar conosco esta
noite, filho, — diz papai, jogando algumas batatas fritas na boca. Seu pé
bate repetidamente no chão de ladrilhos. Ele usa um casaco de inverno
surrado com buracos e um chapéu de inverno. Ele tem uma barba que não
havia sido aparada há Deus sabe quanto tempo, e não consegue
parar… inquieto. Nem sei se ele sabe que está se remexendo tanto, mas
não tinha parado.
Mamãe está do mesmo jeito, mas seus movimentos não são tão
intensos quanto os de papai.
Eles estão… horríveis ‘pra’ caralho.
Como se tivessem deixado Eres e estivessem viajando no trem de
merda desde então.
Fica claro que eles ainda usam drogas, e isso parte meu coração. Eu
imaginei que uma das duas coisas tinha acontecido desde que eles saíram:
(a) eles tiveram uma overdose e morreram, ou (b) eles encontraram seu
caminho para uma vida feliz e limpa e apenas me deixaram no passado.
Obviamente, a opção B tornou mais fácil para eu dormir à noite. Mas
descobrir que havia uma opção (c) ainda estariam tão fodidos quanto antes
– parte meu coração.
— Fazia muito tempo que pretendíamos nos aproximar, mas duvido
que Paw quisesse que voltássemos assim, — diz mamãe, tremendo como
se estivesse com frio, mas suando ao mesmo tempo. Tiro minha jaqueta e
a envolvo em seus ombros. Ela sorri. — Parece que eles acabaram criando
um ótimo cavalheiro sulista, — ela comenta, cutucando papai na
lateral. — Eu disse que ele ficaria ótimo, não disse, Ray?
— Ela com certeza disse isso, — ele concorda, tomando um gole de
sua Coca-Cola.
— O que vocês estão fazendo aqui? Como me acharam?
— Oh, você é fácil de encontrar. Vimos que você estava se
apresentando na cidade esta noite, e seu rosto foi veiculado em toda a
internet, revistas e televisão. Não sei se você sabe, filho, mas você é meio
que importante por aqui.
Dou a ele um sorriso tenso. Se soubesse a inquietação que me causa
ao me chamar de – filho.
Eu não sou filho deles há anos.
— Mas por que vocês estão aqui? — Pergunto novamente. — O que
querem?
Vejo como mamãe fica surpresa com essas palavras, mas não sei
mais como perguntar. Imaginei os dois e eu nos reunindo muitas vezes
antes, mas, infelizmente, eu esperava que tivesse sido antes da fama
chegar – não depois. Agora que estou no caminho de fazer algo por mim
mesmo, parece bastante suspeito que eles estejam se aproximando de mim
para uma reunião de família.
Mamãe se aproxima de mim e coloca a mão em cima da minha e,
porra, foi bom segurar a mão dela. Eu odeio como é bom. Mesmo que suas
mãos estejam geladas, seu toque é o suficiente para aquecer as partes
geladas da minha alma.
— Queríamos ver você, Ian; isso é tudo. Para ter certeza de que você
está bem.
— Poderiam ter verificado há muito tempo para ter certeza
disso. Meu endereço não mudou. Você sabia onde eu estava.
— Sim, mas não tínhamos dinheiro para viajar de volta para
Nebraska, — papai argumenta.
— Suponho que você também não tinha dinheiro para um telefone
público. O número da vovó e do Big Paw é o mesmo desde os anos
noventa.
As sobrancelhas de papai baixaram e uma frieza percorre seu
olhar. — O que você está tentando dizer? Não nos esforçamos o suficiente
para entrar em contato?
— Isso é exatamente o que estou tentando dizer, — falo sem
rodeios. — É estranho que aconteça de você reaparecer depois de todo esse
tempo, agora que me viu na TV. É uma merda isso.
— Cuidado com a língua, garoto! — Papai grunhe, apontando um
dedo severo em minha direção, fazendo com que as pessoas olhem para a
nossa mesa.
Mamãe estende a mão e abaixa seu braço, silenciando-o. — Calma,
Ray.
Ele resmunga. — Só não gosto de onde ele quer chegar.
— Por que, porque estou certo? — Pergunto. Pego minha carteira e
começo a folhear as notas. — Então o que estamos pensando? Quanto
você precisa? Quer dizer, você está atrás de dinheiro, certo? É claro que
não estamos aqui para nos reconectar e compartilhar memórias.
Mamãe abaixa a cabeça e a balança. — Queríamos ver você, Ian. Eu
juro, mas é justo… passamos por momentos difíceis e queríamos saber se
você poderia nos ajudar.
O arrependimento que sinto por permitir que meu coração batesse
novamente depois de todos esses anos veio como uma tempestade de volta
em minha direção. O problema de batimentos cardíacos é que eles podem
se partir em um instante.
Pego o dinheiro da minha carteira e coloco na minha frente. Seus
olhos vidrados de admiração enquanto olham para ele, me mostrando que
o dinheiro é exatamente o que eles buscam. — Eu tenho quinhentos.
— Besteira, — papai – não, Ray, dispara. — Você é um superstar
maldito. Você pode nos dar mais do que isso.
— O que diabos faz você pensar que eu devo algo a você?
— Nós somos seus pais, — ele diz, sua voz pingando de raiva. Ele
provavelmente está louco.
— Você não é nada para mim. Aqui estão suas opções. Você pega os
quinhentos dólares agora, ou não pega dinheiro nenhum, e podemos
descobrir se podemos ter um relacionamento no futuro. Mas se o fizermos,
não vou te dar um centavo nunca. Você pega os quinhentos dólares ou
recebe seu filho de volta. A escolha é sua.
Eu me sinto um idiota.
Conforme os segundos passam, meu coração, meu estúpido coração
machucado e maltratado, grita como a criança de oito anos que eu
costumava ser, pedindo – não, implorando – a seus pais para escolhêlo. Eu quero que eles me escolham, que me acolham, que me desejem.
Eles olham um para o outro, depois para o dinheiro, nunca olhando
para mim. Em um movimento rápido, Ray pega o dinheiro e enfia-o no
bolso.
E meu coração estúpido, machucado e batido?
Quebra, porra.
Eles saem naquela noite com quinhentos dólares nas mãos para
buscar a próxima dose enquanto sou deixado sozinho na lanchonete,
parecendo um idiota.
— O que está acontecendo? O que aconteceu? — Hazel pergunta
enquanto estou deitado no quarto do hotel com o telefone pressionado
contra meu ouvido. Ela me deixou dezenas de mensagens de texto e ligou
várias vezes, deixando mensagens de voz cheias de preocupação.
Eu finalmente crio coragem suficiente para ligar para ela por volta de
uma da manhã. — Apenas algumas besteiras, — murmuro. É necessário
muito para eu recorrer ao uísque, mas beberico em um copo enquanto
estou sentado na cama. Já estava bêbado quando liguei, e isso
provavelmente não é uma coisa boa.
O uísque normalmente me deixa triste, mas isso não importa – visto
que eu já estou esmagado.
— Foi alguém que correu para você? Um fã? Paparazzi?
— Não. — Balanço minha cabeça como se ela pudesse me ver. —
Pior ainda. Foram meus pais.
Hazel engasga com o que ouve. — Oh, meu Deus, o quê?
— Acho que eles me viram na TV. E queriam recuperar o atraso e,
por ‘recuperar o atraso’, quero dizer que queriam dinheiro.
— Oh, meu Deus, Ian. Eu não posso acreditar nisso. O que você fez?
— Eu dei a eles uma opção – quinhentos dólares ou um
relacionamento comigo.
Ela suspira, quase como se soubesse o que eles haviam escolhido. —
Eles pegaram o dinheiro?
— Sim. — Eu rio, o fundo da minha garganta queimando com o
uísque e a dor da noite. — Eles pegaram a porra do dinheiro.
— Idiotas, — ela sussurra. — Eu os odeio. Eu sei que não deveria
odiar seus pais, mas eu odeio. Eu realmente os odeio.
— Sim. Não é como se eles tivessem feito a escolha errada, — eu digo
embriagado, tomando o uísque, antes de caminhar até o bar para me
servir de outro copo. — Eu também não teria me escolhido.
— Não diga isso. Você não é o errado nisso, Ian. Eles são. Eles são
os defeituosos, não você.
Fico quieto e coloco a mão no bar para me estabilizar enquanto
minha mente gira com o uísque e a dor no coração.
— O que você precisa? — Ela pergunta, sua voz alerta e severa. —
Diga-me o que você precisa.
Engulo em seco e limpo minha garganta. — Minha melhor amiga, —
murmuro. — Eu preciso da minha melhor amiga.
— Ok. Estou a caminho.
32
IAN
— Que porra é essa? — Max grita enquanto corre em minha direção
no saguão do hotel na manhã seguinte. Fizemos mais dois shows em
Richmond e não posso evitar de querer voltar para casa. Mas, como eles
disseram, o show tem que continuar.
Os caras e eu estamos esperando no saguão para ir a algumas
entrevistas, e o som da voz estridente de Max parece pregos na porra de
um quadro negro para a minha ressaca.
Belisco a ponta do meu nariz quando ele para na minha
frente. Estou usando óculos escuros bonitos e roupas escuras, e tudo que
quero é um pouco de ibuprofeno e alimentos fritos.
— O que foi? O quê? — Resmungo, não querendo lidar com meu
gerente naquela manhã. Ele fez nossos sonhos se tornarem
realidade? Sim. Ele me deixa louco às vezes? Sim, claro que sim.
— Isso, — diz ele, empurrando o telefone em minhas mãos.
Encaro a tela e um nó se forma no meu estômago. É uma imagem de
tabloide minha sentada na lanchonete com meus pais, e me pega
entregando dinheiro para os dois. Olhando de fora, parece sombrio ‘pra’
caralho.
Ok, independentemente disso, é sombrio, mas os tabloides fizeram
com que parecesse horrível. Agora entendo o pânico de Max.
— O que é isso? — James pergunta, pegando o telefone da minha
mão. No momento em que ele vê, seu queixo cai. — Puta merda. É ele…?
— Pergunta.
Eu concordo. — Sim.
Max pega o telefone de volta das minhas mãos, completamente
inconsciente de com quem eu estava sentado naquela foto. E obviamente
não se importa.
Ele se senta na mesa de centro bem em frente a mim e junta as
mãos. — Você está usando drogas?
— O quê? — Eu solto. — Não, eu não sou um drogado.
— Não minta para mim! Porra, Ian. Se for, só preciso saber de que
tipo. Cocaína? Eu posso fazer. Molly? Certo. Alguns comprimidos e xarope
para tosse em um sábado à noite? Claro, por que não? Mas essa – essa foto
parece duas pessoas usando metanfetamina. E eu não brinco com artistas
que estão usando metanfetamina, — ele berra com o nariz dilatado. —
Então você se encontrou com essas pessoas para se juntar à festa deles?
A mandíbula de James aperta e ele baixa as sobrancelhas. — Você
não sabe do que está falando, Max, — diz meu amigo.
— Sem ofensa, Yoda, mas estou falando com minha estrela
agora. Uma estrela que está prestes a jogar fora tudo o que temos a seu
favor. Então, por favor, cuide da sua vida.
James abre a boca para o colocar no seu lugar, mas levanto a mão
para detê-lo. O rosto de James está vermelho de raiva e ele demora muito
para chegar a esse nível. Sei que se ele atacar Max, não haverá como voltar
atrás.
Quando James fica chateado – o que dificilmente acontece – ele se
transforma no Incrível Hulk, e quebra coisas. Como o rosto de Max.
— Eles são meus pais, — eu digo, sabendo que não há motivo para
mentir. — Há anos eles não aparecem na minha vida, devido ao problema
com as drogas, e quando descobriram meu sucesso, vieram em busca de
dinheiro.
Max suspira e rola a mão contra o rosto. — Por favor, não me diga
que você deu dinheiro a eles; por favor…, — implora.
— Sim, mas disse-lhes que não podiam voltar para buscar
mais. Acabou.
— Droga! — Max diz, levantando-se de sua posição sentada e
pisando forte como uma criança. — Não! Não. Você nunca dá dinheiro a
familiares viciados. Sabe por que, Ian?
— Esclareça-me, — resmungo, irritado com meu gerente.
— Porque eles nunca vão embora! Se você der um centavo a um
drogado, eles voltam pedindo dez centavos. Isso é uma merda. Isso é uma
merda!!! — Max vasculha sua bolsa tipo pochete, tira seus remédios
prescritos e os coloca na boca. Ele respira fundo e tenta se firmar. —
Ok. Ok. Isso é bom. Vou consertar isso. Mas, por enquanto – não saia por
aí distribuindo mais dinheiro para ninguém, certo? Sua carreira está
apenas começando, e eu realmente não quero que termine porque alguns
pais viciados em metanfetamina decidem que querem ficar ricos
rapidamente e escrever uma história para contar tudo sobre Ian Parker.
— Eles não têm nada a dizer. Eles não falam comigo há anos.
— As pessoas não se importam se estão falando a verdade! Eles só
querem drama! — Ele grita.
Antes que eu possa responder, ele já está fazendo ligações e saindo
em disparada.
Todos os caras olham para mim com os olhares mais sinceros em
seus rostos. Está claro que eles estão mais preocupados com meu bemestar do que Max, mas eu não tenho vontade de falar sobre isso.
— Agora não, rapazes, — murmuro, recostando-me na cadeira. —
Não posso falar sobre isso agora.
— Eu entendo, cara, — diz Marcus, dando um tapinha nas minhas
costas. — Mas quando você estiver pronto para conversar, estamos aqui
para ouvir.
A apresentação daquela noite é provavelmente uma das mais difíceis
que eu já fiz, mas eu sigo, e quando chega a hora de sair do palco, corro
para o meu camarim. Não quero nada mais do que evitar todo contato
humano, dormir no meu quarto de hotel e ficar na minha autopiedade.
Ao abrir o camarim, noto uma pessoa sentada na cadeira perto do
meu espelho, de costas para mim.
— Uh, com licença?
— Sabe, você tem que ter mais cuidado para que esses camarins
tenham melhor segurança. — Hazel gira na cadeira e sorri para mim. O
sorriso que conserta as coisas. — Caso contrário, qualquer fangirl pode
entrar aqui e tentar tocar na sua bunda.
Não respondo ao seu comentário atrevido. Eu apenas me aproximo
dela e a puxo para um abraço. Eu a seguro com mais força do que nunca.
— Desculpe-me pelo atraso, — ela sussurra, empurrando sua
cabeça contra meu peito.
— Você chegou bem na hora. Onde está Rosie?
— Big Paw e Holly vão ficar de olho nela nos próximos dois dias, com
a ajuda de Leah, até eu voltar para a cidade. — Ela se afasta um pouco e
coloca a palma da mão na minha bochecha. Seus olhos dilatados me
perfuram. — Você está bem?
Balanço minha cabeça.
Ela me abraça com mais força. — Ok.
Só então, a porta do camarim se abre e Max entra. — Ian, nós
precisamos — Ele para. Arqueia uma sobrancelha e olha Hazel de cima a
baixo. — Oh. Uh, desculpe, eu não sabia que você tinha companhia.
Afasto-me de Hazel e gesticulo em direção a Max. — Haze, este é
Max, meu empresário. Max, esta é minha namorada, Hazel. — É bom
apresentá-la assim às pessoas – como minha namorada.
Os olhos de Max começam a estudar Hazel um pouco mais, e pela
primeira vez desde que comecei a trabalhar com ele, percebo como ele
é. Ele parece um rato, sempre estudando as coisas para ver se consegue
tirar algo delas.
Ele sorri, caminha até Hazel e oferece-lhe um aperto de mão. — Max
Rider. Prazer em conhecê-la. Então é você quem está ocupando o foco de
Ian, hein?
Hazel sorri. — Culpada.
Max mantém os lábios pressionados com força e traça os olhos sobre
Hazel mais uma vez. — Qual é o seu sobrenome, Hazel?
Ela ergue uma sobrancelha, mas responde. — Stone.
Max assobia. — Hazel Stone e Ian Parker. Isso soa bem. De qualquer
forma, não quero tomar muito do seu tempo. Eu só queria te lembrar da
festa hoje à noite com alguns grandes nomes, Ian.
Eu me encolho e balanço minha cabeça. — Esperava ficar escondido
esta noite com Hazel. Foram vinte e quatro horas loucas.
— Para quem você está contando? Eu sei. Estou encarregado do
controle de danos, lembra?
Hazel ergue outra sobrancelha em direção ao tom de Max, e posso
dizer que ela está incomodada com ele. Ela deve ter tentado muito morder
a língua. Posso imaginar as respostas atrevidas voando por seu cérebro.
— Sim, eu sei. Mas só preciso de uma noite de folga.
— Agora não, — ele argumenta. — Agora é a hora de você sair e
mostrar que não está usando drogas. Você é charmoso e engraçado e a
pessoa que estamos criando para Ian Parker ser.
— Não estou com vontade de ser charmoso e engraçado.
— É por isso que se chama atuação.
— Sou músico, não ator.
Ele ri. — Todos os músicos são atores. A única diferença é que os
músicos podem cantar melhor. De qualquer forma, enviarei uma
mensagem com os detalhes.
Ele sai correndo da sala e bate a porta antes que eu possa
responder.
— Então esse é o incrível Max Fodido Rider, hein? — Hazel diz,
revirando os olhos com tanta força que penso que ela nunca verá direito
novamente. — Ele sabe que, no final do dia, ele trabalha para você, certo?
Dou um sorriso preguiçoso. — Duvido que ele saiba disso. Desculpe,
você ter que testemunhar isso. Esperava que pudéssemos conversar e
relaxar, mas acho que tenho que fazer uma aparição esta noite, para
controle de danos e tudo.
— Quem está cuidando do controle de danos em seu coração? — Ela
pergunta.
Passo um braço em volta dela e puxo-a para perto. — Você está. —
Pressiono meus lábios em sua testa. — Sei que você não veio aqui para vir
a uma festa, mas adoraria ter você ao meu lado para me manter
equilibrado.
— Onde você estiver, eu estarei. O que quer que você precise de mim
nas próximas trinta horas, sou sua.
33
HAZEL
Max Fodido Rider.
Mais como Max Fodido Idiota.
Eu não posso acreditar que ele é tão arrogante para um homenzinho
tão pequeno. Max é um cara careca, provavelmente na casa dos quarenta,
mas se veste como se estivesse com vinte. Ele está obviamente se
esforçando demais para permanecer proeminente, e está se saindo
exatamente assim – um homem de meia-idade se esforçando demais. Além
disso, ele tem uma grande quantidade de pelos no peito saindo para fora
da camisa.
Se um pênis e um gorila tivessem um filho, seria Max Fodido Rider.
Se não fosse por Ian e a banda, eu teria dito a Max onde ele poderia
enfiar isso. Mas em vez disso, sou uma boa e bela garota sulista. Sorrio,
encanto e guardo meus pensamentos extremamente desagradáveis sobre o
homem para mim.
Então vou para o hotel com Ian para me preparar para a festa.
— Não tenho nada para vestir para uma festa, — confesso,
vasculhando as poucas peças de roupa na minha mala.
— Tudo o que vestir ficará bom. Poderia usar o que está vestindo
agora, e estará bem, — Ian diz.
Eu rio e olho para o meu moletom com capuz e legging. —
Realmente? É isso que as pessoas usam para conhecer celebridades hoje
em dia? — Eu franzo a testa, sentindo-me um pouco derrotada quando
vejo as roupas extravagantes que Ian está vestindo. Duvido que as
mulheres que cercam os The Wreckage diariamente se parecem como
eu. Elas provavelmente usam vestidos justos e sapatos de salto alto.
Olho para o meu Adidas.
Definitivamente não é Christian Louboutin41.
— Não faça isso, Hazel, — alerta.
— Fazer o que?
— Não pense que você tem que mudar para este mundo em que
estou. Essas festas, essas roupas chiques – isso não é real.
— E o que é real?
— Velhas estradas de terra. Fogueiras. A cozinha da vovó. — Ele
sorri para mim e se aproxima para me pegar em seus braços. —
Você. Eu. Nós. Nós somos reais. Todo o resto é apenas uma atuação. Tudo
o que você vestir está bom o suficiente.
O conforto que essas palavras me dão alivia meu coração
perturbado. Eu não posso deixar de me apaixonar mais pelo homem ao
meu lado. — É muito cedo para eu perguntar como você está após ver seus
pais? Ou você quer passar esta noite primeiro?
— Vamos passar esta noite; então podemos conversar até de manhã.
— Perfeito.
— E Haze?
— Sim?
— Eu também quero que você me diga todos os seus pensamentos
sobre Max.
Eu rio. — Confie em mim, eles não são legais.
— Eu sei. — Ele assente. — É por isso que quero ouvir todos eles.
Quando chegamos à boate, estou completamente fora do meu
ambiente. Ainda assim, Ian mantém minha mão envolta da sua enquanto
vagamos pelo clube. As pessoas estão embaladas como sardinhas. Todos e
41 Marca de sapatos de grife.
suas mães estão nesse lugar durante a noite, conversando e beijando a
bunda dos meninos do The Wreckage, cantando suas canções. É tão
estranho ver o quanto as pessoas amam a banda. Isso é… poderoso.
Todos os caras interagem como se pertencessem também. Mesmo
que Eric seja menor de idade, deve haver uma cláusula “Estou me
tornando famoso” porque ele também tem permissão para entrar no
clube. Além disso, eu fui autorizada a entrar porque estou nos braços de
Ian.
— Vou correr para o banheiro, — digo a Ian, apertando sua mão. Ele
não me deixou ir desde que entramos, e estou tão feliz por seu toque. Ele
me dá o conforto que eu não sabia que precisava.
— Vou esperar aqui, — ele diz, dando um passo ao lado do banheiro.
— Você pode andar por aí. Vou te encontrar.
Ele sorri. — Eu esperarei aqui.
Vou ao banheiro para reorientar minha mente, porque realmente
sinto como se tivesse entrado na Ilha da Fantasia.
Quando entro no banheiro, noto duas mulheres – gêmeas, ao que
parece – reaplicando o batom. — Você viu que Ian Parker está aqui? —
Pergunta uma.
— Sim. E puta merda, ele é quente, — sua irmã gêmea ecoa.
— É meu! — A outra diz.
— Não é justo, — a outra faz beicinho. — Então, o baterista é quente
também. Eu poderia ir atrás dele também.
Ela empurra os seios e sorri antes de olhar para mim com um olhar
confuso.
— Hum, posso ajudá-la? — Ela questiona, olhando-me de cima a
baixo como se eu não pertencesse aqui. Então, também, ela pode ter
estado olhando para mim de forma tão estranha porque estou sendo uma
completa idiota olhando para elas no banheiro enquanto ouço a conversa
sobre meu namorado.
— Oh, uh, não. Desculpe. Você está na fila? — Pergunto, apontando
para as cabines do banheiro. O banheiro completamente vazio. Eu quero
rastejar em uma bola e balançar em um canto por causa do quão estranho
parece.
— Hum, não, querida. É todo seu.
Corro para a cabine e fecho a porta. Bato minha mão contra minha
testa, me sentindo ridícula. Que humilhante.
Depois que as ouço sair, respiro fundo algumas vezes e saio da
cabine. Olho no espelho e tento apagar o quão bonitas aquelas mulheres
são. — Estradas de terra, fogueiras, a comida de Holly, — murmuro, me
lembrando do que é real e do que realmente importa.
No momento em que saio do banheiro, uma sensação incômoda
passa por mim quando percebo que Ian não está no mesmo lugar. Meus
olhos dançam ao redor do espaço em busca dele, e quando começo a me
afastar para procura-lo, ouço meu nome sendo chamado. Eu me viro para
ver Max Fodido Idiota em um terno caro.
Levanto uma sobrancelha. — Sim?
— Pensei que fosse você. É bom te ver de novo.
— É bom ver você também, — minto, dando a ele um pequeno
sorriso falso. — Sinto muito, estou indo encontrar o Ian, — começo, me
afastando.
Ele estende a mão e aponta para o outro lado da sala. — Oh, ele está
bem ali, falando com as gêmeas Romper. São vocalistas promissoras. Tão
quente na cena quanto os The Wreckage.
Eu olho para cima para ver as duas beldades do banheiro, e meu
estômago embrulha.
Elas estão flertando com Ian, tocando seus ombros e jogando a
cabeça para trás quando gargalham, enquanto Ian mantém as mãos para
si mesmo com um sorriso pequeno e desconfortável.
— Eu pedi que fossem conversar com elas. Você sabe, networking42 é
tudo, — Max explica. Enfia as mãos nos bolsos da calça sob medida e
balança para frente e para trás. — Estou feliz por ter topado com você, na
verdade. Esperava saber mais sobre a Sra. Hazel Stone.
— Não há muito o que saber, na verdade.
Ele dá uma risadinha. — Humilde, hein? Isso é bom. Você não
encontra muitas pessoas humildes de onde venho. Devo admitir, quase
sinto como se a conhecesse pela quantidade de vezes que Ian a
menciona. Vocês dois devem estar namorando há muito tempo.
— Não há tempo, na verdade. Nós começamos a ficar juntos no verão
e, na verdade, só tornamos isso oficial um pouco antes de Ian ir para Los
Angeles trabalhar com você.
— Oh? Isso é surpreendente. Portanto, não é um relacionamento
muito sério, — comenta. Não gosto da maneira como ele disse essas
palavras.
— Eu discordo. É muito sério. Nós significamos o mundo um para o
outro.
— Sim, tenho certeza que é verdade. Amor jovem é tudo. Eu só me
preocupo em como isso vai moldar o futuro da carreira dele, você sabe, têlo com alguém como você.
— Desculpe? Alguém como eu?
— Você sabe: uma mãe solteira. Você tem um filho, certo?
Fico quieta e não acho o tom de sua pergunta agradável. E,
obviamente, ele sabe coisas sobre mim.
Ele me dá outro sorriso. Não retribuo o gesto desta vez.
— Eu tenho que perguntar, o garoto é do Ian? Apenas do ponto de
vista do marketing, essas coisas são importantes.
42 Significa Rede de Contatos.
— Não, não é, mas é uma situação bastante particular sobre a qual
não me sinto confortável em falar. Agora, se você me der licença — Eu o
empurro, mas congelo no lugar quando ele fala novamente.
— Eu só me preocupo com as manchetes que seu relacionamento
com Ian poderia trazer em primeiro plano. Como o fato de que sua mãe
está na prisão por dirigir um laboratório de metanfetamina.
— Você está cruzando tantos limites agora, — eu falo em sua
direção, batendo na frente de seu rosto. — Não sei como você sabe sobre a
minha mãe, mas realmente não é da sua conta.
— Mas isso é. Com uma rápida pesquisa no Google, você pode
descobrir tudo o que há para saber sobre qualquer pessoa neste
planeta. Como você acha que será quando as pessoas souberem que Ian
está em um relacionamento com uma viciada em metanfetamina?
— O quê? Não. Eu nunca usei drogas. Não tenho um problema. Eu
não sou minha mãe.
— Mas qual a importância disso? A internet vai fazer de você sua
mãe. Eles vão distorcer a história e tecer uma teia de mentiras. Eles farão
parecer que Ian também é um viciado em drogas. Eles vão desligar sua
chama antes que ele tenha um minuto para queimar, e para quê? Para
uma garota com quem ele não estava tendo um relacionamento sério antes
do início do verão? É isso que você quer para ele? Realmente quer matar
sua chance de fama por uma história de amor que pode nem ser eterna?
Minha boca se abre para falar, mas nenhuma palavra sai. É como se
Max tivesse roubado cada grama de coragem de meus ossos enquanto olha
em minha direção. O que eu mais odeio é como há tanta verdade em suas
palavras. Esses mesmos pensamentos estavam voando pela minha mente
por semanas. Como seria se eu estivesse nos braços de Ian, especialmente
agora com Rosie na foto? O que as pessoas diriam? Como as pessoas nos
julgariam?
O que aconteceria com sua carreira?
— Consigo ver que está entrando em colapso. Posso dizer que você
está colocando as peças juntas em sua mente. Não estou tentando ser o
mau sujeito, mas se é assim que estou sendo, que seja. Vou pegar essa
bala para ter certeza de que esses caras terão a melhor chance de uma
carreira. Eu faço meu trabalho há muito tempo e sei o que parece quando
as pessoas têm o fator “aquele”. Ian Parker tem isso em ondas. Tudo o que
peço é que não o sobrecarregue. Você tem que deixá-lo voar. Eles estão se
preparando para voar. Acabe com ele mais cedo ou mais tarde. Será mais
difícil se você o puxar para baixo. Quer dizer, eu entendo.
— Não, você não entende, — eu rebato.
— Confie em mim, eu entendo. Vocês dois são do mesmo mundo. Os
pais dele são drogados e os seus também.
— Essa não é a razão de eu me ligar a ele. Você não tem ideia.
Estradas de terra. Fogueiras. A cozinha de Holly.
— Querida, é. Você é do mesmo mundo, mas Ian? Ele está a
caminho de um novo planeta. Quero dizer, olhe para ele, — diz,
gesticulando novamente em direção as gêmeas e Ian. — Esse é o futuro
dele. Esse é o tipo de mulher que ele precisa em seu braço. Basta se
contentar em ser uma parte dele do passado. Vai acabar sendo uma boa
história para contar aos seus netos algum dia, que você namorou Ian
Parker, o superstar, por um curto período de tempo.
Eu não digo mais nada para Max.
Max Fodido Idiota.
O homem que fala a verdade mesmo quando meu coração não quer
ouvir.
Afasto-me dele e vou direto à direção de Ian. O nervosismo que
dispara em mim diminui quando ele olha para mim e me dá um de seus
sorrisos. Não seu famoso sorriso de Ian Parker, mas seu sorriso
verdadeiro. Aquele que ele guarda apenas para mim.
Isso é real. Nós somos reais.
Piso na frente das gêmeas, e Ian estende a mão em minha
direção. Eu pego e me sinto em casa mais uma vez. Claro, eu não pareço
com as mulheres ao meu redor, mas Ian olha em minha direção como se
eu fosse a mulher mais bonita daqui.
Ele me puxa para o seu lado e me dá um aperto forte. Mais
conforto. — Erin e Trina, esta é Hazel, minha namorada.
Elas olham para mim como se eu fosse um lixo, e não posso deixar
de sorrir. Estendo minha mão em direção a elas para apertos de mão. —
Prazer em conhecê-las, — eu falo.
— O mesmo, — respondem em uníssono.
Ian se inclina para mim e sussurra em meu ouvido. — Podemos dar
o fora daqui, colocar um pijama e pedir serviço de quarto?
— Você está falando minha língua.
Pedimos licença à conversa e juro que as gêmeas ficaram atordoadas
e confusas. Ian tem um carro esperando por ele nos fundos, e quando
saímos, ele parece imerso em pensamentos enquanto estuda o céu.
Meus dedos se mexem enquanto as palavras de Max tocam uma e
outra vez na minha cabeça. Eu quero desligá-las e permitir que meus
sentimentos por Ian sejam a coisa mais forte do mundo, mas é impossível
não sentir uma dor em meu coração.
Se Max foi capaz de descobrir essas informações sobre meu passado
em um curto período de tempo, tenho certeza de que outros também
poderão.
Ian e eu tínhamos nos aproximado tão rápido. Nem tivemos a chance
de envolver totalmente nossas cabeças em torno da ideia de estarmos
juntos antes de ele partir para Los Angeles. Então, depois disso, veio
Rosie, o que acrescentou outra chave à nossa situação.
Ainda somos tão novos, tão novos para a possibilidade de nossa
história de amor, que não temos a chance de ser realmente concretos
sobre tudo isso.
Ian continua olhando para o céu e eu continuo olhando para ele. —
Você sabe… todas as noites desde que parti, eu saio e olho para a lua. E
fico sentado lá por um tempo olhando para ela em todas as suas fases e
sinto uma estranha sensação de conforto. Los Angeles é diferente, Haze. É
uma terra própria e há tantas pessoas, mas é como se ninguém se
conhecesse ou se importasse realmente. Não é pessoal. Está difícil. Não me
entenda mal – estou feliz pelo que recebi. As oportunidades são fora deste
mundo. Mas fico solitário e sinto falta de casa. Então, quando eu olho para
a lua, me sinto um pouco melhor. Porque eu sei que você está olhando
para a mesma coisa em Eres.
Ele não tem ideia de quanto conforto suas palavras me dão.
Tínhamos rastejado para a cama depois de encher nosso estômago
de fritura. É a primeira vez que pudemos realmente falar sobre tudo o que
aconteceu com seus pais. Eu não quero pressioná-lo, mas fico feliz quando
ele toca no assunto sozinho.
— Quero fingir que não mexeu com a minha cabeça, mas
mexeu. Quero fingir que não rezei para que eles me escolhessem, mas
rezei. Quero fingir que não bebi para passar pelo show hoje à noite, mas
bebi. Estou uma bagunça, Haze, e vendo-os na forma que estavam, fodeu
com minha cabeça. Só quero parar um pouco e não ser forçado a agir feliz
como tive que fazer na festa esta noite. Eu não quero fazer shows me
sentindo miserável, mas eu tenho que fazer isso. Se não fizer, não estou
apenas me ferrando, mas também ferrando os caras. Este não é apenas o
meu sonho – é o sonho deles, e não posso recuar porque afetaria muito
mais pessoas do que apenas eu.
— Os caras vão entender Ian. Na verdade, esses três são os que mais
entendem.
Ele faz uma careta. — Mas aí está o Max.
— Dane-se, — eu berro, sentindo minha pele arrepiar com a menção
dele. — Como eu disse antes, ele trabalha para você. Ele torna sua vida
mais fácil, não o contrário.
Ainda assim, Ian não parece convencido, então abandono esse
ângulo. — Bem, pelo menos por esta noite, você não tem que agir feliz ou
estar ‘bem’. Você pode ser o que precisa ser e eu estarei aqui para ajudálo. Não vou a lugar nenhum.
— Promete? — Sussurra com uma rachadura em sua voz. Ele parece
tão inconsolável. — Promete que não vai me abandonar também?
— Eu prometo.
Ele me segura perto e se desfaz contra mim naquela noite.
Fico perto o suficiente para ter certeza de que sou capaz de pegar
seus pedaços quebrados. E quando fazemos amor, espero que o sinta para
sempre contra meus lábios.
34
HAZEL
No momento em que pouso de volta em Nebraska, dirijo algumas
horas para chegar a Eres e vou direto para Big Paw e Holly buscar
Rosie. Sei que haviam se passado apenas dois dias, mas, nossa, senti
muita falta daquela garotinha. Parece que tem um grande buraco dentro
de mim.
— Obrigada por cuidar dela, — eu digo a Big Paw enquanto pego
Rosie em meus braços. Holly está por perto com aquele sorriso doce no
rosto.
— A qualquer hora, — diz Paw, resmungando. — Mesmo que ela
tenha vomitado na minha cara.
Eu rio. — Sim, ela faz isso. Esperava poder falar com vocês dois
sobre Ian… Estou um pouco preocupada.
Essas palavras fazem os olhos de seus avós se arregalarem de
preocupação.
— O que foi? — Holly pergunta. — O que há de errado com ele?
— Ele encontrou seus pais; é por isso que queria que eu fosse
lá. Eles o usaram e pediram dinheiro. Ele está sofrendo agora, tentando
descobrir todas essas coisas.
— Filho da puta, — Paw resmunga, tirando o chapéu e batendo-o na
perna. — Veja, Holly! Isso é o que eu disse que aconteceria! Eu disse que,
no momento em que aquele menino tivesse sucesso, aqueles dois viriam
tentando reivindicar uma parte dele.
Holly franze a testa e assente com conhecimento de causa. — Como
está nosso menino? — Ela pergunta, suas sobrancelhas baixas. Vejo a
preocupação em seus olhos e não posso culpá-la.
— Ele está lutando, — explico. — Mas ele é forte. E vai ficar bem.
— Eu não entendo por que eles não podiam simplesmente deixá-lo
em paz, — Big Paw bufa. — Ele estava indo bem sozinho. Eles não
precisavam vir e mijar em seu sucesso.
— Sim. Eu me sinto da mesma forma. Se pudéssemos controlar as
escolhas dos outros, a vida seria mais fácil. — Eu acalmo uma Rosie
agitada em meus braços enquanto Big Paw continua carrancudo.
— Leve essa garota para casa e dê uma mamadeira para ela. E a
segure um pouco mais alto; isso a faz parar de se agitar tanto.
Faço o que ele disse e, como mágica, Rosie se acalma.
Quem poderia imaginar?
Big Paw – o encantador de bebês.
Rosie e eu voltamos para casa e, quando destranco a porta da frente,
coloco a cadeirinha do carro de Rosie no chão para acender as luzes.
— Oh, meu Deus! — Eu engasgo quando a sala se enche de luz. No
meio da sala está um Garrett ferido e machucado. — Garrett, o que
aconteceu com você? — Corro para o lado dele para ajudá-lo a se levantar,
mas paro no momento em que ouço outra voz.
— Ele não me escutou – isso foi o que aconteceu com ele.
Eu me viro para ver Charlie parado ao lado da cadeirinha de Rosie.
Todos os pelos do meu corpo se arrepiam quando ele se abaixa e
ergue Rosie em seus braços.
— Coloque-a no chão, — ordeno, correndo em direção a ele, e ele
solta uma risada sinistra.
— O que te faz pensar que pode me dizer o que fazer? — Ele
assobia. — Depois da merda que você fez, me prendendo por todo esse
tempo, fazendo meu negócio cair, você acha que pode me dar ordens?
Tento controlar meu tremor, mas vê-lo segurar Rosie envia uma
onda de pânico por mim.
— Parece que você construiu uma boa vida aqui, — Charlie
comenta. — Estamos vivendo um sonho, não é? Ouvi rumores de que você
namora o astro do rock de Eres também. Isso deve ser bom.
— O que você quer? — Pergunto, querendo que ele vá direto ao
ponto. Rosie começa a chorar e Charlie senta-se no sofá com ela e começa
a balançá-la no seu joelho.
— O que você acha que eu quero? O que é meu. Perdi milhares de
dólares por causa daquela proeza que você fez. Perdi clientes. Tenho os
superiores na minha cola por sua causa. Se não fosse por sua mãe, eu
ainda estaria preso. Então estou aqui para cobrar. Cada centavo que você
tem é meu. Cada cheque de pagamento que você recebe deste trabalho
idiota vem para mim. E o final feliz que acha que tem? A história de amor
com sua estrela do rock? Isso chega ao fim.
— Deixe Ian fora disso.
— Oh, de jeito nenhum. Veja, minha outra metade está presa por
sua causa pelos próximos dois anos. Por que você deveria conseguir uma
história de amor se eu não tenho a minha?
— Você não ama minha mãe, — grito. — Você nunca amou. Amava
controlá-la, assim como ama controlar tudo. Quero dizer, olhe o que você
fez ao seu sobrinho!
— Ele me traiu! — Charlie grita, levantando-se e gesticulando em
direção a Garrett com uma mão e segurando minha irmã gritando com a
outra. — O idiota me traiu quando ajudou você a conseguir Rosie, e ele vai
pagar por isso todos os dias até provar que posso confiar nele novamente.
— Ele fez a coisa certa.
— Foda-se a coisa certa. Pareço alguém que se preocupa com a coisa
certa? —Argumenta. Ele respira fundo e se senta novamente. —
Desculpe. Às vezes, meu temperamento toma o melhor de mim. Fiz uma
aula de meditação enquanto estava preso – estou trabalhando em minhas
técnicas de respiração. Enfim, como eu estava dizendo. Você termina tudo
com aquele seu namorado.
— Por que você está sendo tão cruel?
Ele dá uma risadinha. — Porque eu acho que você está certa. Acho
que gosto de controlar as coisas.
— Não vou fazer isso, — eu digo. — Não vou terminar com ele.
— Isso é ruim. Você sabe o que mais seria muito ruim? — Ele
pergunta. — Se este belo rancho pegasse fogo. Ou pior ainda, se algo
acontecer com essa sua irmãzinha.
Sei que ele diz essas coisas como ameaças, mas também sei que as
ameaças de Charlie normalmente terminam como promessas.
— Então aqui está o que vamos fazer. Você vai me dar dinheiro a
cada duas semanas, vai terminar com seu superstar e levar uma vida
miserável, porque não merece ser feliz. Você entendeu?
— Basta dizer sim, Hazel, — Garrett engasga.
— Que tal você aprender a calar a boca, — Charlie grita para seu
sobrinho. — Os adultos estão tendo uma reunião. Hazel, o que você me
diz? Nós temos um acordo?
Balanço a cabeça lentamente enquanto as lágrimas escorrem dos
meus olhos.
Ele se aproxima de mim e coloca um dedo sob meu queixo. Levanta
minha cabeça até que eu fixe os olhos nos dele. — Eu preciso de um
acordo verbal, querida.
— Sim, nós temos um acordo, — eu digo, tremendo com seu toque.
— Agora, pegue aquele seu celular e ligue para o cara e diga a ele
que acabou.
— O quê? Não posso… — Começo a discutir, mas o fogo nos olhos de
Charlie é o suficiente para me aterrorizar. Tiro meu telefone do bolso de
trás e disco o número de Ian.
Por favor, não atenda; por favor, não atenda; por favor não…
— Alô?
— Oi, Ian, sou eu, — eu digo com uma voz trêmula.
— Oi. Você chegou em casa?
— Sim, cheguei bem. Só há uma coisa… Eu, hum, eu… eu… —
Minhas palavras atrapalham-se contra minha língua enquanto cubro
minha boca com a mão para esconder minhas lágrimas.
— Haze? O que foi? — Ian pergunta, cada vez mais preocupado.
— Cuspa essa merda, — Charlie ordena em um tom baixo.
— Eu… foi ótimo ver você, Ian. Verdadeiramente, foi, mas depois de
ver o mundo que você está criando lá fora, eu percebo que não há mais
muito espaço para mim nele.
— Espere… o que?
— Só acho que é melhor terminarmos agora, antes que sua carreira
decole. Eu sinto muito. Simplesmente não posso mais ficar com você. Não
posso estar neste relacionamento.
— Do que diabos você está falando, Hazel? Nós somos bons ‘pra’
caralho. Fizemos amor esta manhã e estava tudo bem. Você saiu e disse
que me amava. Diga-me o que está acontecendo. O que realmente está
acontecendo?
— Nada. Eu apenas tive muito tempo para refletir no voo para casa e
está claro que estamos indo por caminhos diferentes. Minha vida está aqui
no rancho, e a sua está lá fora, no mundo. É melhor terminarmos agora.
— Você não pode dizer isso, — Ian começa.
— Desligue, — Charlie diz, me empurrando no braço, me fazendo
tremer ainda mais.
Eu não posso, murmuro.
— Desligue agora, ou eu saio com sua irmã, — ele ameaça.
Com o coração dolorido, desligo o telefone enquanto Ian ainda está
implorando por respostas para a minha repentina mudança de opinião.
— Boa menina, — Charlie sussurra, esfregando a mão no meu
pescoço, enviando arrepios pela minha espinha. — Aqui. Pegue essa vadia,
— ele diz, entregando Rosie para mim. — Foi bom fazer negócios com
você. Garrett, levante sua bunda e vamos embora.
Garrett faz o que seu tio diz e cambaleia em direção à porta da
frente.
Charlie se vira para olhar para mim e então olha para o tapete. —
Meia xícara de água morna misturada com uma colher de sopa de
amônia. Isso vai tirar a mancha de sangue do seu belo tapete.
Então ele sai, deixando-me lá soluçando contra Rosie. Nossas
lágrimas se misturam enquanto ela uiva de tristeza.
Meu telefone continua tocando com o nome de Ian aparecendo na
tela, mas não ouso atender. Mesmo que tudo que eu queira seja ouvir sua
voz.
Três dias depois, Ian está de volta a Eres, parado na minha frente
com confusão e tristeza nos olhos. — Max disse algo para você? Ele tentou
afastar você? — Ele pergunta enquanto estamos perto do galpão tarde
naquela noite.
Oh, Ian…
Por favor, não torne isso mais difícil do que precisa ser.
— Não é isso, — eu falo. — Simplesmente sinto que não somos
certos um para o outro.
— Ninguém é mais adequado um para o outro, Haze, do que
nós. Mas estou tão confuso. Eu sinto que você está falando como se não
acreditasse mais na gente. Como se você não achasse que podemos
resolver isso.
Fecho meus olhos e balanço minha cabeça. — Isso é porque eu não
acho que podemos. Sinto muito, Ian. Minha vida mudou e preciso
aprender a aceitar a forma como está se transformando. Estou chegando à
conclusão de que minha responsabilidade na vida agora é cuidar da minha
irmã. E estou chegando a um acordo de que você e eu não podemos
estar…
— Não, — ele implora, balançando a cabeça. — Não diga isso.
— Ian. Não podemos mais fazer isso. Eu não posso ser sua e você
não pode ser meu.
— Você está fugindo antes mesmo de nos dar uma chance justa. Sei
que as coisas têm estado loucas ultimamente e sei que ainda não
encontramos nosso equilíbrio, mas só precisamos de mais tempo.
— Você está certo. Precisamos de tempo para deixar de lado a ideia
de nós. Você é uma pessoa incrível, Ian Parker, e tem tantas coisas
incríveis vindo em sua direção. Mas eu me recuso a ser a garota que
atrapalha seus sonhos. Sei que você diz que eu não vou, mas eu sei que
vou. Especialmente com Rosie. Então, estou terminando isso. Estou
terminando com você porque me importo muito com você para continuar.
— Você prometeu, — diz ele, balançando a cabeça em descrença. —
Você prometeu que não iria embora. Você prometeu que não me
abandonaria.
Aquilo parece uma faca na minha alma. Sei de suas lutas. Sei como
ele teme ser deixado para trás, mas que escolha tenho? Não posso estar
com ele, porque não só coloco o rancho de sua família em perigo, mas isso
deixará Rosie em perigo e eu não posso deixar nada acontecer a ela. Não
posso deixá-la se machucar porque eu egoisticamente quero estar com Ian.
Não respondo ao seu comentário, e essa é a coisa mais difícil que já
tive que fazer, porque não estou tentando abandoná-lo. Se eu tivesse uma
palavra a dizer no assunto, facilmente o amaria para sempre.
Ele abaixa a cabeça. — Eu quero insistir com você, mas parece que
você já se decidiu.
— Sim, e sinto muito. É melhor assim. Eu sei que você não pode ver
isso agora, mas realmente é melhor. Sinto muito por magoar você, mas é
melhor fazer isso agora do que anos depois.
Lágrimas inundam meus olhos, mas faço o meu melhor para afastálas. Não quero chorar, porque tenho certeza de que ele gostaria de enxugar
minhas lágrimas.
Eu vejo o momento em que acontece, o momento em que sua casca
começa a endurecer. Seus olhos brilham com o mesmo ódio que ele tinha
por mim quando nos conhecemos. Sua mandíbula cerra e ele enfia as
mãos nos bolsos da calça jeans…
— Ian… Sinto muito, por favor, não…
Me odeie.
Por favor, não me odeie.
— Fique com a maldita casa. Fique com o emprego. Fique com tudo,
Hazel. Mas não quero ouvir falar de você novamente.
Ele não diz outra palavra. Quando começa a se afastar, minha
mente gira quando o pânico começa a se instalar em meu estômago. Ele
está indo embora, sofrendo, e está construindo sua parede novamente –
tudo por minha causa. — Ian, espere.
Ele olha para trás em minha direção, e um lampejo de esperança
passa por seus olhos.
Engulo em seco. — Talvez ainda possamos ser amigos?
— Amigos? — A esperança some em sua íris e seu olhar se torna frio
como pedra. — Foda-se você e sua amizade, Hazel Stone.
35
IAN
Talvez ainda possamos ser amigos.
Ela está brincando? Essas palavras parecem o maior tapa na cara
depois de tudo que passamos.
Ela nem mesmo tentou encontrar um meio-termo para o nosso
amor. Não me deu a chance de mostrar como as coisas poderiam ter
funcionado. Ela simplesmente cortou o cordão e saiu sem nem
tentar. Tinha se passado semanas desde que Hazel desistiu de nós, mas
ela estendeu a mão e continuou dizendo que esperava que pudéssemos ser
amigos como antes.
Sim, bom ‘pra’ caralho.
Não sei mais ser amigo dela e não quero ser seu amigo. Quero ser
dela para sempre.
Pelo menos, eu pensei que sim quando imaginei que sabia quem
diabos ela é. Acontece que não vale a pena correr atrás dela. Ela me
abandonou, porque é isso que as pessoas fazem. Eles vão embora.
Sento-me no aeroporto, esperando para embarcar no avião para o
nosso próximo show. Fico olhando o Instagram de Hazel, onde ela tem
fotos dela e Rosie sorrindo de orelha a orelha. Não sei por que continuo
percorrendo as fotos, olhando para todas elas como se isso não estivesse
me matando a cada segundo, mas eu não consigo me conter.
Ela parece feliz.
Como ela parece tão feliz depois de arrancar a porra do meu coração
e colocá-lo no chão?
Não entendo. Pensei que tínhamos algo de concreto, algo que nós
dois ansiamos neste mundo – amor verdadeiro.
Mas talvez eu estivesse sonhando. Talvez não houvesse nada de
verdadeiro sobre nós. Talvez fôssemos apenas uma história de amor
temporária.
Eu deveria saber. Todas as coisas boas têm um jeito de partir.
— Você está bem, cara? — James pergunta enquanto me cutuca no
braço.
Desligo meu telefone e coloco no bolso. — Sim. Eu estou.
Ele franze a testa, sabendo que não deve acreditar em mim. — Sabe,
não acho que Hazel fez o que fez por não ter sentimentos por você. Acho
que ela estava honestamente tentando te proteger.
Eu bufo. — Proteger-me de quê?
— De você desistir do seu maior sonho para tê-la em sua vida.
— Eu não teria desistido do meu sonho. Tenho feito isso, não
tenho? Eu tenho aparecido e me apresentado e colocado cem por cento
nessa música, James. Então foda-se essa desculpa. Eu não estou
acreditando. Eu até a convidei para vir com Rosie e se juntar a
nós. Organizei minha vida para trazê-las para o nosso mundo.
— Sim, eu sei, mas você não pode acreditar que é o melhor. Na
verdade, não.
— O que você quer dizer?
James faz uma careta e dá um tapinha no meu ombro. — Ian, Rosie
tem apenas quatro meses, e Hazel agora está conseguindo controlar algum
tipo de normalidade. Você realmente acha que seria sábio trazer uma
criança tão pequena quanto Rosie para a estrada? Que tipo de vida isso
seria para ela? Para Hazel? Você está pedindo a elas que desenraizem seu
mundo para entrar no seu, e isso não é justo.
Odeio que ele esteja certo e odeio estar sendo tão egoísta, mas não
me importo. Eu as quero lá, comigo, para que Hazel e eu possamos tentar
ver o que poderíamos ter nos tornado. É estúpido; eu sei. Dificilmente
poderia me imaginar estando na estrada por meses, viajando de cidade em
cidade, de hotel em hotel, sem senso de normalidade. É confuso para mim
até mesmo oferecer tal ideia para Hazel. Mas ainda… Eu tentei.
— Merda, — murmuro, esfregando as mãos no rosto.
— Eu sei que é uma merda, cara, e eu sei que você realmente se
preocupa com ela, da mesma forma que ela se preocupa com você, mas a
melhor coisa que você poderia fazer por si mesmo é lidar com as próximas
semanas e lembrar por que começamos tudo isso. É tudo sobre a
música. Sempre foi sobre a música.
Sim, isso é verdade. Tudo girava em torno da música antes de eu
saber que havia mais no mundo.
Dou a ele um meio sorriso. — Vou ficar bem. Não se preocupe
comigo. Só tenho que passar pelas primeiras semanas dessa mudança, e
estarei de volta ao meu estado normal novamente.
Mentira.
Mentira, mentira, mentira.
Ele me dá outro tapinha nas costas antes de sair para falar com os
outros caras. Provavelmente para informá-los de que eu não estou pirando
completamente e que posso me comprometer com os próximos meses de
nossas vidas. Eu também estarei comprometido. Até para sempre ainda
soa verdadeiro quando se trata de meus companheiros de banda, embora
eu tenha escorregado um pouco nos últimos tempos.
Eles estão explodindo dia após dia, e o que tenho feito? Dado a eles
motivos para duvidar de nossa chance de fama porque meu coração dói
por algo que não é mais meu?
As paredes que eu trabalhei tão duro para derrubar nos últimos
meses estão começando a se erguer novamente conforme a realidade se
estabelece – eu nunca soube quem realmente é Hazel Stone.
Eu tive que desligar. Desligar meus sentimentos, desligar meu
coração, desligar minhas emoções.
Paro de segui-la nas redes sociais. Excluo todas as nossas
mensagens de texto anteriores. Eu a deixo ir o máximo que posso e então
embarco no avião e compro uísque.
Eu me orgulho de poder investir totalmente em nossas
performances, não importando o quanto meu coração esteja
pesado. Torna-se mais fácil quando estamos sob aquelas luzes brilhantes e
uma multidão esgotada cantando nossas letras de volta para nós.
Todos os dias, agradeço a Deus por nossos fãs e por ter a
oportunidade de conhecê-los. Para cantar para eles. Há tantas partes
difíceis no trabalho, tantas coisas que eu odeio e desejo não ter que
participar. Conhecer e cumprimentar os fãs não é uma dessas coisas. Na
verdade, é o ponto alto da minha carreira. É por causa dessas pessoas que
posso viver a vida que vivo. É devido ao seu amor e apoio que posso fazer o
que amo fazer: criar música.
As vozes crescem mais e mais a cada show, o que parece surreal
para mim. Tudo está acontecendo em alta velocidade. Eu me pergunto se é
assim que se sentem as boy bands. Um dia, eles estão se apresentando em
escolas de ensino médio e, no outro, bum! Milhões de fãs.
Os fãs vieram em massa, centenas de pessoas gastando muito
dinheiro para me conhecer e minha gangue pelo tempo que levo para
rabiscar meu nome e tirar uma fotografia. Não há muito tempo para
conversa, mas há lágrimas.
O fato de que as pessoas choram por mim e por meus companheiros
de banda me deixa perplexo.
Tudo parece um sonho. Os dias se transformam em noites e as
semanas se transformam em meses.
E ainda, de vez em quando, Hazel Stone passa pela minha
cabeça. Tento afastá-la dos meus pensamentos, mas é quase impossível
fazer isso. Quando ligo para casa para conversar com vovó e Big Paw, leva
tudo de mim para não perguntar como Hazel está. Às vezes, ouço Rosie
chorando ao fundo e quero correr para casa para abraçá-la.
Tão estúpido, penso comigo mesmo. Não é nem mesmo sua filha, e
você sente falta dela.
Sempre que Hazel passa por minha cabeça, eu a deixo ficar lá por
um tempo antes de continuar e me concentrar novamente na música. Max
Fodido Rider me disse que eu só tenho que encontrar uma modelo gostosa
para foder e tirar Hazel da minha cabeça, mas é a última coisa que eu
quero. Felizmente, Marcus está mais do que disposto a tirar as modelos de
minhas mãos.
Não vim nessa turnê por sexo, drogas e rock and roll. Eu vim por um
único motivo: para compartilhar minha música com as pessoas, e é
exatamente isso que estamos fazendo.
Ainda assim, por incrível que pareça, mesmo estando cercado por
milhares de fãs gritando meu nome, nunca na minha vida eu me senti tão
sozinho.
Se você tivesse me perguntado anos atrás se eu sentiria falta de
Eres, eu teria rido da sua cara. Mesmo assim, há dias em que eu prefiro
estar no chiqueiro, puxando feno e olhando para Hazel Stone enquanto ela
me conta suas confissões.
Não importa o quanto tento desligar meu coração, eu não consigo. É
como se, depois que Hazel o despertou, eu não pudesse desligá-lo. E
dói. Alguns dias dói ‘pra’ caralho, tudo que quero fazer é ficar na cama e
dormir.
Como não posso fazer isso, uso uísque para enfrentar.
Bebo mais do que devo todos os dias para evitar que meu coração se
parta. Os caras mencionam isso, quando eu apareço com óculos escuros
no meet and greets43, mas eu não tenho energia para me explicar a
eles. Estou fodido e preciso do uísque para me manter.
Nunca perdi um show.
Isso deve ser tudo o que eles precisam se preocupar – eu sempre
apareço.
Três meses se passaram desde que Hazel e eu terminamos o
relacionamento. A banda e eu estamos voltando oficialmente para Los
Angeles para terminar as faixas do nosso primeiro álbum. Depois que o
álbum for lançado, sei que nossas vidas só ficarão mais ocupadas.
Uma noite depois de nosso último encontro antes de voltar para LA,
James me puxa para o lado. Ele deve ter sentido o cheiro de uísque em
meu hálito, da mesma forma que sentiu todas as noites anteriores.
Ele baixa as sobrancelhas. — Seja honesto, Ian. Você está feliz?
Eu rio. — O que a felicidade tem a ver com qualquer coisa? Estamos
ficando famosos, — comento sarcasticamente. Ele vai discutir minhas
palavras, mas eu o impeço. Afinal, o show deve continuar.
Fico surpreso como pode parecer que todos os seus sonhos haviam
se tornado realidade, mas ainda assim, não é o que você pensava que
seria.
Eu tenho tido pesadelos. Algumas envolvendo meus pais, outras
envolvendo Hazel. Não me lembro de todos os pedaços deles, mas ao final
de cada sonho, caio no que parece um buraco negro sem fim. Eu grito por
socorro, e todos ficam ao meu redor, me observando em espiral, me vendo
cair, e ainda assim ninguém estende a mão para eu segurar. Em vez disso,
continuo em queda livre, sem esperança de encontrar o caminho de volta
ao solo firme.
43 Eventos onde os fãs encontram seus ídolos famosos.
Quando eu acordo, seno na escuridão do meu quarto e volto a
dormir, esperando que os sonhos não voltem.
36
HAZEL
— James disse que Ian tem estado miserável, — Leah menciona
durante a noite das meninas, que agora é um evento semanal. Estamos
devorando Netflix, fazendo máscaras e comendo comida ruim enquanto
Rosie rola em seu cercadinho. Leah se tornou uma melhor amiga para
mim, e eu não posso agradecer o suficiente por intervir para ajudar a
cuidar de Rosie quando tenho exames online para concluir.
Meu peito aperta quando sento no sofá, comendo pipoca. A última
coisa que quero ouvir é que Ian está lutando com nossa separação. Eu
tinha uma estranha esperança de que ele fosse capaz de deixar de pensar
em mim devido à sua carreira estar decolando.
— Gostaria que você tivesse trazido uma informação melhor, — eu
murmuro. A culpa está me comendo viva ultimamente, junto com a
solidão. Sinto falta de Ian mais do que palavras poderiam expressar. Meu
sono também foi afetado por tudo o que acontecera nas últimas
semanas. Meus pesadelos voltaram, só que desta vez são sonhos com
Charlie machucando Rosie – meu pior medo no mundo.
A parte mais difícil sobre os pesadelos? Quando eu acordo, não
posso rolar e ter Ian me segurando. Não consigo pegar meu telefone e
encontrar calma com sua voz. Eu não posso ir até ele para me confortar.
Leah franze a testa para mim quando sua máscara de argila começa
a endurecer. — Eu gostaria de ter uma informação melhor também, mas,
na verdade, James está muito preocupado. Ele disse que Ian tem bebido
muito mais também. Os caras pensaram que a música e os shows teriam
ajudado Ian, mas seu coração não está mais nisso. Você sabe por que eu
acho isso?
— Por quê?
Ela estende o braço e coloca as mãos contra as minhas. — Porque
você é a musa dele, e ele não tem mais isso. Ele sente sua falta, Hazel.
Abaixo minha cabeça enquanto as lágrimas enchem meus olhos. —
Eu sei.
— E você sente falta dele. Posso ver isso. Você também não tem sido
a mesma e, para ser honesta, não entendo por que terminou tudo com
ele. Vocês dois eram tão perfeitos quanto Big Paw e Holly – feitos para
ficarem juntos. Eu gostaria de ter o que você e Ian tiveram. É por causa da
distância? Ou, tipo, aquelas mulheres andando com a banda? Porque
estão nisso apenas por influência.
— Não sei o que é influência, — comento.
Ela ri. — Claro que não, minha doce Hazel. Tudo o que estou
dizendo é que Ian nunca trairia você ficando com outra mulher, se esses
são seus medos.
— Eu queria que fosse isso, mas é muito mais complicado do que
isso, Leah. Há muito mais risco por estar com Ian que não estou disposta
a enfrentar.
Seus olhos se estreitam e um olhar perplexo pousa em seu rosto. —
Isso soa realmente uma novela da sua parte, — ela brinca
nervosamente. — O que no mundo poderia estar em risco com você e Ian
sendo um casal?
Engulo em seco e balanço minha cabeça enquanto as lágrimas
enchem meus olhos. Só de pensar nas ameaças de Charlie me emociono. A
maneira como ele falou sobre causar problemas no rancho e, pior, para
Rosie me apavora.
— Hazel, — Leah suspira, seus olhos lacrimejando só de me ver ficar
emocionada. — O que foi?
— Eu… Eu não deveria contar a ninguém. Quanto mais pessoas
souberem, maior será o risco de problemas.
— Você tem minha palavra de que não contarei a ninguém, eu
prometo. Além disso, o que quer que esteja te devorando não deve ficar
apenas em seus ombros. Hazel, você faz muito para ajudar os outros. Você
tem literalmente dezenove anos e está criando sua irmã recémnascida. Você merece ajuda. Deixe-me ajudá-la. Deixe-me tirar um pouco
do peso de seus ombros.
Respiro fundo enquanto as lágrimas começam a rolar por meu
rosto. — É Charlie. Ele está de volta à cidade.
Ela ergue uma sobrancelha. — Charlie? Quem é Charlie?
Isso desencadeia um mar de informações para acompanhar Leah na
selva que é minha vida. Quanto mais detalhes dou a ela, mais baixo seu
queixo cai de horror e choque completo. Quando termino, ela se jogou
contra o sofá, sem acreditar.
— Santo Deus. Sua vida é uma novela! — Exclama ela, totalmente
angustiada. — Oh, meu Deus, Hazel. E você tem lidado com tudo isso
sozinha?
— Eu não tinha ninguém em quem pudesse contar. Eu tive que fazer
isso sozinha; era minha única escolha.
— Não, — ela discorda, balançando a cabeça. — Talvez no passado
você tivesse que lidar com as coisas sozinha, mas você não precisa mais
fazer isso. Você tem uma família agora. Pessoas em quem você pode contar
para obter ajuda ou pelo menos conforto.
Dou a ela um meio sorriso enquanto enxugo as lágrimas que caem
dos meus olhos. — Obrigada, Leah.
— Claro. Tudo faz sentido agora também, porque você afastou
Ian. Se isso te faz sentir melhor, eu teria feito exatamente a mesma coisa –
especialmente se aquele psicopata ameaçou Rosie. Você fez a escolha
certa. Mesmo sabendo que isso te destrói.
— Realmente não importa, Leah. Tudo o que posso fazer é pensar em
Ian e me odiar por magoá-lo. Eu sei que ele teve problemas de abandono, e
isso estar acontecendo logo depois que ele cruzou com seus pais é ainda
pior. Eu gostaria de poder explicar as coisas para ele, mas isso é muito
arriscado. Só espero que ele seja capaz de seguir em frente e encontrar sua
felicidade novamente.
— Tenho certeza que os caras farão questão de cuidar dele. Não
tenho dúvidas sobre isso. Mas, no que diz respeito a você, estou aqui para
garantir que você encontre a sua felicidade novamente. É para isso que os
amigos servem.
Agradeço quando ela se inclina e me dá o abraço mais forte da
história, e me promete que tudo ficará bem algum dia.
Eu gostaria de poder acreditar que isso é verdade, mas saber que
Charlie está fora da prisão é o suficiente para me deixar no limite. E se ele
explodir e decidir prejudicar Rosie e eu, simplesmente porque
pode? Charlie é um louco cujas ações nunca fizeram sentido algum. Pelo
menos ele não poderá chegar até Ian e prejudicá-lo. Há algum conforto em
saber disso.
Mais tarde naquela noite, acordo de um pesadelo devido ao choro de
Rosie. Eu a pego em meus braços e tento acalmá-la de volta para
dormir; então a levo para fora na escuridão da noite e a embalo na cadeira
da varanda. Olho para as estrelas cintilando no céu e faço alguns desejos.
Em primeiro lugar, desejo que minha irmã esteja a salvo de qualquer
perigo. Se alguma coisa acontecer com aquela garotinha, a garotinha que
teve a chance de ser adotada por uma família que não colocaria sua vida
em perigo, eu nunca me perdoarei.
Então eu desejo a felicidade de Ian, rezando para que de alguma
forma, ele encontre outra musa. Desejo que ele se afaste de mim e que seu
coração machucado sare com o tempo. Desejo que ele não desista do amor
e se feche mais uma vez. Ele trabalhou tão duro para tocar em seus
sentimentos, e eu odiarei que ele perca essa conexão consigo mesmo
novamente.
Por último, faço um desejo para mim mesma. Desejo a capacidade
de permanecer forte mesmo durante os momentos mais sombrios e que
meu coração continue batendo todos os dias, mesmo que cada batida doa
mais e mais conforme o tempo passa sem Ian ao meu lado.
Se esses desejos puderem se tornar realidade, eu nunca terei que
fazer pedidos para outra estrela no céu.
37
IAN
— Você está brincando comigo? — Eric deixa escapar durante nosso
encontro com a gravadora. Todos nós ficamos sentados em total descrença
enquanto conversamos com a equipe responsável pelo lançamento do
nosso primeiro álbum. — Como é que algo assim pode acontecer? Quero
dizer, você tem uma equipe para garantir que isso não aconteça,
certo? Quero dizer, você é a Mindset Records, pelo amor de Deus. Como
isso aconteceu?
Eric está com raiva, o que não acontece com frequência, mas ele tem
todos os motivos para estar puto.
Inferno, todos nós estamos.
Nosso primeiro álbum – o álbum no qual derramamos nosso sangue,
suor e lágrimas – vazou pela internet.
Max se senta à mesa, checando seus dois telefones celulares
repetidamente, parecendo tentar fazer o controle de danos na situação em
questão. Donnie Schmitz, o chefe da Mindset Records, senta à cabeceira
da mesa, com as mãos cruzadas. — Seremos honestos; este é um grande
erro de nossa parte. O pior é que ainda faltam dois meses para o
lançamento do álbum. O que significa que temos que fazer algumas
escolhas. Não podemos lançar um álbum que já vazou, então devemos
mudar. Precisamos de novo material e precisamos colocá-los no estúdio de
gravação o mais rápido possível.
— O quê? — Eu bufo. — Você está brincando comigo? Levamos
meses para acertar essas músicas! Não podemos simplesmente lançar um
novo álbum do nada.
— Agora, eu sei como isso pode parecer assustador, — Donnie
começa.
— Acho que a palavra que você está procurando é impossível, —
Marcus corrige com uma careta.
Donnie continua: — Mas temos uma lista de faixas que já estão
totalmente desenvolvidas. Tudo que vocês precisam fazer é entrar no
estúdio e fazer sua mágica.
— O que você quer dizer com faixas totalmente desenvolvidas? —
Pergunta James.
— Chamamos alguns dos melhores compositores da indústria, —
interrompe Max, acenando com a cabeça. — É a melhor notícia. Warren
Lee escreveu as faixas.
Levanto uma sobrancelha. — Warren Lee?
— Sim. — Max concorda. Warren é um dos melhores compositores
da indústria, senão o melhor. Trabalhar com ele significa Grammys44 e
dinheiro. Tudo o que ele toca vira discos de platina. Mas o que usar suas
músicas significa para nós?
Não é autêntico. Não é nosso.
— Nós criamos nossa própria música, — diz Marcus, com as mãos
entrelaçadas e um olhar determinado no rosto.
— Sim, mas não há tempo para criar sua própria música. Você
mesmo disse. Demorou uma eternidade para criar essas faixas. Portanto,
eliminamos a parte mais difícil do trabalho. Agora, basta entrar no estúdio
e fazer o que mandamos.
— Não somos robôs. — Eric suspira, tirando os óculos e apertando o
nariz. — Nós não trabalhamos assim.
44 Grammy Award é uma cerimônia de premiação da “Academia de Gravação” dos Estados
Unidos, que presenteia anualmente os profissionais da indústria musical com o prêmio
Grammy, em reconhecimento à excelência do trabalho e conquistas na arte de produção
musical e, provendo suporte à comunidade da indústria musical.
— Sim, não dissemos isso desde o primeiro dia, Max? Queríamos ser
nós – os The Wreckage. Não uma banda manufaturada de merda que não
tem voz própria, — acrescenta James.
Fico sentado em silêncio, sem saber o que dizer, porque um: estou
um pouco bêbado. E dois: eu não consigo entender o fato de que todos
aqueles meses de nosso trabalho se foram. Tudo o que sacrificamos para
criar aquele álbum não significa nada.
O tempo todo eu poderia estar de volta a Eres com Hazel,
aumentando nossa conexão…
O quê?
Não.
O uísque deveria abafar meus pensamentos sobre Hazel, não os
tornar mais pesados.
Mas ainda assim, o tempo perdido criando músicas que acabaram
sendo inúteis dói.
Porra. Qual é o objetivo de tudo isso?
— Isso foi antes desse vazamento acontecer. Olha, pessoal, também
estou chateado. Vocês acham que eu queria que isso acontecesse? Claro
que não. Mas é aqui que estamos. Este é o lugar em que estamos sentados
e podemos reclamar e reclamar disso o dia todo, ou podemos começar a
trabalhar, porra. Além disso, Warren Lee faz superestrelas, e vocês serão
superestrelas se concordarem com tudo.
O clima de todo o ambiente é muito desanimador. Meus
companheiros de banda parecem ter sido atingidos por um ônibus. Eric
continua falando sem parar sobre como ele não entende como algo tão
importante poderia acontecer com o sistema de segurança da gravadora.
Como um álbum inteiro vazava?
— E se nos recusarmos a usar as canções de Warren? — Pergunto.
Donnie aperta os lábios e me lança um olhar severo. — Ouça, você
assinou um contrato com a Mindset Records, e sabemos que esse
problema não foi culpa sua, mas, para ser franco, você nos deve música. O
tempo está passando e não quero ter que colocar o departamento jurídico
sobre isso.
Claro.
Estamos sendo encurralados, forçados a criar algo que não é
autêntico, algo que não é nosso.
É literalmente o pior pesadelo de um artista.
Por que parece que o mundo está desmoronando ao nosso redor? Por
que parece que nosso sonho está lentamente, mas certamente mudando
para algo que não é mais nosso para segurar?
Estamos nas mãos de uma gravadora que tem o poder de controlar
todos os nossos movimentos com ameaças de processos – processos que
tenho certeza que perderíamos em um piscar de olhos.
Eu limpo minha garganta. — Podemos conversar um minuto com a
banda a sós?
— Certo. Mas não perca muito tempo tentando descobrir uma
maneira de contornar isso, — Donnie menciona enquanto se levanta, junto
com os pequenos roedores que o seguem. — Não temos tempo para
artistas mimados.
Artistas Mimados.
Eu não sabia que faz de alguém uma diva querer falar suas próprias
verdades.
Todos eles deixaram a sala enquanto os rapazes e eu nos sentamos à
mesa.
Os caras e Max.
Todos nós olhamos em sua direção com confusão. Ele olha em volta
com uma sobrancelha erguida.
— O quê?
— Esperávamos conversar sozinhos, — comenta Marcus.
— Eu sou seu empresário. Preciso estar aqui nessas reuniões.
James balança a cabeça. — Esta é mais uma conversa só da
banda. Iremos notificá-lo assim que nos reunirmos.
Max suspira e passa a mão na boca. Ele murmura algo baixinho e
fico feliz por não ter ouvido. Provavelmente estava nos chamando de
pirralhos mimados ou algo assim.
Ele pega uma pasta e a desliza em nossa direção. — Estas são
algumas das canções de Warren para vocês. Olhem para elas. Estes têm
Grammys escritos nelas. Não sejam estúpidos sobre isso, rapazes. Façam
a escolha certa.
Com isso, ele sai, fechando a porta atrás de si. No momento em que
a porta se fecha, Marcus se levanta rapidamente. — Você está brincando
comigo? — Exclama, agitando as mãos como um louco.
— Não há como fazermos isso, — diz Eric, folheando as músicas. —
Quer dizer, tenho certeza que essas faixas de Warren são ótimas, mas isso
não ‘é’ nós. E construímos todo o nosso aspecto social em torno de sermos
nós. As pessoas não querem músicas de Warren; eles querem nossas
músicas.
— É impossível criar um álbum totalmente novo nesse período de
tempo. Não podemos fazer isso, — afirma Marcus, parecendo derrotado. —
Além disso, tenho certeza de que eles vão nos foder com taxas legais e
acabaremos pior do que éramos antes de deixar Eres.
— Podemos tentar, — oferece James. — Podemos tentar fazer nossa
própria música nos próximos meses. Eu sei que vai ser difícil ‘pra’ caralho,
mas podemos trabalhar ‘pra’ caramba para que isso aconteça.
Os três começam a ir e vir – discutindo sobre o que funcionaria e o
que não funcionaria. Quanto mais eles discutem, mais meu peito parece
estar em chamas.
Pego as páginas sobre a mesa e começo a folhear as canções que
Warren Lee escreveu.
Eu me perco enquanto leio as letras. Letras que não significam nada
para mim. Letras que são cortantes e convencionais. Letras que pertencem
a outra pessoa.
E serei forçado a cantar essas canções.
— Vamos pegar as músicas de Warren, — eu falo, me forçando a
levantar.
— O quê? Não. Cara, não podemos fazer isso. Não podemos nos
vender assim, — diz James.
— Ele está certo, Ian. Eu sei que estamos em uma situação difícil,
mas não podemos simplesmente jogar fora tudo pelo que trabalhamos, —
Marcus concorda.
— Temos um tempo limitado e não podemos perder tempo tentando
criar novas músicas, — explico.
— Mas… — Eric suspira, mas não conclui seu pensamento.
Provavelmente porque ele sabe que estou certo.
— Não posso deixar que todos nós entremos em grandes dívidas e
processos judiciais por causa disso, rapazes. Não podemos voltar
atrás. Temos que seguir em frente.
— Mesmo que isso signifique vender nossas almas para a música
mainstream45? — Marcus pergunta.
— Sejamos honestos; fizemos isso no momento em que assinamos os
contratos. Se quiséssemos permanecer pequenos, deveríamos ter ido
embora desde o início. Assinamos um contrato, galera, e não tem como
escapar. Vou dizer a Max que vamos pegar as músicas de Warren e vamos
entrar no estúdio amanhã para começar.
Saio da sala e só paro quando James vem correndo atrás de mim.
— Ian, espere. O que está acontecendo cara?
— O que você quer dizer?
Ele estreita os olhos como se estivesse olhando para um estranho. —
Você não quer nem lutar para tentar criar nossa própria música de
novo? Você não quer tentar?
45 Convencional.
— Eu tentei minha vida inteira, James. Tentei com meus pais, tentei
com Hazel e tentei com nossa música. Tentar não funciona. Podemos
muito bem fazer o que eles querem que façamos. Vai ser mais fácil assim.
— Só porque é fácil não significa que vale a pena. Você não quer
dizer o que está dizendo. Você apenas se sente derrotado, mas não pode
deixar sua dor pesar tanto sobre você.
— Não sinto dor, — falo, encolhendo os ombros. — Não sinto nada.
— Você não acha que isso é um problema? — Ele pergunta.
Talvez tenha sido.
Mas estou cansado demais para realmente me importar.
Eu me deito no escuro da noite. Mesmo quando abro meus olhos,
sinto como se ainda estivesse olhando para a escuridão de minhas
pálpebras. Há quanto tempo estou deitado nas sombras? Há quanto tempo
estou no meu atual estado de vida? Eu me desvio um pouco, e minha
parte inferior das costas dói. Meu corpo inteiro dói da cabeça aos pés,
como se eu tivesse sido atingido por um caminhão. Que diabos fiz ontem?
Corri uma maratona? Lutei com um urso pardo?
Oh sim, fiquei bêbado ‘pra’ caramba depois de deixar a reunião na
Mindset Records.
Esfrego as palmas das mãos contra os olhos, completamente
atordoado e confuso enquanto tento juntar as últimas horas da minha
vida.
Droga, Ian. Como você chegou aqui?
Não quero dizer isso de uma forma penetrada, profunda e
significativa. O que eu quero dizer é: Como diabos eu cheguei aqui? E onde,
exatamente, é aqui?
Minha cabeça lateja em uma velocidade digna de vômito enquanto
tento engolir as memórias devastadoras da reunião na Mindset Records.
Belisco a ponta do meu nariz e, antes que possa me sentar, dois
pares de braços envolvem meu corpo na escuridão.
Dois pares de braços grandes e fortes me levantam da
cama. Quando vou gritar, alguém cobre minha boca com uma das mãos e
meus olhos com a outra, enquanto os braços me carregam. Começo a
chutar e tentar gritar enquanto sou puxado para o corredor do hotel, em
pânico completo enquanto aqueles homens me carregam.
É algum fanático me sequestrando?
Alguém está atrás de mim por causa do meu dinheiro?
Mordo a mão que cobre minha boca e ouço um grito de dor. —
Cara! Que porra é essa?
— Cale a boca, sim? — O outro sibila.
— Ele me mordeu, porra!
Aquela voz… isso é… Eric?
— Eu não me importo se ele mordeu você. Não devemos conversar!
— Bem, não foi você que recebeu uma mordida!
— Eu disse para você colocar fita adesiva em sua boca!
— Não sou um psicopata maluco! Eu não iria colocar fita adesiva na
boca dele!
— É por isso que você foi mordido, seu idiota!
Eric e Marcus?
Eu reconheceria essa briga a quilômetros de distância.
— Que porra está acontecendo? — Grito agora que minha boca está
descoberta.
As mãos deixam meu corpo cair no chão do corredor, e quando
posso olhar para cima, vejo meus três companheiros de banda vestidos de
preto como a porra de ninjas. O que diabos está acontecendo?
— O que diabos está acontecendo? — Solto, esfregando a parte de
trás da minha cabeça, que bateu com força contra o chão.
— Desculpe, Ian, nós estávamos, er… nós pensamos… — James
começa, parecendo culpado ‘pra’ caralho.
— Estamos sequestrando você, cara, — Marcus exclama, sem um
segundo de culpa em seu tom.
— O quê?
Ele não explica mais nada. Apenas acena para mim. — Vamos lá
pessoal. Segurem ele.
Os companheiros de banda fazem o que Marcus disse, e antes que
eu possa gritar, Eric puxa um rolo de fita adesiva e coloca um pedaço
contra minha boca. — Desculpe, Ian. Mas isso é para o seu próprio bem.
O que diabos? Onde diabos está a segurança? Eles não me viram na
câmera sendo arrastado para fora do meu quarto de hotel por três homens
de preto? Isso tem que parecer suspeito ‘pra’ caralho.
Quando saímos, passando pela entrada dos fundos do hotel, há uma
van preta estacionada perto de nós. Eles me apressam, jogam-me lá dentro
e entram.
Marcus pula atrás do volante e começa a dirigir.
Arranco a fita adesiva da minha boca e grito: — O que diabos há de
errado com vocês, psicopatas?
— Desculpe, cara, — diz James enquanto coloca calmamente o cinto
de segurança. — Nós apenas não pensamos que você viria facilmente por
conta própria. Mas, para ser completamente claro, o sequestro de ninja foi
ideia do Marcus.
— E uma ideia muito boa, se você me perguntar! Sempre quis fazer,
tipo, um sequestro relâmpago. Para me divertir, obviamente – eu não sou
maluco. E estava indo muito bem até que Bozo, o palhaço, gritou aqui.
— Ele me mordeu, porra! — Eric exclama mais uma vez. — Acho que
estou sangrando. Ele atingiu uma veia.
— Não seja um bebê, porra, ou direi a mamãe para começar a trocar
suas fraldas de novo.
— Vai se foder, Marcus!
— Vai se foder você também, irmãozinho.
— Fodam-se vocês dois! — Eu adiciono, ainda me sentindo tonto,
confuso e bêbado ‘pra’ caralho. — O que diabos está acontecendo?
James se inclina sobre minha cintura e afivela meu cinto de
segurança como o cara carinhoso que sempre foi. Eu teria agradecido a ele
também, se ele não tivesse me sequestrado.
— Escute, Ian. Eu estive acordado a noite toda fazendo pesquisas
profundas de nerds em computadores, — explica Eric. — Não me senti
bem sabendo que nosso álbum vazou de alguma forma, mas a gravadora
não tinha ideia de como isso aconteceu. Então eu fiz um trabalho. E você
não vai acreditar no que encontrei. Foi…
— Max Fodido Rider! — Marcus deixa escapar enquanto dirige pela
estrada.
— Cara, que diabos? — Eric retruca, batendo no braço de seu
irmão. — Essa era minha grande revelação.
— Você vai se superar e continuar a história? — Marcus ordena.
Eric suspira para seu irmão e passa as mãos pelos cabelos. — Foi
Max Fodido Rider. Rastreei o hack de volta a um servidor que nos levou
direto para seu laptop. Então, para confirmação extra, porque se você
estiver indo para o geek46, você vai para o geek – eu hackeei seus e-mails e
suas redes sociais e tudo mais. Ele trocou e-mails com Donnie semanas
atrás. Eles falaram sem parar sobre como a música que criamos não era
popular o suficiente e eles precisavam fazer uma grande mudança antes
do lançamento.
O quê?
— Eles armaram para nós, cara! — Marcus diz. — Eles nos comeram
no cu e sentaram na nossa frente e nos chamaram de divas por estarmos
chateados com isso.
46 Pessoa que se interessa excessivamente por tecnologia.
— Puta merda, — murmuro, recostando-me na cadeira, finalmente
deixando o choque de ser sequestrado desaparecer quando o choque de ser
fodido na bunda começa a me atingir. — Por que eles fariam isso?
— Dinheiro, provavelmente. Tudo gira em torno de dinheiro para
essas pessoas, — diz James. — E você pode imaginar o burburinho que
estamos recebendo com nossas faixas sendo lançadas? Agora, as pessoas
estão nos observando mais de perto do que nunca para ver o que faremos
a seguir.
Faz sentido.
Estou confuso, mas faz sentido do ponto de vista maligno deles.
— Isso não muda o fato de que ainda estamos ferrados pelo contrato
que assinamos. Ainda estamos ferrados, — explico.
— Talvez, mas não vamos nos ferrar em Los Angeles. Especialmente
com você aéreo como está, — James fala.
— O que isso deveria significar? Para onde diabos estamos indo?
— Olha, Ian. Sabemos que os últimos meses foram difíceis para
você. De seus pais a Hazel e agora ao disco sendo fodido. Mas nós, como
seus melhores amigos, não podemos permitir que você perca sua luz. Você
não pode desistir de tudo.
— Eu não desisti de tudo. — Tudo desistiu de mim.
Porra. Eu mesmo me ouço? Quanto mais emo minha bunda pode
ficar?
— Sem ofensa, cara, mas você está bêbado o tempo todo, — diz
Marcus, sua voz baixa e cautelosa. — E eu não te culpo por isso, porque
eu faria a mesma coisa se eu passasse pela metade da merda que você
passou. Isso é por que permitimos isso por tanto tempo. O que aconteceu
com você foi uma merda, cara. Você recebeu uma mão péssima e jogou o
melhor que pôde, mas é hora de perceber que não precisa jogar
sozinho. Somos seus melhores amigos. Então, sequestramos você para
dar-lhe a desintoxicação de que seu corpo e alma precisam.
— Desintoxicação? E onde diabos essa desintoxicação será? – Eu
rosno, ainda irritado ‘pra’ caralho por ter sido sequestrado do meu torpor
bêbado e jogado em um maldito corredor.
— Eres, — Eric diz, olhando para mim do banco do passageiro. —
Então sente-se, relaxe e aproveite a viagem de vinte horas. Estamos
levando você para casa, Ian.
38
IAN
Os caras me forçaram a dirigir com eles por vinte horas
inteiras. Sempre que parávamos, eu não conseguia descobrir uma maneira
de fugir e voltar para Los Angeles. Eles não trouxeram meu telefone ou
minha carteira. Eu não tinha como escapar do sequestro dos meus
amigos.
Que situação estranha.
Eu não consigo parar de pensar sobre o que Eric descobriu sobre
Max Fodido Rider e Donnie Fodido Schmitz. Gostaria de ter dito que estou
surpreso, mas descobri que os sonhos não acontecem sem seus próprios
problemas. Max deu sinais de alerta desde o início, mas escolhemos
ignorá-los, porque queríamos tanto nosso sonho que doía.
Agora, ficamos em uma situação de merda porque confiamos nas
pessoas erradas. Confiávamos nas pessoas que não davam a mínima para
nós como indivíduos. Eles só se importavam com o dinheiro que estava
sendo levado para suas contas bancárias.
No momento em que paramos nas velhas estradas de terra de Eres,
sinto um nó na garganta. Os caras me levam para minha casa – correção:
agora a casa de Hazel – e antes que eu possa discutir com eles, eles me
jogam para fora do carro e vão embora.
É no meio da noite e eu não tenho vontade de entrar para ver Hazel.
Ok, isso é uma mentira. Tenho todo o desejo de fazer exatamente
isso, mas não o faço. Em vez disso, resmungo como uma criança maldita e
saio pisando duro para o galpão.
Dormirei lá até de manhã, quando irei para a casa dos meus avós e
implorarei a Big Paw uma cama para dormir por algumas horas antes de
descobrir como voltar para Los Angeles e enfrentar a realidade.
Eu resmungo, me virando e me revirando durante o sono. Estou
tendo aquele sonho de novo. Eu caio cada vez mais fundo no abismo sem
fundo da escuridão, gritando para alguém me dar uma mão. Implorando
por ajuda. Meus pais se abaixam e, antes que eu esteja prestes a agarrálos, eles puxam as mãos de volta e começam a rir histericamente enquanto
olham em minha direção. Então, todo mundo começa a rir também. Big
Paw, Vovó, os caras. Todos começam a apontar para mim, rindo
loucamente, enquanto caio cada vez mais fundo.
Todos, exceto Hazel.
Ela fixa os olhos nos meus e move a boca para falar, mas eu não
consigo ouvi-la.
— O quê? — Eu grito.
Ela continua movendo os lábios.
— O quê? — Eu grito.
— Acorde, — ela sussurra.
— Não consigo ouvir você!
— Levante, — ela diz. — Acorde, acorde, acorde!
Polo do meu pesadelo, encharcado de suor e pânico. Meus olhos
saltam enquanto eu olho em volta, tentando descobrir meu paradeiro, e
quando olho para a esquerda, congelo.
Aqueles olhos verdes estão me perfurando.
Aqueles olhos que eu perdi.
Aqueles olhos que eu ainda amo estupidamente.
Aqueles malditos olhos verdes.
— O que você está fazendo? — Eu exijo, sentindo-me confuso e
completamente perdido. Sinto como se metade de mim ainda estivesse no
estado de sonho enquanto a outra metade está acordada e querendo
envolver meus braços em torno de Hazel e implorar para ela me amar de
novo.
Mas eu não faço isso.
Fico imóvel como uma parede de tijolos.
— Ouvi gritos aqui e vim verificar. — Ela inclina a cabeça,
aparentemente confusa. — O que você está fazendo na cidade, Ian?
Minha mão roça minha têmpora e eu gemo. — Tenho me perguntado
a mesma coisa. Não se preocupe; vou sair da sua frente.
Eu me levanto e ela muda de posição.
Aquele Adidas preto.
Deus, odeio que ela ainda use aquele Adidas preto, e por odiar quero
dizer amar, e puta merda, sinto falta dela.
— Espere, não. Você não está me incomodando. Você é… Eu estou
apenas… você estando aqui… — Suas palavras tropeçam e se atrapalham
com sua língua. — Como você está? — Ela pergunta.
Depois de todos esses meses de silêncio, isso é tudo que ela tem a
me dizer? Tudo o que ela conseguiu reunir é como você está?
Não é bom o suficiente para mim.
Viro-me e saio do galpão enquanto o sol da manhã ilumina-me.
Eu não estou com vontade de caminhar até a casa de Big Paw, mas
sei que é o único lugar para onde poderei ir.
Passo minha mão contra minha testa e me viro para Hazel. — Posso
usar seu celular?
Ela hesita como se eu tivesse dito a coisa mais obscura do
mundo. — Eu, uh, você, um…
— Palavras, Hazel, — eu reclamo. — Use palavras.
— Você não pode usar meu telefone.
— E porque não?
— Fui instruída a não deixar você usá-lo.
Levanto uma sobrancelha. — Por quem?
— Por seus amigos.
Bem.
Eu usarei os telefones dos escritórios.
Começo a me afastar, irritado como sempre, e ouço Hazel chamar
atrás de mim. — Espere! Ian. Você está perdendo seu tempo se estiver indo
para os escritórios. Os telefones foram desconectados lá.
O que diabos?
— E por que isso?
— Então você não pode pedir ajuda para sair daqui.
— Por que eu iria querer ficar neste maldito rancho, hein? Por que
diabos eu iria querer estar aqui? — Pareço um idiota, mas não posso
evitar, porque embora eu tivesse tentado desligar meu coração de novo, ele
continua batendo e quebrando todos os dias desde que meus pais e Hazel
o pisaram no chão, e dói. Dói ‘pra’ caralho ficar parado ali na frente
dela. Dói ‘pra’ caralho estar no mesmo espaço que ela. Dói tanto que quero
arrancar meu coração do meu maldito peito para parar de sentir.
Desejo nunca ter começado a sentir de novo.
— Porque esta é sua casa, — ela diz, suas palavras me deixando
confuso. Ela quis dizer que ela é minha casa ou o rancho é minha casa?
Não importa.
Eu ainda vou embora.
— Vou até a casa de Big Paw ligar, — murmuro quando começo a
andar novamente.
— Isso não vai te ajudar, vendo como Big Paw e Holly estão
esperando dentro de casa, junto com a banda.
— Por que eles estão lá?
— Eles querem falar com você. Eles querem ter certeza de que você
está bem.
— Como uma intervenção? Não estou interessado.
— Ian, você não está bem…
— Estou bem! — Eu rebato para ela.
— Você não está, — ela responde, calma como sempre.
— E o que exatamente você sabe sobre mim, Hazel Stone?
— Tudo, — diz ela com tanta naturalidade que me faz querer rastejar
como uma bola e chorar como uma vadia. Ela me dá um meio sorriso e
encolhe os ombros. — Eu sei tudo, Ian. Você é meu melhor amigo.
— Então por que você me deixou? — Pergunto, parecendo
desesperado. Um flash de tristeza passa pelo rosto de Hazel. Balanço
minha cabeça e viro na direção da casa. — Não responda isso.
Eu não preciso de sua resposta, porque não importa, pois ela havia
me deixado. Só importa que ela partiu – fácil assim.
Eu deveria ter aprendido há muito tempo que, quando as pessoas o
deixam para trás, é melhor que você nunca pergunte o porquê. Você
sempre ficará desapontado com a resposta deles.
No momento em que piso na casa do rancho, sinto meus nervos
começarem a disparar. Todos estão sentados na sala de estar com
expressões malditas em seus rostos, como se tivessem perdido seu melhor
amigo, e eu não posso deixar de me sentir ridículo sobre a aparência
dramática.
— O que é isso? — Eu exijo. — Por que vocês estão me mantendo
como refém aqui?
— Não entre aqui com esse maldito tom, garoto. Você não pode ser
desagradável com as pessoas porque elas se preocupam com o seu bemestar, — Paw retruca. — Agora traga sua bunda aqui e sente-se.
Quero discutir com ele, mas sei que isso não levará a nenhum lugar
bom.
Sento-me na poltrona, nada feliz com isso. — Ok. O que você quer?
— Queremos que você pare de agir como uma criança teimosa, —
grita Paw.
— Harry, tenha calma, — vovó diz, colocando a mão em seu joelho.
— Não. Ir com calma não funciona com esse cabeçadura. Precisamos chegar até ele. Ian, seus colegas de banda me disseram
que você bebeu todas as noites. Isso é verdade?
Bastardos.
— Eu tomei alguns drinks, — murmuro, me reajustando na cadeira.
— Ele está bêbado todas as noites por mais de um mês, —
acrescenta Marcus.
Que idiota de merda. — Eu fiz meu trabalho, — eu digo. — Eu
apareci e nunca perdi um show, então o que importa se eu tomar uma
bebida ou duas…
— Ou cinco, — Eric brinca, fazendo a raiva crescer dentro de mim.
Quem essas pessoas pensam que são, falando sobre mim assim? Eu
deveria ser amigo deles, e é assim que eles mostram seu amor?
Foda-se o amor e todos os seus contos de fadas distorcidos.
— Este não é você, Ian, — vovó diz em seu tom gentil. Eu senti falta
dela. Eu errei ao não ligar para ela para checar todas as semanas, e vê-la
trouxe essa culpa de volta para mim instantaneamente. Eu não tenho sido
um bom neto ultimamente e não estou tão chocado.
Eu não tenho sido uma boa pessoa ultimamente.
— As pessoas mudam, vovó. Talvez seja quem eu sou agora.
— Não. — Big Paw balança a cabeça. — Isso não é você, droga. Você
não é um bêbado.
Dou de ombros. — Meus pais nem sempre foram viciados em
metanfetamina, mas também mudaram. Talvez eu apenas pareça com
meus pais um pouco mais do que o normal.
— Cale a boca, seu idiota! — Grita Big Paw, levantando-se da
cadeira. Ele anda de um lado para o outro, batendo as mãos de raiva – ou
talvez de decepção? Talvez tristeza?
Quando ele olha para mim com lágrimas inundando seus olhos, meu
coração confuso quebra ainda mais. Nunca vi Big Paw chorar em toda a
minha vida, e vê-lo parado ali diante de mim com lágrimas escorrendo pelo
rosto me fez querer chutar minha própria bunda por ser um idiota.
— Você não sabe como é, — ele sussurra, sua voz falhando. — Você
não sabe o que é saber que está perdendo tudo ao seu redor. Você não
sabe o que estamos passando aqui, Ian, e você tem a coragem de jogar fora
sua vida como se ela não importasse. Você é egoísta – assim como seus
pais. Você é egoísta e não consegue tirar a cabeça da bunda para ver o
quanto suas ações estão prejudicando os outros.
Vovó se levanta e vai até Big Paw. — Harry, acalme-se…
— Não. Terminei. Se ele quer ser um bêbado, então, por favor! Morra
da mesma maneira miserável que meu pai morreu. Mas não faça isso
aqui. Se você quer se arruinar, volte para LA e faça isso cercado de
pessoas que não ligam para você. Eu me recuso a ver outra pessoa que
amo se perder. Foi muito difícil da primeira vez e estou cansado. — Ele
enxuga as lágrimas e sai furioso de casa. Vovó corre atrás dele, deixandome com os caras, que parecem culpados.
Esfrego minhas mãos no rosto e solto um suspiro pesado.
James faz uma careta. — Eu nunca tinha visto Big Paw chorar, —
ele murmura.
— Nem eu, — respondo.
Marcus passa as mãos pelos cabelos. — Olha, Ian. Não estávamos
tentando fazer uma armadilha trazendo você de volta para Eres. Eu sei
que você tem um monte de merda acontecendo, e pensei que estar de volta
onde nos apaixonamos por música ajudaria. Voltando às nossas
raízes. Mas se você quiser voltar para LA e gravar aquelas faixas de Warren
Lee, então faremos isso. Porque quando dissemos ‘até para sempre’, não
queríamos dizer até que as coisas ficassem complicadas. Queríamos dizer
até para sempre. Sempre. Nós protegemos você de qualquer maneira.
Eu não posso acreditar no idiota que fui ultimamente. Eu não
consigo acreditar na maneira como me perdi no caminho para o sucesso
ou como deixei minha dor no coração me engolir por inteiro. Eu não quero
ser assim. Eu não quero ser um maldito quebrado, mas não posso
evitar. Estou me afogando e minha família e amigos estão tentando ao
máximo me puxar para cima para respirar.
Ao contrário do meu sonho, eles estendem a mão. Eu estou
simplesmente sendo teimoso demais para lhes dar a minha.
— Sinto muito, rapazes, por… tudo. Não estou indo muito bem
depois de tudo que aconteceu. Vou fazer melhor e trabalhar para voltar
aos trilhos. Eu sei que temos que decidir o que fazer pela música, e
precisamos de respostas minhas sobre o que fazer mais cedo ou mais
tarde.
— Aproveite amanhã para se reagrupar e se concentrar em si
mesmo, cara. Sem a bebida, é claro, — diz Eric. — Então voltaremos
juntos e faremos uma votação em grupo sobre tudo.
— Embora já tenhamos nossos votos, de forma realista, tudo o que
você decidir será vetado, — brinca Marcus. — Sério, vá com calma,
Ian. Estaremos por aí vendo nossas famílias e outras coisas. Basta ligar
para nós.
Os caras saem e eu suspiro enquanto rolo minhas mãos sobre meu
rosto. Eu me sinto exausto de todas as maneiras – esgotado física, mental
e emocionalmente.
Quando uma batida soa na porta, me levanto e me dirijo para
encontrar Hazel ali.
— Por que você está batendo na sua própria porta? — Eu pergunto.
— Era a sua porta antes de ser minha.
Eu não sei o que dizer a ela em seguida, embora haja um milhão de
coisas que eu sinto que precisam ser ditas.
Eu coço minha nuca. — Não se preocupe; vou ficar no galpão
novamente esta noite. Você não precisa se preocupar comigo ficando no
seu caminho.
— Não estou preocupada com isso. Eu… — Seus olhos ficam
vidrados e parece que ela também tem um milhão de coisas que precisam
ser ditas.
Diga, Haze. Diga isso para mim, porra, e direi minhas palavras de
volta.
Seus lábios rosados se separam e quase me inclino para proválos; então ela os fecha. Sela-os com força e me dá um sorriso patético que
não é um sorriso.
Mesmo que seus lábios se curvam, eu vejo a tristeza na curva.
— Eu, um, você provavelmente deveria ir ficar com seus avós, — ela
diz, desviando seu olhar do meu. É como se olhar nos meus olhos fosse
muito difícil para ela fazer. — Eles estão passando por algumas coisas e
provavelmente poderiam apreciar sua companhia.
— Que tipo de coisas?
— Somente… eles precisam de você, Ian.
A maneira como ela diz essas palavras faz meu estômago apertar de
nervosismo.
— Posso usar sua caminhonete para chegar lá? — Pergunto.
Ela me joga as chaves. — Na verdade, é a sua caminhonete, acabei
pegando-a emprestada.
Balanço a cabeça uma vez antes de me afastar dela e ir em direção
ao carro.
Eu me pergunto quando chegará ao ponto em que não quero olhar
para trás para Hazel na esperança de que ela ainda esteja olhando na
minha direção.
Quando olho por cima do ombro e a vejo ainda olhando, quase
sorrio. Então me lembro que ela quebrou a porra do meu coração, e
mantenho meu sorriso para mim mesmo.
— Seu avô saiu para clarear a cabeça um pouco. Entre. Vou fazer
um sanduíche para você. Você está muito magro ultimamente.
— Viajar e se apresentar costuma fazer isso.
— Ainda assim, você precisa comer mais. Agora, vá para a cozinha,
— vovó instrui enquanto acena para eu entrar na casa. Ela se move
lentamente em direção à cozinha e eu a sigo.
Sento-me na banqueta do bar em frente à ilha da cozinha e junto as
mãos. — Eu nunca o vi tão chateado, — digo, falando sobre Big Paw.
Ela assente enquanto pega os itens da geladeira. — Ele está
passando por momentos difíceis ultimamente. E se preocupa com você
depois de tudo que aconteceu com seus pais e Hazel. Ambos nos
preocupamos, querido. Nos preocupamos com o seu coração.
Dou de ombros. — Estou bem.
— Você não está feliz.
Não respondo, porque não consigo mentir para a vovó. Ela pode ver
uma mentira a uma milha de distância.
— Seus sonhos deveriam te fazer feliz, — ela comenta.
— Acho que em algum lugar ao longo do caminho, os sonhos que eu
tinha mudaram para outra coisa.
— E quais são os seus verdadeiros sonhos? O que você quer?
Faço uma careta. — Acho que Hazel é o meu sonho.
— Ok. Então saia e pegue-a.
— Não é tão fácil, vovó. Não posso ter alguém que não me queira de
volta.
— Oh, Ian, — ela fala enquanto coloca dois pedaços de pão em um
prato. — Você sabe muito bem que aquela garota te ama.
— Não. Eu não sei. Ela terminou comigo, vovó, depois dos dias mais
difíceis da minha vida vendo meus pais. Isso não é amor.
— Com base em tudo que você sabe sobre Hazel, isso é coisa que
alguém como ela faria? Fazer algo assim?
Claro que parece estranho.
Eu fui pego de surpresa por suas ações. Fizemos amor na manhã em
que ela partiu, e parecia a experiência mais real e poderosa da minha vida,
e então eu fui atingido por uma chicotada quando ela decidiu que não
queria ficar comigo por mais tempo.
— Ela te ama, Ian. Há algo que a impede de mostrar esse amor a
você. Eu sei isso. Então, por favor, lute por ela. Pressiona-a. Faça-a se
abrir com você. Tenho a sensação de que ela precisa de você da mesma
forma que você precisa dela. Ela está com medo de alguma coisa, então
certifique-se de que ela saiba que não precisa ficar com medo e
sozinha. Você acha que seu avô e eu chegamos até aqui sem sentir
medo? Claro que não. Estava com tanto medo que o afastei, e ele tem sido
muito teimoso para permitir que eu faça isso. Você sabe o que aprendi com
o tempo?
— O que?
— Vale a pena lutar pelas coisas mais importantes da vida. Não
importa o que o medo diga.
Ela coloca meu sanduíche na minha frente e se senta na banqueta
ao meu lado. Agradeço pelo sanduíche, mas não pego.
— Está tudo bem aqui? Você e o Big Paw estão bem? Sinto muito por
não ter ligado semanalmente.
— Oh, querido, está tudo bem. Eu sei que você esteve ocupado.
— Não. Fui egoísta. Eu deveria ter ligado mais. Mas vocês dois estão
bem?
Ela me dá um sorriso tenso e coloca a mão na minha e aperta. —
Não importa o que aconteça, tudo vai ficar bem.
O que diabos isso quer dizer?
— Vovó, — eu digo, segurando suas mãos nas minhas. Meus olhos
se estreitam e inclino minha cabeça. — O que está acontecendo?
39
HAZEL
Mais tarde naquela noite, olho pela janela da frente e vejo alguém
parado no final da calçada, olhando para o céu na chuva. Quando abro a
porta, percebo que é Ian. Ele está de costas para mim, mas eu o conheço
bem o suficiente para saber quem é.
— Ian? — Eu grito.
Ele se vira para mim. Sua camiseta branca gruda em seu peito por
causa da chuva torrencial, e a água de seus olhos não é devido às gotas de
chuva. Ele parece como se cada grama de felicidade tivesse sido arrancada
de sua alma.
— Ian, o que foi? — Eu pergunto. O alarme dispara pelas minhas
entranhas quando entro na varanda.
— Ela está doente, — ele engasga enquanto seu corpo treme de frio e
por seus nervos. Sua cabeça abaixa enquanto ele desliza as mãos nos
bolsos. — Vovó está doente, Haze.
No momento em que as palavras deixam sua boca, eu entro na
chuva, vou em sua direção e passo meus braços em volta dele. Ele derrete
em mim como se nossos corpos sempre tivessem sido um só, e começa a
desmoronar enquanto tento o meu melhor para pegar seus pedaços
quebrados.
A chuva martela contra nossos corpos enquanto a tristeza de Ian
enche em meu coração.
Eu o puxo para dentro assim que ele é capaz de controlar suas
emoções.
— Aqui estão algumas toalhas para se secar e, claro, você ainda tem
algumas das suas roupas no seu quarto, se quiser trocar.
— Obrigado, — murmura enquanto olha para as mãos fechadas.
— Como está sua cabeça? — Eu pergunto.
— Perdido. — Ele passa as mãos pelos cabelos. — É irônico,
sabe? Vovó tem o maior coração do mundo. Ela se entrega a qualquer
pessoa necessitada. Ela não guarda rancores, julgamentos e
ressentimentos. Ainda assim, ela acaba com o coração partido. Como isso
foi acontecer? Como a mulher mais gentil da terra acaba com um coração
que não funciona corretamente?
— A vida não é justa.
— Talvez ela amasse demais.
— Isso é uma coisa impossível de fazer. O mundo deveria lutar para
amar do jeito que Holly Parker ama. Precisamos de mais humanos como
ela.
— Precisamos dela. — Ele suspira. Ele pressiona as palmas das
mãos contra os olhos. — Não sei o que farei sem ela.
— Felizmente, ela ainda está aqui. Enquanto ela estiver aqui,
devemos agradecer.
— Você sabia? Você sabia que ela estava doente?
Olho para ele e a culpa me atinge. — Sim.
— E você não pensou em me dizer?
— Eu queria, Ian. Realmente, eu disse, mas seus avós me fizeram
prometer que não contaria a você até que estivessem prontos. Eles não
queriam colocar a culpa em você ou fazer você sentir que precisava voltar
para casa para cuidar deles.
— Eu teria voltado para casa, — ele murmura, enrolando a toalha
em volta de si. Ele então coloca as mãos contra o rosto e suspira. — Eu
nem liguei para checá-los o suficiente.
— Eles não te culpam. E sabem que você estava ocupado.
— Ocupado sendo um merda.
— Ian, eles te amam muito e não têm nada contra você. Confie em
mim; eles te amam. Eles simplesmente não queriam arruinar sua carreira
no momento em que ela estava decolando.
— Parece que todo mundo pensa que me preocupo mais com essa
carreira de merda do que com as pessoas reais na minha vida, — ele
bufa. — Não foi por isso que você terminou comigo, afinal? Por causa do
meu trabalho?
Hesito em responder. Vejo a expressão de dor em seus olhos e a
maneira como ele está lidando com tantas perguntas sem resposta. Eu
quero despejar a verdade. Quero contar a ele sobre Charlie e as ameaças
que ele faz contra mim. Eu quero contar a ele sobre as lutas que eu estou
passando por não ser capaz de estar com ele. Quero dizer a ele que o amo,
que sinto sua falta, que me preocupo com ele todos os dias desde que
seguimos nossos caminhos separados.
Mas nada mudou. Charlie ainda é uma ameaça para mim, para
Rosie e para o rancho da família de Ian, e eu não consigo imaginar colocar
mais pressão e dor em vovó e Big Paw, vendo como eles já estão passando
por tanta coisa. A última coisa que eles precisam é de um Charlie vingativo
destruindo tudo que eles passaram suas vidas construindo.
— Não é tão fácil, Ian, — eu digo.
Ele vai até o sofá e se senta. — Pareceu tão fácil quando você me
afastou.
— Eu sei. — Abaixo minha cabeça e sento ao lado dele. — Eu sei que
não faz sentido, vendo como tudo parecia bom entre nós. Eu sei que
provavelmente te confundi e a separação veio do nada. Eu gostaria de
poder explicar isso para você.
Ele inclina a cabeça em minha direção com o olhar mais sincero. —
Explique, então.
Separo meus lábios, mas minha garganta seca. Eu não sei o que
dizer, o que fazer ou como reagir. Devo ter sido capaz de demonstrar,
porque ele pega minhas mãos nas dele e aperta levemente. — Você ainda
me ama? — Sussurra como uma brisa suave passando pelo meu coração.
— Sim, — eu respondo, sabendo que sou completamente incapaz de
mentir para ele sobre isso.
— Então por que não estamos juntos?
— Porque não podemos estar.
— E por que isso?
Engulo em seco e olho para nossas mãos, unidas perfeitamente. —
Porque eu vou te machucar.
— Nada que você possa fazer pode me machucar a ponto de não ter
retorno, Haze.
Eu concordo. — Sim, mas não irei apenas machucar você, isso
machucará sua família e a minha. Isto… — Fecho meus olhos e respiro
fundo.
Ele me puxa para ele, coloca seus lábios perto da minha orelha e fala
baixinho. — De que você tem tanto medo?
— Perderíamos tudo.
— Eu estive lá. Eu conheço esse medo. Estou vivendo isso agora, e é
por isso que não posso perder você também, Hazel. Minha vida inteira foi
construir um muro para manter as pessoas afastadas. Trabalhei muito
para manter as pessoas distantes e você teve a coragem de me
derrubar. Para me ensinar o que é amor. Então, por favor, — ele implora,
sua respiração quente contra a minha pele, enviando uma onda de energia
para a boca do meu estômago. — Fique comigo.
Sinto suas lágrimas caindo contra minha pele e tenho certeza de que
ele sente as minhas contra as dele. Começo a chorar mais enquanto
seguro sua camisa. — Sinto muito, sinto muito, — continuo repetindo.
— O que está machucando você, Haze? — Ele pergunta
suavemente. — O que está acontecendo? — Ele envolve seu aperto em
volta de mim e me puxa com mais força. — Está bem. Entendi. Entendi.
Odeio ter começado a desmoronar quando ele é o único que deveria
ter se quebrado depois de saber as notícias sobre Holly. No entanto, lá
estou eu, segurando-o e chorando como se ele fosse nada mais do que um
sonho e se o deixar ir, ele irá embora.
Ele segura em mim o máximo que pode, até que a realidade se
estabelece de que eu não posso fazer isso. Eu não consigo segurá-lo perto
de mim. Se Charlie descobrir…
Eu me afasto. Fungo e passo minhas mãos contra meus olhos. — Eu
realmente deveria verificar Rosie.
Ele parece tão perplexo por eu me afastar, mas se levanta e me dá
um aceno de cabeça. — Claro.
— Eu realmente sinto muito, Ian… sobre Holly.
Ele me dá um sorriso quebrado. — Ela ainda está aqui. Vou ficar
grato por isso.
Ótimo.
— Ok, bem, boa noite. Se precisar de alguma coisa é só me dizer.
— Você, — ele responde tão rapidamente que eu quase não tenho
certeza se ele falou essa palavra.
— O quê?
— Eu preciso de você, — declara. Enfia as mãos nas calças
molhadas e pigarreia. — Entendi. Algo aconteceu e você está com
medo. Você está com medo de compartilhar o que aconteceu com você, e
eu entendo isso, mas isso não significa que eu não quero ou precise de
você, Hazel. E acho que você precisa de mim também. Você sabe como a
vovó fez você prometer não me contar sobre o que estava acontecendo? —
Ele pergunta.
— Sim.
— Bem, ela me fez fazer uma promessa também. Ela me fez
prometer lutar pelo que amo, então, não importa o que aconteça, vou lutar
por você. Não estou fugindo, Hazel. Não estou construindo meus muros de
volta. Vou ficar na cidade, e não só vou trabalhar em mim, mas vou
trabalhar em nós. Mesmo que isso signifique dedicar-me em sua
vida. Estou lutando por você, goste ou não, Hazel Stone. Nossa canção de
amor não acabou. Estamos chegando ao refrão e irei cantar para você,
para nós, para sempre.
Ian não está brincando – ele ficou na cidade e ficou na minha vida.
Ele e a banda não pegaram um avião para voltar a Los Angeles para
gravar seu álbum apressado. Em vez disso, eles voltaram ao básico de
gravar suas próprias faixas no celeiro enquanto fazem um plano para
enfrentar sua gravadora.
Não tenho ideia de como eles irão lançar um álbum completo em um
período de tempo tão curto, mas eu também sei que se alguém pode fazer
isso, serão os The Wreckage. Eles estão determinados a provar ao Max
Fodido Idiota que ele não pode controlá-los.
Quando Ian não está com seus avós ou gravando com a banda, ele
está no rancho, comigo.
Big Paw me encarrega de dar a Ian suas tarefas, e é como se
tivéssemos fechado o círculo.
Enquanto ele limpa os chiqueiros, paro para verificar se ele está
fazendo o trabalho. Além disso, eu simplesmente gosto de ver como ele
está, porque não consigo evitar o desejo de estar perto dele.
— Como está indo? — Eu pergunto.
— Estranhamente, não é tão ruim. — Ele diz, colocando seu forcado
no chão. — Estou um pouco mais lento do que costumava ser.
— Sim, você está, — eu brinco. E bato minhas mãos juntas. — Se
recomponha ou você vai ficar aqui a noite toda.
— Se eu tivesse alguém para me ajudar. — Ele sorri. Puxa, adoro
aquele sorriso.
— Se…
— Vamos, Haze. — Ele gesticula em direção a outro forcado e uma
das cercas bagunçadas. — Pelos velhos tempos?
Eu estreito meus olhos. — Você está tentando se livrar do seu
trabalho?
— Não. Eu só gosto de estar perto de você.
Borboletas.
Tantas borboletas.
Respiro fundo e libero pelos meus lábios. Mesmo que Charlie apanhe
Ian e eu, não é como se estivéssemos fazendo nada fora do normal. Nós
estamos trabalhando, isso é tudo.
Pelo menos é tudo que eu penso que está acontecendo.
Quando começo a tirar o feno sujo, Ian fala. — Confissões?
Eu balanço minha cabeça. — Não tenho certeza se estou disposta a
isso.
— Por quê? — Ele estreita os olhos. — Com medo do que pode ser
dito?
— Exatamente.
Ele não desiste, no entanto. — Hora da Confissão: estou com
saudades.
— Ian…
— Hora da Confissão: você é minha melhor amiga.
— Por favor, pare.
— Hora da Confissão: se você me der uma chance, eu te amarei para
sempre.
Engulo em seco enquanto o observo caminhar em minha
direção. Estou bem no meio de esterco de porco, fazendo o trabalho mais
nojento, parecendo que não durmo há dias, e Ian Parker está me dizendo
como ele quer me amar para sempre.
Ele continua. — Hora da Confissão: você é meu sol, minha lua e
minhas estrelas. Hora da Confissão: o que quer que esteja acontecendo,
podemos consertar juntos. Hora da Confissão: eu nunca vou desistir de
nós.
Eu não sei como isso acontece. Não sei como minhas mãos
encontram as dele ou como nossos corpos ficam pressionados um contra o
outro. Não sei como sua testa cai sobre a minha ou como meus batimentos
cardíacos aumentam de forma irregular.
Não sei como seus lábios caem tão perto dos meus ou como suas
exalações se tornam minhas inalações.
Mas lá estamos nós, a segundos de distância de nossos lábios se
tocarem, e eu caindo em uma embriaguez da qual nunca serei capaz de me
recuperar. Se eu começar a beijar Ian, sei que nunca serei capaz de parar.
Ele é tudo para mim.
Ele é o gancho, a ponte e a melodia.
— Eu sinto seu corpo tremendo, — ele respira. — Eu sinto isso
enquanto eu te seguro. Eu sinto o amor que existe, então me diga,
Hazel. Diga-me o que está nos impedindo de ser nós. Dê-me sua confissão
e eu vou resolver tudo.
— Charlie — sussurro, com minha voz trêmula e incerta se estou
fazendo a coisa certa. — É Charlie.
Ele se afasta de mim e ergue uma sobrancelha. — O que você quer
dizer com Charlie?
Sentindo uma quantidade avassaladora de pavor em meu peito,
começo a derramar tudo de mim. Conto a ele sobre como Charlie está fora
da prisão, sobre como ele me ameaçou e me forçou a terminar com
Ian. Como ele ameaçou o rancho. Como ele ameaçou minha irmãzinha.
— Ele disse que machucaria Rosie. Entende? Eu não tive
escolha. Tive que terminar com você, Ian. Ele me colocou em um canto, e
eu não tive outra escolha.
O rosto de Ian está vermelho brilhante enquanto suas mãos formam
punhos. — Ele disse que machucaria Rosie?
— Sim. — Balanço a cabeça, odiando as memórias que voltam para
mim de Charlie segurando Rosie em seus braços.
— Ele vai morrer por isso. Eu vou matá-lo, porra.
— Não. — Eu balanço minha cabeça. — Você não pode fazer
isso. Você não pode ir atrás dele, Ian. Você não pode fazer isso. As pessoas
não enfrentam Charlie. Ele pega pessoas. Acredite em mim, eu tentei
colocá-lo fora e tudo saiu pela culatra. Além disso, você está sob os olhos
do público. Max estava certo sobre isso – você não pode se envolver na
minha bagunça quando está no caminho para o sucesso estrondoso.
— Max disse algo para você também? — Ele sibila enquanto seu
nariz dilata. — Que diabos?
— Está tudo bem. Ele se preocupou com a sua imagem e como seria
estar com alguém com tanta feiura no passado como eu. Eu entendi isso
um pouco.
— Não. Foda-se isso e foda-se Max. E foda-se Charlie. E foda-se! —
Ele grita, andando no celeiro. — Não podemos simplesmente deixar Charlie
escapar impune. Você não pode passar o resto de sua vida sob as amarras
dele.
— Eu não tenho escolha.
— Sempre há uma escolha e sempre há um caminho.
Gostaria de poder acreditar nisso, mas sei como Charlie
funciona. Eu sei quantas vezes ele arrastou minha mãe de volta para seu
mundo miserável. Sei que ele pode arruinar minha vida e a de Rosie em
um estalar de dedos. Eu nunca temi ninguém além daquele louco. Charlie
é um monstro, e não tem medo de machucar ninguém que fique no
caminho de sua destruição.
— Sinto muito, Ian. Eu só… nós… — Suspiro. — Não podemos ficar
juntos.
— Eu não aceito isso.
— Bem, você deveria. Não há como fazer isso funcionar.
— Apenas espere, — ele promete, pegando minhas mãos nas dele e
beijando minhas palmas. — Nós vamos ter nosso felizes para sempre. Mas,
primeiro, permita-me arruinar a vida desse idiota.
40
IAN
Passo a noite toda tentando descobrir como ajudar Hazel e, quando
fica muito difícil e me sinto como se estivesse correndo em círculos,
procuro a única pessoa em quem posso pensar que pode me ajudar. A
pessoa a quem sempre recorro nos momentos mais difíceis.
Big Paw está sentado em sua cadeira de escritório com suas rugas se
aprofundando em uma carranca enquanto conto a ele tudo o que Hazel
revelou para mim na noite anterior.
— Eu sempre odiei aquele Charlie Riley. Ele é uma criatura tóxica
para esta cidade, e é hora de nos livrarmos dele.
— Como? Hazel disse que não tem como. Sua presença aqui é muito
grande, e mesmo quando as pessoas dão um passo à frente, ele empurra
dois passos para trás.
— Não dessa vez. Ele não pode encurralar minha família.
— Mas é isso que ele está fazendo, e não há como contra-atacá-lo.
— Sim, podemos. Quando você é encurralado em um canto, você
calça as luvas de boxe e revida, Ian. Acha que eu nunca enfrentei
situações difíceis? Claro que sim, mas você sabe como passei por esses
períodos difíceis?
— Como?
— Não desisti, continuei lutando e, quando mais precisei, estendi a
mão para outras pessoas me ajudarem. Não temos que enfrentar todas as
batalhas sozinhos. Às vezes, somos mais fortes juntos. — Ele estende a
mão em minha direção e coloca sua mão contra a minha. — Estou feliz
que você veio até mim com isso. Agora, comece a trabalhar hoje e acorde
bem cedo amanhã. Temos uma longa viagem de carro amanhã.
— De carro para onde?
— Para a única pessoa que é o ponto cego de Charlie. Vamos ver a
mãe de Hazel.
— O quê? Como? Ela está na prisão e nem mesmo aceita visitas de
Hazel. Ela não a vê há meses.
— Ela não tem que ver Hazel. Ela tem que me ver e, como já estou
em sua lista de visitantes, não será grande coisa. Eu ia lá amanhã, de
qualquer maneira. A única diferença é que estou levando você comigo
desta vez.
Tenho tantas perguntas para ele. Perguntas sobre por que ele está
visitando a mãe de Hazel. Perguntas sobre por que iremos visitá-la em
primeiro lugar e como ela pode ajudar na situação de Charlie. Perguntas
sobre… tudo.
Mas o jeito como Paw sorri para mim me mostra que eu devo
simplesmente confiar nele.
Portanto, é o que eu faço.
Enquanto caminhamos em direção à prisão, meu estômago
embrulha com o pensamento de ver a mãe de Hazel, Jean. Quando você
imagina conhecer a mãe de sua namorada, não presume que será em uma
prisão. É bem pouco ortodoxo.
— Agora, deixe-me falar primeiro para colocar a conversa em ação,
— ordena Big Paw. — Eu não quero que você crie problemas dizendo algo
diferente.
Entramos e passamos por todos os procedimentos de segurança
antes de sermos conduzidos a uma mesa para esperar a saída de Jean.
Quando ela aparece, fica surpresa ao me ver sentado à mesa com o
Big Paw.
— Você trouxe um convidado, — diz ela, olhando-o mortalmente nos
olhos enquanto se senta. — Onde está Holly?
Espere, o que?
Jean conhece Big Paw e Vovó? Como isso é possível?
— Ela não estava se sentindo muito bem hoje. E não pôde fazer a
viagem, — ele responde a ela.
Eu me mexo na cadeira, tentando ficar confortável, mas sabendo que
é impossível. Jean sente uma grande tristeza por tudo que está
acontecendo. É muito difícil testemunhar. Você pode dizer que ela tem
passado por muitas merdas difíceis em sua vida apenas olhando em seus
olhos. Ela me dá um sorriso de relance, que desaparece rapidamente antes
que seus olhos se voltam para as mãos entrelaçadas.
— Trouxe algumas fotos para você, — diz Paw, puxando uma pilha
de fotos. Ele ergue cada foto para que Jean possa testemunhar, e as
lágrimas começam a cair em seu rosto enquanto ela tira as fotos de Rosie
que Paw compartilha com ela.
— Ela está ficando grande, — ela comenta.
— Sim, — eu concordo. — E se parece muito com você.
— Ela se parece com Hazel, — corrige, brincando com as mãos. —
Quando Hazel era um bebê, ela tinha esses olhos grandes também.
— Espere, como você e o Big Paw se conhecem? — Eu pergunto,
perplexo.
— Holly e eu a visitamos bastante nos últimos meses, — explica ele.
— Sim, ele tem sido um pé no saco, — brinca Jean.
— E ela tem sido uma dor na minha bunda, sempre foi ao longo dos
anos.
— Anos? — Eu pergunto.
Jean concorda. — Tínhamos nos cruzado muitas luas atrás, quando
eu era adolescente. Estava grávida de Hazel e sozinha quando vim para
Eres. Eu estava fugindo de uma infância conturbada e, quando cheguei
aqui, Holly e Big Paw me acolheram de braços abertos.
— Parece ser o que eles fazem, — eu digo.
— Sim, mas eu não facilitei para eles. Eu me envolvi com sua mãe e
seu pai e fiz algumas escolhas que não deveria ter feito depois que Hazel
nasceu. Comecei a sair com Sarah e Ray, e eles me apresentaram a
Charlie, e todos nós sabemos como isso acabou. — Ela gesticula ao redor
dela e franze a testa.
Todo esse tempo eu culpei a mãe de Hazel pela besta que Charlie é,
mas parece que meus pais são os responsáveis por fazerem de Charlie e
Jean um casal.
— Você pode melhorar, quando sair daqui, — eu afirmo, esperando
dar a ela um toque de esperança.
Ela esfrega a mão para cima e para baixo no braço nervosamente. —
Eu quero fazer o certo, isso é tudo.
— É por isso que estamos aqui, — diz Big Paw. — Nós precisamos da
sua ajuda.
Ela dá uma risadinha. — Sem ofensa, Paw, mas não sou capaz de
ajudar muito as pessoas na minha situação atual. — Ela gesticula ao seu
redor novamente.
— Mas você pode fazer o que puder de onde estiver, — ele diz,
juntando as mãos. — Ele ameaçou suas filhas.
Os olhos de Jean se arregalam e ela dá a Big Paw um olhar em
pânico. — Como assim?
— Ele está forçando Hazel a dar a ele toda a sua renda, controlando
seus relacionamentos, dizendo que vai queimar o rancho e ameaçando
fazer mal a ela e Rosie se ela não obedecer. Ele está batendo em Garrett
também, muito.
Lágrimas enchem seus olhos e ela balança a cabeça. — Eu a
coloquei em uma situação terrível. Eu nunca deveria ter me envolvido com
Charlie. Ele não deveria ser capaz de machucar minha garota, mas é assim
que ele é. — Ela enxuga algumas lágrimas dos olhos e engole em seco. —
Mas, não entendo como posso ajudar.
— Isso é fácil, — diz Big Paw. — Se há uma pessoa que conhece
Charlie, é você. Você sabe como funciona o cérebro confuso dele. Você
conhece seus planos, seu negócio, suas… tudo. Então, preciso que você
nos diga algumas coisas para ajudar a pegá-lo. Precisamos prendê-lo e,
desta vez, ele não terá ninguém para assumir a responsabilidade por
ele. Desta vez, ele está por conta própria e, desta vez, vamos garantir que
fique.
Um momento de silêncio se passa enquanto Jean baixa as
sobrancelhas. Ela junta as mãos e acena com a cabeça uma vez. — Vou te
dizer tudo que você precisa saber.
E ela faz exatamente isso.
Ela nos dá tudo que pôde até que chega a hora de ela deixar o
espaço. Quando se levanta da cadeira, ela olha na minha direção. — Você
ama minha filha?
— Sim, senhora, eu amo.
— Você pode me fazer um favor e tratá-la bem? Ela merece alguém
que a trate bem.
— Eu prometo, — eu digo a ela. — E obrigado por sua ajuda. Você
não tem ideia do quanto isso significa para nós.
— Eu tenho sido uma mãe terrível. Tenho estado mais bagunçada do
que limpa, mas deixar as drogas aqui me deixou com a mente mais
clara. E quero fazer o que é certo. Se eu puder ajudá-la, farei o que
puder. Se isso mantém minhas meninas seguras, farei qualquer coisa. Se
você puder dizer a Hazel que sinto muito, por tudo, isso significará muito
para mim.
— Você realmente ama suas filhas, não é?
— Eu amo. Nunca fui uma boa mãe, mas tive a garota mais incrível
do mundo. Eu simplesmente não conseguia perceber quando minha
cabeça estava embaçada. Por favor, diga a ela que sinto muito.
— Você deve entrar em contato com ela, e dizer você mesma.
— Duvido que ela queira ter alguma coisa comigo depois que eu a
afastei todos aqueles meses atrás.
— Ela vai, — eu juro. — Ela é Hazel, afinal… e ama
incondicionalmente.
Jean balança a cabeça uma vez antes de seu olhar se mover para
Big Paw. — Por favor, envie a Holly meus melhores votos. Lamento o que
ela está passando e lamento que você também esteja lutando.
Enquanto Big Paw e eu saímos, faço a ele a única pergunta que está
na minha cabeça todo esse tempo. — Você se culpa pelo que aconteceu
com ela? Como se ela morar com você fosse a causa de seu encontro com
Charlie?
— Todos os dias.
— E é por isso que você deu o emprego a Hazel meses atrás?
Ele assente. — Só estou procurando um pouco de redenção.
— Confie em mim, Paw. Você foi redimido.
No momento em que voltamos para Eres, digo a Hazel qual será o
plano. Mesmo que ela esteja hesitante, há um toque de esperança em seus
olhos.
Eu gostaria de ter dito que houve algum momento superhollywoodiano que aconteceu quando Big Paw e eu armamos para Charlie,
mas não houve. Ele foi pego em um de seus locais de entrega e foi preso
mais uma vez. Desta vez, irá pagar, porque ele não tem mais Jean para
levar a culpa por ele. Além disso, tinha entrado e saído tanto da prisão que
não há como sair ileso.
Quando recebo a palavra de Big Paw de que Charlie está algemado,
vou para casa para ver Hazel. Quando chego lá, ela já está na cama e eu a
acordo de seu sono.
— Ei, — ela sussurra, esfregando os olhos. — O que está
acontecendo?
— Acabou.
Essas são as únicas palavras que eu digo, e são o suficiente para
fazê-la se sentar na cama. — Acabou? Realmente? Eles pegaram Charlie?
— Sim, e ele não vai sair tão cedo. Garrett até disse que
testemunhará contra ele no tribunal. Está realmente acabado,
Haze. Acabou.
Ela solta o maior suspiro de alívio e cai em meus braços. — Acabou,
— sussurra.
Naquela noite, faço amor com meu amor e tudo parece certo.
41
IAN
— Isso é perfeito, perfeito, perfeito! — Hazel bate palmas enquanto
se senta no celeiro com a banda e eu, ajudando a formar as letras de
algumas das faixas que estamos criando.
Trabalhamos dia e noite, tentando tirar esse álbum da nossa bunda
e, com o passar dos dias, parece cada vez mais improvável.
Ultimamente, todos os nossos telefones têm explodido com dezenas
de mensagens de texto de Max, ordenando que voltemos o mais rápido
possível para gravar o álbum e rodar com as faixas de Warren Lee.
— Ignore-o, — Eric me diz. — Max Fodido Rider ficará bem por um
tempo. Nossa maior preocupação agora é a nossa música, não ele.
Agradeço a ele por me lembrar do que é importante.
— Ficou lindo, — diz Hazel, sorrindo de orelha a orelha. Ela não foi
nada além de um trunfo para as músicas, elevando minha visão e fazendoa voar alto. Trabalhamos juntos sem nenhum esforço e fico feliz por voltar
ao básico da música. Está começando a parecer divertido novamente.
Leah participa de nossos ensaios com Hazel, e estou grato por ela ter
se tornado uma grande parte da vida da minha garota. Hazel precisa de
uma amiga na cidade, e eu sei que Leah é leal. Observá-las se
aproximando a cada dia é a melhor coisa de se ver.
— Não para tornar seus egos maiores do que já são, mas isso foi
além de incrível, — diz Leah. — E, acredite, me mata dar um elogio ao meu
irmão, mas foi mágico.
— Eu concordo com Hazel e Leah. Isso foi incrível! — Vovó exclama,
sentando-se em uma cadeira ao lado de Big Paw. Como não devemos
apresentar ou postar nada sobre a nova música, as únicas pessoas com
quem podemos compartilhar as faixas são pessoas em quem realmente
confiamos.
— Acho que você realmente bateu em… — As palavras da vovó
somem enquanto ela se levanta da cadeira. Sua mão cai sobre o peito e ela
respira fundo. Tudo parece estar se movendo em câmera lenta daquele
ponto em diante. Largo o microfone das minhas mãos quando as pernas
da vovó começam a dobrar. Big Paw voa de seu assento, Hazel dispara em
sua direção e os companheiros de banda também correm.
Mas é tarde demais. Vovó bate no chão com um baque forte e, em
um instante, esqueço como respirar.
Da casa do celeiro vamos direto para o hospital. Big Paw e Vovó vão
na ambulância, e todos os outros estão seguindo de perto. Na maior parte,
a viagem é conduzida em completo silêncio. Finalmente, Marcus assume o
controle e liga o rádio. Depois de duas músicas, a nossa chega à estação e
explode nos alto-falantes.
— Jesus, — James suspira, balançando a cabeça. — Eu nunca vou
me acostumar com isso. Nunca vou entender o fato de que estamos no
rádio.
— A vida é uma loucura, — murmuro, mastigando minha unha do
polegar enquanto olho para as estradas de terra que estamos nos
aproximando.
Nós estacionamos no hospital, eu pulo para fora do carro e corro
para dentro. Vou até a mesa da recepcionista para perguntar sobre a vovó,
mas sou interrompido.
— Ian.
Eu me viro para ver Big Paw parado atrás de nós.
— Ei, o que está acontecendo?
— Eles acham que ela pode precisar de um marca-passo. Mas,
primeiro, eles têm que entrar e consertar as coisas, — explica ele. — Eles
estão preparando-a para a cirurgia agora.
Cirurgia?
Porra.
— Dá para acreditar nessa besteira? — Big Paw faz uma careta. —
Esses filhos da puta querem cortar o coração de Holly. — Sua voz falha e
as lágrimas caem por seu rosto.
Aproximo-me de Big Paw e dou um tapinha nas costas dele. — Não
se preocupe. Tudo vai ficar bem.
— Como você pode dizer isso? Você não tem certeza disso, — ele
argumenta.
— Sim, eu sei, mas isso é o que a vovó diria, não é? Ela diria que
tudo sempre dá certo. Se ainda não deu certo, não é o fim da história.
Ele bufa, enxugando o rosto com as mãos cansadas. — Isso é apenas
uma besteira enorme que ela diz. Essa mulher vai ser a minha morte. Não
acredito que ela está fazendo isso comigo. — Suas lágrimas começam a
cair cada vez mais rápido. — Como ela pode entrar lá e deixar essas
pessoas a cortarem?
— Não acho que ela tenha escolha, Paw, mas tenho certeza de que
esses médicos são bons no que fazem. Eles são ótimos em seus
empregos. Eles vão cuidar da vó, eu sei disso. Você só precisa ter um
pouco de fé.
— Eu não posso. Holly é quem tem fé. Eu sou o velho idiota que não
acredita em nenhuma dessas merdas. É engraçado, na verdade, — ele diz
com um tom tão sombrio. — Eles estão cortando seu coração, mas é o meu
que está quebrando.
Eu o puxo para um abraço e seguro firme, tentando ajudar seu
coração atribulado, mas sei que nada o ajudará até que o amor de sua
vida saia bem da sala de cirurgia.
Todos nós nos sentamos na sala de espera enquanto vovó está na
cirurgia. Meus colegas de banda e eu desligamos nossos telefones, porque
as mensagens ininterruptas de Max estão começando a nos deixar
doidos. A vida da minha avó está em jogo, e tudo com que Max se importa
são os números e os valores em dólares que ele está perdendo. É como se
fôssemos nada mais do que robôs em sua máquina de dinheiro.
Sento-me com as mãos cruzadas, batendo os pés no chão
acarpetado, incapaz de firmar meus movimentos. A ideia de vovó não
conseguir sair da cirurgia e não ficar bem me abala profundamente. Eu
não consigo parar de pensar em todo o tempo que passei fora de casa,
perseguindo um sonho, enquanto a saúde de minha avó estava piorando.
Quem sabe quanto tempo eu ainda tenho com eles? Eu deveria ficar
em casa. Eu deveria ter ajudado eles no rancho. Inferno, Big Paw não
deveria estar trabalhando ainda.
Rosie senta em sua cadeirinha, dormindo, e estou com ciúmes da
quantidade de paz que aquele bebê tem. Desejo que a vida seja tão fácil e
pacífica. Uma mão desliza sobre a minha e olho para cima para ver Hazel
de pé na minha frente. Ela me dá aquele pequeno sorriso que eu tanto
amo e se senta na cadeira ao meu lado. Segura minha mão, embora eu
não tenha pedido a ela. Segura firme e eu fico grato por isso. Preciso de
uma mão para segurar. Eu preciso de algo para parar os nervos de
assumir todo o meu sistema, e um simples toque daquela garota acalma
as partes mais selvagens da minha alma.
— Obrigado, — murmuro tão baixinho que não tenho certeza se ela
ouve minhas palavras.
Agora, ela segura com mais força.
Quando o médico sai, ele não parece tão empolgado com a cirurgia
quanto gostaríamos. Todos nós nos levantamos, Big Paw se levantando
mais rápido do que qualquer um, e nos aproximamos dele.
— O que está acontecendo? — Ele grita para o médico, parecendo
mais mal-humorado e irritado do que nunca. — Eu não entendo porque
ninguém veio aqui para nos atualizar sobre minha Holly! Que tipo de lugar
está sendo administrado aqui, afinal? É executado por macacos? Isso é
loucura.
Aproximo-me do médico, que parece surpreso com as palavras fortes
de Paw. Eu dou ao médico um meio sorriso. — Ei, desculpe por isso. Meu
avô está apenas preocupado com sua esposa.
O médico tenta manter a compostura, embora eu tenha certeza de
que ele tem algumas palavras para Big Paw. — Está bem. Houve alguns
problemas com a cirurgia e não fomos capazes de interferir da maneira
que esperávamos. Havia muito líquido ao redor dos pulmões, e não nos
sentimos confortáveis fazendo a cirurgia antes de podermos drenar parte
dele.
— Você está brincando comigo? — Big Paw bufa. — Você está me
dizendo que todos vocês estiveram lá todo esse tempo e nem fizeram nada?
— Sinto muito, Sr. Parker, mas tivemos que determinar o melhor
caminho a seguir para a segurança de sua esposa. Não queríamos causar
mais danos abrindo-a sobre a mesa quando ela não está fisicamente forte
o suficiente para lidar com isso. Vamos trabalhar nos próximos dias e ter
certeza de deixa-la estável, e então vamos rever a opção da cirurgia.
— Obrigado, — eu cuspo antes que Big Paw possa repreender mais o
médico. A julgar pelo fogo nos olhos do meu avô, se eu não o tirar daqui
virá mais com certeza. — Podemos vê-la?
— Ela está sendo levada para o quarto. Uma enfermeira irá notificálo quando você puder entrar.
Agradeço novamente e ele fica ali, quase parecendo pasmo. Eu
levanto uma sobrancelha. — Há algo mais…?
— Uh, bem, sim e não. Não sobre sua avó, mas… — Ele coça o lado
da cabeça. — Você é Ian Parker, certo? Vocês são os The Wreckage? Minha
filha é a maior fã de todos vocês. Seria totalmente impróprio pedir uma
fotografia?
— Sim, — Hazel interrompe, dando um passo alguns metros na
minha frente, bloqueando-me do médico como se ela fosse minha guardacostas. — Isso seria altamente inapropriado e extremamente pouco
profissional.
O médico faz uma careta e vai embora.
— Que figura. — Big Paw explode, ainda balançando a cabeça. — As
coisas pelas quais essas pessoas estão fazendo Holly passar me deixam
louco, — diz ele, recostando-se na cadeira. — Eu só quero levar minha
garota para casa comigo.
Quebra meu coração ver o quão quebrado Big Paw está. É como se
ele não tivesse ideia de como viver sem a vovó ao seu lado. Sem ela, Big
Paw mal consegue respirar.
— Vai ficar tudo bem, Paw, — eu repito mais uma vez, esperando
não estar mentindo. Mas sei que é o que vovó gostaria que eu dissesse.
Tudo vai ficar bem.
42
IAN
— Posso pegar alguma coisa para você? — Hazel pergunta enquanto
segura Rosie em seus braços. É incrível para mim o quanto essa menina
cresceu nos últimos meses. — Eu estou indo para o refeitório ver se
consigo encontrar um café ou algo assim.
Faço uma careta. — Eu estou bem.
James pigarreia. — Talvez você possa ir com ela, Ian, e pegar um
pouco de comida para nós, amigos. Estou faminto. Hazel, podemos cuidar
de Rosie para você, se quiser, — James ergue uma sobrancelha para mim,
como se estivesse me dizendo para ir com Hazel, a menos que eu queira
continuar sendo um idiota pelo resto da minha vida.
— Você tem certeza? — Hazel pergunta. — Ela pode ser muito difícil.
— Por sorte, tenho mãos grandes. — Ele se levanta para pegar Rosie
de Hazel, e ela agradece pela ajuda.
Levanto-me de minha cadeira e enfio minhas mãos nos bolsos
quando começo a caminhar pelo longo corredor com Hazel. Deus, mesmo
com todo o tempo que passou, ela ainda me deixa louco sempre que está
perto de mim. Ela faz meu coração bater irregularmente cada vez que
rouba um olhar na minha direção. Percebo todas as vezes que ela olha,
também, porque eu não consigo tirar meus olhos dela.
Estamos ambos quietos, mas sinto o nervosismo dela preenchendo o
espaço. Ou talvez seja a minha própria energia nervosa. Eu não consigo
mais dizer de quem são os sentimentos. Ela esfrega a mão para cima e
para baixo no braço enquanto me dá um pequeno sorriso. — Eu sei que
você provavelmente está preocupado com sua avó, mas não precisa
estar. Ela é uma lutadora. E você estava certo quando disse a Big Paw que
se não estiver tudo bem, não é o fim. Acho que ele precisava ouvir
isso. Também acho que é verdade.
Eu cruzo e solto minhas mãos repetidamente enquanto continuo
andando pelo corredor. Puta merda, onde fica esse refeitório? Do outro
lado do planeta?
— Podemos falar sobre qualquer coisa que não seja a vovó agora? É
muito pesado e difícil.
Ela assente. — Sobre o que você quer falar?
— Nós. Vamos falar sobre nós. Qual foi a parte mais difícil da
separação para você?
— A coisa mais difícil do mundo foi não poder entrar em contato com
você quando eu tinha um dia ruim. Ou falar com você quando as coisas
correram bem. Senti tanto sua falta, Ian, e por muito tempo me convenci
de que minha saudade era unilateral. Eu me convenci de que você estava
feliz e vivendo seus sonhos ao máximo. Eu precisava fazer isso para me
impedir de estender a mão. Mas eu escrevi um milhão de mensagens para
você no meu bloco de notas, atualizando você sobre as coisas. Deixando
você saber o que estava acontecendo no meu mundo.
— Ainda quero saber de tudo e, desta vez, não vou deixar você
ir. Teremos nosso tipo de história de amor para sempre. O tipo de amor
que Big Paw e Vovó compartilham. Vou envelhecer com você, Hazel Stone.
Ela fica ali completamente imóvel, com seus lábios entreabertos
como se estivesse atordoada com o que eu acabei de dizer. Sei que
provavelmente levará algum tempo para envolver sua cabeça em torno de
tudo. Eu sei que ela precisa de tempo para deixar isso se estabelecer, mas
não me importo.
Ela será meu final feliz e eu serei o dela. Não tenho planos de ir a
lugar nenhum tão cedo.
— Ei, vocês, — uma voz diz, tirando-nos de nossa
conversa. Olhamos para o corredor para ver James segurando uma Rosie
adormecida em seus braços. — Holly está acordada, se você quiser ir vê-la.
— Ok. — Eu balanço a cabeça, e antes de começarmos a ir na
direção da vovó, levemente coloco minha mão no antebraço de Hazel. — Só
para deixar claro, Hazel, você é linda. Você é tão linda que faz meu peito
doer. Eu te amo. Totalmente, desesperadamente, avidamente.
Seus lábios se separam e um pequeno som escapa dela. — Eu
também te amo.
— Estou bem, — vovó diz repetidamente enquanto todos nós
paramos em sua cama de hospital. Ela parece tão cansada e fraca. Quebra
meu coração vê-la em tal estado. Mas as enfermeiras nos informaram que
é bom ela estar falando. Mesmo que oscile dentro e fora do sono.
— Você não tem que mentir. Se você não estiver bem, diga, e eu farei
com que esses médicos façam seu maldito trabalho, — Big Paw resmunga,
sentando-se perto da cama da vovó enquanto segura a mão dela na sua.
Vovó sorri e olha na minha direção. — Por favor, não me diga que
esse velho tem dado trabalho a todas essas pessoas gentis neste hospital.
— Você conhece Big Paw. Todo latido e alguma mordida, — eu
brinco.
— Bem, eu ouvi a enfermeira dizendo que vocês todos estiveram aqui
o dia todo. Vão para casa, comam um pouco e descansem. Deus sabe que
vocês estão cansados.
— Não vou sair do seu lado, Holly Renee, — argumenta Big Paw.
— Sim, você vai. Vá para casa e durma um pouco. Posso dizer pelas
suas olheiras que não dorme há dias. E tome um maldito banho. Eu pude
sentir seu cheiro no corredor mais cedo, — ela brinca, então tem um
ataque de tosse, deixando todos alarmados. — Sério, estou em boas mãos
aqui. Vá descansar um pouco. Por favor. Isso vai me fazer sentir
melhor. Não posso melhorar se estou preocupada com a sua saúde, Harry.
Ele franze a testa e pressiona os lábios na mão dela. — Você é boa
demais para este mundo, Holly. Muito boa para mim.
— Eu sei. — Ela sorri. — Agora, vá para casa e ouça sua esposa.
— Eric e eu ficaremos com ela enquanto vocês vão descansar um
pouco, — Marcus oferece.
— Eu também vou ficar, — acrescenta James. Os três são como
netos para vovó. Claro que eles se ofereceriam para cuidar dela.
— Vê, Harry? Há um monte de gente cuidando de mim. Vá
descansar um pouco e volte pela manhã.
— Eu amo, — diz ele, inclinando-se e esfregando o nariz contra o
dela.
— Você, — ela termina, esfregando o nariz contra o dele.
Hazel e Rosie saem com Big Paw e eu de volta para a casa de Big
Paw. Quando chegamos, Hazel assume o controle, certificando-se de que
todos sejam alimentados e cuidados e garantindo que Big Paw entre no
chuveiro e vá para a cama. Ela é tão boa no papel de mãe. É tão natural
para ela – da mesma forma que vovó.
Ficamos no quarto de hóspedes de Big Paw naquela noite, porque eu
não quero que ele fique sozinho. O quarto de hóspedes fora arrumado com
um berço para Rosie, que agora dorme.
Depois que tomo meu próprio banho, volto para o quarto, onde Hazel
está sentada à mesa, estudando.
— Quando você faz uma pausa? — Eu pergunto.
Ela ri e boceja. — Do estudo ou da vida? Porque a resposta a ambas
as perguntas é nunca.
— Talvez possa parar um pouco agora?
Ela olha para mim e morde o lábio inferior. — Ok.
— Encontre-me no meu antigo quarto para que possamos conversar
sem acordar Rosie?
— Vou. Deixe-me pegar o monitor do bebê e já vou.
— Parece bom. E Hazel?
— Sim?
— Verifique seu Instagram.
43
HAZEL
Depois que Ian sai do meu quarto, corro para o meu celular para
abrir o Instagram. Meu coração voa a um milhão de milhas por hora,
imaginando o que é que eu deveria testemunhar. Então eu vejo. A
postagem mais recente de Ian.
Uma postagem minha.
Eu nunca tinha visto a foto antes. Ele deve ter tirado quando Rosie
estava na UTIN, sem que eu soubesse que minha fotografia estava sendo
tirada. Eu estava olhando para Rosie com o maior sorriso contra meus
lábios enquanto admirava minha irmã mais nova. Era uma foto
simples. Nada de mais, mas a única coisa que pode ser tirada da foto é o
amor. Há muito amor brilhando enquanto eu estudava os batimentos
cardíacos da minha irmãzinha.
As curtidas na postagem dispararam bem diante dos meus
olhos. Centenas. Depois, milhares. Depois, centenas de milhares. Estou
oficialmente virando viral na página do Ian no Instagram.
Minhas mãos caem no meu peito enquanto eu leio a legenda que
acompanha a fotografia.
Esta mulher controla meus batimentos cardíacos. Cada letra de amor
que canto a cada noite é feita para ela. Cada melodia persegue seu
batimento cardíaco e cada refrão implora por seu amor. Chegou ao meu
conhecimento que algumas pessoas da minha equipe de gestão escolheram
abordar o amor da minha vida e dizer-lhe que ela não era boa para a minha
imagem. Devido à sua aparência e ao passado que ela não tinha voto na
criação, eles disseram que ela não era boa o suficiente. É verdade,
crescemos na mesma cidade, mas isso não significava que nossas vidas em
casa foram construídas sobre os mesmos alicerces estáveis. Eu fui
abençoado o suficiente para nunca saber o que é uma luta. Esta garota teve
que lutar com unhas e dentes por tudo o que lhe foi dado. Ela sacrificou sua
própria juventude, porque não queria que sua irmãzinha fosse para o
sistema de adoção. Ela desistiu do amor, para que eu fosse atrás dos meus
sonhos. Ela entrega e dá para fazer os outros felizes, porque essa é a
pessoa que ela é.
Ela é o mais belo ser humano vivo, e para qualquer um –
especialmente para as pessoas que deveriam estar ao meu lado – dizer de
maneira diferente me repugna até a alma. Eu não sou um robô. Eu me
machuco, sinto dor, sofro, amo e choro. E me quebra viver em um mundo
onde tenho que ter medo de mostrar quem realmente sou para ganhar
seguidores.
Portanto, se você não gosta deste fato – que eu não sou solteiro e que
estou irremediavelmente apaixonado – então tudo bem. Se eu perder fãs por
causa disto, não me importo. Farei todos os sacrifícios do mundo a partir de
agora para dar todo o meu amor à mulher que deu mais do que ela deveria
ter dado. Eu te amo, Haze. Desde a lua nova até a cheia. A partir de agora
até para sempre.
Ele fez uma declaração pública de amor para mim. Dando a seu
empresário o maior dedo médio do mundo inteiro. Minhas mãos tremem
enquanto eu releio suas palavras uma dúzia de vezes. Então o ouço
chamar por mim.
— Haze? Você vem?
Respiro fundo e sacudo a cabeça antes de colocar meu telefone na
cômoda. — Sim. Estou indo.
No momento em que entro em seu quarto, não dou a ele a chance de
me oferecer qualquer palavra. Meus lábios batem contra os dele enquanto
ele passa os braços em volta do meu corpo. Nosso beijo é muito mais
intenso do que nunca. É como se estivéssemos recuperando o tempo
perdido, todos os beijos que sumiram por causa de Charlie.
Sua língua dança com a minha, e eu avidamente chupo seu lábio
inferior sempre que tenho a chance. Fazemos amor naquela noite,
balançando nossos corpos juntos, encaixando nossas peças de volta em
seus devidos lugares. Ele possui cada centímetro do meu corpo e cada
pedaço da minha alma. Cada vez que desliza para dentro de mim, eu gemo
por mais. Cada vez que ele empurra mais fundo, eu cravo minhas unhas
em suas costas.
— Para sempre, — ele sussurra em meu pescoço antes de passar
sua língua contra minha pele.
— Para sempre, — eu suspiro, empurrando meus quadris em sua
direção.
Fazemos amor mais três vezes naquela noite, cada vez com mais
paixão que a anterior. E quando adormeço em seus braços, sei que estou
em casa.
Acordo com sons altos de batidas. Sento-me na cama, olhando em
volta quando a confusão me atinge.
Bang, bang, bang!
O que aconteceu?
Olho para o lado esquerdo da cama, onde Ian estivera antes, mas ele
está desaparecido. Minha mão varre seu lugar, e um calafrio corre sobre
mim quando sinto falta de seu calor.
Bang, bang, bang!
Eu me levanto e agarro meu robe, jogando-o rapidamente sobre o
corpo. Verifico Rosie para ter certeza de que ela está bem, mas felizmente,
ela ainda dorme pacificamente.
Desço correndo os degraus e paro quando quase chego ao final. Toda
a sala de estar está em completa desordem, com os painéis de madeira do
chão sendo puxados para cima. Big Paw leva um martelo para eles, e Ian
está ao lado dele, puxando suas próprias peças.
Ainda está escuro como breu lá fora, e eu, por minha vida, não
consigo descobrir se ainda estou sonhando ou não.
— O que está acontecendo aqui?
Big Paw não ergue os olhos. Ele continua martelando e martelando
sem parar no chão.
Ian olha para mim e me dá um sorriso desleixado e quebrado. — Ele
tinha prometido a vovó que consertaria esses pisos nos últimos vinte e
cinco anos. Desci e o vi martelando, então me juntei para ajudar.
— Ela não deveria ter que voltar para casa para esta bagunça, —
murmura Big Paw, enxugando as lágrimas que continuam caindo de seus
olhos. — Sou o idiota que não fiz isso quando ela pediu.
Ele está se culpando porque sente medo por sua esposa. Sua mente
deve ter ficado apavorada por ele não ser capaz de consertá-la, de deixa-la
melhor. Então ele faz o que passou os últimos oitenta anos de sua vida
fazendo – trabalho manual para mostrar seu amor. Ele bate no chão, e Ian
fica ao lado de seu avô, sendo a rocha que o mantém firme. Trabalhando o
mais rápido que pode para ajudar a consertar o chão. Eu não tenho
certeza se o que eles estão fazendo faz algum sentido. Talvez seja apenas
uma saída para deixar suas preocupações se libertarem de suas almas.
A verdade é que não importa por que eles estão fazendo isso. Tudo o
que importa é que eles estão fazendo isso juntos.
Pego um martelo e entro, porque é isso que a família faz. Ficamos
um ao lado do outro em todos os altos e baixos.
Uma semana depois, os pulmões de Holly estão melhorando e a
cirurgia do marca-passo é realizada. Felizmente, a operação foi rápida e
sem complicações. Seu processo de recuperação exigirá muito cuidado e
atenção, mas ela tem um bom exército por trás para garantir que tudo
ocorra da melhor maneira possível.
Todos os caras ajudaram a terminar o piso da casa de Big Paw antes
que Holly voltasse.
— A maior preocupação é ter certeza de que Holly fique bem, — diz
Eric certa noite quando todos nós reunimos na casa do celeiro. — A
música não vai a lugar nenhum.
— Eu ainda me sinto mal por tudo isso estar respingando em
vocês. Max tem sido duro com todos nós desde que coloquei aquele post
sobre Hazel, e me sinto mal por não ter contado sobre o post para vocês
primeiro, — diz Ian.
— Você está brincando comigo? Max Fodido Rider cruzou cada linha
dizendo isso para Haze! Ele teve muita ousadia e, se eu soubesse, nunca
teria deixado isso de lado. Estou feliz que você postou essa merda. Já era
hora de alguém falar a verdade, — exclama Marcus. — E outra coisa: ele
também nos fodeu com o nosso álbum! Max Fodido Rider que vá se foder.
James senta no palco onde a banda costuma dar todos os seus
shows. Seus dedos correm pela plataforma de madeira e um sorriso torto
aparece em seus lábios. — Saudades desse lugar. Nunca pensei realmente
que diria isso, mas digo. Sinto falta da maneira como costumávamos amar
a música. Não me entendam mal: sei que somos abençoados e não
desistiria deste mundo por nada, mas às vezes parece que está tão fora do
nosso controle, e sinto que se não colocarmos um pare com algumas
dessas demandas malucas, nós nos perderemos no futuro.
— Eu digo que devemos votar, — Eric comenta, dançando seus
dedos em seu teclado. — Todos a favor de sentar com Max e Donnie e ter
uma conversa de verdade sobre quem somos e o que queremos fazer com
esta nossa carreira, digam sim.
— Sim. — A sala ecoa e eu sorrio para eles. Os quatro meninos que
sonhavam estão assumindo o controle mais uma vez.
Ian estende a mão. — Para sempre.
Cada um dos caras se aproxima dele e coloca a mão em cima da
dele. — Para sempre.
Todos eles olham para mim com as sobrancelhas erguidas,
perplexos. — Oh, desculpe. Eu não queria atrapalhar o momento, posso
deixar vocês…
— Hazel, se você não trouxer sua mão aqui neste segundo, terei que
forçá-la, — Marcus ameaça.
Eu rio e me aproximo, colocando minha mão em cima da deles. —
Até para sempre, — eu concordo.
— Falando em Max e Donnie, — Eric sorri largamente enquanto
coloca o polegar no nariz — Acho que sei a melhor maneira de lidar com
nosso problema.
— E como é isso? — Ian pergunta.
— Deixe-me te mostrar. — Eric vai até sua mochila perto do teclado
e tira seu laptop. Enquanto ele o liga, todos nós o cercamos. — Todos
vocês sabem que sou um profissional em sempre gravar vídeos e outras
coisas, mesmo quando as pessoas não sabem disso.
— Sim, vá direto ao ponto, — Marcus resmunga para seu irmão.
Eric pega um vídeo e aperta o play. — Tenho feito um bom vídeo
caseiro de situações com Max e Donnie desde que os conhecemos. Das
vezes que íamos a festas e Max tomava pílulas ou cheirava cocaína. Muitas
vezes, os dois homens muito casados foram vistos com mulheres nos
braços. Momentos em que eles tiveram conversas agressivas. Tudo. Temos
o suficiente para prender esses idiotas.
— Mas não podemos. Essas coisas nunca se sustentariam no
tribunal, — argumenta James. — Foi gravado ilegalmente.
— Essa não é a questão. Nem mesmo precisamos levar isso ao
tribunal. O que quero dizer é que ameaçamos mostrar a suas esposas, a
menos que eles nos permitam sair do contrato confuso.
— Você acha que mostrar as suas esposas vai importar? Eles são
idiotas, Eric. Não se importam com os sentimentos de suas esposas.
— Sim, você está certo. Mas tenho certeza de que as esposas ficarão
interessadas em ver o que esses homens têm feito. Além disso, estão com
suas esposas desde antes de encontrarem a fama. E você sabe o que isso
significa?
— O quê? — Ian pergunta.
— Sem acordos pré-nupciais. O que significa que se suas esposas os
deixarem, elas sairão com quase metade das merdas.
Um pequeno sorriso se forma no rosto de todos quando a
compreensão começa a aparecer. Esse plano é brilhante e pode realmente
funcionar. Eu tenho certeza de que os caras farão um ajuste antes de
abordar Max e Donnie, mas parece haver uma luz no final do túnel muito
longo e escuro para os The Wreckage.
O resto da noite, ficamos na casa do celeiro, com Rosie se juntando
quando ela acorda de seu cochilo, e os caras tocam música com todo o seu
coração e cada fagulha de sua paixão. Eles voltam às suas raízes e soam
melhor do que nunca. Eu amo que eles não têm medo de falar dos seus
desejos, das suas necessidades como músicos. Não deve ser fácil enfrentar
homens como Donnie e Max, mas eles não estão sozinhos. Eles entrarão
naquela reunião com suas cabeças erguidas como uma unidade completa.
Não importa o que acontecer quando eles se encontrarem com a
gravadora, sei que tudo funcionará exatamente como deve. Os The
Wreckage terminarão exatamente onde devem ir, porque eles se protegem
mutuamente. Não há como contornar o fato de que quando eles dizem –
até para sempre -, eles realmente falam sério.
Eu fico lá ouvindo as letras saindo da língua de Ian enquanto ele
canta, sua voz derretendo em cada centímetro da minha alma.
E naquela noite, sei que aquelas letras são cantadas exclusivamente
para mim.
44
IAN
— Por favor, diga-me que você está brincando, porque cada exigência
que você está fazendo está fora do reino das possibilidades. Além disso,
para que possa sair de cena, enquanto tiver feito isso sem alcançar metas
não é nada profissional. Vocês perderam muito tempo de estúdio, e agora
não têm nenhum maldito álbum para mostrar. Mas hoje vocês têm a
coragem de vir sentar-se na sala de conferências da maior gravadora de
todos os tempos, com Donnie Schmitz, o maldito CEO da Mindset Records,
para nos dizer que lhe devemos um maldito pedido de desculpas? — Max
cuspe em nós em completo estado de choque.
É engraçado o quanto havia desde que nos sentamos em frente a
Max pela primeira vez. Éramos tão ingênuos naquela época e felizes por
termos apenas uma oportunidade. Ficamos tão felizes que alguém tão
grande como Max nos notou que nem sequer consideramos o que significa
exatamente alguém como ele nos notando.
— Vocês vão todos entrar em um processo judicial infernal, —
Donnie resmunga, juntando as mãos com um olhar ameaçador no rosto.
Aperto minhas mãos da mesma maneira e me endireito. — Duvido
que tenhamos que envolver advogados. Queremos apenas algumas coisas
de você, e vamos sair da sua frente.
Donnie bufa. — Você quer algo de nós? Nós demos tudo a você!
— Sim, até a gentileza de vocês dois vazarem nosso álbum para nos
forçar a tocar sua música mainstream, — explico.
Donnie e Max se entreolham antes de Max balançar a cabeça. — Do
que diabos você está falando?
— Temos nosso próprio esquadrão geek, — diz James, acenando
com a cabeça em direção a Eric. — Ele descobriu de onde vieram os
registros que vazaram. Não se faça de bobo, não é fofo em você.
Donnie faz uma careta enquanto passa as mãos pelo cabelo
grisalho. — Sim, bem, você invadir nossos e-mails não vai parecer nada
bom para você. Isso é um ato ilegal.
— Sim, é por isso que não estamos levando os e-mails aos
federais. Estamos, em vez disso, enviando esses vídeos para suas esposas,
— diz Marcus com naturalidade. Ele pega o celular e manda um e-mail
para Donnie. — Sr. Schmitz, por favor, verifique seu e-mail.
Donnie abre seu e-mail com um vídeo muito, muito
impróprio. Depois que Eric revelou seu plano para nós, fomos capazes de
alcançar algumas das garotas nos vídeos com Max e Donnie, e elas eram
fãs de nossa música. E estavam ansiosas para nos enviar vídeos de seus
casos particulares com Donnie e Max, e vamos apenas dizer que um monte
de merda estranha aconteceu com toranjas47 e paus. Max corre até Donnie
para ver que vídeo está sendo reproduzido e eu observo o momento exato
em que a cor some de seu rosto.
Donnie se endireita na cadeira. — Onde você conseguiu isso?
— Não importa, mas se você fosse mais inteligente, teria feito essas
mulheres assinarem NDAs48. Mas vendo como você não o fez, me pergunto
se suas esposas estariam interessadas em ver esses vídeos. Além disso, se
você fosse mais inteligente, provavelmente teria feito acordos pré-nupciais
antes do casamento. Mas, em vez disso, parece que suas esposas podem
conseguir tirar um bom troco de vocês.
— Eles estão blefando, — Max cuspe. — Eu conheço esses
caras. Eles não têm coragem de…
47 Uma fruta cítrica híbrida, resultante do cruzamento do pomelo com a laranja.
48 NDA é uma sigla em inglês para Non-Disclosure-Agreements, ou simplesmente acordo
de não divulgação.
— Cale a boca, Max, — Donnie late, silenciando Max em meros
segundos. As sobrancelhas de Donnie se franzem e ele baixa os olhos
enquanto reproduz o vídeo. Seus lábios estão pressionados com tanta
força que a veia em seu pescoço lateja.
Quando ele termina de me encarar, finalmente coloca o telefone na
mesa e olha nos meus olhos. — Quais são os seus pedidos?
— Você está de brincadeira? — Max suspira. — Você não pode
realmente…
Donnie estende a mão silenciosa para Max, e ele imediatamente cala
a boca.
Bom cachorrinho.
— Queremos mais três meses para criar um novo álbum. Você
adiará a data de lançamento. Vamos lançar nossa música – nossa música
de verdade – e então, uma vez feito isso, estamos livres de nosso contrato
com você. Não devemos a você nenhum outro álbum no futuro, e tudo o
que concordamos é nulo e sem valor. Estamos livres para andar com as
mãos limpas após o lançamento deste álbum.
Há uma densidade no ar enquanto Donnie contempla suas
escolhas. Ele pigarreia. — Vou redigir um novo contrato nos próximos
dias.
— Você está me zoando? — Max grita. — Você realmente vai permitir
que esses idiotas de uma cidade pequena o encurralem?
Donnie se inclina na direção do telefone de conferência e aperta um
botão. — Laura, por favor, peça à segurança para retirar Max Rider do
prédio.
— O quê? O quê? Você está brincando certo? — Max diz, parecendo
em pânico. — Você não pode me expulsar daqui.
— Sim, eu posso, e eu estou. Eu nunca deveria ter aceitado a ideia
de vazar aquele álbum, e isso é algo com o que terei que viver. Mas, por
enquanto, você não tem mais permissão para acessar a Mindset Records.
— Isso… tudo isso é por causa desses idiotas! — Max grita,
gesticulando em direção à banda e a mim. — Seus idiotas, arruinaram sua
única chance de fama. Eu descobri vocês! Eu fiz de vocês o que são! Você
está atirando no próprio pé. É estúpido e está gerando um milhão
erros. Ficar com aquela garota é um escândalo prestes a acontecer. Sua
porra de música indie estúpida é um desastre. Vocês não vão decolar sem
mim. Vocês não sabem quem eu sou? Sou o maldito Max Rider! Eu faço
estrelas!
Ele grita essas últimas frases repetidamente enquanto o segurança o
arrasta para fora do prédio.
Enquanto juntamos nossas coisas, Donnie olha em nossa direção
com uma carranca nos lábios. — Então, sobre aquele vídeo. Você acha que
pode se livrar disso?
— Oh, Donnie. — Balanço minha cabeça. — Acho que nós dois
sabemos que não podemos destrui-lo até que os novos contratos estejam
em vigor.
— Justo. — Ele acena com a cabeça em compreensão. — Max disse
que vocês, meninos de cidade pequena, não eram os mais inteligentes,
mas parece que provaram que ele estava errado. Parece que vocês
realmente podem se controlar. Entraremos em contato em breve.
Todos concordamos e, ao nos afastarmos, Donnie diz: — A coisa da
toranja valeu a pena. Sentia-se muito bem contra o meu pau enquanto as
meninas trabalhavam com a boca.
Marcus geme quando saímos da sala. — E assim, nunca mais
poderei comer toranja.
Fico um pouco incomodado com a escolha que fizemos na sala de
conferências naquela tarde, mas sei que é a certa. Seremos capazes de
lançar nosso álbum e nossa música em nossos termos. Claro, talvez nunca
seremos capazes de ter o sucesso de superstar que sonhamos sem uma
grande empresa nos apoiando, mas pelo menos teremos nossa música –
que é o que importa em primeiro lugar.
Eric me dá um tapinha nas costas. — Bom trabalho, líder.
— Sim, isso foi ótimo e tudo, mas por que eu sinto que minhas bolas
caíram e eu quero vomitar? — Marcus brinca. — Acabamos de dizer a Max
Fodido Rider e o chefe da Mindset Records para se foderem? É o fim de
nossas carreiras?
— Nah! Acho que vamos ficar bem. Você sabe o que dizem: se não
estiver bem, não é o fim da história. Eu acho que os The Wreckage verão
outros dias, — diz James. — E se não, tenho certeza de que podemos
conseguir nossos empregos de volta no rancho.
Voltar para os chiqueiros e Hazel Stone.
Não parece tão horrível para mim.
Então, novamente, sei que não podemos desistir da música. Vamos
descobrir de uma forma ou de outra. Só que desta vez, faremos do nosso
jeito.
— Então você ameaçou Max Fodido Rider e o chefe da Mindset
Records, e viveu para contar a história, — diz Hazel enquanto nos
sentamos dentro do galpão quando o sol começa a se pôr. Os caras e eu
estávamos de volta a Eres por cerca de trinta minutos, e eu já tinha
encontrado o caminho para o galpão para sentar ao lado de Hazel e olhar
para o céu.
— Acho que vivemos para contar a história. Veremos depois que a
sensação de náusea diminuir, — brinco. — Não sei o que vai acontecer
conosco, mas acho que começaremos tentando encontrar um novo
empresário. Temos uma reunião na gravadora na próxima semana para
ver o novo contrato. Vamos pedir aos nossos advogados que vasculhem
sem parar para ter certeza de que Donnie não está tentando nos ferrar de
alguma forma.
Ela dá uma risadinha. — Seus advogados. Que coisa maluca de se
dizer. Você tem sua própria equipe de advogados. Quem poderia imaginar
que sua vida seria assim?
— Selvagem, certo?
— Da melhor maneira. Eu, por exemplo, acho que vocês estão
fazendo a escolha certa ao procurar um novo empresário. Não apenas
porque odeio cada pedaço da alma de Max, mas também porque você
precisa de alguém atrás de você que acredite nas mesmas coisas. Alguém
que acredita nos seus sonhos e vai te ajudar a alcançá-los. Alguém que vai
defender você. Tenho certeza de que o empresário está aí. Apenas dê um
tempo. Ele vai aparecer.
— Você acha?
— Eu sei que sim.
Ela apoia a cabeça no meu ombro e olhamos para o céu que
escurece. A lua está cheia e uma parte de mim pensa em uivar em direção
a ela. Inclino-me e beijo a testa de Hazel.
— Você sabe o que estive pensando? — Eu pergunto.
— Em que?
— Que você provavelmente deveria se casar comigo algum dia. Em
breve.
Ela levanta a cabeça do meu ombro e a vira na minha direção. —
Como?
Eu rio. — Não se preocupe, não estou pedindo agora, mas pretendo
perguntar um dia e, quando o fizer, espero que diga sim para mim. Porque
a ideia de ter você como minha para sempre significa mais do que você
jamais imaginará.
Ela se inclina com um sorriso e beija meus lábios. — Eu vou dizer
sim, você sabe. Repetidamente, eu direi que sim.
Meu peito aperta quando percebo. Eu estou apaixonado por uma
garota que me ama de volta. O que pode ser maior do que isso? Sem fama,
sem fortuna, nada. Tivemos sorte de nos encontrar, sorte de não desistir
quando as coisas ficaram pesadas.
Hazel Stone me mudou. Ela me mostrou como é a força final. Ela me
mostrou amor incondicional e eu esperava fazer o mesmo por ela pelo resto
de nossas vidas.
Enquanto estamos deitados dentro do galpão olhando para o céu,
sinto uma plenitude passar por mim.
Hazel Stone é minha melhor amiga, minha querida, minha melodia,
minha música.
E, caramba…
Isso parece tão bom.
Epílogo
HAZEL
Um ano depois
A casa do celeiro está lotada enquanto as pessoas dançam em
círculos a noite toda. Rosie está na pista de dança com Marcus, e os dois
pulam loucamente enquanto uma música de Bruno Mars49 toca nos altofalantes. Há mesas arrumadas com os mais deslumbrantes buquês de
rosas nos centros, e as pessoas se sentam às mesas comendo o bolo mais
gostoso conhecido pela humanidade.
Eu me afasto de toda a ação, olhando de longe enquanto a felicidade
brilha por toda a Eres.
Uma mão envolve minha cintura e Ian me puxa para perto de seu
corpo. Sua boca roça o lóbulo da minha orelha e ele sussurra: — Como
está, Sra. Parker? — Ele me beija suavemente de cima a baixo no meu
pescoço.
Eu rio. — Eu te disse, você não tem permissão para me chamar
assim até depois de realmente nos casarmos. — Verdade, a celebração que
estamos assistindo não é nossa, embora Ian tenha me pedido em
casamento há mais de um ano no galpão, enquanto olhávamos para a lua.
Estamos no planejamento do casamento, mas ainda temos alguns
anos antes de oficialmente subirmos ao altar. The Wreckage acabou de
lançar seu segundo álbum, que disparou nas paradas, levando-os a seu
primeiro álbum número um. Depois da briga com Max, eles encontraram
um empresário chamado Andrew Still, que entendia seus sonhos e estava
disposto a fazer o que fosse necessário para torná-los realidade. Eles
49 É um cantor, compositor e produtor musical americano.
partirão para a primeira etapa de sua nova turnê em uma
semana. Sentirei muita falta dele, mas Rosie e eu já temos planos de nos
encontrar com eles para alguns shows na Europa durante o verão, uma
vez que minhas aulas terminem.
Estou há dois anos de meu diploma de administração e não posso
estar mais orgulhosa de mim. Sei que não poderia ter feito isso sem a
família de Ian me ajudando em tudo.
— Tem certeza de que não quer fugir para Las Vegas e apenas nos
casar? Ouvi dizer que Elvis está vivo e bem lá embaixo e disposto a fazer
isso por nós, — Ian oferece pela enésima vez.
Eu rio do pedido e me viro para encará-lo. — Não há pressa. Temos o
resto de nossas vidas para ficarmos juntos.
— Eu sei, mas eu quero isso, — ele diz, apontando para a pista de
dança. A ocasião da noite foi o sexagésimo quinto aniversário de Paw e
Holly. Os dois estão lá fora, balançando para frente e para trás, rindo um
com o outro como se fossem adolescentes se apaixonando pela primeira
vez.
— Nós vamos conseguir isso, — eu juro. — Vamos dançar em todos
os casamentos e ser o último casal de pé.
— Falando em dançar, — Ian diz, estendendo a mão para
mim. Coloco minha mão na dele e ele nos leva para a pista de
dança. Começamos a balançar para frente e para trás, sua mão
descansando na minha parte inferior das costas, minha cabeça apoiada
em seu ombro.
Fico surpresa com o quão longe chegamos. Como nos tornamos um
amor tão forte. Eu tinha dezenove anos quando soube que meu coração
batia por Ian Parker, e chegarei aos noventa com meu coração ainda
batendo por aquele homem.
Mesmo sendo jovens, sei que o futuro será brilhante para
nós. Traremos bebês a este mundo, usaremos nossos dons para o
bem, ajudaremos aos necessitados. Vamos nos amar e nutrir esse amor
ano após ano.
E não importa o que aconteça, passaremos o resto de nossas vidas
dançando sob o luar.
Três anos depois
— Tem certeza de que não quer trabalhar no restaurante? — Eu
pergunto, sentada na minha mesa. À minha frente está minha mãe em
suas melhores roupas. Ela parece muito melhor do que anos antes, e vê-la
sorrindo à minha frente me deixa a filha mais feliz do mundo.
Há muito tempo eu pensava que a tinha perdido para sempre. Uma
parte da minha vida quando pensei que mamãe estava muito perdida com
seus demônios.
Depois que ela saiu da prisão, ela teve medo de cair de volta em seus
velhos padrões, então quando Ian ofereceu a ela a chance de ir para um
centro de reabilitação incrível, ela aceitou. Mamãe trabalhou duro para
mudar sua vida e, enquanto ela fazia isso, Ian e eu sempre mantivemos a
luz da varanda acesa, caso ela quisesse voltar para nós.
Quando ela estava pronta, ela voltou, e agora procura trabalho no
rancho.
— Oh, não, não. Você já sabe que eu não pertenço à cozinha. Acho
que posso fazer parte do trabalho por aqui, mesmo que seja só limpar
algumas merdas. Quer dizer, se você acha que tem espaço… — Ela brinca
com os dedos e me dá um meio sorriso. — Farei qualquer coisa para me
manter ocupada. Além disso, Rosie disse que queria que eu trabalhasse
com os cavalos com ela.
— Parece bom. — Minha irmãzinha ama Dottie tanto quanto eu. Se
ela desaparece, você sempre poderá encontrá-la naqueles estábulos. —
Podemos começar na segunda-feira. Mas não pense que vou pegar leve
com você, só porque é minha mãe, — falo severamente.
Ela assente. — Não esperava que você fizesse. Vou trabalhar duro,
Hazel. Eu prometo a você, não vou a decepcionar.
— Há mais uma condição para o trabalho, mamãe.
— E o que é isso?
— Você vai para a faculdade.
Seu rosto perde um pouco de cor e ela balança a cabeça para frente
e para trás. — Ah, não. Não. Eu não posso, Hazel. Eu nem tenho o ensino
médio. A faculdade não é algo que eu poderia fazer.
— Há muito tempo, Big Paw me disse que você costumava sonhar
em ir para a faculdade. Não é verdade?
Ela brinca com as mãos e o embaraço cai em seu rosto. — Sim, mas
isso foi há muito tempo. Não sou inteligente o suficiente para nada disso e
estou velha e cansada…
— Você é inteligente, mamãe. Você sempre foi inteligente e não
aceito não como resposta. Nós vamos pegar seu diploma no ensino médio e
então trabalhar para colocá-la em alguns cursos universitários. Nunca se
está velho demais para atingir seus objetivos. Você consegue.
Quando ela olha para mim, tem lágrimas nos olhos. — Você
realmente acha isso?
— Eu sei disso. Descobriremos todos os detalhes no futuro, mas
chega de todas essas coisas, — eu digo, sorrindo enquanto me levanto. —
Precisamos chegar ao jantar de Ação de Graças antes que Big Paw nos
mate. Você começará na próxima segunda-feira.
Seus olhos se enchem de lágrimas quando a puxo para um abraço
apertado. — Obrigada, Hazel.
— Eu te amo, mamãe, e estou muito orgulhosa do trabalho que você
fez para mudar sua vida.
— Você vai ser uma ótima mãe, — ela comenta, colocando as mãos
na minha barriga que cresce. Estou a poucas semanas de dar à luz minha
primeira filha, e nem é preciso dizer que estou apavorada.
Eu nem deveria estar mais trabalhando, já que os médicos me
colocaram em repouso na cama, mas não posso deixar ninguém
entrevistar mamãe. Embora eu tenha dito que ela não terá tratamento
especial, sei que ela o receberá.
Benefícios para a família e tudo.
Desde que Rosie nasceu, ela mora com Ian e eu, mas depois que
mamãe se recompôs, ela foi morar com a gente também. Sei que é
importante para ela e Rosie estabelecerem uma conexão o mais rápido
possível. Ela pode não ter sido capaz de apoiar Rosie nos estágios iniciais,
mas mamãe tem todas as esperanças de que ela estará lá até o fim. Mesmo
Garrett para de vez em quando para visitar Rosie. Ele nunca se viu como
uma figura paterna, e achou melhor que Rosie não o veja nesse papel, mas
aquela garotinha adora engatinhar em Garrett e chamá-lo de amigo.
Caminhamos até a casa do celeiro – bem, mamãe caminhou, eu
ginguei – onde o jantar de Ação de Graças está ocorrendo, e sorrio ao ver a
sala lotada de pessoas. É meu segundo ano como responsável pela festa de
Ação de Graças, e estou muito grata pelos habitantes da cidade me
ajudando a criar um evento mágico. Eu esperava que a vovó estivesse
olhando do céu acima, sorrindo de orelha a orelha por como tudo tinha
acabado.
Ela faleceu há pouco mais de um ano, mas aqueles últimos anos de
sua vida foram vividos ao máximo. Ela e Paw finalmente tiraram um tempo
do trabalho e passaram os últimos dias da vovó amando-se plenamente.
Big Paw tinha lutado com isso por algum tempo, mas ele teve sua
estrela da sorte, Rosie, para mantê-lo alerta. Juro, ele sorri muito por
causa da minha irmã, e ele a chama pelo motivo de ainda estar por perto.
— Ela não pode se meter na travessura sozinha. Precisa que eu crie
alguns problemas com ela também, — ele me diz.
Mesmo que a vovó tivesse falecido, Big Paw ainda deixa a luz da
varanda da frente acesa para que seu espírito sempre possa encontrar o
caminho de casa para ele todas as manhãs e noites.
— Mamãe! Mana! — Rosie grita, correndo para o nosso lado. Ela
puxa o braço da mamãe. — Mamãe, nossos assentos são
aqui. Vamos! Antes que Big Paw coma toda a torta!
— Eu não vou comer toda a torta, sua fofoqueira! — Big Paw grunhe,
lançando um olhar penetrante para Rosie.
Rosie mostra a língua para ele, e ele mostra a sua para ela. Então
ela corre até ele e puxa-o para um abraço, e beija sua testa. Isso resume
sua conexão perfeitamente.
Mamãe corre para se juntar a Rosie e Big Paw. Ver mamãe com
Rosie é um presente para todos nós. Ela finalmente está limpa e lúcida o
suficiente para ser a mãe que Rosie merece, e eu fico mais do que feliz em
assumir o papel de irmã.
Além disso, tenho meu próprio feixe de alegria vindo em minha
direção mais cedo ou mais tarde.
— Pronta para um pouco de azia?
Dois braços me envolvem por trás, e eu me aconchego enquanto
sinto o corpo de Ian contra o meu.
— Aí, sim. Traga as comidas ruins e o antiácido, — brinco.
Ele me vira para encará-lo, beija minha testa e depois minha
barriga. Se há alguém mais animado do que eu com a minha gravidez, é
Ian. Ele será o pai do século com base em como cuida de mim e de nossa
filha.
Todas as noites, mesmo quando está viajando, me faz colocar meu
telefone contra minha barriga para que ele possa cantar canções de ninar.
Eu não sabia que poderia amá-lo mais a cada dia.
— Tudo vai mudar quando ela chegar, não é? — Eu pergunto,
aconchegando-me contra ele.
— De certa forma, mas sempre teremos isso, — ele responde,
gesticulando ao redor. — Teremos nossas estradas de terra, nosso rancho
e nossa felicidade para sempre. E teremos um ao outro para
sempre. Estamos apenas adicionando um pouco mais de amor à nossa
música, e eu não poderia desejar mais nada.
Eu mal posso esperar pelo nosso pacote de alegria se juntar a nós.
Holly Renee Parker – ela recebeu o nome de nosso anjo favorito.
Ian roça seus lábios contra os meus e me beija suavemente. — Eu te
amo, querida.
— Eu também te amo, melhor amigo. Para sempre.
Para sempre.
FIM.

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